POR UMA POLÍTICA DE SEGURANÇA PARA O BRASIL
Não há necessidade humana tão básica quanto a segurança pessoal nem tão espontânea
como a liberdade de viver sem medo. Se não estivermos seguros em casa ou na rua, seja
sob ameaça de um Estado policialesco ou de um simples bandido, não seremos livres.
Edward Kennedy
Em todo o Brasil a polícia de hoje é a mesma de ontem. No Rio, os policiais dizem que
correm pela escada, enquanto os bandidos vão de elevador. Um veterano diz, avaliando
seus colegas, que 30% são bons, 40% não entendem nada de polícia, e 30% não querem
trabalhar. Enquanto isso, o secretário de segurança de São Paulo conta que seu sonho
dourado é “uma polícia reaparelhada, mais bem paga e preparada”. Revista Veja (1969)
A
IDEIA DE SEGURANÇA tem evoluído de forma constante desde o final da
Segunda Guerra Mundial. No princípio, foi a noção de segurança nacional:
liberdade de ingerência externa como obrigação do Estado que, focado na
própria sobrevivência, instrumentaliza o poder político e econômico, a diplomacia e a
projeção internacional do país.1 Depois veio o conceito de segurança pública, proteção
do cidadão e das instituições como função da polícia essencialmente. Mais recentemente, sob a influência das organizações do sistema ONU, despontou segurança humana, a
ideia de liberdade de viver sem medo (de pobreza, desigualdade, incapacidade estatal) e
ao abrigo de necessidades (fome, doenças, desastres naturais) que geram confrontos,
sofrimentos e desgraças.2
A vantagem do conceito de „segurança humana‟ é ele estar articulado ao princípio de desenvolvimento social, à ideia de que as mudanças na estrutura e na organização
da sociedade servem basicamente à realização de interesses e objetivos. Isso permite
entender processos e situações complexas como a “sensação de insegurança” ou o próprio medo não só como uma emoção desagradável, mas como um bem ou produto.
O medo é uma mercadoria valiosíssima para as empresas de mídia e os grupos políticos. A maior
parte das informações sobre criminalidade, por exemplo, vem da Administração Pública, depois
de passar por um filtro político, expressando a verdade a partir dos interesses de determinado
grupo. Caso recente do suposto resgate de Marcola e mais três líderes do “Primeiro Comando da
Capital”, de um presídio de segurança máxima de São Paulo. Quando a imprensa vendeu uma
1
2
Joseph J. Romm (1993). Defining national security: the non-military aspects. Council on Foreign Relations, p. 122.
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (1994). Human Development Report.
versão vazada por ex-integrantes da Secretaria da Segurança Pública, as pessoas ficaram com
medo, mas o certo é que foi tudo uma ação política, e que Marcola está terminando de cumprir a
sua pena; em 2016 ele sai da cadeia pela porta da frente, com a ficha em branco. 3
Ao mesmo tempo, na prática e em meio a conflitos cada vez mais destrutivos,
principalmente para a população, vai-se configurando uma moderna perspectiva de segurança, segundo a qual (1) o objetivo não é “vencer” nem “punir”, mas viabilizar o
controle dos conflitos pela sociedade; (2) não existem “inimigos” a eliminar, mas conflitos que põem em risco o desenvolvimento da sociedade e o bem-estar da população;
(3) é necessário usar o mínimo adequado de violência e maximizar os resultados promovendo a interação de múltiplos elementos; e (4) intervir com o máximo de cautela e
extrema paciência.
2
I.
