PENSAR ACADÊMICO ISSN 1808-6136 Publicação semestral da FACIG – Faculdade de Ciências Gerencias de Manhuaçu/MG Editor: Lima Deleon Martins Lívia Paula de Almeida Lamas Conselho Editorial: Aloísio Teixeira Garcia Rita de Cássia Martins de Oliveira Ventura Thales Reis Hannas Periodicidade: Semestral Indexação: Lantidex e Sumários.org Impressão Gráfica: Real Print, Manhuaçu- MG Tiragem: 100 exemplares Diretoria da FACIG: Presidente: Aloísio Teixeira Garcia Diretor Administrativo: Thales Reis Hannas Endereço para Correspondência, Informações e Envio de Trabalhos: Pensar Acadêmico Facig – Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu Av. 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Publicação Semestral da FACIG Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu Ano 3 Número 2 2º Semestre 2011 PENSAR ACADÊMICO ISSN 1808-6136 Revista de Ciências Gerencias da FACIG Ano 3 Número 2 2º Semestre 2011 Artigos p. 05 - As raízes do brasileiro – a cordialidade na obra de Sérgio Buarque de Holanda Amanda Dutra Hot p. 13 - Abordagem acerca da inclusão de um aluno autista no ensino regular Lidiane Hott de Fúcio Borges Hellen Cristine Prata de Oliveira Élida Tamara Prata de Oliveira Regina Coeli p. 23 - Análise dos processos de avaliação e certificação dos serviços de saúde no processamento de roupas, no procedimento de acreditação hospitalar pelos critérios da ONA: estudo de caso em um hospital filantrópico de médio porte Jaqueline Conceição Leite Mônica de Oliveira Costa Farana de Oliveira Mariano p. 35 - Breves apontamentos sobre o papel do direito de resistência na formação dos estados democráticos de direito Lívia Paula de Almeida Lamas p. 39 - Educação e desigualdades regionais: os impactos do Fundeb no Brasil Paulo Eduardo Frinhani p. 53 - Educação e novos saberes: a necessidade de uma nova visão sobre a África e os africanos Amanda Dutra Hot Germano Moreira Campos p. 63 - A questão habitacional em Manhuaçu e a garantia de direitos de cidadania: uma equação possível? Luciana Bosco e Silva Ruteléia Cândida de Souza Silva Roberto Vicente Silva de Abreu p. 73 - Cantiga de trabalho: força e resistência contra a severidade do sistema escravista no Brasil colônia Luiz Antônio Coutinho p. 79 - Mulheres chefes de família no Brasil colônia Sara Bruna Lopes de Souza j Hot (2011). AS RAÍZES DO BRASILEIRO – A CORDIALIDADE NA OBRA DE SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA Área temática: História Amanda Dutra Hot1 1 Mestre em História pela UFOP e professora no curso de História na Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu (FACIG). RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo analisar o conceito de homem cordial, presente na obra Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda. Pretende-se demonstrar como o conceito de homem cordial se desenvolveu e em que medida persiste na história da sociedade brasileira. Partindo da forma como a colonização do Brasil se deu e da consequente organização da política e da sociedade brasileira, impostas pelo nosso colonizador, demonstraremos que nossa atual configuração se deve a esta herança colonizadora. Palavras chave: cordialidade, identidade, colonização do Brasil. INTRODUÇÃO Nas palavras do professor Antônio Cândido, Raízes do Brasil é um livro que “nasceu clássico”1, pois fez uma interessante análise de nossa sociedade colonial. É uma obra que buscou nas características presentes nas sociedades ibéricas as origens para o paternalismo existente nas relações entre os habitantes da colônia brasileira. Raízes do Brasil introduz o conceito de homem cordial como um dos elementos da sociedade colonial. A cordialidade é apresentada a partir da sua relação com o processo de colonização portuguesa no Brasil e com um tipo de socialização rural e doméstica (AVELINO FILHO, 1990, p.5). O que nos interessa no presente trabalho é tentar mostrar o nascimento e desenvolvimento do conceito de homem cordial, desde a colonização portuguesa até uma realidade mais contemporânea, bem como o que caracteriza a cordialidade, até uma discussão do que poderia ser uma superação ou relativização deste conceito. Através deste estudo e das observações já citadas, buscaremos analisar em que medida a noção de homem cordial, em Raízes do Brasil, nos indica o caminho escolhido por Sérgio Buarque de Holanda para caracterizar uma identidade nacional, bem como a existência ou não de um “tipo próprio de cultura”. 1 2 Esta afirmação de Antônio Cândido pode ser encontrada em CÂNDIDO, Antônio. Prefácio. In: HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. RJ: José Olympio Editora, 1982. AS ORIGENS DO HOMEM CORDIAL A Europa do século XVI se caracterizou por uma rígida coesão social, privilégios hereditários e uma hierarquização na sociedade. Pode-se dizer que Portugal2 constituiu uma exceção a esta regra, desenvolvendo aquilo que Sérgio Buarque de Holanda denominou “cultura da personalidade”. Nas palavras de Holanda (1982) pela importância particular que atribuem ao valor próprio da pessoa humana, à autonomia de cada um dos homens em relação aos semelhantes no tempo e no espaço, devem os espanhóis e portugueses muito de sua originalidade nacional. Dessa forma, o isolamento que a Península Ibérica encontrou-se, faz com que os portugueses constituam-se por si mesmos, pelo esforço pessoal. A partir daí forma-se uma sociedade que permite grande mobilidade entre as camadas sociais, devido ao afrouxamento da estrutura social. Já não são mais tão rígidos os princípios Sérgio Buarque de Holanda se refere à Península Ibérica, mas trataremos mais detidamente de Portugal, por ter sido nosso principal colonizador. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 05-12, agosto-dezembro, 2011. Hot (2011). hereditários de nobreza, possibilitando a qualquer pessoa adquirir um título, bastando para tal, que a mesma tenha considerável riqueza. Além da mobilidade social trazida pelos portugueses, os mesmos, através de um processo de miscigenação, proporcionaram um enfraquecimento das regras familiares. Mesmo depois que os portugueses trouxeram suas mulheres e constituíram famílias, a miscigenação sexual é constante. As relações sexuais entre brancos e negras tornam-se frequentes e “aceitas” na colônia, contribuindo para a miscigenação brasileira e influenciando a constituição das relações paternalistas no Brasil. Até a religião, aparentemente inabalável, vê-se obrigada a adaptar-se à realidade da colônia. Os casamentos são menos frequentes, as festas religiosas perdem a respeitabilidade antes apresentada (PRADO JR.,1971, p.355). Embora Sérgio Buarque de Holanda não afirme a existência de uma hierarquia social no Brasil, podemos afirmar que a mesma existiu, mesmo sendo permeada por uma flexibilidade característica da colonização brasileira. A estratificação davase na medida em que havia um senhor, abastado, no topo da pirâmide social e os escravos, subordinados, em sua base. Voltando à colonização portuguesa, há que se ressaltar a característica do colonizador que aqui chegou para embasarmos o argumento de que o homem que se configurou nas terras brasileiras e persiste nos dias atuais (de alguma maneira) é o homem cordial. Segundo Holanda, os portugueses que aqui chegaram não se tratavam de homens com ocupações já determinadas e fixas em sua terra, mas sim de aventureiros. Ou seja, os homens que aceitaram a empreitada colonizadora vieram com a intenção de enriquecer em pouco tempo e obter títulos de nobreza3. Queriam enriquecer e desfrutar da fortuna em Portugal. Dessa 3 A este respeito ver também o trabalho HOT, Amanda Dutra. Muito dinheiro e pouca nobreza: estratégias de ascensão social dos negociantes no Brasil Colonial (Séculos XVII e XVIII), publicado nos Anais do II Memorial do ICHS, disponível em http://www.ichs.ufop.br/memorial/trab2/h531.pdf. forma nasce uma nova consciência, importando para esses homens o mérito e a virtude e não a nobreza adquirida pela família através dos tempos ou pela política de dom e contra dom com o rei. A característica principal deste tipo de mentalidade foi, segundo Sérgio Buarque de Holanda, o desenvolvimento extremado da “cultura da personalidade”, que se definiria pelo valor dado à autonomia do homem e à ausência de qualquer tipo de dependência; uma espécie de “individualismo radical” que produz uma situação de luta e competição constantes na busca da auto superação e acréscimo de prestígio pessoal (AVELINO FILHO, 1990, p.6). Essa mentalidade formará uma frágil organização portuguesa no Brasil, crítica constante de Sérgio Buarque de Holanda. Nas palavras do autor “em terras onde todos são barões não é possível acordo coletivo durável, a não ser por uma força exterior respeitável e temida” (HOLANDA, 1982, p.4). Para dar conta da mentalidade ibérica, Holanda elabora uma tipologia do “aventureiro” e do “trabalhador”. O aventureiro seria o colonizador português, pois para Holanda Essa exploração dos trópicos não se processou, em verdade por um empreendimento metódico e racional, não emanou de uma vontade construtora e enérgica, fez-se antes com desleixo e certo abandono (HOLANDA, 1982, p.12). Para comprovar tal argumento o autor relembra o caráter rural do empreendimento português que perdurou até bem pouco tempo atrás. A prática da exploração desenfreada e despreocupada em estabelecer raízes e uma estrutura foi denominada de semeadora. Até mesmo a forma irregular como a urbanização tardia constituiu-se alude a esse desleixo do colonizador português. “A ordem que aceita não é a que compõem os homens com trabalho, mas a que fazem com desleixo e certa liberdade; a ordem do semeador, não a do ladrilhador” (HOLANDA, 1982, p.82). A colonização espanhola é tida como a do ladrilhador, onde o trabalho, a organização e a urbanização mais ordenada fazem-se presentes. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 05-12, agosto-dezembro, 2011. Hot (2011). Através desta distinção Holanda constrói as bases de um personalismo aqui desenvolvido. Mesmo com a abolição da escravatura, em 1888, o rural predomina, sendo isto claramente percebido no âmbito familiar se projetando fora dele. Ou seja, os vínculos familiares extrapolam o mundo privado e se estendem ao mundo público. Isso é bastante perceptível nos “partidos políticos” da época, em que interesses individuais e familiares alcançam a política. Em relação a essa dicotomia rural/urbano, Buarque de Holanda alega serem dois mundos distintos que se hostilizavam com rancor crescente, duas mentalidades que se opunham como ao racional se opõe o tradicional, ao abstrato o corpóreo e o sensível, o citadino e cosmopolita ao regional ou paroquial. A presença de tais conflitos já parece denunciar a imaturidade do Brasil escravocrata para transformações que lhe alterassem profundamente a fisionomia (HOLANDA, 1982, p.46). A preponderância do rural sobre o urbano faz-se sentir quando, mesmo nas cidades, as famílias mantêm uma mentalidade especificamente ruralista, voltada ao crescimento pessoal, aos interesses individuais. Mas este certo individualismo não excluía as relações de solidariedade. Nesta sociedade as relações desenvolviam-se em círculos restritos de amigos e parentes; “(...) a solidariedade, entre eles existe somente onde há vinculação de sentimentos mais do que relações de interesse- no recinto doméstico ou entre amigos” (HOLANDA. 1982, p.10). As pessoas que vivem nessa sociedade não se relacionam com outras pessoas para ascender socialmente ou adquirir qualquer vantagem ou lucro. Os relacionamentos se baseavam mais no sentimento, no afeto e não em princípios racionais. As relações sociais que surgem a partir daí são baseadas no afeto, na emoção e nos sentimentos vindos do coração. O paternalismo nasce desse preceito onde a emoção está acima da razão. Serão, então, os sentimentos (bons ou maus) a estruturarem as relações estabelecidas no Brasil colonial. Os elementos até aqui citados ocasionarão o nascimento do polêmico “homem cordial” de Sérgio Buarque de Holanda. O HOMEM CORDIAL A cordialidade construída na obra de Sérgio Buarque de Holanda pretendia definir a identidade brasileira que resultou da colonização portuguesa. O homem cordial pode ser definido como aquele que constrói todas as suas relações sociais por meio da afetividade, renegando sempre os princípios da razão. Como bem afirmou Maria Odila Leite da Silva Dias4, a cordialidade a que Sérgio Buarque faz referência diz respeito à dificuldade de institucionalização que o brasileiro possui, consequência das relações estreitas de sociabilidade que carregamos desde os tempos coloniais. No Brasil colônia a cordialidade se faz presente a todo o momento a partir das relações estabelecidas entre o “homem da casa”, o patriarca, com os demais membros da família, da criadagem e do círculo de convívio (amigos, agregados). Dessa forma, a família pode ser considerada uma unidade movida pelo afeto e pela lógica do interesse recíproco. Se, por exemplo, determinado fazendeiro fizesse algum tipo de favor a outro, o último sentia-se impelido a retribuir. Em outro exemplo, se se pretendia fazer algum negócio com determinada pessoa, importava muito se a mesma era do convívio do interessado e, se não fosse, dificilmente conseguiria fazer tal negócio. Já no âmbito mais restrito da família e dos escravos da mesma, as relações também estreitavam-se devido ao contato do senhor com seu escravo e deste com outros membros da família. Muitos escravos trabalharam dentro da casa dos senhores, criando seus filhos, acompanhando a esposa do senhor, enfim perpassando por toda a esfera familiar. Gilberto Freyre5 nos mostra isso bem claramente em Casa-Grande e Senzala, ao perscrutar a influência do escravo negro na formação da família brasileira. Ora, de alguma forma temos que 4 Cf. entrevista dada por Maria Odila Leite da Silva Dias à Revista IHU ONLINE, disponível no site http://www.unisinos.br 5 FREYRE, Gilberto. Casa-Grande e Senzala. SP: Global, 2004. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 05-12, agosto-dezembro, 2011. Hot (2011). concordar com Freyre, pois se as relações eram tão estreitas, daí a cordialidade pode ter resultado. Segundo Holanda, a cordialidade era clara nas relações entre senhor e escravo. A mentalidade predominante era a de que o senhor oferece comida e proteção ao escravo, e este deve cumprir seus deveres com o seu senhor, pois se não o fizesse ele estaria traindo a “confiança” depositada pelo senhor, e não, como nossa mentalidade capitalista atual nos impele a pensar, quebrando um processo produtivo. É importante ressaltar que a cordialidade não implica, necessariamente, a prática de boas maneiras ou gostar de uma pessoa. Muito pelo contrário, a cordialidade se caracteriza pela falta de racionalização das ações, sempre motivadas pelos sentimentos, sendo eles bons ou maus. Segundo Sérgio Buarque de Holanda “a inimizade bem pode ser tão cordial como a amizade, nisto que uma e outra nascem do coração, procedem, assim, da esfera do íntimo, da família, do privado” (HOLANDA, 1982, p.107). Outro aspecto merece destaque no que tange à ausência da racionalização também na religião. O homem cordial rejeita os formalismos e ritualismos da religião, por isso cria uma espécie de humanização e aproximação com a religião nomeando os santos, em sua maioria, no diminutivo. Dessa forma, busca-se uma intimidade maior com a religião, diminuindo as distâncias que as demais nações criaram por respeito à mesma. Por essa razão alguns viajantes que por aqui passaram afirmaram que a religião no Brasil chegava à irreverência até mesmo naquilo em que a religião católica tinha de mais respeitável6. Com a decadência da economia agrícola e a crescente urbanização, as elites tendem a transferir-se para as cidades. Os cargos públicos são agora ocupados por uma mentalidade substancialmente rural e personalista. A cordialidade, antes restrita a esfera privada, começa a ocupar a esfera pública; e nessa “invasão” do privado no público a ideia do cordial permanece. 6 Este aspecto relatado por alguns viajantes pode ser encontrado em LEITE, Miriam Moreira. A condição feminina no RJ do século XIX. SP: Hucitec; Brasília: INL, 1984. O Estado, que com a urbanização vê sua chance de se afirmar como um órgão democrático, não consegue fazê-lo já que ainda representa uma ampliação da esfera doméstica. Dessa forma a urbanização não trouxe mudanças suficientes para a consolidação do Estado democrático; o mesmo só se formará solidamente quando o âmbito familiar for superado. O Estado é um espaço que não admite a ordem familiar. O mesmo surge com a superação da família, tornando todos os indivíduos cidadãos comuns, contribuintes e eleitores que têm seus direitos e seus deveres perante o Estado. É a partir daí que vemos o geral triunfar sobre o individual. As sociedades ditas “mais desenvolvidas”, como a europeia, por exemplo, passaram por esse processo, em que não há mais uma intimidade e subjetividade no trato com os demais. O capitalismo e as leis do Estado é que regem a sociedade, a economia e a política. No Brasil estes princípios do Estado Moderno apareceram mais tardiamente, e mesmo assim não abandonam a cordialidade. O funcionalismo e os políticos brasileiros até bem pouco tempo atrás carregavam muito da cordialidade, o estado impessoal ainda procurava atender seus próprios interesses e dos grupos que os apoiam em vez de pensar no coletivo. Ainda hoje a política brasileira carrega estes traços de interesses próprios e de grupos afins. O nepotismo, ainda que proibido, é uma prática constante e a corrupção chegou a um ponto de ser vista com normalidade. Maria Odila Dias, quando perguntada se existiria um homem cordial contemporâneo, afirmou ser o mesmo, hoje, representado pela corrupção na política brasileira. Assim, o homem cordial, que teve suas origens há mais de cinco séculos, contrário à polidez e bem distante da civilidade, segundo Sérgio Buarque de Holanda, tende a enfraquecer-se. O autor afirma, ainda, que a cordialidade não se apresenta como algo fixo, imóvel e imutável, podendo ser modificada de acordo com as circunstâncias históricas. A INFLUÊNCIA DA CORDIALIDADE NA POLÍTICA BRASILEIRA Tendo em vista a construção do conceito de cordialidade aqui feita, desde o seu nascimento no Brasil colonial até os dias Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 05-12, agosto-dezembro, 2011. Hot (2011). atuais, é possível levantarmos mais uma questão: o quanto a sociedade brasileira, e especialmente a política, ainda carrega dessa cordialidade? Como foi mencionado anteriormente, o político que “teoricamente” representa os nossos interesses atualmente no governo é o mesmo que em outros tempos era o fazendeiro abastado, dono de riqueza e poder, que fazia suas próprias leis. No início do século XX, com o crescimento tecnológico, a urbanização e um aparelhamento do Estado, esses mesmos oligarcas que vinham governando direta (como os presidentes da “política do cafécom-leite”) e indiretamente (os fazendeiros que apoiavam e sustentavam essa política) o nosso país, começam a desaparecer. Fizeram, até então, a típica política do legítimo homem cordial, priorizando o interesse de suas riquezas, de seus familiares e de seus aliados, enfim todos os elementos que permitiam a manutenção dessa ordem por eles estabelecida. Agiam em interesses próprios e faziam suas próprias leis, desconsiderando, na prática, a falsa democracia que regia o país. Com a Revolução de 1930, a política ensaia uma mudança que, na prática, não ocorre. A política continua da mesma forma, com os nossos representantes cada vez mais interessados em lutar por causas próprias. E assim a situação se perpetuou por todo o século XX: políticos engajados (em causas particulares), o povo quase sempre omisso, alheio a tudo, e uma corrupção que se transformou numa “tradição” na política nacional. Tradição esta explicada pela forma como se deu nosso processo de colonização (desorganizado e sem estruturação, na opinião de Buarque de Holanda), nossas relações de reciprocidade estabelecidas na colônia (em que favorecemos o nosso restrito grupo e a nós mesmos) e na forma como encaminhamos tudo isto até o presente tempo. A cordialidade pode ser assim entendida, atualmente, como uma dificuldade enfrentada por nós à institucionalização e como o fato de carregarmos resquícios das relações de sociabilidade do século passado. Presos a essa “teia” de interesses, ainda hoje não conseguimos assumir uma impessoalidade nas relações políticas, o que pode ser percebido na prática tão comum do nepotismo e da corrupção. O que esperamos é que um dia esta triste realidade possa mudar. Que saibamos guardar apenas o que há de positivo na colonização que nos foi aplicada e que dispensemos, de alguma forma, o legado negativo de comodidade, de aceitação dessa corrupção, enfim, dessa cordialidade que nos foi deixada. Esperamos que possa, finalmente, ser interrompida a “procissão dos milagres”7... CORDIALIDADE SUPERADA? A cordialidade é o resultado direto da materialização da “cultura da personalidade” na colônia; é somente com o processo de urbanização que a cordialidade, junto com a influência ibérica, começa a enfraquecer-se (AVELINO FILHO, 1990, p.8). É certo que a cordialidade, desde os tempos em que se configurou, está enfraquecendo. Mas será que está em vias de desaparecer? Ou será que há muito tempo já foi superada? Tomando por base a interpretação de Cassiano Ricardo do termo cordialidade e a reação de Sérgio Buarque de Holanda à mesma, desenvolveremos este tópico buscando uma resposta para a pergunta que o intitula: ocorreu uma superação da cordialidade? Em publicação feita à Revista Colégio, em 1948, Cassiano Ricardo tece algumas considerações sobre o conceito de homem cordial e deixa clara sua interpretação. Afirma apresentar o termo homem cordial uma conotação de bondade, “uma bondade mais envolvente, mais política, mais assimiladora”8. Numa edição posterior da mesma revista, Sérgio Buarque de Holanda, rebate a interpretação feita por Cassiano Ricardo através de uma carta destinada a este. 7 Esta expressão é usada por Sérgio Buarque de Holanda em sua obra Visão do Paraíso, criticando todo esse processo que envolve a formação do povo brasileiro, desde sua colonização. Porém, Holanda não teve uma visão muito otimista acerca desse processo, garantindo que o mesmo perduraria. 8 Citado por HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. RJ: José Olympio Editora, 1982, p.107, nota. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 05-12, agosto-dezembro, 2011. Hot (2011). Holanda alega que Cassiano Ricardo equivocou-se, pois o sentido que pretendeu dar à cordialidade não passa de seu sentido denotativo, ou seja, os sentimentos provenientes do coração, sejam eles bons ou ruins. Sérgio Buarque de Holanda termina a carta com uma afirmação que nos dá pistas para o rumo que tomou o “homem cordial” em seu pensamento e sua obra, fazendo com que pensemos sobre uma possível superação da cordialidade por ele elaborada Por fim quero frisar, ainda uma vez, que a própria cordialidade não me parece virtude definitiva e cabal que tenha de prevalecer independentemente das circunstâncias mutáveis de nossa existência. Acredito que, ao menos na segunda edição do meu livro, tenha deixado este ponto bastante claro. Associo-a antes a condições particulares de nossa vida rural e colonial, que vamos rapidamente superando. Com a progressiva urbanização, que não consiste apenas no desenvolvimento das metrópoles, mas ainda e sobretudo na incorporação de áreas cada vez mais extensas à esfera da influência metropolitana, o homem cordial se acha fadado provavelmente a desaparecer, onde ainda não desapareceu de todo (Carta a Cassiano Ricardo, HOLANDA, 1982, p.145-146). Percebemos através do trecho citado, que Sérgio Buarque de Holanda enfatiza o grau de mobilidade e de historicidade que assume o conceito de “homem cordial”. Essa mobilidade talvez diga respeito ao abandono ou modificação paulatina dos valores ligados à cordialidade na história brasileira. No último capítulo de Raízes do Brasil, intitulado “Nossa Revolução”, o autor se refere a uma lenta e gradativa transformação a que estaríamos passando desde a abolição da escravatura em 1888, até alcançarmos a “linha de chegada” que seria a “nossa” modernização. “Nossa” modernização, pois levamos em consideração – como Sérgio Buarque também o fez – que cada nação tem suas peculiaridades e um tempo próprio de desenvolvimento. O que Sérgio Buarque de Holanda queria dizer é que como país independente, pouco tínhamos, politicamente falando, condições para sustentar este título. Tanto que com uma célebre – porém polêmica – frase, Holanda definiu o que pensava: “A democracia entre nós não passou de um mal entendido”. Com a frase Sérgio Buarque quis dizer que para o tipo de sociedade e de política que existia no Brasil, no século XIX, em que a cultura personalista e os interesses individuais eram predominantes, a democracia não seria uma escolha da maioria. Isso porque numa democracia o interesse da coletividade está no primeiro plano, em detrimento dos interesses individuais; o que não era verificado na política brasileira. Holanda critica contundentemente o fato de termos importado um conjunto de ideias liberais, sem que antes houvesse um preparo na mentalidade das pessoas. Assim, para um povo que se importa mais com seus próprios interesses era difícil assimilar um “modelo” em que a associação e o interesse do povo eram o alvo da política. Por fim, é necessário que respeitemos nosso ritmo lento de modernização, segundo o autor, além de procurarmos entendê-lo bem para não repetir o erro de exportar modelos políticos, econômicos, sociais inadequados à nossa realidade brasileira. CONCLUSÃO Tendo em vista o que foi apresentado, podemos perceber que a obra de Sérgio Buarque de Holanda, embora escrita há mais de cinquenta anos, encontrase atual como nunca e encaixando-se nos problemas que a sociedade brasileira ainda não conseguiu extinguir. A política corrupta, a dificuldade enfrentada para a institucionalização, as relações informais desenvolvidas na sociedade (sempre providas de interesses próprios), são apenas algumas das lembranças que temos ao ler Raízes do Brasil. A obra de Holanda configura-se, na historiografia brasileira, como um dos principais marcos que nos levou a conhecer as raízes do povo brasileiro, sendo de extremo valor para o também conhecimento dos primeiros passos dados pela sociedade para a formação de uma “identidade brasileira”. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 05-12, agosto-dezembro, 2011. Hot (2011). Holanda elabora com perfeição um caminho, usando amostragens de nossas origens históricas, sociais e culturais, para mostrar como se configura nossa sociedade hoje. PRADO JR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. SP: Brasiliense, 1971. BIBLIOGRAFIA AVELINO FILHO, George. Cordialidade e Civilidade em Raízes do Brasil. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais, n.12, v.5, fevereiro 1990. BARBOSA, Francisco de Assis. Verdes Anos de Sérgio Buarque de Holanda. Ensaio sobre sua formação intelectual até Raízes do Brasil. In: Sérgio Buarque de Holanda. Vida e Obra. SP: secretaria de estado da Cultura, 1988. DIAS, Maria Odila Leite da Silva (org.). Sérgio Buarque de Holanda. História. SP: Editora Ática, 1985, p.10-25. FREYRE, Gilberto. Casa-Grande e Senzala. SP: Global, 2004. GOLDMAN, Elisa. A cultura personalista como herança colonial em Raízes do Brasil. Disponível em: http://www.educacaopublica.rj.gov.br/bibliotec a/historia/hist02c.htm/ HOLANDA, Sérgio Buarque de. Visão do Paraíso: os motivos edênicos no descobrimento e colonização do Brasil. São Paulo: Cia Editora Nacional, 1977. _______________. Raízes do Brasil. RJ: José Olympio Editora, 1982. HOT, Amanda Dutra. Muito dinheiro e pouca nobreza: estratégias de ascensão social dos negociantes no Brasil Colonial (Séculos XVII e XVIII). In: II Encontro Memorial do ICHS - Nossas Letras na História da Educação, 2009, Mariana. Disponível em: http://www.ichs.ufop.br/memorial/trab2/h531. pdf. IGLESIAS, Francisco. Sérgio Buarque de Holanda. Historiador. RJ: Imago, 1992. LEITE, Miriam Moreira. A condição feminina no RJ do século XIX. SP: Hucitec; Brasília: INL, 1984. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 05-12, agosto-dezembro, 2011. Hot (2011). Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 05-12, agosto-dezembro, 2011. Borges et al. (2011). ABORDAGEM ACERCA DA INCLUSÃO DE UM ALUNO AUTISTA NO ENSINO REGULAR Área Temática: Educação Lidiane Hott de Fúcio Borges1*, Hellen Cristine Prata de Oliveira2, Élida Tamara Prata de Oliveira3 e Regina Coeli4 1* Mestre em Engenharia dos Materiais, Prof da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu ([email protected]). 