UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO SANDRA APARECIDA FRAGA DA SILVA APRENDIZAGENS DE PROFESSORAS NUM GRUPO DE ESTUDOS SOBRE MATEMÁTICA NAS SÉRIES INICIAIS VITÓRIA 2009 SANDRA APARECIDA FRAGA DA SILVA APRENDIZAGENS DE PROFESSORAS NUM GRUPO DE ESTUDOS SOBRE MATEMÁTICA NAS SÉRIES INICIAIS Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo, como requisito para obtenção do título de doutora em Educação na Linha de Educação e Linguagens (Linguagem Matemática). Orientação: Profª. Drª. Ligia Arantes Sad. Co-orientação: Profª. Drª. Vânia Maria Pereira dos Santos-Wagner. VITÓRIA 2009 Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP) (Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil) Silva, Sandra Aparecida Fraga da, 1976S586a Aprendizagens de professoras num grupo de estudos sobre matemática nas séries iniciais / Sandra Aparecida Fraga da Silva. – 2009. 364 f. : il. Orientadora: Lígia Arantes Sad. Co-Orientadora: Vânia Maria Pereira dos Santos-Wagner. Tese (doutorado) – Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de Educação. 1. Matemática (Ensino fundamental). 2. Professores Formação. 3. Estudos em grupo. 4. Conhecimento e aprendizagem. 5. Metacognição. 6. Emoções e cognição. I. Sad, Lígia Arantes. II. Santos-Wagner, Vânia Maria Pereira dos. III. Universidade Federal do Espírito Santo. Centro de Educação. IV. Título. CDU: 37 A minha família: a meu Eterno amor Jonas; as minhas bênçãos de Deus: Matheus e Maiara; e a meus pais: Ruth e Adenir. Às professoras participantes do grupo. Agradecimentos Eis o caminho... Era preciso caminhar... Embora soubéssemos que, em muitos momentos, o caminhar dependia de nós, pudemos partilhá-lo com outras pessoas, envolvidas emocional e institucionalmente. A todas elas o nosso agradecimento. Em todos os momentos, agradecemos, primeiramente, a Deus pela vida concedida e cuidada a cada dia ensolarado ou nublado, mas cedido para caminhar. O caminho foi longo, minha gratidão à minha família. Em especial, aos meus pais por me apoiarem durante todo o caminhar e a vislumbrar cada passo, tendo paciência e confiança de que caminhar juntos vale à pena. Também agradeço à minha irmã Simone, pelo companheirismo. Durante o caminho, conhecemos outros companheiros, as professoras Beatriz e Susana, a elas agradeço pela intensa participação e confiança que colocaram em nós, ao trilhar conosco este caminho, não se importando com as pedras e obstáculos, mas apreciando e vislumbrando flores e frutos. E por todos os seus alunos, que dividiram grandes momentos, ensinando-nos a visualizar novas oportunidades. E às escolas que nos permitiram interagir com essas professoras e alunos. Agradecemos às professoras Vânia e Lucia, por acreditarem que peregrinar conosco era produtivo. A Vânia, como participante e co-orientadora, por acreditar que, caminhar junto com professores, poderia trazer bons frutos. A Lucia, por confiar que poderia aprender e compartilhar saberes. Às minhas orientadoras Ligia e Vânia, por contribuírem na condução e produção deste estudo, mostrando-me caminhos possíveis. Quando caminhamos, paralelamente, algumas pessoas vivenciam nossas vitórias e derrotas, mesmo que de camarote, essas são chamados amigos. Agradeço-lhes pelo companheirismo ao longo deste processo. Não caminhamos sozinhos, somos acompanhados por pessoas que entram na nossa vida por acaso, mas permanecem por outras razões. Agradeço aos amigos e colegas, do mestrado e doutorado do PPGE/ UFES, pelas aprendizagens partilhadas. Em especial, aos amigos do grupo de estudos mais amplo, no qual vivenciamos, paralelamente à nossa investigação. Especialmente, a convivência e a partilha de conhecimentos com Laudiceia, Leandra, Welington, Jailson, Rose, Messenas e Isabel. Temos outros caminhos, nos quais colocamos em prática algumas coisas aprendidas em grupo. Agradecemos à escola e à faculdade na qual trabalhamos, inclusive aos profissionais que atuam nesses espaços. Também agradecemos aos nossos alunos e ex-alunos que nos ensinaram muito. Às professoras Adair, Jane e Denise por todas as contribuições, dedicação ao analisar e comentar nosso trabalho. Cada qual com seu olhar, enriquecendo nosso trabalho com as diferentes visões. À professora Circe pelas contribuições, ensinamentos e motivações a reflexões. E à professora Maria Nader, pelas aprendizagens que foram além das correções. Tenham certeza, aprendi muitas coisas que ficarão para sempre. Em especial, pelas pessoas que ficaram ao nosso lado, desde o início, compartilhando todos os momentos. Alegrando-se com nossas vitórias, ajudando-nos e amparando-nos nas nossas derrotas, tendo paciência e compreensão nas horas de recolhimento e, de certa forma, abandono por causa dos estudos. Essas pessoas são: meu esposo Jonas, grande companheiro e amor de minha vida. E aos meus presentes de Deus: meu filho Matheus, um adolescente abençoado e cheio de contribuições, de todos os tipos; e a minha princesa, que chegou durante a reta final deste caminhar, minha pequena Maiara, nascida em outubro de 2009. Olhando o caminhar, posso vislumbrar pedaços de cada um de vocês, carrego comigo um pouco dos outros que se fizeram presentes durante esse percurso, sou aquilo que construímos juntos. Por isso, muito obrigada. Debaixo do céu há momento pra tudo, e tempo certo para cada coisa: Tempo para nascer e tempo para morrer. Tempo para plantar e tempo para arrancar a planta. Tempo para matar e tempo para curar. Tempo para destruir e tempo para construir. Tempo para chorar e tempo para rir. Tempo para gemer e tempo para bailar. Tempo para atirar pedras e tempo para recolher pedras. Tempo para abraçar e tempo para se separar. Tempo para procurar e tempo para perder. Tempo para guardar e tempo para jogar fora. Tempo para rasgar e tempo para costurar. Tempo para calar e tempo para falar. Tempo para amar e tempo para odiar. Tempo para a guerra e tempo para a paz. Ecl 3, 1 - 8 LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Esquema para a definição do foco da pesquisa Figura 2 – Esquema das perguntas da pesquisa Figura 3 – Esquema das inter-relações entre perguntas e objetivos da pesquisa Figura 4 - Diagrama de temas Figura 5: Esquema 1 - Elaborado em 01/10/08 e reestruturado em 22/01/09. Figura 6: Esquema 2 – elaborado em 09/12/08 Figura 7 – Monstro da matemática desenhado por aluno de Beatriz em 2007 Figura 8 – Retirado de uma folha xerocada trabalhada pela professora em 16/05/08 Figura 9 – Exemplo de questão da prova de Beatriz que envolve escrita – aluno A Figura 10 – Questão da prova sobre elaboração de problemas – resposta aluno C Figura 11 – Parte da prova da professora Beatriz sobre figuras geométricas Figura 12 – Desenhos de figuras com três lados que não são triângulos Figura 13 – Desenhos de figuras com três segmentos de retas sem ser triângulos Figura 14 – Desenhos de triângulos e não triângulos Figura 15 – Desenhos de triângulos que não possuem os segmentos do mesmo tamanho. Figura 16 – Desenho de polígono de quatro lados que não é quadrado. Figura 17 – Desenho de polígono com quatro lados iguais e que não representa quadrado. Figura 18 – Desenho de polígono com quatro lados iguais e segmentos opostos paralelos. Figura 19 – Desenho de quadrados Figura 20 – Geoplano com construções da professora Susana Figura 21 – Quadro com desenhos e definição de polígono Figura 22 – Alunos fazendo as planificações em 03/set/07 Figura 24 – Planificações dos alunos da professora Susana de paralelepípedos Figura 25 - Planificações dos alunos da professora Susana de paralelepípedos e cubo Figura 26 - Planificação de aluno da professora Susana de um cilindro Figura 27 – Construções de pirâmides com canudinhos Figura 29 – Atividade em grupo em forma de jogo sobre geometria Figura 30 – Alunos tentando utilizar diferentes sentidos para descobrir forma geométrica Figura 31 – Oficina sobre sólidos geométricos – turma da professora Susana 2008 Figura 33 – Caixa para representar a vista e alunos desenhando Figura 34 – Professora Vânia conversando com o aluno sobre seu campo de visão. Figura 35 – Alunos explicando o que desenharam a partir da visualização da caixa. Figura 36 – Pirâmides construídas pelos alunos e delimitação de outros sólidos com pirâmides. Figura 37 – Alunos realizando registros escritos sobre o que trabalharam na aula do dia 11/04/08. Figura 38 – Registro escrito do grupo A de alunos sobre a aula de 11/04/08 Figura 39 - Registro escrito do grupo B de alunos sobre a aula de 11/04/08 Figura 40 - Registro escrito do grupo C de alunos sobre a aula de 11/04/08 Figura 41 - Registro escrito do grupo D de alunos sobre a aula de 11/04/08 Figura 42 - Registro escrito do grupo E de alunos sobre a aula de 11/04/08 Figura 43 – Quadro com desenhos e definição de prismas Figura 44 – Alunos realizando registros em seus cadernos Figura 45 – Trabalho sobre diagonais: abordagem profª Vânia e caderno com anotações Figura 47 – Cartazes de boas vindas, respectivamente, das salas de Beatriz e Susana 25 27 29 97 101 102 147 183 193 194 216 217 218 218 218 219 219 220 220 222 227 230 230 231 232 239 242 243 244 246 247 247 249 250 251 251 252 252 253 255 256 257 283 LISTA DE QUADROS Quadro 1- Exemplos de adição e de subtração relacionados à ideia de juntar 71 Quadro 2 - Exemplos de adição e de subtração relacionados à ideia de transformar 71 Quadro 3 - Exemplos de adição e de subtração relacionados à ideia de igualização 71 Quadro 4 - Exemplos de adição e de subtração relacionados à ideia de comparação 72 Quadro 5 - Exemplos de adição e de subtração com mais de uma ideia de transformação 72 Quadro 6 – Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com ideia de grupos equivalentes 75 Quadro 7 - Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com a ideia de multiplicação comparativa 75 Quadro 8 – Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com a ideia de proporção 75 Quadro 9 - Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com a ideia representação retangular 76 Quadro 10 - Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com a ideia de combinatória 76 Quadro 11: Perguntas, objetivos e instrumentos: elaborados em 18/09/08 e atualizado em 26/09/08 100 Quadro 12 – Metáfora comparando matemática com um animal para a professora (18/set/06) 141 Quadro 13 - Metáfora comparando matemática com um animal para os alunos (18/set/06) 143 Quadro 14 – Metáforas comparando matemática com um animal e com o que nunca seria. (18/dez/06) 144 Quadro 15 – Respostas da metáfora entre ensino de matemática e outras profissões 152 Quadro 16 – Respostas das professoras sobre a questão: Aprender matemática é como... porque... 157 Quadro 17 – Texto coletivo escrito pelos alunos de Beatriz sobre pirâmides 253 Quadro 18 – Poesia sobre geometria escrita pelos alunos de Beatriz na 3ª série em 2007. 262 Quadro 19 – Detalhamento dos encontros do grupo 349 Quadro 20: Apresentação das aulas vivenciadas com a professora Beatriz 359 Quadro 21: Apresentação das aulas vivenciadas com a professora Susana 362 LISTA DE TABELAS Tabela 1- Número de encontros realizados pelo grupo Tabela 2: Número de aulas vivenciadas com as professora Susana e Beatriz Tabela 3 – Quadro resumo da participação de cada professora no grupo de estudos 133 134 135 SUMÁRIO CAPÍTULO I: 16 1 INTRODUÇÃO: O ESTUDO E SEUS APONTAMENTOS 16 1.1 Mapeando e traçando percursos 18 1.2 Problemática da pesquisa 22 1.3 Apresentação da estrutura do trabalho 30 CAPÍTULO II: 32 2 A TEORIA: JANELAS QUE SE ABREM 32 2.1 Janelas entreabertas: aprendizagem docente 33 2.1.1 Ensino e aprendizagem 34 2.1.2 A reflexão crítica abrindo horizontes para aprendizagens de professores 42 2.1.3 Tomada de consciência e metacognição: janelas para dentro de si mesmo 47 2.1.4 Conhecimentos de professores: diferentes janelas 50 2.2 Ensino, aprendizagem e avaliação de conteúdos matemát icos: construindo possibilidades 2.2.1 Geometria: janela descoberta 53 54 2.2.2 Resolução de problemas envolvendo as quatro oper ações: olhando diferentemente por essa janela 60 2.2.3 76 Avaliação de conteúdos matemáticos 2.3 Formação de professores que ensinam matemática: janelas fechadas ou abertas? 79 2.4 Aspectos afetivos e aprendizagem docente 85 CAPÍTULO III: 91 3 AS PORTAS SE ABREM É PRECISO CAMINHAR: TRAJETÓRIAS E PERCURSOS METODOLÓGICOS 91 3.1 Idas e vindas para construção do problema 3.2 Escolhas metodológicas 95 103 CAPÍTULO IV: 108 4 ESCOLHENDO E PERCORRENDO O CAMINHO 108 4.1 Panorâmica do caminhar do grupo: contexto, constituição e consolidação 108 4.2 O grupo 115 4.2.1 Professora Beatriz 116 4.2.2 Professora Susana 119 4.2.3 Professora Sandra 120 4.2.4 Professora Lucia 122 4.2.5 Professora Vânia 124 4.3 Procedimentos para coleta de dados 125 4.4 Identificando e analisando o caminhar: organização e análise dos dados 130 CAPÍTULO V: 138 5 SEMENTES, FLORES E FRUTOS IDENTIFICADOS E COLHIDOS NA CAMINHADA 138 5.1 Sementes de aprendizagens em relação aos aspectos afetivos 139 5.2 Frutos de aprendizagens de conceitos matemáticos aliados às práticas pedagógicas 169 5.2.1 Resolução de problemas 171 5.2.2 Geometria 201 5.3 Flores de aprendizagens em grupo de estudos 263 5.3.1 Aprendizagem coletiva 5.3.2 Aprendizagens evidenciadas por participantes a partir da experiência coletiva no grupo 284 CAPÍTULO VI: 264 297 6 FAZENDO UM BALANÇO DO CAMINHO PERCORRIDO: CONSIDERAÇÕES E IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS 297 6.1 Algumas aprendizagens decorrentes do caminhar 297 6.2 Refletindo sobre o caminho percorrido 319 6.3 Novas janelas, novos caminhos: desdobramentos da pesquisa 323 REFERÊNCIAS 327 ANEXOS 342 RESUMO Esta tese de doutorado foi um estudo longitudinal qualitativo, de dois anos e quatro meses, que analisou aprendizagens de professoras em um grupo de estudos sobre matemática nas séries iniciais. Entre os anos de 2006 e 2008, constituímos uma formação continuada em contexto com um grupo de estudos com as professoras Susana e Beatriz, ambas regentes de séries iniciais na rede municipal de Vitória. Além dessas, mais três professoras de matemática participaram do grupo, incluindo a pesquisadora. Realizamos uma investigação do tipo estudo de casos com perspectiva humanística. Investigamos as seguintes questões: Que aprendizagens das professoras participantes se destacam num grupo de estudos e em suas práticas pedagógicas? Que relações entre aprendizagens de professoras e alguns aspectos afetivos são evidenciadas num grupo de estudos de matemática? Como se percebe a influência do grupo de estudos de matemática nas aprendizagens das professoras participantes e em suas práticas pedagógicas? Os dados foram coletados nos encontros semanais do grupo e nas aulas observadas e/ou participadas das professoras. Dados obtidos nos incidentes críticos ou significativos da investigação permitiram desvelar aprendizagens das professoras Susana, Beatriz e da pesquisadora. Obtivemos evidências de algumas aprendizagens sobre: conhecimentos dos conteúdos matemáticos, em especial o de geometria e de resolução de problemas envolvendo as quatro operações; conhecimento pedagógico, em especial o de contrato didático, estabelecido e executado em aulas; conhecimento pedagógico matemático, ações diferenciadas utilizando escrita nas aulas de matemática e oficinas com materiais manipulativos; conhecimento do currículo matemático, organização e valorização de diferentes conteúdos; e conhecimento dos alunos, enquanto aprendizes de matemática. Notamos como um trabalho diferenciado de formação continuada em contexto, num grupo no qual atuamos como amigos críticos uns dos outros, influenciou e envolveu as integrantes. Nesse grupo, as professoras se respeitavam, ouviam e eram ouvidas em suas vitórias e anseios, opinavam, lançavam propostas e contribuíam para a construção dos diferentes conhecimentos. Esse comportamento influenciou as aprendizagens e as atitudes das professoras em relação à matemática, resultando em ressonâncias em suas práticas em sala de aula. A reflexão crítica contribuiu para que cada professora desenvolvesse sua própria metacognição, reconhecendo-se de forma consciente, enquanto aprendiz e professora de matemática. Também concluímos que é importante analisar crenças, concepções e emoções das professoras na influência de suas atitudes em relação à matemática, ao seu ensino, à aprendizagem e à avaliação. Palavras-chave: Aprendizagens; grupo de estudos; matemática das séries iniciais; formação continuada em contexto. ABSTRAT This doctoral thesis was a longitudinal qualitative study, of two year and four months, which analyzed teachers‟ learning in a study group about first grades mathematics. Between the years 2006 and 2008, we developed an inservice teacher education context in a study group with the teachers Susana and Beatriz, both practicing teachers of the public school system of Vitoria. In addition to them, other three mathematics teachers participated in the group, including the researcher. We realized a case study investigation with a humanistic perspective. We investigated the following questions: Which learning of the participant teachers is highlighted in a study group and in their pedagogical practices? What relations between teachers‟ learning and some affective aspects are evidenced in a mathematics study group? How do we perceive the influence of the mathematics study group in the participating teachers‟ learning and in their pedagogical practices? The data was collected in the weekly meetings and in the observed and/or participated lessons of the teachers. Data obtained in the critical or significant incidents of the inquiry led us to disclose learning of the teachers Susana, Beatriz and the researcher. We got evidences of some learning related to: mathematics content knowledge, in particular this of geometry and problem solving concerning the four basic operations; pedagogical knowledge, in special this of didactic contract, which is established and implemented in lessons; pedagogical mathematics knowledge, involving differentiated actions using writing in mathematics lessons and workshop sessions with manipulative materials; curriculum mathematics knowledge, such as organization and valuing of different topics; and students‟ knowledge, while mathematics learners. We noticed that a different work of inservice teacher education in context, in the group that we acted as critical friends from each other, influenced and involved all its members. In this group, the teachers respected each other, listened and were heard by each other in their successes and struggles; gave opinion, offered proposals and contributed to the construction of each other‟s different knowledge. This behaviour influenced the teachers‟ learning and attitudes towards mathematics, resonating in their practices in classroom. This critical reflexion contributed that each teacher developed his/her metacognition, acknowledging him/herself in a conscious way as a mathematics learner and teacher. We also concluded that it is important to analyze beliefs, conceptions and emotions in the influence of their attitudes concerning mathematics, its teaching, learning and assessment. Keywords: learning; study group; first grades mathematics; inservice teacher education in context. RESUMÉE Cette thèse de doctorat est une étude longitudinale qualitative de deux ans et quatre mois, qui a analysé les apprentissages des enseignantes dans un groupe d‟études en mathématiques dans les premières années de scolarisation. Entre 2006 et 2008, nous avons constitué un groupe d‟études pour la formation continue en contexte avec deux enseignantes du système municipal d‟éducation de Vitória (Susana et Beatriz). Trois autres professeurs de mathématiques les ont rejointes dans ce groupe, y compris l‟autrice de cette étude. Nous avons réalisé une investigation du type étude de cas sous une perspective humaniste. Nous avons enquêté sur les questions suivantes : Quels sont les apprentissages des enseignantes participantes les plus remarquables dans un groupe d‟études et dans leurs pratiques pédagogiques ? Quelles relations entre les apprentissages des enseignantes et certains aspects affectifs sont mises en évidence dans un groupe d‟études en mathématiques ? Comment perçoit-on l‟influence de ce groupe d‟études sur les apprentissages des enseignantes et sur leurs pratiques pédagogiques ? Les données ont été collectées lors des rencontres hebdomadaires du groupe et lors des cours auxquels les enseignantes concernées ont assisté ou participé. Des données obtenues lors des incidents critiques ou significatifs de l‟investigation ont permis de dévoiler les apprentissages de Susana et Beatriz, ainsi que ceux de l‟autrice de cette étude. Nous avons obtenu des évidences de certains apprentissages sur : les connaissances en mathématiques, notamment en géométrie et en résolution de problèmes concernant les quatre opérations ; les connaissances pédagogiques, notamment en contrat d‟apprentissage établi et mis en œuvre en classe ; la connaissance pédagogico-mathématique, les actions différenciées comportant l‟usage de l‟écrit dans les cours de mathématiques et les ateliers avec du matériel manipulatif ; la connaissance des programmes de mathématiques, l‟organisation et la valorisation de différents contenus ; et la connaissance des élèves en tant qu‟apprenants de mathématiques. Nous avons remarqué comment un travail différencié de formation continue en contexte, dans un groupe dans lequel nous avons été des « amis-critiques » les unes des autres, a influencé et engagé les intégrantes. Dans ce groupe, les enseignantes se respectaient, écoutaient les victoires et les aspirations des autres et faisaient écouter les leurs, donnaient leurs avis, lançaient des propositions et contribuaient à la construction de différentes connaissances. Ce comportement a influé sur les apprentissages et sur les attitudes des enseigantes vis-à-vis des mathématiques, retentissant sur leurs pratiques en salle de classe. La réflexion critique a contribué à ce que chacune développe sa propre métacognition et se reconnaisse consciemment comme apprenante et enseignante de mathématiques. Nous avons également conclu qu‟il est important d‟analyser l‟influence des convictions, conceptions et émotions des enseignantes sur leurs attitudes vis-à-vis des mathématiques, de son apprentissage et de son évaluation. Mots-clés : Apprentissages; groupe d‟études; mathématiques dans les premières années de scolarisation ; formation continue en contexte. 