Licitação versus política de segurança
Falta de segurança ou mesmo o aparente insucesso das práticas conhecidas para
lidar com violência e criminalidade não é, como muitas vezes se pensa, um “caso de
polícia”. O fato é que, à exceção da época em que nosso país foi peça do pérfido esquema de segurança nacional dos Estados Unidos, o Brasil jamais teve uma política
para lidar com problemas cada vez mais graves, de solução aparentemente impossível,
envolvidos em um processo de crescimento irrefreável dos investimentos públicos em
segurança.4 Situação agravada, por outro lado, pela postura de autoridades e especialistas diante de problemas como violência e criminalidade como problemas que podem ser
3
Cf. Roger Franchini apud Luciano Martins Costa (“O fato que não aconteceu”) e Mauro Malin (“A polícia e o motim do PCC em 2006”). In Observatório da Imprensa, (12 Mar. 2014) (texto condensado).
4
Vide Gráficos 1, 2 e 3 (dados: Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM/DATASUS; Censo 2010, IBGE;
Estadão (4 Nov. 2013); Sistema Integrado de Administração Financeira e Secretaria do Tesouro Nacional).
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entendidos e resolvidos, mas como “práticas sociais de ampla visibilidade”, passíveis de
serem manipuladas, “disseminadas politicamente” e transformadas em “argumento político” em confrontos eleitorais.5 Com isso, aos olhos das nossas elites políticas e intelectuais, problemas corriqueiros e recorrentes como crime e violência transformaram-se em
matéria-prima do processo de banalização do hediondo, degradante, homicida e abominável, mesmo assim admissível de vez que reflete “a vida como ela é” e “as coisas do
jeito como sempre foram”.
Consequentemente, e ao contrário do que se apregoa, o obstáculo não seria a
“excessiva tematização” dos problemas pela opinião pública, mas a inação dos governos, o descaso com políticas de segurança, qualquer que seja o conceito, preteridas em
favor de reformas dependentes de procedimentos licitatórios. Não admira, portanto, que
as taxas de homicídio (a referência mais comum para comparar diferentes países ou
localidades) tenham disparado de 11,7 homicídios por 100 mil habitantes (no final dos
anos 80) para 27,1 (no princípio do século). Desde então, estabilizaram-se em patamar
altíssimo (cerca de 40 mil-50 mil vítimas fatais por ano), cresceu ao mesmo tempo sem
parar a desigualdade das taxas entre estados e entre municípios. No mesmo período,
aumentaram os investimentos públicos, atingindo 61 bilhões de reais em 2012 (16% a
mais que no ano anterior).
Gráfico 1. Evolução da taxa de homicídio por 100 mil hab. (1980-2011)
30
25
20
15
10
5
0
1980
1985
1990
1995
2000
2002
2004
2006
5
2008
2010
2011
Doriam Borges (2013). As estatísticas de violência e a “profecia autocumprida do medo”. In Violência e segurança
pública (Guaracy Mingardi, org.), Ed. Fundação Perseu Abramo, p. 20.
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3
Gráfico 2. Evolução financeira dos investimentos em segurança pública. União, Estados e
Municípios (2000-2009)
Bilhões de $Reais
60
50
40
30
20
10
0
Valor nominal
Valor real (IPCA)
Gráfico 3. Taxa de homicídio por 100 mil hab. Unidades da Federação (2011)
Santa Catarina
São Paulo
Piauí
Rio G. do Sul
Roraima
Minas Gerais
Acre
Maranhão
Tocantins
Mato Grosso S.
Rio de Janeiro
Rondônia
Amapá
Paraná
Mato Grosso
Ceará
Rio G. do Norte
Distrito Federal
Sergipe
Amazonas
Goiás
Bahia
Pernambuco
Pará
Paraíba
Espírito Santo
Alagoas
4
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Na falta de uma política de segurança, somente a alta constante do gasto público
(e a consequente militarização das polícias) explica a estabilidade das taxas de homicídio e as impressionantes desigualdades regionais e locais. Não apenas no Brasil, mas
também nos Estados Unidos, onde a taxa de homicídio caiu substancialmente desde os
anos 90, porém continua sendo a maior no mundo desenvolvido. Nesse país o gatilho
para licitações bilionárias foram as “guerras” às drogas e ao terror: de 2002 a 2011, foram repassados 35 bilhões de dólares pelo governo federal para que estados e municípios comprassem equipamento bélico pesado e montassem forças paramilitares. Ao
mesmo tempo o Pentágono contribuía enviando às polícias do país inteiro kits de sobras
de guerra. Daí o número de missões paramilitares de polícia ter aumentado de 3 mil
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(1980) para 50 mil (hoje), acentuadamente em localidades com baixos índices de violência.