2 Doutora em Engenharia dos Materiais, Prof. da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu. 3 Mestre em Educação Matemática, Prof. da Rede municipal de Juiz de Fora. 4 Doutora em Educação, Prof. Da Universidade Federal de Juiz de Fora Resumo: O processo de inclusão do aluno autista na escola nos tempos atuais tem-se mostrado deficiente, pois os professores da educação básica não estão preparados para lidar com alunos especiais em suas turmas, seja em classes regulares seja em classes especiais. Este estudo foi motivado, principalmente, pelas enormes dificuldades em se admitir a questão da inclusão na educação regular brasileira. E vem analisar a inclusão de um aluno autista matriculado em uma escola regular da rede municipal de Juiz de Fora (MG). A pesquisa de campo foi realizada baseada no estudo de caso, através de entrevistas semi-estruturadas com a mãe do aluno autista e três profissionais da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE). No espaço escolar, o estudo foi realizado através de dois questionários, um deles aplicado aos colegas do autista e outro aplicado a alguns professores. Através dos resultados, notou-se que na inclusão é necessário o desenvolvimento do aluno especial, como os demais alunos, salvo suas limitações. Sendo de total relevância a capacitação dos professores ao lidar com a inclusão. Palavras chave: autismo, educação especial, inclusão. INTRODUÇÂO O presente artigo foi motivado pela falta de preparo, de uma professora de matemática do ensino fundamental da educação básica, ao incluir um aluno diagnosticado autista9 no processo de ensino-aprendizagem em uma de suas salas de aula regulares, de 7° ano, em escola pública. Como fazer para que a inclusão não seja apenas uma inclusão social, esquecendo-se das potencialidades que podem ser desenvolvidas pelo aluno autista, dentro de seus limites, no ambiente escolar? Como contribuir para que esta inclusão se dê de fato, indo além de uma simples matrícula no ensino regular? Estes são desafios a serem vencidos pelos educadores matemáticos. Esta pesquisa tem por objetivo verificar como se procede a inclusão de alunos com 9 Neste estudo, o aluno autista, de 15 anos, terá o pseudônimo de Teo. necessidades especiais em classes comuns do ensino regular. A questão de investigação, portanto, consiste em analisar alguns casos de inclusão que estão presentes em diversos trabalhos, comparando-os com a situação de inclusão vivenciada pela professora em sua sala de aula, de forma que seja observado como tem sido praticada a inclusão nas escolas regulares e até que ponto tal modalidade deixa de ter caráter de inclusão ou se torna ‘excludente’, trazendo ou não benefícios para o aluno e sua família que, buscam na escola, apoio para seu desenvolvimento pleno. No que tange aos procedimentos metodológicos, um acompanhamento do aluno autista na sala de aula regular pela professora, vai se estruturar como um estudo de caso e um conjunto de dados específicos foram coletados em entrevistas com alguns professores da escola, objeto de estudo, bem como a família e os colegas do Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 13-22, agosto-dezembro, 2011. Borges et al. (2011). aluno autista, perfazendo com uma gama de detalhes um cenário de pesquisa qualitativa. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Uma breve reflexão sobre o autismo A palavra autismo é oriunda da junção de duas palavras gregas: “autos” que significa “em si mesmo” e “ismo” que significa “voltado para”, ou seja, o termo autismo originalmente significava “voltado para si mesmo” (GOMES, 2007). As definições mais atuais do autismo são dadas por dois documentos distintos: CID-1010 e DSM-IV-TR11, nos quais o autismo é classificado como um Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD), ou seja, autismo é um distúrbio do desenvolvimento apresentando perturbações no trio: interação social, comportamento e comunicação. Como exposto, o autismo é tido como uma deficiência que representa uma disfunção global do desenvolvimento e de acordo coma a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008), “os alunos com transtornos globais do desenvolvimento são aqueles que apresentam alterações qualitativas das interações sociais recíprocas e na comunicação, um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo” (p.15). E embora o autismo seja classificado como um distúrbio de desenvolvimento com alterações nas relações sociais, na comunicação e no comportamento, na maioria dos casos, essa deficiência é também acompanhada por alguma deficiência mental (GOMES, 2007; GAUDERER, 1993; SERRA, 2004; CAMARGO, 2007; MARTINS, 2007). Segundo Gauderer (1993) cerca de 75% dos 10 CID 10: Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com Saúde (conhecida também como Classificação Internacional de Doenças). Foi aprovada em uma Conferência Internacional convocada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), realizada em Genebra no ano de 1989 e que entrou em vigor em janeiro de 1993 e permanece até hoje. 11 DSM IV-TR: Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais que foi atualizado no ano de 2002 e elaborado pelos psiquiatras da Associação de Psiquiatria Norteamericana. autistas convivem com algum nível de retardo mental. Outras características do autismo são descritas por Grandin & Scariano (1999): O autismo é um distúrbio do desenvolvimento. Uma deficiência nos sistemas que processam a informação sensorial recebida fazendo a criança reagir a alguns estímulos de maneira excessiva, enquanto a outros reage debilmente. Muitas vezes, a criança se “ausenta” do ambiente que a cerca e das pessoas circunstantes a fim de bloquear os estímulos externos que lhe parecem avassaladores. O autismo é uma anomalia da infância que isola a criança de relações interpessoais. Ela deixa de explorar o mundo à sua volta, permanecendo em vez disso em seu universo interior. (GRANDIN & SCARIANO, 1999, p.18) Assim, a pessoa autista permanece em seu mundo interior como um meio de fugir dos estímulos que a cerca no mundo externo. Outro motivo para o autista permanecer em seu universo interior é o fato de que, em geral, o autista sente dificuldade em se relacionar e em se comunicar com outras pessoas uma vez que ele não usa a fala como um meio de comunicação. Não se comunicando com outras pessoas acaba passando a impressão de que a pessoa autista vive sempre em um mundo próprio, criado por ela e que não se interage fora dele. Na verdade, quando uma criança autista se isola do mundo externo é de acordo com Grandin & Scariano (1999) uma fuga para filtrar os estímulos externos, pois caso contrário, o excesso de muitos estímulos simultâneos causa nos autistas ataques de nervos, gritos e outros comportamentos inadequados. Segundo essas autoras, as causas para o autismo ainda são desconhecidas, apesar de haver vários estudos e pesquisas na busca das mesmas, mas ele é identificado através dos sintomas e características que surgem ao longo do tempo. A maioria das crianças começa a mostrar sintomas de autismo entre 18 a 24 meses e os meninos são mais afetados pelo autismo do que as meninas. Numa proporção de uma menina para quatro meninos. Algumas das características encontradas em uma pessoa autista, de acordo com Grandin & Scariano (1999), Gauderer (1993), Serra (2004), Martins Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 13-22, agosto-dezembro, 2011. Borges et al. (2011). (2007), e Gomes (2007) são: contato visual difícil sendo normalmente evitado; ecolalia (repetição de palavras ou frases); preferência em estar só; não responde as ordens verbais (atua como se fosse surdo); recusa em ouvir; incapacidade de estabelecer interações sociais com outras crianças; dependência de rotinas e resistência à mudança; pode começar a desenvolver a linguagem, mas repentinamente isso é completamente interrompido sem retorno; apresenta certos gestos imotivados como balançar as mãos ou balançar-se; fazem movimentos repetitivos; cheira ou lambe os brinquedos; resiste à mudança de rotina; demonstra desigualdade em habilidades motoras. Vale ressaltar que cada autista tem suas características e limitações próprias, ou seja, um autista dificilmente se comportará igual a outro autista. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta lei, a modalidade da educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. O que os documentos legais dizem a respeito da inclusão? Há, tanto na legislação brasileira quanto na legislação internacional, vários documentos, decretos, leis, conferências, declarações que versam sobre a inclusão e a educação especial. Para esclarecer o que se entende por inclusão será feito o uso das palavras de Carvalho (2004 apud Silva, 2007), o qual afirma: Por inclusão estou me referindo ao acesso, ingresso e permanência desses alunos em nossas escolas como aprendizes de sucesso e não como números de matrícula ou como mais um na sala de aula do ensino regular. Estou me referindo à sua presença integrada com os demais colegas participando e vivendo a experiência de pertencer, isto é, estar no palco, sem ser herói ou vilão (CARVALHO, 2004 apud SILVA, 2007, p.122). Dessa forma, a mera matrícula de um aluno com necessidades especiais na escola regular não é suficiente para se dizer que ele está incluso, é necessário garantir sua permanência e desenvolvimento de suas habilidades no espaço escolar. Uma definição para educação especial está presente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) – Lei n° 9.394/96, em vigência, a qual dedica o Capítulo V à educação especial e em seu artigo 58 encontra-se que: Em outras palavras, educação especial é a educação fornecida aos alunos portadores de alguma deficiência e o termo ‘preferencialmente’ escrito na LDBEN não deixa claro que a educação especial se dá necessariamente em classes regulares de ensino, dessa forma torna-se possível se ter a educação especial fora da rede regular de ensino, por exemplo, em classes especiais ou até mesmo em escolas especializadas. Para complementar as ações da educação especial tem-se no artigo 24 do Decreto n° 3.298/99, o qual regulamenta a Lei n° 7.853/89, que a oferta da educação especial deve ser gratuita e obrigatória nos estabelecimentos públicos de ensino, sendo que todo aluno com necessidades especiais têm direito aos mesmos benefícios concedidos aos demais alunos. Em ambos os documentos, Constituição Federal de 1988 e a Lei n° 8.069 de 1990, que é o Estatuto da Criança e do Adolescente, é garantido a toda criança e adolescente o “direito à educação visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988, Art. 205; BRASIL, 1990, Cap. IV, Art.53). Dessa forma, para dar suporte ao aluno deficiente e promover um avanço no seu desenvolvimento “é dever do estado assegurar atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência preferencialmente na rede regular de ensino” § 1° Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial. § 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular. § 3º A oferta de educação especial, deve ser constitucional do Estado, tem inicio na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil. (BRASIL, 1996, Art. 58). Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 13-22, agosto-dezembro, 2011. Borges et al. (2011). (BRASIL, 1988, Art.208, Inc. III; BRASIL, 1990, Cap. IV, Art. 54, Inc. III). E de acordo com o Decreto n° 6571 de 2008, esse Atendimento Educacional Especializado (AEE) é definido como “conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucionalmente, prestado de forma complementar ou suplementar à formação dos alunos no ensino regular” (BRASIL, 2008, Art. 1, Parágrafo 1), ou seja, o AEE é, então, um reforço para o ensino regular e não seu substituto. MATERIAIS E MÉTODOS Esta pesquisa analisou a inclusão de um aluno autista no ensino regular utilizando o estudo de caso de Bogdan & Biklen (1994) e Flick (2009). Para este estudo foi feito inicialmente um contato com a mãe do aluno Teo, que o acompanha até a escola todos os dias, para lhe explicar os objetivos da pesquisa. A mãe de Teo repassou as informações para seu marido e ambos concordaram e assinaram o termo de consentimento da pesquisa, pois para eles, esse trabalho é um meio para se obter mais informações sobre o autismo, como lidar com suas características e comportamentos. Foi realizada uma entrevista semiestruturada com a mãe de Teo, na própria residência dela, em um horário em que ele não estava em casa, pois a mãe justificou-se dizendo que não gostava de falar do filho na presença dele. Nessa entrevista foram abordados os seguintes temas: a infância de Teo, sua entrada na escola, as mudanças ocorridas na fase escolar, o contato com as outras pessoas e sua comunicação com as mesmas. Com o intuito de conhecer as atividades desenvolvidas com o aluno e seus progressos obtidos desde 2001, ano em que ele começou a frequentar a APAE, o Teo também foi observado em seu dia-a-dia na APAE. Foram analisadas, juntamente com os profissionais responsáveis pelo trabalho nessa instituição, todas as atividades desenvolvidas nesse ambiente e como se dava a participação dos alunos nas mesmas. Além dessas tarefas, a pesquisadora, enquanto professora do Teo, manteve-se atenta a todos os comportamentos e mudanças ocorridas com ele, não só durante suas aulas, mas em todo o ambiente escolar. E, por se manter atenta aos fatos ocorridos em sala é que a pesquisadora viu a necessidade de elaborar um questionário a partir de uma discussão com os alunos da turma de Teo a respeito da inclusão. Foi aplicado um ‘questionário infantil’ aos demais 23 alunos da turma. Concomitante a essas pesquisas e conversas, foi repassado aos professores das disciplinas de Artes, Educação Física e Informática um questionário indagando sobre como o Teo se comporta em suas aulas. A escolha por essas disciplinas foi feita com base no fato de elas serem disciplinas mais livres de um conteúdo maçante que exija muito do adolescente pesquisado. RESULTADOS E DISCUSSÃO A seguir serão apresentados os principais resultados da pesquisa. No tópico de ‘Pesquisa de campo’ serão abordadas a entrevista com a mãe do Teo e a visita à APAE, enquanto que no tópico ‘Questionários’ serão explicitados os resultados dos dois questionários aplicados no ambiente escolar. Pesquisa de campo Na entrevista semi-estruturada e conversas informais realizadas com a mãe de Teo, ficou-se sabendo que a entrada do Teo na escola se deu aos 5 anos de idade em uma escola pública da rede municipal da cidade de Juiz de Fora (MG), na qual ele permanece até hoje, aos 15 anos. A mãe comentou que quando foi procurar vaga para seu filho nesta escola, a direção não teve dificuldades para aceitá-lo e logo que começou a estudar, sugeriram a ela procurar tratamento com um fonoaudiólogo e psicólogo para o filho. O que ela só conseguiu na APAE, três anos mais tarde. Na APAE as atividades desenvolvidas com o Teo são: ludoterapia (na área de psicologia), psicomotrocidade, terapia ocupacional e hidroterapia. Conversando com os profissionais da instituição que atendem o Teo, todos afirmaram mudanças positivas desde a sua entrada na APAE, como: mais sociável, mais calmo, mais feliz e participativo nas atividades propostas. Estas atividades são desenvolvidas com apoio de materiais concretos, pois fazer uso da abstração é difícil para compreensão por parte de alunos especiais. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 13-22, agosto-dezembro, 2011. Borges et al. (2011). Já no ambiente escolar, a mãe de Teo relata que antes dele entrar na escola ele era mais calado, mais tímido e até muito nervoso, mas depois que se iniciou no ensino regular ele foi tornando-se mais calmo, mais esperto, e foi se interessando por outras atividades, até mesmo em se comunicar com as pessoas. Ela comentou também que antes de entrar na escola ele não tinha conhecimento nenhum, não sabia identificar nada, nem o nome do irmão, nem o nome dele e foi na escola que aprendeu a identificar seu nome e demais objetos. Quando questionada se era válido ou não a inclusão de pessoas com necessidades especiais em classes regulares de ensino, ela disse que é válido e fundamental para a qualidade de vida desta pessoa, e melhor é que a inclusão também traz benefícios para todos ao redor, uma vez que eles têm a oportunidade de aprenderem a conviver com a diversidade e enquanto ao Teo, ela não vê nenhum problema com a inclusão, pois os colegas e a direção respeitam suas necessidades. Questionários Com relação ao questionário aplicado aos professores de Artes, Educação física e Informática, apenas um deles, a professora de Artes, não tinha em sua experiência de docência lecionado para alunos com necessidades especiais. Quando questionados sobre as atividades desenvolvidas com o Teo, os três professores relataram que elas eram realizadas com a ajuda dos colegas ou do próprio professor. O professor de Educação Física respondeu que as atividades são atividades lúdicas de coordenação motora (relacionada a movimentos), a professora de Artes colocou que também trabalha com a coordenação motora e visual, porém através de desenhos e colagens e a de Informática desenvolve com o Teo atividades de pintar, digitar e alguns jogos. Os três professores ressaltaram que respeitando o interesse e a limitação do aluno é possível que ele execute as atividades propostas. Quanto ao relacionamento do Teo com o professor e demais alunos, os professores se posicionaram da seguinte forma: O relacionamento tanto com a turma, quanto comigo, é amigável e a turma o respeita e nunca discrimina sua participação, quando aleatoriamente ele participa em conjunto com todos os alunos (Professor de Educação física). O aluno em questão é quieto, dócil, carinhoso, calmo, de fácil convívio, apresentando características próprias do autista, que é viver em seu próprio mundo, sem interagir com os colegas, mas receptivo quando procurado (Professora de Artes). O aluno é amável com seus colegas e comigo. Às vezes, não responde aos estímulos externos (Professora de Informática). Nota-se dessa forma, um relacionamento amigável com os alunos e professores. Porém no ‘questionário infantil’, os colegas, em sua maioria, se mostrou contrários a inclusão do Teo em classes regulares. Dos 23 questionários, 15 alunos responderam que o Teo deveria estar matriculado em uma classe especial. As explicações são as mais variadas possíveis: que na escola regular, na qual o Teo está matriculado, tem muito barulho o que é ruim para ele, enquanto que na escola especial existem pessoas para ajudá-lo, que vão dar mais atenção a ele, que ele vai aprender mais em uma escola especial do que na escola regular, que na escola especial as pessoas sabem como lidar com ele. Ao todo, dos 23 alunos, 19 estudam com o Teo há dois anos ou mais, e os demais há um ano. E dentre os 23 alunos somente 6 sabiam qual o nome da deficiência que o Teo tem, mas isso não significa que eles saibam, de fato, o que é autismo; 5 responderam que sabiam qual era a deficiência, mas não lembravam o nome; 10 disseram que não sabiam qual era a deficiência e 2 colocaram que sabiam a deficiência, mas responderam errado; um escreveu que ‘ele fica muito irritado dentro de sala’ e outro colocou ‘cabeça’. Os professores, muitas vezes, por estarem desinformados e por serem inexperientes no assunto sentem dificuldades em trabalhar com o Teo, e alguns deles não conseguem realizar as atividades propostas com o aluno especial em todas as aulas. Este fato foi comprovado na resposta obtida do questionário realizado com os alunos, quando eles forma indagados se “Todos os professores conseguem realizar atividades com o Teo durante as aulas ou, Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 13-22, agosto-dezembro, 2011. Borges et al. (2011). às vezes, ele fica sem fazer nada?”, a maioria dos alunos (13 alunos) respondeu que ‘nem todos professores dão atividades para o Teo’ ou que ‘ele, às vezes, fica sem fazer nada’, 5 alunos responderam que ‘todos professores ajudam como podem’, 3 deixaram em branco e 2 responderam apenas ‘sim’ ou ‘não’. Como uma escola pretende fazer ‘inclusão’ se os próprios colegas de sala não têm conhecimento da deficiência que o colega possui? Como poderão ajudar o colega com necessidades especiais se desconhecem suas limitações e dificuldades? Não tem como o aluno especial, como o Teo, obter uma aprendizagem significativa e um bom desenvolvimento, no ensino regular, se a escola (direção, coordenação e professores) não for capacitada para tal. Ainda mais considerando, por parte do aluno, suas dificuldades e limitações provenientes da deficiência. Que inclusão é esta em que parece não haver um tratamento adequado para com o aluno com necessidades especiais? Neste ponto faz-se necessário repensar se a experiência vivenciada pela pesquisadora é inclusão mesmo ou se é a integração, pois para integrar um aluno com necessidades especiais basta inseri-lo em uma escola comum para que ele venha a ter contato com um sistema escolar, seja na classe regular seja na classe especial. Com a legislação brasileira apoiando e dando suporte para os alunos deficientes terem acesso a uma educação regular de qualidade, observa-se que o n°. de matrículas de deficientes em classes regulares tem aumentado no decorrer dos últimos anos se comparado com as matrículas realizadas em classes especiais. Por exemplo, no ano de 1999, foram realizadas 374.699 matrículas, em nível nacional, na educação especial e transcorridos dez anos (2009), este n°. subiu para 637.242, conferindo um aumento em torno de 70%. Das 374.699 matrículas realizadas, em 1999, 311.354 destas foram feitas em escolas exclusivamente especializadas e/ou classes especiais e as demais, 63.345, em escolas regulares e/ou classes comuns. Já em 2009, do total de 637.242 matrículas, 250.908 foram realizadas em escolas exclusivamente especializadas e/ou classes especiais e as demais, 386.334, em escolas regulares e/ou classes comuns. Então, de 1999 para 2009 o no. de matrículas em escolas especializadas e/ou classes especiais diminuiu, pois em 1999 esse no. correspondia cerca de 83% do total de matrículas e já em 2009 ele caiu para aproximadamente 40%. Por outro lado, o no. de matrículas em escolas regulares e/ou classes comuns aumentou, pois em 1999 esse no. correspondia cerca de 17% do total de matrículas e já em 2009 ele subiu para aproximadamente 60%. Logo o n°. de matrículas de alunos com necessidades especiais em classes regulares tem se tornado superior ao de classes especiais, com o decorrer dos anos. Portanto, é possível notar uma concordância das leis brasileiras com o movimento de se ter uma educação acessível a todas as pessoas, inclusive aquelas que apresentam alguma deficiência. Mas para isso tornar realidade é necessário a preparação e a capacitação dos professores para lidar com as diferenças. CONCLUSÕES A proposta de inclusão tal como foi abordada neste trabalho tem seus aspectos positivos, mas, infelizmente, há também os negativos. Erroneamente, muitos professores e outros profissionais pensam que para praticar a inclusão basta colocar o aluno com necessidades especiais matriculado em uma classe regular, porém a inclusão vai muito além de uma inclusão social. É necessário que na inclusão o aluno especial se desenvolva e aprenda como os demais alunos, observando suas limitações. Dessa forma, acredita-se que para Teo, há ganhos na inclusão, como sua própria mãe relatou, mas há também perdas, como no caso da aprendizagem que fica prejudicada. O que se percebe, segundo o relato da mãe de Teo, é que os benefícios trazidos pela inclusão são mais visíveis na educação infantil quando se tem apenas um professor, com dedicação de cerca de 4 horas para desenvolver as atividades com os alunos, e possui maior facilidade de adaptação de material. Quando ingressam no ensino fundamental, a rotina muda completamente: os alunos passam a ter vários professores de diversas disciplinas, cada um com sua Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 13-22, agosto-dezembro, 2011. Borges et al. (2011). cultura, com sua forma de lecionar, e com apenas 50 minutos para ensinar seu conteúdo. Os alunos, em grande parte, frente a estas mudanças, apresentam alterações no comportamento e no comprometimento com os estudos. Para os autistas, que possuem certa resistência à quebra de rotinas, a troca da educação infantil para o ensino fundamental, é mais complicada. Percebe-se que tal como vem sendo incluído nesta escola, o Teo não tem tido tanto progressos quanto poderia ter, caso houvesse maior comprometimento por parte da instituição, professores e alunos com a sua inclusão. Ter o aluno com necessidades especiais ‘incluído’ numa sala de aula regular, mas não desenvolver atividades com ele, não fazer com que ele tenha avanços acaba-se tornando uma prática excludente. Não se pode deixar de levar em conta os benefícios trazidos por esta inclusão, mas em âmbito geral, acredita-se que o Teo pudesse se desenvolver mais nas classes especiais, nas quais o número de alunos é reduzido e há profissionais habilitados para tal tarefa. Para as classes regulares, com elevado número de alunos, o ideal seria ter um monitor, ou outro professor, alguém que pudesse dividir a responsabilidade de educar junto com o professor da turma. Portanto, os pais e/ou responsáveis devem buscar uma escola que favoreça o desenvolvimento do aluno com necessidades especiais, seja ela especial ou regular. BIBLIOGRAFIA Brasil. (1988): Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília. Disponível em: http://portal.mec.gov.br. ______. (1990). 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Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 13-22, agosto-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). ANÁLISE DOS PROCESSOS DE AVALIAÇÃO E CERTIFICAÇÃO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE NO PROCESSAMENTO DE ROUPAS, NO PROCEDIMENTO DE ACREDITAÇÃO HOSPITALAR PELOS CRITERIOS DA ONA: Estudo de caso em um hospital filantrópico de médio porte Área Temática: Ciências Contábeis Jaqueline Conceição Leite1, Mônica de Oliveira Costa2, Farana de Oliveira Mariano3 1 Dicente do curso de ciências contábeis na FACIG. Professora e assessora na Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu - FACIG. 3 Professora na Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – FACIG. 2 RESUMO: A Organização Nacional de Acreditação (ONA) visa com o compromisso da qualidade hospitalar, contribuir para a melhoria da qualidade dos processos das Instituições Hospitalares. Sendo assim, o objetivo deste trabalho é analisar o setor de Processamento de Roupas de um hospital filantrópico de Médio Porte, que presta atendimento ao SUS, convênios e particulares, quanto às condições operacionais e os critérios necessários para atingir o Nível 1 de acreditação da ONA. A instituição tem como Missão “prestar assistência hospitalar com qualidade e humanização a todos os clientes com responsabilidade social” e tem a visão de “ser um hospital regional acreditado, reconhecido pela excelência nos serviços prestados”. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de natureza descritiva, desenvolvida através do método de estudo de caso. Os dados foram coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas com os colaboradores da unidade e através de observação direta participativa. Os principais resultados alcançados, possibilitaram verificar a necessidade de aprimoramento da condução dos processos de trabalho, implementando-os em conformidade com as normas pertinentes ao setor. Ocorrendo o aperfeiçoamento dos processos, pressupõe-se o alcance de resultados positivos, quanto ao aumento da qualidade dos serviços prestados, otimização dos recursos e do tempo, redução dos fluxos entre outras. Palavras chave: acreditação hospitalar, processamento de roupas, qualidade. INTRODUÇÃO O presente estudo, realizado em um hospital filantrópico de médio porte, em Minas Gerais, aborda o tema referente ao processamento de roupas de serviços de saúde e os critérios para acreditação hospitalar; baseados no Manual das Organizações Prestadoras de Serviços Hospitalares da ONA (Organização Nacional de Acreditação). Sua importância deve-se ao fato da instituição ter como objetivo se tornar um hospital acreditado e de referência na qualidade de atendimento. O hospital teve contemplado em seu Plano Diretor 2008-2010, como opção estratégica, a auto-sustentação e o crescimento com excelência operacional, buscando a reestruturação do modelo de atuação dos processos e dos recursos, para manter o equilíbrio econômico-financeiro e a melhoria contínua da prestação de serviços aos clientes. Baseada nestes propósitos, a instituição pretende passar pelo processo de acreditação da ONA. Uma organização não governamental caracterizada como: “pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos e de interesse coletivo”, com abrangência de atuação nacional e que tem como objetivo geral promover a implementação de um processo permanente de avaliação e de certificação da qualidade dos serviços de saúde, permitindo o aprimoramento contínuo da atenção, de forma a garantir a qualidade na assistência aos cidadãos brasileiros, em todas as organizações prestadoras de serviços de saúde do País ONA (2001). Segundo a Organização Nacional de Acreditação - ONA (2001) - , acreditação é um método de avaliação dos recursos Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). institucionais, voluntário, periódico e reservado, que tende a garantir a qualidade da assistência por meio de padrões previamente definidos. O Manual Brasileiro de Acreditação das Organizações Prestadoras de Serviços de Saúde e as Normas para o Processo de Avaliação (2006), dispõem sobre os três níveis de complexidade, sendo que, o Nível 1 de Estrutura: observa a segurança na estrutura física, sanitária e de capacitação profissional. O Nível 2 de Processo: evidencia o planejamento na organização da assistência hospitalar, referentes à documentação, corpo funcional, treinamento, controle, estatísticas básicas para a tomada de decisão clínica e gerencial e práticas de auditoria interna. O Nível 3 de Resultados: utiliza perspectivas de medição organizacional, alinhadas às estratégias e correlacionadas aos indicadores de desempenho dos processos; disposição sistemática de comparações com referenciais externos pertinentes, bem como evidências de tendência favoráveis para os indicadores; apresenta inovações e melhorias implementadas, decorrentes do processo de análise crítica. Para iniciar o processo de implantação da acreditação, é necessário e importante a elaboração de um diagnóstico da situação atual da organização, para que se obtenham bases de comparação para futuras avaliações do programa. O sucesso da implantação desta política ocorrerá à medida que for incorporada à rotina de trabalho e no comportamento de todos os envolvidos da instituição e pela sua constante revisão e monitoramento, para atingimento das metas e obtenção de serviços que atendam às expectativas dos clientes. A avaliação da qualidade em serviços de saúde constitui um passo importante no planejamento e na gestão dos serviços. Para Henriques (2003, p.02)12: [...] Fortalecer e divulgar o processo de acreditação é necessário para atingir o reconhecimento pelo cidadão. É a sociedade quem deve validar este processo, não apenas os profissionais 12 Cláudio Maierovitch Pessanha Henriques Diretor-presidente - Agência Nacional de Vigilância Sanitária. da área da saúde. Quando atingir este ponto, o sistema estará maduro, não apenas como instrumento de gestão e avaliação, mas como efetivo instrumento de controle social [...] A unidade de processamento da roupa de serviços de saúde é considerada um setor de apoio que tem como finalidade coletar, pesar, separar, processar, confeccionar, reparar, e distribuir roupas em condições de uso, higiene, quantidade, qualidade e conservação a todas as unidades do serviço de saúde (GODOY et al, 2004). Para Kotaka (1989) uma unidade de processamento de roupas bem planejada resultará na eficiência dos processos realizados, na economia dos custos operacionais e de manutenção, na confiabilidade, segurança e conforto dos trabalhadores e usuários. De acordo com Prochet (2000), o serviço de processamento de roupas é uma área da saúde pouco conhecida e estudada, que pode, entretanto, representar um grave problema, principalmente pelas condições e riscos que oferece ao trabalhador desse setor, o qual está sujeito aos riscos físicos, químicos, biológicos, ergonômicos, psicossociais e de acidentes. Dentro dessa classificação destacam-se aqueles relacionados ao uso de produtos químicos, manipulação e operação dos equipamentos, inadequação da infra-estrutura física da unidade e organização do trabalho. Sabe-se, que só será possível atingir o Nível 1 de acreditação pela instituição se todos os setores estiverem no mesmo padrão de qualidade. Portanto, devido à grande variedade de serviços executados, o setor pesquisado, se restringirá ao de processamento de roupas. Pretende-se com este estudo, verificar os critérios mínimos de expectativas de qualidade, descritos em forma de padrões necessários no processo de acreditação, no setor de Processamento de Roupas de um hospital filantrópico de médio porte, com base Itens de Orientação do manual da ONA (Organização Nacional de Acreditação), editado de acordo com Resolução da Diretoria Colegiada - RDC Nº. 93, de 26 de maio de 2006: Manual Brasileiro de Acreditação de Organizações Prestadoras de Serviços de Saúde e as Normas para o Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). Processo de Avaliação, da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, levantado a seguinte questão: Como o setor de Processamento de Roupas do hospital atende aos critérios baseados no Manual das Organizações Prestadoras de Serviços Hospitalares da ONA para acreditação? A conquista do Nível 1 de acreditação permitirá ao hospital, fornecer melhores serviços à comunidade, pois, o processo envolve a garantia da melhoria contínua da qualidade da assistência à saúde, na segurança para os pacientes/clientes, sendo um útil instrumento de gerenciamento, com critérios e objetivos concretos adaptados à realidade da instituição. Para a realização dessa pesquisa, em sua parte metodológica, foi necessária a utilização de entrevista semi-estruturada, sendo esta analisada qualitativamente. Pode-se concluir que a unidade de Processamento de Roupas, ainda não está em condições de acreditar Nível 1, devido ao fato de alguns processos não apresentarem conformidade com os critérios exigidos nos itens de orientação da ONA. Conseqüentemente espera-se que este estudo possa ser contributivo quanto às informações que serão levantadas, e sirvam de subsídios para a iniciação do processo de acreditação no hospital. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA O Processo de acreditação hospitalar no Brasil O Brasil é líder na América Latina no desenvolvimento de sistemas de acreditação. Uma revisão dos avanços em acreditação hospitalar em dezenove países da América Latina concluiu que o Brasil é um dentre os cinco únicos países da região que não apenas haviam estabelecido uma comissão nacional de acreditação e produzido um manual de procedimentos padrões, como também tinham iniciado a implementação de um programa em nível nacional. O Brasil foi o único país da América do Sul a chegar tão longe (NOVAES, 1999). Em novembro de 1998 o Ministério da Saúde aprovou a proposta de criação de uma comissão nacional para acreditação hospitalar, a Organização Nacional de Acreditação (ONA). À ONA coube a responsabilidade de desenvolver regras, normas e procedimentos para definir os padrões, e assumiu a liderança ao criar normas técnicas, desenvolver um código de ética, treinar pesquisadores e certificar institutos e empresas de vistoria. De acordo com La Forgia; Couttolenc (2009), Os sistemas de acreditação estão bem desenvolvidos no Brasil, mas a participação neles é voluntária e sua utilização é inaceitavelmente baixa. Não há conexão com as regulações de licenciamento governamentais ou com requisitos de certificação baseada em qualidade que definem os arranjos contratuais e financeiros entre pagadores (SUS e as seguradoras privadas) e os hospitais. [...] os critérios de elegibilidade para financiamento do SUS deveriam estar vinculados ao licenciamento e, eventualmente, à acreditação hospitalar. Sem esse tipo de vínculo e sem o incentivo financeiro concomitante, muitos hospitais brasileiros permanecerão abaixo dos padrões e potencialmente inseguros num futuro próximo. O processo de acreditação trata de questões consideradas de suma importância para a cadeia assistencial em uma rede de serviços de saúde: o direito dos pacientes, a educação de pacientes e familiares, o acesso e a continuidade do cuidado ao paciente, incluindo a questão da referência e contrareferência. O paciente tem reconhecidas suas necessidades nas diferentes fases de sua doença e o hospital deverá educá-lo quanto ao cuidado necessário, garantindo o seu acesso aos serviços disponíveis na instituição e referir ou contra-referir para outros níveis de cuidados internos ou externos, para que o paciente tenha atendidas todas as suas necessidades (CBA)13. 13 CBA - Consórcio Brasileiro de Acreditação é o nome fantasia da Associação Brasileira de Acreditação de Sistemas e Serviços de Saúde – ABA. A Associação Brasileira de Acreditação de Sistemas e Serviços de Saúde, organização sem fins lucrativos, foi criada de acordo com o novo Código Civil Brasileiro, que regulamenta todas as atividades institucionais sociais. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). Segundo La Forgia; Couttolenc (apud DLUGACZ, 2004, p. 358), “[...] a acreditação busca, por meio de avaliação independente, estabelecer padrões ótimos atingíveis. Ela tem o foco na organização como um todo. Esses padrões fornecem estrutura para prestação de serviços de qualidade que os gestores das unidades podem utilizar para melhorar seu desempenho”. Em entrevista ao P&P – Saúde Suplementar, o coordenador de Educação do Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA), Heleno Costa Jr.; e o gerente de Projetos do CBA, José de Lima Valverde Filho, afirmam que há um crescimento cada vez maior entre as instituições de saúde brasileiras pela busca da acreditação, que está se tornando um diferencial desejado tanto por gestores quanto por pacientes. Portanto, passa a ser um referencial de qualidade, que deve ser continuamente seguido para garantir a melhor e mais adequada segurança na prestação de assistência aos clientes/pacientes. Outro diferencial, é que o hospital acreditado passa a integrar uma seleta rede internacional de hospitais acreditados. Esta rede possibilita o intercâmbio e o benchmarking entre as instituições, quando são utilizados referenciais comparativos de qualidade, através do estabelecimento de indicadores clínicos e gerenciais. De acordo com Costa (2009), o desenvolvimento contínuo, através de educação, treinamento e capacitação, devem ser instrumentos fundamentais na política de recursos humanos em uma instituição. Através do programa de acreditação, os profissionais recebem especial atenção nestes requisitos, garantindo assim, seu contínuo aperfeiçoamento pessoal e profissional. A exigência dessa qualificação e capacitação dos profissionais eleva significativamente o grau de confiabilidade no desempenho das atribuições conferidas a cada categoria profissional. O processo de acreditação traz vantagens tanto para instituição quanto para o cliente/paciente que está sob os seus cuidados. Costa (2009) ressalta que a Instituição acreditada reconhece a O CBA é o representante exclusivo da Joint Commission International no Brasil. necessidade de uma avaliação permanente de seus serviços, utilizando ferramentas e instrumentos efetivos para monitorar o desempenho clínico e gerencial. O cliente/paciente passa a contar com a garantia e a manutenção da segurança e excelência na prestação dos cuidados. Processamento de Roupas de Serviços de Saúde Até o início do séc. XIX, as lavanderias eram vistas apenas como um serviço de hotelaria, sem que houvesse qualquer preocupação com sua morbidade potencial (causadora de doenças) ou a difusão de agentes patogênicos (MÜHLEN, 2002). O processamento da roupa do serviço de saúde hospitalar consiste em todos os passos requeridos para a coleta, transporte e separação da roupa suja, bem como aqueles relacionados ao processo de lavagem, secagem, calandragem, armazenamento e distribuição (TIETJE; BOSSEMEYER; MCINTOSH, 2003). A lavanderia hospitalar é um dos serviços de apoio ao atendimento dos pacientes,, responsável pelo processamento da roupa e sua distribuição em perfeitas condições de higiene e conservação, em quantidade adequada a todas às unidades do hospital (MS, 1986). A Resolução – RDC Nº. 50 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) estabelece as atribuições da prestação de serviços de apoio logístico, com objetivos de proporcionar condições de lavagem das roupas usadas, tais como: 1) coletar e acondicionar roupa suja a ser encaminhada para a lavanderia; 2) receber, pesar a roupa e classificar conforme a norma; 3) lavar e centrifugar a roupa; 4) secar a roupa; 5) costurar e/ou confeccionar, necessário, a roupa; quando 6) passar a roupa através da calandra; prensa ou ferro; 7) separar e preparar (dobragem, etc.) a roupa lavada; 8) armazenar a roupa lavada; Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). 9) separar e preparar os pacotes da roupa s ser esterilizada; 10) distribuir a roupa lavada; 11) zelar pela segurança dos operadores; e 12) limpar e desinfetar o ambiente e os equipamentos. Figura 1 - Processo da lavanderia hospitalar. Fonte: Adaptação RDC Nº. 50 – ANVISA depende de padrões específicos para cada país, estabelecidos pelas respectivas O Ministério da Saúde em seu Manual de agências reguladoras (LA FORGIA; Lavanderia Hospitalar (1986, p.03), ressalta a COUTTOLENC, 2009). importância da lavanderia dentro do Os hospitais devem desempenhar complexo hospitalar, pois da eficácia de seu suas atividades, sempre atenciosos com a funcionamento depende a eficiência do qualidade. Conforme O Manual de hospital, refletindo-se especialmente nos Segurança Hospitalar/ ANVISA, 2003, o seguintes aspectos: principal objetivo de um hospital é a prestação de serviços na área da saúde, com • Controle das infecções; qualidade, eficiência e eficácia. Conceituando • Recuperação, conforto e segurança do da seguinte forma: paciente; Qualidade: Aplicação apropriada do • Facilidade, segurança e conforto da equipe conhecimento disponível, bem como de trabalho; da tecnologia, no cuidado da saúde. • Racionalização de tempo e material; Denota um grande espectro de características desejáveis de • Redução dos custos operacionais. cuidados, incluindo eficácia, eficiência, efetividade, equidade, aceitabilidade, acessibilidade, Qualidade dos Serviços de Saúde adequação e qualidade técnicoA qualidade é um conceito abstrato, científica. de fácil descrição, mas de operacionalização Eficácia: A habilidade do cuidado, no difícil. seu máximo, para incrementar saúde. Não é fácil definir o que seja um “bom” serviço de saúde, e isso muitas vezes Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). Eficiência: A habilidade de obter o máximo de saúde com um mínimo custo. Efetividade: O grau no qual a atenção à saúde é realizada. Uma análise mais abrangente do sistema hospitalar, sob uma perspectiva nacional, realça as enormes discrepâncias na prestação de serviços de saúde de boa qualidade, tanto entre os hospitais como dentro deles. Deficiências generalizadas em estruturas, processos e resultados hospitalares são evidentes tanto em hospitais administrados pelo Estado como nos privados (LA FORGIA; COUTTOLENC, 2009, p.300). Atenção à saúde de boa qualidade possui seis dimensões principais: Quadro 4 – As dimensões principais da atenção à saúde de boa qualidade Segurança dos pacientes Evitar danos aos pacientes por parte dos serviços cujo propósito é ajudá-los. Efetividade Proporcionar serviços pautados no conhecimento científico e evitar proporcioná-los àqueles que provavelmente não se beneficiam deles. Cuidados centrados nos paciente Proporcionar cuidados que respeitem e correspondam às preferências, necessidades e valores dos pacientes individualmente e assegurar que os valores dos pacientes orientem todas as decisões clínicas. Adequação no tempo Reduzir as demoras às vezes prejudiciais tanto para os beneficiários como para os fornecedores dos serviços. Eficiência Evitar desperdício de equipamento, suprimentos, idéias e energia. Equidade Promover cuidados que não variem em qualidade em virtude de características pessoais, tais como gênero, grupo étnico, naturalidade ou status socioeconômico. Fonte: IOM, (2001) apud La Forgia; Couttolenc (2009, p. 297). A Organização Nacional de Acreditação (ONA), e outras instituições têm desenvolvido padrões que servem como orientações para o fornecimento de serviços de excelência. Segundo o IQG – Instituto Qualisa de Gestão14, o desenvolvimento da qualidade em qualquer setor do mercado depende da existência de um ambiente competitivo, da cultura empresarial, da participação dos trabalhadores e da organização dos consumidores. A globalização e o atual cenário político financeiro do país acabaram por impulsionar os hospitais a procurar novas alternativas para gestão do setor. A necessidade de garantir resultados positivos, de manter clientes satisfeitos num mercado em permanente evolução; onde tecnologias similares estão cada vez mais acessíveis, requer mais que bons produtos e serviços; requer qualidade na forma de atuar (IQG, 2006). METODOLOGIA DE PESQUISA Delineamento da Pesquisa Quanto aos procedimentos adotados, fez-se necessário a elaboração em duas fases, onde a primeira embasou-se em pesquisa teórica bibliográfica, onde houve a leitura e estudo de livros e textos utilizados durante o curso de Ciências Contábeis; leitura e estudo de livros e textos referentes a serviços de saúde, acreditação hospitalar, processamento de roupas de serviço de saúde, qualidade na saúde e ainda, manuais, leis e normas pertinentes ao tema; além de publicações consultadas por meio eletrônico. Houve ainda, pesquisa teórica documental, com análise do plano diretor da instituição (2008-2010) onde estão contempladas as diretrizes, estratégias e 14 IQG – Instituto Qualisa de Gestão – Instituição Acreditadora credenciada pela ONA, e tem a missão de disseminar os conceitos da Gestão da Qualidade no Brasil e América Latina. Orientado sempre pelo compromisso de reforçar a competitividade e sustentabilidade das Instituições de Saúde. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). metas, leitura do Estatuto documentos da instituição. e outros A segunda fase, quanto à técnica utilizada para a pesquisa, foi a de estudo de caso, que segundo Bertucci (2008, p.52): [...] “tem por objetivo apresentar aos estudantes uma determinada realidade organizacional, um problema, uma situação prática, a partir da qual utiliza toda uma metodologia didática para levar os participantes a simular situações da vida organizacional”. Como instrumento empregado para a coleta de dados, optou-se pela entrevista formal semi-estruturada, o que de acordo com Marconi e Lakatos (2004, p.279), é também chamada de assistemática, antropológica e livre, pois, o entrevistador tem liberdade para desenvolver cada situação em qualquer direção que considere adequada. Uma forma de poder explorar mais amplamente a questão. As entrevistas foram realizadas com pessoas diretamente envolvidas com o setor de processamento de roupas. As questões levantadas foram baseadas nos itens de orientação do padrão de Nível 1 do Manual Brasileiro de Acreditação – ONA (2006); no Manual de Processamento de Roupas de Serviços de Saúde: Prevenção e Controle de Riscos da ANVISA (2007); e ainda, através da observação direta participante dentro da instituição. Onde a observação participante, “Implica a interação entre investigador e grupos sociais, visando coletar modos de vida sistemáticos, diretamente do contexto ou situação específica do grupo” (MARCONI e LAKATOS, 2004, p. 277). Adotou-se uma abordagem qualitativa como critério para análise dos dados, que foi elaborada a partir da confrontação entre os dados coletados e as normas e padrões constantes dos manuais da ONA (2006) e da ANVISA (2007), onde foi possível verificar o proposto no objetivo principal desta pesquisa. Marconi e Lakatos (apud Eisman et al, 1998, p. 228), citam que: “a investigação qualitativa supõe adoção de determinadas concepções filosóficas e científicas e fórmulas específicas de coleta e análise de dados. O que origina uma nova linguagem metodológica”. Análise dos Dados Expõe-se a seguir os resultados obtidos relativos ao perfil dos entrevistados e à identificação das condições operacionais do setor de Processamento de Roupas. Os dados coletados foram confrontados e analisados de acordo com o proposto nos itens de orientação do padrão de Nível 1 do Manual Brasileiro de Acreditação – ONA (2006) e o disposto no Manual de Processamento de Roupas de Serviços de Saúde: Prevenção e Controle de Riscos da ANVISA (2007). Identificação das Condições Operacionais Levando-se em consideração as atividades desenvolvidas pelo setor de Processamento de Roupas, buscou-se através da entrevista e observação direta participante, obter informações que tornasse possível a análise das condições operacionais para atingimento do nível 1 de acreditação da ONA, que determina a segurança na estrutura física, sanitária e capacitação profissional. Capacitação do Corpo Funcional De acordo com os entrevistados nenhum possui curso especializado para a prática da função. O treinamento e orientação quanto à execução das atividades, são repassados pelos colegas mais antigos. Não há um capacitador específico proporcionado pela instituição. Em relação as dificuldades em realizar as atividades no setor, seis dos entrevistados relataram não ter dificuldades em realizar suas funções. Duas das entrevistadas da área limpa mencionam dificuldades em realizar a entrega da roupa nas unidades do hospital, devido ao peso do carrinho. Quanto ao questionamento feito à coordenadora da lavanderia sobre alguma dificuldade em realizar as atividades no seu setor, a mesma menciona ter dificuldades em entender as normas pertinentes à unidade. Segundo o Manual de Processamento de Roupas de Serviços de Saúde: Prevenção e Controle de Riscos da ANVISA (2007, p.16); O trabalhador deve ser capacitado para a execução das suas atividades no que se refere aos aspectos técnicos e operacionais, à legislação, às novas tecnologias, à prevenção e controle de infecção e a segurança e saúde ocupacional. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). Já o Manual Brasileiro de Acreditação da ONA (2006, p.147), preconiza que haja responsável técnico conforme legislação; corpo funcional habilitado e/ou capacitado, dimensionado adequadamente às necessidades do serviço. tem como objetivo a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e a promoção da saúde do trabalhador (BRASIL, 1978 – NR 5). Condições estruturais e operacionais quanto aos requisitos de segurança No tocante ao quesito: conhecimento das medidas de prevenção contra o risco ergonômico, procurou-se investigar os principais, como postura inadequada de trabalho, levantamento de peso e repetitividade. Seis dos entrevistados confirmam não ter conhecimento sobre o risco de se ter uma postura inadequada no trabalho; Quanto ao levantamento de peso, apenas dois relatam não ter conhecimento; e a respeito da repetitividade, todos assinalaram que sim, possuem conhecimento. A coordenadora da lavanderia relata que as roupas sujas são colocadas nas máquinas de lavar por estimativa, sem pesagem, pois o setor não possui balança própria para pesagem. Menciona que são lavados em média 35.000 kg de roupa/mês. E ainda, que após a lavagem, um funcionário da área suja vai até a área limpa para desempenhar, nesta unidade, as funções de centrifugação da roupa molhada e secagem na secadora. Quanto ao uso regular dos equipamentos de proteção individual, apenas uma entrevistada da área limpa, afirma não fazer uso do protetor auricular por não possuí-lo e comenta já ter comunicado a chefia de segurança do trabalho, que ficou de providenciar. Todos os respondentes afirmam haver inspeções em seus setores, por parte dos técnicos de segurança do trabalho da instituição, com o objetivo de analisar a conduta e rotina na execução das atividades. O Manual de Processamento de Roupas de Serviços de Saúde: Prevenção e Controle de Riscos da ANVISA (2007, p.95106), mencionam várias normas que visam à segurança e saúde ocupacional do trabalhador, através da implantação de vários programas. Citamos a seguir alguns exemplos: II - A NR-9 que dispõe sobre o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – PPRA, e tem como objetivo conhecer e identificar os riscos presentes no ambiente de trabalho, bem como recomendar e aplicar medidas de controle, minimização ou eliminação desses riscos (BRASIL, 1978- NR9). I - A NR-5 que dispõe sobre a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA e III - A NR-17 que dispõe sobre a avaliação da adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores cabe ao empregador realizar a análise ergonômica do trabalho conforme NR 17 (BRASIL, 1978 –NR17). IV - A NR-32 que dispõe sobre a Segurança e Saúde no Trabalho em Estabelecimentos de Saúde e tem por finalidade estabelecer as diretrizes básicas para a implementação de medidas de proteção à segurança e à saúde dos trabalhadores dos serviços de saúde, bem como daqueles que exercem atividades de promoção e assistência à saúde em geral (BRASIL, 2005 – NR32). A NR 32 foi estabelecida por meio da Portaria MTE nº. 85, de 11 de Novembro de 2005. O item 32.7 dessa NR estabelece algumas determinações específicas para a unidade de processamento de roupas de serviços de saúde. O Manual traz ainda no item 2.7 p.32 uma Nota Importante: A circulação do trabalhador entre a área limpa e a área suja deve ser evitada. A passagem de um trabalhador da área suja para a limpa deve ser precedida de banho. O Manual Brasileiro de Acreditação da ONA (2006, p.147), cita que o setor de Processamento de Roupas – Lavanderia deve possuir condições estruturais e operacionais que atendam aos requisitos de segurança conforme as normas vigentes. Sistemática da manutenção preventiva dos equipamentos Quando perguntado se há no setor um manual de operação rotineira que vise manter os equipamentos funcionando Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). adequadamente; por unanimidade, todos os entrevistados responderam que não há. Em relação à realização da manutenção preventiva dos equipamentos e máquinas, apenas um dos entrevistados comentou que esta não é realizada: “só acontece se der problema nas máquinas”. Os demais relatam que sim, bem como a periodicidade é mensal. A coordenadora do setor informou que a manutenção dos equipamentos é realizada em períodos de 15 em 15 dias, por funcionários da própria instituição. Informou ainda, haver visita do fornecedor dos produtos utilizados na lavanderia no mesmo período, com o objetivo de verificar a utilização e eficácia da lavagem das roupas. O fornecedor faz a leitura das máquinas com relação à quantidade de roupas e de produtos utilizados, a fim de mensurar o custo do kg da roupa lavada. No que se refere à limpeza diária dos equipamentos e máquinas, todas as respostas foram afirmativas. Comparando as informações contidas no Manual de Processamento de Roupas de Serviços de Saúde: Prevenção e Controle de Riscos da ANVISA (2007, p.60-65), com os dados obtidos através da coleta de dados, este traz uma série de informações relevantes e uma nota importante “a unidade de processamento de roupas é a responsável pela elaboração, implantação e implementação do Plano de Gerenciamento de Equipamentos”. Conforme o Manual, a unidade de processamento de roupas de serviços de saúde deve promover o gerenciamento dos seus equipamentos, o qual abrange: A identificação da necessidade de aquisição de um determinado equipamento; A escolha do equipamento ideal; O seu recebimento; A capacitação do operador; A operação do equipamento; O acompanhamento de seu desempenho e de eventos adversos relacionados; Os planos de manutenção preventiva e corretiva. Para acreditar Nível 1, a ONA recomenda em seu Manual (2006, p.147) que haja sistemática de manutenção preventiva e corretiva das instalações e equipamentos. Gerenciamento do controle de infecções e biossegurança Procurou-se através da coleta de dados, identificar através de questões básicas, como é realizado no setor de processamento de roupas o gerenciamento do controle de infecções e biossegurança. As respostas foram positivas de acordo comuns, quanto ao recebimento constante de orientações sobre o modo de transmissão de doenças e controle de infecções; quanto à realização de campanhas de vacinação preventiva por parte da instituição e a participação dos entrevistados nas mesmas. Os trabalhadores da unidade de processamento de roupas devem receber constantemente orientações referentes ao modo de transmissão de doenças e controle de infecções; as infecções adquiridas pelos trabalhadores na unidade de processamento de roupas estão relacionadas principalmente à não adesão das precauções padrão, quais sejam: uso de equipamentos de proteção individual - EPI; higienização das mãos e dos equipamentos de EPIs; limpeza e desinfecção das áreas e equipamentos da unidade de processamento de roupas dentre outras, estas são informações constantes do Manual de Processamento de Roupas de Serviços de Saúde: Prevenção e Controle de Riscos da ANVISA (2007, p.85-91). O setor de Processamento de Roupas, de acordo com Manual Brasileiro de Acreditação da ONA (2006, p.147), deve atender aos seguintes requisitos de: identificação, gerenciamento e controle de riscos sanitários, ambientais, ocupacionais e relacionados à responsabilidade civil, infecções e biossegurança e cumprimento das diretrizes da Comissão de Controle de Infecção. CONSIDERAÇÕES FINAIS Discussão dos resultados A diversidade de serviços que um hospital oferece, torna sua administração complexa e altamente desafiadora. A necessidade cada vez maior das organizações hospitalares executarem suas atividades dentro de processos coerentes Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). com as normas vigentes, faz com que seja imprescindível a adoção de métodos que possibilitem aumentar a eficiência e a qualidade dos serviços prestados. A pesquisa possibilitou identificar e verificar as condições operacionais e os critérios para acreditação do setor de processamento de roupas, que culminou no atendimento do objetivo geral, que são comentados a seguir: Quanto ao corpo funcional capacitado, embora a maior parte dos entrevistados afirmem não ter dificuldades na realização das atividades, baseado nas entrevistas ficou evidenciado que falta capacitação/qualificação voltada à função, para a maioria dos colaboradores. Inclusive para a coordenadora, visto que, as atividades são desempenhadas sem treinamento ou orientação proporcionada pela instituição e não possuem curso específico na área. As condições estruturais e operacionais quanto aos requisitos de segurança, que visam à saúde física e psicológica dos colaboradores, observou-se que poucos possuem conhecimento de fato. Podendo considerar como um fator de risco, que possivelmente implicará em afastamentos para tratamentos médicos. O que demandaria um outro estudo mais aprofundado, não sendo neste momento foco do trabalho: se há absenteísmo e suas causas. Um acontecimento também observado é em relação ao funcionário da área suja ir até a área limpa para desempenhar outras funções, sem tomar as medidas de segurança descritas no Manual da Lavanderia, o que também podemos considerar como um fator de risco, pois pode originar a contaminação da área limpa. Pôde-se verificar que a coordenadora possui dificuldades de entendimento das normas pertinentes ao setor. Porém um fator positivo identificado através da observação e da pesquisa teórica documental, é que a instituição possui em conformidade com legislação pertinente: Programa de Prevenção de Riscos Ambientais – PPRA; Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA; Técnico de Segurança e Saúde do Trabalho; relacionados às atividades desempenhas na lavanderia. Identificou-se através das entrevistas e da observação, que há sistemática de manutenção preventiva e corretiva dos equipamentos, realizada pelos funcionários do serviço de manutenção da instituição e as limpezas diárias dos equipamentos e máquinas por parte dos operadores. Porém, não está implantado e implementado o Plano de Gerenciamento de Equipamentos, contemplando no Manual de Processamento de Roupas de Serviços de Saúde: Prevenção e Controle de Riscos da ANVISA (2007). Falta ainda, balança para controle da quantidade de roupa a ser processada. Está situação é negativa, considerada como não conforme, pois, não atende aos requisitos dos Itens de Orientação Nível 1, no processo de acreditação. Para acreditação Nível 1, espera-se que o setor tenha gerenciamento do controle de infecções e biossegurança e cumpra as diretrizes da Comissão de Controle de Infecção hospitalar (CCIH). Muitos fatores positivos foram observados no que se refere à participação da CCIH. Sendo efetiva na orientação e acompanhamento das atividades na lavanderia, com intuito de promover a segurança contra infecções e a biossegurança dos colaboradores e usuários dos serviços ali prestados. A comissão realiza visita técnica regularmente ao local para averiguação da correta conduta e auxilia no encaminhamento dos casos, que necessitam de medidas específicas. Confecciona relatórios mensais e identifica caso haja algum evento adverso como, por exemplo, o colaborador se ferir durante o manuseio da roupa suja, com objeto pérfuro – cortante possivelmente infectado. Foi verificado que os funcionários participam de programas de vacinação preventiva específicos para a unidade, fornecidos pela instituição, contemplando várias doenças imunopreveníveis. Diante do acima exposto, foi possível concluir que a unidade de Processamento de Roupas, ainda não está em condições de acreditar Nível 1, devido ao fato de alguns processos não apresentarem conformidade com os critérios exigidos nos itens de orientação da ONA. Sugere-se que todo o processo na lavanderia seja revisto e analisado por profissionais com capacidade técnica específica, em conformidade com a legislação correspondente e se tomem às medidas de adequação condizentes, para aprimoramento dos métodos de trabalho. Sugere-se ainda, que seja promovido pela instituição, curso especifico em Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pens@r Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 23-34, julho-dezembro, 2011. Leite, Costa e Mariano (2011). lavanderia hospitalar contemplando a capacitação do calaborador deste setor, a reconhecer e aperfeiçoar os serviços de Processamento da Roupa Hospitalar, reconhecendo e aplicando corretamente as normas técnicas e os princípios científicos. 