ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER NO CICLO GRAVÍDICO PUERPERAL: AVALIANDO A DIMENSÃO ORGANIZACIONAL DA ACESSIBILIDADE Lais Vasconcelos Santos 1 Jéssica Oliveira Rodrigues2 Lara Caline Santos Lira3 Laianne Santos Barbosa de Souza 4 Sheila Milena Pessoa dos Santos5 1 Relatora, graduandaem Enfermagem pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG, Campina Grande (PB), Brasil. E-mail:laí[email protected] 2 Enfermeira pela UFCG, Campina Grande (PB), Brasil. E-mail: [email protected] 3 Graduanda em Enfermagem pela UFCG, Campina Grande (PB), Brasil. E-mail: [email protected] 4 Graduanda em Enfermagem pela UFCG, Campina Grande (PB), Brasil. E-mail: [email protected] 5 Orientadora, Enfermeira, Doutoranda, Professora do curso de Enfermagem da UFCG,Campina Grande (PB), Brasil. E-mail: [email protected] RESUMO Introdução:A garantia da assistência e do direito à saúde reflete na capacidade da população de ter condições de acessibilidade aos serviços. Objetivo: Analisar a dimensão organizacional da acessibilidade na atenção do ciclo gravídico e puerperal. Metodologia: Trata-se de um estudo exploratório e descritivo, de abordagem quantitativa-qualitativa com métodos múltiplos de coleta: análise documental e entrevista semiestruturada, elaborado a partir de recorte de um projeto de pesquisa. A composição da população teve como representação mulheres que estiveram em período gravídico ou puerperal nos anos de 2012, 2013 a abril de 2014. Na abordagem quantitativa, a amostra foi obtida por meio do cálculo de amostra para proporção de uma população finita, resultando na representação de 69 gestantes. A fonte de informações se deu na consulta de prontuários e cartões das gestantes, os dados advindos da coleta dos documentos foram alimentados, tabulados e analisados com estatística descritiva pelo programa estatístico EpiinfoTM7. Para fase qualitativa, adotouse o critério de saturação para definir a quantidade expressiva do estudo, resultando em 29 entrevistadas, os materiais dessa técnica foram analisados conforme a análise de conteúdo do tipo categorial temática. O estudo foi aprovado pelo comitê de ética e pesquisa do Hospital Universitário Alcides Carneiro, CAAE nº: 25772813.3.0000.5182, parecer 869.561.Resultados: Os resultados mostraram que existem diversas lacunas que impedem que assistência à mulher no ciclo gravídico puerperal seja completa e de qualidade. Conclusão: Este estudo aponta a necessidade de mudanças organizacionais de modo que reflita na melhoria da qualidade a assistência. DESCRITORES: Acessibilidade. Assistência à mulher. Gestantes. INTRODUÇÃO A Estratégia de Saúde da Família emerge no cenário brasileiro não apenas como programa na atenção básica, mas estende-se para orientar e organizar a atenção, constituindo possibilidade de transformação do Sistema Único de Saúde. A equipe de Saúde da Família deve investir em ações abrangentes de promoção da saúde e prevenção de agravos, possuindo como eixos organizativos o trabalho em equipe, a adstrição de clientela, o estabelecimento de vínculos e a família como foco da atenção (BRASIL, 2012). Para a conquista de assistência, voltada às necessidades da população, é preciso a colaboração de todos os envolvidos nesse processo de trabalho. Assim, os trabalhadores de saúde, gestores, usuários e comunidade que estejam vinculados à Estratégia de Saúde da Família passam a ter corresponsabilidade pelo reconhecimento e adequação da oferta às reais necessidades, bem como a conquista de um sistema hierarquizado de assistência à atenção básica e de construção de novos saberes, resultando no estabelecimento e surgimento de novas práticas (COELHO; JORGE; ARAÚJO, 2010). Para tanto, Vieira (2010) coloca que numa política de saúde integral voltada a grupos específicos da sociedade, precisa-se considerar a totalidade do ser humano atentando para as dimensões física, mental, afetiva e espiritual como objeto do cuidado e práticas de saúde acumuladas e organizadas nas redes de serviços. Neste sentido, modelos assistenciais pautados na concepção ampliada de saúde, que foi a base do processo de proposição do Sistema Único de Saúde, consideram que o atendimento integral na linha de cuidado de Saúde da Mulher deve ser norteado pelas responsabilidades das ações de assistência ao pré-natal, incentivo ao parto natural e redução do número de cesáreas