QUIMICA E ENSINO REVISÃO CURRICULAR DO SECUNDÁRIO Neste espaço damos conta da posição da SPQ e de pondeu-nos que a comissão estava em fase de in- alguns dos seus associados, acerca da proposta de corporar todas as contribuições e que só depois de reforma curricular do ensino secundário. Aderiram todo esse trabalho estar feito voltariam a pronun- cerca de uma centena de Departamentos e Grupos ciar-se sobre o assunto. Por tal, não consideravam de Escolas, e várias centenas de professores a títu- ser esta a altura oportuna para se pronunciarem. É lo individual à posição manifestada pela SPQ. Por uma atitude compreensível. Infelizmente retirou ao outro lado, foi pedido ao Ministério da Educação corpo editorial a possibilidade de apresentar neste um artigo onde os autores da proposta justificassem número um pluralismo de opiniões que é sempre a opção feita. Em resposta, a assessora de impren- enriquecedor. O corpo editorial sa, a quem havíamos solicitado a contribuição, res- Ao Senhor Ministro da Educação Posição da SPQ sobre as Linhas Orientadoras da Revisão Curricular Ministério da Educação, 2002 J O S É F E R R E I R A G O M E S 1 SOCIEDADE PORTUGUESA DE QUÍMICA, ríodo de discussão pública formal, en- vidade e competitividade. Por estas ra- uma das maiores, mais antigas e tende a SPQ dever apresentar-lhe o seu zões, não deixaremos de acompanhar o mais activas sociedades científicas por- balanço desta discussão pública e as processo legislativo a nível do Governo e tuguesas, assumiu as suas responsabili- suas propostas de intervenção futura. do Parlamento, manifestando a nossa dades perante os seus mais de 2200 as- O Senhor Ministro assumiu uma posição sociados e perante o País, participando de certa flexibilidade, mostrando-se in- na discussão pública das linhas orienta- teligentemente aberto à melhoria da doras da revisão curricular propostas proposta com base nos contributos re- pelo Ministério da Educação (ME). Ouvi- cebidos. Entendemos que a proposta é 1. No Curso de Ciências e Tecnologias dos os associados, a SPQ divulgou um tecnicamente muito pobre, carece de deve exigir-se uma sólida formação Manifesto que foi aprovado em reunião qualquer enquadramento no trabalho científica, teórica e laboratorial, nas da sua Divisão de Ensino e Divulgação e que vinha sendo feito, é terrivelmente áreas-base do mundo tecnológico em recebeu posteriormente o apoio de mui- prejudicial para a formação científico- que vivemos. A Química tem aqui um tos professores que não puderam estar tecnológica dos nossos jovens, e baixa- papel central pelas suas relações com presentes na reunião. Concluído o pe- ria ainda mais o nosso nível de produti- as outras ciências e pelo volume de A 1 Presidente da Sociedade Portuguesa de Química. total disponibilidade para contribuir para a melhoria da proposta. Registamos aqui os principais pontos de discordância. 83 84 QUÍMICA emprego que gera na Europa: 1,7 milhões de postos de trabalho directos! 2. Não é tolerável que seja dado aos alunos um leque de opções que possa criar a falsa ideia de que se pode sobreviver numa área científico-tecnológica sem uma sólida e ampla formação inicial. Não nos esqueçamos que o nível e a amplitude da formação actual em Química é muito inferior, por exemplo, à Britânica. Enquanto estes se mostram preocupados e tomam medidas concretas para melhorar ainda mais a sua formação (Set for success, Sir Gareth Roberts´Review to the Treasury, Abril 2002) em Portugal 4. Não matem a criatividade dos jovens! avaliação e de integração que, sob a di- É no laboratório que a criatividade recção de diversos governos, foi sendo própria de um jovem e a sua fértil ima- acumulado e que aponta em direcções ginação são alimentadas e postas em diferentes da proposta. Melhoremos a pleno. Os professores são unânimes articulação a montante e a jusante (En- no relato do entusiamo e interesse sino Básico e Superior) no sentido de que os estudantes têm pelas discipli- tornar