16 CAPÍTULO I: 1 INTRODUÇÃO: O ESTUDO E SEUS APONTAMENTOS sta tese se refere a uma pesquisa realizada com professoras participantes de um grupo de estudos sobre matemática nas séries iniciais do ensino fundamental. Pretendíamos, desde o início (2006), trabalhar com formação continuada, em contexto, de professores que ensinam matemática para esse nível de ensino. Por esse motivo, formamos o grupo de estudos enviando convites a professores que atuavam em escolas da Prefeitura Municipal de Vitória1, em 2006. Aceitaram o convite e participaram do trabalho cinco professoras: duas das séries2 iniciais (Susana e Beatriz 3 ), duas que atuavam nas séries finais do Ensino Fundamental (Lúcia e Sandra – a pesquisadora deste projeto) e uma professora da universidade (Vânia - coorientadora da investigação, e que também possui experiência com as séries iniciais). O foco central do nosso estudo foi análise de aprendizagens dessas professoras, neste grupo de estudos e em suas práticas pedagógicas, sobre processos de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática desse nível de ensino. Isso somente foi possível por meio da realização de um estudo longitudinal de, aproximadamente, dois anos e quatro meses. No decorrer da investigação, percebemos que nosso foco se encontrava nas interseções entre formação continuada de professores, a matemática nas séries iniciais, tanto em relação aos conteúdos como em relação às práticas pedagógicas ou procedimentos metodológicos, e alguns aspectos cognitivos e afetivos do professor. Para atendermos a essa complexidade de conexões e 1 Desde já agradeço a PMV por ter concedido a licença remunerada para estudo de doutoramento. Por este motivo o nosso projeto estabelece uma devolutiva ao investimento, atuando juntamente com professores que trabalham em escolas da rede municipal de Vitória. 2 Sabemos que estamos passando por um período de transição entre uma nomenclatura „séries‟ para „anos‟, utilizaremos neste trabalho o termo séries porque é desta forma que utilizamos nas escolas das professoras que participam desta pesquisa. 3 Utilizamos nomes fictícios para as professoras com exceção da pesquisadora Sandra e da professora coorientadora Vânia. 17 interseções que se estabeleceram, decidimos investigar situações que nos levassem a compreender algumas aprendizagens das professoras participantes neste grupo de estudos sobre matemática nas séries iniciais. Nosso olhar esteve voltado para o grupo, porém, temos uma quantidade maior de dados e detalhes nas análises de algumas aprendizagens das duas professoras, que atuavam e continuam atuando nas séries iniciais (Susana – duas turmas de 3as séries, 2007 e 2008, e Beatriz – 3ª série em 2007 e 4ª em 2008). Por causa da participação intensa e contínua dessas professoras nos encontros do grupo de estudos, o que nos levou a acompanhá-las em suas aulas de matemática nas séries iniciais. Dessa forma, realizamos num estudo longitudinal utilizando a formação continuada em contexto para analisar algumas aprendizagens dessas professoras no processo coletivo de explicitar, discutir e refletir, criticamente, alguns aspectos do processo de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática das séries iniciais. As professoras Susana, Beatriz, Sandra, Vânia e Lucia possuem experiências diferenciadas em suas formações iniciais e em suas atuações em salas de aula. Elas aceitaram fazer parte deste grupo por motivos diversos, mas, tinham, em comum, interesse em estudar e compartilhar questões relacionadas ao processo de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática nas séries iniciais. Assim sendo, cada professora com suas experiências e motivações pode contribuir de maneira singular na constituição e na consolidação do grupo. Os trabalhos aconteceram de agosto de 2006 a dezembro de 2008 com encontros semanais. Detalhamos e tecemos alguns comentários e reflexões sobre o grupo, no decorrer do trabalho, em especial, nas seções 4.1, 4.4 e 4.5. Acreditamos que este grupo de estudos se apresentou como uma formação continuada de professores, que ocorreu em contexto, de diferentes níveis de ensino que trabalharam juntos, em busca de maior desenvolvimento profissional e maior entendimento e reflexão crítica sobre questões relacionadas à matemática, tanto no campo pessoal quanto no profissional. Isso só foi possível pelo tempo destinado ao estudo, bem como a forma como realizamos a formação continuada, pois possibilitou um conhecimento das 18 professoras e a constituição de uma comunidade de aprendizagem que gerou processos reflexivos. 1.1 Mapeando e traçando percursos Destaquei, nesta parte, algumas das razões e alguns dos interesses em realizar uma pesquisa com formação continuada de professores que ensinam matemática para as séries iniciais do ensino fundamental. Percebi que minha experiência profissional contribuiu para a preocupação com relação à formação continuada de professores. Encerrei o curso de licenciatura em matemática, no segundo semestre de 2000, pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Sentia dificuldades em entender alguns processos de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática que ocorrem ao longo da atividade profissional. Essas dificuldades se justificam em parte pelo escasso número de debates sobre o assunto ao longo de minha formação inicial. Já atuei como professora no nível médio da educação básica e atuo como professora de matemática das séries finais do ensino fundamental, na Prefeitura de Vitória (PMV), desde 2002, e também no nível superior de ensino. Essas diferentes experiências me proporcionaram uma visão mais ampla do ensino da matemática e do modo como alunos de diferentes níveis escolares se relacionam com a matemática. Pela minha experiência notei que muitos professores não possuíam, por vários motivos, a oportunidade de debates com seus pares sobre questões pertinentes aos processos de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática. Certifiquei-me também, de que, em alguns casos, professores acabavam por “culpar” outros profissionais de níveis de ensino anteriores, quando identificavam “problemas” na aprendizagem dos alunos em matemática. Essa falta de reflexão e de investigação sobre as causas e os porquês desses “problemas” não contribuíam para que pudessem ser sanados ou atenuados. Desejava entender alguns desses questionamentos e decidi buscar o cotidiano para realizar o meu estudo. 19 Além de atuar como professora de matemática das séries finais do ensino fundamental, tive oportunidades de trabalhar com professores das séries iniciais. Acompanhei, durante oito meses, o trabalho deles na mesma escola da PMV em que lecionava e também em encontros de formação continuada em diferentes momentos e locais na rede municipal de Vitória. Foram experiências que contribuíram para que gerasse um incômodo na minha visão sobre professores das séries iniciais e sobre suas práticas nas aulas de matemática. Como licenciada em matemática, tinha a crença que esses professores eram malpreparados e não desejavam aprender ou aprofundar seus conhecimentos em conteúdos matemáticos. Nessas experiências, pude iniciar uma modificação de minha crença quando percebi que muitos desejavam aprender, diferenciar e modificar suas práticas em aulas de matemática, porém não possuíam condições necessárias para tanto. Com um novo olhar, passei a conceber esses profissionais como sujeitos aprendentes. De diferentes maneiras, alguns desses profissionais tentavam fazer um trabalho diferenciado e realizavam ações interessantes. Porém, a matemática desenvolvida, nas séries iniciais, precisava ser desvelada. Necessitávamos e acredito que ainda necessitamos de ações que possam dar visibilidade ao que é trabalhado com esses alunos e ao que é realizado por diversos professores da área. Um dos encontros do qual participamos foi o de Formação Continuada da PMV para professores das séries iniciais, que tinha por objetivo apresentar as propostas para o ensino de matemática das Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental da PMV4 (VITÓRIA, 2004). Nos encontros, tive o privilégio de discutir sobre alguns desafios e algumas dificuldades encontradas pelos professores, relacionadas ao processo de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática. Notei certa vontade por parte de alguns professores em superar determinadas dificuldades explicitadas, de continuarem a aprender. Precisavam, portanto, de estudar conteúdos matemáticos. Algumas falas 4 Trata-se de um documento reestruturado por gestores e professores do município de Vitória em 2004 que sintetiza as orientações curriculares que deverão ser desenvolvidas no âmbito da educação municipal. A pesquisadora fez parte da comissão organizadora que reestruturou a parte referente à área de Matemática. 20 desses professores das séries iniciais, que se acham incapazes de ensinar matemática, chamaram nossa atenção. Eles alegam que se sentem perdidos pelo motivo de terem ocorrido diversas mudanças nos últimos anos, em relação ao conteúdo matemático e as suas metodologias de ensino. Alegam que ficam sem saber quais conteúdos são importantes na aprendizagem matemática dos alunos. Alguns professores chegaram a pedir a realização de um curso de “alfabetização matemática” que os ajudasse a tirar dúvidas relacionadas à disciplina (conceitos, conteúdos e regras) e em relação às metodologias que poderiam ser utilizadas. Outras reclamações que apareceram se relacionavam às críticas ao livro didático utilizado ou adotado pela escola. Elas se baseavam no fato de que o livro muitas vezes está distante da realidade dos alunos, não possui linguagem acessível e alguns exercícios não são adequados. Esses são alguns exemplos de colocações de professores das séries iniciais, direcionado à matemática, que nos chamaram atenção e nos provocaram em buscar maior conhecimento sobre o ensino. Iniciamos, portanto, um processo de mudanças de nossas próprias crenças em relação a alguns dos professores polivalentes e de suas práticas. Dessas inquietações, começamos um trabalho sobre resolução de problemas junto com a professora Circe Mary S. da S. Dynnikov, as coordenadoras dos grupos de formação continuada e assessoras da Secretaria de Educação. O trabalho foi realizado com o intuito de formar essas coordenadoras, para que os grupos de formação continuada pudessem ter acesso a algumas das propostas de ensino e aprendizagem de matemática. No ano de 2005, realizamos minioficinas em alguns dos grupos de formação continuada das séries iniciais, nas quais apresentamos parte desses encontros. Outra experiência que contribuiu e continua contribuindo para nosso olhar diferenciado de formação continuada foi a participação no grupo de estudos, com professores de matemática, organizado e coordenado pela professora Vânia Santos-Wagner. Cujo objetivo tem sido proporcionar momentos de trabalho coletivo para que professores procurem se conhecerem, enquanto professores e aprendizes. Nos vários momentos aprendemos como uma 21 proposta diferenciada de formação continuada, que se preocupa com a formação mais ampla do professor, pode colaborar com sua prática em sala de aula e para que nosso conhecimento enquanto aprendizes e professores de matemática de forma consciente. No grupo de estudos, compartilhamos de eventos e de acontecimentos em nossas aulas de matemática, que nos chamaram a atenção e que consideramos importantes, relevantes ou críticos por algum motivo. Também estudamos e trocamos ideias sobre assuntos matemáticos e sobre leituras de educação matemática e de educação geral. Essas e outras experiências nos levaram a percorrer caminhos surpreendentes, relacionados com a formação de professores que ensinam matemática, em especial, a formação continuada. Gerando um envolvimento enquanto professora de matemática num processo de reflexão mais crítica que conduz a percepções sobre o caminhar e sendo sujeito de conhecimento nos próprios fazeres e saberes, no contexto em que estamos inseridos. Algumas questões motivadoras e iniciais, que nos incomodavam no início dessa pesquisa e que nos ajudaram a pensar o problema que foi se construindo, foram: Como são trabalhados os conteúdos de matemática nas séries iniciais? Quais as metodologias utilizadas pelos professores dessas séries? Quais conteúdos os professores gostam de ensinar? Isso tem relação com o que eles gostaram de aprender enquanto alunos? Por que professores das séries iniciais afirmam ter dificuldades em abordar certos conteúdos matemáticos? Quais são os conteúdos selecionados pelos professores das séries iniciais? Quais têm maior relevância para eles e por quê? Algumas dessas questões foram aproveitadas ao longo deste trabalho, e encontramos respostas, já outras ainda continuam como dúvidas. A princípio, por influências de discussões no grupo organizado pela professora Vânia Santos-Wagner e por leituras do pesquisador português, João Pedro da Ponte, pensamos em abordar, nesta pesquisa, a investigação sobre a própria prática. Acreditávamos que esse tema fosse bem interessante, porém, no decorrer do trabalho, percebemos que essa investigação estaria presente nos momentos em que as professoras refletissem sobre suas práticas, logo, não 22 poderia ser o foco principal de nossa pesquisa. Constatamos, desde o início e durante o desenvolvimento do trabalho que outros focos apareceram e ganharam destaque na nossa investigação. Por isso, preferimos pesquisar sobre aprendizagens das professoras, decorrentes da participação em um grupo de estudos e acompanhamento em aulas de matemática com discussões sobre processos de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática nas séries iniciais. 1.2 Problemática da pesquisa Pesquisas sobre ensino e aprendizagem de matemática com professores das séries iniciais 5 já vêm sendo realizadas em todo o mundo, durante algum tempo, tanto em formação inicial como em continuada. Entretanto, sentimos a necessidade de continuar com investigações na área para aprofundarmos estudos sobre aprendizagens desses professores (ou simplesmente aprendizagem docente) e suas práticas pedagógicas em aulas de matemática. Iniciamos uma imersão, na procura de conhecimentos para a constituição da problemática, estudando de uma maneira geral, como pesquisas sobre educação matemática estão sendo desenvolvidas nas últimas duas décadas (BISHOP, 1992; BORBA; ARAUJO, 2004; GROUWS, 1992; KILPATRICK, 1992; PIRES; PONTES, 1999; ROMBERG, 1992). Posteriormente aprofundamos nossas buscas e estudos nos focos específicos de nossa investigação conforme apresentamos a seguir. Existe uma variedade de nomenclaturas de formações permanentes ou continuadas que foram diversificando de acordo com o tempo, como por exemplo: cursos de capacitação, formação em serviço, formação continuada e 5 Algumas outras formas de denominação dos professores que trabalham com as séries (anos) iniciais do ensino fundamental encontradas em pesquisas educacionais são professores polivalentes ou ainda professores generalistas. 23 formação permanente. Todavia, cremos que, mais importante do que pensar em que mudanças denominações com suas respectivas raízes filosóficas educacionais para “formações permanentes ou continuadas”, seria melhor proporcionar ao professor fazer parte de sua própria formação. Ou seja, promover um espaço participativo onde ocorra partilha de angústias, sucessos, anseios, preocupações, vitórias e derrotas em relação ao ensino e à aprendizagem de matemática. Carvalho (2005) escreve sobre os espaços de formação, identifica que os professores sabem da importância da formação continuada, porém, em algumas situações não se sentem parte dessa formação. Ela ressalta o fato de pesquisas, instituições e espaços de formações indicarem como importante a centralidade das formações no professor, possibilitando-lhes voz e vez, mas, na realidade, nem sempre isso ocorre. Isso nos levou a questionamentos sobre a constituição e efetivação do grupo de estudos que iniciamos para este trabalho. Alguns desses questionamentos são: Como realizar uma formação em contexto que contribuísse para a formação global do professor? De que forma podemos realizar um grupo de estudos centrado no professor e em suas práticas? Quais iniciativas nós poderíamos tomar para que os professores sentissem motivados à continuarem aprendendo e refletindo criticamente sobre suas concepções, crenças, atitudes e a relação dessas sobre suas práticas? Essas perguntas nos motivaram a buscar na literatura e em nossas ações meios para conduzirmos uma formação continuada em contexto atendendo aos nossos anseios. Algumas pesquisas apontam para o desenvolvimento do ensino de matemática de modo a tornar todos os envolvidos como coaprendizes (JAWORSKI, 2001). Concordamos com Jaworski (2001), pois, ao participar de um grupo de estudos durante um tempo longo existe uma maior possibilidade de cada integrante aprender de forma consciente com os parceiros e com suas próprias reflexões. Zeichner (1998) ressalta que não existe igualdade absoluta entre os participantes de pesquisas que trabalham junto com o professor. Vários outros pesquisadores em educação matemática já discutiam e investigavam isso também nessa década de 1990 (LLINARES, 1999; SANTOS, 1993, 1995). Mas, é, exatamente, por causa dos diferentes conhecimentos e experiências de 24 cada participante que a contribuição de cada uma foi importante para a formação e desenvolvimento do grupo. No grupo com professoras das séries iniciais tentamos ter uma paridade no relacionamento, reconhecendo e respeitando a contribuição do outro. Isso somente foi possível, a partir de um estudo longitudinal, com tempo para desenvolvermos um trabalho conjunto com o professor. Necessitávamos de um espaço de formação em que o professor se sentisse construtor do seu conhecimento e da sua aprendizagem. No qual ele pudesse ter voz e vez e que participasse de momentos dialógicos de reflexão crítica sobre si próprio, seu pensar e agir na prática de sala de aula, gerando assim conhecimento local (MIZUKAMI et al., 2002; SANTOS, 1993, 1997; SANTOS-WAGNER, 1999, 2003). Espaço que nos auxiliassem a adquirir nossa metacognição enquanto aprendizes e enquanto professores de matemática, formando comunidades de aprendizagens. Precisávamos e precisamos de formações continuadas para além de palestras, espaços em que professores e pesquisadores sentem junto, escutem uns aos outros, trabalhem juntos de modo a partilhar e valorizar os diferentes conhecimentos. Um trabalho conjunto no qual o fazer – refletir – fazer esteja presente na relação dialógica. Isso está relacionado com o desenvolvimento profissional de cada professor, que está imerso em seu contexto social, político, pessoal, emocional e profissional (LLINARES e KRAINER, 2006). Essa forma de desenvolvimento de trabalho, ao ser entendida como uma parceria, uma colaboração entre os envolvidos, recebeu o nome de “amigo crítico” 6 (critical friend) por alguns pesquisadores, desde a década de 1990. Cooney e Krainer (1996) tornaram mais explícito o papel do amigo crítico, ao afirmarem que: Um amigo crítico pode ser um pesquisador ou um colega dedicado que pode ajudar a escolher uma investigação ou ajudar a coletar e analisar dados. Amigos críticos podem encorajar um professor a gravar e analisar suas próprias experiências de um modo que elas 6 Utilizamos em todo texto „amigo(s) crítico(s)‟, mesmo se tratando de uma pesquisa com um grupo exclusivamente feminino, por acreditarmos que a versão feminina dessa expressão não representaria seu significado original. 25 possam ser vistas e discutidas por outros (COONEY; KRAINER, 7 1996, p. 1175, tradução nossa) . Formamos o grupo de estudos, de maneira que cada participante agisse como um amigo crítico da outra. A riqueza de ser um amigo crítico deveria estar em partilhar saberes, de uma maneira comprometida com as práticas envolvidas, os diálogos formados e com as consequências de atitudes e práticas oriundas dessas discussões. A proposta de amigo crítico já está sendo utilizada em diferentes países para aplicação de novas sugestões pedagógicas e para o desenvolvimento de investigações pelo professor, em suas salas de aula. Realizando uma breve retrospectiva, sobre nosso caminhar para a definição do foco e do nosso problema de pesquisa, comentamos que, desde o iniciar do processo de investigação, compreendemos que estaríamos abordando e interrelacionando vários focos. O esquema seguinte mostra de forma sucinta os vários focos envolvidos nesse caminhar. Figura 1 – Esquema para a definição do foco da pesquisa 7 A critical friend can be a researcher or a dedicate colleague who can help design an investigation or help collect and analyze data. Critical friends can encourage a teacher to record and analyze his/her experiences in such a way that they can be shared and discussed by others (COONEY; KRAINER, 1996, p. 1175). 26 O esquema contribui para entendermos como o foco do trabalho foi sendo construído, mas precisamos indicar que isso ocorreu num processo contínuo de construção da problemática de pesquisa, não de forma estanque e linear. A elipse está envolvendo todos os itens para indicar exatamente isso, eles não foram pensados em momentos separados, mas num ir e vir em busca do problema. Observando notamos que no início desejávamos organizar um trabalho de investigação que estivesse voltado para a formação continuada de professores, devido a minha atuação na PMV como coordenadora de formação continuada de matemática. Após o trabalho com professores das séries iniciais, encantei-me e decidi investigar formação continuada de professores desse nível de ensino. Depois de algumas leituras (PONTE, 2002) e influências de discussões no grupo de estudos com a profª Vânia pensei em trabalhar com investigação da própria prática. Na qualificação I, o projeto apresentado estava relacionado com esse tema. Porém, diversos debates gerados após a apresentação dessa proposta nos levaram a entender que seria inviável ter como foco central a investigação da própria prática. Pois não seria possível, num estudo de doutorado, a escrita pessoal e conjunta das professoras, o que caracteriza a investigação da própria prática. Compreendemos que esse foco continuaria no nosso trabalho embora não como central. Outra vertente que apareceu, fortemente, no trabalho foi a reflexão, não aquela realizada por todos, mas uma reflexão crítica pessoal, com intencionalidade e profundidade. Mas, ainda assim, reconhecemos que nosso trabalho era mais amplo e abrangia outros focos como os conhecimentos de professores e de alguns dos seus aspectos afetivos (crenças, concepções e atitudes). Ao longo do processo, entendemos que, ao trabalhar com conhecimentos de professores, ainda deixaríamos algumas situações que, realmente, estavam acontecendo no grupo com as professoras, sem serem realçadas. Assim, decidimos estudar e investigar para compreender aprendizagens das professoras, e concluímos que esse foco envolvia os outros e que perpassa pelos caminhos percorridos anteriormente. 