desnecessárias, diminuição da mortalidade materna, enfrentamento da violência contra a mulher, planejamento familiar, assistência ao climatério, atenção às mulheres negras e à população Lésbica, Gays, Bissexuais e Transexuais (BRASIL, 2013). No tocante a atenção pré-natal, percebe-se que para uma assistência de qualidade deve contar com avaliação pré-concepcional, planejamento familiar, ações de promoção da saúde com atividades educativas que promovam o parto normal, aleitamento materno e cuidados com recém-nascido, além de fácil acesso às consultas e de ações de prevenção da saúde, com consultas médicas e de enfermagem que possam identificar possíveis complicações e iniciar tratamento oportuno (BRASIL, 2012). Neto et al (2012) mostram a importância do cuidado e intervenções de saúde no ciclo gravídico-puerperal, pois contribuem para diminuição do risco de complicações e óbitos da mulher e criança, além da redução de fatores de risco de mortalidade, como o baixo peso ao nascer e prematuridade. Embora o acesso ao pré-natal alcance praticamente toda a população, a qualidade desse atendimento ainda é insatisfatória visto que atividades educativas em saúde não abordam as necessidades reprodutivas e sexuais das mulheres e homens, a rede de serviços de apoio diagnóstico para realização de exames preconizados durante a gravidez não contemplam as necessidades dos municípios, além de existir em diversas localidades a peregrinação da mulher para encontrar um estabelecimento de saúde no momento de atenção ao parto e nascimento (ALVES, 2011). Ademais as mulheres estão expostas a estabelecimentos que não proporcionam práticas baseadas em evidências cientificas. O estabelecimento de parâmetros possibilita adoção de critérios claros de avaliação nos serviços de saúde pública, principalmente no que se refere à assistência pré-natal na atenção básica articulada à média e alta complexidade, tanto ambulatorial quanto hospitalar, visando oferecer uma atenção de qualidade (NETO et al, 2012). Estudos avaliativos compõem uma estratégia necessária para direcionar ou redirecionar a execução de ações e atividades, colaborando para a tomada de novas decisões e melhoria da qualidade do processo assistencial (VILARINHO; NOGUEIRA; NAGAHAMA, 2012). É notória a relação entre os aspectos da população em termos de necessidades, de ações de saúde e de proposta de meios para a operacionalização. Essa ideia perpassa as barreiras quantitativas da avaliação, contudo, revela que o simples fato de ter a disponibilidade dos recursos em um dado espaço e momento, não garante a sua inteira aplicação (STARFIELD, 2002). Nesta direção, o termo acessibilidade traduz a possibilidade de que as pessoas cheguem aos serviços, tornando-se necessária desde o primeiro contato com o sistema sempre que o usuário busca atenção à saúde (SOUZA, 2008). Essa realidade não é determinada apenas na atenção básica, mas em todos os graus de complexidade visto que os mesmos devem estar acessíveis, mesmo que certos aspectos da acessibilidade na atenção básica diferem das demais, uma vez que é o ponto de entrada para os serviços de saúde. Neste sentido, entende-se que a acessibilidade aos serviços de saúde deve contemplar tanto as características do serviço, no que diz respeito à oferta de atendimento em horários compatíveis, disponibilidade de profissionais preparados, acolhimento, adequação às condições do usuário em relação ao local que reside, sua disponibilidade de tempo, poder aquisitivo, hábitos e costumes e a relação entre eles (CARVALHO, et al., 2008). Além de priorizar as gestantes nas filas, proporcionar acesso às atividades de educação e informação em saúde (FEKETE, 1997). No que tange a dimensão organizacional da acessibilidade, nota-se que a mesma é evidenciada em falhas com a demora em realização de uma consulta, tipo de marcação de horário, turnos de funcionamento, dentre outras instâncias de origem organizacional dos recursos de assistência à saúde. Essa perspectiva pode demandar inicialmente na entrada e sequencialmente no interior da unidade de saúde, lembrando que devem ser considerados os obstáculos que surgem no processo assistencial, já que tem com princípio a referência e contra-referência (FEKETE, 1997). Amparado pelos aspectos acerca da atenção à mulher apresentados, torna-se imprescindível o desenvolvimento de estudos que analisem a oferta de serviço com foco nas