Dez anos sem Lúcio Lins
Poetas e amigos lembram legado literário do autor de
“Histórias Flutuantes”
Linaldo Guedes
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Poetas não morrem, poetas se encantam, dizem alguns. Dentro
dessa lógica, há dez anos o poeta Lúcio Lins se encantou para o
reino da palavra, onde o verbo se faz poesia. Falecido em 16 de
abril de 2005, de câncer, o poeta publicou os livros Lado que
cavo/que covas (1982), As lãs da insônia (1991), Perdidos
astrolábios (1999) e Histórias Flutuantes – 25 anos de poesia,
legado literário que o fez querido por amigos, leitores e
companheiros de papo e poesia.
Entre esses amigos, está o poeta Sérgio de Castro Pinto. Para ele,
a importância da poesia de Lúcio Lins no contexto da lírica
paraibana poderia ser ainda maior caso ele ainda estivesse vivo.
“Com efeito, foi a partir de "Perdidos astrolábios" que ele encontrou
a voz com que demarcou o seu próprio espaço com relação ao dos
poetas com os quais mantinha "afinidades eletivas". Foi-se ainda
jovem, mas a sua poesia permanece entre nós. É definitiva”,
comenta.
Sérgio, que também é professor da Universidade Federal da
Paraíba, costuma recitar poemas de Lúcio Lins em sala de aula. Ele
brinca e diz que conhece Lúcio Lins desde quando, em Macondo,
chegou o primeiro carregamento de gelo. “Desde quando, menino,
Bandeira teve o seu primeiro alumbramento: viu uma mulher nuinha
em pelo. Desde quando viajei aos seios de Duília. Conheço Lúcio
Lins desde tempos imemoriais”.
A presença física de Lúcio Lins já consistia num episódio
interessante, segundo Sérgio. Aliás, em texto que escreveu sobre
ele no livro "A Casa e seus arredores", destacou a condição de
causeur do seu querido amigo "Ainda hoje, vejo-me à frente de
Lúcio, ouvindo as suas frases de efeito, o seu humor agridoce,
como se estivesse diante dos camelôs bandeirianos, esses
'demiurgos de inutilidades' que '(...) ensinam no tumulto das ruas os
mitos heroicos da meninice.../ E dão aos homens que passam
preocupados ou tristes uma lição de infância'. Que falta nos faz o
'demiurgo de inutilidades' Lúcio Lins! 'Ah, mas os seus versos ainda
correm como rios perenes ao encontro do mar maior de sua poesia!
- dirão alguns. Ao que eu respondo: É verdade, mas para os da
minha geração, a ausência física de Lúcio lembra uma marchinha
antiga (...): 'zum, zum, zum, zum,zum, zum zum, tá faltando um!/
zum zum zum zum zum,zum, zum, tá faltando um!"
Já o poeta André Ricardo Aguiar afirma que Lúcio Lins trouxe para
a poesia uma musicalidade inteligente, um ritmo que não abria mão
da inventividade lúdica e também uma coerência temática. “O mar
sempre foi uma de suas paixões recorrentes. História flutuante
talvez seja um poema que melhor represente a poética do querido
autor”, destaca.
André conheceu o poeta quando estava cursando Letras na UFPB.
“A amizade veio de pronto, pois Lúcio era de um bom papo, de uma
capacidade irrequieta de puxar para o lado lúdico da realidade.
Frequentamos mesas de bares e tínhamos muitos amigos em
comum. Lúcio me mostrava poemas ainda em processo, me dava
dicas. A Praça da Alegria deveria levar seu nome. Foi seu melhor
escritório”. Segundo ele, Lúcio não parava quieto, não conseguia
durar muito tempo sentado no banco. “Sempre foi como onda de
praia, ia e vinha, ia e vinha”.
Já Ed Porto, também poeta, afirma que não sabe mensurar a
importância de Lúcio Lins para a literatura paraibana. “Sei que
muitos de seus poemas me tocavam. A temática do mar recorrente.
O cotidiano também”. A relação de Ed com Lúcio Lins era de
amizade sincera e com muito amor, de celebração da vida sempre
que se encontravam.
Ed conta um episódio interessante envolvendo Lúcio Lins: “Xisto,
Gustavo Moura e eu rabiscamos algo numa farra que depois foi
musicado por Xisto. Lúcio fez questão de participar da composição
fazendo uns versos. Condicionamos sua participação a uma petição
por escrito. E assim fez com sua verve humorística. A canção está
gravada num CD de Xisto Medeiros”.
Para o poeta e amigo Edônio Alves, a poesia de Lúcio Lins não era
senão o registro existencial da pessoa que ele era: imaginativa e
imagética. “Bem humorada, mas detentora de um humor que faz
pensar nas dobras assimétricas da existência; lírica, mas de um
lirismo cortante e denso; contida, mas de uma contenção medida
com o peso acumulado da experiência com a palavra", analisa.
Edônio faz uma bela definição da poesia e do estilo de Lúcio Lins:
“É que Lúcio Lins era poeta no sentido maior do termo, poeta da
vida e poeta do texto, a ponto de costumeiramente confundir a
todos nós que privavam da sua amizade no quando estava
poetando, no sentido literário; ou no quando estava fazendo poesia,
no sentido existencial. Nele uma dimensão sempre comportava a
outra (vida e poesia não se separavam), num processo visceral que
conduzia usufruindo de todos os seus elementos constitutivos e
essenciais”.
Lúcio Lins fez, também, parcerias musicais com fez parcerias com
Adeildo Vieira, Byaya, Chico César, Eleonora Falcone, Fuba e Zé
Wagner. Além de poeta, era bacharel em Direito, formado pelos
Institutos Paraibanos de Educação - IPÊ (atualmente UNIPÊ), 1989,
em João Pessoa.
(Matéria publicada no jornal A União, no dia 16 de abril de 2015
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