Leitura Complementar
Curso on-line de Aperfeiçoamento em Agricultura Orgânica
Prof. Silvio Penteado
A INSENSATEZ DA AGROQUÍMICA
Engº Agron. José Lutzenberger
Desde milênios, desde que inventou a agricultura – um passo muito sério
e talvez fatal na história da evolução orgânica – o homem vem
enfrentando os problemas das enfermidades e pragas, ou parasitas, das
plantas e animais domésticos. Para citar apenas um caso extremo, basta
lembrar a grande fome na Irlanda no séc. XVIII, quando a Phytophtera
acabou com as lavouras de batata, causando a morte por inanição de
uma quarta parte da população do país e obrigando outra quarta parte a
emigrar. A população da Irlanda ficou reduzida à metade. Em menor
escala, quem, entre os que apreciam o seu jardim, ainda não se
incomodou com a saúva, pulgões e lesmas ou com enfermidades
criptogâmicas?
Hoje, além de uma maquinaria cada dia mais sofisticada, o agricultor
moderno, para resolver seus problemas, tem à sua disposição os adubos
químicos e todo um arsenal de venenos químicos os mais diversos,
potentes e persistentes, os assim chamados produtos fitosanitários,
pesticidas, defensivos ou corretivos: inseticidas, acarecidas, nematicidas,
rodenticidas, molusquicidas, repelentes, fumigantes, desinfetantes,
fungicidas, antibióticos, herbicidas, defoliantes, alguicidas e alguns mais.
Cada uma destas substâncias lhe é entregue em formulações sempre
mais complexas em que, além dos ingredientes ativos, participa toda
uma série de substâncias auxiliares: material inerte, solventes,
condicionadores, detergentes, emulsificantes, colorantes, sinergistas e
mais alguns.
Entretanto, quem observa a natureza intacta, quem observa um bosque
virgem ou qualquer outro sistema natural: tundra, chaparral, savana,
cerrado, caatinga, deserto ou banhadal, os lhanos da Venezuela ou os
campos nativos do Rio Grande do Sul, um recife de corais em mares
tropicais, um rio em plena selva, certas micro-comunidades bióticas
como as comunidades epífitas de nossas velhas figueiras, as pequenas
comunidades epílitas dos chapadões e paredões dos cerros e montanhas,
ou as associações de organismos de uma rocha de praia de mar, assim
como uma infinidade de outros sistemas terrestres ou aquáticos, quem
observa tudo isto de olhos abertos, notará logo que em toda a parte
estão presentes organismos que costumamos classificar de patogênicos
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ou de pragas e que, no entanto, são raríssimos os casos de catástrofes
como as que podemos tantas vezes observar em nossas lavouras e
jardins. Quando realmente sucedem estragos sérios, são sempre
localizados e passageiros.
Acontece que a Natureza é incrivelmente complexa, enquanto que nós
humanos, em nossos cultivos e criações, achamos que devemos
simplifica-la ao máximo, estabelecendo sistemas ultra-simples. Numa
lavoura de milho consideramos inço ou praga tudo aquilo que não é
milho. A natureza costuma fazer o contrário. Nos sistemas naturais é
enorme o número de espécies. Quem já observou de perto a selva
amazônica, por exemplo, sabe que às vezes pode caminhar centenas de
metros para rever uma determinada espécie, tantas são as espécies
existentes.
O estudo dos sistemas naturais nos mostra que quanto mais complexo
um sistema, quanto maior o número de espécies na comunidade, tanto
mais estável; quanto mais simples, tanto mais vulnerável o sistema. A
tundra é mais vulnerável que o bosque pluvial tropical, a comunidade
marinha da costa da Islândia mais do que o grande recife da Austrália.
Naturalmente, devemos sempre abstrair dos estragos que sabe causar o
homem. Contra o fogo e a terraplanagem não há defesa. Assim mesmo,
se a Selva Amazônica fosse como as florestas canadenses, talvez já teria
desaparecido há muito tempo.
Mas também os sistemas naturais relativamente simples, como a tundra,
não apresentam problemas comparáveis aos que encontramos em nossa
agricultura. Porque, apesar de relativamente simples, estes sistemas são
incrivelmente velhos e todos os organismos ali presentes tiveram um
tempo infinito para ajustar-se mutuamente em equilíbrios dinâmicos
permanentes. As comunidades naturais são sempre estáveis, enquanto
que nossos cultivos são quase sempre sistemas desequilibrados. Uma vez
desaparecida a mão do homem, em mais ou menos tempo, desaparecem
sem deixar vestígio.
Não somente os sistemas que o homem procura estabelecer são
extremamente simples, comparados com a natureza intacta, mas
também insistimos em transplantar organismos a condições muito
diferentes das em que se originaram. A batata, em seu habitat natural,
nos Andes, se adapta a um grande número de condições ambientais
diferentes. Existe até uma variedade epífita, mas nenhuma destas formas
nativas vive em condições que se comparam de longe com as de uma
moderna lavoura de batatas, como as que se podem ver na Holanda, por
exemplo.
Os geneticistas, quando selecionam as fabulosas variedades que hoje
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cultivamos, fazem uma seleção unilateral, simples. Visam o máximo de
produção e um aspecto comercialmente atrativo, muitas vezes em
detrimento da qualidade alimentícia, e mal tomam em conta os fatores
ecológicos. Já na própria estação genética as linhas em seleção recebem
doses maciças de adubos químicos e são submetidas a chuvas de
pesticidas violentos. Já são selecionadas para condições artificiais.
Além disso muitas das pragas são também organismos introduzidos. Nas
condições em que se encontram nas lavouras, faltam quase sempre seus
inimigos naturais que os mantinham sob controle no habitat original.
Não é de admirar, portanto, que nossos sistemas extremamente
simplificados sejam também muito vulneráveis, que surjam cada dia
novas dificuldades, dificuldades que não observamos na Natureza intacta
e que aumentam na mesma proporção em que “modernizamos” nossos
cultivos.
Enquanto o agricultor ainda estava bastante próximo da Natureza, como
era o caso nas agriculturas européias e asiáticas até poucas décadas
atrás, ele mais ou menos se defendia sem ou com pouco adubo químico e
praticamente não usava venenos no combate às pragas, mas conseguia,
assim mesmo, obter rendimentos constantes, às vezes bastante altos,
com plantas e animais relativamente sãos e de elevado valor nutritivo.
A medida, porém, que a agricultura se moderniza, com a mecanização
que conduz à monocultura em vastas áreas, à introdução de variedades
altamente produtivas, mas também altamente exigentes e sensíveis, e
que os modernos métodos têm possibilitado ao agricultor alienar-se cada
vez mais da Natureza, à medida que a indústria entrega ao agricultor
sempre novos remédios especiais e fáceis, para cada problema real ou
imaginário, que se faz agricultura em terras marginais que nunca
deveriam ter sido desbravadas e aradas, que se elimina mão de obra
pelo uso de herbicidas, que se eliminam os últimos arbustos e cercas
vivas, os últimos refúgios de fauna e flora, à medida que avança toda
essa artificialidade e dilapidação dos sistemas naturais equilibrados, os
problemas das pragas e enfermidades se tornam necessariamente cada
dia mais complicados e mais sérios.