diferentes dimensões da acessibilidade. Dessa forma, contribui-se para reflexão e compreensão dos entraves para assistência, indicando caminhos para construção de serviços de saúde resolutivos e de qualidade. OBJETIVO Analisar a dimensão organizacional da acessibilidade na atenção à saúde no ciclo gravídico e puerperal. METODOLOGIA Trata-se de um estudo exploratório e descritivo com abordagem quantitativaqualitativa, elaborado a partir de um recorte do projeto de pesquisa intitulado Acessibilidade ao serviço no ciclo gravídico puerperal: uma avaliação da atenção à mulher na atenção básica, vinculado ao Programa de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde) articulado ao Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde (PET-Saúde), da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) 2012 e 2013, conforme previsto no Edital nº 24 de 15 de dezembro de 2011 do Ministério da Saúde, por intermédio da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES). O estudo foi realizado no município de Lagoa Seca-PB, em duas unidades da Estratégia de Saúde da Família contempladas com equipes do PRÓ/PET Saúde. Participaram do estudo mulheres que nos anos de 2012, 2013 a maio de 2014 estiveram/estavam em período gravídico ou puerperal e que realizaram pré-natal nas unidades participantes do estudo não havendo limitação de idade, cor/raça ou deficiência física permanente ou transitória. O critério de exclusão adotado nesse estudo foi à residência incompatível com a área de abrangência das Unidades de Saúde da Família-USF selecionadas. O universo considerou um levantamento de gestantes a partir dos registros de cada USF, no recorte temporal adotado, resultando em: 227 gestantes. A estratégia escolhida para sistematizar o estudo foi a de triangulação concomitante. Os métodos utilizados foram: análise documental e entrevista semiestruturada. Na fase documental, utilizou-se prontuários e/ou fichas e os cartões de gestante das mulheres pesquisadas. O instrumento de coleta foi adaptado do formulário de Barbatesfano (2009) considerando a Ficha Perinatal (BRASIL, 2012; SÃO PAULO, 2007), cartão da gestante (BRASIL, 2010) e indicadores estratégicos para a Rede Cegonha. O mesmo possui questões avaliativas de acessibilidade para assistência prénatal. Para compor a amostra da fase quantitativa, calculou-se tomando como base a fórmula de determinação do tamanho mínimo de amostra para proporção de uma população finita, adotou-se nível de confiança de 95% e margem de erro de 2%. O qual proporcionou a seleção por sorteio de 69 mulheres, que concordaram em participar da pesquisa, e com consentimento disponibilizaram seus prontuários e cartões das gestantes para fonte deste estudo. Quanto aos cartões, 9 delas não possuíam e relataram haver perdido. Os dados advindos da coleta dos documentos alimentaram banco de dados divididos por fonte (prontuário e cartão), realizados no programa estatístico Epiinfo TM7. Após a digitação, foram revisados e tabulados. Para análise adotou-se a estatística descritiva, compondo variáveis para avaliação da acessibilidade (Nº de consultas, procedimentos do atendimento, exames realizados, assistência puerperal). Na realização das entrevistas, que se deu no período de (outubro a dezembro de 2014), as pesquisadoras se deslocaram para as residências das participantes, possuindo como guia um roteiro, composto por questionamentos abertos sobre a acessibilidade nos serviços de saúde. As entrevistas foram realizadas nos domicílios das participantes, totalizando 29, obedecendo a avaliação de saturação, utilizou-se aparelho de mp3 para gravá-las. O tempo de duração média foi de 10 minutos e trinta e quatro segundos. Os diálogos foram transcritos e organizados, e analisados conforme a análise de conteúdo do tipo categorial temática. O projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Universitário Alcides Carneiro, onde foi aprovado com o CAAE nº CAAE: 25772813.3.0000.5182, parecer 869.561. A privacidade das participantes foi priorizada durante a coleta, tabulação dos dados e exposição das entrevistas, preservando anonimato e o sigilo dos dados, escolheu-se nomes de pedras preciosas para representar as entrevistadas. RESULTADO Diante os achados nas fontes de coleta, estruturou-se o resultado representando a dimensão organizacional da acessibilidade. Inicia-se com a abordagem quantitativa