No município de Keene, estado de New Hampshire, de 1999 a 2012 ocorreram apenas 3 homicídios, mas assim mesmo a polícia gastou quase 300 mil dólares num BearCat [versão estadunidense do “Caveirão” carioca], que na prática só serve para patrulhar o “Festival da Abóbora” da
região. Em Fargo (Dakota do Norte), os problemas de segurança são maiores (média de dois homicídios por ano), o que justificou a aquisição de um blindado de transporte com metralhadora
giratória. Na maioria dos casos, as licitações não são feitas por necessidade, muito menos obedecendo a uma política de segurança clara e precisa, mas porque “ninguém quer ficar para trás”: na
diminuta Walpole (Massachusetts), por exemplo, um tenente admite que a polícia local investe
em equipamento militar somente para “estar em dia” com as grandes corporações.6
As convergências entre a situação americana e a brasileira quanto à “estabilização” das taxas de homicídios devem-se à inação do Poder Público que, diante da banalização da violência e da criminalidade, optar por investir cada vez mais na militarização
das polícias e transformar cidadãos em “inimigos do Estado”7. Ironicamente, as imensas
dificuldades de ambos os países com seus sistemas de segurança não lhes impede de
querer ensinar a outros povos a melhor maneira de lidar com os mesmos problemas.
Ocasião em que mostram saber o que é e como aplicar os recursos da Segurança Humana8 na reforma ou reconstrução dos setores de segurança (forças armadas, polícia, Justiça, presídios, aduanas, partidos políticos, órgãos legislativos) de países ou regiões vulneráveis, em transição ou pós-conflito, como Haiti, Kosovo e Serra Leoa.
Quando se trata de seus problemas internos de segurança esses mesmos países
fazem-se de rogados, recusam-se a admitir que precisam dos mesmos remédios.9 Limitam-se a fazer recomendações uns aos outros, geralmente na base das proverbiais avaliações do Conselho de Direitos Humanos da ONU, que, recentemente pediu ao governo
brasileiro que extinguisse a Polícia Militar, mesma solicitação feita pela Dinamarca.
Outros países denunciaram a existência de "esquadrões da morte" nas polícias brasileira
(Coreia do Sul), sugeriram que mais estados brasileiros organizem Unidades de Polícia
Pacificadora (Austrália), pediram a revisão dos programas de formação em direitos humanos para as forças de segurança (Espanha), garantias para o trabalho da Comissão da
6
Economist. Cops or soldiers? America‟s police have become too militarised (22 Mar. 2014).
John W. Whitehead. Paranoia, surveillance and military tactics: have we become enemies of the government? The
huffington Post (20 Fev. 2014).
8
OECD-DAC Handbook on Security System Reform - Supporting Security and Justice. Organization for Economic
Co-operation and Development, 2007.
9
“É dever do Brasil estar no Haiti, porque o Brasil é uma grande potência. Sendo uma grande potência, temos responsabilidade com os países latino-americanos”. Nelson Jobim, ministro da Defesa (5 Jun. 2008).
7
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5
Verdade (Paraguai, Argentina, França), e reestruturação urbana visando a Copa do
Mundo e os Jogos Olímpicos, contudo sem “deslocamentos e despejos” (Canadá).10
II.
