MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 41a PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE NATAL - RN ________________________________________________________________________ EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO TITULAR DA 9ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE NATAL, POR PRIVATIVIDADE O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, pela sua 41ª Promotoria de Justiça desta Comarca de Natal/RN, com atribuições de defesa do meio ambiente, com fundamento no art. 129, I, da CF, na legislação processual penal vigente e lastreado no Inquérito Civil 011/10, em anexo, vem oferecer a presente DENÚNCIA contra Marco Aurélio Martins de Almeida, CPF nº 050.207.35434, RG nº 104.135 SSP/RN, residente na Rua Sandoval Capistrano, 1477, Lagoa Nova, nesta Capital Ivanosca Rocha Miranda, CPF 331.357.624-91, RG 529998 SSP/RN, residente na Rua Monjolos, 4324, Conjunto Pirangi, Bairro Neópolis, nesta Capital Gilsimar Rodrigues Pereira, CPF 015.229.537.28, RG 2385826, SSP/RN, residente na Rua José Barreira Lima Verde, 92, Apt 102-A, Tirol, nesta Capital conforme os fatos e fundamentos adiante arrolados. 1. Consta do Inquérito Civil 011/10 1 (cópias em anexo), que os denunciados concederam licença ambiental, em desacordo com as normas ambientais aplicáveis, para o funcionamento de um incinerador de lixo hospitalar, cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público. 2. A licença ambiental aqui referida – ATO – Autorização para Teste de Operação – foi expedida pelo IDEMA para permitir o funcionamento de um incinerador de lixo, propriedade da empresa Limp Express, situado na Av. Saturnino da Rocha Laranjeira 1304 – Passagem de Areia – Parnamirim. A presente denúncia, porém, está sendo oferecida nessa Vara Criminal Especializada, em face de a licença ter sido expedida em Natal, onde foi praticada a conduta delituosa praticada pelos gestores do IDEMA, ora denunciados. 3. Como é do conhecimento desse ilustre Juízo, existem vários tipos de licença ambiental, dentre elas, a chamada ATO, estabelecida no art. 46, § 3º da Lei Complementar Estadual 272/04 – Lei da Política Estadual do Meio Ambiente 2, verbis: § 3º - Poderá ser concedida Autorização para Teste de Operação, previamente à concessão da LO e com prazo de validade não superior a 180 (cento e oitenta) dias, quando necessária para avaliar a eficiência das condições, restrições e medidas de controle ambiental impostas à atividade ou ao empreendimento. (grifos) 4. Portanto, pela legislação ambiental do Estado, é necessário que o empreendedor interessado tenha primeiramente uma LP – Licença Prévia que, para ser concedida, devem ser avaliadas as condições ambientais do empreendimento, através dos estudos de impacto ambiental cabíveis, e, em seguida, a LI – Licença de Instalação, quando será autorizada a instalação das obras e equipamentos necessários ao funcionamento da empresa interessada. 5. Após obter a LI, e antes de obter a LO – Licença de Operação, o empreendedor, para o caso de equipamentos que precisam ser testados e calibrados, como no caso concreto, deve pedir a ATO e assim realizar os testes de queima. Pela lei, 1. Atuação conjunta entre a Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Natal e Parnamirim. Estão sendo anexadas aqui apenas cópias de alguns termos, pois as investigações para avaliar os danos ambientais, no plano cível, ainda não foram concluídas. 2. Com as alterações da Lei Complementar Estadual 336/06. portanto, é um pré-requisito para a empresa poder funcionar regularmente. 6. Por outro lado, para a concessão da ATO o Órgão Ambiental competente deve obedecer às regras fixadas na Resolução 316/02 CONAMA, que trata procedimentos e critérios para o funcionamento de sistemas de tratamento térmico de resíduos. Nessa norma, é estabelecido que, antes do teste de queima, é necessário que a empresa interessada tenha obtido, verbis: Resolução 316/02 ….......................................................................................................... “Art. 36. São condições prévias à realização do Teste de Queima; I - ter um Plano de Teste de Queima aprovado pelo órgão ambiental competente; II - não apresentar risco de qualquer natureza à saúde pública e ao meio ambiente; III - ter instalados, calibrados e em condição de funcionamento, pelo menos, os seguintes monitores contínuos e seus registradores: monóxido de carbono (CO), oxigênio (O2), temperatura e pressão do sistema forno, taxa de alimentação do resíduo e parâmetros operacionais dos ECPs; IV - ter instalado e em condição de funcionamento um sistema de intertravamento, para interromper automaticamente a alimentação de resíduos (...)” (grifos) 7. As razões da cautela estabelecida nesse procedimento são perfeitamente compreensíveis, pois os incineradores são equipamentos que trabalham a temperaturas próximas a 1.000 Cº e são altamente poluidores. 