Hoje uma grande lavoura de algodão no Texas ou no Egito, com os
métodos atuais seria inimaginável sem fortes doses de adubos químicos e
um número cada vez maior de tratamentos com sempre novos
pesticidas. Um produtor de maçãs no Tirol ou em Marrocos chega a fazer
até trinta e mais tratamentos por temporada.
Chegamos, assim, a uma situação de círculo vicioso: quanto mais
química, mais pragas e, portanto, mais química. Situação esta muito do
agrado das grandes empresas químicas.
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Vejamos um caso concreto entre dezenas de casos parecidos: no Brasil
ainda comemos laranja manchada. Nosso público ainda não reclama se
na casca da laranja, que afinal não se come, aparecem algumas
minúsculas cochonilhas. O homem comum, em geral, é cego para os
aspectos biológicos e a grande maioria não vê nada. De fato, neste caso,
as cochonilhas não fazem absolutamente mal nenhum. O dano é só no
aspecto. Mas, nos países tecnologicamente desenvolvidos, com sistemas
de comercialização em grande escala e super-competitivos, uma laranja
assim não tem chance. No supermercado alemão ou americano as
laranjas levam carimbo, são de aspecto impecável, umas como as outras.
Um inseto, uma mancha, um arranhão e a laranja vai para o refugo. Na
época da colheita, na Espanha ou na Itália, podem ver-se montanhas de
laranjas, perfeitamente aptas para o consumo, apodrecendo ao lado da
estrada. Trata-se de refugo. Na estante do supermercado a laranja mais
parece saída de uma daquelas máquinas de extrusão de objetos de
plástico do que proveniente de uma árvore que vive.
Para obter aquele fruto de aspecto impecável o cultivador nas Caraíbas
ou na região do Mediterrâneo tem que usar inseticidas cada vez mais
violentos, em aplicações sempre mais numerosas. Na África do Norte,
contra a cochonilha, usaram inicialmente o Parathion. Este inseticida tem
o que os técnicos chamam um”espectro amplo”, quer dizer que não é
nada seletivo, mata quase tudo (em Marrocos as autoridades até o têm
usado para matar pardais. Fazem aplicações de avião, à tardinha, quando
os pardais estão reunidos dentro das árvores, em sua costumeira
algazarra, antes de dormir. Muito bom apiário desapareceu assim). Este
poderoso inseticida controlava satisfatoriamente a cochonilha, mas,
devido justamente a este espectro amplo, matou também um sem
número de outros organismos, quase todos desconhecidos do agricultor.
Entre eles os inimigos naturais dos pulgões e dos ácaros.
Antes do uso intensivo deste inseticida o ácaro e o pulgão ocorriam
esporadicamente na região. Não chegavam a incomodar. Mas, com o
desaparecimento de seus inimigos naturais, seguiram o exemplo do
homem, tiveram sua explosão demográfica. Agora o agricultor, para
combate-los, além dos produtos que já usava contra a cochonilha, usa
mais um inseticida sistêmico e um acarecida. Três venenos violentos
onde antes não era necessário nenhum.
Os predadores desaparecem e as pragas tornam-se sempre mais
resistentes aos inseticidas, obrigando ao emprego de sempre novas
substâncias em doses sempre maiores.
Não tivesse o consumidor dos grandes centros sido condicionado pelo
comércio a só aceitar frutos de aspecto impecável, a produção seria mais
barata, haveria menos desperdícios e o ambiente das fazendas, a água
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dos rios, lagos e mares, a natureza em geral estariam menos poluídos,
nossa saúde estaria mais protegida.
A química levou a agricultura a uma situação semelhante de pessoa
drogada. O drogado começa com doses pequenas que lhe proporcionam
imenso prazer. Acaba tomando sempre mais, com efeito sempre menos
satisfatório, até o desastre final.
Os próprios adubos químicos já descandeiam um ciclo vicioso deste tipo.
As primeiras doses de azoto produzem efeito espetacular. Mas o
agricultor acaba usando sempre mais para manter o mesmo nível de
colheita. A micro-flora e fauna do solo, assim como sua estrutura,
acabam degradando-se e desaparecem. Perde-se a capacidade original
de fixação do azoto no ar. Alcançam-se então dosificações tais que a
maior parte do adubo se perde por lixiviação. O solo se transforma em
simples substrato hidropônico. Os rios e lagos morrem pela eutroficação.
Nestas condições é impossível evitar desequilíbrios metabólicos nas
plantas cultivadas. Não somente sofre o valor alimentício, mas aumenta
também a susceptibilidade às enfermidades e pragas. Aparece então o
vendedor de pesticidas e começa novo ciclo, ainda mais anti-ecológico e
mais pernicioso.
Há uns trinta anos havia, talvez, uma dúzia de produtos fitosanitários
no mercado e seu uso era relativamente restrito. Predominava a procura
de soluções biológicas, ou seja, ecológicas, para os problemas das pragas
e enfermidades dos vegetais cultivados. Os agrônomos e sanitaristas
procuravam combater as pragas pela introdução ou proteção dos
inimigos naturais, ou predadores destas. Nos métodos de cultivo
procurava-se levar em conta as condições que dificultavam a
sobrevivência da praga e favoreciam o predador. Os geneticistas
selecionavam variedades robustas e resistentes. O camponês tradicional
baseava-se em sabedoria ancestral que consistia, em geral, em métodos
que respeitavam até certo ponto os equilíbrios naturais e que eram, por
isso, permanentemente sustentáveis. Mas, com a descoberta do DDT
durante a última grande guerra, esta situação começou logo a alterar-se
profundamente. Era muito mais fácil aplicar venenos que observar a
Natureza e pensar em termos ecológicos. A química tomou conta da
agricultura. Hoje o índice de produtos fitosanitários americano contém
uns 650 herbicidas, 750 inseticidas, 600 fungicidas e mais uns 550
produtos diversos, num total de cerca de2.500 produtos, sem contar os
produtos compostos que contém várias substâncias ativas. O índice geral
que contém todas as marcas de produtos simples e compostos registra
mais de 10.000 produtos. No índice alemão podem contar-se cerca de
1.100 produtos e o índice francês enumera ao redor de 1.400 produtos
( situação de 1969). Mas estes índices nunca estão completos, cada ano
aparecem centenas de produtos novos.
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Se para o técnico especializado é difícil manter-se a par desta inundação,
imaginemos a situação do agricultor. A própria dona de casa está hoje
comprando muitos destes produtos na estante do supermercado, ao lado
da manteiga e da goiabada.
Todos estes venenos, entre eles os venenos mais violentos até agora
desenvolvidos pelo homem, estão à disposição de qualquer irresponsável.
Qualquer criança pode comprá-los sem receita na loja da esquina.
Qualquer caboclo analfabeto se acha com o direito de largar os biocidas
mais fulminantes em qualquer ecossistema sem a menor preocupação.
Qualquer prefeito de cafundó, para combater mosquitos ou borrachudos,
envenena banhados ou arroios, se considera muito progressista quando
aplica alguicidas ou herbicidas num lago para matar algas ou aguapés.
Os plantadores de arroz não hesitam diante do uso de iscas envenenadas
com inseticidas persistentes para livrar-se dos marrecões. Em termos
ecológicos isto equivale a entregar bombas atômicas ao público para que
as utilize em suas disputas pessoais.