Corrupção
O segundo fator determinante para a ausência ou fracasso das políticas de segu-
rança no mundo moderno é a corrupção, corretamente definida pelo presidente do Partido Republicano Brasileiro como “mal enraizado na administração pública”.11 Com efeito, como o genocídio, a tortura e o terrorismo, a corrupção é uma das formas delituosas
mais graves do mundo moderno, na maior parte das vezes perpetradas, instigadas e justificadas pelo Estado e seus agentes. Razão pela qual esses crimes de Estado são controversos e ainda superficialmente entendidos pela opinião pública e pelos estudiosos,
que frequentemente rotulam corrupção, por exemplo, como um “crime sem vítimas” em
que o único prejudicado é o Estado, o “inimigo comum” que merece ser saqueado.
Por isso se diz que, apesar de a corrupção ser moralmente inaceitável e prejudicial ao
indivíduo lesado, na prática suas consequências seriam absorvidas sem esforço ou dano para a
sociedade. Algo “explicado” por um antigo governador de São Paulo que, certa vez, pressionado
por delegados de polícia que clamavam por melhores vencimentos, disse à queima-roupa: “delegado não precisa de aumento, pois se dinheiro é problema tudo que tem a fazer é mostrar a
carteira funcional”. Com isso, além de não causar prejuízo, a corrupção na administração pública seria “funcional”, contribuindo para manter as coisas no lugar, dando “ao vencedor, as batatas”, aos perdedores as cascas, e a todos um meio de partilhar a pilhagem.
Essa explicação “racional” geralmente é corroborada pela certeza que “ninguém é santo”, que todos somos potencialmente corruptos, e que a corrupção está em todas as partes,
aguardando o momento de reduzir ao status de canalha desprezível mesmo o mais virtuoso dos
10
11
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/paises-da-onu-recomendam-a-abolicao-da-policia-militar-no-brasil
Marcos Pereira (11 nov. 2013). Contra a corrupção, http://www.prb10.org.br/noticias/contra-a-corrupcao.
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6
seres humanos. Como no caso da jovem aprovada em concurso público e nomeada para trabalhar em uma movimentada repartição tributária. Ainda vibrando com suas realizações pessoais,
ao receber o primeiro contracheque verificou que na sua conta bancária havia um salário e meio
a mais. Atônita, perguntou ao supervisor o que poderia ter acontecido e como fazer para devolver o dinheiro. Paternalmente, o chefe lhe disse que o dinheiro sim era dela e que poderia continuar recebendo tanto ou até mais se cumprisse determinadas "instruções superiores". “Esqueceu” de dizer, mas a moça logo ficou sabendo que todos se recusavam a cumprir as “instruções”
não só deixavam de receber depósitos extras como eram imediatamente transferidos para lugares distantes, perdidos no sertão brasileiro.
7
Corrupção é, de fato, crime “organizado”, rigorosamente hierárquico e autoritário. Não
ocorre só quando a ocasião se faz presente nem se restringe a “bandas podres” de “maus servidores” que agem apenas de vez em quando, “instigados” pela população mal intencionada. Corrupção permeia a polícia, o Judiciário e o Ministério Público, envolve políticos, partidos, empresas, intermediários e a população. É uma rede diabólica em que superiores dizem aos subordinados como e quando usar práticas corruptas e cometer abusos, estabelecendo quotas de participação em transações com dinheiro, informações, proteção política, decisões favoráveis, apoio
e consentimento.