27 Para atender as propostas deste estudo tivemos como objetivo geral analisar aprendizagens das professoras em uma formação continuada ocorrida num grupo de estudos sobre matemática nas séries iniciais e em suas práticas pedagógicas. Acreditamos que uma única pergunta não englobaria todas as inter-relações que surgiram. Estabelecemos três perguntas que se complementam de maneira processual e complexa, na qual representamos de forma cíclica e que nos ajudaram a convergir para o nosso objetivo geral (fig. 1). Numeramos as perguntas com I, II e III, para nos ajudar na organização, mas elas não têm uma ordem de importância, já que se integram. Figura 2 – Esquema das perguntas da pesquisa Na tentativa de responder as questões apresentadas destacamos alguns objetivos específicos: 28 A. Identificar como os aspectos afetivos influenciaram aprendizagens das professoras no grupo e em suas práticas pedagógicas. B. Identificar algumas aprendizagens das professoras participantes que foram explicitadas ou percebidas a partir de discussões no grupo de estudos e em suas práticas pedagógicas. C. Compreender como acontecem algumas aprendizagens e como estas são percebidas ou explicitadas nos encontros do grupo e em práticas pedagógicas pelas professoras. D. Analisar como o grupo influenciou algumas aprendizagens das professoras participantes e suas práticas pedagógicas. E. Compreender como os diferentes conhecimentos estão articulados e relacionados com aprendizagens ocorridas no grupo. O esquema, apresentado na figura 3, nos ajuda a compreender a inter-relação entre nossas perguntas, os objetivos específicos e o objetivo geral. Nele vemos o objetivo geral no início, envolvendo e motivando os outros componentes. No centro se encontra aprendizagem das professoras, pois está relacionada às três perguntas e se integram e é o foco de nossa investigação. Cada pergunta, por sua vez, está relacionada aos objetivos específicos, conforme as setas pontilhadas. Os objetivos também se relacionam e contribuem uns aos outros. A curva pontilhada que permeia todos os componentes representa nossa crença em que ao analisar aprendizagens de professores envolvemos todos os outros componentes, eles estão todos imbricados numa teia complexa. Englobando toda estrutura necessária para a realização deste trabalho em vista de atingir aos seus objetivos e responder às suas questões apresentamos nossa estruturação na próxima seção. Figura 3 – Esquema das inter-relações entre perguntas e objetivos da pesquisa Compreender como os diferentes conhecimentos estão articulados e relacionados com as aprendizagens ocorridas no grupo. Identificar como os aspectos afetivos influenciaram aprendizagens das professoras no grupo e em suas práticas pedagógicas. Analisar como o grupo influenciou algumas das influenciou aprendizagens algumas das professoras aprendizagens e suas participantes professoras e suas práticas pedagógicas. práticas participantes pedagógicas. Compreender como acontecem algumas aprendizagens e como estas são percebidas ou explicitadas nos encontros do grupo e em práticas pedagógicas pelas professoras. Identificar algumas aprendizagens das professoras participantes que foram explicitadas ou percebidas a partir de discussões no grupo de estudos e em suas práticas pedagógicas. ANALISAR APRENDIZAGENS DAS PROFESSORAS EM FORMAÇÃO CONTINUADA NUM GRUPO DE ESTUDOS SOBRE MATEMÁTICA NAS SÉRIES INICIAIS E EM SUAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS. 29 30 1.3 Apresentação da estrutura do trabalho Utilizamos, nos títulos e subtítulos dos seis capítulos, algumas metáforas de um „caminhar da pesquisa‟, seus percursos e o que pôde ser visto e vivenciado. Desde o primeiro passo, nos deparamos com algumas janelas, portas e um caminho a ser trilhado, com escolhas e direções diferenciadas. Sabíamos que não existia uma única estrada, mas fizemos nossas escolhas ao longo da caminhada. A partir do caminhar e de um olhar atento, pudemos descobrir sementes, flores e frutos do que fizemos e dos passos que demos. E, ao encerrar, foi-nos possível analisar o caminhar. Nossas histórias, nossas escolhas, nosso caminhar,... Tantos acertos, erros, quedas e vitórias, porém, o mais importante foi termos caminhado juntos e possibilitado construirmos a nós mesmos, que ressaltamos em aprendizagens. No primeiro capítulo, proporcionamos uma visão inicial do projeto de pesquisa que desenvolvemos, mapeamos e traçamos percursos, destacando a problemática de estudo e nossos objetivos. No segundo capítulo, fizemos uma explanação e apresentação de estudos de diferentes autores que contribuíram para a abordagem do nosso foco. Estes estudos representam algumas „janelas‟ nas quais nos deparamos durante o caminhar. Entre as possíveis janelas escolhemos a da aprendizagem docente, as que nos proporcionaram entender alguns processos de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática, a de formação continuada de professores que ensinam matemática, e aquelas relacionadas aos aspectos afetivos. Foi olhando através dessas janelas que constituímos nossa revisão bibliográfica e nossa discussão teórica do trabalho. No terceiro capítulo, apresentamos uma síntese das orientações teóricometodológicas. Desvelando nossos percursos metodológicos, nossa saída pela „porta‟ inicial da pesquisa e a necessidade de ir além. Fizemos uma panorâmica do desenrolar da pesquisa, pontuando os caminhos percorridos para escolha e organização metodológica. 31 No capítulo quatro, explicitamos como construímos, utilizamos, organizamos e analisamos alguns dados. O leitor constatará mais detalhes de nosso caminhar desde a inserção no campo de pesquisa e do desvelar do grupo e suas participantes. Demos maior visibilidade aos dados quando relatamos um pouco do grupo e suas participantes, a partir de uma panorâmica do nosso caminhar. Realçamos, no capítulo cinco, algumas análises de aprendizagens e alguns processos nos quais as professoras se envolveram e desenvolveram durante a investigação. Representam na nossa metáfora sementes, flores e frutos que lançamos e colhemos no decorrer da caminhada. Realçamos a aprendizagem das professoras sobre seus aspectos afetivos, as aprendizagens dos conteúdos matemáticos e as relacionadas ao grupo pela participação de cada uma de nós. Finalmente, no sexto capítulo, realizamos um balanço dessa investigação colocando algumas considerações finais acerca do vivido e implicações pedagógicas que encontramos no desenrolar da pesquisa. Trazemos sínteses de aprendizagens que puderam ser evidenciadas na análise dos dados e reflexões sobre o processo e seu desenvolvimento. Explicitamos alguns desdobramentos da pesquisa que surgiram ao longo do processo. Colocamos também uma relação de algumas consequências e alguns direcionamentos que surgiram a partir da pesquisa. 32 CAPÍTULO II: 2 A TEORIA: JANELAS QUE SE ABREM este capítulo, apresentamos um pouco do nosso caminhar pela literatura bibliográfica, as janelas com as quais deparamos, identificando entreabertas. Outras se estavam janelas, de abertas início, ou passaram despercebidas, mas as fomos evidenciando aos poucos, no decorrer do caminhar. Definimos, a partir das descobertas das „janelas‟, os eixos teóricos, procurando destacar, desde o início da pesquisa questões pertinentes às aprendizagens de professores. Esse caminhar aconteceu na medida em que se fizeram necessárias algumas dessas leituras, ou na medida em que tivemos acesso aos trabalhos. Como percebemos que teríamos de abordar diferentes componentes inter-relacionados com aprendizagens de professores e com nossa proposta de trabalho, decidimos organizar uma seleção de tópicos que pudessem ser explorados de maneira mais intensa, se olhados separadamente. Foram escolhas difíceis, porém, pensamos que, dessa forma, apresentamos, de maneira mais clara, alguns componentes dessa teia que envolve a aprendizagem. A separação feita contribuiu para ressaltar alguns tópicos importantes e para facilitar a interpretação e a identificação dos vários eixos que permeiam nosso trabalho. Destacamos, em todos eles, os principais conceitos para a nossa pesquisa, evidenciando aqueles que escolheremos para definirem os termos utilizados e que foram nossos teóricos de base. Analisamos periódicos nacionais como: Bolema; Zetetiké; Quadrante; APM (Associação dos professores de matemática); Educação Matemática em Revista; e GEPEM. E tivemos acesso a periódicos internacionais por meio eletrônico e em visitas a outras universidades, entre os quais, podemos destacar os seguintes: Journal of Teacher Education; Journal for Research in Mathematics Education; Journal of Mathematics Teacher Education; Educational Research; e UNIÓN: Revista Iberoamericana de Educação 33 Matemática. Não limitamos data inicial para nossas buscas, pois precisamos de textos antigos de 1986, mas esses foram casos isolados de textos originais de alguns autores como, por exemplo, Shulman e Paul Ernest. De uma forma geral, preferimos realizar uma busca por artigos em revistas e congressos com datas referentes às duas últimas décadas (1990 a 2009). Consideramos aprendizagem como um processo no qual o professor está, constantemente, em formação. O tipo de aprendizagem depende do seu contexto social, cultural e organizacional. Ademais, já pontuamos que a aprendizagem docente está diretamente influenciada pelos aspectos afetivos, cognitivos, relacionados aos conteúdos matemáticos. Para nos aprofundar sobre esses assuntos, nosso trabalho se baseou nos seguintes eixos teóricos: Aprendizagem docente: teorias implícitas e aspectos cognitivos que envolvem o pensamento e conhecimento do professor, reflexão crítica que leva à tomada de consciência e a metacognição. Ensino e aprendizagem e avaliação de matemática: a relação entre ensino, aprendizagem e avaliação da resolução de problemas envolvendo as quatro operações e da geometria. Formação de professores que ensinam matemática. Aspectos afetivos e suas relações com aprendizagem docente: crenças, concepções, atitudes e emoções de professores em relação à matemática e ao seu ensino e aprendizagem. 2.1 Janelas entreabertas: aprendizagem docente Trabalhar com aprendizagens de professores aproxima nosso olhar para aspectos cognitivos que envolvem as participantes. Restringir-nos-emos a detalhar a aprendizagem sob o ponto de vista do professor, no nosso caso, em 34 formação continuada num grupo de estudos sobre matemática, nas séries iniciais. Essas aprendizagens estão envolvidas nos processos cognitivos que envolvem processos de conhecer, compreender, relacionar, interpretar, apreender e dar significado aos vários focos que estão sendo apresentados ou explicitados. Sabemos que os aspectos cognitivos estão diretamente interligados aos aspectos afetivos, porém os separamos para podermos analisar cada panorâmica de um, particularmente. alguns aspectos Nesta cognitivos seção, que apresentamos identificamos uma como fundamentais em aprendizagens de professores. 2.1.1 Ensino e aprendizagem Abordamos aqui, questões referentes ao ensino e aprendizagem no âmbito geral, focalizando a pessoa do professor. Preocupamo-nos, nesta pesquisa, em analisar algumas questões que dizem respeito a como nós adultos aprendemos, sem focalizar detalhes como os alunos aprendem. Dessa forma, colocamos o professor como uma pessoa, que ao ensinar aprende (FREIRE, 1996), realçando assim nossa natureza de aprendizes ao longo da vida. Destacamos alguns autores de psicologia cognitiva como Vygotsky (1988/19348) e algumas de suas principais relações com processos de ensino e aprendizagem. Também distinguimos, nesta seção, algumas pesquisas nacionais e internacionais que envolvem a aprendizagem dos professores de maneira explícita. Estamos falando em aprendizagens, outros autores falam em saberes (por exemplo, NACARATO, 2000) ou conhecimentos (por exemplo, SHULMAN, 1986) de professores. Consideramos que a palavra „aprendizagens‟ nos proporciona uma abrangência maior sobre processos de associação, de provocação e de absorção do que acontece com o professor e 8 Estamos colocando duas datas em alguns autores, como por exemplo, o caso do Vygotsky. A primeira data representa a que está impressa no livro utilizado por nós, e a segunda, a data em que o livro foi lançado, dessa forma chamamos a atenção do leitor para o fato de as ideias defendidas por esses autores serem de um período anterior à data da versão utilizada por nós. 35 com o contexto no qual está inserido. Assim como, aquilo que o faz refletir criticamente e que o leva a analisar seus saberes e fazeres em suas práticas. Por esse motivo escolhemos aprendizagens das professoras num grupo de estudos como título do nosso trabalho. Estamos trabalhando com aprendizagens de professores e, portanto, devemos ter uma compreensão diferenciada da aprendizagem construída com as crianças. Tentamos colocar, a seguir, algumas definições e a forma como entendemos aprendizagens de professores e como usamos neste trabalho. Acreditamos que precisamos falar em aprendizagem e ensino, não separadamente, por entendermos que as relações existentes entre o ensino e a aprendizagem ocorrem em processos. Da maneira em que acontecem, estão imbricados com relações perceptíveis e imperceptíveis, explícitas e implícitas, e que não ocorrem em momentos isolados e únicos, mas sim, por meio de processos. Quando falamos em processos não estamos afirmando que, simplesmente, relacionem causas e efeitos, mas que consistem em desenvolvimento, em continuum. Várias maneiras de pensar e agir que não precisem estar numa ordem definida e estática. Evidenciamos aprendizagens de professores, como sujeito aprendente, num sentido mais amplo, considerando como descrito acima que, ao falarmos em aprendizagens, não as estamos separando do ensino, apenas destacando parte do processo. A inter-relação entre ensino e aprendizagem é defendida por alguns autores, como Freire (1996, p. 23) que afirma que quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. Freire ainda afirma que o ensinar inexiste sem aprender e vice-versa. Ele atribuiu a aprendizagem social à ocorrida entre os membros de uma determinada região ou local, que aconteceu historicamente, a percepção de que era possível ensinar por que com alguns tipos de comportamentos, alguém estava aprendendo. Para Freire (1996), o aprender precedeu o ensinar, e somente aprendemos o que podemos recriar ou refazer o que foi ensinado. E mostrou como essa identificação entre ensinar e aprender é complexa e exige de nós um envolvimento maior do que imaginamos. Ele afirma que 36 Quando vivemos a autenticidade exigida pela prática de ensinaraprender participamos de uma experiência total, diretiva, política, ideológica, gnosiológica, pedagógica, estética e ética, em que a boniteza deve achar-se de mãos dadas com a decência e com a seriedade (FREIRE, 1996, p. 24). A relação entre o ensinar e aprender, por parte do professor, pode também ser percebida, explicitamente, em alguns trabalhos como é o caso da tese de doutorado de Adair Nacarato (2000), que teve por objetivo identificar e analisar saberes curriculares, reflexões, produzidos por um grupo de professores das séries iniciais, envolvidos num processo simultâneo de ensinar e aprender geometria. Em suas colocações, Nacarato (2000) também aponta para o fato da aprendizagem ser social, conforme Vygotsky. Todas as componentes do grupo aprenderam umas com as outras, aprendizagens diferenciadas, pois cada uma está numa fase de desenvolvimento profissional e com objetivos diferenciados para a participação nesse tipo de grupos. Aprendizagens são individuais, ninguém pode aprender pelo outro, mas se dá socialmente, por meio de mediações e interações com outras pessoas. Aprendizagens podem ocorrer, a partir de experiências vivenciadas ao ensinar matemática, desde que sejam realizadas provocações para a reflexão crítica por parte de todo o grupo. Nacarato (2000, p. 274) também afirmou isso, quando disse em sua conclusão que “todas aprendiam e ressignificavam saberes, tanto para quem narrava como para quem ouvia e refletia sobre a experiência do outro”. Notamos que a aprendizagem ocorreu a partir de reflexões sobre o que era apresentado sobre o processo de ensinar pelos componentes do grupo. Mizukami (2006) comenta sobre a aprendizagem na docência e faz uma análise das pesquisas que investigam o assunto, apontando quais os principais indícios apresentados por essas pesquisas. Confiamos em que nossa pesquisa contribua para ampliar esses indícios, pois trabalhamos sobre várias situações colocadas. Concordamos com Mizukami (2006) ao dizer que: Os processos de aprender a ensinar, de aprender a ser professor e de desenvolvimento profissional de professores são lentos, iniciam-se antes do espaço formativo dos cursos de licenciatura e se prolongam por toda a vida. A escola e outros espaços de conhecimento são contextos importantes desta formação. Conhecimentos teóricos diversos assim como aqueles que têm como fonte a experiência 37 pessoal e profissional são objetos de aprendizagens constantes. A literatura voltada para a compreensão de processos de aprendizagem da docência vem indicando o caráter individual e coletivo de tal aprendizagem; a força das crenças, valores, juízos na configuração de práticas pedagógicas; a reflexão como processo de inquirição da própria prática no sentido de, por meio dela, superar desafios, dilemas e problemas; a importância das comunidades de aprendizagem e de processos colaborativos para o desenvolvimento individual e coletivo; as aprendizagens docentes como sendo situadas e socialmente distribuídas; diferentes tipos de conhecimentos necessários a docência que passam gradativamente a compor a base de conhecimentos de cada professor; processos cognitivos acionados pelos professores para a construção da referida base; a importância dos conteúdos e dos níveis de reflexão (MIZUKAMI, 2006, p. 214). Notamos como aprendizagens de professores se constituem complexamente, sendo influenciadas por diversas vertentes: pessoais, coletivas, culturais, emocionais, cognitivas, psicológicas e sociais. Estudar aprendizagens envolve uma análise minuciosa dessas vertentes e suas influências no grupo na qual estamos trabalhando. Outros autores também destacam esses entrelaçamentos em torno de aprendizagens. Podemos perceber isso em Llinares e Krainer (2006, p. 429) quando colocam a “aprendizagem dos professores de matemática como um processo de aprendizado que dura a vida inteira que inicia com nossas próprias experiências com o ensino de matemática da perspectiva de um estudante, ou mesmo com atividades matemáticas antes da escolarização9”. Para eles, os tipos de experiências, que acontecem antes mesmo de se iniciarem em cursos de licenciaturas, influenciam na carreira dos professores. Concordamos com alguns autores (LLINARES; KRAINER, 2006; MIZUKAMI, 2004; 2006) que afirmam que nossas aprendizagens de “ser e tornar-se” professor são frutos de diferentes experiências, em diversos momentos, como alunos e como professores, e das relações que cada um pode vivenciar por meio das próprias experiências e do meio sociocultural no qual está inserido. Muitas vezes, vamos (re)aprendendo e (re)significando nossas aprendizagens de acordo com nossas experiências, 9 […] mathematics teachers‟ learning as a lifelong learning process which starts with one‟s own experiences of mathematics teaching from the perspective of a student, or even with mathematical activities before schooling (LLINARES e KRAINER, 2006, p. 429). 38 formação, participação em grupos de discussões e com o desenvolvimento do nosso trabalho enquanto professores. Algumas pesquisas estudam aprendizagens de professores em diferentes momentos de sua profissionalização, realçando que a aprendizagem não fica isolada na formação inicial. Luciana Parente Rocha (2005), em sua dissertação, estudou alguns saberes dos profissionais que vivenciavam a transição entre alunos e professores, nos seus primeiros anos de docência. Ela indicou em seus resultados que são muitos os aspectos que envolvem a passagem de aluno a professor, mas apontou para o fato de essa passagem ser caracterizada por um período de intensas aprendizagens. Esta passagem, normalmente, é marcada por diferentes tipos de sentimentos, como desafios, angústias, dilemas, satisfações, responsabilidades e alegrias. Rocha (2005) mostrou que na prática pedagógica, os professores, reconheceram a continuidade da aprendizagem e que o processo de se tornar professor não acaba na formação inicial. Sabemos que a aprendizagem dura toda a vida profissional, por isso desenvolvemos esta pesquisa com professores que já atuavam em sala de aula, há mais de 15 anos, identificando e analisando algumas aprendizagens que foram influenciadas ou pelo menos, motivadas pelo grupo de estudos, em particular. Para Llinares e Krainer (2006), os professores são vistos como construtores ativos dos seus próprios conhecimentos, por esse motivo são encorajados a refletir sobre suas próprias práticas e modificá-las quando for apropriado. Para eles, o desafio é encontrar respostas para questões sobre onde, como e o quê os professores aprendem, já que “[...] aprendizagem de professores é um processo complexo e é influenciado em ampla extensão por fatores pessoal, social, organizacional, cultural e político” 10 (LLINARES; KRAINER, 2006, p. 429) (tradução nossa). 10 […] teachers‟ learning is a complex process and is to a large extent influenced by personal, social, organizational, cultural, and political factors (LLINARES; KRAINER, 2006, p. 429). 