PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Registro: 2011.0000226255 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 913655005.2007.8.26.0000, da Comarca de Porto Ferreira, em que é parte ESPÓLIO DE GILDÁSIO SOARES DE ANDRADE e Apelante RICARDO RAMOS sendo apelados BRUNA DAIANE BARBOSA DE ANDRADE, MARIA RISOLEIDE NUNES BARBOSA, MAICON ERIC BARBOSA DE ANDRADE, DERIK DOUGLAS BARBOSA DE ANDRADE e MINISTÉRIO PÚBLICO. ACORDAM, em 27ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GILBERTO LEME (Presidente) e MORAIS PUCCI. São Paulo, 4 de outubro de 2011. Berenice Marcondes Cesar RELATOR Assinatura Eletrônica 2 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Serviço de Processamento do 14º Grupo de Câmaras Direito Privado - 27ª e 28ª Câmaras Palácio da Justiça, s/nº - 4º andar - sala 403 - São Paulo - SP - CEP 01018-010 Apelação com Revisão - nº 91366550-05-2007.8.26.0100 Apelante/Autor: RICARDO RAMOS Apelados/Réus: BRUNA DAIANE BARBOSA DE ANDRADE, MAICON ERIC BARBOSA DE ANDRADE e DERIK DOUGLAS BARBOSA DE ANDRADE, representados por MARIA RISOLEIDE NUNES BARBOSA MMª. Juíza de Direito: Comarca de Porto Ferreira Fabiana Kumai 2ª Vara Cível Voto nº 4673 AÇÃO DECLARATÓRIA POSITIVA AÇÃO DE ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO MEDIDA CAUTELAR DE BUSCA E APREENSÃO bem pertencente a menores objeto de negócio jurídico firmado entre a genitora detentora do pátrio poder e o advogado constituído para prestação de serviços de advocacia um dos deveres do pátrio poder é a simples administração dos bens de menores que exclui a alienação ou dação de bens em pagamento, que implicam na diminuição do patrimônio - falta de autorização judicial negócio jurídico nulo. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Trata-se de “ação declaratória de Apelação - 9136550-05.2007.8.26.0000 - Voto nº 4673 dra - ldDnf 3 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Serviço de Processamento do 14º Grupo de Câmaras Direito Privado - 27ª e 28ª Câmaras Palácio da Justiça, s/nº - 4º andar - sala 403 - São Paulo - SP - CEP 01018-010 reconhecimento de relação jurídica cc. tutela antecipada” ajuizada por RICARDO RAMOS contra BRUNA DAIANE DE ANDRADE; MAICON ERIC BARBOSA DE ANDRADE; DERIK DOUGLAS BARBOSA DE ANDRADE; “ação civil de anulação de negócio jurídico” ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO” contra RICARDO RAMOS; MARIA RISOLEIDE NUNES BARBOSA; “medida cautelar de busca e apreensão” ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO contra RICARDO RAMOS, que foram julgadas em conjunto pela r. de sentença (fls. 182/190), cujo relatório adoto, a primeira ação foi julgada improcedente, e o Autor condenado ao pagamento das custas e despesas processuais mais honorários advocatícios arbitrados em R$ 500,00; a segunda ação foi julgada procedente determinando a anulação do negócio jurídico realizado com os Réus, condenando os Réus ao pagamento das custas e despesas processuais, sem arbitramento de honorários advocatícios; e a terceira ação foi julgada procedente tornando definitiva a liminar concedida, condenando o Réu ao pagamento das custas e despesas processuais, sem arbitramento de honorários advocatícios. Inconformado, RICARDO RAMOS, (autor e réu), interpôs recurso de apelação (fls. 196/206) argüindo em síntese que comprou o veículo após o término do inventário e pagou a importância de R$ 5.000,00. A ilegitimidade do Ministério Público após o término do inventário questionar direito de menor com representante legal. Requereu a procedência da ação por ele ajuizada e a reforma da r. sentença. Os Réus apresentaram contrarrazões (fls. 226/230; 232/234) no sentido de ser mantida a r. sentença. A d. Procurador de Justiça 246/250) manifestou-se pela manutenção da sentença. Apelação - 9136550-05.2007.8.26.0000 - Voto nº 4673 dra - ldDnf (fls. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Serviço de Processamento do 14º Grupo de Câmaras Direito Privado - 27ª e 28ª Câmaras Palácio da Justiça, s/nº - 4º andar - sala 403 - São Paulo - SP - CEP 01018-010 É o relatório. Trata-se de recurso de apelação contra r. sentença que julgou em conjunto três ações, dando pela improcedência da ação declaratória positiva; procedência da ação de anulação de negócio jurídico e medida cautelar preparatório de busca e apreensão. As questões do recurso resumem-se: na legitimidade ativa do Ministério Público no interesse de menores; na validade do negócio jurídico existente entre as partes. Os fatos limitam-se no seguinte: RICARDO RAMOS (autor/réu), advogado, foi contratado por MARIA RISOLEIDE NUNES BARBOSA (ré) genitora de BRUNA DAIANE BARBOSA DE ANDRADE; MAICON ERIC BARBOSA DE ANDRADE; DERIK DOUGLAS BARBOSA DE ANDRADE (réus), menores, impúberes, para requerer o arrolamento sumário dos bens deixados pelo falecimento de GILDÁSIO SOARES DE ANDRADE, genitor dos menores. O patrimônio do “de cujus“ era formado por duas motocicletas da marca Honda, uma CBR 450 SR, no valor de R$ 5.000,00 e a outra CG 125 Titan, no valor de R$ 2.500,00. Na partilha coube para cada herdeiro a fração de 1/3 de cada veículo, e a partilha foi homologada em 27.NOV. 2002. Encerrado o arrolamento, a genitora do menores, MARIA RISOLEIDE NUNES BARBOSA, representada pelo advogado RICARDO RAMOS requereu alvará para transferir a propriedade da motocicleta CBR 450 SR, para RICARDO RAMOS, que estava na posse do veículo desde 15.JUL.2002. A genitora dos menores, havia entregue a motocicleta ao advogado porque estaria dando muitas despesas ao Espólio. E, a motocicleta seria entregue a RICARDO RAMOS em pagamento de parte dos honorários advocatícios. A petição foi subscrita por RICARDO RAMOS, como advogado, e por MARIA RISOLEIDE e o pedido de alvará apensado aos autos de arrolamento. Ocorre que na tramitação do pedido de alvará, a genitora dos menores MARIA RISOLEIDE, prestou declarações perante à Promotora de Apelação - 9136550-05.2007.8.26.0000 - Voto nº 4673 dra - ldDnf 4 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Serviço de Processamento do 14º Grupo de Câmaras Direito Privado - 27ª e 28ª Câmaras Palácio da Justiça, s/nº - 4º andar - sala 403 - São Paulo - SP - CEP 01018-010 Justiça, quanto à não contratação do advogado que teria sido feita por sua sogra, e que a motocicleta havia sido entregue a RICARDO RAMOS por sua sogra. Alegando ser precária a sua situação financeira. A propriedade da motocicleta foi transferida para o advogado RICARDO RAMOS em 29.MAI.2003. O Promotor de Justiça com fundamento no art. 82, I, do CPC, requereu a anulação da transferência da propriedade do veículo, que foi anulada retornando o veículo ao cadastro anterior. O pedido de alvará foi indeferido. A Promotora de Justiça ajuizou ação contra RICARDO RAMOS e MARIA RISOLEIDE para anular o negócio jurídico (compra e venda da motocicleta) firmado entre os Réus. O advogado RICARDO RAMOS ajuizou ação contra os menores e sua genitora para declarar a existência da relação jurídica (-compra e venda-) existente entre as partes. Inicialmente deve ser examinada a legitimidade ativa do Ministério Público no interesse dos menores. O art. 81 do CPC, determina: “O Ministério Público exercerá o direito de ação nos casos previstos em lei, cabendolhe, no processo, os mesmos poderes e ônus das partes.” O dispositivo legal atribui capacidade postulatória ao membro do Ministério Público. Mesmo tratando-se de interesse privado, há também um interesse de ordem pública por ser questão de bens de menores, o que dá legitimação para agir ao Ministério Público (CF, art. 127). Há que se fazer um parêntese, o arrolamento de bens foi encerrado com a homologação da partilha, em 27.NOV.2002. O autor RICARDO RAMOS alega ter comprado o veículo pelo valor de R$ 5.000,00. E instruiu a petição inicial da ação que ajuizou com cópia de recibo de venda da motocicleta pelo valor de R$ 5.000,00, passado por MARIA RISOLEIDE, na qualidade de inventariante e representante dos filhos menores, datado de 05.JUL.2002; e também Apelação - 9136550-05.2007.8.26.0000 - Voto nº 4673 dra - ldDnf 5 6 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Serviço de Processamento do 14º Grupo de Câmaras Direito Privado - 27ª e 28ª Câmaras Palácio da Justiça, s/nº - 4º andar - sala 403 - São Paulo - SP - CEP 01018-010 juntou uma declaração dos menores e da genitora, no sentido de que a motocicleta estava onerando o patrimônio com despesas diárias, por isso, entregavam o veículo ao advogado, RICARDO RAMOS, e lhe davam a preferência de compra. Tal declaração está datada de 15.JUL.2002. Comparando-se o que foi alegado no pedido de alvará judicial, de que a motocicleta teria sido entregue a RICARDO RAMOS, em pagamento de parte dos honorários advocatícios pelos serviços prestados (-dação em pagamento-), com o. que foi alegado na ação declaratória pelo o autor RICARDO RAMOS de que teria a preferência na compra e a compra e venda, e que esta ocorreu após o encerramento do inventário, não ficou esclarecido o negócio jurídico efetivo