caracterizando a assistência pré-natal e segue-se com o tratamento qualitativo com os dizeres das mulheres sobre a (des)organização do serviço como fator prejudicial à assistência. Características da assistência pré-natal Para caracterização do atendimento pré-natal prestado adotou-se as seguintes variáveis, conforme padrões estabelecidos pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2011): número de consultas, número de consultas por profissional, inicio do pré-natal, procedimentos de rotina (aferição de PA, dados antropométricos, vacinação, inspeção de mamas, realização de exame ginecológico, participação consulta odontológica), exames realizados (primeira solicitação e repetições) e consulta puerperal. Referente à quantidade de consultas realizadas durante o pré-natal, nota-se predomínio de mais de 6 consultas (58,33% cartão 57,97% prontuário), iniciadas no primeiro trimestre (76,67% cartão 68,15% prontuário). Tal achado indica a possibilidade da gestante receber cuidados preventivos e de promoção da saúde durante as consultas (MARTINELI, et al., 2014). Quanto ao início da assistência, a captação precoce das mulheres é de suma importância, pois propicia uma estimativa da idade gestacional mais fidedigna, com melhor acompanhamento do crescimento fetal e permite acesso a diagnósticos e terapias para diversas patologias com repercussões graves para a saúde da mulher e do bebê, como, por exemplo, anemia, infecção pela sífilis e pelo HIV, hipertensão arterial crônica e diabetes (PEREIRA; GUIMARÃES; LANZA, 2013). Em relação ao número de consultas realizadas por profissionais, percebe-se que a maior parte foi realizada por enfermeiras. Identifica-se que parte das mulheres não teve consulta com o profissional médico durante o período de realização do pré-natal (48,33% cartão, 48,28% prontuário). Contudo, o Ministério da Saúde propõe que para uma boa assistência as gestantes, deve-se realizar as consultas de pré-natal intercaladas por enfermeira e médico (BRASIL, 2012). Uma consulta de enfermagem não substitui uma consulta médica e vice-versa, portanto, é de suma importância o acompanhamento pelos dois profissionais. No que concerne às atividades prestadas na assistência pré-natal, nota-se que os procedimentos de aferição de PA, dados antropométricos e vacinas foram os mais registrados (com preenchimento no cartão de 93,33, 78,33 e 81,67, respectivamente e preenchimento no prontuário de 86,96%, 76,81 e 73,91). Se opondo, os dados sobre a inspeção das mamas, realização de exame ginecológico e participação de consultas odontológicas (preenchimento do cartão 35,00, 13,33, 18,33, respectivamente e com preenchimento no prontuário, de 40,58%, 27,54% e 14,49%) indicando pouca realização. Santos Neto et al (2012) justificam achados semelhantes com o fato de profissionais de nível técnico terem na formação uma visão mecanizada, que reflete no seu exercício em atividades sem pautas em princípios tais como integralidade, humanização e assistam os usuários numa prática reduzida a realizar tarefas. Possivelmente, deve-se a isso a regularidade na realização de tais procedimentos. De acordo com Pereira; Guimarães e Langa (2013) é perceptível os registros negligenciados durante todo o período de assistência do pré-natal, aonde surge a dúvida se os campos deixados em branco sugerem a ausência de sua realização ou a falta de evolução pelo profissional. Em seu estudo, os autores destacam o exame ginecológico e inspeção de mamas como os procedimentos mais negligenciados, o que indica que essas práticas apresentam dificuldades em serem incorporadas à rotina do pré-natal, sejam pelo tempo de consulta que demanda para a sua realização ou pela habilidade que é exigida do profissional. Sobre os exames, verifica-se que nas primeiras solicitações os cartões possuíam maior percentual de registros do que os prontuários. Referente ao tipo, nota-se menores percentuais de registro para Beta HCG (66,67% cartão 2,90% prontuário,), sorologias de toxoplasmose (56,67% cartão 52,17% prontuário) e hepatite B (65,00% cartão 53,62% prontuário). Encontrou-se poucos registros referentes à realização de TTOG (1,67%), parasitológicos de fezes (1,67%), ureia/creatinina (1,67%) e sorologia para rubéola (3,33%). Nas repetições dos exames (terceiro trimestre), percebeu-se que o percentual de realização e consequentemente registros são inferiores, quando