Convém mencionar que, ao contrário do que acontece com os fabricantes
de outros ramos, os fabricantes de pesticidas, nos rótulos e folhetos
explicativos, deixam bem claro que se isentam de qualquer
responsabilidade por eventuais conseqüências desfavoráveis do uso
indevido e, o que é mais interessante e significativo, também do uso
devido de seus produtos. Entregam toda a responsabilidade ao
comprador. Mas o público não costuma ler estas advertências em letra
pequena, como não lê as cláusulas escondidas das apólices de seguro.
Na indústria química o ramo dos pesticidas é hoje um dos mais
importantes, com taxas de crescimento fabulosas. As grandes casas
internacionais fazem enormes investimentos na pesquisa e conquista de
mercados. Ali trabalham milhares de técnicos, químicos, biólogos,
farmacólogos, agrônomos e um exército ainda maior de comerciantes. As
indústrias tem suas próprias estações experimentais com recursos
ilimitados e ainda se servem das estações do estado e de particulares,
todas ansiosas em participar nesta cornucópia de remédios fáceis.
A medida que aumenta o mercado e, uma vez existentes as grandes
capacidades de produção, procuram-se sempre novas possibilidades de
aplicação. Em minha atividade dentro da indústria tive a oportunidade de
ser confrontado, inclusive, com folhetos técnicos que recomendavam a
destruição de minhocas com chlordano, um hidrocarboneto clorado com
todos os inconvenientes do DDT. Assisti a discussões em que agrônomos,
a serviço da indústria, homens aparentemente inteligentes, propunham
como uma nova idéia genial a aplicação no bosque de um herbicida já
fracassado na viticultura devido à sua persistência. Este herbicida matava
as vinhas anos depois de sua aplicação porque descia lentamente no
solo. Para que propunham eles estes herbicidas no bosque? Para acabar
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com a vegetação rasteira e facilitar assim o trabalho do caçador que veria
melhor a lebre!
Vejamos um caso mais nefasto de conquistas de novos mercados.
Trata-se do caso dos “defoliantes” no Vietnam. “Defoliantes”, neste caso
é apenas um eufemismo para uma arma abominável. Trata-se de
herbicida, como o 2,4-D, o 2,4,5-T e o pichloram, que são usados em
dosificações pelo menos dez vezes superiores às agrícolas, tornando-se
assim herbicidas totais. Dezenas de milhares de km² de florestas, sem
falar das lavouras, foram assim definitivamente destruídas. Grandes
extensões de mangue desapareceram para sempre. Os manguesais são o
resultado de equilíbrios frágeis. Destruídos, o dano é irreparável. Os
vietnamenses eram uma das poucas civilizações culturalmente elevadas
que sabiam viver em relativa harmonia com o bosque. A recuperação dos
estragos causados levará séculos. A “defoliação”, que teria como fim
apenas tornar visíveis os soldados inimigos, acabou não somente com o
bosque, mas com toda a fauna dele dependente. Destruiu-se também
uma civilização milenar.
Voltando ao agricultor, ele está hoje tão condicionado e o aparelho
comercial continua com todos os meios a indoutriná-lo, que já não
concebe agricultura sem química. Já não mais espera o aparecimento da
praga. As aplicações são feitas segundo um calendário fixo. Não somente
ele emprega veneno onde seria desnecessário, ele tende sempre a
abusar das dosificações.
O raro técnico que se atreve a sugerir que em determinada situação seja
talvez melhor não tratar, ou usar menos produtos, é automaticamente
considerado mau técnico. Sempre estará presente o técnico da
concorrência com uma boa receita de venenos sempre mais potentes e
em combinações sempre mais complexas. Algo parecido ao que está
acontecendo na medicina. Muita gente sai do consultório decepcionada se
o médico não receitou nada, ou pouco. Este médico não pode ser bom.
E isto nos leva a uma situação interessante e bastante imoral que existe
nesse negócio. Imaginem quanto remédio estaríamos tomando se o
farmacêutico fosse quem escrevesse a receita. Para os produtos
fitosanitários a quase totalidade do assessoramento técnico está em
mãos das próprias casas fabricantes e do comércio. É claro que fazem
todo o possível para aumentar as vendas e para que não vinguem outros
métodos.
Outro exemplo concreto: uma grande casa alemã, fabricante de um
herbicida que na Europa deu excelentes resultados na cultura da
beterraba açucareira, queria introduzir este produto na África do Norte. O
técnico da casa, estacionado na região, argumentou que, por razões
sociais e técnicas, o produto não interessaria. A substituição da capina
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manual pela química deixaria sem trabalho milhares de fellahs para os
quais isto significaria a fome. Este argumento não interessou. Se o
argumento social não pesava, seria de supor que o argumento técnico
fosse decisivo. Não era.
Nas culturas açucareiras européias predominam os inços dicotiledônios,
as plantas herbáceas, contra as quais este produto, à base de pyrazon,
trabalha muito bem. Na África do Norte são as gramíneas que constituem
problema na beterraba. Contra estas a substância não tem efeito. Um
graminicida barato como o TCA seria sufiente. A casa passou então a
recomendar uma fórmula especial na base da dosificação normal, muito
cara, do pyrazon mais a quantidade necessária de TCA para matar as
gramíneas. O pyrazon nesta fórmula é enfeite, não dá vantagem
nenhuma ao agricultor, mas encarece consideravelmente o tratamento,
além de constituir uma poluição totalmente desnecessária. Obsolecência
planejada até na agricultura.
Quando falamos no aspecto social tocamos um aspecto muito grave e
sempre esquecido da chamada Revolução Verde. Já que se tornou moda
falar da “poluição da pobreza” convém mencionar que muitas das
técnicas modernas contribuem para esta pobreza. As modernas técnicas
de racionalização do trabalho agrícola surgiram todas nos Estados Unidos
ou na Europa. Dentro das estruturas econômicas específicas destas
regiões estas técnicas contribuem efetivamente ao enriquecimento social,
se bem que a curto prazo. Os custos ambientais ainda não estão
computados. O dia em que a Natureza apresentar a conta ela será brutal.
Na Europa e nos Estados Unidos, entretanto, toda economia de mão de
obra é uma vantagem social. Mas será que isto é o caso na Índia ou na
América Latina?
Nos países super-industrializados a pouca mão de obra ainda existente
no campo é bem paga e suas rendas aumentam com o incremento da
técnica. Na Colômbia ou no Irã, quando aparece o trator, a combinada e
o herbicida no campo, explode a favela na cidade. Só o agricultor que já
era forte, o homem digno de crédito bancário, pode tirar proveito das
novas técnicas. O camponês e o peão perdem a corrida, e vão para a
cidade engrossar as massas amorfas de marginais. Naqueles países onde
ainda existe o camponês tradicional, apegado à terra, com suas práticas
milenares, a Revolução Verde está causando o desmoronamento de
estruturas sociais estáveis. O preço é o descontentamento e a frustração
das massas com conseqüente instabilidade política.
Durante os últimos trinta anos, a quase totalidade da pesquisa dirigida a
resolver os problemas das pragas e enfermidades dos cultivos tomou o
caminho da química. É natural. A finalidade da maior parte desta
pesquisa não era resolver os problemas da agricultura ou da sociedde,
era a de resolver os problemas da indústria. Mas os técnicos agrícolas,
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mesmo quando não ligados à indústria, de tal maneira se deixaram
empolgar pelas soluções simples da química que quase se esqueceram de
que há outros caminhos.