39 Em relação ao aprendizado humano, Vygotsky (1988/1934) difere do aprendizado que pode ser realizado com animais; ele afirma que o “aprendizado humano pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual as crianças penetram na vida intelectual daquelas que as cercam” (VYGOTSKY, 1988/1934, p. 99). Esse autor interliga aprendizado com o que chama de zona de desenvolvimento proximal e explica essa relação ao asseverar que: Propomos que um aspecto essencial do aprendizado é o fato de ele criar a zona de desenvolvimento proximal, ou seja, o aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação com seus companheiros. [...] Desse ponto de vista, aprendizado não é desenvolvimento; entretanto, o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de acontecer. Assim, o aprendizado é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas (VYGOTSKY, 1988, p. 101). Assim sendo, entendemos os processos apresentados por esse autor como atividades do indivíduo de apropriação dos significados provocados e discutidos nos com os pares. E o que se encontra na zona de desenvolvimento proximal hoje pode estar no nível de desenvolvimento real no futuro (VYGOSTKY, 1991). Desde a apropriação e a utilização, isto é, a mudança de atitude, decorrente do uso do que foi aprendido, podemos afirmar que houve apropriação dos significados do que estava sendo proposto. Vygotsky (1991) afirma que a escola tem papel fundamental na apropriação do saber acadêmico e científico e deve se preocupar com as interações entre professores e alunos e como essa apropriação está sendo motivada e construída. Encontramos algumas definições para aprendizagens que nos ajudaram a entender o que acontece com o professor quando ele vivencia uma aprendizagem. A aprendizagem dos professores pode ser vista como um processo construtivo e interativo (grifo nosso) que lhes permite interpretar os 40 sucessos sobre a base do conhecimento, crenças e disposições (a 11 atuar) prévias (GARCIA; LLINARES, 1999, p. 61). Sabemos que temos diferentes aprendizagens ocorrentes de acordo com o local e o tipo de interação que os indivíduos vivenciam. A escola pode promover certo tipo de aprendizagem que a diferencia de outras. Colinvaux (2007) define a aprendizagem na escola, de forma a relacioná-la com conhecimentos, significações e como processo, conforme observamos na seguinte citação que partimos do pressuposto que, na escola, a aprendizagem tem por objetivo central (ainda que não exclusivo) construir conhecimentos. Postulando que conhecimento é significação, conceituamos aprendizagem como um processo que se organiza e realize em torno de significações. A noção de processo é central e implica, de um lado, movimentos individuais e coletivos em torno dessas significações, movimentos estes que é importante apreender e caracterizar, em seus possíveis recuos e avanços. De outro lado, a noção de processo, desdobrando-se em movimentos, pressupõe uma discussão da dimensão temporal, isto é, das escalas de tempo adotadas para acompanhar esses mesmos processos e movimentos. Finalmente, o processo de aprendizagem, com seus movimentos de significação realizados ao longo do tempo, pressupõe mudanças e, especialmente, emergência de novidades (COLINVAUX, 2007, p. 31). Assim como Colinvaux (2007, p. 31), concebemos “aprendizagem como um processo que se organiza e realiza em torno de significações”, que envolve e atua em movimentos individuais e coletivos. Aprendizagens são construídas e reconstruídas nas interações com os outros indivíduos e o meio que se está inserido, e como movimento tem uma dimensão temporal, contextual. Um tempo multidimensional, que inclui o tempo individual, o coletivo e aqueles a que estamos envolvidos nas escolas e nos encontros do grupo. Portanto, os processos de ensino e aprendizagem ocorrem em movimentos em torno de significações. Em vista disso, investigar aprendizagem docente, que está presente nesse processo em movimento se torna complexo, pois estamos tratando e investigando algo dinâmico e que está em constante mudança. Ademais, a aprendizagem docente não é linear, cada um aprende de forma 11 El aprendizaje de los profesores puede ser visto como un proceso constructivo e iterativo que lês permite interpretar los sucesos sobre la base del conocimiento, creencias y disposiciones (a actuar) previas. (GARCIA; LLINARES, 1999, p. 61) 41 diferenciada, e precisamos estar em constante discussão com o docente para que possamos entender algumas de suas aprendizagens. A intenção de realizar no grupo momentos de discussão sobre o que acontecia em sala de aula oco rreu por acreditarmos, assim como Mizukami (2004), que a aprendizagem ocorre a partir da reflexão sobre as experiências vividas e, não apenas, pelo fato de vivermos experiências. Nós aprendemos a partir das experiências quando temos que parar para relembrar o que houve e tentar relatar de forma clara para os outros membros do grupo, pois precisamos reviver, analisar e reconstruir as experiências vividas. É necessário analisarmos cuidadosamente ao falarmos sobre aprendizagens de professores, e percebermos que esse processo que envolve a cognição é contextual. Isso foi discutido por Polenttini e Sabaraense (1999) ao assegurarem: Pensando na cognição do professor no contexto de todos os desafios e influências que o rodeiam, o professor pode aprender, mudar e desenvolver-se enquanto interage com o seu meio ambiente. O estudo do professor e do ensino de matemática não pode ser feito adequadamente ignorando o contexto de interações sociais e culturais nas quais a formação do professor e o ensino ocorrem (POLENTTINI; SABARAENSE, 1999, p. 193). Observamos ser preciso situar o professor e destacar, sempre que possível, dados que ajudem o leitor entender de que lugar falamos e em qual lugar as professoras estão trabalhando e interagindo com seus alunos e com outros profissionais da educação. Esta pesquisa é um estudo de casos sobre algumas aprendizagens das professoras que participam num mesmo grupo de estudos. Portanto, estão situadas e foram influenciadas pelo contexto ao qual esta pesquisa está inserida. 42 2.1.2 A reflexão crítica abrindo horizontes para aprendizagens de professores A questão da reflexão vem sendo trabalhada a algum tempo, de diferentes formas por vários pesquisadores em diferentes perspectivas (ALARCÃO, 2004, 1996a; DEWEY, 1979/1910; FREIRE, 1996; LOPEZ-REAL, 2003; NÓVOA, 1992; PERRENOUD, 2002; PONTE, 2002; SANTOS, 1993; SCHÖN, 2000). Essas pesquisas utilizam nomenclaturas diferentes, com algumas ideias diversas entre elas, algumas se focalizaram na formação de professor reflexivo, outras, na reflexão sobre a ação e reflexão na ação, e algumas na investigação sobre a prática. Porém, todas elas possuem pontos em comum, estão voltadas para a reflexão por parte do professor, de maneira organizada e sistemática. Refletir é ato realizado por todos, mas, normalmente, sem profundidade, criticidade, análise adequada que possam gerar possíveis mudanças às questões levantadas. As reflexões, quase sempre, são realizadas individualmente e em pouco tempo, muitas vezes dentro do espaço da sala de aula. Desejamos que os professores reflitam criticamente, que observem e analisem como agem, por que agem dessa ou daquela forma, como reagem a determinadas situações, e como podem continuar nesse processo de reflexão na sua prática profissional. Concluímos que a melhor forma de entendermos algumas relações referentes aos processos de ensino e aprendizagem em matemática é destacando a reflexão crítica e constante. Isso leva o professor a pensar e a se tornar consciente sobre o seu fazer, seu agir, suas crenças, concepções, valores, atitudes, dentre outras coisas se relacionam aos processos de ensino e aprendizagem (MIZUKAMI et al., 2002; SANTOS, 1993). Schön (2000/1998) considera que as crenças, os valores, as superstições que professores possuem estão relacionados com o ensino, a aprendizagem, os alunos, os conteúdos e que influenciam sua prática na sala de aula e em sua reflexão. Utiliza um termo que chama de profissional reflexivo, usado ao comentar sobre a necessidade do professor (instrutor) estar atento como um 43 pesquisador, para compreender as questões relacionadas ao sucesso dos alunos no cotidiano. Ele diferencia duas maneiras, nas quais o conhecimento em ação é adquirido originado na reflexão: reflexão na ação e reflexão sobre a ação. Esclarece ainda que algo acontecido não esperado ou planejado, serve como ponto de partida para a reflexão na ação e para a reflexão sobre a ação, isso ocorreu em nossa pesquisa. Schön (2000/1998) indica que não existe um momento específico da formação do professor no qual ele deve aprender a ser reflexivo, constatamos que é pela prática que isso acontece, de acordo com a necessidade do próprio professor, a partir das ações vivenciadas, pois é a partir da reflexão na e sobre a própria prática que as transformações podem acontecer. Ele afirma que os momentos de reflexão-na-ação não são tão fáceis de serem identificados isoladamente, mas são importantes para a imediata significação na ação. Esse autor considera ainda, que “na reflexão-na-ação, o repensar de algumas partes de nosso conhecer-na-ação leva a experimentos imediatos e a mais pensamentos que afetam o que fazemos na situação em questão e talvez em outras que possamos considerar como semelhantes a ela” (p. 34). Ele faz um contraponto com a reflexão-na-ação com a reflexão sobre a reflexão-na-ação considerando que A reflexão-na-ação é um processo que podemos desenvolver sem que precisemos dizer o que estamos fazendo [...] é claro que, sermos capazes de refletir-na-ação é diferente de sermos capazes de refletir sobre nossa reflexão-na-ação, de modo a produzir uma boa descrição verbal dela. E é ainda diferente e de sermos capazes de refletir sobre a descrição resultante (SCHÖN, 2000/1998, p. 35). A importância que o autor dá à reflexão sobre nossa reflexão-na-ação é de que modificaremos ações futuras, dessa forma ele afirma que essa reflexão dá início a um diálogo de pensar e de fazer através do qual sejamos profissionais mais habilidosos. Portanto, promover situações em que as professoras possam pensar sobre suas ações, e como a conceberam, pode contribuir para um processo de reflexão crítica que almejamos. Em um de seus artigos, Alarcão (1996b) realiza uma reflexão crítica em relação ao pensamento de Schön, chamando a atenção para o fato de ele trabalhar com profissionais quaisquer e não apenas com formação de professores. Ela 44 ressalta que temos que ter cuidado para não interpretarmos erroneamente as ideias de Schön sobre reflexão. Por esse motivo, utilizamos o que consideramos apropriado para nossa pesquisa, porém, tomando o cuidado para não nos limitarmos aos seus pensamentos, relacionando-os com os de pesquisadores da educação. Alarcão (1996a, 2004) utiliza o termo professor reflexivo, e confirma que esse possa contribuir para que se efetivem mudanças. Um dos seus argumentos é de que a reflexão é inata ao ser humano, logo, precisa apenas de contextos com os quais se desenvolva o espírito crítico. Ela apresenta a estrutura de uma pesquisa-ação que atende aos moldes a fim de que ocorra a reflexão na ação e sobre a ação. Ela nos chama a atenção para o fato de que tanto a escola como os professores devem estar em estado de constante reflexão, de modo a manter presente a questão da função que professores e escola desempenham na sociedade e na tentativa de solução dos problemas e dilemas. Essa autora afirma que “ser-se reflexivo é ter a capacidade de utilizar o pensamento como atribuidor de sentido” (ALARCÃO, 1996a, p. 175). Essa autora associa a reflexão do professor em prol da autonomia do aluno. Concordamos com Alarcão (1996a), pois acreditamos que os processos de mudança, por parte dos professores, devem ocorrer para contribuir na aprendizagem do próprio professor e de seus alunos. Uma de suas frases nos chamou atenção porque acreditamos que precisamos nos conhecer enquanto professores para ajudar nossos alunos, no nosso caso na aprendizagem da matemática. Ela coloca a seguinte frase como uma máxima apresentada por ela: “Professor, descobre o sentido da tua profissão e descobre-te a ti mesmo como professor para ajudares os teus alunos a descobrirem a língua que aprendem e a descobrirem-se a si próprios como alunos” (ALARCÃO, 1996a, p. 187). Concordamos com Dóris Bolzan (2002) quando afirma que durante o processo de reflexão constatamos que o professor deixa emergir seus esquemas implícitos. E até mesmo suas construções teóricas, que são formuladas desde antes de sua formação acadêmica, pois concluímos que esse profissional se faz professor no processo em que já está inserido ainda como aluno. No processo de refletir o professor pode olhar para o passado, suas ações, 45 práticas, crenças e atitudes, e estabelecer relações com o presente e com possíveis ações futuras. A esse processo a autora chamou de reflexão crítica, que pode ser feito individualmente ou em grupo, e que tornará os professores conscientes dos modelos teóricos e epistemológicos evidenciados na atuação profissional deles. Bolzan (2002), ao abordar sobre o que seja necessário redirecionar a escola para favorecer os processos de ensino e aprendizagem, mostra que um dos caminhos para isso é a reflexão, fundamentando ao afirmar: Refletir sobre a prática pedagógica parece ser um dos pontos de partida, pois compreender o processo de construção do conhecimento pedagógico de forma compartilhada implica compreender como se constitui esse processo no cotidiano da escola, local de encontros e desencontros, de possibilidades e limites, de sonhos e desejos, de encantos e desencantos, de atividade e reflexão, de interação e de mediação nessa construção que não é unilateral, mas acontece à medida que compartilhamos experiências, vivências, crenças, saberes, etc., numa ciranda que não se esgota, ao contrário, se desdobra, se modifica, se multiplica, revela conflitos e se amplia (BOLZAN, 2002, p. 27). Essa reflexão sobre a prática deve ser produzida criticamente e serve para relacionar teoria e prática. Concordamos com Freire (1996), quando afirma que “a reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação Teoria/Prática sem a qual a teoria poderia ir virando blábláblá e a prática, ativismo” (p. 22). De acordo com o educador, a reflexão deve levar a um „pensar certo‟ sobre a prática, que envolve em qualquer pessoa a curiosidade. Não uma curiosidade ingênua, conforme nos aponta Freire (1996, p. 39), mas deve iniciar com a curiosidade ingênua, chegando, por meio da reflexão crítica sobre a prática, à curiosidade epistemológica. Llinares e Krainer (2006, p. 431) afirmam que a “reflexão pode se vista como uma maneira em que cada professor constrói o significado e conhecimento que guia suas próprias ações 12” (tradução nossa). Em outros momentos, eles apontam para a necessidade de provocar momentos de 12 reflection is regarded as a way in which teachers construct the meaning and knowledge that guide their actions (p. 431). 46 reflexão crítica, tanto para futuros professores como para professores que já estão atuando em sala de aula. Para Llinares e Krainer (2006, p. 442), “a reflexão é considerada como elemento chave para o desenvolvimento dos professores, e que é a partir da reflexão que o professor continua a aprender sobre ensino e sobre si mesmos como professores”. Certamente, os professores devem ter uma prática que proporcione a reflexão crítica. Destarte, o foco do processo de reflexão é o elemento chave para dar suporte à generalização da reflexão e à análise crítica das crenças e concepções dos professores. Acreditamos que quando os professores refletem criticamente sobre si próprios, suas ações, os espaços-tempos nos quais estão inseridos e em todo o processo de ensino, aprendizagem e avaliação podem contribuir para que ocorra mudanças no seu próprio desenvolvimento profissional como também nesse processo no qual está imerso. Por isso, acreditamos que os professores precisem se tornar práticos reflexivos, de forma crítica e sistemática. Na formação de professores que atuarão nas séries iniciais, Serrazina (2003) coloca a reflexão como fundamental, mas que deve ir além, contribuindo para a ampliação do processo que envolve o ensino e aprendizagem de matemática: o principal objetivo deve ser o de os professores serem capazes, não só de refletir sobre na e sobre a sua prática para descobrir, criticar e modificar os modelos, esquemas e crenças subjacentes a mesma, como também de planificar, experimentar e avaliar projetos curriculares. [...] o professor precisa de ter instrumentos de análise e reflexão sobre a sua prática, sobre o seu significado, sobre o tipo de conteúdo a trabalhar, sobre como aprendem seus alunos e sobre como ensinar (SERRAZINA, 2003, p. 70). Conseguiremos ajudar os professores, tanto na formação inicial como na continuada, quando conseguirmos levá-los a refletir criticamente com utilização de instrumentos de análise, conforme apontado por Serrazina (2003). Essa necessidade de reflexão deve ser considerada em todos os momentos de formação que conduzem ao desenvolvimento profissional do professor. Cooney e Krainer (1996, p. 1162) defendiam a necessidade da ênfase na reflexão, em programas de formação continuada, a qual pode contribuir de modo a 47 proporcionar aos professores explicitar considerações sobre as implicações de suas próprias experiências de aprendizagens e sobre as influências dessas nas suas práticas de ensino e para os contextos gerados em sala de aulas por esses professores. Chapman (2005) e Santos (1999) também defendem a necessidade de utilizar a reflexão sistemática e crítica sobre nossas aprendizagens, nossas atitudes, crenças e concepções e sobre nossas práticas para que possamos estabelecer o desenvolvimento profissional. Utilizamos nas análises algumas das ideias sobre reflexão crítica, que envolve o individual e o coletivo como também o social e o local, apresentadas por Schön (2000/1998), Llinares e Krainer (2006) e Serrazina (2003). Os autores citados anteriormente colocam o papel do professor como parceiros das pesquisas e não sujeitos de pesquisa. Defendemos essa visão, queremos junto com as professoras investigar os processos de ensino e aprendizagem de matemática, partindo de nossas próprias aprendizagens, geradas por meio da reflexão crítica dos fatores envolvidos. 2.1.3 Tomada de consciência e metacognição: janelas para dentro de si mesmo As questões relacionadas às mudanças de atitudes, tomadas de consciência e metacognição se referem à reflexão do professor e sua investigação sobre a prática. A tomada de consciência, por parte do professor, significa ele sair do processo de apenas intuição, iniciar na reflexão sobre a própria prática para se conhecer, enquanto professor e enquanto aprendiz. Poder ter a consciência de seus processos de aprendizagem, do seu saber e do seu fazer, significa reconhecer-se enquanto sujeito do conhecimento. Muitos de nós, professores, temos atitudes inconscientes, sem refletirmos sobre as causas e as consequências do que fazemos. Agimos num nível de intuição ingênua, precisamos nos dar conta de nós mesmos, de maneira consciente para podermos inferir sobre nossas ações, o que perpassa pela reflexão, ampliando 48 a discussão para aspectos cognitivos e emocionais. Santos (1995, 1994) nos aponta para a necessidade de tomada de consciência que um futuro professor deve ter, acrescentamos que todos os professores necessitam ter esse nível de consciência. Ela afirma que “um professorando/a [...] precisa estar consciente de quem ele/ela é em termos de seu conhecimento, concepções e atitudes sobre a educação e a disciplina que ele/ela estará lecionando, e a motivação que ele/ela tem para aprender e ensinar” (SANTOS, 1993, p. 120). Vânia Santos (1995) discute vários aspectos que devem ser considerados sobre a consciência metacognitiva de futuros professores, ela observa que esse tipo de consciência deve incluir: 1. Pensar sobre seu próprio processo de pensamento durante a resolução de problemas; 2. Pensar sobre suas próprias fortalezas e limitações no que diz respeito a certos tópicos matemáticos e procedimentos; 3. Pensar sobre seu próprio conhecimento matemático; 4. Pensar sobre suas crenças e concepções enquanto aluno de matemática e futuro professor de matemática; 5. Pensar sobre suas próprias atitudes sobre aprendizagem em matemática, o ensino de matemática, e a avaliação tanto como aluno/ quanto como futuro/a professor/a de matemática; 6. Pensar sobre a influencia de suas crenças, concepções e atitudes sobre a matemática e sua pedagogia podem ter nos seus/suas futuros/as alunos/as; 7. Pensar sobre sua própria motivação para aprender matemática e para superar dificuldades em matemática em comparação com o seu futuro trabalho como professor/a para motivar os/as alunos/as a aprender e a superar as dificuldades de aprendizagem; e 8. Pensar sobre o monitoramento e controle de seu próprio esforço para resolver problemas matemáticos (SANTOS, 1995, p. 120 – 121). Concluímos que esses aspectos possam ser abordados nos trabalhos com professores que já atuam em sala de aula, mas que também necessitam pensar sobre o seu próprio processo de pensamento, suas fortalezas e limitações a respeito de conceitos matemáticos, sobre seu conhecimento matemático, suas crenças e concepções, suas atitudes e a relação com sua prática em sala de aula de matemática. Precisamos definir melhor o que entendemos por metacognição, para isso, estudamos alguns autores que trabalham com o assunto. Ribeiro (2003), trabalhando a etimologia, afirma que “a palavra metacognição significa para 49 além da cognição, isto é, a faculdade de conhecer o próprio ato de conhecer, ou, por outras palavras, consciencializar, analisar e avaliar como se conhece” (RIBEIRO, 2003, p. 109). Essa mesma autora afirma que “a metacognição diz respeito, entre outras coisas, ao conhecimento do próprio conhecimento, à avaliação, à regulação e à organização dos próprios processos cognitivos” (RIBEIRO, 2003, p. 110). Tanto Ribeiro (2003) como Jou e Sperb (2006) apontam a metacognição como apoio ao processo de aprendizagem de alunos. Assim, os professores precisam realizar tarefas que ajudem seus alunos a desenvolverem o conhecimento metacognitivo, fundamental para a aprendizagem. Ampliamos essa colocação para os professores, pois, se eles aprendem a desenvolver a metacognição, interagindo sobre seus próprios conhecimentos, desenvolvendo sua própria aprendizagem, possivelmente, contribuirá melhor com a aprendizagem de seus alunos. Ribeiro (2003, p. 115) afirma que “a metacognição pode, então, ser vista como a capacidade chave de que depende a aprendizagem, certamente a mais importante: aprender a aprender, o que por vezes não tem sido contemplado pela escola”. Acreditamos que também não tem sido contemplado em muitas formações das quais os professores participam. E analisando no âmbito do professor, cremos que as formações necessitam criar condições que levem o professor a experiências metacognitivas que desenvolvam o conhecimento metacognitivo para que possa continuar aprender a aprender. Metacognição também pode ser colocada, como um processo que envolve a habilidade de um indivíduo (no nosso caso do professor) de refletir criticamente, olhar para dentro de si mesmo, compreender e tentar controlar a cognição (BAIRRAL; RODRIGUEZ, 2005; DAVIS; NUNES; NUNES, 2005; FERREIRA, 2003; SANTOS, 1995), o que leva a conhecer melhor a própria aprendizagem e as próprias ações de ensino. Ou ainda como “a capacidade do ser humano de ter consciência dos seus atos e pensamentos” (JOU; SPERB, 2006, p. 177). Dessa forma, os conhecimentos que ele possui sobre si próprio enquanto aprendiz e enquanto professor de Matemática incluem, dentre os muitos fatores, conhecer suas potencialidades e dificuldades, tendências e comportamentos típicos, suas atitudes em situações particulares. O professor 50 deve relacionar conhecimentos com a existência da consciência de seu próprio repertório metodológico, táticas e estratégias e do modo como elas podem facilitar o desempenho, quanto as crenças sobre a Matemática e sua influência sobre sua prática. Em nossa pesquisa, trabalhamos a metacognição para tentar levar as professoras a terem conhecimento e controle intencional acerca de seus processos cognitivos e os produtos desses e também para desenvolverem a habilidade de monitoramento e auto-regulação para potencializar sua atividade cognitiva. 2.1.4 Conhecimentos de professores: diferentes janelas Abordamos nesta seção, alguns conhecimentos que consideramos importantes para professores e suas práticas. Em relação aos diferentes tipos de conhecimentos dos professores, temos, por exemplo, que alguns autores utilizam a palavra saberes. Em nossa pesquisa utilizamos a palavra conhecimentos. Shulman (1986) reformulou o foco de pesquisas que envolvem conhecimento de professores. Em seus estudos sobre esses, ele afirma que existe uma base de conhecimento que é um conjunto de compreensões, conhecimentos e habilidades que o professor necessita para desenvolver processos de ensinar e aprender (MIZUKAMI, 2004). Shulman (1986) classificou os conhecimentos dos professores utilizando as seguintes categorias: conhecimento do conteúdo que se refere às escolhas e à organização dos conteúdos matemáticos pelo professor; conhecimento pedagógico do conteúdo, que está relacionado com os modos que o professor utiliza para trabalhar em sala de aula os conteúdos selecionados por ele; e o conhecimento curricular, que é mais amplo e envolve a dinâmica educacional. Outros autores fazem outras classificações, detalhando ou subdividindo essa classificação de Shulman (1986), entretanto, normalmente, fazem menção à sua classificação. 