comparados aos de primeira solicitação. Os exames com maior frequência foram ABO/Rh e Anti HIV com percentuais acima de 80%, nos outros tipos têm-se valores abaixo de 30%, evidenciando-se as sorologias para toxoplasmose inferior a 10%. De acordo com os achados de Duarte e Mamede (2013) o planejamento assistencial municipal é essencial para alcance dos exames do pré-natal por todas as gestantes, os autores explicam que a disposição de laboratório municipal, agendamento organizado perante fluxograma com comunicação entre os níveis de atenção, possibilitam a realização dos exames com rapidez. Ademais, os achados de realização das sorologias, essencial para o sucesso da triagem durante o pré-natal, compõe os desafios a ser enfrentado no serviço. Carellos, Andrade e Aguiar (2008) colocam que a não-repetição dos exames aumenta o risco do nascimento de crianças infectadas porque se perde a oportunidade de identificar a infecção aguda na gestante. Tais motivações para a baixa realização dos exames devem ser melhor analisados no cenário investigado. Em relação à assistência domiciliar puerperal, registrados nos prontuários, verificou-se a falta de anotações (não informado=55,07%) e pouca realização (realizadas = 27,54%). Nota-se que todas as visitas foram realizadas por enfermeiras (27,54%). Brasil (2012) recomenda que se deve realizar visita domiciliar na primeira semana após a alta da criança. Neste estudo, considerando as consultas puerperais realizadas, encontra-se uma barreira, que precisa ser revisada na assistência pelo serviço, expressa em percentual baixo dos profissionais das USF que realizarão consulta domiciliar puerperal. Indo ao encontro aos achados de Hass, Teixera e Beghetto (2013), que relataram poucas visitas e as que foram realizadas perceberam que eram mulheres de alto risco. Diante a análise do cartão da gestante e prontuários percebe-se a existência de lacunas na assistência pré-natal nas unidades estudadas, evidenciada pela falta de registros em todas as variáveis coletadas nesta pesquisa, em ambos instrumentos. Corroborando outros estudos visualiza-se diferenças entre as anotações de documentos por parte dos profissionais. Tais achados, refletem na qualidade da assistência prestada nos serviços de saúde, uma vez que, os registros nesses documentos mostram os procedimentos realizados na consulta, porém é comum o sub-registro (PEREIRA; GUIMARÃES; LANZA, 2013). Dizeres das mulheres sobre a (des)organização do serviço como fator prejudicial à assistência. Sabe-se o quão relevante é a assistência perinatal para que o desfecho da gestação seja favorável ao binômio mãe-bebê. Nesta perspectiva, é necessário que todas as gestantes tenham fácil acesso no que concerne às ações de promoção e prevenção da saúde no período gestacional, a ponto que a assistência seja contínua e possa intervir consideravelmente no manejo de possíveis problemas. Neste sentido, a acessibilidade organizacional está relacionada às facilidades oferecidas pelo serviço, que favorecem o atendimento dos usuários (CLEMENTINO, MIRANDA, 2010). Quando existem obstáculos, referem-se à demora em obter consulta, tipo de marcação de horário, tempo de espera por atendimento e /ou para fazer exames laboratoriais (FEKETE,1997). Neste sentido, todas as mulheres relataram aspectos positivos acerca da assistência recebida e de ter um fácil acesso às consultas: Sempre fui bem atendida (Amazonita). Sempre tem bom atendimento, nunca deixei de ser atendida (Topázio). Adorei, fui bem atendida (Zircão). Não, não tenho do que reclamar (Turmalina). A facilidade de acesso às consultas pré-natal está atrelada a avaliações positivas das usuárias em relação aos atendimentos nos serviços de saúde (CORREA; BONADIO; TSUNECHIRO, 2011). No entanto, uma pequena amostra das mulheres identifica uma barreira organizacional no tempo de espera para as consultas, ratificando o estudo de Carneiro (2012): A gente espera muito, tá entendendo? Chega cedo e demora para ser atendida (Ambar). Assim custa demais pra elas chegarem. Eles chegam de 08h30min-9h, aí a pessoa sai de casa logo cedo e elas demoram pra começar o atendimento (Cristal). O ruim é só o horário de lá, que pede pra chegar cedo e demora a atender (Zircão). O horário que é custoso porque a pessoa demora muito (Turmalina). Líberaet al (2011) encontraram em seu estudo o tempo de espera para as consultas, como uma