Acontece que na química é fácil movimentar muito dinheiro, fazer crescer
grandes capitais e burocracias. As grandes casas podem dar-se o luxo de
gastar até dezenas de milhões de dólares para descobrir e preparar para
o mercado um novo produto de grande aceitação. Este produto, uma vez
introduzido, permitirá ganhar centenas de milhões. Mas este problema
não é exclusivo das chamadas sociedades capitalistas, é tão grave nos
países que se dizem socialistas como entre nós. Lá descobrem menos
produtos, mas usam os produtos ocidentais com o mesmo abandono e a
mesma irresponsabilidade ecológica.
Por outro lado, para elaborar um método de combate biológico, também
se torna necessário gastar grandes somas, movimentar exércitos de
cientistas e técnicos por vários anos. Mas, quando o método está pronto,
em geral, só quem lucra é o agricultor, nossa saúde e a Natureza. São
raros os métodos biológicos que permitem a terceiros ganhar grandes
somas.
É claro que este tipo de trabalho não atrai grandes capitais. Os métodos
biológicos e integrados terão que ser desenvolvidos pelas estações e
instituições do Estado, pelas universidades, pelas grandes cooperativas
ou grandes empresas agrícolas particulares. Os países chamados
socialistas perderam uma grande chance. Em vez de seguir o exemplo
ocidental, deveriam ter se dedicado à pesquisa biológica. Teriam hoje
algo a oferecer.
Os métodos brutais do combate químico, pela sua simplicidade, pelo
enfoque simplório de simples erradicação, tem uma atração toda especial
para os burocratas. Estes burocratas não conhecem, não querem, nem
tem capacidade de conhecer a complexidade dos fenômenos em jogo. É
muito fácil e parece tão científico falar em termos de tantos cm³ por litro
de tal ou qual ingrediente ativo, aplicado em tantos litros por hectare, de
preferência por avião, para eliminar este ou aquele inimigo. Não há
atração nenhuma em falar em termos de dinâmica de populações, de
interação entre praga e predador, em falar na necessidade da
conservação de certas comunidades naturais, da necessidade de rotação
de culturas, de manutenção de uma certa homeostase natural através de
ecossistemas artificiais mais complexos. Tampouco é interessante falar
da necessidade de proteção da saúde do solo. É muito mais fácil abrir
concorrência de preços para mil toneladas de DDT que estabelecer uma
rede de laboratórios, de centros de pesquisa ecológica e de
assessoramento. A química oferece soluções tão simples. Todoburocrata,
quer seja ele capitalista ou comunista, prefere sempre soluções simples.
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Outro importante incentivo para a agroquímica é que ela se presta tão
bem para a corrupção. Vejamos um exemplo. Em um determinado país
Norte-africano, durante dois mil anos não se empregou nenhum
inseticida nas oliveiras. Com os equilíbrios naturais ainda existentes, os
danos por pragas de insetos eram os mínimos e aceitáveis. Até que um
dia um funcionário do Ministério da Agricultura resolveu importar
“progresso”. As companhias logo se precipitaram sobre ele com ofertas
de gordas comissões em conta bancária Suíça. A firma que ofereceu a
melhor comissão recebeu o pedido que, naturalmente, era bastante
grande, calculado, simplesmente, em base às estatísticas quanto a
número de árvores. Surgiu assim um interesse criado. As árvores são
agora tratadas regularmente. Aparecerão novas pragas e aumentará o
número de produtos empregados. As colheitas não aumentam com isso,
apenas torna-se mais difícil a vida do agricultor pequeno.
Assim continuamos todos a envenenar cada vez mais o nosso belo
Planeta e a nós mesmos.
Levamos mais de vinte anos para dar-nos conta do perigo que representa
a introdução do DDT na biosfera. Muitos dos danos até agora conhecidos
já são irreversíveis e não sabemos o que está por vir. Assim mesmo a
irresponsabilidade continua. Apesar da proibição em vários países, ainda
não fecharam as fábricas de DDT. A Organização Mundial da Saúde das
Nações Unidas, em sua campanha antimalarial, compra DDT de fábricas
que já não podem vender em seus próprios países. Mas já há excessões.
A Alemanha ampliou recentemente a legislação que proibia o uso do
DDT, incluindo a proibição da fabricação e da exportação.
Se, a partir de amanhã, não se usasse mais um kilo de DDT, ainda assim,
por muitos anos, o escoamento desta substância dos continentes aos
mares continuaria em aumento, antes de começar a diminuir e não
sabemos se a quantidade já existente nos oceanos já não desencadeou
processos irreversíveis. Segundo um estudo recente, os peixes de todos
os oceanos estão com entre 0,5 e 5 ppm de DDT em seus organismos.
Até os pingüins da Antártida, lugar onde nunca foi aplicado o DDT, estão
afetados. A águia calva (Bald Head Eagle), pássaro do emblema dos
Estados Unidos está em vias de extinção. O pelicano do Golfo do México
praticamente desapareceu, o da Califórnia está no mesmo caminho.
Muitas espécies seguirão. No Rio Grande do Sul as aves de rapina já
começaram a tornar-se raras.
O grande oceanógrafo Cap. Jacques Ives Cousteau, num depoimento que
prestou num simpósio das Nações Unidas, expressando suas
preocupações pelo estado dos oceanos, declarou que durante os últimos
vinte anos, a vitalidade dos mares havia diminuído em 30 – 50% em
termos de vida animal e vegetal. Em declarações mais recentes,
renomados ecólogos americanos calculam que a perda de biomassa nos
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oceanos é de cerca de 40%. Naturalmente, os pesticidas persistentes não
são os únicos biocidas a poluírem os oceanos. O homem transformou os
oceanos em grandes lixeiras. Não sabemos até que ponto vai a
capacidade de autodepuração.
Os hidrocarbonetos clorados, dos quais o DDT é apenas o mais
conhecido, são muito persistentes. Calcula-se que a meia vida do DDT
em condições médias é de cerca de 10 anos, ou seja, depois de 10 anos
ainda circulam na biosfera 50% da quantidade introduzida. Além de sua
persistência estas substância se concentram através da cadeia alimentar.
O DDT é quase insolúvel na água mas é acumulado pelas bactérias e
algas. Quando estas são consumidas pelo seguinte elo da cadeia, pelos
protozoários, verifica-se nova concentração. Cada protozoário, durante
sua vida, consome centenas, talvez milhares de algas e bactérias,
retendo o DDT destas. O protozoário, por sua vez, é devorado pelo
alevino, girino, pequeno crustáceo, pelos vermes, moluscos e insetos
aquáticos. Mas a história não termina aí. Todos estes animaisinhos
acabam no estômago de organismos maiores: no peixe pequeno que é
devorado pelo maior, e assim por diante, até chegar ao peixe que
consumimos ou nas aves aquáticas e outros carnívoros. Em cada caso
verifica-se uma concentração que pode ser de uma ou várias ordens de
magnitude. O que começou com concentrações insignificantes,
aparentemente sem perigo algum, termina assim numa concentração que
pode ser fatal. No caso do pelicano e de outras aves de rapina é
suficiente para interferir no metabolismo do cálcio a ponto de impedir a
reprodução. As fêmeas põem ovos sem casca, ou com casca muito fina,
que esmagam ao chocar. Convém lembrar que nós humanos estamos na
cúspide da pirâmide alimentar.
