Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Programa de Pós-Graduação em Zoologia de Vertebrados IMPORTÂNCIA DA QUÍMICA DE ALARME NO COMPORTAMENTO ANTIPREDATÓRIO DO LAMBARI, Astyanax bimaculatus, Linnaeus, 1758 - (Pisces: Characidae) Vinícius Donisete Lima Rodrigues Goulart Belo Horizonte 2010 Vinícius Donisete Lima Rodrigues Goulart IMPORTÂNCIA DA QUÍMICA DE ALARME NO COMPORTAMENTO ANTIPREDATÓRIO DO LAMBARI, Astyanax bimaculatus, Linnaeus, 1758 - (Pisces: Characidae) Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Zoologia de Vertebrados da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito para a obtenção do título de Mestre em Zoologia de Vertebrados Orientador: Robert John Young Belo Horizonte 2010 FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais G694i Goulart, Vinícius Donisete Lima Rodrigues Importância da química de alarme no comportamento antipredatório do lambari, Astyanax bimaculatus, Linnaeus, 1758 - (Pisces: Characidae) / Vinícius Donisete Lima Rodrigues Goulart. Belo Horizonte, 2010. 50f. : il. Orientador: Robert John Young Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Pós Graduação em Zoologia de Vertebrados. 1. Lambari (Peixe). 2. Peixe - Comportamento. I. Young, Robert John. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Pós Graduação em Zoologia de Vertebrados. III. Título. CDU:597.5 Para Victória AGRADECIMENTOS Agradeço a toda minha família pelo apoio durante toda esta jornada. A Camilla – Companheira para toda vida. Ao Robert pelos ensinamentos valiosos e pela ótima orientação. Aos professores do Mestrado por serem decisivos na minha formação Ao Adriano pela confecção das réplicas Ao Rogério pela confecção das difíceis lâminas e à Clédma pela ajuda e todo suporte. Aos Colegas de turma que me auxiliaram desde a preparação para o processo seletivo do mestrado até hoje. À FAPEMIG e ao CNPQ, pelo financiamento da pesquisa e do curso. RESUMO A superordem Ostariophysi é composta por um diverso grupo de peixes representando cerca de 65% das espécies de peixes de água doce. Um caráter comum a maioria dos peixes Ostariophysi é a presença de células epidérmicas que produzem e armazenam substâncias químicas de alarme. Danos à pele liberam esta substância que causa o aumento dos comportamentos antipredatórios. O presente estudo tem como objetivos: analisar o comportamento antipredatório de Astyanax bimaculatus (Lambari) em cativeiro; determinar os padrões de resposta comportamental aos diferentes tipos de modelos de predadores aquáticos e aéreos; verificar a resposta antipredação sob a influência da química de alarme. Os peixes foram divididos em oito grupos de oito indivíduos. Cada grupo foi submetido a três tipos de estímulos de predação, além do estímulo controle. Cada estímulo foi analisado na presença e na ausência da química de alarme. Para cada teste foram realizadas três réplicas. Através da histologia da epiderme verificamos que A. bimaculatus produz a substância química de alarme como os demais Ostariophysi. O estímulo controle sem a química de alarme não provocou alterações no comportamento dos lambaris. A química de alarme junto ao controle provocou uma diminuição na movimentação dos peixes. Os modelos de predador, quando apresentados sem a substância química de alarme, provocaram uma maior diversidade de comportamentos do que quando comparados às respostas com a química de alarme. Concluímos que a química de alarme é um importante fator de alerta e os lambaris conseguem reconhecê-la como o indicativo de uma situação de risco. Sua detecção causa uma reação de ansiedade nos peixes que, quando aliada a um modelo de predador, gera imediatamente uma reação de fuga que possibilita a sobrevivência do cardume. Percebe-se ainda que os comportamentos antipredatórios variam expressivamente quando comparamos respostas para predadores aéreos e aquáticos sem a química de alarme. Palavras-chave: Química de alarme; Comportamento antipredação; Astyanax bimaculatus. ABSTRACT The superorder Ostariophysi is composed of a diverse group of fish representing approximately 65% of species of freshwater fish. A common character to most Ostariophysi fish is the presence of epidermal cells that produce and store chemical alarm cues. Damage to the skin release this substance that causes an increase in antipredatory behaviors. This study aimed to: analyze the antipredatory behavior of Astyanax bimaculatus (Lambari) in captivity; determine the patterns of behavioral responses to different kinds of aquatic and aerial predators models; verify the antipredatory response under the influence of alarm cues. The fishes were divided into eight groups of eight individuals. Each group was subjected to three types of predation stimuli and the control. Each treatment was examined in the presence and absence of alarm cue. For each test we made three replicates. The histology of the epidermis reveled that A. bimaculatus produces alarm cues as the other Ostariophysi. The control without alarm cue did not promoted behavioral changes, but the alarm cue allied to the control caused a decrease in the fish movements. The predator model presented without the alarm cue triggered a greater diversity of behaviors when compared to the responses with alarm cue. We conclude that alarm cue is an important alert factor and the lambari can recognize it as indicative of a risk. Its detection causes an anxiety response in fish that, when combined with a model predator, immediately generates a flight reaction that allows the survival of the shoal. We can also observe that the antipredatory behaviors vary significantly when comparing responses to aerial and aquatic predators without alarm cues. Key-words: Alarm cue; Antipredatory behavior; Astyanax bimaculatus LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1: Réplica em resina de um peixe predador, Hoplias malabaricus, utilizada para representar o estimulo de predação de procura ativa. 18 Figura 2: Esquema demonstrando o funcionamento do aparato utilizado para apresentação do estímulo de um predador de emboscada 19 Figura 3: Representação do modelo de predador aéreo 20 Figura 4: Objeto utilizado para os testes de Controle 20 Figura 5: Corte histológico da epiderme de Astyanax bimaculatus evidenciando a presença de glândulas; Coloração em Hematoxilina-eosina aumento 100x 26 Figura 6: Corte histológico da epiderme de Astyanax bimaculatus mostrando a presença de células PAS positivas e negativas evidenciando a presença de células produtoras da química de alarme. Coloração em PAS; aumento 100x 26 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Descrição dos comportamentos de Astyanax bimaculatus, Lambari 17 Tabela 2: Ordem de apresentação dos estímulos de predação e da química de 22 alarme para cada grupo Tabela 3: Valores de p para o teste de Friedman na comparação entre as 27 réplicas realizadas para cada tipo de estímulo de predação Tabela 4: Ranks com diferenças significativas para os resultados do teste de 27 Friedman e teste post-hoc Tukey comparando as réplicas realizadas para cada tipo de estímulo apresentado Tabela 5: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do 28 estímulo controle. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey Tabela 6: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do 29 estímulo de predador aéreo. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey Tabela 7: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do 30 estímulo de predador de procura ativa.. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey. Tabela 8: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do 31 estímulo de predador de emboscada. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey Tabela 9: Resultados para a comparação dos comportamentos entre os 33 estímulos apresentados (Controle, Predador aéreo, procura ativa e de emboscada). Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey Tabela 10: Resultados para a comparação das áreas utilizadas no aquário entre os estímulos apresentados. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey. 34 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS °C grau Celsius µm Micrometros A Agredindo Cm2 Centímeto quadrado FF Forrageando o fundo Fr Teste estatístico de Friedman GL Graus de liberdade N Nadando NR Nadando rápido ns Não significativo P Perseguindo PA Parado ativo PAS ácido periódico de Schiff SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 10 2 METODOLOGIA 15 2.1 Peixes 15 2.2 Desenho experimental 16 2.3 Preparação do extrato bruto de pele 23 2.4 Histologia 23 2.5 Análises Estatísticas 23 3 RESULTADOS 25 3.1 Histologia 25 3.2 Análise Comportamental 27 4 DISCUSSÃO 35 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 40 10 1 INTRODUÇÃO A superordem Ostariophysi é composta por um diverso grupo de peixes, sendo 6500 espécies descritas (MOYLE; CECH, 2004) o que representa cerca de 65% das espécies de peixes de água doce (NELSON, 2006). Esta superordem consiste de cinco ordens existentes: Gonorynchiformes, Cyprinidformes, Characiformes, Siluriformes e Gymnotiformes. Um caráter comum a maioria dos peixes Ostariophysi é a presença de células epidérmicas em forma de clava (PFEIFFER, 1977), que produzem e armazenam substâncias químicas de alarme (SMITH, 1992; SMITH 1997). Danos à pele liberam esta substância de alarme que é detectada pelo olfato e causa uma reação de medo em indivíduos espacialmente próximos (SPEEDIE; GERLAI, 2008). Estas substâncias químicas liberadas na água causam o aumento dos comportamentos antipredatórios (WISENDEN et al., 2004; SZULKIN et al., 2006). Em meados de 1940, Karl Von Frisch descreveu a reação em Phoxinus phoxinus, o vairão, resultante da elementos químicos liberados por indivíduos feridos (CHIVERS et al., 1999). Ele criou o termo "Schreckreaktion" (reação de medo) para descrever esta resposta. Desde então vários estudos foram realizados para descrever a reação à substância de alarme em P. phoxinus e outros Ostariophisi (CHIVERS, et al., 1999). Entretanto, existem poucos estudos referentes à química de alarme de espécies endêmicas do Brasil. As reações de alarme são especializações adaptativas comportamentais apresentadas por animais de hábito social, as quais visam a proteção contra predadores (EDMUNDS, 1974). Para isso, são utilizados os sentidos como o olfato, paladar, visão e sistema acústico-lateral, bem como substâncias químicas, tais como os feromônios (GIAQUINTO; VOLPATO, 1997). Esta substância química de alarme constituí-se de um feromônio, quimicamente similar ou idêntica em todos os peixes desta superordem. A substância química de alarme é constituída pelo composto químico hipoxantina-3-N-óxido, mas estudos indicam que qualquer substância química composta pelo grupo funcional de óxido de nitrogênio parece funcionar como agente potencial de alarme (BROWN et al., 2000a). 11 Admite-se cerca de 16 hipóteses para que indivíduos se beneficiem da emissão de um sinal químico de alarme (SMITH, 1992), entretanto, apenas três destas hipóteses tem sido testadas empiricamente (HALBGEWACHS et al., 2009). Uma hipótese sustenta que a química de alarme pode evoluir através da seleção de indivíduos com certo grau de parentesco onde os peixes que a liberam podem aumentar o inclusive fitness da população, avisando parentes (HALBGEWACHS et al., 2009). Outra hipótese sugere que a química de alarme atrai predadores secundários, onde a interação entre estes, pode aumentar a possibilidade da presa em sobreviver (HALBGEWACHS et al., 2009). Entretanto, a freqüência em que predadores secundários se aproveitam da liberação da química de alarme é desconhecida (HALBGEWACHS et al., 2009). Além de funcionar como alerta de possíveis predadores próximos, tal substância pode ter suas funções relacionadas como parte integrante do sistema imune (HALBGEWACHS et al., 2009) indicando até indivíduos com alta carga parasitária, os quais são evitados pelo cardume. Dentre todos os tipos de indicativos de uma possível predação, os sinais químicos e visuais são os mais estudados (CHIVERS; SMITH, 1998; HARTMAN; ABRAHAMS, 2000), contudo, estes sinais representam diferentes tipos de informações. Sinais visuais de um predador podem ser críticos, pois o predador deve estar próximo à presa para a sua detecção (BROWN et al., 2000b). Alguns padrões comportamentais têm sido bem documentados para a influência da química de alarme como o aumento da coesão do cardume, evasão de áreas, movimentos erráticos, diminuição no comportamento natatório, redução no forrageio e acasalamento (CHIVERS; SMITH, 1998). A química de alarme pode ainda possibilitar o reconhecimento de um novo predador, induzir mudanças na biologia da espécie e avaliar o risco de predação através da inspeção do predador (CHIVERS; SMITH, 1998; BROWN; GODIN 1999). Os animais se mantêm em grupos principalmente para aumentar a possibilidade de encontrar recursos alimentares e evitar predadores (POLLARD; BLUMSTEIN, 2008). Para a melhor eficiência do forrageio, os animais podem compor grupos para caçar e predar presas maiores ou por aumentar as chances de detecção de uma fonte alimentar (KRAUSE; RUXTON, 2002; MOYLE; CECH, 2004). Os animais podem diluir as chances de predação por estarem próximos uns aos 12 outros (Dilution effect) (MOYLE; CECH, 2004), por aumentar a chance de detecção do predador (Many eyes effect) (ROBERTS, 1996) ou por confundir o predador dificultando a captura de um indivíduo dentro de uma massa coesa, como um cardume (Confusion effect) (MOYLE; CECH, 2004). Em peixes, a comunicação pode ser realizada a partir da química de alarme. Um fator que mantém grupos unidos em cardumes é a presença destas células epidérmicas especializadas que conferem uma vantagem evolutiva (WISENDEN; THIEL, 2002). Os grupos de animais podem diminuir a chance de serem capturados por desenvolver sistemas de comunicação para alertar sobre a presença de predadores. Uma observação comum é que se um membro de um grupo detecta um predador, um chamado de alarme é emitido para que todo grupo seja alertado (ROBERTS, 1996), mesmo que um indivíduo chame a atenção de um predador, todo o restante do grupo é beneficiado (HOLLEN; RADFORD, 2009). Em animais que vivem em grupos, indivíduos podem usar sinais referenciais e pistas transmitidas entre eles para aumentar a eficiência do forrageio (GALEF; GIRALDEAU, 2001), e ainda, vocalizações de alarme podem fornecer diferentes tipos