característica marcante na assistência pré-natal, a longa espera para as mulheres serem atendidas causam cansaço, estresse e sensação de fome nas mulheres enquanto aguardam ser chamadas. Isto indica que muitas vezes os serviços estão estruturados e organizados para atender suas próprias necessidades, estabelecendo horários de chegada, que sejam mais adequados para o trabalho dos profissionais sem se preocuparem com as necessidades dos usuários e com os compromissos que essas mulheres têm na vida fora da USF (VASCONCELLOS; CHAGAS, 2013). Identificam-se em algumas falas a dificuldade que as gestantes encontram para marcarem as ultrassonografias (USG) passadas pelos profissionais durante o pré-natal: Você deixa um exame aqui pra marcar e tem menino e eles só vem dar depois (Seda). Pois quando foi para marcar tem que ir na secretaria, né? Ai eles não marcaram (Pirita). Demora marcar (Dolomita). Não gosto de pedir nada pelo SUS não, acho que demora (Citrino). Bati as todas as USG, consegui nenhuma pelo SUS (Rubi). Depreende-se destes depoimentos que o atual modelo de assistência pré-natal tem adicionado altos custos relacionados à inclusão de tecnologias (exames laboratoriais e de imagem), sem que estes apresentem impacto na redução da mortalidade maternoinfantil (OLIVEIRA NETO, 2009). A OMS recomenda que a assistência pré-natal deve ser baseada no uso de tecnologias apropriadas, não se justifica usar exames de imagem altamente tecnológicos quando métodos e procedimentos mais simples podem ser mais eficazes, como um exame físico e obstétrico bem feito (BRASIL, 2012). Cabe aos profissionais orientar as usuárias sobre a USG, solicitar quando for necessário e informar que só deve fazer o exame, se isso não se tornar em uma dificuldade financeira no orçamento. Em relação ao atendimento no parto, a maioria falou que teve um bom atendimento e que conseguiu ter o bebê sem maiores problemas: O atendimento foi bom (Cianita). Fui bem atendida lá (Topázio). Foi tudo muito bom, Jesus colocou uma enfermeira abençoada que me ajudou muito (Turmalina). Mas eu fui bem atendida, tanto na primeira consulta que faz logo quanto lá em cima também (Calcita). O atendimento foi bom, tudo que uma mulher deveria ter no parto eu tive, bebe normal, parto normal (Jade). Recebi toda assistência, não tenho o que reclamar de lá não, achei muito bom lá mesmo (Pérola). Queiroz et al. (2007) relata satisfação de 74% das usuárias em relação a assistência recebida no momento do parto. O que esta associado com as características dos profissionais que atendem bem e conseguem alcançar bons desfechos perinatais. Porém, determinados relatos das mulheres revelam a peregrinação em busca de uma maternidade, o que reflete uma barreira organizacional: Eu fui direto pra maternidade aí não tinha vaga, né? Porque lá tava cheio, aí eles botaram eu pra [hospital], mas demorou um pouquinho lá, né? Se eu não tivesse corrido mais depressa, eu tinha ganhado no meio do caminho, só é ruim por isso, né? (Dolomita). Era pra eu ganhar no [hospital], mas não consegui ser atendida e fui pra [Outro serviço] (Ágata). A peregrinação de mulheres em procura de uma a maternidade em trabalho de parto, esta relacionada à desvinculação entre a assistência pré-natal e a do parto. Fato que se agrava por este momento demandar intervenções de modo a prevenir morte materna (GUERREIRO; SILVEIRA; LUCENA, 2012). As USF durante as consultas devem realizar vinculação das gestantes para à maternidade de referência no momento do parto, esta vinculação inclui a mulher conhecer o local do parto e ter a garantia de vaga sempre (BRASIL, 2011). Neste estudo duas mulheres entrevistadas referiram peregrinar em busca de uma maternidade para parir, conseguindo na segunda tentativa. Os achados divergemde Cunha et al (2010) ao referirque 26% das mulheres peregrinaram em busca de uma maternidade para parir, passando por várias até conseguir vaga para ter o bebê. Outra usuária referiu um desarranjo organizacional na gestão de leitos na maternidade: O problema foi lá porque ela nasceu na recepção da Maternidade, aí eu fiquei no sofá lá porque não tinha cama, ai depois me colocaram numa sala que meu Deus do céu, nunca tinha visto uma coisa daquela, uma falta de higiene uma sujeira. Umas 3h depois que subi pra enfermaria (Citrino). Queiroz et al. (2007) em seu estudo conclui que a demora/e ou dificuldade nos