22 set. 2009. Entrevista concedida a L. Camimura. FALK, J. A. Gestão de Custos para Hospitais. São Paulo: Editora Atlas, 2001. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANVISA. Resolução – RDC Nº. 50. Brasil: 2002. G. M. LA FORGIA; B. F. COUTTOLENC. Desempenho Hospitalar no Brasil: em busca da excelência. São Paulo: Editora Singular, 2009. Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT (2000). NBR ISO 9001. Sistemas de Gestão da Qualidade - Requisitos. Rio de Janeiro: ABNT, 21 p. GODOY, S.C.B. et al. Riscos Para o Trabalhador em Lavanderias Hospitalares. Rev. Min. Enf., v.8, nº 3, p. 382-387, jul/set/ 2004. BERTUCCI, Janete L. O. Metodologia Básica para Elaboração de Trabalhos de Conclusão de Cursos. 1. Ed. São Paulo: Atlas, 2008. KOTAKA, F. Lavanderia Hospitalar: Sugestão para o planejamento do recurso físico. Revista Paulista de Hospitais. São Paulo, v. 37, n. 9/12 P.118-125, set-dez 1989. BRASIL. Ministério da Saúde. Agência de vigilância Sanitária. Legislação. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br/legis/index.htm>. Acesso em: 02 ago. 2009. BRASIL. Ministério da Saúde. Agência de vigilância Sanitária. RDC 50 ANVISA Disponível em: <http://www.saude.mg.gov.br/atos normativos/legislacaosanitaria/estabelecimentos-de-saude/infraestrutur-fisica/RES 50.pdf>. Acesso em: 20 set. 2009. BRASIL. Ministério da Saúde. Coordenação de Controle de Infecção Hospitalar. Processamento de artigos e superfícies em estabelecimentos de saúde. 2a ed. Brasília, 1994. 32p. Brasil. Ministério da Saúde. Organização Pan-Americana de Saúde. Projeto de Desenvolvimento de Sistemas e Serviços de Saúde. 1º ed. Brasília, 2003. 158p Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. 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Resumo: O presente ensaio se propõe a fazer uma análise do papel exercido pelo direito de resistência na formação dos Estados Democráticos de Direito, de forma a demonstrar que eles funcionam como uma garantia de autodefesa da sociedade frente aos abusos contra os direitos fundamentais do ser humano. O direito de resistência é considerado a partir do século XV, pois somente a partir dessa data ele pode ser visto como uma Instituição. É também nesse período que se inicia o processo em que os direitos humanos fundamentais começam a ser inseridos em todos os âmbitos da vida civil e assumem um papel essencial na proteção do indivíduo enquanto sujeito de direitos. Palavras chave: resistência, direitos humanos fundamentais. INTRODUÇÃO Desde os primórdios, a humanidade sempre exerceu o direito de resistência como forma de combater a opressão, ou seja, o povo se julgava no direito de reagir contra aqueles que tiravam sua vida, oprimiam sua liberdade e feriam o seu direito à dignidade humana. O direito de resistência encontrava, portanto, subsídios na garantia de autodefesa da sociedade e na concepção individualista de que o homem se antepõe a toda forma de poder, até mesmo, o poder do Soberano. Todavia, foi somente a partir do século XV que esse direito se desenvolveu e surgiu de uma forma institucional. Assim, um estudo adequado sobre o direito de resistência nos Estados Democráticos de Direito, não pode se iniciar sem antes propor uma reflexão a respeito do “processo de secularização”, termo utilizado para definir as mudanças vivenciadas pela sociedade a partir da ruptura entre a cultura eclesiástica e o modo de produção das ciências. A secularização teve início no período denominado iluminismo, e o seu foco recai no indivíduo, em seus direitos fundamentais, e na sustentação da idéia de que “toda sociedade política legítima deve originar-se de um ato de livre consentimento por parte do povo inteiro” (SKINNER, 1996 p. 590). O iluminismo, por sua vez, consistiu em um movimento filosófico e pedagógico que substituiu as justificações teológicas pela razão, de tal modo que o saber passou a ser fundado na razão do homem (antropocentrismo). “A humanidade descobriu seu poder no mundo e integrou essa dignidade a uma nova consciência de razão e potencialidade” (HARDT, NEGRI, 2002 p.89). “O resultado é uma teoria da revolução inteiramente política, alicerçada numa tese moderna e secularizada acerca dos direitos naturais e da soberania original do povo” (HOBBES, p. 780). Com o iluminismo, a moral é secularizada, “iniciando o processo que, no século XX, redundará na universalização dos direitos humanos” (CARVALHO, 2002, p.6) e ocasionará o nascimento do constitucionalismo e do Estado de Democrático de Direito. A Declaração de Independência Americana, de 1776, pode ser considerada um marco decisivo nessa história, pois foi o documento através do qual as Treze Colônias da América declaram sua independência da Inglaterra. O texto, escrito por Thomas Jefferson, proclamou solenemente que todos os homens foram criados iguais e que foram dotados de certos direitos inalienáveis; dentre os quais se devem colocar em primeiro plano a vida, a liberdade e a busca pela felicidade, sendo que para assegurar o uso desses direitos, os homens estabelecerão entre si governos, cuja justa autoridade emanará do consentimento dos governados. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 35-38, agosto-dezembro, 2011. Lamas (2011). Em 1787, foi discutida e aprovada a primeira e única Constituição dos Estados Unidos. Dotada de fortes características iluministas, a Carta Magna assegurava o direito de propriedade e defendia os direitos e garantias individuais do cidadão. Sob a influência desses ideais o povo francês encontrou força e argumentos para se rebelar contra a concentração do poder em uma só pessoa, o que acabou culminando na Revolução Francesa (1789), cujo lema era Liberdade, Igualdade, Fraternidade. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, resultante dessa Revolução, afirmou a existência de certos princípios superiores e imutáveis que se impõem a todos os povos, a qualquer tempo, “tais princípios os homens deveriam ter sempre diante dos olhos. Os legisladores para lhes servir de guia; os cidadãos, de salvaguarda” (FRAGOSO, 1977. p.120). Com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, o homem definitivamente passou a ser compreendido como sujeito de direitos humanos universais. Esses direitos não decorriam do fato de o indivíduo ser ou não cidadão de determinado Estado, mas sim de que os direitos humanos eram “inalienáveis, irredutíveis e indeduzíveis de outros direitos ou leis” (ARENDT, p. 324), justamente em virtude de sua essencialidade para a vida e a dignidade do homem. Isso “significava que doravante o Homem, e não o comando de Deus nem os costumes da história seria a fonte da Lei” (ARENDT, 2006, p. 324). Em uma época em que o Estado absoluto não tinha limites jurídicos, os ideais pregados pelos movimentos revolucionários norte americanos e franceses, foram essenciais para o nascimento do constitucionalismo. Movimento político, jurídico e social, através do qual emergiram as constituições nacionais. Essas Constituições, que deveriam ser escritas, celebrariam um “contrato” onde governantes e governados estariam sujeitos ao Direito - leis. Teriam, ainda, por escopo a extinção preventiva dos conflitos sociais. A Constituição seria a lei suprema de um Estado, responsável por determinar as autoridades competentes para a produção das normas jurídicas, bem como os procedimentos para a sua elaboração. Seria também responsável pela separação dos poderes e pelas garantias dos direitos individuais. Neste sentido, os ideais incorporados pelo movimento constitucionalista, acabaram influenciando o processo que culminou com o surgimento do Estado de Direito, entendido como a organização jurídica-política do poder, destinada a garantir os interesses e valores consagrados pelo seu povo. 15 O Estado de Direito pregava o respeito a hierarquia das Leis, a separação dos poderes e o respeito aos direitos fundamentais. O Estado de Direito, segundo dispõe Toledo (p. 111): Não é um fim em si mesmo, mas organização política da sociedade, normatizada pelo Direito, cuja finalidade é, em última instância, a concretização da liberdade. Apresentase então como meio, instrumento, para a realização do homem enquanto sujeito de direitos, realização somente possível dentro da organização jurídico-política do Estado. No Estado de Direito, os homens deveriam ser tratados pelo Estado com igualdade, pois, conforme as sábias palavras de Hobbes (1988, p.78): A natureza fez os homens tão iguais, quanto às faculdades do corpo e do espírito que, embora por vezes se encontre um homem manifestamente mais forte de corpo, ou de espírito mais vivo do que outro, mesmo assim, quando se considera tudo isto em conjunto, a diferença entre um e outro homem não é suficientemente considerável para que qualquer um possa com base nela reclamar 15 Sobre esse tema, SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos Direitos fundamentais. 2003, p.111. Na condição de limite da atividade dos poderes públicos, a dignidade necessariamente é algo que pertence a cada um e que não pode ser perdido ou alienado, porquanto, deixando de existir, não haveria mais limite a ser respeitado. Como tarefa imposta ao Estado, a dignidade da pessoa humana reclama que este guie as suas ações tanto no sentido de preservar a dignidade existente ou até mesmo de criar condições que possibilitem o pleno exercício da dignidade. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 35-38, agosto-dezembro, 2011. Lamas (2011). qualquer benefício a que outro não possa também aspirar, tal como ele. Ocorre, todavia, que criar uma Constituição e estabelecer um Estado de Direito não foram suficientes para proteger o indivíduo contra as arbitrariedades do Estado. Os Direitos do Homem, que se supunham inalienáveis e independentes de todos os governos, pois dispunham da proteção das leis, viram-se fragilizados justamente em razão delas. O Estado de Direito ao manter todos abaixo das regras legalmente ditadas, acabou tendo o seu objetivo principal – a proteção aos direitos humanos fundamentais - desvirtuado durante a Segunda Guerra Mundial, visto que, com base na lei alemã, vários judeus foram massacrados por Hitler. Tais acontecimentos foram provenientes de um comando normativo e violaram profundamente os direitos fundamentais. Dessa forma, o uso inadequado da lei autorizou o uso do direito de resistência, como argumento político e jurídico, na tentativa de se restabelecer a ordem. Esse direito atuou como uma manifestação de legítima defesa diante do arbítrio. Como conseqüência da interpretação errônea feita pela Alemanha nazista acerca do Estado de Direito, após a Segunda Guerra Mundial, a interpretação dada às leis teve que sofrer uma mudança significativa. Passou-se a estabelecer que há um grupo de valores fundamentais para a vida e a dignidade humana que devem ser respeitados e obedecidos, independentemente do ordenamento jurídico vigente. Desse modo, passou-se a falar não mais em Estado de Direito, mas em Estado Democrático de Direito, “definido então como organização jurídica do poder, que se assenta em alguns princípios elementares e na declaração e garantia dos direitos fundamentais” (TOLEDO, p. 114). Nesse sentido, Dahl (1997, p.25) parte do pressuposto de que “uma característica-chave da democracia é a contínua responsividade do governo às preferências de seus cidadãos, considerados como politicamente iguais.” A dignidade da pessoa humana deve funcionar como “princípio estruturante” (JARDIM, 1999, p. 317) dos Estados Democráticos de Direito, ou seja, representar o arcabouço político constitutivo basilar sobre o qual o Estado repousa o seu ordenamento jurídico. A dignidade da pessoa humana representa um princípio maior, composto por um conjunto de valores objetivos e subjetivos considerados invulneráveis e que devem ser assegurados por todo estatuto jurídico, “de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos” (MORAES, 2000, p.60) O respeito aos direitos humanos fundamentais assumiu, portanto, um novo caráter a partir da formação dos Estados Democráticos de Direito. A partir dessa perspectiva os direitos da pessoa humana passaram a ser inseridos em quase todos os âmbitos da vida civil, de forma não apenas estática, mas igualmente de modo a se buscar a sua efetivação, ou seja, a simples afirmativa de que os indivíduos possuem direitos não é suficiente, é preciso que haja a concretização dos direitos garantidos, ainda que por meio da resistência. CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante do exposto pode-se afirmar que a partir do século XV, iniciou-se um processo que defende a legitimidade do governo e das leis, que devem ser construídas a partir do consentimento popular e em função da sociedade. Neste sentido, caso apareçam situações de desigualdade e injustiça, cometidas pelo titular do poder ou quando este se abstenha de agir, o direito de resistência se instrumentaliza, de forma a recompor e atender às legítimas aspirações do povo. A formação dos Estados Democráticos de Direito representa, portanto, um marco em uma história marcada por guerras e revoluções, pois confere aos indivíduos a defesa de seus direitos fundamentais, que devem ser considerados invulneráveis, independentemente do contexto em que se encontrem. REFERÊNCIAS Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 35-38, agosto-dezembro, 2011. Lamas (2011). ARENDT, Hannah. As origens do totalitarismo. Trad. Roberto Raposo Companhia das Letras: 2006. BOCKENFORDE, Ernest Wolfgang. Estudios sobre el estado de derecho y la democracia. CARVALHO, Amilton Bueno de. e CARVALHO, Salo de. Aplicação da Pena e Garantismo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. DAHL, Robert A. Poliarquia: Participação e Oposição. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1997. FRAGOSO, Heleno Cláudio. Direito Penal e Direitos Humanos. Rio de Janeiro, Forense, 1977. HARDT, Michel. NEGRI, Antônio Império Rio de Janeiro. Ed. Record. 2002. HELLER, Herman. Teoria do Estado. São Paulo. Ed. Mestre Jou. HOBBES, Thomas. Leviatã São Paulo. Abril Cultural, 1988. JARDIM, Afrânio Silva. Bases Constitucionais para um Processo Penal Democrático in Direito Processual Penal, 7ª ed, Rio de Janeiro, Forense, 1999. MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da república Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência. 3 ed. 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Para avaliar os impactos do Fundeb e os resultados alcançados, esta pesquisa analisa o novo padrão de financiamento da educação básica introduzido pelo fundo, buscando verificar se o fundo estabelece uma política nacional de correção das desigualdades regionais e analisar a trajetória dos recursos disponíveis do valor aluno/ano aplicado nas regiões brasileiras podendo concluir se o Fundeb representa um importante avanço para o equilíbrio federativo no financiamento da educação básica, ampliando a discussão entre a política social, educacional e econômica no Brasil através da avaliação da introdução do Fundeb. Palavras chave: educação, Fundeb, financiamento, desigualdades. ABSTRACT: The objective of the study is to show the impacts of Fundeb in the financing of the public basic education Brazilian in the period from 2005 to 2009, tends for comparison the growth of Ideb in the Brazilian areas. To evaluate the impacts of Fundeb and the reached results, this research analyzes the new pattern of financing of the basic education introduced by the bottom, looking for to verify the bottom establishes a national politics of correction of the regional inequalities and to analyze the path of the available resources of the value applied aluno/ano in the Brazilian areas could be concluded Fundeb represents an important progress for the federal balance in the financing of the basic education, enlarging the discussion among the social policy, education and economical in Brazil through the evaluation of the introduction of Fundeb. key words: Education, Fundeb, financing, inequalities. INTRODUÇÃO As avaliações educacionais nacionais, seguindo situações internacionais emergentes, tiveram a implantação a partir do final dos anos 80, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) que veio a mobilizar e trazer questionamentos em torno de seus resultados e diagnósticos dos estudantes brasileiros. Com as divulgações feitas, várias críticas tiveram lugar e o governo resolveu criar outro instrumento que pudesse analisar, nacionalmente, a evolução da qualidade educacional em termos do rendimento escolar (com taxas de aprovação, reprovação e abandono). De modo previsto, a meta divulgada publicamente necessitava incluir a participação das escolas e comunidades no acompanhamento e esforço para crescimento da educação no país. Assim, foi criado, segundo o Ministério da Educação, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB)– “um indicador que combina informações de fluxo e de desempenho dos alunos, criado para promover um sistema de responsabilidade, visando à melhoria da qualidade da educação no país” (BRASIL, 2007, p.1). No mesmo sentido das metas de avaliações educacionais nacionais, para se obter bons resultados o governo também precisava garantir, por lei, fundos específicos de financiamento para a educação básica pública, que era garantida apenas pelo art. 212 da Constituição Federal. Assim, surgiram o Fundef, em 1996, que garantia recursos ao ensino fundamental e o Fundeb, em 2006, garantindo recursos para toda a educação básica pública. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. Frinhani (2011). O Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) foi estabelecido em 1996, para vigorar a partir de janeiro de 1998. Antes da sua criação, já havia uma vinculação de recursos à educação expressa no art. 212 da Constituição Federal, que determinava que 18% das receitas da União, 25% das receitas dos estados e municípios deveria ser, obrigatoriamente, aplicada "na manutenção e desenvolvimento do ensino”. O Fundef foi o primeiro fundo especifico da educação básica pública brasileira, mas garantia recursos apenas ao ensino fundamental, deixando de fora a educação infantil, o ensino médio e os cursos técnicos profissionalizantes. Para Mendes (2002, p.17), “este tipo de vinculação mostrou-se, na prática, insuficiente, porque o termo “manutenção e desenvolvimento do ensino" é muito genérico, podendo qualquer ente da federação que desejasse burlar essa obrigação, podia lançar mão de manobras contábeis de modo a registrar, como gasto em educação, despesas pouco relacionadas ao ensino. Agindo dessa forma, o governador ou prefeito escapava da restrição legal, ganhando graus de liberdade na gestão do seu orçamento, à custa do nível educacional da federação”. Visando corrigir essas distorções na educação básica pública brasileira, o governo federal implanta o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), que foi criado pela Ementa Constitucional nº. 53/06 e aprovada em 06 de dezembro de 2006 e convertida Lei nº. 11.494, de 20 de junho de 2007 que regulamenta o fundo, e passou a garantir recursos para toda a educação básica, deste a educação infantil até ao ensino médio. Este artigo busca avaliar a capacidade do Fundeb em promover o equilíbrio federativo no financiamento da educação básica, tendo por objetivo principal mostrar quais foram os impactos do Fundeb no financiamento da educação básica, tendo por comparação o Ideb das regiões brasileiras. Para responder ao objetivo principal o artigo apoiou-se em verificar se o Fundeb estabelece uma política nacional de correção das desigualdades educacionais regionais no Brasil, analisando a trajetória dos recursos disponíveis do Fundeb e do valor aluno/ano aplicado em cada região brasileira, para por fim verificar se o Fundeb representa um importante avanço para o equilíbrio federativo no financiamento da educação básica. Desta forma o presente estudo está focado nos impactos do Fundeb e suas relações com a correção das desigualdades educacionais regionais existentes no plano nacional de educação. O FINANCIAMENTO PÚBLICO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA De acordo com Júnior (2009) a educação pública no Brasil teve inicio em 1551, com o ensino sob administração dos Jesuítas que durou até 1758. Após esse período o ensino público brasileiro ficou sob manutenção e administração da família patriarcal sobe a mercê do investimento tributário das vendas de carnes nos açougues e das cachaças nos alambiques denominados na época de subsídio literário. Júnior (2009) descreve que após esse período com o crescimento das grandes cidades brasileiras o ensino passou a se sustentar através de impostos arrecadados (equivalentes ao atual ICMS) e somente em 1983 com a “emenda João Calmon” e posteriormente com a consolidação da Carta Magna em 1988, garantiu e especificou as delimitações dos financiamentos para com a Educação, por meio de Leis expressas pela Constituinte no art. 212. Para Castro (2007) a necessidade de ampliação do acesso à educação e a melhoria da qualidade dos níveis de ensino, deve estar ligado diretamente à estrutura de financiamento da educação básica, porque é importante identificar e compreender como se molda o financiamento e o gasto realizado pelo Poder Público para gerar os bens e serviços educacionais, com o fim de aferir possíveis dificuldades a serem enfrentadas. Desta forma os investimentos em educação básica no Brasil estão sendo foco de muitas análises e discussões com propósito de promover uma educação de qualidade. Segundo Education at a Glance: 16 OCDE Indicators (2007, p.1) “a instrução e a educação desempenham um papel 16 Organização para a Desenvolvimento Econômico. Cooperação Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. e Frinhani (2011). importante no desenvolvimento econômico e social dos países”. E o capital humano é um fator chave para direcionar o crescimento econômico e para desenvolver os resultados dos indivíduos, exercendo assim evidências que influenciam também sobre os resultados não econômicos. Para a Education at a Glance: OCDE Indicators (2007) a OCDE é uma organização que fornece uma série de indicadores valiosos, comparáveis e atualizados sobre o desempenho dos sistemas educativos dos países. Embora seja dada ênfase aos 30 países membros da OCDE, a organização têm incluído de modo crescente os indicadores de países parceiros, e entre eles o Brasil. Esses indicadores da OCDE analisam os gastos com a educação, o funcionamento da educação e os sistemas de aprendizagem, fazendo um panorama da educação no país. De acordo com a OCDE (2007, p.2), “a porcentagem do PIB gasto com educação demonstra a prioridade que os países dão à educação em relação a outros gastos de seu orçamento”. Segundo o Ministério da Educação (2008) atualmente o gasto público brasileiro com educação considerando as três esferas de governo é de aproximadamente 5% do Produto Interno Bruto (PIB), proporcionando um gasto com educação ainda abaixo do retratado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que recomenda que países como o Brasil devam gastar no mínimo em torno de 6% do PIB. Para Abrahão (2005, p.884) “a investigação dos gastos públicos na educação tem como objetivo compreender o valor e o uso dos recursos colocados à disposição do poder público para gerar o bem-estar social, mediante a oferta de bens e serviços educacionais para a população”. A tabela 01 mostra a evolução do gasto público com educação básica no Brasil no período de 1997 quando começou a introdução do Fundef até o ano de 2009. Tabela 1 – Gasto em Educação Básica no Brasil em relação ao PIB:1997 – 2009 Ano Valor em relação ao PIB (%) 1997 2,71 1998 3,22 1999 3,15 2000 3,03 2001 3,15 2002 3,16 2003 3,12 2004 3,14 2005 3,10 2006 3,20 2007 3,90 2008 4,00 2009 4,30 Fonte: MEC/INEP Elaborado pelo autor A Tabela 1 mostra apenas dois grandes saltos no gasto com educação básica pública, que foram em 1998 com a implantação do Fundef e 2007 com a implantação do Fundeb. Esses dois momentos foram muito significativos para a educação básica pública brasileira, porque elevaram o gasto com educação básica em relação PIB em aproximadamente 0,51 pontos em 1998 com a implantação do Fundef e aproximadamente 0,7 pontos em 2007 com a implantação do Fundeb. Após a implantação do Fundeb podemos observar que os gastos públicos com educação básica continuam a crescer ano a ano proporcionando uma parcela um pouco mais significativa do PIB destinada a educação básica pública brasileira. Para Abrahão (2005, p.843) “a estrutura de financiamento da educação é fortemente baseada em impostos, que são recursos gerais tomados à sociedade”. Isto significa que parte expressiva dos recursos, principalmente de Estados, Distrito Federal e Municípios, são provenientes da arrecadação tributária, sobretudo em razão da vinculação de impostos. Conforme Castro e Fernandes (1999) a educação pública no Brasil segue normas legais vigentes, devendo ser realizada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, que têm a responsabilidade Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. Frinhani (2011). e competência pela manutenção e expansão dos sistemas de ensino. De acordo co Abrahão (2005, p. 843): “a União deve aplicar recursos na execução de programas e ações próprias, além de transferir recursos para os sistemas estaduais e municipais. Na composição de suas receitas, os Estados somam os recursos recebidos da União aos provenientes de suas fontes, os quais são utilizados na manutenção e expansão de seus sistemas de ensino. Por sua vez, na composição dos recursos destinados à manutenção e