Esta concentração biológica é também a causa do desaparecimento do
predador, ao mesmo tempo que a praga consegue tornar-se resistente.
Durante os primeiros tratamentos com uma nova substância tóxica, a
praga morre naqueles lugares e nas condições em que for atingida por
doses letais. Fora de área tratada, porém, nas margens desta e mais
além, ela se encontra exposta a doses sub-letais. São estas doses subletais que permitem a seleção natural de linhas resistentes. Elas
constituem, por assim dizer, uma vacina que opera a nível populacional.
Para o predador a situação é bastante diferente. O predador morre na
zona letal e morre quase sempre na zona sub-letal e além. Isto porque,
além da dose sub-letal que recebeu diretamente, ele recebe e acumula
em seu organismo as doses sub-letais absorvidas pelas presas. O
acúmulo se torna letal para ele. Desaparece antes que possa aparecer
resistência.
O que acontece com os hidrocarbonetos clorados pode acontecer com
todos os venenos não biodegradáveis e cumulativos. Convém lembrar a
catástrofe da Baía de Minamata, no Japão, onde houve mortes e sérias
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lesões cerebrais, assim como danos teratogênicos pelo consumo de
peixes com altas concentrações de mercúrio. Neste caso o mercúrio
provinha dos efluentes de certas fábricas de plásticos, mas o mercúrio
também é introduzido na biosfera por certos tratamentos agrícolas, pelos
fungicidas mercuriais. Em nossas regiões tritícolas foram enormes os
danos às aves silvestres pelos fungicidas mercuriais no tratamento da
semente. Já tivemos também o escândalo da semente tratada com
fungicidas mercuriais que foi misturada com trigo de consumo.
O mercúrio constitui um perigo, se não quantitativamente, pelo menos
qualitativamente, muito
mais grave que o DDT. O mercúrio como elemento, é totalmente
indestrutível na Natureza e não sabemos quanto tempo continuará
circulando nos sistemas vivos. Muitos dos belos lagos suecos estão hoje
interditados à pesca devido à contaminação com mercúrio. Nos Estados
Unidos foram condenadas e destruídas grandes partidas de atum pescado
em alto mar por estar seriamente contaminadas com mercúrio. Os
grandes rios europeus estão todos contaminados. Entre nós este
problema está pouco estudado, mas levando-se em conta o fato de
estarem sendo usados fungicidas mercuriais em quase toda a lavoura
tritícola no tratamento da semente, mais a poluição industrial, é possível
que a situação já seja bastante grave.
A única razão porque ainda predominam os produtos mercuriais no
tratamento da semente é o preço; eles são mais baratos que outros
fungicidas. Aliás esta é também a razão por que se continua usando o
DDT.
No organismo humano o DDT ingerido pouco a pouco, em frações de
miligramas por dia, é retido no tecido adiposo, onde se concentra.
Enquanto se encontra ali depositado não causa prejuízos aparentes, mas
quando o indivíduo adoece por outra causa, digamos uma gripe forte
numa pessoa de idade, consomem-se as graxas que são as reservas do
organismo. O DDT entra então maciçamente em circulação. A
enfermidade se agrava pela intoxicação. O médico naturalmente não
saberá o que realmente matou o paciente. E há ainda a suspeita de efeito
carcinogênico do DDT no homem, por mais que os defensores do DDT
digam que nunca se provou tal efeito. Acontece que para prová-lo
teríamos que fazer experiências com humanos. Essas experiências,
obviamente, não se fazem. Em ratos de laboratório houve efeito
carcinogênico.
Os venenos não cumulativos, por sua vez, podem causar danos
cumulativos. Estragam lentamente o fígado, os rins e outros órgãos,
encurtando a vida. Matam indiretamente e a longo prazo.
Por isso a fixação de tolerâncias para resíduos de pesticidas na
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alimentação tem pouco
sentido. Com isto não se leva em conta o efeito cumulativo e o fato de
que, nas condições atuais, nosso organismo se vê obrigado a arcar
diariamente com quantidades homeopáticas de centenas de substâncias
com efeitos os mais diversos, quase todos desconhecidos. Este enfoque é
apenas cortina de fumaça para permitir a continuação de práticas
duvidosas, porém rendosas.
Tal enfoque ignora completamente os possíveis e muito prováveis efeitos
sinergísticos entre as muitas substância que ingerimos todos os dias. Não
há estudos neste sentido. Estes estudos seriam extremamente difíceis,
custosos e demorados. Ignora também os efeitos carcinogênicos,
mutagênicos e teratogênicos.
Basta dizer que hoje, pela alimentação que consumimos, pela água que
tomamos e pelo ar que respiramos, nosso corpo é constantemente
confrontado com toda uma série de espectros de substâncias quase todas
biocidas: temos os resíduos dos pesticidas aplicados na agricultura que
aparecem na alimentação vegetal e animal; na alimentação animal
aparecem ainda os resíduos dos produtos veterinários; temos os resíduos
dos pesticidas aplicados nos silos e armazéns para a conservação das
colheitas; aparecem os venenos usados nas residências, escritórios,
cinemas e restaurantes pelas desinsetizadoras; na elaboração dos
alimentos a indústria alimentícia usa toda uma gama de aditivos químicos
para a conservação, condicionamento e coloração; inclusive sabores e
aromas artificiais; abusamos dos medicamentos, sedativos e
tranqüilizantes; a água que tomamos e usamos na cozinha naturalmente
tem sua lista própria de substância alheias; além do que entra pela boca
respiramos todas as porcarias que hoje enriquecem o ar das cidades e do
campo também; e não são poucos os venenos que absorvemos pela pele.
O homem introduz hoje no ambiente cerca de 500.000 substâncias
alheias. Esta lista aumenta de alguns milhares por ano.
A grande maioria destas substâncias são desenvolvidas de maneira
empírica, com enfoque tecnológico unilateral. Em cada caso persegue-se
um fim restrito e a curto prazo, sem considerações pelos efeitos
colaterais, especialmente quando estes efeitos só aparecerão mais tarde
ou em outros lugares. Cada técnico supõe que os poucos resíduos que ele
deixa não terão importância. Mas acontece que na Natureza e em nosso
organismo tudo isto se encontra e reage entre si. Ninguém pode prever o
que acontecerá.
Recém agora estamos descobrindo os efeitos perniciosos do 2,4,5-T, já
quase tão velho quanto o DDT. Estamos descobrindo que as substância
do grupo PCB (bifenil policlorado) constituem problema talvez mais sério
e mais fatal que o DDT e seus parentes, mas já estão todos os oceanos
contaminados com PCB. Estamos agindo como o aprendiz de feiticeiro.
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O lógico seria que não usássemos substâncias das quais não conhecemos
os efeitos remotos e a longo prazo, que as observássemos em
experimentos controlados o tempo necessário para descobrir todos os
seus efeitos adversos. Acontece que a indústria quer ver render
rapidamente seus vultosos investimentos e não se sujeita a isso quando
não é obrigada a tanto por uma legislação severa. Esta legislação apenas
começa a ser elaborada em alguns países. O desastre da Talidomida
deixou bem clara esta situação.