atendimentos da maternidade causa uma insatisfação das usuárias em relação aos serviços. Observa-se que muitas usuárias não referiram ações de promoção e prevenção da saúde e ações educativas no período gestacional. Isso pode estar relacionado à assistência profissional visando apenas o desenvolvimento fetal ou ao entendimento destas usuárias sobre o pré-natal. Contudo, uma atenção pré-natal qualificada se dá por meio de ações de promoção e prevenção da saúde com atividades de educação em saúde, que busquem o bem-estar da mulher e o bom desenvolvimento gestacional (GUERREIRO; SILVEIRA; LUCENA, 2012) Os profissionais de saúde durante a assistência pré-natal devem ser educadores e compartilhar saberes, buscando desenvolver a autoconfiança da mulher para que ela viva a gestação, o parto e o puerpério (SOUZA; ROECKER; MARCON, 2011). Outro problema organizacional identificado foi a não realização de visita puerperal pelos profissionais, a maioria das usuárias entrevistadas disseram que não houve nenhuma visita domiciliar pelos profissionais que realizaram o pré-natal, grande parte das visitas foram realizadas por agentes comunitários de saúde. A visita puerperal é importante para orientar sobre amamentação, cuidados com o recém-nascido, avaliar interação da mãe com a criança, identificar situações de risco ou intercorrências e orientar o planejamento familiar (BRASIL, 2012). A não realização dessas visitas pode refletir um desarranjo na organização das equipes da USF, de modo que elas não encontram tempo para sair do espaço físico das unidades e ir à casa das usuárias. CONCLUSÃO Ações estratégicas, engajamento do acesso universal aos serviços de saúde, efetivação e superação de carências da oferta de atenção a diversas conjunturas que envolviam e ainda permeiam a saúde da mulher, especialmente de gestantes e puérperas, em todos os níveis de complexidade do sistema de saúde, são práticas articuladas por meio de programas sintetizados ao longo da história. Para tal, é indispensável a co-participação de todos os envolvidos nesse processo, incluindo gestores, profissionais e usuárias. O último mencionado, em especial, representa a fonte da adequação da oferta às reais necessidades de saúde. No tocante a atenção à saúde da mulher, adotar critérios que possibilitam a avaliação dos serviços oferecidos, em especial no tocante à assistência pré-natal na atenção básica articulada à média e alta complexidade, pretendendo qualificar o serviço. Relativo aos achados do cartão da gestante e do prontuário, é característico dos serviços avaliados, o predomínio de mais de 6 consultas, em que a maioria são iniciadas no primeiro trimestre, das quais são realizadas em maior parte pelas enfermeiras, sendo essas representantes das visitas puerperais. Ainda, sobre o registro, é predominante a questão da aferição de PA, dados antropométricos e vacinas. A discrepância das anotações entre cartão da gestante e prontuário é um fator destacável e importante, uma vez que, o registro da unidade, é característico pela ausência de informações que são relevantes e servem de fonte de coleta para uma assistência voltada a investigação e ainda, pelo fator legal que esses dados conferem. Diante das falas das participantes do estudo, infere-se que é necessário o cumprimento dos preceitos da acessibilidade, no tocante à dimensão organizacional. Questões que perpassam a responsabilidade da equipe, pela demora em obter consulta e tempo de espera, ausência de ações de promoção e prevenção da saúde e ações educativas no período gestacional e chegam à gestão com a dificuldade para marcação da ultrasonografia e peregrinação em busca de uma maternidade, evidenciando uma problemática de cunho multifatorial e de responsabilidade múltipla. Estratégias de adequação são necessárias. Para isso, o reconhecimento e a autoavaliação devem ser os pontos de partida para viabilizar as reais e mais urgentes necessidades, dentro dos limites das equipes e gestão para que as barreiras sejam minimizadas e objetivo principal seja alcançado, nesse contexto, ou seja, a atenção integral à saúde de gestantes e puérperas. REFERÊNCIAS ALVES, M. L. P. Adequação da atenção à Saúde da Mulher e da Criança no município do Paudalho segundo olhar da rede cegonha. Plano de Intervenção de Especialização em Gestão de Sistemas e Serviços em Saúde. 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