8. Por isso é que, para o funcionamento desses equipamentos a empresa deve ter previamente um técnico responsável, conforme prevê a mesma norma acima referida, verbis: Resolução 316/02 ….......................................................................................................... “Art. 28. Todo sistema de tratamento térmico de resíduos deverá possuir um responsável técnico para o seu funcionamento, devidamente habilitado para este fim, com registro responsabilidade técnica no órgão profissional competente”. de (grifos) 9. A despeito dessas normas técnicas, o IDEMA, através dos denunciados, autorizaram o teste de queima, sem observar as cautelas legais, inserindo todos esses requisitos técnicos, sob a forma de condicionantes, com se observa na ATO de fls. 082. IDEMA Autorização de Teste de Operação ….......................................................................................................... CONDICIONANTES ….......................................................................................................... “3. O empreendedor, no prazo de 30 (trinta) dias a identificação do técnico responsável (…) 4. O empreendedor deverá no prazo de 90 (noventa) dias apresentar os seguintes documentos, conforme preconizado pela Resolução CONAMA 316 DE 2002, art. 26, Inciso I, III, IV; • Projeto básico • Estudo da análise de risco • Plano do teste de queima • Plano de contingência • Plano de emergência” (grifos) Vê-se claramente, portanto, que, com essa manobra criminosa, o que era prévio por força da norma, foi transformada pelos denunciados em obrigação futura. 10. Com essa manobra criminosa, os denunciados permitiram que a empresa pudesse fazer o teste de queima, sem os requisitos técnicos essenciais de segurança e de prevenção ao meio ambiente. 11. Mais ainda, com essa manobra criminosa, os denunciados permitiram que a empresa passasse a funcionar normalmente, como se tivesse as licenças ambientais definitivas, mesmo que com uma simples autorização para teste, como se pode ver a fls. e seguintes, nos quais o Hospital do Coração, Unimed, Promater e Gastropropte informam estarem fazendo regularmente o tratamento de seu resíduo hospitalar com a empresa Limp Express. Tal fato, pode ser ainda comprovado pelo relatório da vistoria feita à sede da empresa pelo IDEMA em 31 de agosto de 2010, no qual aponta que a empresa está funcionando normalmente (fls. 140). 12. Ao serem ouvidos nesta Promotoria de Justiça, o denunciado Marcos Aurélio, então Diretor Geral do IDEMA, afirma que assinou o documento confiando em sua assessoria técnica e que não foi exigido do empreendedor uma licença prévia porque no local já existia uma outra indústria, porém, de laticínios. De igual modo, a denunciada Ivanosca afirma que não atentou para o problema, embora tenha dito que tem 22 anos de experiência no IDEMA. 13. Tais argumentos são absolutamente injustificáveis. O fato de existir anteriormente no local uma indústria de laticínios não afasta a necessidade de se licenciar um novo empreendimento ali – ainda que seja outra indústria de laticínios. Além disso, com essas declarações o denunciado Marco Aurélio demonstrou que tinha conhecimento dos fatos, não podendo, portanto, alegar que confiou em sua assessoria. Por outro lado, pela simples leitura dos termos da ATO pode-se ver ainda que os requisitos mínimos de segurança para o teste de queima, por exemplo, que deveria ter previamente um plano de teste que deveria ser “prévio”, foram relegados pelo denunciado a segundo plano, a partir de quando permitiu que tal exigência fosse cumprida posteriormente como “condicionantes”. Tal procedimento é claramente irregular, mesmo perceptível a um leigo, pois, além dos erros graves apontados acima, para ser uma cláusula “condicionante” é preciso que haja um ato posterior, o