Contrário ao que geralmente se admite, portanto, corrupção é uma terrível ameaça à ordem social e ao regime democrático. Prejudica a economia, inviabiliza o crescimento, a acumulação do capital e o investimento produtivo; promove desperdício, gastos extravagantes, suborno, tratamento preferencial, nepotismo, o rentismo e a evasão fiscal. Confunde o regime de livre
comércio em favor da especulação, lucros exorbitantes, contrabando, sonegação e fraude. Anula
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o planejamento debilitando a capacidade governamental de intervir construtivamente. Envilece
o comportamento econômico, transtorna a mobilidade social, os talentos individuais e a capacidade criativa da sociedade. Avacalha os padrões de moralidade e os modelos de conduta da
sociedade. Revigora-se mutuamente com a ineficiência do setor público, gerando desânimo em
relação ao trabalho duro e honesto, e desconfiança com o cidadão, um “inimigo” e causador de
problemas, justificando práticas corruptas e abusivas.12
Contudo, o legislativo é mesmo a esfera em que é mais elevado o grau de inconsciência
acerca dos efeitos malévolos da corrupção e das formas eficazes de combatê-los. No Brasil, em
particular, as políticas públicas de segurança carecem de padrões (normas, valores, e modelos de
conduta) simplesmente porque ainda não foi regulamentado o art. 23 da Constituição Federal,
que estabelece as atribuições concorrentes de União, Estados, Distrito Federal e Municípios. O
mesmo no que concerne o parágrafo 7º do art. 144 (“a lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de
suas atividades”). Não admira, assim, a constante ocorrência de conflitos de competência e a
criação de múltiplos ordenamentos para resolver os mesmos problemas.
Caso da Lei Anticorrupção, promulgada às pressas durante os protestos de rua de 2013,
e que pode ser interpretada de vinte e sete formas diferentes em cada Estado, e ter mais de cinco
mil interpretações dependendo do município. Como está a lei apodera as autoridades locais para, sob a alegação de má-conduta, autuar e acionar empresas, abrindo assim mais espaço para
usurpação de competências, abusos e práticas corruptas. Concebida com as melhores intenções,
a lei nº 12.846/13 tornou-se “uma receita para confusão", um deus-nos-acuda agravado pelo fato
da metade dos Estados não ter regulamentado sequer a Lei de Acesso a Informação (12.527/11),
e, pela absoluta alienação de bacharéis que acham o Judiciário plenamente capaz de resolver
dúvidas e “garantir a razoabilidade na incidência da lei”.13
Felizmente, na Controladoria Geral da União vigora visão mais realista focada no alinhamento das interpretações de estados e municípios, para evitar conflitos, controvérsias e incerteza jurídica. Malgrado suas deficiências, a Lei Anticorrupção quitou uma velha dívida brasileira com a comunidade internacional, modificando a ênfase convencional, restrita ao setor público e prejudicada pela diferenciação entre corrupção (que supõe “livre acordo” entre corruptor
e corrompido) e concussão (onde o acordo não é livre, mas resultado de um constrangimento).
Os próximos passos serão mudanças no modo de financiamento das campanhas políticas e no
próprio sistema de justiça, o qual atualmente promove impunidade ao demorar 15 a 20 anos
para prolatar sentenças em casos de corrupção.
12
Cf. Zengke He (2000). Corruption and anti-corruption in reform China. Communist and Post-Communist Studies,
33, pp. 243–270.
13
Pierpaolo Cruz Bottini e Igor Tamasauskas. Impressões sobre a Lei Anticorrupção. Folha de S. Paulo (29 Jan.
2014).
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8
Em muitos países também ainda imperam as redes de corrupção. Em alguns deles, com
normas e culturas milenares diferentes das nossas, existiam “metodologias” escusas parecidas às
brasileiras, exceto que o dinheiro não era, por exemplo, depositado na conta, mas posto na mesa
do “calouro”. Esses países já foram extremamente corruptos, mas agora estão no topo da lista
em matéria de transparência. Resultado de políticas eficazes, que podem ser adaptadas em toda
parte, a saber, medidas orientadas especificamente ao combate a:14

Corrupção sistêmica, enraizada, autossustentável, baseada em normas implementadas por terceiros e na superposição de cargos. Combatida mediante redução de meios à disposição dos “síndicos” de acordos escusos, e inoculando desconfiança nas redes de corrupção por meio de (a) infiltração de agentes em setores mais “vulneráveis”; (b) adoção de controles rigorosos e pesadas
sanções ao financiamento político ilegal e às fraudes contábeis por empresas;

Corrupção estrutural, alicerçada em reputações, normas de reciprocidade, cooperação condicionada, ameaças de “pular fora”. Enfrentada com desmontagem de circuitos de influência, encorajando deserção e diminuindo o horizonte das relações entre corruptos “ativos” e “passivos”, mediante (a) rodízio de funcionários em setores “vulneráveis”; (b) incentivo e proteção à denúncia
(e.g., redução das sanções e/ou participação em porcentagem dos recursos apreendidos);

Corrupção menor, fundamentada em confiança individual e regras genéricas de comportamento.