de informação, incluindo o tipo de predador (LEAVESLEY; MAGRATH, 2005). Como exemplo, os macacos Vervet, Chlorocebus aethiops, emitem diferentes tipos de vocalizações de alarme ao avistarem aves de rapina, cobras ou leopardos. Assim, os outros membros do grupo respondem a estes chamados de diferentes formas, como olhando para o alto para o chamado de aves de rapina ou para baixo para chamados de cobras (SEYFARTH et al., 1980). Contudo, a maioria dos estudos de comunicação referencial tem sido realizados para aves e mamíferos (HOLLEN; RADFORD, 2009). A predação é uma das mais importantes pressões seletivas enfrentadas por presas e pode modelar o comportamento, a morfologia e a história natural destes indivíduos (BROWN, 2003). A habilidade de julgar o risco de predação local é um aspecto crítico para a sobrevivência. Entretanto, as estratégias antipredatórias podem reduzir o tempo e a energia disponíveis para outros comportamentos, como o forrageio. Assim, estas, consistem de um trade-off entre a diminuição do risco de predação e a diminuição do comportamentais (BROWN, 2003). fitness associados com outros padrões 13 Já se sabe que as respostas antipredação são debilitadas em peixes de cativeiro em comparação a peixes selvagens (HOWELL, 1994). Diversos estudos mostram a importância de um encontro prévio com o predador para o desenvolvimento apropriado de respostas antipredação em peixes (KELLEY; MAGURRAN, 2003). Isto tem levado a aplicação de diferentes práticas de criação para aprimorar o desempenho comportamental de peixes de cativeiro através de um treinamento apropriado (BROWN; DAY, 2002). Determinar como os animais reconhecem um novo predador e a investigação de como eles aprendem resulta em novos conceitos sobre os mecanismos de aprendizagem. Os resultados de estudos experimentais sugerem fortemente que certos tipos de estímulos podem ser efetivos no gatilho da aprendizagem sobre predadores, como a química de alarme (GRIFFIN et al., 2000). Portanto, o estudo da influência desta substância sobre o comportamento dos peixes pode ajudar na concepção de medidas para melhorar a qualidade das reintroduções e sobre como afastar peixes de áreas de risco. O uso de modelos de predadores é comum no meio científico para avaliar o comportamento de peixes. Algumas vezes, diferentes tipos de metodologias são empregados para fornecer um estimulo de predação aos peixes como é o caso de um estudo realizado para verificar se o paulistinha (Danio rerio) responde a exposição de um predador virtual. Para o estudo foi utilizado um monitor de LCD colocado ao lado do aquário com a apresentação de imagens animadas de um predador natural da espécie, peixe folha (Nandus nandus) (GERLAI et al., 2009). Este tipo de estimulação levou os peixes a respostas comportamentais de medo e estresse significativas. Em alguns estudos, para provocar reações comportamentais, são expostos predadores vivos em aquários próximos fornecendo um estímulo visual (SPEEDIE; GERLAI, 2008). Outros apresentam até modelos mais simples como objetos que simulam predadores como tubos de plástico preenchidos com água e carvão e com dois olhos postiços (BLASER; GERLAI, 2006). Um fato conhecido por pescadores é que os peixes conseguem reconhecer o comportamento de modelos que simulam peixes, como é o caso de iscas artificiais. Uma grande diversidade de iscas artificiais estão disponíveis e são criadas para estimular o comportamento predatório dos peixes (MACDONALD et al., 2009). As iscas artificiais mais comumente utilizadas simulam enguias, lulas e uma grande variedade de iscas de metais ou plásticas desenhadas para simular pequenas espécies de presas feridas 14 (MACDONALD et al., 2009). Com isso, o uso de modelos que simulam diferentes comportamentos de predadores em estudos comportamentais, como o trabalho aqui apresentado, é apropriado. O presente estudo tem como objetivos: analisar o comportamento antipredatório de Astyanax bimaculatus (Lambari) em cativeiro; determinar os padrões de resposta comportamental aos diferentes tipos de modelos de predadores aquáticos e aéreos; verificar a resposta antipredação sob a influência da química de alarme. Para isso, formulamos duas hipóteses em que: Os lambaris apresentarão respostas iguais para todos os predadores constituindo uma resposta eficiente, única e inespecífica mantida pela evolução; Os lambaris apresentarão respostas específicas para cada tipo de predador constituindo uma resposta adaptativa e coordenada que favoreça a sobrevivência do grupo. 15 2 METODOLOGIA 2.1 Peixes Todos os animais foram sacrificados, manipulados e mantidos de acordo com as normas exigidas pela comissão de ética da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Os peixes foram eutanasiados de acordo com as diretrizes da American Veterinary Medical Association. Os animais utilizados não precisam de licença específica para manutenção em cativeiro devido a sua natureza comercial. Astyanax bimaculatus (Pisces: Characidae), conhecido popularmente como lambarí-do-rabo-amarelo, são pequenos characiformes, com tamanho máximo registrado de 17,5 centímetros, que possuem mancha próxima à cauda, de hábito alimentar generalista (COSTA; BRAGA, 1993; ESTEVES; GALETTI, 1995), migradores de curta distância (UIEDA, 1984; GARUTTI, 1988), com desova parcial e ovos adesivos (BAZZOLI et al., 1991) bem adaptados a ambientes lênticos e lóticos (AGOSTINHO et al., 1997). Esta espécie foi escolhida devido a sua fácil obtenção em empresas de piscicultura, ao seu pequeno porte, ao fácil manejo, ao seu hábito de vida em cardumes. Portanto, devido a suas características físicas e comportamentais, o lambari é ideal para o presente estudo e para a experimentação. Foram obtidos, em loja especializada em piscicultura, 100 espécimes de A. bimaculatus os quais foram encaminhados para o laboratório experimental localizado no Programa de pós-graduação em Zoologia de Vertebrados da Pontifícia Universidade Católica Minas Gerais. Os peixes foram mantidos em tanque-estoque de 150 litros com oxigenação permanente, temperatura estável em 28° C e sob a ação constante de filtros químico, físico e biológico. A iluminação foi mantida através de timer eletrônico sob um ciclo de 12 horas claro e 12 horas escuro, onde não havia iluminação natural presente. A alimentação se deu com ração em grânulos (Tetra Color Tropical Granules), três vezes ao dia (8:00; 12:00; 17:00) e em pequenas porções sendo os peixes alimentados pelo menos uma hora antes da realização dos testes e nunca durante o experimento. Todos os aquários foram tratados com anticloro (Mydor Dechlor-ease) e medicamento para prevenir infecções comuns aos 16 peixes (Mydor Ick-ease), devido ao estresse do transporte. Assim os peixes foram mantidos durante 45 dias para a aclimatação. Para este estudo decidimos não capturar peixes selvagens, pois esperávamos verificar o comportamento anti-predatório dos animais que não haviam tido contato prévio com predadores. 