existente entre as partes. E na instrução também nada foi provado. A única testemunha inquirida, Antonio José Biancardi (fls. 144), o tabelião que reconheceu a firma da assinatura de MARIA RISOLEIDE, no documento de transferência de propriedade do veículo para RICARDO RAMOS, confirmou apenas o reconhecimento da firma da vendedora MARIA RISOLEIDE. Apesar de que não restam dúvidas de ter existido entre as partes, uma relação contratual para a transferência da propriedade do veículo dos menores para o advogado RICARDO RAMOS. Para verificar a validade da transferência da propriedade do veículo ao advogado RICARDO RAMOS, é necessário examinar a que título a genitora detinha a posse e administração dos bens dos menores. Com o falecimento do genitor dos menores, o pátrio poder dos mesmos passou a ser exercido exclusivamente pela genitora MARIA RISOLEIDE (CC/1916, art. 382 sem correspondência legislativa no CC/2002), que assim passou a deter a Apelação - 9136550-05.2007.8.26.0000 - Voto nº 4673 dra - ldDnf 7 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Serviço de Processamento do 14º Grupo de Câmaras Direito Privado - 27ª e 28ª Câmaras Palácio da Justiça, s/nº - 4º andar - sala 403 - São Paulo - SP - CEP 01018-010 posse e administração dos bens. O pátrio poder tem como um dos deveres a administração dos bens dos filhos menores (CC/202, art. 1.689, II), mas tal administração corresponde apenas à conservação e exploração dos bens, ou seja, ao melhor aproveitamento do bem. E não é permitido ao detentor do pátrio poder a prática de atos que impliquem na diminuição do patrimônio do menor, sem autorização judicial. Bem Rodrigues: “Na administração explica o saudoso Silvio os pais devem zelar pela preservação do patrimônio de que cuidam, não podendo praticar atos que impliquem alienação direta ou indireta de bens, ou dos quais possa resultar uma diminuição patrimonial. A essa restrição se impõe uma ressalva. Podem os pais exorbitar dos atos de administração, em caso de necessidade evidente ou utilidade da prole, mediante autorização do juiz (..)” (em “Direito de Família”, vol. 6, Saraiva, 2002, pág. 406) A RISOLEIDE, genitora dos menores MARIA poderia negociar do bem de propriedade exclusiva dos menores, com o advogado RICARDO RAMOS, mas, para a validade da negociação era necessária a autorização judicial. Além de não ter sido requerida a autorização judicial para a negociação da motocicleta com o advogado RICARDO RAMOS, o pedido de alvará para transferência da propriedade do veículo foi indeferido. E, apesar de não ter ficado esclarecido se ocorreu dação em pagamento para saldar parte dos honorários advocatícios ou compra e venda da motocicleta, qualquer relação jurídica levaria à transferência da propriedade do veículo a RICARDO RAMOS, mas como o negócio jurídico foi praticado sem a autorização judicial é nulo. E em conseqüência da nulidade não produziu Apelação - 9136550-05.2007.8.26.0000 - Voto nº 4673 dra - ldDnf 8 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Serviço de Processamento do 14º Grupo de Câmaras Direito Privado - 27ª e 28ª Câmaras Palácio da Justiça, s/nº - 4º andar - sala 403 - São Paulo - SP - CEP 01018-010 efeitos jurídicos, com isso, a motocicleta deve permanecer no patrimônio dos menores, sendo de rigor a procedência tanto da medida cautelar de busca e apreensão com da ação principal de anulação da relação jurídica existente entre as partes ajuizada pelo Ministério Público. O i. Paulo Nader faz a seguinte citação de julgado do Superior Tribunal de Justiça em sua obra, que bem ilustra: “A transação por ser negócio jurídico bilateral, que implica concessões recíprocas, não constitui ato de mera administração a autorizar o pai a praticá-la em nome dos filhos menores independentemente de autorização judicial. Realizada nestes moldes, não pode a transação ser considerada válida, nem eficaz a quitação geral oferecida, ainda que pelo recebimento de direitos indenizatórios oriundos de ato ilícito“ (em “Curso de Direito Civil“, Direito de Família, Forense, vol. 5, pág. 423). Assim advogado, RICARDO RAMOS, não autor/apelante, assiste sendo razão correta ao a improcedência da ação declaratória positiva ajuizada, devendo ser mantida a r. sentença de primeiro grau. Diante do exposto, CONHEÇO e NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pelo Autor ficando mantida a r. sentença de primeiro grau. Berenice Marcondes Cesar Relatora Apelação - 9136550-05.2007.8.26.0000 - Voto nº 4673 dra - ldDnf