expansão de suas redes de ensino, os municípios recebem recursos da União e dos Estados, os quais são somados aos seus recursos próprios. Ou seja, se seguido o estabelecido pela norma legal, o regime de financiamento entre os entes federados deve se pautar pela colaboração, além do que a ação supletiva e redistributiva da União e dos Estados estão condicionadas à plena capacidade de atendimento e ao esforço fiscal dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”. Para Castro (2007, p.12) “a forma de financiamento da educação reserva um determinado percentual de valor arrecadado mediante impostos que tem sido uma das medidas políticas mais importantes para garantir a disponibilidade de recursos para o cumprimento de responsabilidades do poder público na área de educação”. Abrahão (2005, p.855), mostra em um artigo publicado na revista Educação e Sociedade “que é importante alertar que os baixos gastos não podem ser automaticamente associados com baixa qualidade da educação oferecida”. Mas, entretanto quando esses números foram tão baixos como os do Brasil ao longo do tempo não há como não se questionar os possíveis resultados educacionais brasileiros. O FUNDO DE MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA E DE VALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO (FUNDEB) Segundo o Ministério da Educação (2008) o FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação visa aperfeiçoar o processo de financiamento e gerenciamento orçamentário da educação básica, garantindo o aumento de recursos para este setor, bem como estabelecer uma política nacional de redução das desigualdades regionais. Para o Ministro da educação Fernando Haddad (2008) num artigo publicado no site no Ministério da Educação (MEC), “O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) busca promover o alcance das metas do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), em que a principal meta a ser alcançada é a elevação da parcela do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação, saltar de 3,9% para 6%”. Se observarmos no histórico de investimentos em educação no Brasil, o país está longe de atingir está meta. Mas na opinião do ministro os rumos estão bem definidos, e o país vai cumprir boa parte das metas do PDE. O Ministro ainda citou que “o mais difícil para o país seja promover uma intensa mobilização e sensibilização da sociedade para os gastos com educação e cobrar maior responsabilidade dos gestores públicos”. Segundo Vasquez (2005, p.26) “o financiamento de políticas públicas através da constituição de um fundo realiza-se pela destinação de receitas específicas que por lei, se vinculam à realização de determinados objetivos”. Assim a Lei 9.424 que descreve que “o Fundeb é um fundo de natureza contábil, criado no âmbito de cada Estado, instituído automaticamente no ano de 2007, formado com recursos dos próprios Estados e municípios”. De acordo com a cartilha do Fundeb (2007) a origem das receitas do fundo está ligada diretamente a uma cesta de impostos dos estados, do Distrito Federal e municípios, formando um montante de recursos que são aplicados pela união na educação básica pública. Segundo o manual de orientações do Fundeb (2008) essa cesta de impostos que Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. Frinhani (2011). financia o Fundeb é composta por 20% de vários tributos: Fundo de Participação dos Estados (FPE), Fundo de Participação dos Municípios (FPM), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre Produtos Industrializados (proporcional às exportações (IPIexp), Imposto sobre Transmissão Causa Mortis (ITCMD), Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), Imposto sobre Renda e Proventos incidentes sobre rendimentos pagos pelos municípios, Imposto sobre Renda e Proventos incidentes sobre rendimentos pagos pelos estados, cota-parte de 50% do Imposto Territorial Rural (ITR) devida aos municípios. A tabela 2 seguinte mostra a origem dos recursos do Fundeb com seus respectivos crescimentos ao longo dos anos. Tabela 2 – Origem das Receitas do FUNDEB: 2007 – 2009 (MEC – Cartilha do FUNDEB) IMPOSTOS ARTIGO CF 2007 2008 2009 ITCMD Art. 155, inciso I 6,66% 13,33% 20% ICMS Art. 155, inciso II 16,66% 18,33% 20% IPVA - (participação estadual) Art. 155, inciso III 6,66% 13,33% 20% Competência residual (part. estadual) Art. 157, inciso II 6,66% 13,33% 20% ITR (participação municipal) Art. 158, II 6,66% 13,33% 20% IPVA - (participação municipal) Art. 158, III 6,66% 13,33% 20% ICMS (participação municipal) Art. 158, IV 16,66% 18,33% 20% FPE Art. 159, I, alínea “a” 16,66% 18,33% 20% FPM Art. 159, I, alínea “b” 16,66% 18,33% 20% IPIexp (participação estadual) Art. 159, II 16,66% 18,33% 20% IPIexp (participação municipal) Art. 159, II c/c L.C. n.º 16,66% 18,33% 20% 61/89, art. 5. º ICMS Desoneração de Exportações (LC 87/96) 16,66% 18,33% 20% Receitas da dívida ativa tributária relativa aos impostos elencados neste quadro, bem como juros e multas eventualmente incidentes. Ganhos auferidos em decorrência das aplicações financeiras dos saldos da conta do FUNDEB. Complementação da União: I - R$ 2.000.000.000,00 (dois bilhões de reais), em 2007; II - R$ 3.000.000.000,00 (três bilhões de reais), em 2008. III - R$ 4.500.000.000,00 (quatro bilhões e quinhentos milhões de reais), em 2009; IV – 10% do montante resultante da contribuição dos Estados e Municípios, a partir de 2010. Para o Ministério da Educação (2008) Conforme descrito na cartilha do tanto o Fundef como o Fundeb são dois Fundeb (2007, p.9) observa-se que, no caso fundos de natureza contábil com finalidades das receitas sobre as quais já era feito o de financiar a educação pública brasileira e desconto em favor do FUNDEF (ICMS, FPE, melhorar a qualidade do ensino público no FPM, IPIexp), o percentual passará de 15 Brasil. Ainda conforme o Ministério da para 20% em três anos, ou seja, haverá um Educação (2008) esses dois fundos incremento de 1,66 ponto porcentual a cada representam um avanço no ensino público ano (5 / 3 = 1,66). No caso das demais nacional, porque garantem recursos receitas de impostos e transferências, que financeiros provenientes de impostos para a não integravam a base de contribuição para educação, desta forma o Fundeb foi o Fundef (IPVA, ITR, ITCMD), o porcentual implantado com o objetivo complementar e de contribuição passará de 0% para 20% em corrigir as falhas ocorridas no Fundef. três anos, com incremento anual de 6,66 Para Fernandes (2007) o efeito pontos porcentuais ao ano (20 / 3 = 6,66). financeiro da mudança do Fundef para o Fundeb, decorreu de uma aplicação dos Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. Frinhani (2011). mecanismos redistributivos de transferências de recursos pelo número de alunos atendidos. Fernandes (2007) ainda afirma que a equalização promovida pela redistribuição de recursos do governo em cada estado, não era suficiente para promover a redução das desigualdades regionais e proporcionar uma melhoria qualitativa do ensino brasileiro. Desta forma a mudança ocorrida teve como principal foco a participação da União na complementação dos recursos do fundo. O ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA (IDEB) De acordo com o Ministério da Educação (2007) “o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) foi criado em 2007 para medir a qualidade de cada escola e de cada rede de ensino. O indicador é calculado com base no desempenho dos estudantes em avaliações do Inep e em taxas de aprovação”. Segundo o Ministério da educação (2007) esse indicador mede a qualidade da educação brasileira e foi criado para facilitar o entendimento de todos através de uma escala de notas que varia de zero a dez. A partir deste instrumento, o ministério da educação traçou metas de desempenho bianuais para cada escola e para cada rede de ensino no país até o ano de 2022. Para Fernandes, “um sistema educacional que reprova sistematicamente seus estudantes, fazendo com que grande parte deles abandone a escola antes de completar a educação básica, não é desejável, mesmo que aqueles que concluem essa etapa de ensino atinjam elevadas pontuações nos exames padronizados. Por outro lado, um sistema em que todos os alunos concluem o ensino médio no período correto, não é de interesse, caso os alunos aprendam muito pouco na escola. Em suma, um sistema de ensino ideal seria aquele em que todas as crianças e adolescentes tivessem acesso à escola, não desperdiçassem tempo com repetências, não abandonassem a escola precocemente e, ao final de tudo, aprendessem”. (2007, p.1). Segundo o Inep/MEC (2007) o Ideb é uma variável importante na análise dos índices educacionais brasileiros, porque através do Ideb o governo federal tem informações sobre o desenvolvimento da educação nacional, nas regiões, nos estados, nos municípios e nas escolas. O Ideb também verifica o indicador de rendimento escolar, baseado nas taxas de aprovação em todos os níveis da educação nacional. OS IMPACTOS DO FUNDO DE MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA E DE VALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO (FUNDEB) NO BRASIL Esta parte do estudo visa analisar os efeitos e impactos do Fundeb no financiamento da educação básica brasileira nos anos de 2005 até 2009, avaliando o primeiro fundo especifico da educação básica pública brasileira. A fim de conhecer as transformações promovidas pela aplicação do Fundeb, partiuse de análises referentes aos anos de 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009, períodos em que ocorreram o processo de implantação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Assim pretende-se avaliar os primeiros impactos da introdução do fundo como instrumento de financiamento da educação básica nacional. O número de matrículas na educação básica pública Segundo Andrade (2007, p.3) “o Brasil, nos últimos 15 anos, observou-se um intenso crescimento da oferta de matrículas na educação básica”. Porém este estudo nos mostra somente a evolução das matriculas durante a implantação do Fundeb no período dos anos de 2005 até 2009, onde ocorreram quedas nas matriculas da educação básica pública nacional. A tabela 03 seguinte nos mostra a variação nas regiões brasileiras e no Brasil, considerando todas as matrículas na educação básica pública nacional. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. Frinhani (2011). Tabela 3 - Variação das Matrículas na Educação Básica pública por regiões brasileiras nos ano de 2005 a 2009 Brasil / Regiões Brasil 2005 49.040.519 2006 48.595.844 2007 46.643.406 2008 46.131.825 2009 45.270.710 Norte 5.007.618 5.020.031 4.866.406 4.819.075 4.828.574 Nordeste 16.279.403 16.014.812 15.045.706 14.742.522 14.355.067 Sudeste 18.182.860 17.970.601 17.479.482 17.448.332 17.098.937 Sul 6.232.904 6.252.475 6.064.038 5.985.542 5.876.922 Centro- Oeste 3.337.734 3.337.925 3.187.774 3.136.354 3.111.210 Fonte: MEC/INEP Elaborado pelo autor. Para Andrade (2007, p.3), diz que: “em relação ao Ensino Médio, a oferta de matrículas, apesar de estar muito longe da universalização (e, legalmente, não ter oferta pública e gratuita obrigatória, como ocorre com o Ensino Fundamental) apresentou um explosivo crescimento durante os anos 90. De todos esses foi o seguimento que mais expandiu. O volume de matrículas mais do que dobrou, passando de 3,7 milhões, no início dos anos 90, para 9 milhões em 2006. Esse vigoroso crescimento permitiu que a taxa de atendimento dos jovens de 15 a 17 anos passasse de 20% no início dos anos 90 para 45% atualmente. Ainda assim, muito longe do que seria a universalização do acesso neste nível de ensino”. Mas o que mudou? A quantidade de matriculas em 2005 estava quase alcançando os 50 milhões e nos anos seguintes começaram a diminuir. Essa redução foi proveniente da implantação do Fundeb, que obrigou o governo federal a fiscalizar ainda mais os repasses dos recursos. Segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad/IBGE, 2008) as matriculas na educação básica do país sofreram queda de 4,89% de 2005 para 2007. Entretanto a Pnad/IBGE, (2008) ressaltou que a redução não significa que há menos crianças na escola, porque a taxa de atendimento escolar está crescendo a cada ano. Já para o ministro da educação Fernando Haddad em uma nota divulgada no site do MEC (2008), “o que ocorre é que a metodologia do censo escolar brasileiro está muito mais apurada a cada ano e desta forma estamos evitando a dupla contagem”. Segundo os dados do Educacenso (2007) “essa redução do número de matriculas não surpreendeu o Ministério da Educação (MEC), que já desconfiava que os dados dos censos escolares anteriores estivessem inflados”. Dos 2,9 milhões de alunos a menos, aproximadamente 2 milhões eram da rede pública. O governo desconfia que prefeituras ou secretarias estaduais informavam um número maior de alunos para receber mais verbas federais, principalmente a do Fundeb. Para o Ministério da Educação (2008) “o principal indício de problemas no antigo censo eram as discrepâncias em relação à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE. Porque em 2006 a Pnad estimou em 36 milhões o número de estudantes de ensino fundamental e médio em escolas públicas, enquanto o censo escolar apontou a existência de 37,6 milhões de matrículas nos mesmos níveis. Uma diferença, portanto de aproximadamente 4,4%”. O governo enfatiza que o aumento da taxa de escolarização identificado pela Pnad e a redução das matriculas indicadas pelo educacenso, mostram um impacto proveniente da implantação do Fundeb, que Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. Frinhani (2011). obrigou o governo federal a fazer uma melhor fiscalização dos recursos financeiros repassados aos estados e municípios referentes a quantidade de matrículas para uma melhor fidelidade dos dados educacionais nacionais. O crescimento do valor aluno/ano O Brasil é um dos países com menor gasto por aluno/ano, segundo relatório da OCDE (2007). O valor investido em cada estudante do ensino básico público ainda está muito abaixo do estipulado pelo Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Para o Inep/MEC (2007) “a evolução desses gastos com educação deve levar em conta todo o dinheiro investido pela União, estados e municípios considerando o crescimento da matrícula e a melhoria dos investimentos para cada nível e modalidade de ensino da educação básica nos próximos anos”. Para o ministro da educação Fernando Haddad em uma nota divulgada no site do ministério da educação (MEC 2007) “o PDE e o Fundeb vão aumentar em 0,4 ponto do PIB os investimentos em educação até 2010”. Disse ainda que “os investimentos com a educação vão depender muito dos esforços dos estados e municípios brasileiros para que até 2021 o país atinja a meta de 6% do PIB estipulada pela OCDE”. Segundo dados do ministério da educação (MEC 2008) os estados e municípios estão cumprindo com a obrigação prevista na constituição federal de aplicarem na educação um mínimo de 25% do total de receitas provenientes de tributos, já incluídas as transferências de impostos. A tabela 04 seguinte mostra o valor aluno/ano repassado para cada região do Brasil com recursos do Fundeb no período de 2005 a 2009. Tabela 4 - Valor anual médio em R$ por aluno com recursos do FUNDEB repassado para cada Região brasileira, no período de 2005 a 2009 Brasil / Regiões Ufs 2005* 2006 2007 2008 2009 Brasil 1.110,10 1.411,53 1.495,55 1.699,86 1.686,89 Norte 1.223,86 1.500,10 1.604,40 1.908,41 1.848,57 Nordeste 7.40,35 892,13 1.094,84 1.280,71 1.332,75 Sudeste 1.292,59 1.485,58 1.706,13 1.822,80 1.769,41 Sul 1073,29 1.429,69 1.532,33 1.742,86 1.801,11 Centro-Oeste 1.220,38 1.413,75 Fonte: MEC/INEP Elaborado pelo autor 1.540,08 1.744,54 1.682,63 Os resultados apresentados na tabela 04 nos mostram grande crescimento no valor aluno/ano com recursos do Fundeb repassado para cada região. Segundo IBGE no final de 2005 a inflação fechou em 5,69% (IPCA), em 2006 fechou com 3,14% (IPCA), em 2007 fechou com 4,93% (IPCA), em 2008 fechou com 5,90% (IPCA) e em 2009 fechou com 4,31% (IPCA). Fazendo uma comparação entre o crescimento dos recursos do Fundeb e os índices de inflação pode-se observar que os crescimentos do fundo estiveram acima dos índices de inflação nos períodos de 2005/2006, 2006/2007 e 2007/2008, ficando abaixo somente no período 2008/2009. De acordo com MEC (2008) um segundo indicador importante da análise do financiamento da educação refere-se ao impacto redistributivo do valor aluno/ano destinado aos Estados e o Distrito Federal proporcionado pelo Fundeb. O Ministério da Educação (2008) ainda afirma que o valor por aluno/ano antes e depois da implantação do Fundeb, principalmente nas regiões mais carentes do país, não deixa dúvidas quanto a sua relevância como política pública. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. Frinhani (2011). A evolução do índice de desenvolvimento da educação básica (IDEB) Segundo dados do Inep/MEC (2008) a maioria dos estados estão atingindo as metas fixadas pelo governo federal, e esses resultados devem ser comemorados pelo fato, de não só o índice ter aumentado, mas sim pelo motivo do país ter agora um indicador quantitativo aceito em todos os segmentos da sociedade (inclusive por educadores), que pode ser utilizado para monitorar a evolução da qualidade da educação no Brasil e cobrar resultados dos responsáveis pelas políticas educacionais do país. A tabela 05 seguinte mostra o crescimento das notas médias do Ideb em todas as regiões do Brasil, com destaque para a região Nordeste que apresentou um expressivo crescimento de 2005 para 2009, se aproximando da média nacional. Essa aproximação mostra que o Brasil está conseguindo corrigir as desigualdades regionais educacionais existentes no Plano Nacional da Educação, que busca ofertar ensino de qualidade em todas as regiões do território nacional. A tabela 05 seguinte mostra as notas médias do índice de desenvolvimento da educação básica por região e nacional nos anos de 2005, 2007 e 2009. Tabela 5 – Nota média do IDEB da educação básica pública brasileira por Região, no período de 2005, 2007e 2009 Brasil / Regiões Ufs Brasil 2005 3,567 2007 3,797 2009 4,071 Norte 3,033 3,228 3,708 Nordeste 2,933 3,217 3,520 Sudeste 4,033 4,196 4,372 Sul 3,967 4,247 4,510 Centro-Oeste 3,567 Fonte: MEC/INEP Elaborado pelo autor 3,889 4,247 Para o Ministério da Educação (2008), um dos fatores que pode estar por trás do crescimento do Ideb em quase todo o país é o aumento recente dos recursos financeiros do Fundeb, que destina um fundo de investimento na educação básica, que deve ser convertido em índices de desenvolvimento de qualidade da educação pública. O Fundeb se tornou um fator de grande influência na obtenção de melhores índices educacionais, proporcionando um grande crescimento no valor médio aluno/ano e aumentos significativos no Ideb que pode ser considerado mais um impacto do fundo, comprovando a importância de investimentos na educação básica nacional. Mas um ponto importante que deve ser lembrado, é que só aumento de dinheiro na educação básica não resolve, porque o Brasil gasta pouco com educação em relação aos países da OCDE. Mas independente do valor gasto esses recursos devem ser bem investidos a fim de melhorar a qualidade do ensino e atingir toda a educação básica nacional e também todas as regiões do país e por isso deve ter uma maior visualização sobre a real situação da educação básica brasileira. A evolução do gasto com educação básica pública em relação ao PIB Segundo o Inep/MEC (2007) “a evolução de gastos com educação leva em conta todo o dinheiro investido pela união, estados e municípios, considerando o Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. Frinhani (2011). crescimento da matrícula e a melhoria dos investimentos para cada nível e modalidade de ensino da educação básica”. Para o Inep/MEC (2008), “os investimentos dos recursos na área educacional compreendem os valores financeiros brutos aplicados pelo setor público no atendimento de demandas educacionais, como no custo de bens e serviços - inclusive bens de capital - e nas transferências, excetuando-se a depreciação e a amortização dos investimentos em estoque. O conceito utilizado para a agregação corresponde à finalidade dos recursos alocados por área de atuação”. De acordo com o Inep/MEC (2008) a cobertura dos investimentos públicos em educação compreende a formulação de política, manutenção e desenvolvimento do ensino, a expansão e melhoria das escolas de diversos níveis e modalidades de ensino, dos estabelecimentos de educação, dos programas de assistência ao estudante, entre outros. O gráfico 01 seguinte apresenta o comportamento do gasto em educação básica em relação ao PIB, no período de 1997 até 2009. Gráfico 1 – Gasto em educação básica publica em relação ao PIB 1997 – 2007. Fonte: MEC/INEP Elaborado pelo autor Os resultados no gráfico 01 mostram um bom crescimento no gasto com educação básica pública no ano de 1998, quando ocorreu a implantação do Fundef e somente depois após a introdução do Fundeb em 2007 que novamente ocorreu um novo expressivo aumento. Após a introdução do Fundeb o Brasil tem mostrado um bom crescimento no gasto público com educação básica, destacando a importância da elevação de recursos neste setor. Já para o Inep/MEC (2008), o crescimento do gasto com educação em relação ao PIB foi obtido devido à implantação de um novo fundo de financiamento da educação, o Fundeb, se tornando o principal agente financiador da educação básica pública nacional, e configurando em mais um impacto proveniente da implantação do fundo. O Fundeb se mostra muita eficiente em garantir recursos específicos para a educação básica pública brasileira, combinando transparência no número de matriculas, crescimento no valor aluno/ano, melhores índices educacionais e proporcionando evolução nos gastos públicos com educação básica. CONCLUSÃO Com objetivo de analisar os efeitos e impactos do Fundeb no financiamento da educação básica brasileira no período de 2005 a 2009, o presente estudo verificou que o número de matriculas na educação básica pública, o crescimento do valor aluno/ano, a evolução do Ideb e a evolução do gasto com educação básica pública em relação ao PIB foram impactos provenientes da implantação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação básica e de Valorização do Magistério (Fundeb), verificando que o Fundeb estabelece uma política de correção das desigualdades educacionais regionais no Brasil. Para Vasquez (2005, p.63), “as desigualdades regionais no financiamento da educação nacional têm origem no comportamento dos impostos e das transferências que compõem os fundos estaduais, a partir das receitas vinculadas disponíveis em cada unidade federativa. Tendo em vista essas diferentes capacidades de financiamento dos fundos estaduais no plano nacional, o mecanismo do fundo estabelece uma política de correção dessas desigualdades por meio da participação da união no financiamento do programa”. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 39-52, agosto-dezembro, 2011. Frinhani (2011). Para o ministério da educação (2007) “a política de correção das desigualdades regionais proposta pelo Fundeb é realizada por meio da complementação de recursos federais aos fundos estaduais, em que o volume de recursos vinculados ao Fundeb não seja suficiente para garantir um valor médio por aluno superior ao valor mínimo estabelecido nacionalmente”. O Fundeb não tem o objetivo de garantir um valor anual médio por aluno igual para todos os estados e regiões do Brasil, porque os custos são diferenciados de região para região, mas sim garantir recursos mínimos suficientes que conduzam a uma educação de qualidade em todas as regiões do território nacional, a fim de garantir um crescimento estipulado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Assim pode-se concluir que o Fundeb busca promover um equilíbrio federativo no financiamento da educação básica pública brasileira deixando visível a trajetória de todos os recursos financeiros educacionais aplicado a cada estado e região do Brasil. Destaca-se ainda a continuidade deste estudo e a importância da continuidade do Fundeb e o Ideb, porque os mesmos têm objetivos a serem atingidos até 2022 com o intuito de ampliar o debate sobre o financiamento e a gestão da educação brasileira, visando garantir um ensino público de qualidade destinada a todos os cidadãos. Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do magistério e das outras providências. Brasília, DF, 1996. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L942 4.htm>. Acesso em: 14 de Junho de 2009. REFERÊNCIAS _______. Ministério da Educação. O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Brasília, DF: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC), 2007. ABRAHÃO. J. 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RESUMO: Nos últimos anos, toda a comunidade acadêmica e a sociedade brasileira tem se deparado com a exigência estabelecida pelo Governo Federal, através da Lei 10.639/2003, de se trabalhar com o ensino da cultura afro-brasileira e africana em diferentes níveis educacionais. Tal determinação torna-se muito válida na busca de um ensino mais humanista e humanitário, que compreenda as diversidades e valorize a questão da multiculturalidade. Por outro lado, deparamonos com sérias barreiras estabelecidas por uma visão essencialmente eurocêntrica a respeito dos africanos, visão esta que contaminou excessivamente os materiais didáticos e mesmo pesquisas acadêmicas concernentes aos africanos. Diante desta situação, o presente artigo objetiva relacionar as possibilidades de se estudar, entender e também de se fazer uma história da África de forma menos enviesada e que tenha os africanos como atores, e não apenas como expectadores ou vítimas do processo colonizador europeu. Tal proposta se torna pertinente, uma vez destacada a atualidade e a importância do assunto em nosso cotidiano e sua necessidade cada vez maior nos currículos acadêmicos e escolares. Palavras chaves: educação, eurocentrismo, história da áfrica. ABSTRACT: In recent years, the entire academic community and Brazilian society has been faced with the requirement established by the Federal Government, through the Law 10.639/2003, to work with the teaching of culture african-Brazilian and African in different educational levels. Such a determination becomes very valuable in the search for a more humanistic and humanitarian education, he understands and values the diversity issue of multiculturalism. On the other hand, we face serious barriers established by an essentially Eurocentric view about the Africans, a view that excessively contaminated materials, and even academic research pertaining to Africans. In this situation, this article seeks to relate the possibilities of studying, understanding and also to make a story of Africa in a less biased and has the Africans as actors, not only as spectators or victims of European colonization process. This proposal becomes irrelevant, since highlighted the timeliness and importance of the matter in our daily life and its increasing need in academic curricula and school. Keywords: education, eurocentrism, african history. INTRODUÇÃO Nos últimos anos a educação brasileira, no âmbito de suas escolas públicas e privadas, além do ensino de nível superior, vem adotando medidas, tardias é verdade, a respeito da valorização da cultura Afro-Brasileira e Africana no ambiente escolar; tanto em nível de ensino propriamente dito, como também no campo da pesquisa em geral e, por extensão, na produção dos materiais didáticos a serem trabalhados nas escolas. Ao fazer isto, o Ministério da Educação de nosso país possibilita que se inicie um processo para que se salde uma dívida histórica com os povos que tanto se mostraram importantes para a formação do Brasil que conhecemos. A omissão da abordagem da temática racial, que engloba preconceito, racismo e discriminação, vem à tona como um elemento que colabora para a inferiorização daqueles que tanto se doaram para a construção do país em que vivem. Esta situação em muito colabora para as práticas de preconceito e discriminação contra os negros, o que se manifesta em todos os campos da sociedade e, também e infelizmente, no ambiente escolar. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Hot e Campos (2011). Práticas de violência física e a utilização de apelidos de tom pejorativo para se identificar alunos negros consistem num grande problema enfrentado pelas instituições de ensino brasileiras. Esta situação demonstra que as crianças e os jovens negros ainda estão sob o jugo de práticas racistas e discriminatórias, algumas vezes claras e outras mitigadas e disfarçadas, mas todas herdadas de uma imagem de dominação e de superioridade lançada sobre os negros. Os profissionais da educação, muitas vezes sem a devida consciência e orientação, acabam, mesmo que inconscientemente, por colaborar para a ocorrência e o estabelecimento de práticas de discriminação racial. Pode-se dizer que tal fato se deva à formação acadêmica desses profissionais e ainda aos materiais de que dispõem para realizar seu trabalho. O longo silêncio da escola e da academia sobre as dinâmicas das relações étnico-raciais acabou por permitir, e até mesmo por legitimar, que fosse transmitida aos alunos a ideia de uma suposta “superioridade branca”, repetida e presente nos materiais didáticos, na organização e escolha das turmas e nas próprias abordagens dos conteúdos escolares, com destaque para as disciplinas de História, Sociologia, Geografia, Antropologia e para o campos das Artes, onde incluímos a Literatura. Nesse sentido, pensamos que a atitude de silenciar-se diante do problema não apaga magicamente as diferenças e, ao contrário, permite que cada um construa, a seu modo, um entendimento muitas vezes estereotipado acerca do outro que lhe é diferente. No campo da educação, para se promover uma atitude ética, voltada para o respeito e para o convívio harmônico com a diversidade, deve-se partir de temáticas significativas do ponto de vista ético, propiciando condições desde a mais tenra idade – e que seja também um processo contínuo durante a formação de nível superior – para que professores e alunos desenvolvam a capacidade de diálogo e para que tomem consciência das próprias raízes históricas a que pertencem, que ajudaram e ajudam a constituir a cultura e formar a nação brasileira, pois o preconceito e o racismo correspondem a formas da violência mais vil. Diante disso, pode-se perguntar quais as situações que temos possibilidade de mudar em nosso ambiente escolar? Qual seria a nossa contribuição concreta para viabilizar a conscientização acerca dessa temática em sala de aula? Como desenvolver pesquisas acadêmicas, de mercado e políticas públicas que tenham o negro como protagonista e não apenas como coadjuvante ou mesmo com objeto passivo dos processos históricos? Obviamente, em termos da educação de nível superior, estas são sérias lacunas existentes na pesquisa, no ensino e, pode-se ainda inferir, na própria cultura educacional brasileira, fruto de interpretações importadas de outros centros, como a Europa. Diante destas questões e apontamentos, identifica-se na Lei 10.639/2003 e na Lei 9.131/1995 iniciativas no sentido de se valorizar a importância das relações étnico-raciais no ensino escolar e na pesquisa acadêmica das Instituições de Ensino Superior. Para a promoção da real democracia racial é necessária a promoção do respeito mútuo, do reconhecimento das diferenças, da possibilidade de se falar sobre as diversidades sem medo, receio e sem preconceito. Sabe-se que o Brasil é um país absolutamente rico em diversidade étnica e cultural, e, portanto, plural e multicultural em sua identidade. No entanto, mesmo a diversidade marcando a gênese da vida social brasileira17, é comum observarmos historicamente a existência de estereótipos que alimentam preconceitos, relações de discriminação e exclusão social, que impedem muitos brasileiros de terem uma vivência plena de sua cidadania. Atualmente, vivemos um momento marcado pela busca por políticas públicas voltadas para a igualdade e para o desenvolvimento de oportunidades da população negra18. Esta ação tem seus 17 Conforme podemos ver em autores como Gilberto Freyre e Roberto da Matta, além de outros. 18 A este respeito vale que se diga sobre os muitos esforços da UNESCO em parceria com muitas universidades brasileiras para desenvolver programas e cursos que valorizem o olhar e as políticas de igualdade diante da diversidade Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Hot e Campos (2011). pontos reservados por lei, na Constituição Federal de 1988, e vivemos com a esperança de que somente através da educação conseguiremos diminuir o nível de exclusão vivenciado pelos alunos que sofrem com o mal do preconceito e da discriminação racial na escola em seus mais diferentes níveis, do ensino básico à educação superior. Nesse contexto, acreditamos que a escola (aqui considerada como locus educacional e de formação, que vai da educação básica à superior), por ser um espaço privilegiado de formação, desempenha um importante papel no processo de superação da discriminação e de construção de uma sociedade mais justa, onde as diferenças sociais, culturais e individuais sejam utilizadas para enriquecer as interações e a aprendizagem entre os seres humanos. O educador que se preze não pode estar disposto a entrar em sala somente para explicação teórica das matérias constantes no currículo escolar, mas deve se dedicar ainda a entender as diferenças, os problemas, as dificuldades que possam decorrer da não valorização das culturas afro-brasileiras. As linhas deste artigo visam oportunizar aos que ensinam e aprendem o conhecimento das histórias de dignidade, de conquista e criação de culturas e povos que constituem a sociedade brasileira, e propõe, sobretudo, contribuir para a formação de novas mentalidades, pois a diversidade valoriza a singularidade de cada um e de todos. A compreensão da diversidade cultural é, antes de qualquer coisa, um exercício de alteridade, de compreensão e convivência com o outro. étnica e racial. Uma dessas iniciativas é o grupo AMDE – Cátedra UNESCO, criado pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), que oferece vários cursos nesse sentido, tais como Gênero e Diversidade na Escola (GDE), Educação para a Diversidade e Cidadania (EDC) e Gestão de Políticas Públicas com ênfase em Gênero e Raça (GPP GeR).Vale, também, destacar a iniciativa de algumas instituições privadas nesse sentido, como a Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu (FACIG), que criou uma disciplina comum a todos os cursos, Relações Étnicas e Raciais, onde profissionais especializados na área têm a oportunidade de debater esta questão junto aos alunos. Para tanto, se fará um histórico acerca de autores e trabalhos muito respeitados nos meios acadêmicos brasileiro e mundial, apontando aqueles que colaboraram para uma visão distorcida e mesmo preconceituosa sobre os africanos, assim também como aqueles que vem se esforçando por superar essas chagas históricas, trabalhando pela valorização de uma história escrita a partir e pelos africanos, não apenas sobre eles. Isto torna-se importante de ser dito, uma vez que os níveis iniciais e básicos da educação consomem e compram os argumentos produzidos pela academia, ou seja, a história que se escreve na sala da universidade será aquela lida e estudada em sala de aula nas escolas brasileiras. O que se escreve sobre a África Para identificar como as visões estereotipadas sobre os africanos contaminaram os espaços escolares, tornase necessário, inicialmente, fazer um apanhado de autores e livros acadêmicos que marcaram época e tornaram-se clássicos em termos das diferentes caracterizações que realizaram. Através dos textos de John Thornton (2004) e Alberto da Costa e Silva (2003) podemos notar inicialmente as preocupações desses dois estudiosos em torno da forma de como se fazer uma história da África. De início, logo nos deparamos com os problemas das abordagens eurocêntricas onde, na ânsia de se fazer uma história dos vencedores (dos chamados “homens de iniciativa”), autores como o britânico H. Trevor-Hopper (TREVOR-HOPPER, op. cit. SILVA 2003), não consideram possível a existência de uma história da África subsaariana apenas com atores (ou agentes) propriamente africanos. Também o renomado nome dos Annales F. Braudel, em seu celebrado Mediterrâneo e o Mundo Mediterrâneo à Época de Felipe II, como afirma Jonh Thornton (THORNTON, 2004), destaca excessivamente os empreendimentos europeus, excluindo ou marginalizando as sociedades atlânticas das movimentações político-econômicas em terra e mar. A visão de uma África passiva e indefesa é apresentada ainda por Pierre Chaunu (THORNTON, 2004) e, mais tarde, as elaborações em que se misturava a teoria Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Hot e Campos (2011). dos Annales somada a enfoques marxistas de André Gunder Frank e Walter Rodney (THORNTON, 2004) que, por exemplo, ajudaram a estereotipar essa ideia sobre o continente africano e seu povo. Não raramente americanistas que lançaram olhos sobre a África o fizeram através de uma brutal homogeneização dos diversos povos e culturas locais e se nortearam pela ausência de uma compreensão da dinâmica das sociedades africanas (PRIORE & VENÂNCIO, 2004) précoloniais: é como se considerassem que os grandes descobrimentos marítimos e o tráfico internacional de escravos fossem os marcos iniciais do “nascimento da África”. Conforme disse Thornton: “Historiadores radicais buscaram explicar a cultura e a religião dos escravos em termos da instituição da escravidão, reduzindo desse modo a identidade africana dos escravos” (PRIORE & VENÂNCIO, 2004). Mas para não pecar em apontar apenas aqueles que vitimizaram os conhecimentos sobre o continente africano, somos alertados, também, para não perdermos de vista as complicações que uma história africana de teor altamente nacionalista, desenvolvida principalmente no pós Segunda Guerra e nas décadas de 1960/70. Alguns enfoques até certo ponto radicais e bastante forçados (ou mesmo tendenciosos) podem prejudicar uma visão da complexidade africana da mesma forma que os problemas já apontados. De acordo com os dizeres do diplomata brasileiro – que por muitos anos trabalhou em terras Africanas, sendo profundo conhecedor dos idiomas e documentos locais – Alberto da Costa e Silva: “Sendo antiga e ampla a bibliografia sobre a África, a história da África é, contudo, uma disciplina nova” (SILVA, 2003, p. 234). Temos entre as fontes possíveis – e prováveis – vários relatos de viajantes europeus e especialmente árabes que comercializavam no continente, pinturas diversas e muitas marcas da oralidade de muitas etnias, onde o trabalho do historiador não pode se excluir das contribuições da arqueologia e da etnografia em suas abordagens. Ao mesmo tempo em que as fontes se apresentam tão várias, suas especificidades se tornam, também, uma dificuldade, haja vista que a forte marca da tradição oral – apenas para citar um exemplo – das diversas etnias africanas não foram muitas vezes preservadas ou sofreram alterações de interpretação por aqueles que se dedicaram a essa árdua e sensível atividade. Analisando a expansão marítima ibérica, Serge Gruzinski (GRUZINSKI, 2004) trabalha a mundialização das relações político-econômicas e sociais e considera o vasto fluxo de ideias, bens e pessoas como uma grande troca de experiências e valores culturais. Embora o tamanho do mundo tenha se estendido, nunca os contatos entre pontos e povos diferentes foram tão intensos: o distante parecia algo familiar enquanto distâncias inconcebíveis eram descobertas. Através dessa “mobilização” (o autor prefere esse termo) os símbolos e os referenciais dos povos envolvidos nessa transação sofrem profundas alterações: o global se confunde com o local, mas o certo é que “novos indivíduos se formam e novos cenários também” (GRUZINSKI, 2004, p. 65). Gruzinski nota que assim como os europeus modificaram os africanos, estes também fizeram dos europeus novos homens. Dessa forma, podemos mesmo inferir que uma complementaridade se tece entre as histórias da Europa, do Brasil e da África a partir desse momento em que o mundo se integra cada vez mais do século XVI em diante. Mais importante que avaliar a história dos africanos a partir do tráfico de escravos é pensarmos que a história da África ajuda em muito a explicar a própria história do Brasil; o continente mãe da humanidade se apresenta como uma espécie de irmão mais velho da história brasileira. Este artigo se propõe a abordar temas recorrentes em muitos livros didáticos brasileiros, lançando vistas a uma certa possibilidade e, até mesmo uma necessidade de renovação dos saberes trabalhados nos livros destinados à educação básica. Dessa forma, e dotados desse interesse, os temas que mais nos chamaram a atenção e que pensamos serem, talvez, os mais problemáticos constituem na história da África e a forma como a mesma é trabalhada no Ensino Médio e a situação, não menos problemática, dos assuntos ligados à participação feminina na história. Temos, então, dois temas problemáticos em questão: a África e as mulheres africanas. Com relação à história da África, e dos africanos, tradicionalmente temos a Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Hot e Campos (2011). impressão de que seu processo histórico só tem início com o tráfico atlântico para o Brasil, ou seja, a partir do momento em que os africanos passam a servir aos interesses coloniais europeus. Essa apresentação eurocêntrica se enraizou de tal modo no mercado de livros didáticos que, prezando pela simplificação, acabou por contribuir não para um melhor ou mais correto aprendizado escolar das relações entre África, Portugal e Brasil, mas sim no estabelecimento de preconceitos hoje difíceis de serem contornados. Deste modo, embora o conhecimento que temos a respeito dos africanos seja fundamentalmente oriundo da presença deles no Brasil, onde ora servindo como escravos no nordeste açucareiro, ora nas terras de Minas Gerais, sempre o que fica – e vale observar que muitos foram os esforços para isso – é a presença do negro enquanto escravo (FREIRE, 1977, p. 315) como uma ferramenta disposta aos interesses do dominador branco. Isso se deve porque era apenas como escravo, e não como ser humano, que o negro servia para os interesses fundamentais da empresa colonial portuguesa. Podemos observar nessa situação uma questão duplamente problemática: primeiramente o “esquecimento” das origens e da vivência africana dos negros que chegaram ao Brasil, e, também, o fato que aos africanos só é atribuído valor e atenção historiográfica enquanto estes servem como escravos e motores para os interesses metropolitanos. A esta negligência da historiografia tradicional de matriz europeia, junta-se um outro esquecimento: a questão das mulheres – e dentre essas especialmente as negras, mas não apenas – enquanto agentes sociais e parte imprescindível na formação na sociedade em que se insere, seja ela africana, brasileira ou mesmo portuguesa. Estes serão alguns dos apontamentos sobre os quais discutiremos na sequência deste texto. Por outra história da África: as diferenças entre o que é produzido e o que é ensinado Esta situação duplamente problemática de que falamos acima reproduziu-se de forma espetacular no meio editorial didático escolar. Com relação às origens africanas dos negros, observamos, no contato com variados livros e materiais didáticos trabalhados na educação básica brasileira, que aquilo que procuram apresentar ao professor, e que este repassa a seus alunos, é a existência de uma história marcadamente atlântica e europeia dos africanos. O tráfico negreiro não raramente pode ser identificado como um marco de origem para a entrada dos negros na história. A todo o momento estes são apresentados de forma passiva, muito mais sofrendo com os cursos do desenvolvimento de uma história portuguesa e, por extensão brasileira, do que propriamente agindo nela. Isso nos força – a professores e alunos – a identificar o elemento africano pelo viés da pena ou também da indiferença. Acostumados que estamos com a dita “história dos vencedores”, a “passividade” e o sofrimento africano desinteressa os olhares analíticos de professores e alunos, que acabam por reproduzir a temática abordada pelos livros que utilizam. O escopo documental de que muitos historiadores se valeram, assim como seus objetivos e interesses colaboraram por produzir um conhecimento altamente desqualificador a respeito da história da África. Vale lembrar a capacidade do poder de dominação que possuem aqueles que dominam a arte da escrita da história: eles transmitem uma visão “oficial” dos fatos, de acordo com interesses os mais diversos. De outra forma, o interesse na visão dos africanos como escravos, haja vista a sua utilidade como tal, encobriu aquilo que pode se chamar de uma história da vida privada, dos aspectos da intimidade e da subjetividade dessas pessoas. Tanto na África, como em Portugal e no Brasil, os escravos além de incorporarem as funções a eles destinadas pelo poder metropolitano, também, e não podemos esquecer disso, atuaram seguindo seus próprios desígnios e vontades. Eles não foram apenas massacrados – embora a presença da violência fosse forte – pelo sistema colonial, mas agiram numa situação de mão dupla: se por um lado eram vistos como “as mão e os pés de seus senhores” (ANTONIL,1982), por outro as fugas, os muitos quilombos formados, a constituição de família, a cultura e até mesmo os interesses comerciais marcariam um limite entre o que é submissão Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Hot e Campos (2011). e aquilo que se constitui como ação, interesse e livre arbítrio dos africanos nos três continentes citados. Frente a esta situação uma das grandes dificuldades que, se solucionada, poderia contribuir de forma interessante para uma visão mais detalhada e menos preconceituosa sobre a história da África seria a aproximação entre os saberes produzidos na academia e a produção de novos materiais didáticos. Atualmente ainda é difícil essa aproximação, uma vez que mesmo padecendo de seus problemas a história produzida no interior das universidades brasileiras tem se dotado de uma grande dinâmica, sempre abrindo novas possibilidades de compreensão da história. Embora a história da África seja ainda recente19, a historiografia brasileira vem conseguindo consideráveis avanços neste campo, deixando de lado visões anteriormente cristalizadas. Dessa forma pululam novas considerações acerca da escravidão e também das vivências dos negros no Brasil, mas também na África. Mas infelizmente os materiais disponíveis aos professores não incorporaram – pelo menos não com a velocidade e o comprometimento desejados – as novas abordagens de que falamos. Pensamos ser o debate entre academia e escola um dos pontos chaves para a necessária reformulação das considerações sobre a história da África. Nesse sentido, alguns assuntos esquecidos pelos materiais didáticos tradicionais, mas necessários para uma visão menos segregadora da África e dos africanos podem ser identificados na produção historiográfica brasileira e de brasilianistas20 em especial. 19 A este respeito destacam-se as iniciativas da USP e da UFMG, que possuem centros de pesquisa específicos no trato com a história africana. 20 Para citarmos apenas alguns temas e autores, a título de exemplo: trabalhando com a família escrava, temos SLENES, Robert. Na senzala, uma flor: esperanças e recordações na formação da família escrava. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.; a influência cultural africana na formação da família brasileira em FREIRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala. 18 ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1977; as estratégias de vivência entre senhores e escravos em GRAHAM, Sandra Lauderdale. Caetana diz As africanas que vemos e as que conhecemos: seriam as mesmas mulheres? É relativamente recente a aparição das mulheres na historiografia brasileira. Apenas a partir da década de 1930 (FREIRE, 1977) estudos historiográficos apontam as mulheres, mesmo que discretamente, como integrantes da história. Já os livros didáticos quando mostram uma mulher, é sempre como algo exótico e curioso, nunca revelando verdadeiramente suas vivências e experiências. As mulheres escravas ou negras foram ainda mais negligenciadas, já que eram quase sempre vistas como parte passiva e subjugada da história, o que motiva historiadores contemporâneos da área a provar o contrário. Essas africanas e afro descendentes foram parte imprescindível de nossa história. Na África, principalmente na região da Costa Ocidental, essas mulheres desempenharam um dos principais papeis: o do abastecimento, já que muitas delas trabalhavam como vendeiras ambulantes. Até mesmo em Portugal podemos perceber a atuação de quitandeiras, indispensáveis para o comércio de gêneros alimentícios. Junto com o tráfico atlântico, e muitos se esquecem disso, vieram também as tradições, vivências e habilidades desses escravos. Isso pode ser percebido através da atuação de minas-nagô (provenientes da Costa da Mina) no comércio não. História de mulheres da sociedade escravista brasileira. São Paulo: Cia das Letras, 2005; a atuação de escravas e forras no comércio ambulante em FIGUEIREDO, Luciano R. O avesso da memória: cotidiano e trabalho da mulher em Minas Gerais no século XVIII. Rio de Janeiro: José Olímpio, 1993, DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. 2ª Edição. São Paulo: Brasiliense, 1995 e SOARES, Carlos Eugênio Líbano. Comércio, Nação e Gênero: as negras minas quitandeiras no Rio de Janeiro (1835- 1900). In: SILVA, Francisco Carlos Teixeira da; MATTOS, Hebe Maria & FRAGOSO, João (orgs.). Escritos sobre história e educação. Homenagem a Maria Yedda leite Linhares. Rio de Janeiro: Maud/FAPERJ; história da África em SILVA, Alberto da Costa e. A enxada e a lança: a África antes dos portugueses. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1992 e SILVA, Alberto da Costa e. A manilha e o libambo: a África e a escravidão, de 1500 a 1700. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2002. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Hot e Campos (2011). em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais21 nos séculos XVIII e XIX. É interessante ressaltar que neste último local, as mulheres negras comerciantes eram ao mesmo tempo fundamentais para o abastecimento de alimentos da região das minas – e por isso bem vistas pela Metrópole portuguesa – e representantes da tensão que pairava nas áreas mineradoras, por serem responsáveis pelo desvio de ouro e pedras preciosas, pela embriaguez dos escravos garimpeiros, pela ajuda na fuga de escravos e pelo abastecimento de quilombos – e por isso combatidas e controladas pela Coroa. Também é bem pouco conhecida a influência da mulher escrava no que tange à educação e na formação da família brasileira. No nordeste açucareiro eram as mães pretas que criavam os filhos do senhor de engenho. Eram elas que educavam, contavam histórias, cantavam e lhes ensinavam as primeiras letras. No continente africano a importância das mulheres toma dimensões ainda maiores, mas infelizmente desconhecidas por grande parte do público escolar, já que este assunto não faz parte (pelo menos da forma como deveriam) dos materiais utilizados na educação básica brasileira. Nos conflitos internos africanos, onde duas tribos inimigas disputavam terras e recursos, as mulheres da tribo derrotada eram incorporadas pela sociedade dos vencedores. Por isso as mulheres na África eram mais valiosas do que os homens, uma vez que esses, quando derrotados eram mortos pelos vencedores ou aprisionados de modo a fomentar o comércio de escravos com os portugueses, pois os prisioneiros sempre representavam o elemento de perigo de subversão para os vencedores. 21 Ver: para São Paulo, DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. 2ª Edição. São Paulo: Brasiliense, 1995; Rio de Janeiro, SOARES, Carlos Eugênio Líbano. Comércio, Nação e Gênero: as negras minas quitandeiras no Rio de Janeiro (18351900). In: SILVA, Francisco Carlos Teixeira da; MATTOS, Hebe Maria & FRAGOSO, João (orgs.). Escritos sobre história e educação. Homenagem a Maria Yedda leite Linhares. Rio de Janeiro: Maud/FAPERJ, 2001; Minas Gerais, FIGUEIREDO, Luciano R. O avesso da memória: cotidiano e trabalho da mulher em Minas Gerais no século XVIII. Rio de Janeiro: José Olímpio, 1993. Outra grande importância das mulheres africanas é no que diz respeito à sucessão dos reinos locais. Como a poligamia prevalecia na África, no momento do falecimento de um rei local ficava difícil identificar o seu primogênito, já que tinha várias mulheres e muitos filhos ocorriam de nascer em datas próximas. A importância dessas mulheres dá-se à medida que a relação de sociabilidade entre as várias esposas de um rei decidia de forma consensual aquele filho que viria a ser sucessor do rei. De todos os pontos abordados até o momento fica a clara discrepância da história produzida na academia, que busca ressaltar a importância das mulheres para a história, e a história efetivamente ensinada, que mascara muitas vezes estas outras abordagens da história que não a eurocêntrica e tradicional. CONCLUSÃO Alguns motivos nos levam a pensar que esta realidade de inadequação academia-escola-livros didáticos está em vias de encontrar algumas saídas, tendo em vista os esforços que vem sendo realizados por algumas instituições de ensino superior, tanto pública como privadas, visando promover o debate e o estudo de uma história que lance uma visão mais plural sobre os povos de origem africana. Estes trabalhos a que nos referimos consistem em atividades nas quais os alunos são incentivados a mudar esta realidade que se mostra segregacionista. Como exemplo de tal prática podemos citar os eventos realizados nas dependências da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu (FACIG) – a já mencionada disciplina específica na área e os eventos sobre cultura africana em parceria com o Colégio América – nos quais a comunidade local e escolar é convidada a debater sobre as apropriações da cultura afro-brasileira e africana e a importância das mesmas para a formação do povo brasileiro. Se estes trabalhos, que buscam pôr fim à ditadura segregacionista de muitos livros didáticos serão postos em prática em outros locais ou, ainda, se isto se tornará uma constante no Brasil, é cedo para afirmarmos, mas o caminho percorrido neste sentido nos dá esperanças de que uma nova etapa da educação brasileira está sendo Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Hot e Campos (2011). construída, uma vez que a grande função da academia é repassar conhecimentos à sociedade, e não trancafiá-lo em seus muros internos. À sociedade e ao poder público, por sua vez, cabem a tarefa de receber este conhecimento novo – porque fruto de novas técnicas e de novas abordagens – não através da desconfiança, mas como novas luzes e compreensões lançados sobre uma história antes considerada oficial, única e verdadeira. A história, antes de tudo, é uma ciência da interpretação e da compreensão, e novas abordagens são sempre muito bem vindas. REFERÊNCIAS ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil: por suas drogas e minas. São Paulo: Ed. USP/Itatiaia, 1982. BASTIDE, Roger. Sociologia do folclore brasileiro. São Paulo, Editora Anhembi, 1959. ______________. Estudos afro-brasileiros. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1973. BHABHA, H. K. O local da cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998. CARNEIRO, Edison. Religiões Negras: notas de Etnografia Religiosa. 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In: SILVA, Francisco Carlos Teixeira da; MATTOS, Hebe Maria & FRAGOSO, João (orgs.). Escritos sobre história e educação. Homenagem a Maria Yedda leite Linhares. Rio de Janeiro: Maud/FAPERJ, 2001. SOUZA, Marina de Mello e. Reis negros no Brasil escravista. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Hot e Campos (2011). THORNTON, John. A África e os africanos na formação do mundo atlântico, 14001800. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Hot e Campos (2011). Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 53-62, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). A QUESTÃO HABITACIONAL EM MANHUAÇU E A GARANTIA DE DIREITOS DE CIDADANIA: UMA EQUAÇÃO POSSÍVEL? Luciana Bosco e Silva1, Ruteléia Cândida de Souza Silva2, Roberto Vicente Silva de Abreu3 1 Doutora em Artes Plásticas (EBA/UFMG) e Coordenadora dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo, Construções e História da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu. 2 Mestre em Política Social (UFES) e Coordenadora do Curso de Serviço Social da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu. 3 Graduando em Engenharia Civil, aluno de Iniciação Científica da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu. RESUMO: Ao longo da história, as mazelas e precariedades habitacionais sempre acometeram milhões de pessoas no Brasil. Essa realidade também se materializa em Manhuaçu-MG, cidade marcada por uma herança coronelista, num contexto de resignação e “naturalização” da pobreza, sobretudo, a partir da desorganização política dos segmentos mais vulnerabilizados. As discussões propostas neste artigo têm como objetivo justamente traçar algumas considerações em torno da qualidade das habitações e as localidades de maior incidência de carências habitacionais no município. Procura estabelecer conexões entre a crise habitacional e o processo de crescimento e urbanização da cidade, sobretudo, num contexto em que as ações e iniciativas adotadas têm assumido, em geral, um caráter meramente pontual ou sem bases sustentáveis necessárias à resolução deste problema. O que se observa é que tal situação requer a adoção de políticas públicas viabilizadoras de direitos sociais e de cidadania, promotoras de desenvolvimento social, econômico e ambiental da região. Palavras chave: sustentável. déficit habitacional, política habitacional, cidadania, desenvolvimento INTRODUÇÃO “– Pai, por que a gente veio morar aqui no mangue?”