51 Ponte (2001) é um dos autores que nos mostra a importância em estudar os conhecimentos dos professores, ao afirmar que o conhecimento usado pelo professor, na sua prática profissional, constitui um dos principais temas de interesse em diversos estudos. Para ele, importa saber em que consiste o conhecimento do professor, qual a sua natureza, como os conhecimentos se desenvolvem e qual a sua relação entre conhecimentos e prática profissional. Os estudos relacionados com os conhecimentos dos futuros professores e dos professores em exercício são colocados por Llinares e Krainer (2006) como importantes para que possamos entender as aprendizagens dos professores. Concordamos que existe uma estreita ligação entre conhecimentos e aprendizagens, de forma que, muitas vezes não conseguimos separar o que representa cada um. Serrazina (2003) faz considerações sobre o que o futuro professor deve saber de matemática, mas sabemos que isso deve acontecer com todos os professores que ensinam matemática. Ela, ao comentar Débora Ball, aponta que o futuro professor necessita ter uma profunda compreensão da matemática, e essa compreensão não pode ser limitada ao conhecimento tácito de como saber fazer. No entanto, defende o conhecimento que permite o professor falar sobre a matemática, além de descrever os passos para algum algoritmo, mas com a capacidade de explicar os significados utilizados e as relações e procedimentos. Serrazina (2003) aponta alguns conhecimentos pedagógicos matemáticos quando afirma que os professores devem ser capazes de: Ter em conta, a todo o momento da atividade matemática, o conhecimento matemático previamente adquirido pelos seus alunos; Priorizar as experiências dos alunos, procurando que desenvolvam uma aprendizagem da matemática baseada na ação e na reflexão; Contextualizar as atividades de aprendizagem da matemática de modo que os conhecimentos que pretende que os alunos adquiram sejam significativos; Incluir as atividades de ensino/aprendizagem da matemática em situações educativas mais amplas que lhes dêem significado e onde as explicações do professor façam sentido; Apresentar os conteúdos matemáticos de forma relacionada, integrada e recorrente em diferentes níveis de elaboração, pois na 52 verdade não se aprende de uma vez por todas (SERRAZINA, 2003, p. 69). Os artigos de Llinares (1999) e de Marcelo Bairral (2003) resumiram ideias de várias pesquisas sobre conhecimento profissional dos professores, colocando a variedade de classificações e a importância em se estudar e analisar como, historicamente, foram sendo construídas essas teorias para investigações sobre a formação de professores e sua direta relação com o conhecimento profissional docente. Bairral (2003) realizou um estudo teórico que contribuiu com nossa pesquisa no que diz respeito a conhecer diferentes abordagens dadas pelos pesquisadores ao investigarem conhecimento profissional dos professores, com isso, decidimos que vamos organizar nossas escolhas no que Shulman (1986) realizou sobre conhecimentos, com algumas adaptações. Fennema e Franke (1992) também abordam o tema sobre os conhecimentos dos professores e seus impactos e esclarecem que não podem separar conhecimentos de crenças e concepções. Nesse trabalho, as autoras fazem uma revisão de muitos estudos que possuem abordagem nos conhecimentos dos professores em matemática e de sua importância para a sala de aula por ter influência direta em como os professores selecionam e aplicam os conteúdos nas aulas. Fennema e Franke (1992) estudam também conhecimentos das representações matemáticas e conhecimentos gerais dos professores sobre ensino. Abordam a estrutura e os modelos cognitivos sobre conhecimentos dos professores, apontando caminhos para as pesquisas nesse enfoque. Em diferentes momentos, as autoras comentam as ligações entre conhecimentos e crenças e concepções, relacionando-os com os aspectos afetivos. Em nossa pesquisa vivenciamos essa constatação das autoras e ao percebermos as interseções entre os diferentes conhecimentos que professores possuem com suas crenças e concepções. Comentamos não acreditar que podemos isolar aspectos cognitivos dos afetivos, porém abordálo-emos em tópicos com destaques separadamente, mas com a consciência de que, na prática, eles estejam se influenciando mutuamente. 53 Para nossa pesquisa utilizaremos a seguinte categorização dos conhecimentos dos professores: o Conhecimento dos Conteúdos Matemáticos: o que se relaciona com a apropriação dos conceitos matemáticos pelos professores e seleção dos conteúdos matemáticos ensinados. o Conhecimento Pedagógico: modos como os professores abordam o trabalho dos conteúdos em sala de aula, assim como se apropriam do contrato didático. o Conhecimento Pedagógico Matemático: modos como os professores trabalham conteúdos específicos de matemática com seus alunos. o Conhecimento do Currículo de Matemática: organização dos conteúdos matemáticos pelo professor. o Conhecimento dos Alunos: que se relaciona às aprendizagens, ao aspecto emocional e cognitivo dos alunos. 2.2 Ensino, aprendizagem e avaliação de conteúdos matemáticos: construindo possibilidades Vários conceitos e conteúdos matemáticos foram abordados durante este estudo longitudinal. Alguns, em profundidade; outros, superficialmente, como curiosidades ou desafios para nós, enquanto participantes de um grupo de estudos. As possibilidades de abordagens foram se construindo ao longo desse processo. As demandas do grupo surgiam em um entrelaçamento dos trabalhos educacionais realizados pelas professoras Susana e Beatriz, com a volitude e a necessidade do grupo em estudar tais conceitos e conteúdos matemáticos. 54 Dentre as possibilidades de aprofundamento nos conceitos e nos conteúdos matemáticos destacaram-se nos nossos incidentes críticos ou significativos13 a geometria e a resolução de problemas envolvendo as operações fundamentais (adição, subtração, multiplicação e divisão). Ressaltamos a importância desses conteúdos nas séries iniciais como campos de conhecimentos fundamentais para a construção do edifício matemático. Notamos isso nas propostas apresentadas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN‟s, nas abordagens dos livros didáticos, além das diferentes pesquisas sobre esses assuntos. Por esse motivo, discorremos sobre esses assuntos, destacando nossos estudos e os principais autores que nos permitiram tanto contextualizar a pesquisa, quanto entender e interagir com os dados obtidos na mesma. 2.2.1 Geometria: janela descoberta A geometria está presente a nossa volta, no mundo que nos cerca, porém, muitas vezes não a percebemos, ela representou nossa „janela descoberta‟. Com a abertura dessa janela, pudemos vislumbrar outros horizontes de nossa própria aprendizagem e em aulas de matemática. Normalmente, a formação em geometria não tem sido satisfatória nas últimas décadas. Um forte fator que provocou o afastamento da geometria do ensino e aprendizagem da matemática foi o Movimento da Matemática Moderna por ocasionar mudanças nos currículos escolares de matemática (MIORIM; MIGUEL; FIORENTINI, 1993; MIGUEL; FIORENTINI; MIORIM, 1992; PAVANELLO, 1993). Desde esse movimento foram ocorrendo também alterações no currículo dos cursos de licenciatura em matemática nas diferentes universidades brasileiras. E em muitos cursos de licenciatura, desde a década de 1970, os professores de matemática se formaram sem ter estudado em profundidade conhecimentos de geometria euclidiana. Nos currículos escolares, a geometria foi aparecendo 13 Os incidentes críticos ou significativos e a escolha da geometria e da resolução de problemas serão detalhados no capítulo 4. 55 sempre na lista de conteúdos como um dos últimos e os livros didáticos, algumas vezes como referência central para o professor, reforçou essa afirmação. Algumas pesquisas mostram professores que não aprenderam geometria quando estudantes e por isso são inseguros ao abordar o assunto em aulas de matemática (PAVANELLO, 2004). Um desses motivos foi que o ensino da geometria sofreu um „abandono‟, após o Movimento da Matemática Moderna, no qual o ensino de álgebra se tornou central. Outro motivo foi a falta de preparação dos professores, quanto ao desenvolvimento dos conteúdos geométricos pela deficiência da formação (FRAGA, 2004; MIORIM; MIGUEL; FIORENTINI, 1993; MIGUEL; FIORENTINI; MIORIM, 1992; PAVANELLO, 1993). Não pretendemos nos aprofundar nesse assunto, mas apenas citar o fato, pois influenciou na formação de uma geração e em especial, na formação das professoras participantes em nosso grupo. Já existem pesquisas comprovando que, nos últimos anos, tem ocorrido uma tentativa de resgate desse conteúdo nas aulas de matemática e em formações iniciais e continuadas, de uma maneira diferenciada (MIORIM; MIGUEL; FIORENTINI, 1993; NACARATO; PASSOS, 2003). Concordamos que uma formação deficitária, relativa à geometria, seja na formação escolar básica ou na licenciatura, pode gerar maior dificuldade posterior em ensinar geometria, principalmente por aqueles que não se sentem atraídos ou encantados com essa parte da matemática ou desejam conhecê-la por conta própria. Percebemos e confirmamos em algumas pesquisas, como a de Nacarato e Passos (2003), que, durante a trajetória estudantil, professores não estudaram de maneira adequada conteúdos de geometria, principalmente os que atuam nas séries iniciais. Esse fato pôde ter influenciado professores na valorização e ensino dessa área, já que concordamos com Lorenzato (1995) quando afirma que quem não aprendeu geometria pode ter dificuldade em ensiná-la. Quanto à geometria, fazemos uma crítica aos PCN‟s, pois indicam a necessidade de um trabalho com a geometria nas séries iniciais, porém não 56 colocam orientações mais diretivas de como realizá-las, talvez em forma de exemplos como atividades para os professores utilizarem em aulas, como fez com as quatro operações. Os PCN‟s afirmam que “a geometria é um campo fértil para se trabalhar com situações-problema e é um tema pelo qual os alunos costumam se interessar naturalmente” (BRASIL, 1997, p. 55 - 56). Além disso, também está explícito que o trabalho com a geometria contribui para a aprendizagem de aritmética e vice-versa. Evidenciam os conhecimentos matemáticos em detrimento aos conhecimentos pedagógico matemáticos sobre geometria. Entretanto, na parte em que estabelece algumas orientações didáticas, o quantitativo maior é nas quatro operações, colocando exemplos e algumas ideias que essas envolvem. As que envolvem geometria se restringem a apresentar algumas sugestões sobre como a criança inicia o aprendizado da geometria, porém, sem nenhuma contribuição para o conhecimento pedagógico matemático de geometria. Sabemos que já existem estudos e livros que trazem diferentes ideias e atividades sobre a geometria trabalhada nas séries iniciais, mas não são indicados nos PCN‟s como orientações para o trabalho da geometria em sala de aula. Acreditamos que apenas mencionar a importância da geometria em documentos oficiais não favorece efetivamente o ensino da geometria, precisamos envolver os professores a participarem de discussões e de projetos de formação continuada sobre o assunto, tanto da parte teórica como da prática pedagógica desse conteúdo (NACARATO; PASSOS, 2003). Deduzimos ser também isso um reflexo da visão coletiva de muitos professores, os quais acreditam que, nas séries iniciais, o mais importante é ensinar os números e o processo de contagem com as quatro operações. Abordamos, nesta seção, algumas considerações sobre a formação de conceitos geométricos, pois isso contribuirá para nossas discussões sobre a aprendizagem e a (re) construção desses conhecimentos pelas professoras participantes e por seus alunos. Alguns autores, como Broitman e Itzcovich (2006), levantam questionamentos sobre diferenças e semelhanças entre conhecimentos do nosso espaço tridimensional e conhecimentos geométricos 57 que são estudados na escola. Eles apontam, principalmente, para o fato de que aprendemos alguns conhecimentos sobre o espaço, de forma espontânea e que, normalmente, não são abordados em sala de aula. Neste trabalho destacamos uma maneira de contribuir para a construção sobre conhecimentos geométricos por meio da formação de professores. Instigando esses professores para que possam pensar e elaborar atividades que contribuam para a construção desses conhecimentos por parte dos alunos. Questionamonos o „para quê‟ se ensinar geometria nas séries iniciais e concordamos com a síntese realizada por Broitman e Itzcovich (2006), a fim de explicar os objetivos desse ensino. Eles afirmam que o ensino da geometria fundamental pode apontar para dois grandes objetivos. Em primeiro lugar, para a construção de conhecimentos cada vez mais próximos de “porções” de saber geométrico elaborados ao longo da história da humanidade. E, em segundo lugar, e talvez seja o mais importante, para a iniciação de um modo de pensar próprio do saber geométrico. Ambos os objetivos estão intimamente imbricados (BROITMAN; ITZCOVICH, 2006, p. 175). Rina Hershkowitz (1994a)14 aprofunda discussões sobre aspectos psicológicos de aprendizagem em geometria, chamando a atenção para a formação de conceitos geométricos. Ela inicia, fazendo referência às pesquisas e às suas teorias que envolvem o assunto. Essa autora cita Piaget e sua teoria de concepção do espaço para a criança, principalmente, a questão da percepção e da representação. Hershkowitz (1994a) comenta também sobre a teoria de Van Hiele e suas fases de ensino, e porque o seu objetivo é a construção da geometria como uma estrutura dedutiva. Após essa reflexão, ela se refere a alguns pontos que precisam ser abordados para a formação dos conceitos geométricos, e os quais destacamos na sequência. Quando comentamos sobre ensino da geometria, deparamo-nos com a questão da visualização. Para Hershkowitz (1994a, p. 9), a “visualização 14 Os artigos utilizados dessa autora foram retirados do BOLETIM GEPEM 32 e foram resultados de traduções realizadas em trabalhos trazidos por Hershkowitz para um curso intitulado “Ensino e aprendizagem da geometria”, realizado na Universidade de Santa Úrsula em 1993. Logo a data dos artigos originais pode ser diferentes da apresentada neste trabalho. Quando tivermos acesso a essa informação, indicaremos no texto. 58 geralmente se refere à habilidade de representar, transformar, gerar, comunicar e refletir sobre informação visual”. Acrescenta ainda, que a visualização se torna importante porque envolve tipos de processos mentais que são necessários na geometria e em outras áreas da matemática. Nacarato e Passos (2003) também exploram a questão da visualização para situações de ensino da geometria, em função de ser um dos elementos que envolvem o processo de representação. Essas autoras chamam a atenção para o fato de que, na educação matemática, a visualização pode ser tratada com outros termos considerados equivalentes, como imagem mental ou pensamento espacial. Neste trabalho, preferimos utilizar visualização para representar essa habilidade de pensar em termos de imagem mental (NACARATO; PASSOS, 2003; CLEMENTS; BATTISTA, 1992). Hershkowitz (1994b, p. 45) ressalta que o papel da visualização no desenvolvimento dos conceitos geométricos possui complexidade e atua em duas direções que são opostas. Uma é que, para formar a imagem de um conceito e de seus elementos utilizamos da visualização ou identificação de seus elementos. E a outra é que a limitação a esses elementos visuais empobrecem a imagem conceitual. Precisamos trabalhar de forma que os alunos tenham uma imagem mental dos objetos geométricos, utilizando-se de diferentes sentidos e conhecimentos para realizar experiências no ambiente em que vivemos, pois estamos rodeados de formas geométricas na natureza e outros objetos construídos pelos seres humanos. Além de valorizarmos os processos de argumentação e provas que devem começar a serem construídos nas séries iniciais. Para trabalhar a formação de conceitos geométricos básicos, Hershkowitz (1994a) faz uma distinção entre conceito e imagem conceitual. Sendo o conceito decorrente de sua definição matemática, e a imagem conceitual - o conceito conforme está refletido na mente do indivíduo -, “resultado dos processos mentais de formação do conceito” (p. 15). Ela chama a atenção para o fato de que podemos considerar boa parte da estrutura dos conceitos básicos de geometria como „conjunção‟ de atributos relevantes. Para Hershkowitz 59 (1994a), os conceitos possuem atributos relevantes e atributos não críticos que devem ser trabalhados para a formação de exemplos e de contra-exemplos. Ela faz a seguinte diferenciação: O conceito é derivado de sua definição matemática e desta forma, possui atributos relevantes (críticos) – aqueles atributos que devem ser satisfeitos para termos um exemplo positivo do conceito – e atributos não críticos – aqueles atributos que apenas alguns dos exemplos possuem. A própria definição verbal geralmente inclui um subconjunto mínimo dos atributos relevantes suficientes para definir um conceito. A definição portanto pode ser considerada como um critério para instâncias de classificação entre exemplos conceituais positivos ou negativos. Os exemplos negativos (os contra-exemplos) que são relevantes para o ensino e para as pesquisas sobre a formação do conceito são aqueles que possuem alguns, mas não todos os atributos relevantes (HERSHKOWITZ, 1994a, p. 16). A formação dos exemplos e contra-exemplos foi trabalhada por nós durante a pesquisa, uma forma de contribuir para a identificação e compreensão das conjunções dos atributos relevantes na formação dos conceitos geométricos pelas professoras. Destacamos, nas análises, alguns momentos em que provocamos esses atributos, juntamente com a visualização. Em relação à construção do saber geométrico, existe certo acordo entre os diferentes pesquisadores sobre o estudo, das propriedades das figuras e dos sólidos, se iniciar nas primeiras séries (BROITMAN; ITZCOVICH, 2006; HERSHKOWITZ; BRUCKHEIMER; VINNER, 1994) e, com isso a introdução do pensar geométrico. Hershkowitz (1994a) revela algumas implicações para o ensino da geometria, destacando algumas características das estratégias de ensino. Para ela, existe (a) Falta de completude, na qual apenas parte dos exemplos e atributos são apresentados; (b) falta de consciência, como também ausência do conhecimento de elementos adicionais (Hershkowitz et 15 al., 1987 ) por parte do professor ou até mesmo dos livros didáticos (ou material didático); (c) falta de consciência das dificuldades do 15 HERSHKOWITZ, R.; BRUCKHEIMER, M.; VINNER, S. Activities with teachers based on cognitive research. In: LINDQUIST, M. M.; SHULTE, A. P. (ed.) Learning and teaching geometry k-12. Reston, VA: National Council of Teacher of mathematics, 1987. Com tradução para o português com a seguinte referência: HERSHKOWITZ, R.; BRUCKHEIMER, M.; VINNER, S. Atividades com professores baseadas em pesquisas cognitivas. In: LINDQUIST, M. M.; SHULTE, A. P. (ed.) Aprendendo e ensinando geometria. Tradução de Hygino H. Domingues. São Paulo: Atual, 1994. 60 aluno e dos conceitos errôneos na construção destes conceitos; e (d) generalização dos atributos do conceito (definições) realizada (se tanto) pelo professor ou pelo material pedagógico, com o aluno sendo visto meramente como um simples receptor passivo (HERSHKOWITZ, 1994a, p. 20). Essa mesma autora, em outro artigo, resume essas características de ensino em incompletude, quando apenas alguns poucos exemplos são utilizados pelos professores ou em situações não formais, e, no desconhecimento ou inconsciência do professor ou dos livros didáticos de outros elementos (HERSHKOWITZ, 1994b; HERSHKOWITZ; BRUCKHEIMER; VINNER, 1994). No ensino da geometria nas séries iniciais aparecem tanto a incompletude como o desconhecimento. Um dos fatores para essa afirmação é que esses conhecimentos não foram explorados de maneira adequada em sua formação, nem na educação básica e nem nos cursos de licenciatura ou pedagogia. Além disso, no momento de ensinar geometria, nas primeiras séries, ocorre muitas vezes incompletude e desconhecimento por causa de falta desses conhecimentos nos professores, não se sentindo confortáveis para ensinar aquilo que não está bem construído em suas mentes (HERSHKOWITZ, 1994b). Isso se reflete na aprendizagem dos alunos em relação à geometria. Precisamos realizar ações para que professores, em formação inicial ou continuada, possam ter oportunidades de vivenciar situações da prática pedagógica que contribuam para a formação do seu próprio pensamento geométrico (NACARATO; PASSOS, 2003). 2.2.2 Resolução de problemas envolvendo as quatro operações: olhando diferentemente por essa janela A resolução de problemas foi um tema abordado em grande parte dos nossos encontros. Por esse motivo, identificamo-la como um tópico ao qual precisávamos dar a devida atenção. Sabemos que é possível haver resolução 61 de problemas vinculada a vários conteúdos matemáticos, porém, neste trabalho restringir-nos-emos a apresentá-la relacionada com as quatro operações fundamentais de adição, subtração, multiplicação e divisão. Os conceitos matemáticos estão relacionados com o conhecimento de matemática dos professores, o que eles sabem sobre cada conceito ou definição, o que e de que forma valorizam tal conhecimento, como identificam cada conceito ou definição e sua relação com os demais conhecimentos matemáticos. Já existe um grande número de autores que estudam a formação de professores e sua relação com alguns conteúdos matemáticos (LOPES, 2003; PAVANELLO, 2004), outros abordam os conteúdos com suas formas de abordagens (LORENZATO, 2006; LORENZATO, 2006; NUNES et al., 2005; PANIZZA, 2006; SAIZ, 1996) e a relação desses com as interações entre professores e alunos (CARRAHER, 1986; CARRAHER, CARRAHER e SCHLIEMANN, 1988; MUNIZ, 2004). Por meio dessas leituras, observamos como alguns dos conceitos matemáticos colocados, anteriormente, foram abordados por outros professores e pesquisadores, e ainda, como esses trabalhos contribuiriam para nossa investigação. As operações fundamentais de adição, subtração, multiplicação e divisão também ganharam destaque em nossas discussões e no que foi observado em sala de aula. Notamos, entretanto, que estavam normalmente envolvidas por situações-problema e em suas resoluções. Por isso, decidimos abordá-la, conjuntamente, com a resolução de problemas. Mesmo sendo uma abordagem e conteúdo amplamente trabalhado pelas professoras, olhamo-la, diferentemente, e percebemos que solicitava a apreendermos alguns conceitos que envolvem as operações fundamentais de maneira aprofundada e diferenciada. Olhando através dessa janela, ampliamos nossos horizontes, aprendemos e identificamos novas propostas. 