2.2 Desenho experimental Os experimentos foram realizados em dois aquários experimentais de 63 litros cada um, com as medidas de 60 centímetros de comprimento, 35 centímetros de largura e 30 centímetros de altura sendo suas laterais isoladas do meio externo evitando estímulos visuais. Assim como no tanque estoque, a oxigenação foi constante, com temperatura de 28°C, sob ação de filtros e iluminação 12:12 horas claro:escuro. A frente dos aquários experimentais foi demarcada formando uma 3 estratos de igual tamanho, os quais foram utilizados para quantificar o posicionamento dos peixes durante a experimentação. Os testes foram filmados usando câmera de vigilância colorida montada sobre um tripé posicionado frontalmente ao aquário, ligada a televisor e à vídeo cassete (Samsung modelo time lapse SSC – 1280). As fitas obtidas foram posteriormente digitalizadas e armazenadas em DVDs. As filmagens foram analisadas com o método de amostragem de scan instantâneo com registros a cada 30 segundos quando foram anotados os comportamentos e a posição no aquário. O experimento foi dividido em cinco fases: A primeira fase consistiam de 10 minutos iniciais sem apresentação de estímulos para fornecer uma linha de base estatística dos comportamentos; a segunda fase consistiam dos cinco minutos após a apresentação do estímulo; a terceira de cinco a dez minutos após a apresentação; a quarta de 10 a 15 minutos após a apresentação; a quinta fase de 15 a 20 minutos após a apresentação dos estímulos. Para a análise dos comportamentos, foi elaborado um etograma a partir de um estudo piloto onde foram identificados seis comportamentos principais: Parado ativo 17 (PA); Nadando (N); Nadando rápido (NR); Agredindo (A); Perseguindo (P); Forrageando o fundo (FF) (Tab. 1). Tabela 1: Descrição dos comportamentos de Astyanax bimaculatus, Lambari. Comportamento Parado Ativo Nadando Nadando Rápido Agredindo Perseguindo Forrageando o Fundo Sigla PA N NR A P FF Descrição Manutenção de posição fixa com movimentos leves das nadadeiras peitorais Movimentação pelo aquário com velocidade regular Movimentação rápida com movimentos acentuados das nadadeiras Ataque ou ser atacado por mordidas ou choques Perseguição curta dois ou mais peixes no aquário Forrageio do fundo do aquário O comportamento ―Parado ativo‖ se deu quando os peixes mantinham uma posição fixa na coluna d’água com movimentos leves das nadadeiras peitorais. O comportamento ―Nadando‖ se deu quando os peixes se locomoviam pelo aquário com uma velocidade regular. O comportamento ―Nadando rápido‖ ocorria quando os peixes se locomoviam pelo aquário com movimentos acentuados da nadadeira caudal apresentando uma velocidade maior do que a observada no comportamento ―Nadando‖. O comportamento ―Agredindo‖ ocorria quando um peixe atacava ou era atacado por outro, aparentemente por mordidas e choques violentos contra os indivíduos. O comportamento ―Perseguindo‖ se dava quando um ou mais peixes realizavam um ataque ou eram atacados, seguido de uma curta perseguição. O comportamento ―Forrageando o fundo‖ se deu quando os peixes se posicionavam em ângulo, estando com a cabeça voltada para o fundo e a cauda para cima enquanto mordiscavam o fundo do aquário. Os peixes foram divididos em oito grupos de oito indivíduos. Cada grupo constituiu-se de quatro machos e quadro fêmeas, sendo os espécimes de tamanho semelhante. A identificação do sexo se deu pela análise da nadadeira anal a qual nos machos a nadadeira se apresentava com pequenas espículas e nas fêmeas, lisa. A observação da região ventral dos peixes também foi utilizada para a identificação, onde nas fêmeas poderia se apresentar ligeiramente abaulada. Após os experimentos os peixes foram sacrificados por decapitação para confirmação do sexo confirmado a presença de 4 machos e 4 fêmeas em cada grupo. 18 Cada grupo foi submetido a quatro tipos de estímulos: Predador de procura ativa, predador de emboscada, predador aéreo e controle. O predador de procura ativa e de uma réplica em resina de um peixe com olhos e boca grande que, durante a exposição (Fig. 1), perseguia os peixes durante 5 minutos. A perseguição foi feita prendendo a réplica por arames finos possibilitando a condução do modelo no aquário. Figura 1: Réplica em resina de um peixe predador, Hoplias malabaricus (Traíra), utilizada para representar o estimulo de predação de procura ativa. O predador de emboscada (sit-and-wait) consistia em uma réplica em resina de traíra, Hoplias malabaricus, que através de um sistema de molas e fios de nylon, era ejetada de um cano de PVC toda vez em que um peixe inspecionava a entrada do tubo, durante os cinco minutos de exposição (Fig. 2). 19 Figura 2: Esquema demonstrando o funcionamento do aparato utilizado para apresentação do estímulo de um predador de emboscada. O predador aéreo foi feito reproduzindo-se um modelo genérico de uma cabeça de ave como uma garça, gênero Ardea, seguindo as mesmas características de um predador de olhos grandes e afastados e um bico longo e pontiagudo (Fig. 3). Esta réplica de cabeça era ligada a uma mangueira firme que simulava um longo 20 pescoço. Durante a estimulação de cinco minutos, a cada 15 segundos, a réplica da ave era rapidamente inserida dentro do aquário, visando uma evasão do cardume, tomando os devidos cuidados para não machucar os animais experimentais. Figura 3: Representação do modelo de predador aéreo O objeto controle tratava-se de um vasilhame de 15 centímetros de altura, com água e pedras em seu interior para fazê-lo afundar e estando hermeticamente fechado (Fig. 4). O controle foi colocado no centro do aquário durante os cinco minutos de estimulação. Figura 4: Objeto utilizado para os testes de Controle 21 Todos os testes foram realizados de forma que o pesquisador exerçesse o mínimo de influência possível durante a exposição dos modelos. Antes e após a realização dos testes, todo o ambiente do experimento permaneceu desocupado. Cada modelo de predador foi apresentado na presença e na ausência do extrato bruto de pele, possibilitando a análise da influência da comunicação química no comportamento dos lambaris. Para isso, antes da apresentação do estímulo, cinco mililitros extrato bruto de pele contendo os sinais químicos foram injetados no aquário de testes por uma seringa. Após a realização dos testes que envolviam o extrato bruto da pele, todos os peixes eram transferidos para um aquário provisório nas mesmas condições do aquário original e toda a água do aquário de teste era trocada. Logo após, os peixes retornavam para o aquário original, onde voltavam para uma nova aclimatação. Cada teste foi repetido três vezes, com intervalos de uma hora e meia, para atingir um número satisfatório de réplicas. Em cada grupo, os estímulos foram apresentados de maneira alternada, evitando assim os efeitos relacionados à ordem de apresentação dos estímulos e da química. A ordem de apresentação dos estímulos seguiu uma distribuição Latin square (Tab. 2). 