Na prática, faltando legislação, se parte do princípio de que, onde não se
conhecem os perigos, se supõem simplesmente que não os há. Continuase fazendo tudo aquilo que não está proibido, e algo mais. Quando
aparecem as primeiras calamidades, estas são menosprezadas e se luta
contra todo esboço de legislação reguladora. Fala-se do alto sentimento
de responsabilidade das casas, que só tem em mente o bem-estar da
humanidade e a luta contra a fome. Mas quando os estragos estão à
vista, a situação é clara e a proibição se torna total, retira-se o produto
do mercado, mas continua-se a vender naqueles países onde os
legisladores ainda estão dormindo.
Felizmente esboça-se agora uma reação. Pelo menos nos países
tecnologicamente mais desenvolvidos, que são também os que mais
sentem os estragos causados pela tecnologia descontrolada. Em 1962
apareceu o livro da grande, já então famosa bióloga americana Rachel
Carson, “Silent Spring” (Primavera Silenciosa). Este livro pode dizer-se
que ascendeu a primeira faísca da atual preocupação pelo ambiente.
Apesar de alguns pontos fracos, logo ferozmente atacados pela indústria,
a Senhora Carson, em uma linguagem apaixonada e apaixonante,
conseguiu alertar e ser ouvida pelo grande público. Sem este livro
provavelmente ainda não teríamos, pelo menos em alguns países, os
primeiros passos de uma legislação ambiental. Não haveria ainda
retomada de métodos biológicos e integrados na agricultura.
Na Europa e nos Estados Unidos verifica-se uma crescente preocupação
pelos resíduos dos pesticidas na alimentação. Muita gente já está
disposta a pagar mais por alimentos mais puros, isentos de venenos. Isto
levou a um auge na agricultura sem química, até recentemente praticada
somente por pequenos grupos de fanáticos, os “biodinâmicos” ou
agricultores “agrobiológicos” na Europa e os “organic farmers” nos
Estados Unidos. Só na França existem hoje 400.000 ha cultivados pelos
métodos agro-biológicos. A demanda de seus produtos ultrapassa de
longe a produção.
Ao contrário da agro-química que procura, com os adubos sintéticos e
com biocidas violentos, corrigir as conseqüências dos desequilíbrios
causados pelos métodos anti-ecológicos da agricultura chamada
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moderna, a agricultura biodinâmica parte de um enfoque preventivo. Em
vez de lutar contra a Natureza, ela procura sempre trabalhar com ela. O
agricultor biodinâmico vê na Natureza seu maior aliado, não seu inimigo.
Os agricultores biodinâmicos são ecólogos práticos. Eles procuram, em
seus cultivos, criar ecossistemas artificiais que se aproximem o mais que
possível de ecossistemas naturais, que tenham um máximo de
homeostase, ou seja, de auto-regulação natural.
A razão da grande estabilidade dos sistemas naturais está na rede de
arcos de retroação entre a multitude de organismos diferentes presentes.
Estas retroações constituem controles naturais, ou controles sistêmicos,
isto é, inerentes ao sistema. Todo ecossistema natural é um sistema
homeostático, isto é, um sistema dinâmico, porém estável e autoregulado. O que costumamos chamar de “pragas” não é senão a polícia
da Natureza que procura sempre restabelecer situações estáveis.
A agro-química, em vez de evitar desde logo os desequilíbrios, ataca os
sintomas, substitui controles externos, assistêmicos, aos controles
naturais, sistêmicos, controles estes à cuja perda, inicialmente, ela
mesma contribuiu em parte. Estes controles artificiais, que são
tecnologias unilaterais, cegas, consistem, em parte, na introdução
indiscriminada de biocidas no ambiente natural. Com isto se inicia uma
cadeia de desequilíbrios sucessivos e crescentes. Torna-se assim
necessária a introdução de sempre mais controles assistêmicos. A
homeostase natural, gratuita, que não polui e que aprimora o ambiente,
fica substituída por uma tecnologia que agride sempre mais a Natureza e
que acaba poluindo todos nossos alimentos. O agricultor biodinâmico
recusa-se a participar desta corrida suicida.
Um dos fatores mais importantes para a obtenção de colheitas sãs e de
alto valor nutritivo é a saúde biológica do solo. A agricultura mecanizada,
de monocultura, acaba degradando o solo a ponto de transformá-lo em
simples substrato mineral, sem vida e vulnerável a erosão. É sabido que
a planta em solo biologicamente são é menos suscetível às enfermidades
e muitas pragas. Grande parte dos problemas fitosanitários ficam
automaticamente resolvidos em um solo rico em matéria orgânica e com
micro-fauna e micro-flora protegidas. Se cuidássemos da saúde orgânica
do solo, usaríamos uma fração apenas dos pesticidas que usamos e o
solo teria maior capacidade de degradação destes pesticidas. A poluição
dos cursos d’água seria muito menor.
O caso das infestações com nematóides é um exemplo. Estes vermes
microscópicos que atacam as raízes das plantas são muito difíceis de
controlar quimicamente. Às vezes, o combate químico custa mais que o
valor da terra, mas logo aparece reinfestação. Entretanto, em solos que
estão organicamente em ordem, os nematóides tem uma série de
inimigos naturais e não chegam a constituir praga.
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Teremos que restabelecer também equilíbrios estáveis entre as partes
cultivadas e não
cultivadas de uma paisagem. Não podemos acabar com o último bosque
virgem, o último banhado, a última cerca viva. Não podemos acabar com
o último pássaro, a última borboleta. Será necessário conservar partes
viáveis de cada ecossistema para que todas as espécies tenham
possibilidade de sobreviver, para que haja o máximo de homeostase
natural.
Infelizmente, a agricultura está hoje tão drogada na química que não
mais podemos eliminar abruptamente os pesticidas químicos, como não
se pode negar repentinamente a droga ao viciado. Mas, onde for
necessário continuar com meios de combate químico, devemos desistir
imediatamente de todas as substâncias que, como o DDT, os mercuriais e
outros, são muito persistentes e sujeitas à concentração biológica, ou de
substâncias cujos efeitos a longo prazo não conhecemos. Uma nova
substância ativa só deveris ser liberada ao público depois de estudos
exaustivos sobre todos os efeitos a curto e a longo prazo.
A lista das substâncias no mercado deveria ser reduzida de modo que o
agricultor e os técnicos possam realmente aprender a conhecer seus
produtos. Seria um grande progresso se conseguíssemos acabar com os
nomes comerciais, com as marcas. Só o DDT aparece no mercado sob
mais de 50 denominações diferentes.
É a mesma situação da farmacologia, onde a penicilina tem dúzias de
nomes diferentes. Os produtos deveriam aparecer no mercado com seus
nomes técnicos.
O assessoramento sobre o uso destas substâncias não deve continuar
nas mãos dos próprios fabricantes e comerciantes. Este assessoramento
deveria ser feito por entidades especializadas independentes, estatais ou
particulares. Em alguns casos, e para determinados produtos, a aplicação
deveria ser feita exclusivamente por equipes técnicas, nunca pelo próprio
agricultor. Vejamos o caso das mortes e intoxicações que houve no
tratamento contra o pulgão do trigo na temporada de 1971 no Rio
Grande do Sul, assim como a mortandade de gado em Palmeira das
Missões e em Guaíba, sem falar no massacre da fauna já tão dizimada.
Estes são problemas que necessitam de soluções políticas além de
técnicas e comerciais.
