EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS PARA A LEI NACIONAL DE SEGURANÇA E
SAÚDE NO TRABALHO DOS SERVIDORES PÚBLICOS
A Constituição Federal, em especial nos seus arts. 1º, inc. III, art. 6º e 196 e ss.,
expressa o direito à saúde no âmbito dos direitos sociais. O art. 7º XXII garante aos trabalhadores
“redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança”,
aplicando o direito/dever de proteção à saúde na relação de trabalho celetista. E o art. 39, § 3º
estende-o aos servidores públicos, guardando coerência com os princípios constitucionais da
isonomia (art. 5º: “todos são iguais perante a lei … garantindo-se … a inviolabilidade do direito à
vida... à igualdade, à segurança...”) e da universalidade do direito à saúde (art. 196), nela
compreendida a do trabalho (art. 200, VIII).
As normas de saúde, higiene e segurança referidas no art. 7º, XXII, da Constituição
Federal são as Normas Regulamentadoras (conhecidas como NR's) do Ministério do Trabalho e
Emprego. Elas são as únicas existentes na legislação nacional que regulamentam, de forma
ampla, as condições de segurança e saúde nas diversas atividades profissionais.
É um equívoco pretender aplicá-las somente aos trabalhadores celetistas, quando se
sabe que os direitos sociais estabelecidos no art. 6º são dirigidos a todos os cidadãos,
indistintamente e independentemente do vínculo trabalhista. E, entre esses direitos estão a saúde
e o trabalho, que juntos fazem parte do direito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III) que
se estende às relações de trabalho, vez que é no ambiente de trabalho que o ser humano
produtivo passa a maior parte de sua existência quando acordado. ESTÃO TODOS
HARMONICAMENTE INTERLIGADOS NO TEXTO CONSTITUCIONAL E FIGURANDO ENTRE
OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS.
Direitos dessa importância consistem em prestações materiais que são de
aplicabilidade imediata. Requerem ações positivas do Estado, materializadas em políticas públicas
voltadas a efetivar garantias mínimas ao ser humano. Nessa esteira, os escólios de Paulo
Bonavides :
“ ... recentes Constituições, inclusive a do Brasil, formularam o preceito
da aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais.
De tal sorte que os direitos fundamentais da segunda geração tendem a
tornar-se tão justificáveis quanto os de primeira; pelo menos esta é a regra
que já não poderá ser descumprida ou ter sua eficácia recusada com
aquela facilidade de argumentação arrimada no caráter programático da
norma. Grifo nosso. (BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional,
p. 564).
Discorrendo sobre a proteção jurídica efetiva do direito à saúde do trabalhador,
SEBASTIÃO GERALDO DE OLIVEIRA, Juiz do Trabalho, Professor de Direito do Trabalho e
Mestre em Direito pela UFMG, considerando que tal direito encontra-se entre os direitos sociais,
destaca :
“ A preocupação quanto à efetividade das normas foi acolhida na
Constituição da República de 1988 que estabeleceu expressamente no art.
5º, § 1º : 'As normas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm
aplicação imediata'. … O conhecimento dos princípios fundamentais
permite adaptar leis antigas aos fatos novos, integrar e harmonizar as
diversas normas para a finalidade precípua da proteção, característica
essencial do Direito do Trabalho.” (OLIVEIRA, Sebastião Geraldo.
Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador, 3ª edição, LTr, págs. 51 e 53.)
Naturalmente, aplica-se no caso o princípio da proteção ao servidor público, que na
relação Estado/empregador-servidor/empregado é o hipossuficiente, exposto às mais arriscadas
condições de trabalho.
Nesse sentido, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL reforçou a obrigatoriedade de
Estados e Municípios aplicarem legislação Federal que dispuser sobre condições de realização do
trabalho, ainda que essa condição esteja relacionada à jornada de trabalho :
“3- O Ministério Público Federal, em parecer subscrito pela Subprocuradoria-Geral
da República Ela Wiecko V. De Castilho, opina pelo provimento do recurso [fls. 402405]. Transcrevo a ementa do aludido parecer:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Apelação Ação Ordinária. Servidor público
municipal. Prestação de redução da jornada de trabalho pra trinta horas
semanais, nos termos da lei 8.856/1994, referente aos profissionais
fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais. Alegação de violação aos arts. 5º,
caput, e II, art. 37, caput, e 22, I e XVI, da CF.
−
Cabe a União legislar privativamente sobre condições para o exercício
de profissões. Assim, a lei nº 8.856/1994 é norma geral aplicável a todos os
profissionais da área, tanto no setor privado quanto público.