62 Resolução de problemas Ao estudarmos sobre resolução de problemas, constatamos que ela sempre esteve presente na matemática, mas, pesquisadores somente começaram a investigá-la de maneira sistemática na década de 1970 (ONUCHIC, 1999; ONUCHIC; ALLEVATO, 2004; STANIC; KILPATRICK, 1989). Também notamos que essa atividade é algo complexo e envolve várias capacidades cognitivas, conforme Lester (1993) nos aponta ao comentar que: A resolução de problemas é uma actividade que requer que um indivíduo se envolva numa variedade de acções cognitivas cada uma das quais exigindo algum conhecimento e capacidade. Além disso, estas acções cognitivas são influenciadas por factores não cognitivos. Ou seja, pela sua natureza mais intrínseca, a resolução de problemas é uma forma extremamente complexa de desafio que envolve muito mais do que o simples recordar de factos para a aplicação de procedimentos bem aprendidos. Além do mais, a capacidade para resolver problemas de Matemática desenvolve-se lentamente ao longo de um período muito alargado de tempo porque o seu sucesso depende de muito mais do que os conhecimentos de conteúdos. O desempenho em resolução de problemas parece ser uma função de pelo menos cinco categorias alargadas e interdependentes de factores: (1) aquisição e utilização de conhecimentos; (2) controlo [sic]; (3) concepções; (4) factores do domínio afectivo; e (5) contextos sócio-culturais. Estas cinco categorias intersectam-se (e.g., não é possível separar completamente factores do domínio afectivo, concepções e contextos sócio-culturais) e relacionam-se numa variedade de formas tão vasta [...] (LESTER, 1993, p. 24-25). Admitimos estarem presentes nas práticas dos professores esses fatores, portanto, devemos atentar para a não simplificação da resolução de problemas como a um simples fato de buscarmos uma resposta a um problema proposto. Precisamos investigar o contexto nos quais professores e alunos estão envolvidos, suas crenças, seus conhecimentos matemáticos e o domínio afetivo ao se resolverem problemas em aulas de matemática. Neste trabalho, nos restringimos a situar o leitor sobre as três diferentes abordagens, com resolução de problemas em educação matemática, pois, estudos mais detalhados já podem ser encontrados na literatura específica da área (ONUCHIC; ALLEVATO, 2004; SANTOS, 1993; SANTOS-WAGNER, 2008; SCHOENFELD, 1992; STANIC; KILPATRICK, 1989). 63 Uma das vertentes apontadas por Onuchic e Allevato (2004, p. 220) é a “metodologia de „Ensino-aprendizagem de Matemática através da Resolução de Problemas‟ (grifo nosso), que se constitui num caminho para ensinarmos matemática através da Resolução de Problemas”. Nessa metodologia, inicia-se o trabalho da matemática com problemas, utilizando resolução de problemas fazendo conexões entre os conteúdos e para desvelar conceitos matemáticos a serem explorados (SANTOS-WAGNER, 2008). Nesse caso, não apenas ensinamos a resolver problemas, mas partimos de problemas para ensinar matemática. Assim, havemos de considerar que “a aprendizagem será uma consequência do processo de Resolução de Problemas” (ONUCHIC; ALLEVATO, 2004, p. 221). Os PCN‟s (BRASIL, 1997) apontam esse caminho como proposta para um trabalho que coloque como foco do processo de ensino e aprendizagem, a resolução de problemas. Em outra abordagem do ensino sobre resolução de problemas, professores e alunos aprendem caminhos de como resolver problemas de maneira mais sistemática. Alguns professores focalizam no uso de algumas estratégias para resolver problema, diferenciando os problemas e classificando-os segundo modelos. Ensinam o conceito matemático para depois trabalharem os problemas modelos com os alunos. Indicam, sistematicamente, como se resolvem os problemas, nem sempre valorizando o processo de pensar próprio de cada aluno. Santos-Wagner (2008) exemplifica que o papel do professor nessa abordagem, muitas vezes restringe ao uso dos quatro passos de Polya, pois o professor preocupa-se em exemplificar e exercitar com os alunos as estratégias de resolução de problemas e as quatro fases para a resolução de Polya. [...], que são: leitura e compreensão do problema; planejamento e implementação de ações para resolver o problema; tentativa de resolução segundo os planos identificados; verificação da solução e análise da solução (SANTOS-WAGNER, 2008, p. 58-59). A terceira abordagem é a do ensino para a resolução de problemas, na qual ao ensinarmos matemática, esperamos que os alunos utilizem, em diferentes situações, o que foi aprendido na resolução de problemas. Por conseguinte, 64 num momento final do processo de ensino, “o professor propõe aos alunos uma série de atividades denominadas problemas, onde, na verdade, uma grande parte são, de fato, exercícios para praticar e fixar os conceitos e procedimentos explorados e estudados em aulas” (SANTOS-WAGNER, 2008, p. 59). Aqui aparece o questionamento sobre o que é um problema e sua diferença de atividades. Consideramos, como problema, uma situação na qual o sujeito precisa buscar solução, mas que não conhece todo o percurso ou a estratégia necessária para seguir e solucionar tal situação (CHARLES; LESTER, 198216 apud SANTOS-WAGNER, 2008; KRULIK; REYS, 1997/1980). Temos ciência de que a terceira abordagem de ensino foi e continua sendo o que aparece nos livros e o qual os professores fazem inicialmente em sala de aula. Já o ensino sobre resolução foi iniciado e ampliado depois que o livro de Polya foi divulgado. E o ensino através da resolução de problemas aparece como uma abordagem mais abrangente e dinâmica e também nessa abordagem percebe-se como é importante que o professor também trabalhe com as outras duas abordagens também. Indicamos que não devemos valorizar apenas uma dessas abordagens, mas utilizar a que mais convir para a situação proposta. Pois, quando um professor limita somente a uma dessas abordagens, empobrece a aprendizagem de seus alunos, pois não possibilita que ele tenha acesso a outras formas de olhar e utilizar a resolução de problemas. A terceira abordagem foi a que mais esteve presente nas práticas em aulas de matemática. Não podemos afirmar que, em nossos encontros, predominou esse ou aquele enfoque, pois, discutimos sobre resolução de problemas e de maneira a atender demandas trazidas pelas professoras. Porém, não abordamos a resolução de problemas como um meio para ensinar determinado conteúdo e, sim, como discussão de conceitos matemáticos e diferentes formas de abordagens em sala de aula. 16 CHARLES, R.; LESTER, F. Teaching problem solving: What, why and how. Palo Alto, CA: Dale Seymour Publications, 1982. 65 Tivemos em alguns encontros discussões sobre a segunda abordagem, inclusive, com estudo de um texto sobre o assunto, levado pela professora Lucia. Porém, o que se destacou nos debates e o que apresentamos em nossas análises foram momentos de reflexão e trocas sobre resolução de problemas. Em alguns tópicos mostramos algumas estratégias utilizadas pelas professoras para ajudarem seus alunos a resolver problemas, mas, sem que atendessem, rigorosamente, os passos sugeridos por Polya ou por outro matemático para esse fim. O que ocorreu durante as aulas aconteceu de uma forma mais ampla e sem se vincular a um autor específico, e de uma maneira muito particular pelas professoras. Concordamos com diferentes autores quando afirmam que o papel do professor é importante para o desenvolvimento dos processos de ensino e aprendizagem de matemática, utilizando resolução de problemas. São as crenças e atitudes do professor que nos fornecerão indícios sobre como esses trabalham a resolução de problemas em suas salas de aulas. Isto está de acordo com o que Lester (1993) comentava sobre a interconexão das cinco categorias que envolvem os conhecimentos: o controlo; o domínio afetivo; as crenças; as concepções; e o contexto sociocultural, quando falava sobre resolução de problemas nas pesquisas desenvolvidas nos Estados Unidos. Brito (2006, 2006a) aponta algumas atitudes que professores precisam utilizar para que possamos compreender como se dá o processo de resolução e pensamento dos alunos, em relação ao problema proposto. Assim, cabe ao professor a função de mediador entre o ambiente e os sujeitos da aprendizagem, buscando conhecer e integrar as diferentes formas de pensamento, usando essas maneiras diferentes de pensar para mostrar a importância da reflexão sobre os processos mentais. O professor deve propor questões e atividades que motivem o estudante e, para isso, os problemas propostos devem despertar a atenção do aluno, engajá-lo na tarefa e ser visto como um desafio para o pensamento. Ao final, os estudantes devem ser solicitados a justificar oralmente ou por escrito, individualmente ou em grupo, os diferentes procedimentos empregados, as ideias utilizadas e as descartadas e o que aprenderam na atividade (BRITO, 2006a, p. 4748). Uma estratégia metodológica utilizada nas resoluções de problemas foi sugerir aos alunos que utilizassem diferentes representações. Passamos então a 66 mostrar um pouco do que e por que escolhemos o uso de diversas representações como um procedimento de ensino. Observamos que para o trabalho referente aos conceitos matemáticos, os professores precisam ajudar os alunos a utilizar diferentes representações. O uso de representações costuma enfatizar os materiais manipulativos, porém, devemos sugerir que crianças façam representações espontâneas para tentarem resolver problemas (SELVA; BORBA, 2005). Muitas vezes, as pessoas, em especial os alunos, possuem a crença de que a resolução de problemas deve ser realizada para responder ao questionamento do problema com uma única resposta (SANTOS, 1997). Nós, professores, algumas vezes reforçamos essa crença quando trabalhamos em nossas aulas de matemática, apenas, com problemas desse tipo. Outras vezes, não valorizamos as diferentes respostas e alternativas dadas pelos alunos. Agindo dessa forma, não mostramos a riqueza existente em procurar soluções por caminhos diferenciados. Com isso, não motivamos nossos alunos a buscar mais de uma alternativa de resolução, nem a pensar em diferentes representações para seus raciocínios quando resolvem problemas matemáticos. Notamos que, normalmente, alunos copiam a resolução exposta pelo professor durante a correção, ignorando muitas vezes sua própria solução (SANTOS-WAGNER; SILVA, 2009). Com isso, nós, professores, pouco contribuímos para o crescimento e a segurança do nosso aluno ao resolver problemas. Em verdade, precisamos ajudar nossos alunos a valorizar suas estratégias de solução e a entender como os colegas resolvem os mesmos problemas. Para que possam assim, perceber a diversidade, riqueza e amplitude que um problema pode ter em suas soluções. Concordamos com Nunes et al. (2005), ao esclarecerem que os professores precisam encontrar maneiras com que os alunos registrem suas estratégias de resolução de problemas para que elas possam ser discutidas, validadas e comparadas entre si. A explicação do raciocínio ajuda o aluno a compreender melhor suas próprias estratégias e ajuda o professor na tarefa de oferecer feedback e propor situações que levem o aluno a novas formas de abordar o problema (NUNES et al., 2005, p. 68). 67 Nós, professores que ensinamos matemática, identificamos e reiteramos o quanto mais precisamos estudar sobre a resolução de problemas, a fim de melhor ajudarmos nossos alunos. Refletir sobre nossas práticas com a resolução de problemas, quais abordagens utilizamos, de que forma as realizamos e como podemos adequar essas práticas e nossas atitudes para contribuirmos com uma visão mais ampla, relacionando-a a resolução de problemas, para assim melhor serem discernidas por parte do aluno. Operações fundamentais O trabalho de Abrantes, Serrazina e Oliveira (1999) destaca que as operações fundamentais de adição, subtração, multiplicação e divisão representam uma extensa área de aprendizagem nas séries iniciais. Esse fato ocorre em outros países assim como acontece no Brasil (BRASIL, 1997, CARRAHER; CARRAHER; SCHLIEMANN, 2003/1988; SELVA; BORBA, 2005; VASCONCELLOS, 1998). Confirmando essa hipótese, em nossas discussões em grupo, estiveram destacadamente presentes questões referentes às operações fundamentais. Percebemos que as quatro operações são trabalhadas de forma intensa pelas professoras das séries iniciais, porém não temos informações sobre a compreensão dessas operações por parte das crianças. Podemos afirmar, pela nossa experiência, que professores de matemática, que atuam com as séries finais do ensino fundamental, questionam a compreensão dos alunos sobre essas operações fundamentais. Porém, não sabemos se os mesmos professores licenciados em matemática possuem, eles próprios, uma compreensão clara e completa das ideias subjacentes a cada operação fundamental. O que percebemos, a partir de um trabalho em grupo de estudos, como o formado pela professora Vânia e citado anteriormente, é que alguns professores não possuem clareza quanto às várias ideias que envolvem a adição, a subtração, a multiplicação e a divisão. Porém, isso não é foco deste trabalho e não abordamos neste texto. Queremos apenas levantar alguns questionamentos: Os cursos de licenciaturas em matemática ou em pedagogia conseguem fazer conexões entre os conteúdos estudados 68 com essas ideias iniciais das operações fundamentais? Os professores de matemática têm conhecimento dessas ideias que envolvem as operações? Os professores conseguem compreender como seus alunos constroem esses conceitos matemáticos? São esses quesitos provocações para outras pesquisas já que não tivemos a oportunidade de investigá-las de forma rigorosa em nosso trabalho. Em alguns casos, as crianças sabem realizar os algoritmos, mas não compreendem o que fazem; realizam a operação, mecanicamente. Concordamos com algumas pesquisas, quando apontam que, compreender uma operação vai além de saber utilizá-las, mas “é ter a percepção de suas propriedades, perceber as relações existentes entre elas e ter um entendimento intuitivo do efeito de uma operação num par de números” (NCTM, 199117, apud JESUS, 2005, p. 93). A autora Ana Maria Jesus (2005) amplia essa discussão, pontuando questões de devem permear a compreensão das operações pelos alunos, conforme vemos a seguir: Crianças com uma sólida compreensão das operações estão aptas a usá-las significativamente e com flexibilidade. [...] contrariamente, aprender regras e procedimentos sem entendimento pode provocar sérias consequências a longo prazo e que não se vêem imediatamente. Se os procedimentos são aprendidos como peças soltas de informação sem conexão com o conhecimento conceptual, os alunos tem maior dificuldade de os relembrar e transpor para os outros contextos (JESUS, 2005, p. 93). Harmonizamo-nos com o que a autora afirmou e ampliamos nossa discussão para o fato de entendermos que professoras que não construíram essa sólida compreensão também possuem dificuldades ao trabalhar esses conteúdos com seus alunos. Por esse motivo, estávamos cientes de que ampliando nossas discussões com as professoras estaríamos contribuindo para um entendimento de todas nós sobre essas operações e sobre a cognição que as envolvem. Percebemos, ao longo de nossas discussões, que cada uma de nós não tinha clareza de todos os aspectos e sentidos de cada operação fundamental. 17 NCTM. Normas para o Currículo e a Avaliação em Matemática Escolar. Lisboa: APM e IIE, 1991. 69 Para trabalharmos com números e as quatro operações nos encontros, utilizamos vários livros como: os do projeto Fundão - o livro de Avaliação de Vânia Santos (1997) e o livro sobre Números de Santos e Rezende (1996); o livro de Terezinha Nunes et al. (2005); alguns livros didáticos como os de Bigode e Gimenez (2005); e a revista Nova Escola, especial Matemática (2007). Também utilizamos textos específicos para trabalhos com as quatro operações e indicamos quais foram estudados nos encontros. Separamos as operações fundamentais em duas partes, conforme vem sendo trabalhada por vários autores: adição e subtração ou campo aditivo; e multiplicação e divisão ou campo multiplicativo. Essas ideias foram trabalhadas por autores como Piaget, Constance Kamii e por Vergnaud. Neste trabalho não abordamos de maneira aprofundada o que cada um desses autores investigou e a forma como foi realizado. Apenas, vamos apontar as ideias referentes a cada operação, e sua ligação com as demais para situarmos nossas discussões sobre o assunto. Logo, fizemos uma explanação das ideias e conceitos subjacentes às operações fundamentais, destacando suas nuances que, algumas vezes, passaram despercebidas. Adição e subtração ou Campo aditivo Evidenciamos alguns de nossos estudos realizados sobre a adição e subtração ou, simplesmente, sobre o campo aditivo. Percebemos que algumas pesquisas já têm se preocupado em como os alunos aprendem tais conceitos e como professores e pesquisadores têm tratado tal assunto (FUSON, 1992; MORO, 2004; MORO; SOARES, 2006; NUNES et al., 2005; VASCONCELOS, 1998). Karen Fuson (1992) em sua revisão sobre pesquisas, que abordam adição e subtração, mostra-nos que crianças saem da educação infantil com certo conhecimento de situações de adição e subtração as quais devemos considerar. Quando as crianças iniciam o ensino fundamental, já possuem alguma compreensão de adição e subtração, portanto, precisamos explorar 70 esse conhecimento para investigar quais procedimentos e estratégias usam para resolver os problemas. Fuson (1992) também faz uma crítica aos livros didáticos, afirmando que não abordam todas as ideias que envolvem as operações, não possibilitando assim as crianças compreenderem os diferentes significados. Concordamos com a autora e acrescentamos que, nós, enquanto professores, algumas vezes também não possuímos o cuidado de inserir, em nossas aulas, situações-problema que englobem essas diferentes ideias, inclusive, muitas vezes, também não possuímos clareza e conhecimento sobre a importância desse trabalho. Segundo os PCN (BRASIL, 1997) deve ser realizado um trabalho com as operações fundamentais, concentrando-se na compreensão dos diferentes significados de cada operação e em suas relações. Acreditamos que devemos trabalhar os problemas aditivos e subtrativos, simultaneamente, pois existem estreitas conexões entre as situações que envolvem essas operações. Muitos autores seguem as ideias organizadas nas estruturas aditivas de Vergnaud, como é o caso de estudos de Moro (2004) e da pesquisa, com crianças e professores de 1ª e 2ª séries, realizada por Moro e Soares (2006). Para esses autores, as crianças devem ser levadas ao estudo das estruturas aditivas de maneira a abordarem de problemas aditivos e subtrativos, simultaneamente, respeitando as particularidades de cada operação, mas não subordinando a subtração à adição. Eles acreditam que “o que deve, sim, ser trabalhado é o caráter oposto e/ou recíproco das duas operações” (MORO; SOARES, 2006, p. 138). Analisando as ideias que englobam as estruturas aditivas utilizadas e apresentadas por diferentes autores (FUSON, 1992; MORO; SOARES, 2006; PCN – BRASIL, 1997; VASCONCELOS, 1998) podemos realizar a seguinte separação: Num primeiro grupo, temos situações-problema associadas à ideia de combinar ou de juntar duas grandezas, para obter uma terceira; comumente, essa ideia está associada com a ação de “juntar”. 71 Operação Adição Subtração Problema Paula gosta de colecionar figurinhas. Ela tinha 5 figurinhas da turma da Mônica e 7 da Barbie. Quantas figurinhas ela tem no total? Paula gosta de colecionar figurinhas. Ela tem ao todo 12 figurinhas. Se 5 são da turma da Mônica, quantas são da Barbie? Esquema 5+7=? 12 - 5 = ? Quadro 1- Exemplos de adição e de subtração relacionados à ideia de juntar O segundo grupo trata da alteração de um estado inicial, são as situações ligadas à ideia de “transformação”. Os problemas que trabalham essa ideia também são considerados como problemas de mudança. A partir de um estado inicial, ocorre uma ação direta que causa um aumento ou uma redução naquela quantidade. Operação Problema Paula gosta de colecionar figurinhas. Ela tinha 7 figurinhas. Sua Adição mãe lhe deu mais 5. Quantas figurinhas ela tem agora? Paula gosta de colecionar figurinhas. Ela tinha 12 figurinhas. Ela Subtração deu 5 para sua irmã que também começou a colecionar figurinhas. Quantas figurinhas ela tem agora? Quadro 2 - Exemplos de adição e de subtração relacionados à ideia de transformar Esquema 7+5=? 12 - 5 = ? No terceiro grupo, temos situações-problema, ligadas à ideia de “comparação” quantificada. Os autores dividem opinião sobre esse tipo de problema. Colocamos as duas ideias que encontramos sobre isso. Alguns desses problemas são denominados de „problemas de igualização‟, porque eles envolvem mudança na quantidade de forma que as duas partes tenham a mesma quantidade. Ao mesmo tempo, em que os problemas envolvem ação, precisam de comparação entre as grandezas iniciais e finais. Operação Problema Paula e Maria gostam de colecionar figurinhas. Paula tem 12 Adição figurinhas e Maria tem 5. Quantas figurinhas Maria tem que comprar para ficar com a mesma quantidade que Paula? Paula e Maria gostam de colecionar figurinhas. Paula tem 12 Subtração figurinhas e Maria tem 5. Quantas figurinhas Paula tem que dar para seu irmão para ficar com a mesma quantidade que Maria? Quadro 3 - Exemplos de adição e de subtração relacionados à ideia de igualização Esquema 5+?= 12 12 - ? = 5 72 Outros problemas envolvem a comparação entre duas quantidades e realiza-se uma análise da diferença entre essas grandezas. Operação Problema Paula e Maria gostam de colecionar figurinhas. Paula tem 12 Adição figurinhas e Maria tem 5 a mais que Paula. Quantas figurinhas Maria tem? Paula e Maria gostam de colecionar figurinhas. Paula tem 12 Subtração figurinhas e Maria tem 5. Quantas figurinhas Maria tem a menos que Paula? Quadro 4 - Exemplos de adição e de subtração relacionados à ideia de comparação Esquema 12 + 5 = ? 12 - 5 = ? E o quarto grupo compreende situações que supõem a compreensão de que ocorreu mais de uma transformação (positiva ou negativa). Operação Esquema Problema Paula gosta de colecionar figurinhas. Paula tinha 12 figurinhas e 12 + 5 + 2 Adição ganhou de Maria mais 5. Depois ela ganhou mais 2 figurinhas de =? sua mãe. Com quantas figurinhas Paula ficou? Paula gosta de colecionar figurinhas. Paula tinha 12 figurinhas e 12 + 5 - 2 = Subtração ganhou de Maria mais 5. Depois ela perdeu 2 figurinhas. Com ? quantas figurinhas Paula ficou? Quadro 5 - Exemplos de adição e de subtração com mais de uma ideia de transformação Colocamos, anteriormente, alguns exemplos das ideias que envolvem as estruturas aditivas, mas os tipos de problemas de adição e subtração podem sofrer modificações, em relação a qual dos três elementos que envolvem a operação é desconhecido (VASCONCELOS, 1998). Isso parece natural para um adulto, mas precisamos de estruturas mentais diferenciadas para resolvermos cada situação que se apresenta. Enquanto professores, devemos estar atentos aos processos cognitivos que nossos alunos se envolvem ao resolverem os problemas e de que forma modificam essas estruturas. 