que, na verdade não existe, pois a ATO se encerra nela mesma3. Além disso, pode-se ainda inferir o dolo da conduta do denunciado em conceder uma autorização para a realização de um teste por um período de 6 meses – máximo permitido pela norma – quando claramente bastaria apenas alguns dias para esse fim. 14. Igualmente pode-se aplicar todos esses argumentos do primeiro denunciado 3 . Como, por exemplo, se existisse a ATO 1 e ATO 2, que uma condicionante seria exigida na primeira para a obtenção da segunda. à denunciada Ivanosca, Diretora Técnica do IDEMA, diretamente subordinada a ele e com mais de 22 anos de experiência no órgão, que certamente conhecia todos esses fatos e se tornou co-autora do crime praticado. 15. Por tudo isso, mostra-se claro o dolo como elemento subjetivo da conduta dos dois primeiros denunciados. 16. Por último, pode-se facilmente descrever a conduta delituosa do denunciado Gilsimar, consultor técnico do IDEMA, ao ver do Ministério Público o autor principal do crime, por ter concorrido de qualquer modo para a sua consumação, uma vez que atuou no processo de licenciamento como o técnico responsável pela sua análise, dando seu parecer favorável à concessão da ATO, mesmo sabendo que o empreendedor não tinha apresentado os documentos cabíveis, já que transcreveu em seu parecer a norma que exige tal procedimento. Além disso, em seu depoimento prestado a esta Promotoria de Justiça, o denunciado Gilsimar afirmou que foi ao local onde a empresa está instalada pelo menos 15 vezes, demonstrando assim um comportamento bastante incomum à sua função de consultor do IDEMA, porque para colher dados geográficos e do equipamento – dados fornecidos pelo próprio empreendedor, bastava ter ido ao local apenas uma vez. Isto porque no parecer proferido pelo denunciado a fls. 034, em que ele recomenda a concessão da ATO, são apenas citados dados técnicos do incinerador e sua localização geográfica da empresa, além de serem transcritos inúmeros dispositivos normativos da Resolução 316/02 (que, embora citados, não foram considerados no parecer concessivo). Nada que justificasse, portanto, ir ao local 15 vezes. Além disso, em seu parecer, o denunciado Gilsimar realmente afirma que foi ao local do incinerador uma única vez, em janeiro de 2009 (fls. 035), portanto, 11 meses antes de o empreendedor ter protocolado o pedido para a expedição da ATO, em 29 de dezembro de 2009. Por tudo isso, pode-se concluir que o comportamento do denunciado Gilsimar era, na verdade, de consultor da empresa e não do IDEMA, demonstrando assim o dolo de sua conduta em facilitar a concessão da licença ao empreendedor. 17. Assim, estão os denunciados Marco Aurélio Martins de Almeida e Ivanosca Rocha Miranda incursos nas sanções cominadas no art. 67, caput, da Lei 9.605/98 e o denunciado Gilsimar Rodrigues Pereira nas penas do art. 67, caput, da Lei 9.605/98 c/c art. 29, caput do CP, para o qual requer esta Promotoria de Justiça o recebimento da presente denúncia e o prosseguimento do feito criminal, na forma dos art. 396 e seguintes do CPP, com a oitiva das testemunhas e declarantes adiante arroladas, para que ao final seja julgado procedente e os denunciados condenados pelo crime praticado. Pede deferimento, Natal/RN, 6 de setembro 2010 João Batista Machado Barbosa Promotor de Justiça ROL DE TESTEMUNHAS: 1) MARIA DAS GRAÇAS AZEVEDO, Servidora do IDEMA, situado na Avenida Nascimento de Castro 2127 – Lagoa Nova – Natal/RN 2) HERMÍNIO PEREIRA DE BRITO, Servidor do IDEMA, situado na Avenida Nascimento de Castro 2127 – Lagoa Nova – Natal/RN 3) REGINA COELI DUARTE DE OLIVEIRA E SILVA, Servidora do IDEMA, situado na Avenida Nascimento de Castro 2127 – Lagoa Nova – Natal/RN 4) ALVARO DE MEDEIROS E SILVA, Servidor do IDEMA, situado na Avenida Nascimento de Castro 2127 – Lagoa Nova – Natal/RN 5) NIVALDO NICERIO GOMES, Servidor do IDEMA, situado na Avenida Nascimento de Castro 2127 – Lagoa Nova – Natal/RN Natal/RN, 6 de setembro de 2010 João Batista Machado Barbosa Promotor de Justiça PEDIDO DE DILIGÊNCIAS: Requer o Ministério Público a juntada aos autos de certidão atualizada de antecedentes criminais dos denunciados para avaliar a possibilidade ou não de se propor a suspensão do processo, na forma do art. 89 da Lei 9.099/90. Pede deferimento, Natal/RN, 6 de setembro de 2010 João Batista Machado Barbosa Promotor de Justiça