22 Tabela 2: Ordem de apresentação dos estímulos de predação e da química de alarme para cada grupo. Grupo 1 Química de Alarme Réplicas Grupo 2 Química de Alarme Réplicas Predador Procura ativa Sem Química Predador Procura ativa 3 Controle Sem Química 3 Com Química 3 Controle Com Química 3 Predador Emboscada Sem Química 3 Predador Procura ativa Sem Química 3 Predador Emboscada Com Química 3 Predador Procura ativa Com Química 3 Predador aéreo Sem Química 3 Predador Emboscada Sem Química 3 Predador aéreo Com Química 3 Predador Emboscada Com Química 3 Controle Sem Química 3 Predador aéreo Sem Química 3 Controle Com Química 3 Predador aéreo Com Química 3 Grupo 3 Química de Alarme Réplicas Grupo 4 Química de Alarme Réplicas Predador Aéreo Sem Química 3 Predador Emboscada Sem Química 3 Predador Aéreo Com Química 3 Predador Emboscada Com Química 3 Controle Sem Química 3 Predador Aéreo Sem Química 3 Controle Com Química 3 Predador Aéreo Com Química 3 Predador Procura ativa Sem Química 3 Controle Sem Química 3 Predador Procura ativa Com Química 3 Controle Com Química 3 Predador Emboscada Sem Química 3 Predador Procura ativa Sem Química 3 Predador Emboscada Com Química 3 Predador Procura ativa Com Química 3 Grupo 5 Química de Alarme Predador Procura ativa Com Química 3 Predador Procura ativa Sem Química Predador Emboscada Predador Emboscada Predador aéreo Química de Alarme Réplicas Controle Com Química 3 Controle Sem Química 3 Com Química 3 Predador Procura ativa Com Química 3 Sem Química Predador Procura ativa Sem Química 3 Com Química 3 Predador Emboscada Com Química 3 Predador aéreo Sem Química Predador Emboscada Sem Química 3 Controle Com Química 3 Predador aéreo Com Química 3 Controle Sem Química 3 Predador aéreo Sem Química 3 Grupo 7 Química de Alarme Réplicas Grupo 8 Química de Alarme Réplicas Predador Aéreo Com Química 3 Predador Emboscada Com Química 3 Predador Aéreo Sem Química Predador Emboscada Sem Química 3 Controle Com Química 3 Predador Aéreo Com Química 3 Controle Sem Química Predador Aéreo Sem Química 3 Predador Procura ativa Com Química 3 Controle Com Química 3 Predador Procura ativa Sem Química Controle Sem Química 3 Predador Emboscada Com Química 3 Predador Procura ativa Com Química 3 Predador Emboscada Sem Química Predador Procura ativa Sem Química 3 Réplicas Grupo 6 3 3 3 3 3 3 3 23 2.3 Preparação do extrato bruto de pele A química de alarme foi preparada capturando cuidadosamente os lambaris, evitando estragos a pele e sacrificando-os por decapitação. A pele foi removida inserindo delicadamente uma tesoura sob a pele, a partir do orifício aberto pela decapitação, sendo esta removida por inteiro sem maiores danos. A pele retirada foi macerada com a adição de água destilada, utilizando uma proporção de 10 mililitros de água destilada para 5cm² de epiderme. A solução obtida foi filtrada por filtro de papel para a remoção de partes solidas como escamas. A extração do extrato bruto de pele foi feita antes da realização dos testes e o conteúdo extraído foi mantido congelado caso não fosse utilizado imediatamente. O restante da solução foi armazenada em vidros com o conteúdo suficiente para a realização de cada teste, sendo descongelado apenas o necessário e em temperatura ambiente, ficando estocadas não mais que 6 horas. Método adaptado de Ide (2003). 2.4 Histologia Para a histologia, as peles de dois machos e duas fêmeas em estado reprodutivo (maturação avançada) foram removidas e fixadas em líquido de bouin por 12 horas para confecção de lâminas, utilizando técnicas histológicas de rotina com inclusão em parafina, microtomia de 3-5µm, coloração em hematoxilina-eosina para caracterização morfológica do tecido e ácido periódico de Schiff (PAS) para identificação de glicoproteinas para confirmação da presença das células clava (PEARSE, 1985). 2.5 Análises Estatísticas Os dados obtidos foram compilados em uma tabela onde estavam organizados por grupo, réplica, tipo de estímulo, presença ou ausência da substância de alarme e fase do experimento. A porcentagem dos comportamentos e do posicionamento dos peixes foi calculada para cada uma das cinco fases, antes e depois da apresentação dos estímulos. Estas porcentagens foram utilizadas para a realização dos testes estatísticos. A não normalidade dos dados foi verificada pelo teste de normalidade de Anderson-Darling (p<0,05). A freqüência de comportamentos e o posicionamento dos peixes no aquário foram analisados pelo teste de analise de variância de 24 Friedman comparando o tipo de estímulo apresentado, a diferença entre presença e ausência da substância de alarme, a diferença entre os grupos e entre as fases. Todos os testes foram seguidos do teste post-hoc de Tukey. Os testes estatísticos foram feitos utilizando os softwares Minitab 15 e Biostat 5.0, utilizando o nível de significância de 0,05. 25 3 RESULTADOS 3.1 Histologia Os cortes histológicos da pele dos lambaris corados com Hematoxilina-Eosina demonstraram a presença na epiderme de células em forma de clava com o núcleo central na epiderme. O método de coloração de ácido periódico de Schiff (PAS) permitiu diferenciar as células mucosas das células produtoras da substância de alarme. As células mucosas apresentavam-se coradas, devido ao seu conteúdo glicoprotéico, enquanto as células Club eram PAS-negativas estando não coradas e com o núcleo central (HALBGEWACHS et al., 2009; KUMARI et al., 2009). Assim foi possível concluir que A. bimaculatus produz a substância química de alarme como os demais Ostariophysi, mesmo em maturação avançada (Fig. 5 e 6). 26 Figura 5: Corte histológico da epiderme de Astyanax bimaculatus evidenciando a presença de glândulas; Coloração em Hematoxilina-eosina aumento 100x. Seta: Glândulas mucosas e células produtoras da química de alarme indiferenciadas pelo método de coloração Figura 6: Corte histológico da epiderme de Astyanax bimaculatus mostrando a presença de células PAS positivas e negativas evidenciando a presença de células produtoras da química de alarme. Coloração em PAS; aumento 100x. ↓ * ↓ Asterisco: Célula mucosa PAS positiva / Seta: Célula produtora da química de alarme PAS negativa 27 3.2 Análise Comportamental Foram realizados 192 testes (3 x 8 x 8) totalizando 96 horas de filmagens. Ao se comparar estas repetições, percebemos que os peixes estudados apresentaram diferenças significativas para a maioria dos comportamentos. As repetições foram influenciadas por testes realizados anteriormente em pelo menos um comportamento resaltando algum processo de reconhecimento e influência dos experimentos precedentes (Tab. 3 e 4). Tabela 3: Valores do teste de Friedman (Fr) na comparação entre as réplicas realizadas para cada tipo de estímulo de predação. (Graus de liberdade=2) Controle Controle Predador Aéreo Predador Aéreo Predador Predador Predador Procura Ativa Procura Ativa Emboscada Predador Emboscada Com Química Sem Química Com Química Sem Química Com Química Sem Química Com Química Sem Química PA 3.8 9.91** 12.48*** 9.68** 7.13* 16.73*** 8.21** 1.61 N 14.33*** 17.13*** 8.63** 8.48** 6.91* 25.80*** 11.11** 4.38 NR 0.01 3.76 2.11 0.26 12.18** 5.11 0.05 2.03 P 8.41** 12.41** 16.88*** 17.71*** 1.13 12.76*** 7.96** 11.15** A 2.13 1.38 0.80 1.38 1.16 1.36 0.48 0.38 FF 2.48 0.91 3.63 1.01 1.61 1.38 4.08 1.13 PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF – Forrageando o Fundo; p<0,05 - *; p<0,01 - **; p<0,001 - ***. Tabela 4: Ranks com diferenças significativas para os resultados do teste de Friedman e teste posthoc Tukey comparando as réplicas realizadas para cada tipo de estímulo apresentado (graus de liberdade=2). Comportamento Controle Predador aéreo PA N NR P A FF Com química ns 1 e 2 / 1 