73 Multiplicação e divisão ou Campo multiplicativo Em nossos estudos sobre a multiplicação e a divisão,também denominada de „campo multiplicativo‟ ou estruturas multiplicativas, percebemos a necessidade de aprofundar nossos conhecimentos, enquanto professores sobre as ideias que envolvem tais operações (CARRAHER, 1998; CORREA, 2006; CORREA; SPINILLO, 2004; GREER, 1992; NUNES et al., 2005; SAIZ, 1996; SELVA, 1998). Ao trabalharmos com as estruturas multiplicativas (multiplicação e divisão), percebemos que, normalmente, é iniciado com os alunos o significado mais simples de multiplicação que se associa com a adição de parcelas repetidas. O que queremos destacar é que esse significado pode não permitir que os alunos explorem, compreendam ou resolvam outras situações relacionadas à multiplicação, que abordamos na sequência deste trabalho. As ideias da divisão com as quais vamos trabalhar envolvem os dois significados atribuídos pela maioria dos autores que encontramos. Um significado que está associado à ação de repartir em partes iguais, ou significado de divisão equitativa ou distributiva. O outro significado de divisão está associado à ideia de quantos cabe ou divisão quotativa ou por quotas, também considerado como medida por alguns autores. Portanto, quando abordamos problemas de divisão, separamos em dois tipos: partição e quotição. É interessante destacar que a palavra quota (cota) possui significado no dicionário, já a palavra „quotativa‟ aparece como uma palavra da linguagem matemática, não estando presente nem mesmo em dicionários. Normalmente, os professores não percebem a diferença entre partição e quotição e trabalham esses diferentes tipos de problemas, sem a devida atenção às possíveis representações que podem ser feitas com cada um destes. Para aprofundar e esclarecer a diferença entre essas ideias, nós buscamos, na literatura, as definições dadas pelos autores que trabalham com o assunto. Selva e Borba (2005) fazem essa diferenciação da seguinte forma: Problemas de partição são aqueles em que é dado um conjunto maior e o número de partes em que o mesmo deve ser distribuído, o 74 resultado é o valor de cada parte. Problemas de quotição consistem em problemas em que é dado o valor do conjunto maior e o valor das quotas em que se deseja dividir o mesmo, o resultado consiste no número de partes obtidas (SELVA, BORBA, 2005, p. 55). Outros autores, como Jesus (2005), realizam essa separação entre os dois sentidos da divisão, porém utilizando outros termos. Ela comenta que um dos sentidos é o de partilhar, equitativamente, um conjunto de objetos e outra é identificar o número de grupos de uma mesma quantidade formados, a partir de certa quantidade. Dessa maneira, Jesus (2005) faz a diferenciação entre divisão por partilha e divisão por agrupamento. Ela explica cada um desses sentidos da seguinte forma: A divisão por partilha pode ser começada a realizar mais cedo, na medida em que não exige qualquer conhecimento de contagem, rebuçado [bala ou doce] a cada um até que não haja mais rebuçados, ou até que os rebuçados não cheguem para mais uma volta. Como o total é partilhado de igual modo, chama-se divisão partitiva. Na divisão por agrupamento, também considerada como medida, a criança faz agrupamentos com igual número de elementos (JESUS, 2005, p. 94). Outra questão que nos chamou a atenção durante a pesquisa foi a abordagem dada à resposta aos problemas de divisão, que pode ser exata ou inexata. Essa questão é fundamental para a compreensão do conceito de divisão, porquanto, na maioria das vezes, consideramos e identificamos a divisão como o inverso da multiplicação. Porém, isso apenas ocorre caso a divisão seja exata (ou com resto igual a zero), no caso de divisão inexata ou com resto não nulo, temos que a divisão se relaciona com a multiplicação e a adição. Na discussão sobre esse assunto, Carraher (1998, p. 77) afirma que “na verdade, matematicamente, a divisão é definida pela multiplicação e pela adição. A divisão no domínio dos números inteiros é expressa pela equação A = qB + R, onde R é menor do que B”. Por esse motivo, a divisão com resto não nulo é considerada mais complexa do que a com resto zero, e os alunos tendem a não saber como agir com relação ao resto (SELVA, 1998). Colocamos a seguir as ideias identificadas, com base em estudos sobre as estruturas multiplicativas (CARRAHER, 1998; CORREA, 2006; CORREA; 75 SPINILLO, 2004; GREER, 1992; BRASIL, 1997; NUNES et al., 2005; SAIZ, 1996; SCHILIEMANN; CARRAHER, 1998; SELVA, 1998), com os respectivos exemplos: No primeiro grupo, colocamos problemas relacionados aos grupos equivalentes. Multiplicação Divisão partitiva Divisão quotativa Matheus comprou 5 pacotes de Matheus comprou 5 Matheus comprou pacotes de figurinhas com 3 figurinhas em pacotes de figurinhas e figurinhas e agora tem 15 casa um. Quantas figurinhas agora tem 15 figurinhas. figurinhas. Se em cada pacote Matheus conseguiu com essa Quantas figurinhas tem vem 3 figurinhas, quantos compra? em cada pacote? pacotes ele comprou? Quadro 6 – Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com ideia de grupos equivalentes No segundo grupo, envolvemos situações-problema associadas ao que se poderia denominar de „multiplicação comparativa‟ ou „comparação multiplicativa‟. Multiplicação Divisão partitiva Divisão quotativa Ana possui 5 bonecas e Rosangela possui 15 Rosangela possui 15 Rosangela possui três vezes bonecas, sabemos que ela bonecas e Ana 5 bonecas. mais bonecas que Ana. tem três vezes mais bonecas Quantas vezes é que Rosangela possui quantas que Ana. Quantas bonecas a Rosangela tem a mais bonecas? Ana tem? bonecas que Ana? Quadro 7 - Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com a ideia de multiplicação comparativa Já no terceiro grupo, temos as situações-problema relacionadas à comparação entre „razões‟, envolvendo, portanto, a ideia de „proporção‟, comumente encontrada em situações cotidianas. Multiplicação Divisão partitiva Divisão quotativa Um carro se move a uma Um carro percorreu 300 km em 5 Um carro se move a uma velocidade média de 60 km horas. Se percorrer sempre à velocidade média de 60 por hora. Quantos quilômetros mesma velocidade, quantos km km por hora. Quantas esse carro percorreu em 5 andou por hora? horas demora para horas? percorrer 300 km? Quadro 8 – Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com a ideia de proporção O quarto grupo traz problemas associados à „representação retangular‟ ou a ideia de „área retangular‟. 76 Multiplicação Divisão partitiva Divisão quotativa Uma sala de aula possui 5 filas com 6 Numa sala de aula tem 30 carteiras dispostas em carteiras cada uma. Quantas crianças filas com a mesma quantidade de carteiras. Quantas 18 no máximo podem estar nessa sala? carteiras tem em cada uma das 5 filas? Quadro 9 - Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com a ideia representação retangular No quinto grupo, encontramos as situações-problema relacionadas à „combinatória‟. Multiplicação Divisão partitiva Divisão quotativa Numa sorveteria existem 5 sabores Uma sorveteria faz 15 tipos de sorvetes com diferentes de sorvete e 3 coberturas coberturas diferentes. Sabendo que essa diferentes. De quantos modos podemos sorveteria oferece 5 sabores de sorvete, fazer um sorvete de um sabor com uma quantas são as coberturas? cobertura? Quadro 10 - Exemplos de multiplicação e de divisão relacionados com a ideia de combinatória Tivemos um panorama de diferentes ideias relacionadas aos conceitos matemáticos envolvendo as operações fundamentais, aprofundamos a seguir questões referentes à avaliação em aulas de matemática. 2.2.3 Avaliação de conteúdos matemáticos Precisamos abordar, além de ensino e aprendizagem, questões referentes à avaliação, pois, sabemos que esses processos estão imbricados. Restringimonos à avaliação em aulas de matemática, pelo emprego desse tipo de avaliação em nosso trabalho. Quando Santos (1997) comenta sobre a avaliação para a sala de aula de matemática, adequada às novas mudanças e às necessidades do século XXI, ela aponta para a diferença em se trabalhar com avaliação em uma concepção de educação e ensino de matemática mais inovadora. Essa nova concepção valoriza a criatividade, a intuição e os processos de raciocínio e aquisição de conceitos (SANTOS, 1997), admitindo 18 Algumas das ideias não possuem separação entre divisão por partição ou quotição. Acreditamos que seja pela interpretação que pode ser ambígua nesses casos. 77 que o conhecimento matemático seja construído continuamente. Portanto, a avaliação não pode ser pontual, utilizando um único tipo de instrumento e ao final do processo educativo. Vários são os fatores que influenciam a aprendizagem e a construção do conhecimento matemático e é com base nisso, que Santos (1997) assevera: Neste caso a avaliação deve ser feita em vários momentos do processo educativo e deve utilizar diversos instrumentos quantitativos e qualitativos que analisem aspectos objetivos e subjetivos da aprendizagem dos alunos. Esta nova visão de avaliação serve para evidenciar o que os alunos sabem e o que não sabem durante todo o processo educativo. A avaliação ocorre em diversos momentos, em situações formais e informais, e o professor encara o processo de ensino-aprendizagemavaliação como um processo integrado à instrução e sujeito a alterações de percurso caso estas sejam necessárias (SANTOS, 1997, p. 6). Observando o professor e sua ação em relação à avaliação nessa visão mais ampla do processo de ensino e aprendizagem de matemática, Santos (1997) assenta algumas afirmações: O professor tem uma visão mais ampla do potencial dos alunos, pois os diversos instrumentos de avaliação possibilitam que os alunos demonstrem habilidades rotineiras e não-rotineiras do que foi explorado em sala de aula. Como conseqüência os alunos tornam-se mais criativos e autônomos enquanto aprendizes de matemática. O professor é uma autoridade de saber matemático, mas não é o único detentor desde saber e, portanto estimulará os alunos a validarem suas respostas e a tornarem-se mais independentes e responsáveis por seu processo de aprendizagem (SANTOS, 1997, p. 6). E acrescenta: O professor precisa estar atento para que haja coerência entre seu trabalho pedagógico e a forma de avaliação utilizados. A forma como elaboramos nossas avaliações e os critérios de correção adotados transmitem uma forte mensagem para nossos alunos sobre o que priorizamos e valorizamos em matemática (SANTOS, 1997, p. 7). Algumas funções da avaliação são destacadas por Santos (1997), evidenciamos aquela na qual ela afirma que uma dessas funções é a de desenvolver, no professor, alguns conhecimentos. Essa autora destaca o conhecimento metacognitivo, o qual o faz refletir sobre ele mesmo, enquanto professor-educador acerca dos seguintes aspectos: 78 o Pontos fortes e fracos (o que já sabe sobre como ensinar e avaliar determinado conhecimento de seus alunos e o que ainda não domina) o Auto-reflexão sobre seu conhecimento matemático e sobre seu conhecimento pedagógico de matemática (conhecimentos sobre as diferentes formas de explorar um conteúdo, sobre os obstáculos epistemológicos de aquisição de determinado conteúdo, sobre as dificuldades de ensinar este assunto e sobre as dificuldades do aluno em aprender este conteúdo) o Controle de tempo e estratégias (saber que estratégias são adequadas ou não para ensinar e compartilhar um conhecimento com seu aluno, saber quanto tempo é necessário para explorar com os alunos as dificuldades conceituais de determinado assunto, e saber verificar se utilizou ou não os caminhos apropriados para permitir que o aluno adquirisse o conhecimento que queria ensinar) (SANTOS, 1997, p. 12). Realizar avaliações com os professores sobre eles próprios levando a conhecimentos e aprendizagens, ajudou-nos a compreender o professor e seu pensamento. Acreditamos que para atender aos aspectos apresentados anteriormente necessitávamos contribuir de alguma maneira para que as professoras se conhecessem enquanto aprendizes de matemática e professoras que ensinam tal conteúdo. Precisávamos ter espaços nos quais as professoras refletissem sobre seus saberes e fazeres em aulas de matemática para realizarem uma avaliação da própria prática. Essa avaliação não acontece de maneira isolada, quando partilhada com os pares se torna mais efetiva. A avaliação que contribui para um desenvolvimento profissional deve ser crítica, formativa e continuada, pois deve ocorrer em diferentes momentos para atingir os diferentes objetivos. Assim como a avaliação dos processos de aprendizagens por parte dos alunos, não deve ocorrer de maneira isolada. Isso foi discutido por nós em diferentes momentos, a partir de situações vivenciadas nas aulas das professoras. Indicamos a importância de um olhar externo, dos amigos críticos, não para recriminar ou buscar defeitos a partir da avaliação, mas para contribuir e levantar questionamentos ou realçar pontos fortes não percebidos pelas professoras. Esse tipo de avaliação que se faz em grupo pode ser rico pela diversidade de experiências e contribuições que cada participante pode proporcionar. 79 Temos consciência que a questão da avaliação em larga escala já tem sido discutida em diferentes pesquisas há algum tempo, mas não temos ciência de pesquisas que investigaram os diferentes usos da avaliação em aulas de matemática. Acreditamos que precisamos situar o leitor que utilizamos e discutimos formas de avaliação da aprendizagem pessoal e dos alunos de várias maneiras. Porém, não desenvolvemos uma análise sistemática sobre o tema avaliação, o que discutimos foram algumas propostas apresentadas por Santos (1997) em seu livro “Avaliação de aprendizagem e raciocínio em matemática: métodos alternativos”. Ampliando nossas discussões com alguns resultados identificados em aulas de matemática pelas participantes. 2.3 Formação de professores que ensinam matemática: janelas fechadas ou abertas? A formação de professores é um assunto muito comentado nas últimas décadas, porém seu significado tem sido considerado de diferentes modos. Analisamos diferentes trabalhos sobre formação de professores (FIORENTINI, 2003; FIORENTINI; NACARATO, 2005; NACARATO; PAIVA, 2006; SILVER, 2006), alguns deles focalizaram na formação inicial (CURI, 2004; REIS, 2007; NASSER; SANTOS, 1994; SANTOS-WAGNER; NASSER; TINOCO, 1997) outros na continuada (ESPINOSA, 2002; FERREIRA, A. C., 2003, 2003a; GIMENES, 2006; MARQUESIN, 2007; NACARATO, 2000; SILVA, 2007). Pesquisamos vários trabalhos relacionados a formação, porém não apresentamos todas as análises, dando maior destaque às que tratam de formação de professores que ensinam matemática para as séries iniciais, pela interseção com nosso trabalho. 80 Formação e desenvolvimento profissional devem estar relacionados, mas acreditamos que os processos de formação que já estão instituídos nem sempre privilegiam o desenvolvimento profissional. Comentam-se e executamse formações sem levantar a questão do desenvolvimento profissional, parece que essa preocupação deve ser algo particular do professor. Destarte, compreendemos e identificamos várias formações iniciais e continuadas que acontecem, mas cujos retornos se tornam momentâneos, pois com o encerramento das formações, algumas das propostas discutidas ficam esquecidas. Realmente, esse tipo de formação, como cursos de aperfeiçoamento, são necessários, porém, com uma programação de acompanhamento durante um período mais longo. Defendemos uma formação mais produtiva para o professor e para o ensino de matemática, e concordamos com Elvira Ferreira (2002) quando afirma que A formação de professores não se esgota em cursos pontuais, sobre temas específicos, desligados da sala de aula e do contexto da escola. A formação de professores tem de caminhar muito para além desta concepção e fomentar uma ligação cada vez mais estreita entre a teoria e a prática, prolongando-se no tempo, em contextos de escola, com grupos de professores, com mais debate, com trocas de experiências, com mais reflexão, ganhando bastante significado o seu desenvolvimento ao longo de toda sua carreira (FERREIRA, 2002, p. 238). A formação inicial do professor, que ensina matemática, tem sido discutida em diferentes pesquisas sob diversos enfoques. Serrazina (2003), no início de seu artigo, aponta que os futuros professores necessitam experimentar e vivenciar a matemática que ensinarão. Acrescentamos que tanto futuros professores como os que já atuam em sala de aula precisam vivenciar diferentes experiências matemáticas. Numa formação continuada nos moldes mencionados por Ferreira (2002), podemos proporcionar tais experiências, de maneira que os profissionais (re) signifiquem sua aprendizagem e sua prática, ampliando assim sua própria aprendizagem, em relação aos conteúdos de matemática, ao seu ensino e em relação às suas crenças e concepções em relação à matemática. 81 Serrazina (2003) comenta que não se deve falar em formação de professores para o ensino de matemática na educação pré-escolar e no 1º ciclo do ensino básico, sem comentar sobre o que deve ser o ensino de matemática para cada ciclo. Ela faz referência ao papel do professor, sua importância para que se realizem mudanças no ensino de matemática. Indica ainda a necessidade de o professor desenvolver uma atitude de investigação e de constante questionamento em matemática, além de desenvolver uma abertura em relação à experimentação e a inovação. Dessa forma, Serrazina (2003, p. 68) afirma que “o principal objetivo da formação deve ser o de futuros professores se prepararem e se envolverem no seu próprio desenvolvimento de modo que o prossigam ao longo da carreira”. Em consequência, a formação poderia contribuir para a autonomia dos professores que ensinarão matemática. Ampliamos esse pensamento, afirmando que um dos objetivos da formação continuada de professores que realizamos foi contribuir para um desenvolvimento profissional adequado a realidade de cada participante. Artigos relacionados também com formação de professores demonstram a necessidade de analisar a prática. Polenttini (1999) mostra as análises feitas por professores a fim de verificar se mudou suas práticas, o que requer reflexão. Afirma que a “reflexão sobre as experiências passadas e presentes desempenha um papel fundamental para o desenvolvimento profissional do professor” (POLENTTINI, 1999, p. 250). Porque a reflexão desejada não é a realizada sem criticidade, de maneira quase autônoma, mas a reflexão que possui uma predisposição para a pesquisa, realizada em profundidade e criticamente. Acreditamos numa formação que possua o intuito de ser uma forma de contribuir no processo de constituir-se professor, para o seu desenvolvimento profissional. Pois, na nossa concepção, formação e desenvolvimento profissional devem estar inter-relacionados. Acreditamos numa formação que permita e incentive o professor a pensar sobre o seu próprio conhecimento, o conhecimento de seus alunos e o seu fazer em sala de aula, contribuindo assim para a formação de um profissional reflexivo e crítico, um profissional 82 que consiga lidar com os problemas enfrentados ao ensinar e aprender, no nosso caso em matemática. No Brasil, temos grupos de pesquisadores que realizam trabalhos, com foco em formação continuada de professores e a ideia de grupos de estudos. Um desses trabalhos desenvolvidos nessa linha é realizado desde 1982 no Rio de Janeiro, denominado Projeto Fundão, que realiza atividades com formação continuada de professores e pesquisas em educação matemática. Esse projeto constitui-se de grupos temáticos, nos quais os professores participam de acordo com seus interesses, como resultado desse trabalho, vários livros foram publicados, assim como a realização de eventos. Desde 1999 em Campinas, outro grupo de estudo denominado Grupo de Sábado (GdS). O objetivo e a dinâmica trabalhada pelo grupo GdS podem ser entendidos, com base na fala de Fiorentini e Jiménez Esta dinâmica que acontece no GdS pode ser considerada uma modalidade reflexiva e investigativa de educação contínua de professores, onde o professor, frente aos desafios diários, busca continuamente novos saberes e arrisca-se em novas experiências docentes, re-significando permanentemente sua prática e seus saberes. No grupo e pelo grupo, o professor não apenas acompanha e recebe novos conhecimentos e ideias, mas, também, troca e contribui para o desenvolvimento de seu campo profissional. Ou seja, o professor adquire mais autonomia, tornando-se sujeito de sua profissão; alguém que participa do debate público, desenvolve coletivamente projetos e grupo de estudo, dentro ou fora da escola, tentando buscar, no outro e com o outro, novas experiências e saberes da profissão docente (FIORENTINI; JIMÉNEZ, 2003, p. 9). Nos últimos anos, muitas pesquisas de doutorado e mestrado focalizaram na formação do professor de matemática. Um exemplo é tese de Silva (2007) que trabalha com formação continuada num grupo de professores das séries iniciais na tentativa de identificar alguns dos fatores que poderiam exercer influência sobre o processo de desenvolvimento profissional dos docentes. Ela destaca a reflexão sobre a prática em trabalho colaborativo, para se romperem crenças e concepções dos professores sobre o ensino e aprendizagem da matemática, no seu caso, sobre frações. Silva (2007) conclui que são necessários espaços para rediscutirmos alguns conteúdos matemáticos e como a reflexão aliada a um trabalho colaborativo influencia nas práticas de 83 professores das séries iniciais. Porém, isso deve ocorrer num grupo com objetivos em comum e de forma contínua na escola. Caso isso não aconteça, esse tipo de intervenção pode se tornar superficial e sem muitos resultados. Acrescentamos a importância do tipo de trabalho que estamos desenvolvendo, um estudo longitudinal, que possa influenciar professores de modo a continuarem com reflexões críticas após a intervenção. A formação de grupos de estudo terá mais significado, se a motivação partir dos próprios professores envolvidos, conforme foi o nosso caso. Curi (2004) realizou, em seu trabalho de doutorado, uma pesquisa com futuras professoras polivalentes, investigando conhecimentos necessários para ensinar matemática e as crenças e atitudes que podem influenciar nesses conhecimentos. Curi (2004) analisou impactos da formação inicial, juntamente com a análise das crenças e atitudes relativas à matemática e seu ensino, que intervieram na formação dos sujeitos de sua pesquisa. Acreditamos que é essencial irmos além, pois essas formações iniciais são uma parte da formação permanente. Necessitamos investigar como professores que já atuam nas salas de aulas estão analisando suas próprias crenças e concepções em relação à matemática e como isso está sendo aplicado em sala de aula. Portanto, nossa pesquisa procurou colaborar, trabalhar com professores que já estão em sala de aula e levá-los a refletirem sobre suas crenças e concepções e como elas estão presentes em suas práticas, principalmente como aprendemos em grupo de estudos. Outro trabalho que se realizou a partir da constituição de um grupo de professores refere-se ao de Marquesin (2007), no qual se fez um estudo de caso que focalizou o processo de desenvolvimento profissional de professoras que ensinam matemática nas séries iniciais do ensino fundamental. Esse desenvolvimento foi analisado em professores que passaram a pertencer a um grupo com o propósito de aprender e de ensinar Geometria. Esse tipo de formação aconteceu na escola escolhida pela pesquisadora, com participação voluntária das professoras. De acordo com a conclusão dessa autora, concordamos quando afirma que formações desse tipo favorecem o 84 desenvolvimento profissional das professoras envolvidas e que o processo de reflexão conjunta pode influenciar nas aprendizagens dos componentes do grupo. Nosso trabalho também envolveu professores, embora não de uma única escola, mas de uma rede de ensino, a prefeitura municipal de Vitória. Além disso, não escolhemos a priori um único conteúdo matemático, pois queríamos investigar aprendizagens de professoras ao debaterem em grupo o ensino de matemática, nas séries iniciais, e perceber quais conteúdos teriam maior destaque e quais seriam colocados como dúvidas no posicionamento das professoras. Participamos da opinião da autora ao afirmar que a adesão das professoras por livre e espontânea vontade permite uma maior participação nas ações desenvolvidas no grupo. Gimenes (2006) desenvolveu a sua dissertação com o objetivo de identificar as contribuições de um grupo de estudos para a prática de professores que atuam nas séries inicias e desejam buscar “os porquês” de determinados conteúdos matemáticos. No caso dessa pesquisa, focalizaram-se as quatro operações fundamentais e o sistema decimal. A proposta foi que o professor estivesse em constante processo de aprendizagem e percebesse a Matemática como algo construído, que ele soubesse relacionar as ideias essenciais, de modo a favorecer seu papel de mediador do conhecimento matemático. Somos do mesmo parecer da autora quando conclui que o professor precisa se conscientizar de que deve estar aprendendo constantemente e também que a participação num grupo de estudos pode contribuir para esse tipo de atitude. Uma de nossas propostas com o grupo de estudos é justamente fazer com que o professor saiba que sempre temos coisas a ensinar e a aprender com o outro e que em se trocando experiências e se discutindo sobre eventos ocorridos em sala de aulas podemos ampliar nossos próprios conhecimentos sobre nós mesmos enquanto aprendizes e professores. Alguns livros e artigos contribuíram para definirmos o tipo de formação que desejávamos realizar no nosso trabalho (CURY, 2001; GERALDI; FIORENTINI; PEREIRA, 1998; MOREIRA; DAVID, 2005; KRAINER; PETER-KOOP, 2003; PETER-KOOP; SANTOS-WAGNER; BREEN; BEGG, 2003; SARAIVA; 85 PONTE, 2003). Consideramos o processo de acompanhamento da formação continuada enquanto processo de constituição do professor e enquanto sujeito desse seu próprio conhecimento, potencializando o seu desenvolvimento profissional. Portanto, desenvolvemos os encontros do grupo de estudos de forma a provocar o professor a olhar seu próprio ensino e aprendizagem, refletindo sobre o que e como ensina e sobre sua própria relação com a matemática. Em conclusão, todos os componentes do grupo foram envolvidos nessa formação e cada professor pode formar-se e crescer profissionalmente mediante a troca (MOURA, 2005). Estamos de acordo com Freire (1996, p. 39) quando afirma que “na formação permanente de professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática”. Deduzimos que esses processos de formação devem favorecer reflexões, autoconhecimento, auto-reflexão e metacognição, que são alguns dos aspectos cognitivos relacionados com aprendizagens de professores. 