o ensino em Portugal mais coe- nas laboratoriais. Não poderemos cin- rente. Corrijamos alguns erros recentes gir-nos ao espartilho de uma aprendi- que já mostravam algum desprezo pela zagem formal numa disciplina, mas componente científica e experimental sem ela o aluno não dominará as téc- da formação dos nossos jovens. Compa- nicas básicas da experimentação remos a nossa realidade e necessidades científica tão importantes para os pro- com aquelas dos nossos parceiros mais jectos a que seja solicitado e para a directos e vejamos as suas preocupa- maioria das suas actividades profissio- ções. Ir atrasado pode permitir evitar al- nais futuras. guns erros alheios. Não sigamos o ca- alimentamos a ideia de que o estudo 5. Que dizer das lacunas inconcebíveis sério das disciplinas científicas é uma nos Cursos Tecnológicos? O melhor opção. Evitável! Opor-nos-emos por que se poderá dizer é que terão sido todos os meios a que a disciplina de pensados por alguém com pouco con- Física e Química seja opcional no 10º tacto com o que é um posto de traba- e 11º anos. lho tecnológico hoje e sem nenhuma 3. A extinção das Técnicas Laboratoriais é outro erro grave que será combatido. Quando já estavam consolidadas, propõe-se a sua extinção desperdiçando toda a experiência acumulada pelos professores e o elevado investimento que foi feito em equipamentos. Dir-nos-á que a parte laboratorial será incluída na disciplina de Química ou de Física e Química. Foi induzido em erro por algum assessor sem experiência da vida nas nossas escolas. ideia do que é a Química e o seu peso na criação de emprego. Que pensar da extinção do Curso Tecnológico de Química e Controlo Ambiental e da aprendizagens. Evitemos a todo o custo destruir alguma coisa pequenina que funciona pelo prazer de ver o barco, ainda que pintado de novo, afundar-se com toda a tripulação. Quem se terá esquecido dos proble- cordamos com muitas das preocupa- mas ambientais que têm de ser moni- ções que vem expressando desde que torizados e resolvidos pela Química? A tomou conta desta pasta governativa. ignorância e o esquecimento poderão Oferecemos a nossa disponibilidade ser desculpados mas não deixaremos para cooperar com o seu Ministério no passar estes erros. sentido de melhorar o que temos. Temos a experiência do terreno escolar deste argumento. Sob a ameaça de alunos estão mais preocupados em uma avaliação que será mais baseada optimizar a sua possibilidade de reali- na parte teórica, sob a pressão de zarem os seus sonhos de futuro do uma distribuição de tempo lectivo es- que dar largas à sua imaginação pi- casso, sob pressão de um custo ligei- sando terrenos inexplorados e sem ramente superior da parte laboratorial, compensação imediata evidente. poeirento de um passado remoto. avaliação e a elevação do nível das mos do essencial da sua proposta, con- para uma altura (o 12º ano) em que os tórios serão convertidos em museu da qualidade! Criemos incentivos para a com Ambiente mas sem Química? concorrem para confirmar a falácia simples e quase universal: Os labora- sas carências mais gritantes. É a hora Senhor Ministro, ainda que discorde- 6 Não desloquemos a área de projecto materiais consumíveis, a decisão será passadas sem ser capaz de ver as nos- criação de outro curso Tecnológico Todos os professores consultados quer em esforço do professor quer em minho cego copiando os erros de modas para evitar as medidas que coloquem o frágil sistema actual em maiores riscos. Reunimos saberes e experiências de todos os níveis do ensino e da profissão de Químico. Temos contactos internacionais com todos os países europeus, com as pessoas que pensam nestes problemas, que têm memória do que vai Ilustrámos acima de forma sintética al- sendo feito e do que deve ser evitado. guns dos erros mais gritantes da pro- Estamos disponíveis! posta apresentada. Não compreendemos como foi possível divulgar uma proposta que ignora todo o trabalho de Porto, 31/Jan/03