O objetivo aqui é recuperar a confiança dos cidadãos nas interações com servidores públicos (a)
empoderando e dando chance à cidadania de supervisionar processos de tomada de decisões do
Poder Público; (b) simplificando procedimentos e promovendo o reconhecimento dos padrões de
desempenho no serviço público; (c) promovendo competição entre repartições e agentes públicos; (d) estabelecendo controle efetivo e transparente das movimentações bancárias e do patrimônio dos agentes públicos; (e) fortalecendo iniciativas não-governamentais de controle da corrupção;

Corrupção individual, baseada em intermediação e vínculos de confiança entre corruptos. O objetivo é esclerosar os canais de comunicação entre os infratores e afetar suas relações de mútua
confiança implantando (a) acentuada assimetria de sanções em detrimento de quem inicia acordos; (b) sanções pesadas à intermediação e ao tráfico de influência.
III.
Jornadas Brasileiras de Segurança
Política de segurança pública no Brasil é, na opinião dos especialistas, um tema ainda
em construção, carente de um mínimo de concordância e conhecimento necessários para elaborar ações visando soluções viáveis e permanentes. Razão pela qual vicejam sobre o assunto posturas diferenciadas, geralmente antagônicas e virtualmente irreconciliáveis, sobre questões extremamente genéricas como “desmilitarização”, “descriminalização das drogas”, “diminuição da
idade penal”, “privatização dos presídios”, etc.
14
Cf. Alberto Vanucci (2011). The informal institutions of corruption. A typology of governance mechanisms and
anti-corruption policies. Departamento de Política e Ciências Sociais, Universidade de Pisa, Itália.
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9
O problema, no entanto, não é simplesmente formular políticas de segurança, mas consideravelmente mais simples e profundo, já dizia uma excepcionalmente bem-sucedida dirigente
britânica. A solução desse problema demanda “coragem política e vontade, convencer as pessoas que não podem confiar indefinidamente nos outros para resolver suas preocupações com
segurança, e sim que cada um deve assumir a sua parcela de responsabilidade”.15 O mesmo
quanto à discussão de questões “genéricas” ou de políticas de segurança destinadas ao fracasso
não por falta de massa crítica, mas porque os cidadãos nunca são ouvidos nem convidados a
participar.
Na formação de políticas públicas, o fator com maior potencial transformador é sem
dúvida o envolvimento da cidadania, razão pela qual deve-se trabalhar permanentemente na
perspectiva de práticas de governo responsivas. O que requer resgatar a experiência e o conhecimento de diferentes setores da sociedade, em particular das localidades, tendo em vista projetar soluções adequadas às necessidades concretas. No que diz respeito à segurança, em particular, novas abordagens são necessárias, de modo a incentivar a contribuição coletiva, reunindo o
setor público, o setor privado e a cidadania. As Jornadas Brasileiras de Segurança, iniciativa da
Fundação Republicana, foram projetadas precisamente nesse sentido, para ser instrumento de
trabalho privilegiado concentrado no equacionamento de problemas que ainda parecem estar
além da nossa capacidade de cooperação e entendimento.
10
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MAURO SILVA
Presidente
PEDRO SCURO NETO
Coordenador Nacional
Segurança e Desenvolvimento Social
15
Margaret Thatcher (20 set. 1988). “Discurso de Bruges”.
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