e 3 ns 1 e3 ns ns Sem química 1 e 3 1 e 3/ 2 e 3 ns 1 e3 ns ns Com química 2 e 3 1 e2 ns 1 e 2 / 1 e 3 ns ns Sem química 1 e 3 1 e3 ns 1 e 3 / 2 e 3 ns ns Com química 2 e 3 1 e2 1 e 2 / 1 e 3 Ns Predador procura ativa Sem química 1 e 3 / 2 e 3 1 e 3 / 2 e 3 ns Com química 1 e 2 Predador emboscada Sem química ns ns ns 1 e 3 / 2 e 3 ns ns 1 e2 ns 1 e2 ns ns ns ns 1 e 2 / 1 e 3 ns ns PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF – Forrageando o Fundo; ns – Não significativo. O estímulo controle não provocou alterações no comportamento dos lambaris e também não gerou diferenças significativas no posicionamento dos peixes, antes e 28 depois da apresentação do estímulo, sem a presença da química de alarme. No entanto, ao se apresentar o estímulo neutro (controle) com a presença da substância de alarme, o posicionamento dos peixes não foi alterado, mas observa-se um aumento tardio do comportamento ―Parado Ativo‖ (Fr = 25.85, GL=4, p < 0.0001) junto a uma diminuição do comportamento ―Nadando‖ (Fr = 24.37, GL=4, p < 0.0001)(Tab. 5). Tabela 5: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do estímulo controle. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey (Graus de liberdade=4). Estímulo Controle Comportamento PA N NR P A FF Posição Acima Meio Fundo Com química Aumento – Fases 1 e 4, 1 e 5. Diminuição – Fases 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5 ns ns ns ns Sem química ns ns ns ns ns ns ns ns ns ns ns ns PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF – Forrageando o Fundo; ns – Não significativo. Com a apresentação do modelo Ave sem a química de substância arme, os peixes imediatamente diminuíram o comportamento ―Nadando‖ (Fr = 31.49, GL=4, p < 0.0001) e aumentaram a freqüência do comportamento ―Nadando Rápido‖ (Fr =22.92, GL=4, p = 0.0001) sendo que a partir de cinco minutos após a apresentação do estímulo, houve um aumento do comportamento ―Perseguindo‖ (Fr =19.12, GL=4 p = 0.0007). Os lambaris se posicionaram inicialmente no fundo do aquário (Fr=16.62, GL=4, p=0.0023), mas em seguida utilizam o meio da coluna d’água a maior parte do tempo do teste (Fr=20.60, GL=4, p=0.0004)(Tab. 6). A apresentação do modelo de Ave com a substância de alarme faz os peixes diminuírem imediatamente o comportamento ―Nadando‖ (Fr=23.59, GL=4, p<0.0001), aumentam o comportamento ―Nadando Rápido‖(Fr=12.69, GL=4, p=0.0129) e aumentam imediatamente o comportamento ―Perseguindo‖(Fr=18.45, 29 GL=4, p=0.0010). Além disso, utilizam o fundo do aquário durante maior parte do tempo subseqüente a apresentação do estímulo aéreo (Fr= 14.76, GL=4, p= 0.0052)(Tab. 6). Tabela 6: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do estímulo de predador aéreo. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey (Graus de liberdade=4). Estímulo de Predador aéreo Comportamento Com química Sem química PA ns ns N Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4 Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5 NR Aumento – Fases 1 e 2 Aumento – Fases 1 e 2 P Aumento – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4 Aumento – Fases 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5 A ns ns FF ns ns Posição Acima ns ns Meio ns Diminuição – Fases 1 e 2 Fundo Aumento – Fases 1 e 2 ns PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF – Forrageando o Fundo; ns – Não significativo. A exposição do predador de procura ativa sem a substância de química de alarme produziu uma resposta aumentando imediatamente o comportamento ―Perseguindo‖ (Fr=15.67, GL=4, p=0.0035) e diminuindo o comportamento ―Nadando‖ (Fr=24.85, GL=4 p<0.0001) sendo que no final do teste há um aumento do comportamento ―Parado Ativo‖ (Fr=28.74, GL=4, p< 0.0001). Ao final do teste, os peixes passam a utilizar significativamente mais o meio da coluna d’água (Fr=13.96, GL=4, p=0.0074) e menos o fundo (Fr=15.75, GL=4, p=0.0034)(Tab. 7). Com a exposição do predador de procura ativa com a presença da química de alarme, os lambaris aumentam os comportamentos ―Nadando Rápido‖ (Fr= 24.28, GL=4, p< 0.0001) e ―Perseguindo‖ (Fr=17.83, GL=4, p=0.0013) e diminuem o comportamento ―Nadando‖ (Fr=36.25, GL=4, p< 0.0001) imediatamente e então aumentam o comportamento ―Parado ativo‖(Fr=46.57, GL=4, p< 0.0001) tardiamente. Para este tipo de estimulação, não houve diferença significativa entre o posicionamento no aquário (Tab. 7). 30 Tabela 7: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do estímulo de predador de procura ativa.. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey (Graus de liberdade=4). Estímulo de Predador procura ativa Comportamento Com química Sem química PA Aumento – Fases 1 e 4, 1 e 5 Aumento – Fases 1 e 5 N Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5 Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 5 NR Aumento – Fases 1 e 2 ns P Aumento – Fases 1 e 2, 1 e 4 Aumento – Fases 1 e 2, 1 e 3 A ns ns FF ns ns Posição Acima ns ns Meio ns Aumento – Fases 1 e 3 Fundo ns Diminuição – Fases 1 e 3 PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF – Forrageando o Fundo; ns – Não significativo. Para o modelo predador de emboscada sem a substância de alarme, houve apenas uma diminuição tardia do comportamento ―Nadando‖ (Fr=19.45, GL=4, p=0.0006) e o posicionamento dos peixes não foi afetado significativamente. Entretanto, para este tipo de estímulo, com a apresentação da química de alarme, há uma diminuição imediata do comportamento ―Nadando‖ (Fr=33.96, GL=4, p=< 0.0001) e um aumento do comportamento ―Nadando Rápido‖ (Fr=17.87, GL=4, p=0.0013) seguido de um aumento tardio do comportamento ―Parado Ativo‖ (Fr=25.51, GL=4, p< 0.0001) e o posicionamento também não foi afetado (Tab. 8). 31 Tabela 8: Comparação entre as fases, antes e depois à apresentação do estímulo de predador de emboscada. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey (Graus de liberdade=4). Estímulo de Predador de emboscada Comportamento Com química Sem química PA Aumento – Fases 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5 ns N Diminuição – Fases 1 e 2, 1 e 3, 1 e 4, 1 e 5 Diminuição – Fases 1 e 3, 1 e 5 NR Aumento – Fases 1 e 2, 1 e 4 ns P ns ns A ns ns FF ns ns Posição Acima ns ns Meio ns ns Fundo ns ns PA – Parado Ativo; N – Nadando; NR – Nadando Rápido; P – Perseguindo; A – Agredindo; FF – Forrageando o Fundo; ns – Não significativo. Comparamos ainda cada comportamento usando os estímulos como variáveis. Os comportamentos ―Parado Ativo‖, ―Forrageando o Fundo‖ e ―Agredindo‖ não diferiram significativamente entre os estímulos na presença e na ausência da química de alarme. A apresentação da química de alarme fez com que os comportamentos não se alterassem com a exposição de estímulos diferentes. Assim, os estímulos de predador de procura ativa, o predador aéreo e o predador de emboscada não se diferenciaram significativamente entre todas as fases do experimento, exceto para o comportamento ―Nadando Rápido‖ onde se verificou uma diferença apenas entre o predador de procura ativa e o controle nos cinco minutos iniciais após a apresentação do modelo de predador (Fr=8.71, GL=3, p= 0.0334) (Tab. 9). A apresentação da química de alarme fez com que os peixes utilizassem mais a área próxima