. Mas, por que aqui no mangue, por que não fomos morar na cidade, do outro lado do mangue? Lá é tão bonito, tão diferente, é como fosse um outro mundo." (Josué de Castro. Homens e caranguejos) O deslocamento de populações da zona rural para o meio urbano tem se constituído num dos mais importantes movimentos populacionais da atualidade e está diretamente vinculado a um conjunto de mudanças estruturais na economia e na sociedade. Diante da adoção de novas técnicas agrícolas, da mecanização do campo e, consequentemente, do aumento do desemprego, estabelece-se um movimento em que um expressivo número de trabalhadores – atraídos pela possibilidade de conquistar melhores condições de vida – vêem-se compelidos a buscar, no espaço da cidade, alternativas de enfrentamento das desigualdades sociais que se multiplicam no espaço rural. No entanto, acompanhado da adoção de novos padrões de sociabilidade e cultura, esse movimento se depara com um quadro socioespacial desigual e excludente que se expressa, principalmente, na segregação espacial dos territórios da cidade. Circunscrito numa totalidade dialética, resultante das leis tendenciais que regem o capitalismo em seu movimento de reprodução ampliada – cuja unidade se forma na diversidade –, todo esse processo Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). vem reforçar o quadro de depreciação da qualidade de vida, traduzida, sobretudo, pelo agravamento dos níveis de degradação ambiental e pela afirmação de um quadro de exclusão socioespacial em patamares jamais vistos. Para agravar ainda mais essa situação, a ocorrência das chamadas “disfunções urbanas” – com ênfase em seus aspectos meramente físicos – aliada a ineficiência dos dispositivos de controle urbanístico de uso e ocupação do solo, reforçam a dinâmica excludente que sempre esteve presente no processo de formação socio-histórica brasileira. Num contexto em que o modelo de planejamento praticado não corresponde ao movimento da sociedade na construção do meio urbano, o resultado é um agravamento das múltiplas expressões da questão social, de modo especial, àquelas ligadas à questão ambiental e habitacional, particularmente, quando articuladas, aos conflitos espaciais deles decorrentes. Numa simples incursão pelo cenário urbano brasileiro, é possível identificar essa realidade, especialmente, a partir da concentração de populações com nível de pobreza social muito acentuado – marcado pelos baixos salários ou até mesmo pelo desemprego – em determinadas áreas sem infraestrutura adequada, resultante de um desenvolvimento seletivo e excludente que privilegia alguns espaços e negligenciam outros. Neste sentido, se por algum tempo as favelas e cortiços se constituíram numa possível solução para o problema habitacional, com o passar do tempo se tornaram um grave problema que reforça um quadro de disparidade socioespacial e de discriminação de diversos segmentos marginalizados na sociedade. Embora esse processo remonte, o Brasil, do final do século XIX e início do século XX, é no último quartel deste último século que essa temática se torna objeto recorrente de análise e debate por parte de diversos estudiosos dos mais variados campos das ciências humanas e sociais e, até mesmo de alguns governantes, que buscam, ainda que de modo incipiente, reduzir essa disparidade. A partir desse momento, tem-se a adoção de novas atitudes, de modo especial, com as contribuições de movimentos socioambientalistas ligados a vertentes populares, sindicais e ambientais e do Movimento Nacional pela Reforma Urbana – MNRU, que ganham força no período pré e pós-constituinte e, recentemente, a partir dos anos de 1990, com o crescimento do debate em torno do desenvolvimento sustentável e sua apropriação pela comunidade técnicocientífica. Desde então, tem-se observado importantes avanços na condução política das ações de planejamento urbano e ambiental, sendo visíveis os esforços da sociedade para consolidar marcos institucionais capazes de contemplar um novo modelo de gestão e de desenvolvimento sustentável, que alia demandas já apresentadas às práticas sociais contemporâneas. Esse direcionamento tem se constituído no fio condutor das diretrizes para a política urbana inseridas na Constituição Federal Brasileira de 1988 – capítulos da Política Urbana e do Meio Ambiente – (BRASIL, 2000), nas Leis Orgânicas Municipais (LOMs), nos novos Planos Diretores e no Estatuto da Cidade, de 10 de julho de 2001 (BRASIL, 2001). No entanto, ainda que novas possibilidades de ação política tenham se efetivado na sociedade brasileira, poucos avanços têm sido identificados na consolidação desses novos marcos normativos. Inclusive, poucos municípios brasileiros conseguiram avançar na regulamentação desses instrumentos legais que servem de diretrizes para a formulação de uma nova política urbana, cujo objetivo centra-se na reversão da lógica excludente de produção e apropriação do espaço urbano e no reconhecimento dos conflitos socioambientais. O artigo 6º da Carta Constitucional de 1988 prescreve que "são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados [...]” (BRASIL, 2000). Assim, positivado pela Constituição Brasileira, o direito a moradia torna-se um Direito Fundamental, cabendo ao Estado protegê-lo e implementá-lo por meio de leis e políticas públicas. No entanto, embora exista previsão legal, é visível, em todo perímetro urbano brasileiro, a inexistência de moradias dignas Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). para uma parcela expressiva da população. Além do mais, não se trata apenas da moradia em si, mas da garantia mínima de infraestrutura básica – como água, esgoto, energia elétrica, saneamento – e de acesso aos equipamentos sociais, como saúde, educação, segurança, lazer e cultura. Muito mais do que a presença de um abrigo ou teto, o direito a moradia diz respeito ao acesso a uma habitação adequada, capaz de oferecer, aos moradores, uma possibilidade de melhoria contínua de suas condições de vida. O RETRATO DA QUESTÃO HABITACIONAL EM MANHUAÇU: PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES Com base no histórico da qualidade de moradia no Brasil, constata-se que a questão da habitação é um problema atual e que acontece, principalmente, em grandes e médios centros urbanos. A questão da moradia no Brasil é preocupante, uma vez que “amontoados de casas” são construídos em lugares inadequados e sem qualquer infraestrutura básica, colocando em riscos muitas vidas. Hodiernamente, as cidades mais desenvolvidas economicamente sofrem os impactos desse processo, fato que pode ser constatado na cidade de Manhuaçu-MG, onde se constata um quadro de ocupação desordenada em alguns bairros, caracterizados pelo inchaço populacional e pelo pouco espaço disponível para novas construções, sendo que uma parcela significativa das já existentes não possuem condições mínimas de habitabilidade. O município de Manhuaçu situa-se na porção leste do Estado de Minas Gerais, próximo à divisa com o estado do Espírito Santo. No contexto da divisão da macrorregião mineira, Manhuaçu insere-se na Região 11, correspondente à Zona da Mata, na microrregião que recebe seu nome e sob sua respectiva influência, sendo constituída por 16 municípios vizinhos. Ele conta com uma extensão territorial de 628,43 (seiscentos e vinte e oito vírgula quarenta e três) quilômetros quadrados, constituindo-se numa cidade polo da região. Esta polarização socioeconômica é em função de sua localização privilegiada, com acesso a duas rodovias federais (BR262 e BR-116); da intensa comercialização de café; dos serviços prestados no setor de saúde, comércio e serviços públicos. O município conta com diversas instituições públicas, o que tem contribuído ainda mais para o desenvolvimento da região, tais como: Superintendência Regional de Ensino; Agência Regional do Instituto Nacional de Seguro Social – INSS; Décimo Primeiro Batalhão da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais; Agência Regional da Receita Federal; Agência Fazendária Regional Estadual; Agência Regional do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais – IPSEMG; Agência Regional do Instituto Estadual de Florestas – IEF; Agência Regional do Instituto Mineiro Agropecuária – IMA; Junta de Conciliação e Julgamento – Justiça do Trabalho; Fórum da Justiça de Primeira Instância; Ministério Público do Estado de Minas Gerais; Justiça Federal; Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural – Emater; Delegacia de Alistamento Militar e Batalhão do Corpo de Bombeiro. O perfil industrial de Manhuaçu voltase para indústrias do segmento de café, visando o aproveitamento da matéria prima abundante. Ainda neste segmento, existe um grande mercado para máquinas e implementos agrícolas. Conforme registro do Sindicato Rural Patronal, o Município produz cerca 4,1 milhões de sacas de café por ano, em suas, cerca de 5.893 propriedades agrícolas. O município também conta 54 (cinquenta e quatro) entidades da sociedade civil registradas no âmbito do Conselho Municipal de Assistência Social, dentre associações e movimentos sociais de segmentos específicos como moradores de determinados bairros, negros, mulheres, idosos, pacientes oncológicos e de insuficiência renal, pessoas com deficiência e instituições de atendimento a crianças e adolescentes privados do convívio familiar, dentre outras. Atualmente, o município de Manhuaçu concentra uma população de 79.574 habitantes (IBGE, 2011), sendo que os índices que medem o desenvolvimento humano mostram uma realidade que requer ações capazes de reverter o quadro de exclusão social. O Atlas da Exclusão Social no Brasil (AMORIM; POCHMANN, 2003), por exemplo, apresenta alguns indicadores sociais que caracterizam o município quanto Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). ao índice de pobreza que, no ano 2000, apresentava o equivalente a 0,565 de alfabetização, 0,833 de escolaridade, 0,484 de exclusão social, 0,505 de emprego formal, 0,165 de desigualdade, 0,129; de violência, 0,974. A realidade do município, indubitavelmente, reflete a herança histórica do “coronelismo” que marcou e ainda marca as sociedades rurais brasileiras. A vivência neste contexto possibilitou verificar a ausência de consciência política, a resignação e a “naturalização” da pobreza, sobretudo, a partir da desorganização política dos segmentos vulnerabilizados. Neste contexto, o desenvolvimento do município de Manhuaçu ocorre de forma desordenada, em razão, especialmente, da inexistência de estudos prévios capazes de fornecer subsídios que orientem a definição de prioridades, projetos, programas e obras públicas, bem como da falta de atuação dos demais segmentos da sociedade. Por ser um polo socioeconômico o município vivencia os impactos do êxodo rural, recebendo um significativo contingente de trabalhadores que se desloca do campo para a cidade em busca de melhores condições de vida e trabalho. Entretanto, tais iniciativas, muitas vezes, não alcançam êxito e acabam agravando os índices de desigualdade social e de déficit habitacional do município. Ademais, a localização do município, à margem da BR-262, também contribui para intensificar o crescente fluxo migratório de trabalhadores que buscam novas oportunidades de emprego. Todo esse contexto tem contribuído para agravar ainda mais o déficit habitacional da cidade, o que tem tornado cada vez mais latente a necessidade da formulação de políticas habitacionais na tentativa de solucionar graves problemas sociais decorrentes desse déficit. Assim, o que se percebe na cidade de Manhuaçu é que as condições de vida e de moradia de milhares de pessoas em determinados bairros são extremamente precárias, uma vez que certas famílias apresentam padrões socioeconômicos muito abaixo dos padrões necessários a sua subsistência22. A inexistência de rede de saneamento básico é um fator a ser considerado nessa realidade. Ela acarreta o lançamento de efluentes domésticos nos corpos d’água do Rio Manhuaçu (figuras 1, 2 e 3) e a medida que uma parcela significativa do esgoto urbano local não recebe nenhum tipo de tratamento, constitui-se numa das principais fontes poluidoras do ecossistema aquático do município. Há, inclusive, muitos casos em que nos períodos de alta pluviosidade, o esgoto retorna para dentro das casas, acarretando sérios transtornos e riscos à qualidade de vida da população. Foto 1 - Lançamento de efluentes domésticos no Rio Manhuaçu – MG. 22 Segundo dados do IBGE (2010), 23% da população de Manhuaçu vive em condição de pobreza. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). Foto 2 - Lançamento de efluentes domésticos no Rio Manhuaçu – MG. em políticas habitacionais e na melhoria nas condições socioeconômicas, fazendo com que a população tenha garantido o direito constitucional à habitação digna. Somente assim, a população vai deixar de lado um cenário que se apresenta de forma degradante – e até mesmo assustador, uma vez que pode colocar em risco a vida de famílias e/ou comunidades inteiras. Analisando os tipos de casas e a condição de moradia em alguns bairros de Manhuaçu, nota-se que os problemas são visíveis e que falta uma maior intervenção governamental em tais áreas. Como exemplo tem-se o vulgo Bairro Campo de Avião (figuras 5, 6 e 7), o Bairro Santa Luzia e o Bairro Santana, locais em que várias casas estão em condições precárias e se assemelham às casas de favelas em grandes cidades. Diariamente, lê-se nas páginas policiais do jornal da cidade ocorrências de roubos e crimes cometidos nesses locais. É por essas e outras razões, que a melhoria das condições sociais das pessoas desses bairros se faz mais do que necessário. Foto 3 - Lançamento de efluentes domésticos no Rio Manhuaçu – MG. A isso se somam os problemas relacionados a construções irregulares em áreas de voçoroçamento, desmoronamento de encostas, leitos de rios, dentre outras. O que se observa é que não faltam irregularidades nas diversas formas de ocupações. Toda essa situação resulta em um desenvolvimento urbano que ocorre de forma irregular, implicando em grandes impactos ambientais, sociais e econômicos para a cidade de um modo geral. Logo, nota-se que a questão habitacional em Manhuaçu é um assunto de extrema importância, isso porque uma parcela significativa da população vive em lugares não habitáveis. A população que vive em áreas de risco, tanto de estadia quanto para a saúde, está sujeita a doenças e catástrofes, o que requer investimentos Foto 5 – Moradias precárias no Bairro Campo de Avião, Manhuaçu – MG. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). Foto 6 – Moradia precária no Bairro Campo de Avião, Manhuaçu – MG. Foto 7 – Moradia precária no Bairro Campo de Avião, Manhuaçu – MG. Foto 8 – Moradia no Bairro Alfa Sul, Manhuaçu – MG. Foto 9 – Moradia no Bairro Alfa Sul, Manhuaçu – MG. Em contraposição à realidade apresentada, temos a vivida por um bairro de classe média alta, como o Bairro Alfa Sul, conforme demonstram as Figuras 8 e 9. Diante desse fato, a realização de um estudo mais detalhado sobre as condições de habitação na cidade permitirá reunir substratos comprobatórios de mais inadequações e precariedades do que se imagina, como a coabitação familiar, que consiste no convívio de mais de uma família em uma mesma casa com espaço apenas para uma, de maneira a apresentar soluções adequadas para problemas específicos. Dentre os principais fatores que precisam ser analisados estão aqueles relacionados às condições físicas da moradia e de sua localização, tendo como quesitos centrais de análise: tipo de localidade; situação do imóvel; tipo de abastecimento de água; tipo de construção; tratamento de água; tipo de iluminação; destino do lixo no domicílio; revestimento das paredes; revestimento de piso; tipo de lote em que a casa se situa; escoamento sanitário; material predominante na cobertura (telhado), conforme demonstrado no quadro a seguir. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). Quadro 1 - Principais quesitos a serem analisados na classificação dos imóveis. Tipo de localidade Se a localidade do imóvel é de risco social ou não. Situação do imóvel Tipo de construção Material predominante na cobertura (telhado) Revestimento piso de Revestimento paredes das Tipo abastecimento água de de Tratamento água de Escoamento sanitário Tipo de iluminação Tipo de lote em que a casa se situa Destino do lixo no domicílio É a condição de posse da habitação, se é cedida, alugada, própria, invadida ou arrendada. Diz respeito à posse do tal imóvel, já que esse é um fator de extrema importância porque é desse item que se avaliará a solução para a casa, uma vez que muitas habitações não precisam ser demolidas e sim reformadas. Tijolo/alvenaria, adobe, taipa revestida, taipa não revestida, madeira, material aproveitado, outros. É uma das partes mais importantes de uma casa, assim dever ser levado em conta para uma análise superficial. Telha, laje de concreto, madeira aparelhada, zinco, madeira aproveitada, palha, outro material. Por esse quesito é possível analisar o nível socioeconômico da família, já que a laje de concreto pesaria muito no orçamento de uma família pobre. Cerâmica vitrificada, cimento queimado, cerâmica porosa, cimento grosseiro, sem revestimento. É outro padrão que serve para análise comprobatória, já que na maioria dos domicílios localizados em regiões periféricas não possuem piso cerâmico e sim cimento grosso ou queimado. Revestimento cerâmico, reboco com pintura, plástico emulsionável, reboco e caiação, reboco sem pintura, alvenaria sem revestimento, taipa sem revestimento. Rede pública, poço/nascente, carro pipa, rio, outro. Relaciona-se com a saúde dos moradores, além do mais serve de base para uma análise do serviço público, assim como nos próximos itens, tratamento de água e escoamento sanitário. Filtração, fervura, cloração, sem tratamento, outro. Exprime o grau de qualidade da água ingerida, uma vez que se a mesma não for de qualidade pode causar riscos à saúde. Rede pública, fossa rudimentar, fossa séptica, vala, céu aberto, rio, outro. Fator de extrema importância já que os dejetos sanitários se não escoados em locais correto causam doenças graves. Rede pública, sem relógio, relógio comunitário, lampião, óleo, querosene, vela, gás de botijão, outro. É um paradigma que deve ser considerado porque em muitos locais há o hábito de fazer os chamados “gatos”. Lote comprado já pago, comprado ainda em pagamento, invadido, lote em área de preservação ambiental. Entra-se agora nas questões de posse do terreno, sendo que muitas casas são construídas em áreas irregulares e de preservação ambiental, causando futuras catástrofes. Coletado, queimado, céu aberto, enterrado, jogado em rio ou lago, outro. Em muitos lugares não há coleta de lixo, assim os restos são jogados em qualquer lugar já que há falta de acesso a caminhões e aos profissionais que recolhem o lixo e isso compromete o meio ambiente e a saúde das pessoas. Outro fator de extrema importância é a análise da quantidade de pessoas por cômodo e quantos desses compartimentos são usados como dormitórios, ou seja, o adensamento familiar. Esse item se faz necessário já que uma habitação deve conter mais que paredes fortes e telhado resistente, precisa apresentar uma boa distribuição de moradores por cômodo. Logo, a categorização das condições dos domicílios em questão dará uma visão pormenorizada de cada família, fazendo com que soluções distintas sejam dadas de acordo com as particularidades de cada família. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). Tipologia 1: Tipo de localidade: sem risco social Situação do imóvel: próprio Tipo de construção: tijolo/alvenaria Material predominante na cobertura (telhado): laje de concreto Revestimento de piso: cerâmico Revestimento das paredes: cerâmico ou reboco com pintura Tipo de abastecimento de água: rede pública Tratamento de água: filtração Escoamento sanitário: rede pública Tipo de iluminação: rede pública Tipo de lote em que a casa se situa: comprado Destino do lixo no domicílio: coletado Tipologia 2: Tipo de localidade: de risco social Situação do imóvel: invadido Tipo de construção: taipa não revestida Material predominante na cobertura (telhado): palha Revestimento de piso: sem revestimento Revestimento das paredes: sem revestimento Tipo de abastecimento de água: direto de lagos e rios Tratamento de água: sem tratamento Escoamento sanitário: rio ou a céu aberto Tipo de iluminação: óleo ou querosene Tipo de lote em que a casa se situa: invadido Destino do lixo no domicílio: rio ou lago Usando os parâmetros adotados no quadro acima e comparando as diferentes tipologias é possível validar a seguinte hipótese: quanto mais um domicílio se aproximar das classificações da tipologia 1 o seu risco e a necessidade de melhorias é menor, porém, quanto mais ele se aproximar da tipologia 2 as melhorias são urgentes e ele deve ser tratado como prioridade. Além do mais, o segundo tipo de domicílio causa mais danos à natureza, uma vez que os efluentes domiciliares e demais resíduos sólidos têm como destino os rios e áreas de disposição inadequada, contaminando o meio ambiente e causando problemas de saúde para a população em geral. Cabe ressaltar que um a porcentagem da carência habitacional de cada casa pode ser calculada pela seguinte equação: Eq.1: ICH = SCH X 100/12 Onde ICH é o Índice de Carência Habitacional e o SCH é o Somatório de Carência Habitacional. O somatório é executado da seguinte maneira: Cada item das tipologias do quadro 01 recebe um valor, sendo que ele vai de zero (sem risco social, próprio, tijolo/alvenaria, laje de concreto, cerâmico, cerâmico ou reboco com pintura, rede pública, filtração, rede pública, rede pública, coletado, comprado) até um (de risco social, invadido, taipa não-revestida, palha, sem revestimento, sem revestimento, rio ou lago, sem tratamento, rio ou a céu aberto, óleo ou querosene, invadido, direto de lagos e rios). O valor 0 representa que a situação do imóvel é boa, entretanto quanto mais o valor se afasta de zero e se apropinqua de 1 a situação do imóvel se mostra crítica. Note que as respostas do questionamento da Tipologia 1 são as ideais, ou seja quanto mais as respostas em relação a uma casa se aproximarem dos resultados da Tipologia 1 menor será a porcentagem de carência habitacional do domicílio. Porém quanto mais próximo da Tipologia 2 maior o Índice de Carência Habitacional, já que o ICH se apropinqua de 1. Assim, para se obter o valor do SCH basta somar o valor dado a cada um dos doze itens das tipologias, sendo que cada resposta da Tipologia 1 vale zero e cada resposta da Tipologia 2 vale um. Descoberto o SCH se faz a aplicação do mesmo na Eq.01. Por fim, a questão habitacional se alia a inexistência de infraestrutura urbana, ao escasso acesso aos serviços públicos e, de modo mais preocupante, a ausência de políticas públicas efetivas no combate ao tráfico de drogas, à prostituição e o que é mais grave: a exploração sexual de adolescentes, fato esse amplamente divulgado e costumeiro nas páginas policiais da cidade, principalmente, na região da Baixada. Para finalizar, importante, se faz ressaltar que é ainda grandioso o número de pessoas em situação de rua que se alojam, em grande parte, nos bairros mais Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). movimentados, como o Bairro Coqueiro e o Bairro da Baixada, uma vez que a maior incidência de pessoas nas calçadas de tais locais faz com que a probabilidade da obtenção de “esmolas” aumente e que é nas redondezas do Terminal Rodoviário de Manhuaçu que se encontra o Bairro Santana, localidade com maiores índices de tráfico de drogas e prostituição. As estratégias apresentadas para conter tal situação se limitam a um projeto de lei que proíba a venda de bebidas alcoólicas nas mediações da rodoviária como forma de coibir os pontos de encontros entre usuários; e a proposta de alguns vereadores e líderes da cidade de separar os passageiros que se encontram na rodoviária das pessoas que estão ali só para se aproveitar delas, ou seja, criar um cordão de isolamento na tentativa de inibir furtos e assédio. Segundo os criadores dessa proposta, com isso as crianças que estão naquele lugar apenas esperando seu horário de saída do ônibus não precisariam ver cenas absurdas de assédio sexual explícito e roubo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante do exposto questiona-se qual seria a relação entre os problemas habitacionais e os problemas sociais em Manhuaçu. A resposta é simples, já que a concentração de domicílios em condições precárias é maior nos bairros onde os problemas sociais afloram. Dentre as mazelas sociais a que a população local está submetida, o déficit habitacional tem se constituído num grave problema que tem acarretado impactos nocivos à saúde, ao meio ambiente, enfim, ao desenvolvimento local sustentável. Dessa feita, torna-se fundamental a ação do poder público na construção de políticas – urbana e habitacional – efetivas que ofereçam melhor qualidade de vida à população, de modo especial, aos seus extratos mais empobrecidos, devendo ser articuladas e realizadas a partir de estudos que viabilizem a atuação das três esferas de governo: federal, estadual e municipal, com a efetiva participação da sociedade. Isso porque o envolvimento de todos os sujeitos sociais – sociedade civil, poder publico e áreas técnicas – no enfrentamento da questão habitacional, contribuirá, sobremaneira, para o respeito e fortalecimento da cidadania e dos direitos garantidos na Lei Maior, como é o caso dos direitos fundamentais de cada cidadão. Tal dimensão suplanta o caráter meramente imediatista de algumas ações que recorrentemente têm assumido o status de “solução redentora” de todos os problemas habitacionais. Nos dias atuais, quando se fala em déficit habitacional, logo vem à mente o conhecido discurso em torno da construção de “casas populares”, como se elas por si só pudessem dar conta da complexidade que envolve a temática em questão. Muito além da construção de unidades habitacionais, a ação do poder público, principalmente o municipal, deve contemplar uma dinâmica que também envolve a regulamentação do uso da propriedade urbana, dos espaços urbanos, da ocupação do solo em benefício de toda a sociedade, por meio de instrumentos como o Plano Diretor. Grande parte das medidas adotadas são implementadas sem um estudo prévio da realidade local, deixando de contemplar variáveis importantes para o alcance efetivo das ações, como, por exemplo, aspectos econômicos, sociais, ambientais, dentre outros. Isso faz com que ocorram equívocos e a adoção das medidas se torne pouco eficiente no enfrentamento do déficit habitacional. Em muitos casos, as casas providas pelo governo situam-se em áreas sem qualquer proximidade com o polo econômico da cidade, dificultando o deslocamento das famílias realocadas para o trabalho e escola. Em várias cidades onde programas de habitações populares foram implantados a recorrência de falhas no sistema de atendimento das famílias tem comprometido a efetividade das ações, uma vez que muitas famílias cadastradas nos programas não são contempladas e, em alguns casos, sequer são propostas ações que atendam às demandas inerentes a sua condição de habitabilidade. Não se quer com tal assertiva, negar a importância da construção de casas populares, mas reforçar a necessidade das ações serem precedidas de um estudo das condições iniciais e vivenciais de cada família e das interfaces do problema habitacional com as demais expressões da questão social. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Silva, Silva e Abreu (2011). Outro grande desafio que se coloca nos dias atuais refere-se à apropriação de um referencial técnico-operativo capaz de garantir às famílias o direito à cidade. Normalmente, o equacionamento do déficit habitacional, ao invés de se constituir enquanto política pública de caráter permanente do Estado, tem se caracterizado como programa de ação de um governo específico. Embora a sociedade brasileira tenha vivenciado avanços significativos em torno dessa problemática – a exemplo, o Estatuto das Cidades, em 2001, e a Política Nacional de Habitação, em 2004 – a questão habitacional – como muitas outras políticas – tem assumido um caráter efêmero e de extrema focalização na pobreza, se constituindo numa “política pobre para os pobres”. Ainda que o Estatuto das Cidades (BRASIL, 2001) e a Política Nacional de Habitação (BRASIL, 2004) apresentem as diretrizes necessárias à regulamentação da utilização do espaço urbano, por si só não conseguem abarcar a complexidade que envolve o direito à cidade, como parte integrante do direito à cidadania e, por conseguinte, do direito à dignidade da pessoa humana. Sendo assim, as ações em torno da questão habitacional exigem a adequação das ações desenvolvidas ao princípio da participação e mobilização comunitária, geração de emprego e renda, preservação do meio ambiente, promoção à saúde, dentre outras, num conjunto articulado de proposições capazes de contemplar o maior número possível de demandas apresentadas pela população usuária. No caso específico de Manhuaçu, a realização de estudos pode contribuir, dentre outros aspectos, para a formulação de uma política habitacional que contemple as múltiplas determinações do real, viabilizadora de direitos sociais e de cidadania e promotora de desenvolvimento social, econômico e ambiental da região. Muito mais do que atuar diretamente no enfrentamento das mazelas sociais, o poder público pode consolidar um modelo de gestão da cidade que, ao invés de oficializar a ocupação de lugares impróprios e de risco – negligenciando as condições de habitabilidade local –, prioriza a construção, não apenas de unidades habitacionais, mas de vias asfaltadas, escolas, unidades básicas de saúde e de educação infantil, além da adoção de medidas preventivas. Enfim, o poder público municipal assume definitivamente sua condição de agente garantidor dos direitos fundamentais de cidadania. REFERÊNCIA BRASIL. Ministério das Cidades. Secretaria Nacional de Habitação. Política Nacional de Habitação. Brasília, 5 nov. 2004. ______. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Estatuto da Cidade. Brasília: Senado, 2001. ______. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 5 de outubro 1988. 25. ed. São Paulo. Saraiva, 2000. CASTRO, Josué de. Homens e caranguejos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo de 2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.h tm?1. Acesso em: 1 de Agosto de 2011. POCHMANN, Márcio; AMORIM, Ricardo (Orgs.). Atlas da Exclusão Social no Brasil. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2003. v. 1. 221 p. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 63-72, agosto-dezembro, 2011. Coutinho (2011). CANTIGA DE TRABALHO: FORÇA E RESISTÊNCIA CONTRA A SEVERIDADE DO SISTEMA ESCRAVISTA NO BRASIL COLÔNIA Área temática: História Luiz Antônio Coutinho1 1 Graduando do 3º Período de História pela Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – FACIG. RESUMO: Este artigo tem como objetivo mostrar a trajetória dos negros africanos, enquanto escravos no Brasil, de maneira a demonstrar que, mesmo trabalhando nos engenhos, nas minas ou mesmo nas cidades e sofrendo com a opressão imposta por seus senhores, estes resistiram de diversas formas: fugas, rebeliões, sabotagens, e principalmente, através de seus cantos de trabalho que, em certas ocasiões, serviam de protesto contra o brutal sistema escravista. Palavra chave: canto de trabalho, escravidão, protesto, religião. INTRODUÇÃO A vida na África Antes da chegada dos portugueses, a África Atlântica tinha sua estrutura social bem definida. Vivia-se em uma sociedade tribal, onde existia a escravidão, mesmo que doméstica, e o escravo era parte integrante da família. A vida tinha sua constância no trabalho, principalmente na agricultura, e a religião tinha na força da natureza a base da crença dos nativos africanos que, com seus tambores, dançavam e cantavam: para chover; para se ter uma boa colheita; no nascimento de um filho; na lida diária; para dar ritmo as ações de trabalho coletivo, enfim, cantavam para tudo. É importante notar que o negro africano tem a musicalidade na alma, o que não significa que outros povos não a tenha. O ser humano, até mesmo mais do que os pássaros, é um cantor extraordinário. A música provoca uma atenção plena porque vem de fontes do ser onde a vontade calculadora, controladora, não detém o controle. A canção surge simplesmente, brota de alguma raiz escondida em nosso ser. A carne torna-se livre na canção e faz ressoar sua presença. Um sujeito canta, mas existe algo na canção que vai além de uma auto educação completa (DESMOND, 1990). Segundo Kátia Mattoso (2003), o tráfico foi o responsável por quebrar a estrutura social e política que vigorava na África, onde homens livres tinham o direito de possuir escravos. Nas zona saelo-saariana os escravos chegaram a representar entre 30 e 50% da população. Neste sentido, John Thornton, fornece uma explicação para a força da escravidão na África: A escravidão era difundida na África Atlântica porque os escravos eram a única forma de propriedade privada que produzia rendimentos reconhecidos nas leis africanas. Em contraste, nos sistemas legais europeus a terra era a principal forma de propriedade privada lucrativa, e a escravidão ocupava uma posição relativamente inferior. De fato, a posse da terra era em geral uma pré– condição na Europa para a utilização produtiva dos escravos, ao menos na agricultura. Em razão de sua característica legal, a escravidão era de muitas maneiras o equivalente funcional do relacionamento do proprietário da terra com seu arrendatário e talves igualmente dissiminada. Neste sentido, foi a ausência de propriedade privada – ou para ser mais preciso, foi a propriedade coorporativa da terra – que levou a escravidão ser tão difundida na sociedade africana.(THONTON, 1949 P.125) Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 73-78, agosto-dezembro, 2011. Coutinho (2011). Nessa sociedade, a riqueza se baseava no número de escravos que se tinha e não na terra, pois esta pertencia a todos, sendo preciso de alguém que trabalhasse para fazê-la produzir. Muitos homens e mulheres se tornaram escravos por causa de guerras; outros se ofereciam para ser escravos, pois o clima desfavorável tornava difícil a sua sobrevivência. Assim, a mão de obra escrava tornou-se fundamental. Deste modo, os portugueses se aproveitaram desta estrutura e entraram neste comércio comprando e vendendo escravos, até mesmo dentro da própria África. Neste contexto, como a riqueza se baseava em ter escravos, podia-se inclusive transferir a propriedade adquirida, no caso o escravo, de pessoa a pessoa e, isto era moralmente aceito na sociedade africana. Importante se faz ressaltar que não existia uma justificativa para a negociação além mar de escravos, visto que a África não estava sob qualquer pressão comercial e ecomômica (THONTON, 1949). No entanto, a tecnologia militar oferecida pelo colonizador fez com que a ganância aumentasse entre os africanos e estes passassem a oferecer cada vez mais escravos em troca de armas para garantir sua defesa contra os inimigos. Desta forma o tráfico tormou-se cada vez mais cruel. A bordo dos negreiros Na longa travessia do Atlântico, os negros ficavam amontoados nos porões dos navios, acorrentados e amarrados em troncos, submetidos a uma condição bastante insalubre. Ao longo dessa viagem muitos morriam, o que gerava prejuizo financeiro para os compradores. Neste contexto, os comerciantes tumbeiros descobriam, logo nos primeiros contatos com a África, que os negros, além de pendores para todas as artes, têm o ritmo na alma. Assim, quando traziam suas cargas para o Brasil, regularmente levavam os cativos para o convés e os fazia dançar e cantar de forma a evitar doenças como o banzo que, acometendo um negro, mata-o de tristeza (MARTINS, 2008). Dessa forma, os negros arrancados de seu convivio social se misturam a outros tantos na nesma condição. Muitas vezes, até inimigos de outras tribos eram colocados juntos, pessoas totalmente estranhas, de dialetos diferentes passavam a conviver lado a lado, com a mesma dor e o mesmo sofrimento (MATTOSO, 2003). Segue-se, dessa maneira, a jornada dos degredados de sua terra natal. Sua cultura, sua tradição religiosa vai ficando cada vez mais distante, sumindo na linha do horizonte. Certamente o estupor e o medo, o abatimento e o pavor , o horror diante do desconhecido, do estranho e da coação, são suas primeiras reações. Mas os cativos vão pouco a pouco, penosamente, às próprias custas, aprender a existência de outro mundo, estranho e diferente (MATTOSO, 2003). Todo o sofrimento e humilhação sofridos desde sua partida da África deixava os cativos atordoados. E, para piorar a situação, quando eles chegavam ao local de esembarque ainda pernaneciam alguns dias no navio, para a inspeção sanitária. Depois eram levados para uma gaiola coletiva, onde eram arrematados em leilões por senhores brancos, que verificavam o porte físico e os dentes. Se saudáveis, recebiam lances, e o negro iniciaria uma outra vida, por certo, uma outra história. Negros de engenho, das minas e cidades Com a introdução da economia açucareira, impostos eram cobrados sobre todo o tipo de mercadoria que era produzida e negociada, inclusive escravos. A coroa recebia uma porcentagem por cada escravo que era vendido ao senhor de engenho. Mais tarde, houve também a tributação sobre o fumo, o couro e o algodão. Essas cobranças de altas taxas obrigavam o engenho a aumentar a sua produção, assim, para se ter lucro no negócio, era necessário explorar cada vez mais o trabalho do escravo. Nesse sentido, ainda é importante ressaltar que os trabalhos na lavoura e no engenho não representavam a totalidade do que era exigido dos cativos. Eles eram obrigados a construir e reparar cercas, cavar fossos, consertar estradas e pontes, prover a casa-grande de lenha, reparar os barcos e os carros de boi e uma série de outras atividades, além de ter de providenciar parte de seu próprio alimento, pescando, caçando ou cuidando da roça. Diante dessas condições, um escravo revoltado podia facilmente sabotar a produção do engenho. Bastava espremer Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 73-78, agosto-dezembro, 2011. Coutinho (2011). limão em uma caldeira de melado para impedir a sua cristalização em açúcar. Dessa forma, para conseguir a colaboração dos escravos era preciso recorrer a incentivos. Os senhores costumavam, portanto, pagar os escravos com pequenas quantidades de açúcar, aguardente, melaço, roupa ou mesmo dinheiro. Esses descontentes, os resistentes, os rebeldes ou os fugitivos. Cada um ao seu modo e de acordo com seus próprios meios, procurava alterar o sistema e sua regras. Para alguns, era um modo de barganhar melhores condições para si e para o grupo; para outros era uma maneira de adquirir poder, liberta-se e determinar seu próprio destino; e para um outros grupos, um meio de virar a mesa sobre seus senhores e governantes (Thornton, John Kelly, 1940). Desse modo, mesmo sendo escravo, a luta contra a tirania fazia com que o negro buscasse de toda forma coagir os seus senhores, seja através de sabotagens ou pequenos furtos e, até mesmo, através da forma cantada, que por vezes incomodava os administradores, deixando-os temerosos, por causa de uma possível rebelião. Trapacear o senhor é um jogo que tem justificativa na própria opressão (MATTOSO, 2003). Dentre as formas de protesto estavam as músicas em dialeto yorubá ou nagô, misturadas com palavras em português, que os negros costumavam cantar enquanto trabalhavam ou, até mesmo, na senzala. O Canto23 de trabalho era, muitas vezes, um protesto contra o brutal sistema escravagista. 23 Cantos de trabalho são cantos que acompanham o trabalho, entoados em coordenação com o movimento do corpo. Ao enfrentar a dureza de suas tarefas braçais , o escravo cantava para revigorar-se ao som de sua própria voz. No transporte de cargas pesadas , por exemplo, quando um escravo via o companheiro fraquejar as pernas , punha-se ao seu lado e cantava, marcando o ritmo da caminhada. Então o que estava a ponto de cair respondia primeiro com a voz débil e quando o companheiro respondia mais forte clareava a voz . Firmava os passos e os dois seguiam sem mais demonstrar cansaço. (Lopes,NEI: Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana, São Paulo: Selo Negro, 2004) A insatisfação era manifestada por símbolos culturais como cantigas de trabalho e provérbios que desafiavam os mecanismos próprios do sistema colonial. O protesto se dava em forma de versos cantados com raiva: Branco diz que preto furta// Preto furta com razão: Sinhô branco também furta// Quando faz escravidão (MATTOSO 2003). Essa maneira de expressar do negro enquanto cativo no Brasil era diferente da maneira com que ele se expressava em terras africanas, pois sua condição de escravo nos engenhos, trabalhando até 14 horas a fio e com uma alimentação insuficiente para matar sua fome em nada lembrava a de sua terra natal. Normalmente, os cativos levantavam-se por volta das cinco horas da manhã e ao toque do sino do feitor se reuniam no terreiro para receberem as ordens do dia. Em alguns engenhos, sobretudo nos pertencentes a ordens religiosas, os escravos eram obrigados a fazer uma oração matinal antes de seguir para o trabalho no canavial. Em geral, eles trabalhavam em turmas que reuniam entre dez ou quinze cativos. Às nove horas, os cativos paravam para uma pequena refeição e três ou quatro horas depois almoçavam, ali mesmo no campo. Depois disso, continuavam trabalhando até o anoitecer. Já em sua terra natal ele era livre para viver a sua crença, conviver com os parentes e o ambiente era conhecido. Não resta dúvida que sua alegria era outra. A canção de trabalho adquiriu suas próprias qualidades distintas na América, por uma série de motivos. Em primeiro lugar, embora o canto para acompanhar o trabalho do homem fosse uma coisa de todo comum na África Ocidental, torna-se óbvio que o trabalho em terra própria se mostra bem diferente do trabalho forçado numa terra alheia e estrangeira. E a despeito a insistência física necessária para seguir uma canção de trabalho ainda se encontrar presente, as referências acompanhantes do trabalho haviam se transformado radicalmente. A maioria dos africanos ocidentais era composta de lavradores, e tenho a certeza de que essas canções agrícolas poderiam ter sido usadas nas terras do Novo Mundo do mesmo modo Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 73-78, agosto-dezembro, 2011. Coutinho (2011). que no Velho. Mas, a letra de uma canção onde se dizia que ‘Depois de plantar, se os deuses fizerem chover/ Minha família, meus ancestrais, serão ricos tanto quanto são belos’ não poderia aplicar-se nas circunstâncias horríveis da escravidão (TINHORÃO, 2008) Cantos como “na fazenda da Cachoeira,//Tem cabrito, tem boiada,//Tem carneiro, tem porcada/Urubu tá comendo foia... ,//(Coro) Lá, lá ri, lá, lá lá ri” eram utilizados como analogia a situação do negro cativo, ou seja, o dono da fazenda Cachoeira, apesar de muito rico (“ Tem cabrito, tem “boiada”), só dava aos seus trabalhadores couve para comer. Ora, negro comendo couve era o urubu comendo folha. Assim, de norte a sul do Brasil, os negros contribuíram para o desenvolvimento do país com os seus braços e, foram, por muito tempo, o pilar mestre da economia açucareira, mineradora, dentre outras. Nas cidades, como os negros faziam todo trabalho pesado, encantavam muitos Viajantes com seus cantos animados. Na descrição do capitão Theodor Von Leithold é ressaltado, desde logo, o verdadeiro sentido do canto de trabalho dos negros, pois ao ouvir-lhes a cantoria com as cargas à cabeça, lembrou-se logo do coro dos lenhadores da Alemanha: “Esses escravos são extremamente ágeis e robustos. Podem carregar pesos incríveis sobre a cabeça. Quanto mais pesado parece ser o trabalho, mais selvagemente se põem a cantar, como se sua força fosse estimulada pelo coro, igual dos nosso [alemães] lenhadores. Seu instrumento consiste numa gaita prêsa a uma tábua em que estão esticadas duas cordas, que eles tocam caminhando ou reunidos à porta de uma venda para dançar ao som do mesmo.” “Ao carregar esses fardos pesadíssimos, através das ruas, os pretos cantam uma espécie de coro, que não deixa de ser uma maneira muito útil de prevenir o transeunte para que saia da frente, já que, em meio aos numerosos ruídos da cidade. (GOMES,1996) Por fim, não se pode deixar de fazer referência às negras de tabuleiros, que vendiam seus quitutes pelas ruas das cidade: Salvador, Rio de Janeiro, Ouro Preto. Elas, além de ganhar o seu sustento e o de sua família, faziam o intercâmbio entre os faiscadores e os contrabandistas de ouro, faziam contato com os negros de canto que organizavam rebeliões para impor respeito para o seu grupo ou até mesmo organizar fugas para quilombos. E ainda, no seu vai e vem sempre entoavam canções . Afinal, tarde da noite, quando a maioria das famílias se preparava para dormir, algumas negras velhas vagueavam pelas ruas sombrias e, olhando o céu abaixo, entoavam cantos de melodias claras e melancólas de origem africana e de versos, em parte, africanos , mercando as guloseimas, comidas e bebidas que tinham para vender. Esses cantos pesarosos eram terno ao ouvido, embalavam a cidade. (Bernardo, 2003) CONCLUSÃO Diante dos fatos apresentados podese concluir que após um longo periodo de escravidão no Brasil é inegável o papel do negro na formação cultural desta terra. A mãe África ficou no horizonte, perdida do outro lado do Atlântico, mas as raizes deste frondoso Baobá (árvore símbolo da África ) se espalhou pelo território brasileiro dando um tempero todo especial a esta nação de brancos, negros, mulatos, cafusos e mamelucos. REFERÊNCIAS BERNARDO, Teresinha. Negras, mulheres e mãe: lembranças de Olga de Alaketu / Teresinha Bernardo. São Paulo: EDUC; Rio de Janeiro: Pallas, 2003. GOMES, Flávio dos Santos. org. REIS, João José. Liberdade por um fio: História dos quilombos no Brasil. São Paulo. Cia das Letras 1996. MARTINS, Tarcísio José. Quilombo do Campo Grande – A história de Minas que devolve ao povo, MG: Ed Santa Clara, 2008. MATTOSO, Kátia de Queirós. Na África: ser vendido como escravo. In: Ser escravo no Brasil, SP .: Brasiliense, 2003. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 73-78, agosto-dezembro, 2011. Coutinho (2011). TINHORÃO, José Ramos. Os sons dos negros no Brasil: cantos, danças e folguedos. Origens. São Paulo: Ed 34, 2008. THORNTON, John Kelly. A África e os africanos na formação do mundo Atlântico: 1400-1800: tradução Marisa Rocha Mota – RJ, Elsevier, 2004. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 73-78, agosto-dezembro, 2011. Coutinho (2011). Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 73-78, agosto-dezembro, 2011. Souza (2011). MULHERES CHEFES DE FAMÍLIA NO BRASIL COLÔNIA Área Temática: História Sara Bruna Lopes de Souza1 1 Graduanda do 3º Período de História pela Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – FACIG. RESUMO: A presente pesquisa se propõe a analisar a estrutura da família brasileira no Brasil Colonial, sendo a chefia feminina de domicílios o destaque deste. Para desenvolver este trabalho valemo-nos de dissertações e outros estudos que abordam tal assunto. Assim, buscaremos entender qual foi o real valor da família patriarcal na sociedade colonial, quem eram as mulheres que chefiavam lares, destacando o que propiciou a formação de tais fogos e como estas mulheres viviam, quais eram suas estratégias de sobrevivência. Sabe-se que as atividades exercidas por essas mulheres variaram em diferentes funções, e foi por meio delas que sustentavam seus lares. Desta forma, ao analisar a diversidade quanto à organização familiar, destacaremos como a chefia feminina de domicílios foi um fenômeno comum na família brasileira. Palavras chave: família, mulher, sociedade colonial. INTRODUÇÃO Ao dizer que a família patriarcal é o modelo predominante no Brasil, cairemos em um equívoco, pois esta não corresponde à maior parte das formações, apesar de ser o modelo mais influente. Nas palavras de Mariza Corrêa (...) a família patriarcal pode ter existido, e seu papel ter sido extremamente importante, apenas não existiu sozinha, nem comandou do alto da varanda da casa grande o processo total de formação da sociedade brasileira. (CORRÊA, 1993, p. 27) O presente trabalho propõe um estudo da composição da família brasileira no Brasil Colonial, especificamente, a chefia feminina nos domicílios. Neste estudo, analisaremos as estratégias de sobrevivência dessas mulheres. A família colonial era marcada pela diversidade no que diz respeito à organização familiar. Com isso, a chefia feminina de domicílios foi um fenômeno comum na história da família brasileira. QUEDA DA ORGANIZAÇÃO FAMILIAR PATRIARCAL No Brasil Colonial, o modelo de família patriarcal, o casal, depois os filhos, os agregados, os escravos e, muitas vezes, os filhos casados, não era o que predominava. Na verdade, esse modelo era mais incomum do que se pensa. Em seu estudo dedicado a sociedade paulista do século XIX, Eni de Mesquita Samara afirma que famílias extensas, compostas de casais com muitos filhos, parentes, escravos e agregados na forma concebida pela literatura não foram, portanto, o tipo predominante, não chegando a 30% do total de domicílios. (SAMARA, 2003, p.40) Ainda no que diz respeito à organização familiar, é importante ressaltar que poucos eram os casamentos oficiais, pois era muito caro e dificultoso/burocrático se casar. Assim, o casal acabava vivendo junto. Assim, além de concebidas pela dificuldade financeira das partes, as uniões ilícitas podem ser vistas como uma forma de resistência ao sistema escravista, como notou a historiadora Romilda de Oliveira Alves: Os relacionamentos instáveis podem ser vistos como uma atitude de resistência de alguns escravos e libertos contra a sociedade que os oprimia; cativos e descendentes evitavam seguir as normas estabelecidas pelas autoridades coloniais, vivendo em uniões Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 79-82, agosto-dezembro, 2011. Souza (2011). consensuais e passageiras que foram responsáveis pelo alto índice de ilegitimidade. (ALVES, 2006, p.49) Ao longo de muitos anos, a visão que se tinha da mulher na sociedade colonial era de um ser frágil, que vivia nos recônditos do lar, sem participar do sistema produtivo na sociedade colonial. 24 Entretanto, por meio de estudos, hoje já se sabe que o papel da mulher não se restringia ao âmbito doméstico, sendo que esta deveria muitas vezes sair para trabalhar para o sustento do lar, fosse ela da elite ou não. QUEM ERAM AS MULHERES QUE CHEFIAVAM FAMÍLIAS? Segundo Donald Ramos, que estudou os domicílios chefiados por mulheres em Vila Rica no período da passagem do predomínio da atividade mineradora para a agrícola, o que propiciou a formação de domicílios 24 Certamente contribuíram para a formação desta imagem da mulher passiva e submissa, os viajantes que estiveram no Brasil em seu período colonial e imperial. Muitas vezes estes afirmavam que as mulheres viviam recolhidas em suas casas e que não podiam sequer sair sozinhas. Atestam, ainda, que quando da chegada de algum estranho em casa, as mulheres se escondiam nos quartos e de lá saíam apenas quando a visita fosse embora. Certamente os viajantes usaram de grande generalização ao fazerem tais afirmações, considerando, em grande medida, as mulheres que integravam a elite. Assim, acabam por desconsiderar grande parte da sociedade, ou seja, as mulheres pobres e as escravas, as quais se destacaram por seu trabalho e atuação na produção colonial e imperial. Para maiores informações sobre estas discussões Ver: SAINTHILAIRE, Auguste. Viagem pelas províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1975, p.96; DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. 2ª Edição. São Paulo: Brasiliense, 1995; SOARES, Carlos Eugênio Líbano. Comércio, Nação e Gênero: as negras minas quitandeiras no Rio de Janeiro (1835- 1900). In: SILVA, Francisco Carlos Teixeira da; MATTOS, Hebe Maria & FRAGOSO, João (orgs.). Escritos sobre história e educação. Homenagem a Maria Yedda Leite Linhares. Rio de Janeiro: Maud/FAPERJ, 2001; FIGUEIREDO, Luciano R. O avesso da memória: cotidiano e trabalho da mulher em Minas Gerais no século XVIII. Rio de Janeiro: José Olímpio, 1993. chefiados por mulheres foi a emigração da população masculina para zonas de fronteiras agrícola, a alta percentagem da população feminina e as exigências burocráticas da Igreja para se casar. O número de fogos chefiados por mulheres, com o tempo tornou-se expressivo. Segundo Eni Mesquita, em 1836, 1/3 dos domicílios eram chefiados por mulheres em São Paulo. Nesse contexto, quem se destaca são mulheres solteiras, viúvas ou com maridos ausentes. Em sua pesquisa sobre a chefia de domicílios em Minas Gerais no século XIX, Cristiane Viegas de Andrade observou que nos fogos chefiados por mulheres solteiras viviam mulheres abandonadas e mesmo aquelas casadas que tiveram seus maridos afastados por necessidade econômica. Segundo ela, enquanto os homens eram em sua maioria casados (82, 39%), as mulheres chefes são, em grande número, solteiras (49,99%) e viúvas (40,72%). Essa diferença no número de mulheres chefes de domicílio também se diferencia quanto à cor. Ainda segundo Viegas: No total de mulheres chefes de domicílio, as mestiças, 51,75%, predominavam sobre as brancas, 28,70%. O estudo também mostra 16,78% de crioulas, e 2, 77% de africanas como chefes (ANDRADE, 2001, p. 75-76) Ao verificar que as mães solteiras tinham em média menos filhos que as casadas, e que viviam em casas menores, Donald Ramos diz ser uma indicação de que as solteiras pertenciam a uma classe sócioeconômica mais baixa do que as casadas. Assim, as mães solteiras chefiavam fogos menores do que aqueles domicílios de mulheres que são ou foram casadas. COMO VIVIAM? A economia dessa época era diversificada e dinâmica. Tomando como exemplo Minas Gerais, especificamente Mariana, Romilda de Oliveira Alves comenta: Trata- se, como se vê, de uma economia dinâmica e centrada nas atividades agropecuárias coexistindo Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 79-82, agosto-dezembro, 2011. Souza (2011). com uma insistente mineração de ouro e pedras preciosas. Consideram-se, ainda, dentre estas atividades diversificadas, os trabalhos artesanais e produção de ferros nas forjas domésticas da região de Mariana. (ALVES, 2006. p.33) Dentro dessa sociedade de economia diversificada, mulheres pobres, escravas e forras muito contribuíram. A autora Laura de Mello e Souza, ao observar a região de Minas Gerais no século XVIII, verificou que quanto as mulheres forras e escravas e mulheres solteiras chefes de família, o exercício da prostituição como renda complementar de seus lares, foi comum. O alto índice de prostitutas pode ser associado a pobreza mineira da época. De fato, a prostituição era exercida por mulheres solteiras, porém também foi por quem tinha uma família estruturada. Nas palavras de Romilda Alves A prática do meretrício chegou inclusive a invadir o tecido familiar, havendo pais que consentiam a prostituição da prole e mães que dividiam o mesmo ofício com as filhas. A concessão de lares para a prática de delitos sexuais e prostituição às vezes tornava-se um meio de sobrevivência de parte da sociedade colonial. (ALVES, 2006, p.37) No que diz respeito ao comércio, destacamse as “negras de tabuleiro”. Em sua maioria eram escravas e libertas que se dedicavam ao comércio ambulante, sendo que algumas chegavam a ser proprietárias de venda. Dentro das minas, os principais produtos vendidos eram a cachaça, doces, bolo e mel. Entretanto, muitos foram os alvarás de tentativa de impedir a presença destas nas áreas de mineração, lavras, morros ou aluviões. Para as autoridades, as vendas e as negras de tabuleiro representavam um perigo de desvio das normas. “Tais autoridades, acusavam as mesmas pelos desvios do ouro, diamantes, dos jornais dos escravos e por provocarem brigas e conflitos nas áreas de mineração”(ALVES, 2006, p. 38). Vale destacar que muitas mulheres alcançavam mobilidade social e econômica por meio desse comércio. Outra atividade utilizada por mulheres para o sustento do lar foi a produção doméstica de fios. No Brasil Colônia, a maior parte das mulheres se ocupava em atividades do setor têxtil, como fiandeiras, tecelãs, rendeiras e costureiras. Isso acabou contribuindo para a construção de uma indústria têxtil em Minas, por exemplo. Segundo Carla Almeida: Pela lista nominativa de Catas Altas, constatamos que 34,4% dos chefes de domicílio deste distrito se dedicavam a algum tipo de atividade ligada a indústria têxtil (de 352 chefes do domicílio, 74 eram fiandeiras, 13 tecedeiras, 2 rendeiras, 15 costureiras e 17 alfaiates). Portanto, a “indústria têxtil” era já neste momento bastante significativa no contexto da economia mineira. (ALMEIDA, 1994, p.92) Nesse contexto, ainda eram encontrado mulheres livres e escravas desenvolvendo atividades em teares rudimentares e tecendo e fiando algodão, tanto para uso familiar, quanto para fins comerciais. Sendo que, atividades em sítios e fazendas exercidas por mulheres não era incomum. Nas palavras de Francisco Eduardo Andrade (...), especialmente as mulheres livresesposas, filhas, agregadas-, com suas escravas ou não, e, sobretudo aquelas com poucas posses, dividiam a lida cotidiana doméstica entre cozinhar, lavar, tecer, cuidar dos pequenos animais (galinhas e porcos) e da horta, trabalhar no beneficiamento de gêneros agrícolas. Mas, certamente, a fiação e tecelagem se destacavam, devido aos rendimentos que auferia ao grupo familiar. (ANDRADE, 1998, p. 125) CONCLUSÃO Contudo, com o que foi apresentado, podemos perceber que ao longo da História, um grupo sempre foi negligenciado pela historiografia, mulheres pobres, escravas e forras. Entretanto, estas tiveram grande destaque na sociedade colonial, principalmente na contribuição econômica. Revista da Faculdade de Ciências Gerenciais de Manhuaçu – Facig (ISSN 1808-6136). Pensar Acadêmico, Manhuaçu, MG, v. 5, n. 2, p. 79-82, agosto-dezembro, 2011. Souza (2011). Estas mulheres exerceram variadas ocupações, como vendedoras, costureiras, fiandeiras e também prostituição. O que vale destacar é a situação econômica de tal época que propiciou a chefia de mulheres de domicílios, sendo que em períodos de crise aparece um maior número de chefia feminina, podendo ser estas mulheres mulatas, negras e também brancas. As atividades exercidas por essas mulheres foram diversificadas, e foi por meio delas que muitas mulheres obtiveram recursos para o sustento do seu lar. BIBLIOGRAFIA ALMEIDA, Carla Maria Carvalho de. Alterações nas unidades produtivas mineiras: Mariana (1750-1850). 1994. 220 f. Dissertação (Mestrado em História) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 1994. ALVES, Romilda de Oliveira. Mulheres Solteiras Chefes de Domicílio: Mariana C. 1807- C. 1822. Mariana- MG (Monografia). Universidade federal de Ouro Preto, 2006. ANDRADE, Cristiane Viegas de. 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