Entre as substâncias disponíveis devem preferir-se sempre as
substâncias biodegradáveis. A moderna biologia molecular abre vastas
avenidas de investigação, inclusive em campos que poderão tornar-se
rendosos para a indústria: hormônios, enzimas, feromonas (substância
odoríferas usadas na comunicação entre insetos), atrativos e repelentes,
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alcalóides, inseticidas botânicos e outros. Teremos então armas bem
mais específicas e mais precisas que os atuais inseticidas e herbicidas de
largo espectro, com a vantagem de que estas substâncias não
continuariam circulando indefinidamente na biosfera. No caso dos
hormônios, dos atrativos e das feromonas é pouco provável o
aparecimento de resistência, tão comum no caso dos inseticidas
correntes.
Os inseticidas de largo espectro são armas brutais e indiscriminadas que
na verdade não
honram nenhum técnico – trabalho de elefante em casa de vidro. O
agricultor ou o sanitarista só enxergam a espécie que pretendem
eliminar, mas aplicam um veneno que mata direta ou indiretamente
centenas de espécies, inclusive as que eles mesmos deveriam proteger.
Devemos, portanto, procurar trabalhar, sempre que possível, com
substâncias que tenham efeito, ou modo de ação, o mais específico
possível. Assim, em muitos casos, um inseticida sistêmico, é
ecologicamente menos pernicioso que um inseticida de contato,
sobretudo se este último é persistente. O sistêmico mataria só os insetos
chupadores, o pulgão, p.ex., o de contato mataria também os inimigos
naturais da praga que devem ser protegidos.
Existem muitos métodos biológicos, ecológicos e integrados de luta,
muitos já conhecidos, outros por descobrir.
As estações genéticas, em vez de concentrar seu trabalho de seleção de
novas variedades no máximo de produtividade e no aspecto vistoso,
teriam que dar maior importância à verdadeira qualidade alimentícia e à
resistência genética contra enfermidades e pragas. Aqui no Rio Grande
do Sul já tivemos um grande trabalho desta índole. Basta lembrar o
saudoso geneticista Ivar Beckmann, criador do trigo Frontana. Sem estas
linhas resistentes à ferrugem não teria sido possível o auge da triticultura
gaúcha.
Aqui convém chamar a atenção para outro perigo da revolução verde.
Progresso numa direção sempre significa perda em outra direção. Tratase do perigo genético, ou seja, do perigo do empobrecimento do capital
genético de nossos cultivos. As novas variedades altamente produtivas
impressionam de tal maneira o agricultor que ele abandona por completo
as variedades tradicionais que, se bem que menos produtivas, são em
geral de maior valor nutritivo, e representam ótimas adaptações locais.
Na Ásia, p.ex., havia milhares de variedades de arroz que estão agora
desaparecendo de maneira irrecuperável.
Este grande número de variedades representava um grande e valioso
capital genético. As próprias estações, criadoras das novas variedades, se
servem deste capital em suas cruzas e seleções. Este capital agora está
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se perdendo irremediavelmente.
Em futuro próximo não somente será mais difícil, ou impossível,
selecionar novas linhas que tenham as novas resistências então
necessárias, mas também, e isto é mais grave, a uniformidade genética
do material cultivado através de vastas regiões significa vulnerabilidade
exponenciada diante das novas adaptações das enfermidades
criptogâmicas e das pragas, adaptações estas que surgirão
inevitavelmente. Facilmente nos veremos confrontados com calamidades
generalizadas para as quais não haverá mais remédio, como no caso da
calamidade que assolou a Irlanda no século XVIII mencionada
anteriormente.
Também neste ponto estamos pecando contra um dos princípios mais
fundamentais da ecologia, o princípio de necessidade da variedade. A
homeostase é função da variedade, isto é, do grande número de espécies
e variedades. Um sistema é tanto mais estável, tanto mais autoregulado,
quanto maior o número de espécies que contém.
Entre os métodos de luta biológica, o método popularmente mais
conhecido, que é também uma das armas mais antigas no arsenal de luta
contra as pragas, é o dos predadores ou inimigos naturais. Já em 1888,
nos pomares da Califórnia, foi possível controlar o pulgão lanígero com
outro inseto, a joaninha. Voltando às laranjas, anteriormente
mencionadas, em Marrocos, hoje, em uma área destes cultivos, um
pequeno grupo de biólogos abnegados conseguiu elaborar um controle
biológico que consiste em criar em laboratório e largar na plantação um
micro-himenóptero, cujas larvas consomem a cochonilha. Nas plantações
onde já funciona este método, automaticamente desaparece o problema
do pulgão e do ácaro. Para não prejudicar a vespinha introduzida, o
produtor não usa mais inseticidas. Com isto, voltam os predadores destas
pragas e restabelece-se o velho equilíbrio.
Muito antes dos herbicidas químicos, os australianos conseguiram
controlar a opuntia introduzida da América e que lá se tinha
transformado em terrível praga das pastagens. Para isto, vieram aqui
estudar os inimigos naturais deste cactus e os levaram para a Austrália.
Nos estados sulinos dos Estados Unidos era comum controlar os inços
nas lavouras de algodão com gansos. O processo se chama “cotton
goosing”, ou seja, “gansear” o algodão. O ganso não toca no algodão, do
qual não gosta, mas acaba com todas as ervas e gramíneas. Gosta
imensamente do Sorghum halepense (Johnson Grass), uma gramínea
muito comum naqueles algodoais e difícil de combater quimicamente. Na
Guiana Britânica o “manatee”, nosso peixe-boi, já quase exterminado na
Amazônia, mantém os canais de irrigação livres de aguapés e ao mesmo
tempo fornece boa carne. No entanto, o Sudão prefere gastar enormes
somas com a importação de herbicidas sistêmicos para controle da
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Eichhornia, nosso aguapé, que lá entope barragens e turbinas. Assim, se
polui desnecessariamente o Nilo com substâncias que estão sob suspeita
de serem carcinogênicas.
Notem que não gostamos de usar o termo “erradicar”, preferimos sempre
“controlar” ou “combater”, nunca “exterminar”. Na natureza todas as
espécies são importantes e não devemos nunca procurar exterminar
nenhuma delas, por mais que ela nos possa parecer detestável no
momento. O próprio mosquito é importante, sua larva serve de alimento
aos alevinos dos peixes que desovam nos banhados. Os adultos
alimentam andorinhas e morcegos. Tampouco sabemos quais os usos
que nós humanos acabaremos inventando para espécies aparentemente
sem importância. Que seria da biologia molecular, da moderna genética
molecular, se tivéssemos exterminado a Drosophila melanogaster uns 50
anos atrás. Muito mais afastados estaríamos de uma possível cura do
câncer.
Outro método de luta biológica é o dos agentes patogênicos. Já existem
alguns produtos no mercado, o Bacillus thuringiensis, p. ex. Há
possibilidades de trabalho com vírus e protozoários. Nesta avenida de
investigação poderão ser encontradas armas bem específicas. Os
laboratórios bélicos das grandes potências, que gastam bilhões na
investigação de armas biológicas para matar gente e colheitas, bem que
poderiam dedicar-se a controlar biologicamente as pragas dos cultivos.
Outro caminho que promete muito e que já deu grandes resultados com
algumas espécies é o método dos machos esterilizados. Cria-se em
laboratório a espécie que se quer combater e produz-se enormes
quantidades de machos esterilizados, porém, não impotentes. Isto se
obtém com determinadas dosificações de raios X com certas substâncias
químicas. Os machos estéreis são largados nas regiões infestadas. Cada
fêmea que se acasala com um macho estéril produzirá ovos estéreis.