a superfície quando aliada ao estímulo de predador de emboscada, mas quando a substância de alarme era apresentada junto ao estímulo de predador aéreo os peixes utilizavam menos esta área superior no aquário (Fr=8.41, GL=3, p=0.0382) (Tab. 9). Os modelos de predador, quando apresentados sem a substância química de alarme, provocaram uma maior diversidade de comportamentos quando 32 comparados às respostas com a química de alarme. O comportamento ―Nadando‖ diminuiu significativamente em relação ao controle para os modelos de procura ativa e predador aéreo na fase imediatamente à apresentação do estímulo (Fr=18.33, GL=3, p=0.0004). Nas fases seguintes, a diferença para este comportamento se deu entre o predador aéreo e o controle (fase 3: Fr=12.15, GL=3, p=0.0069; fase 5: Fr=13.65, GL=3, p=0.0034). Ao passo que o comportamento ―Nadando‖ diminui, há um aumento do comportamento ―Nadando Rápido‖ para os estímulos de predador aéreo, nas fases 2 e 3, e predador procura ativa na fase 2 (fase 2: Fr=21.12, GL=3, p< 0.0001; fase 3: Fr=10.73, GL=3, p=0.0132). O comportamento ―Perseguindo‖ aumenta tardiamente para o modelo de predador aéreo, a partir de cinco minutos após a apresentação do estímulo até o fim das filmagens (Fr= 13.20, GL=3, p=0.0042). Entretanto, este comportamento apresenta os menores níveis na fase de 15 a 20 minutos após a estimulação com o modelo de predador de emboscada (Fr=12.13, GL=3, p=0.0069) (Tab. 9). O posicionamento dos peixes sem a química de alarme mostrou que os peixes utilizam mais o fundo do aquário quando o predador aéreo é apresentado e menos quando o predador de emboscada é exposto (Fr=11.91, GL=3, p=0.0077). Quando apresentados os modelos de predador de emboscada e de procura ativa o uso do fundo é menor na fase 2, onde para estes modelos o uso do meio da coluna d’água é maior (Fr=9.3250, GL=3, p=0.0253). Nas fases finais da realização dos testes, de 15 a 20 minutos, os peixes voltam a se posicionar normalmente, não apresentando diferenças significativas entre o controle e os modelos de predador (Tab. 10). 33 Tabela 9: Resultados para a comparação dos comportamentos entre os estímulos apresentados (Controle, Predador aéreo, procura ativa e de emboscada). Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey. Comportamento Com Química Sem Química 0 - 5 minutos ns ns 5 - 10 minutos ns ns 10 - 15 minutos ns ns 15 - 20 minutos ns ns 0 - 5 minutos ns Aéreo e procura ativa > Controle 5 - 10 minutos ns Aéreo < Controle 10 - 15 minutos ns ns 15 - 20 minutos ns Aéreo < Controle 0 - 5 minutos Procura ativa > Controle Aéreo e procura ativa > Controle 5 - 10 minutos ns Aéreo > Controle 10 - 15 minutos ns ns 15 - 20 minutos ns ns 0 - 5 minutos ns ns 5 - 10 minutos ns Aéreo > Controle 10 - 15 minutos ns Aéreo > Controle 15 - 20 minutos ns Aéreo > Controle 0 - 5 minutos ns ns 5 - 10 minutos ns ns 10 - 15 minutos ns ns 15 - 20 minutos ns ns 0 - 5 minutos ns ns 5 - 10 minutos ns ns 10 - 15 minutos ns ns 15 - 20 minutos ns ns Parado atívo Nadando Nadando Rápido Perseguindo Agredindo Forrageando o fundo Aéreo – Estímulo de predador aéreo; Controle – Estímulo controle (objeto neutro); Procura atíva – Estímulo de predador de procura ativa; ns – Não significativo. 34 Tabela 10: Resultados para a comparação das áreas utilizadas no aquário entre os estímulos apresentados. Resultados significativos do teste de Friedman e post-hoc de Tukey. Acima Meio Fundo Com Quimica Sem Quimica 0 - 5 minutos ns ns 5 - 10 minutos Aéreo < Emboscada ns 10 - 15 minutos Aéreo < Emboscada ns 15 - 20 minutos ns ns 0 - 5 minutos ns Aéreo < Procura ativa e Emboscada 5 - 10 minutos ns Aéreo < Procura ativa 10 - 15 minutos ns ns 15 - 20 minutos ns ns 0 - 5 minutos ns Aéreo > Procura ativa e Emboscada 5 - 10 minutos ns ns 10 - 15 minutos ns ns 15 - 20 minutos ns ns Aéreo – Estímulo de predador aéreo; Emboscada – Estímulo de predador de emboscada; Procura atíva – Estímulo de predador de procura ativa; ns – Não significativo. 35 4 DISCUSSÃO Para a validação de um estudo envolvendo reação de alarme em uma espécie em que a presença da química de alarme ainda não foi estudada, fez-se necessário um estudo histológico qualitativo para a verificação da presença ou ausência das células produtoras da substância de alarme. Pelo fato de algumas espécies descritas na literatura, possuírem um dimorfismo sexual envolvendo a presença destas glândulas (IRVING, 1996), machos e fêmeas em estado reprodutivo (maturação avançada) foram utilizados para esta análise. A presença de células produtoras da química de alarme é tida como uma constante para a superordem Ostariopysi, entretanto, apenas cerca de 5% dos peixes desta superordem foram estudados neste aspecto (IRVING, 1996). Alguns destes peixes não reagem à química de alarme, mas produzem este feromônio como as piranhas (Família Serrasalminae) ou mesmo não possuem as células produtoras, nem a reação de alarme como alguns cascudos (e.g., Loricariidae e Gymnotiformes) (NELSON, 2006). Com os resultados obtidos, podemos observar que Astyanax bimaculatus apresenta as células secretoras da química de alarme como os demais membros da superordem Ostariophysi. O gênero Astyanax é o mais rico em diversidade de espécies da ordem Characiformes (NELSON, 2006). Então, generalizações sobre a presença das células produtoras da química de alarme e estudos sobre comportamento destas espécies frente à apresentação desta substância, não devem ser feitas sem estudos prévios sobre a histologia da epiderme. Uma conclusão deste estudo foi que os lambaris conseguem reconhecer a química de alarme como o indicativo de uma situação de alerta. A falta de resposta dos lambaris à apresentação do Controle sem a química de alarme demonstrou que a introdução de um objeto neutro no aquário não foi percebida como risco. Com isso, ficou demonstrado que a resposta aos modelos de predador representou um possível estímulo de predação aos peixes durante a realização dos testes. Quando o Controle foi inserido com a química de alarme criou-se uma situação de alerta onde, 36 mesmo um objeto que não representa risco de predação gerou uma mudança comportamental. O aumento do comportamento ―Parado Ativo‖ e a diminuição do comportamento natatório dos peixes constitui uma resposta comum para a presença da química de alarme (WISENDEN et al., 2010; LAWRENCE; SMITH, 1989). O paulistinha (Danio rerio) é um comum modelo em pesquisas científicas médicas e farmacêuticas tendo seus comportamentos muito estudados para medir reações a drogas. O comportamento descrito como ―freezing‖, que consiste na diminuição da atividade natatória, é tido como o mais confiável para medir ansiedade em peixes (BLASER et al., 2010). Com isso, podemos presumir que a química de alarme provocou ansiedade e medo nos peixes, mesmo sem a apresentação de um possível risco eminente de predação. As observações realizadas evidenciaram que a química de alarme aliada a um modelo de predador gera estratégias antipredação semelhantes. A resposta para todos os predadores consistiu no aumento imediato da atividade natatória. Indivíduos têm uma grande chance de evitar predadores se eles fugirem imediatamente do local, uma vez que detectada uma fonte de predação (MATHIS; SMITH, 1993). Uma resposta rápida à detecção de um predador está relacionada a um menor risco de serem predados (LIMA; DILL 1990). A mudança comportamental resultante da visualização de um predador é maior quando há pré-exposição de sinais químicos de alarme. A interação entre sinais visuais e químicos intensificam a resposta, fazendo com que os peixes evitem um modelo de predador (WISENDEN et al., 2004). O paulistinha apresenta respostas semelhantes. Os indivíduos fazem movimentos natatórios erráticos em resposta à aparição de um predador (GERLAI et al. 2000). Assim, os movimentos erráticos são uma reação de fuga exibida pelo paulistinha (SPEEDIE, N.; GERLAI, R. 2008). O aumento do comportamento natatório, em resposta a substância química de alarme aliada a um predador, consiste em um comportamento antipredatório e representa uma situação de medo e ansiedade (SPEEDIE, N.; GERLAI, R. 2008). Este tipo de reação está relacionado a características do ambiente em que as espécies vivem. O paulistinha habita pequenos riachos e lagos com água parada ou onde escoa lentamente. O fundo destes ambientes geralmente possui sedimentos e vegetação. O aumento do comportamento natatório e o uso do fundo levanta sedimentos que podem cobrir e esconder os peixes consistindo de um comportamento antipredatório (SPEEDIE, N.; 37 GERLAI, R. 2008). Para os lambaris o aumento do comportamento natatório pode estar relacionado com a busca por abrigos, onde os peixes podem se refugiar dos predadores. Foi verificado que os lambaris apresentam respostas diferentes para cada modelo de predador quando apresentados sem a química de alarme. A resposta para o modelo de Predador Aéreo consistiu no aumento nos comportamentos natatório e de perseguição entre os lambaris. O aumento da atividade natatória pode estar relacionado com a facilidade de um predador aéreo na captura dos peixes, caso fiquem parados, visto que o aquário de testes não possuía abrigos. Os peixes se posicionaram no fundo do aquário, visto que o estímulo de predação era proveniente da superfície. Terminada a ameaça, os lambaris voltaram a utilizar normalmente a região mediana do aquário. O maior uso do fundo e o aumento da atividade natatória e estão de acordo com a resposta obtida para outras espécies de peixes que possuem predadores aéreos (LITVAK, 1993). A apresentação do Predador de Procura Ativa e de Emboscada sem a química de alarme causou uma diminuição da atividade natatória. A movimentação é facilmente distinguida pelo predador e espécies de presas podem reduzir sua atividade quando o risco de predação é alto (LAWRENCE; SMITH, 1989). O aumento do comportamento ―Parado ativo‖ pode ser considerado uma estratégia antipredação comum aos peixes onde a probabilidade de sobrevivência da presa é aumentada por dificultar a visualização pelo predador. Indivíduos mais ativos são facilmente visualizados por se diferenciarem da cor de fundo tornando fácil sua detecção pelo predador (KRAUSE; GODIN, 1995). O aumento do comportamento ―Parado ativo‖ também pode ser descrito como uma reação de medo e ansiedade (BLASER et al., 2010). Outra explicação para o aumento deste comportamento pode estar relacionado à comunicação entre os lambaris por sinais visuais. Uma espécie da mesma família do lambari, o Hemigrammus erythrozonus (Characidae), apresenta um típico comportamento de alerta que consiste de movimentos rápidos das nadadeiras dorsal, caudal e peitorais, sem resultar na mudança da posição corporal (BROWN; GODIN, 1999; BROWN et al., 1999). Estes movimentos das nadadeiras podem alertar outros indivíduos sobre a presença de um predador (BROWN et al. 1999). Alguma estimulação visual pode ocorrer entre os lambaris, mas não foram examinados neste estudo. Isto pode explicar o aumento do 38 comportamento ―Parado Ativo‖ estando relacionado ao reconhecimento de um predador aquático, visto que não houve aumento neste comportamento para o predador aéreo. Uma reação inesperada foi observada. O aumento do comportamento ―perseguindo‖ ocorreu para os estímulos de Predador Aéreo e de Procura Ativa, onde os peixes apresentavam interações agonísticas entre si após a apresentação do predador. O aumento destas interações constantemente levava alguns indivíduos debilitados se afastarem do cardume. É esperado que os peixes se reúnam em cardumes visando a proteção contra predadores (HOARE et al., 2004; HENSOR, et al., 2005), porém o aumento da agressão entre indivíduos do cardume pode fazer com que os menos competentes fiquem mais vulneráveis à predação, enquanto o restante do cardume consiga sobreviver. Os peixes afastados do centro do cardume têm uma maior chance de serem predados, e assim podemos relacionar o aumento em comportamentos agonísticos (Perseguindo) como um estabelecimento de uma posição privilegiada no grupo. Além dos benefícios para se viver em grupos, é possível que os membros de um cardume se escondam atrás de outros indivíduos para evitar a predação como conseqüência da hipótese de Selfish herd (FROMMEN, et al., 2009). Isto pode explicar a presença de escamas identificadas como integrante da dieta de A. bimaculatus e sua possível ingestão durante a exibição de comportamentos agressivos (SAZIMA, 1983; ARCIFA et al., 1991). Uma possível aplicação deste trabalho esta na seleção de indivíduos com comportamentos adequados para a reintrodução. O repovoamento dos estoques pesqueiros é uma prática mitigatória comum do impacto ambiental (GODINHO; GODINHO, 2003, FLAGG et al., 1995). A taxa de mortalidade de peixes de cativeiro reintroduzidos é alta e uma das grandes preocupações é a viabilidade destes indivíduos (OLLA et al., 1998, BROWN; LALAND, 2001), Uma das grandes causas de mortalidade na reintrodução de animais é a predação (TEIXEIRA et al., 2007). Portanto, novos estudos podem ser realizados visando a seleção indivíduos adequados para o peixamento ou avaliando o treinamento de peixes para a reintrodução. Outros estudos podem ser feitos investigando o mecanismo de comunicação entre os peixes para coordenar as estratégias antipredatórias. 39 Concluímos que a química de alarme é um importante fator de alerta. Sua detecção causa uma reação de ansiedade nos peixes que, quando aliada a um modelo de predador, gera imediatamente uma reação de fuga que possibilita a sobrevivência do cardume. Percebe-se ainda que os comportamentos antipredatórios variam expressivamente quando comparamos respostas para predadores aéreos e aquáticos. A apresentação de comportamentos agonísticos, como o aumento da perseguição, demonstra como a evolução atua nesta espécie, selecionando os indivíduos mais competentes dentro de um grupo. 40 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Agostinho, A. A., Bini, L. M. & Gomes, L. C. 1997. Ecologia de comunidades de peixes da área de influência do reservatório de Segredo. In: Reservatório de Segredo, bases ecológicas para manejo (Ed. By Agostinho, A. A. & L. M. Gomes), pp. 97–111. Maringá: EDUEM Arcifa, M. S., Northcote, T. G. & Froehlich, O. 1991. Interactive ecology of 2 cohabiting characin fishes (Astyanax-fasciatus and Astyanax-bimaculatus) in an eutrophic brazilian reservoir. 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