- A recusa em conceder a redução de jornada pleiteada ofendeu o art. 22, XVI da
CF. Parecer pelo provimento do recurso.”
4- Por considerar irretocável o parecer da Procuradoria Geral da república, adoto-o
como razão de decidir.
Dou provimento ao recurso com esteio no disposto no artigo 557, § 1º-A, do CPC.
Declaro invertidos os ônus da sucumbência.” (RE 589870 / SP - SÃO PAULO, Rel.
Min. Eros Grau, Julgamento: 31/08/2009) GRIFEI.
Conforme explanado na justificativa da lavra do Deputado Federal Mauro Nazif, que
apresentou o PLC nº 152/2008 ao Plenário da Câmara dos Deputados, a proposição foi motivada
pela fadiga mental, física e emocional a que estão submetidos os assistentes sociais, verbis :
“... A maior exposição à fadiga, causada pelo exercício de determinadas profissões,
justifica, portanto, a fixação de jornadas reduzidas de trabalho.
Os assistentes sociais constituem, sem dúvida, uma categoria cujo trabalho leva
rapidamente à fadiga física, mental e emocional ...”
Em resumo, o STF afirmou que compete à União legislar sobre as condições para o
exercício das profissões, conforme prevê o art. 22, XVI da CF, sendo que, em razão disso,
qualquer legislação federal que regulamentar o exercício de determinada profissão, deve ser
acatada pelos Estados e Municípios, inclusive quando a condição para o exercício profissional for
uma jornada de trabalho reduzida, em face dos fatores de risco próprios da atividade.
Portanto, considerando que o presente anteprojeto de lei versa sobre as condições
seguras e saudáveis de trabalho para o exercício profissional do servidor público, aplica-se a ele o
transcrito precedente jurisprudencial do STF, evidenciando que não há qualquer afronta ao
princípio federativo ou à autonomia dos Estados.
Esse raciocínio fica ainda mais evidente se lembrarmos que as NR's do Ministério do
Trabalho e Emprego já eram aplicadas às Administrações Públicas de Estados e Municípios em
relação aos órgãos que possuam servidores celetistas, conforme disposto no primeiro item da NR1:
“As Normas Regulamentadoras – NR, relativas à segurança e medicina do trabalho, são de
observância obrigatória pelas empresas privadas e públicas e pelos órgãos públicos de
administração direta e indireta, bem como pelos órgãos dos poderes legislativo e
judiciário, que possuam empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho –
CLT.”
Com o anteprojeto será possível fazer cessar distorções e tratamentos desiguais para
situações idênticas de risco à segurança e à saúde de servidores em exercício de uma mesma
atividade profissional perante a administração pública, mas cujos vínculos empregatícios são
diferentes (um estatutário e ou outro celetista). Ou alguém irá negar a aplicabilidade da NR-10
aos eletricistas estatutários da Administração Pública ?
Vê-se, portanto, que são normas que regulam expressamente condições de trabalho
nas mais diversas profissões. E, conforme vimos, as condições para o exercício profissional são
estabelecidas por leis de competência privativa da União, aplicáveis em todo o território nacional,
inclusive nas Administrações Públicas.
Têm, assim, as Normas Regulamentadoras, natureza híbrida, pois são ao mesmo
tempo normas de saúde e segurança (no trabalho), como também são normas para o exercício
profissional, vez que, em última análise, são estabelecidas condições para o exercício seguro e
saudável das profissões, algumas de forma genérica e outras de forma específica, como os
profissionais da indústria da construção (NR-18), eletricistas (NR-10), profissionais de saúde (NR32), profissionais de teleatendimento (NR-17, Anexo II), dentre outros.
Conclui-se, portanto, que as Normas Regulamentadoras sobre Saúde e Segurança no
Trabalho são concretizadoras de direitos fundamentais da pessoa humana, o Direito à Saúde, ao
trabalho e a condições dignas de trabalho, razão pela qual a própria Constituição Federal, no art.
39, § 3º c/c 7º XXII, não distinguiu o tratamento entre celetistas e estatutários nesse particular,
determinando a aplicação aos servidores públicos da garantia de redução dos riscos inerentes ao
trabalho, por meio de normas, que, aliás, já estavam editadas desde 1978.
Por outro lado, reconhecendo a existência de características peculiares à
Administração Pública, o presente anteprojeto regulamenta esse direito de forma específica para
os servidores públicos, evidenciando quais são as normas imediatamente aplicáveis e fornecendo
os meios para as adaptações que se fizerem necessárias.
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exposição de motivos para a lei nacional de segurança e saúde no