Com aplicações subseqüentes chega-se rapidamente a níveis aceitáveis
na população da praga. Este processo foi usado com êxito em Curaçao,
nas Antilhas Holandesas, e atualmente está sendo usado na Flórida
contra a mosca da bicheira do gado. A elegância deste método e dos
demais métodos biológicos está em que são perfeitamente específicos.
Só são atingidas as espécies que se quer atingir, sem os danos
imprevisíveis e generalizados dos produtos químicos.
Existem também possibilidades nas associações de palntas, isto é, no
cultivo associado de plantas que atraem ou afugentam pragas. A
Tagetes, p. ex., exuda em sua raízes uma substância que afugenta
nematóides. Alternada com tomates em solos infestados protege o
tomate. O custo é muito inferior ao dos nematicidas. Em Cuba,
obtiveram-se ótimos resultados no controle de uma lagarta do milho,
pela intercalação, cada oito metros, de uma linha de girassol. O girassol
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atrai a lagarta e é consumido, evitando o ataque ao milho. No sul da
França é comum o milho entremeado com o algodão, como isca para as
pragas deste. A agricultura tradicional conhecia muitas práticas deste
tipo. Infelizmente estas práticas estão se perdendo por causa da química.
Convém reavivá-las e modernizá-las. Os agricultores biodinâmicos são
repositório de grande cabedal de conhecimentos deste tipo.
O caminho que deveria de ser seguido imediatamente, como transição
para uma agricultura mais natural, é a luta integrada. A luta integrada
consiste no uso judicioso dos pesticidas químicos. Usa-se um mínimo de
substâncias biocidas nos momentos e nas condições ecologicamente mais
indicadas para um efeito o mais específico possível, preferindo-se sempre
as substâncias biodegradáveis e de efeito restrito. Um exemplo de luta
integrada é o combate da mosca do mediterrâneo (Ceratitis), com
atrativos orgânicos e inseticidas sistêmicos. Em vez de tratar todo o
pomar com um inseticida total que, além de matar a Ceratitis, causaria
grandes estragos nos demais insetos, entre os quais muitos predadores
importantes, trata-se somente uma em cada três ou quatro linhas de
árvores com uma mistura de atrativo (isca) e inseticida sistêmico. Só a
Ceratitis é atraída pelo atrativo, neste caso um hidrolisato de proteína, e
é destruída. Nas linhas não tratadas sobrevivem os demais insetos.
Assim a interferência no equilíbrio natural é mínima.
São numerosos também os problemas especiais, alguns de índole não
agrícola, suscetíveis de soluções não biológicas ou ecológicas. A Austrália
está atualmente introduzindo umas 40 espécies de escaravelhos
estercoreiros africanos. Na Austrália, antes da colonização, não havia
herbívoros grandes. Faltavam, portanto, os estercoreiros capazes de
desmanchar o esterco de vaca. No Rio Grande do Sul, pela mesma razão,
temos o mesmo problema. O esterco seca no campo, transformando-se
em algo que seria mais útil como combustível do que para reciclar a
matéria orgânica. Os estercoreiros africanos que evoluíram
conjuntamente
com os grandes herbívoros resolvem perfeitamente este problema.
Se apenas uma fração do dinheiro já gasto na pesquisa química tivesse
sido gasta para a pesquisa biológica, talvez já teríamos resolvido a
maioria dos problemas, evitando um dos aspectos mais graves da
poluição ambiental e da degradação ecológica.
Uma coisa é certa. Até o fim do século teremos que encontrar uma
maneira de alimentar mais uns três e meio bilhões de humanos. As áreas
de terras aráveis não aumentarão. Atualmente, só pela erosão, estamos
perdendo 5.000.000 de ha anualmente, uma superfície que corresponde
aproximadamente à quinta parte do Rio Grande do Sul. Só pelo aumento
da produtividade por unidade de área poderemos resolver o problema.
Mas, se o fizermos com os métodos atualmente em voga, isto é, com
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sempre mais química indiscriminada, a poluição de continentes e mares
será exponenciada de tal forma que a Ecosfera não mais aguentará o
abuso.
Temos que procurar novos caminhos, e temos que procura-los já.
A problemática dos efeitos adversos do uso indiscriminado da química na
agricultura é outro aspecto dos graves problemas ambientais que hoje
confrontamos, conseqüência de nossos enfoques setorializados, de onde
resulta uma tecnologia unilateral e míope. O homem do campo, hoje um
dos mais alienados diante da Natureza, terá que voltar a abrir os olhos
para ela.
O perigo não reside na ciência e na tecnologia em si, está na maneira
como nos servimos delas. O que está errado não é a ciência, é nossa
filosofia que precisa ser radicalmente reformulada. Se desrespeitamos a
Natureza a ponto de preparar nossa própria extinção, é porque temos
uma filosofia antropocêntrica, que quer que o homem seja o dono do
Universo. A Natureza para nós é apenas uma massa amorfa, moldável a
nosso bel prazer. Na magnífica baleia enxergamos apenas tantas
toneladas de matéria prima para fabricar sabão ou margarina.
Esquecemos que somos apenas um entre uma infinidade de atores,
dentro deste fabuloso processo que é o caudal da vida neste astro. Se
não conseguirmos aprender que não estamos por fora, por cima e contra
a Natureza, mas que somos parte integrante dela, não teremos futuro.
Aqui vai um apelo ao Ministério da Agricultura, às Secretarias de
Agricultura, às Universidades e às empresas agrícolas para que se
empenhem na pesquisa de métodos de controle biológico e integrado.
Não estão agora em causa “valores” político-econômicos como
capitalismo contra feudalismo, socialismo contra capitalismo ou
democracia contra tirania, mas a vida de todas as espécies animais, nas
quais estão compreendidos o homem e os vegetais. Numa palavra, toda
a vida orgânica do planeta.
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nº 16 Aug. 15, 1970
Cotton and Chemicals – Kevin P. Shea – Environment, Nov. 1968
Blunted Weapons – Kevin P. Shea – Environment, Jan-Feb. 1970
A New Polution Problem – Sheldon Novick – Environment, May, 1969
DDT on Balance – Gordon Conway, et al. – Environment, Sept 1969
Moeglichkeiten und Grenzen der biologischen Schaedlingsbebekaempfung – G.
Benz
Und V. Deluchi – Schutz unseres Lebenraumes – Symposium na der technischen
Hochschule in Zürich.1970 – BLV, München
Sinnvoller Einsatz von Pflanzenschutzmitteln – R. Fritsche – Schutz unseres
Lebensraumes – Symposium der Technischen Hochschule in Zürich, 1970 – BLV,
München
Organic Farming on Trial – Lisa Alther – Natural History, Nov. 1972
The Limits to Growth – A report of the CLUB OF ROME’S projet on the
predicament Of mankind – Potomac Associates, New York
A Blueprint for Survival – The Ecologist, jan. 1972
Environmental Quality – The First Annual Report of the Council on
Environmental
Quality – Washington, D. C.
Précis d’Ecologie – Roger Dajoz – Dunod, Paris
Bedrohte Lebensordnung – Dr. Richard Harlacher – Wirtschaftsverlag M. Klug
GmBH,
München
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