2.4 Aspectos afetivos e aprendizagem docente Os aspectos afetivos que abordamos nesta seção são os relacionados às crenças, concepções, emoções e atitudes dos professores. Nessa revisão termos uma visão mais abrangente de como pesquisadores relacionam os aspectos afetivos dos professores com os processos de ensino e aprendizagem de matemática. Utilizamos crenças e concepções como tradução de “beliefs”, termo utilizado por Thompson (1992, p. 61). Essa autora define “beliefs” como processos mentais e abrange de uma maneira mais ampla as crenças, significados, conceitos, proposições, regras, imagens mentais, preferências e semelhanças. 86 Consideramos que traduzindo dessa forma, não estamos limitando ou reduzindo esse termo e, sim, contribuindo para interpretações mais coerentes em nosso contexto. Ao mesmo tempo, acreditamos que exista uma estreita ligação de crenças e concepções com os aspectos cognitivos. Admitimos que concepções possuem características mais profundas que crenças, são mais difíceis de mudanças e que as crenças estão mais baseadas no contexto social, enquanto as concepções são mais pessoais, a partir do que se tem como crenças. Gómez Chacón (2003) fala de crenças com base na perspectiva do aluno, todavia, em nosso trabalho utilizamo-las na perspectiva do professor, pois acrescentamos crenças dos docentes sobre aprendizagens matemáticas enquanto alunos. Colocamos nossa crítica em relação à autora Gómez Chacón (2003), no que se refere ao fato de ter utilizado em sua apresentação parte dos textos de Paul Ernest (1989/1988) e de Thompson (1992) sem fazer a devida citação da fonte. Ou seja, tivemos acesso às obras citadas e constatamos o quanto das obras foi utilizado sem a devida referência, no texto comentado. O artigo de Cury (1999) faz uma revisão de pesquisas sobre concepções e crenças dos professores de Matemática e discute os diferentes significados, que são atribuídos a esses termos pelos investigadores. Para ela, os pesquisadores concluíram que as crenças dos professores iniciam das suas experiências prévias como alunos de Matemática (SANTOS, 1993). Desta forma, Cury (1999) chama a atenção para os cursos de formação de professores, alegando ter necessidade de enfatizar não só a aquisição de conhecimentos matemáticos, mas também a possibilidade de desenvolver experiências de ensino em que as crenças fossem explicitadas e pudessem ser discutidas. Identificamos diferentes definições para concepções e crenças. Moron e Brito (2005) fizeram uma seleção de alguns autores e apresentam algumas definições de concepções. Essas autoras nos apontam que as concepções operam, permanentemente, sobre as crenças, valores, conhecimentos e elementos afetivos. Significando que as concepções envolvem o professor 87 como pessoa, individual e profissionalmente. Ao final das colocações sobre os diferentes autores consultados, Moron e Brito (2005) afirmam que concepção é definida como a maneira própria de cada indivíduo elaborar, interpretar, representar suas ideias e agir de acordo com as mesmas. É construída a partir das experiências individuais que são influenciadas por uma serie de variáveis do ambiente (conhecimento, valores, experiência prática, componente emocional) (MORON; BRITO, 2005, p. 266 - 267) (grifo das autoras). Em relação às atitudes, Moron e Brito (2005) colocam que as atitudes estão situadas em três dimensões: cognitivo, afetivo e intencional ou de tendência a certo tipo de comportamento. Ao focalizarem o olhar para a matemática eles fazem uma categorização entre atitudes em relação à matemática e atitudes matemáticas. Compreendemos que as atitudes são mais fáceis de serem identificadas, pois acontecem de maneira mais explícita, facilitando a identificação e análise. Algumas leituras nos ajudaram a entender as diferenças e como estaríamos tratando essas atitudes (MATOS, 1992; MENDUNI, 2003; MORON; BRITO, 2005; PIROLA; BRITO, 2005). A diferenciação de atitudes em relação à matemática e atitudes matemáticas nos ajuda entender parte do que acontece em sala de aula e em relação às aprendizagens de cada pessoa. A atitude está relacionada ao comportamento diante da matemática que possui influência das crenças e concepções de cada indivíduo. Ressaltamos também que é um dos pontos que podem ter mudanças sensíveis de uma maneira mais rápida, desde a reflexão sobre a prática e o entendimento das próprias crenças e concepções. Concordamos com Gonçalez e Brito (2005, p. 223 - 224), ao observarem que “compete aos professores criar situações que favoreçam o estabelecimento e desenvolvimento de objetivos atitudinais nos alunos”. A preocupação em não transmitir ideias negativamente pré-concebidas aos estudantes deve estar presente na reflexão dos professores. Ao contrário, o que vai ser ensinado aos alunos precisa estar revestido de um caráter positivo, para que gere atitudes positivas dos alunos. Favorecendo as atitudes positivas podemos esperar que 88 os alunos sintam vontade e necessidade de aprender o conteúdo. É pretensão dos professores que os alunos se sintam competentes para usar o que aprendem, não apenas em sala de aula, mas também fora da escola, em situações do dia a dia. Os objetivos dos professores de matemática deveria ser o de ajudar as pessoas a entender a matemática e encorajá-las a acreditar que é natural e agradável continuar a usar e a aprender matemática. Entretanto, é essencial que ensinemos de tal forma que os estudantes vejam a matemática como parte sensível, natural e agradável de seu ambiente. Acredito que, freqüentemente, falhamos ao ensinar matemática apropriada e que a matemática que temos ensinado tem sido ensinada de tal forma que leva o estudante a não gostar, nem da matemática e nem da aprendizagem da mesma, assegurando, portanto, que mesmo eles pudessem usar a matemática de forma efetiva, eles não o fariam (WILLOUGHBY, 2000, p.8; apud PIROLA e BRITO, 2005, p. 88). As atitudes dos professores não são “pré-disposições” tão simples e, por isso, Gonçalez e Brito (2002) dizem que atitudes apresentam componentes tanto do domínio cognitivo, como do afetivo e o do comportamental. Qualquer programa que busque modificar, de alguma forma, as atitudes, deve buscar atingir essas três esferas. Isso somente é possível por evidenciarmos, assim como esses autores que “as atitudes não são estáveis e cristalizadas, podendo mudar de direção de acordo com determinadas circunstâncias” (GONÇALEZ, BRITO, 2002, p. 224). Questões relacionadas com mudanças e tomadas de consciência estão diretamente ligadas aos aspectos afetivos com os quais os professores estão envolvidos. Gómez Chacón (2003, p. 147) chama a atenção para o fato de que cada professor adota em sua sala de aula uma série de decisões e de atitudes em relação ao que acredita ser o ensino e a aprendizagem em matemática. Ela diz que é importante refletir sobre as atitudes e que as mudanças se dão, a partir dessa reflexão. Gómez Chacón (2003) relaciona emoções às crenças e complementa que essas dependem dos acontecimentos vivenciados pelos professores. Estamos de acordo com essa autora, pois acreditamos que diferentes situações ocorridas ao longo da formação de uma pessoa pode influenciar suas emoções com relação a matemática, no nosso caso. Em sua definição, apresenta as emoções de maneira complexa afirmando que são 89 respostas organizadas além da fronteira dos sistemas psicológicos, incluindo o fisiológico, o cognitivo, o motivacional e o sistema experiencial. Surgem como resposta a um acontecimento (interno ou externo) que possui uma carga de significado positiva ou negativa para o indivíduo (p. 22). Em suas explanações, Gómez Chacón (2003, p. 64) pontua, os professores como foco das mudanças nas reformas educativas, colocando que “em grande parte, os avanços dependem, essencialmente, das mudanças produzidas no professor, como individuo, em sua aproximação ao ensino e a aprendizagem da matemática e suas crenças.” Para produzir mudanças „no professor‟ é necessário trabalhar mais de perto com esses professores, contribuindo para o início de um processo de reflexão crítica onde possam olhar para si mesmos e perceberem o que fazem e como relacionam isso com suas crenças e concepções. Essa foi nossa intenção na constituição desse grupo, trabalhar mais de perto com as professoras. A influência do contexto social nas oportunidades e restrições para a situação de ensino também foi apontada por Gómez Chacón (2003, p. 65). Ela pontua como a influência deste contexto social age em vários aspectos do processo de ensino e aprendizagem, vivenciado em sala de aula de matemática. Realmente, percebemos as diferenças existentes nas escolas e nas professoras integrantes dessa pesquisa e notamos a importância do contexto social para a prática de cada uma delas. Para ampliar a discussão, podemos nos apoiar na síntese feita por Gómez Chacón a partir de Coob, Yackel e Wood (1989)19 quando diz que o ato emocional é gerado pelas avaliações cognitivas das situações, influenciadas pela ordem social local. A avaliação envolve uma comparação da situação interpretada por meio das expectativas. Sua ênfase na base cognitiva da emoção como ato não nega que as pessoas sintam emoções, ou que possam sentir, em determinadas ocasiões, uma emoção que vai além do seu controle. Nessas ocasiões a experiência emocional intensa gera uma interpretação subjetiva cognitiva de uma situação particular (GÓMEZ-CHACÓN, 2003, p. 46). 19 COOB, P.; YACKEL, E. WOOD, T. Young children‟s emotional acts while engaged in mathematical problem solving. In: MCLEOD, D. B.; ADAMS, V.M. (eds.). Affects and mathematical problem solving: a new perspective. Nova York: Springer Verlag, p. 117 – 148, 1989. 90 As abordagens que envolvem aspectos cognitivos e afetivos contribuíram para apurar nosso olhar sobre as situações ocorridas e observadas por nós nos diferentes momentos de interação com as professoras. Também revelaram algumas relações das professoras sobre alguns conteúdos matemáticos que valorizam ou que repudiam. As crenças, concepções, emoções e atitudes estão imbricadas com o modo com que as professoras conduzem suas aulas, bem como a relação de cada uma delas com a matemática. Por isso, optamos por realizar nossa investigação, segundo características de pesquisas internacionais determinadas como naturalística ou humanística. Pesquisas essas que nos ajudam a entender que não podemos separar o profissional da pessoa do professor que ensina matemática. Devemos ter certo cuidado ao realizar pesquisas desse tipo, pois estão imbricadas com questões psicológicas. Concluímos, então, que nos era preciso aprofundar em discussões presentes na psicologia da Educação Matemática, pelas razões expostas anteriormente. Procuramos observar na literatura internacional relacionada ao grupo Psycology Education Mathematics – PME, em especial o livro organizado por Gutiérrez e Boero (2006), no qual há uma síntese das pesquisas realizadas por esse grupo entre 1976 a 2006. Essas leituras contribuíram para uma visão mais atual sobre como pesquisas em diferentes países estão tratando do assunto. 91 CAPÍTULO III: 3 AS PORTAS SE ABREM É PRECISO CAMINHAR: TRAJETÓRIAS E PERCURSOS METODOLÓGICOS pesquisa foi de natureza qualitativa procurando compreender e analisar quais são as aprendizagem e como elas acontecem (FIORENTINI; LORENZATO, 2006; FLICK, 2004; LINCOLN; GUBA, 1985; CHAPMAN, 2005, 2006). Nosso foco principal é o professor e sua aprendizagem que está relacionada com seu pensar e seu fazer. Assim sendo, escolhemos metodologias que contribuam para analisar aprendizagens dos professores que estejam envolvidos, de modo a obter um olhar voltado para cada professor como pessoa, que possui características próprias e que tem sua atuação profissional repleta do seu „eu‟. Por conseguinte, não havemos de olhar para o professor como um ser isolado, insta analisar o ser coletivo do professor, ou seja, o ambiente em que o profissional está inserido, sua formação, seu caminhar escolar, seu desenvolvimento profissional, dentre outras coisas. Também não devemos generalizar nossas análises, pois cada pessoa é única e precisa ser olhada como tal. Embora muitas de nossas análises sejam aplicáveis, de um modo geral, a outras vivências educativas e sirvam para fomentar diferentes reflexões, estaremos apresentando dados e análises de maneira pontual. Se esses dados e essas análises puderem ser utilizados para outros olhares, estaremos indo além dos nossos objetivos com este trabalho. Optamos por pesquisar professores e a nós mesmos enquanto aprendizes e tentamos observar alguns conhecimentos de prática que fazemos sobre aprendizagens. Precisamos destacar que fizemos uma ligação entre o olhar pontual sobre as aprendizagens de cada professor e do grupo como um todo e colocações de autores como Llinares e Krainer (2006) e outros que desenvolvem pesquisas ligadas às perspectivas apontadas pelo grupo Psychology of Mathematics Education – PME. Procuramos no desenrolar da 92 pesquisa e em seus diferentes momentos, voltar nossos estudos para os manuais de pesquisa na área da educação matemática. A escolha pela perspectiva humanística se deu pelo fato de ela contribuir para desenvolvermos esse tipo de análise. Ouvimos, pela primeira vez, sobre estudos humanísticos na palestra da professora Olive Chapman, realizada em 2005 no auditório do Centro de Educação da UFES. Quando iniciamos nossa pesquisa, sabíamos que seria de caráter qualitativo e após análise de pesquisas, constatamos que queríamos realizar algo que ampliasse e contemplasse indicações nacionais e internacionais. Encontramos autores de renome internacional que já estão utilizando metodologias diferenciadas para pesquisas de natureza qualitativa, naturalística ou humanística, há mais de duas décadas. Investigando mais profundamente conseguimos encontrar textos de Lincoln e Guba (1985) que trabalham sobre essa discussão, num âmbito mais geral de pesquisa científica. Esses autores afirmam que: Cada época histórica tem exibido algum modo característico de responder às questões eternas do que existe que pode ser conhecido e como alguém pode conhecer isto. [...] Hoje nós vivemos na era da ciência. As questões eternas são melhores respondidas, isto é afirmado, ao colocar-se questionamentos diretamente para a Natureza e deixar a Natureza mesmo respondê-los. [...] Este livro é sobre tal desafio. Ele descreve um paradigma alternativo que, grandemente por acidente histórico, está agora viajando sob o nome ''naturalístico''. Ele tem outros nomes aliados também, por exemplo: o pós-positivístico, etnográfico, fenomenológico, subjetivo, estudo de caso, qualitativo, hermenêutico, humanístico. Ele tem tantos nomes porque as pessoas que professam praticar o mesmo tendem a considerar diferentes visões do que este implica [...] (LINCOLN; 20 GUBA, 1985, p. 5) . Escolhemos trabalhar com uma autora da educação matemática que aborda a perspectiva humanística em suas pesquisas. Em nosso estudo, vamos considerar as professoras da mesma forma que Chapman (2006), colocando 20 Every historical age has exhibited some characteristic way of answering the eternal of what there is that can be known and how one can go about knowing it. […] Today we live in the age of science. The eternal questions are best answered, it is asserted, by putting queries directly to Nature and letting Nature itself answer. […] This book is about such a challenge. It describes an alternative paradigm that, largely through historical accident, is now traveling under the name “naturalistic.” It has other aliases as well, for example: the postpositivistic, ethnographic, phenomenological, subjective, case study, qualitative, hermeneutic, humanistic. It has so many names because de persons who profess to practice it tend to take different views of what it implies […] (LINCOLN e GUBA, 1985, p. 5) 93 como participante e não como objeto de estudo. Além disso, queremos identificar aprendizagens, sempre que possível, a partir da visão das professoras. Chapman (2006) explica de maneira interessante a fundamentação adotada por ela, e seguida por nós, para utilização da pesquisa com perspectiva humanística, conforme podemos verificar na citação a seguir: Em contraste com a perspectiva analítica, a perspectiva humanística focaliza-se na compreensão da natureza dos pensamentos e contextos do professor que moldam a percepção dele ou dela da sua realidade. Considera o pensamento do professor a partir da perspectiva do professor de seu comportamento em sala de aula, a fim de dar sentido ao ensino. É, portanto, preocupado com a própria compreensão do professor sobre sua própria perspectiva. Em geral, os estudos baseados nessa perspectiva de pesquisa vêem o professor de modo humanista que é consistente com as perspectivas teóricas do conhecimento profissional dos professores [...] Os professores são tratados como pessoas que tem algo de valor para contribuir e não como objetos de estudo. Suas ações são vistas para ter (dar) significados em suas situações ou contextos. Assim, o foco desse estudo é a conceituação do conhecimento experiencial dos professores e fornecer explicações plausíveis dos processos de ensino como o são para o professor. Em particular, os comportamentos de ensino têm que ser entendidos em relação às intenções dos professores e à complexidade da situação (CHAPMAN, 21 2006, p. 111-112) . A pesquisa qualitativa, que Lincoln e Guba (1985) denominam naturalística, foi citada por Bicudo (2004, p. 105-106) para identificar a diferenciação entre pesquisa qualitativa e a pesquisa quantitativa. Ela afirma que, em pesquisas qualitativas, privilegiam-se o olhar sobre os aspectos humanos sem passar pelos crivos da mensuração, sem partir de um método previamente definido e, portanto, sem ficar preso a quantificadores e aos cálculos decorrentes 21 In contrast to the analytic perspective, the humanistic perspective focuses on understanding the nature of the teacher‟s thing and contexts that shape his our her perception of his or her reality. It considers teacher thinking from the teacher‟s perspective of his or her classroom behavior in order to make sense of teaching. It is thus concerned with understanding teachers from their own perspective. In general, studies based on this researcher perspective view teachers in a humanistic way that is consistent with the theoretical perspectives of teachers‟ professional knowledge […]. Teachers are treated as persons who have something of value to contribute and not as objects of study. Their actions are seen to have meaning in their situations or contexts. Thus, the focus of these studies is on conceptualizing the experiential knowledge of teachers and providing plausible explanations of teaching processes as they are for the teacher. In particular, teaching behaviors have to be understood in relation to the intentions of teachers and to the situational complexity (CHAPMAN, 2006 p. 111-112). 94 (BICUDO, 2004, p. 105). Nossa proposta é de trilhar esses caminhos da pesquisa qualitativa, de uma forma naturalística, evidenciando as características apontadas desde o desenvolvimento da investigação. Como analisamos algumas aprendizagens das professoras envolvidas, escolhemos implementar um estudo longitudinal por termos um espaço de tempo mais longo para partilhar nossos olhares e permitir trabalhar com as complexidades que nosso trabalho propicia. Além disso, um trabalho por um período prolongado como esse permite-nos aprofundar e analisar criticamente nossas aprendizagens, os conhecimentos desvelados, nossas reflexões e os desdobramentos dessa investigação. Estamos acompanhando as duas professoras durante dois anos e quatro meses, o que consideramos um longo período de tempo. Somente dessa forma, poderemos fazer algumas considerações relativas às suas aprendizagens e ao seu desenvolvimento profissional. Uma pesquisa com um período reduzido de tempo não nos permitiria agir e interagir com as professoras envolvidas, de modo a efetuarmos considerações pertinentes ao tipo de investigação. Segundo Llinares e Krainer (2006, p. 445), algumas pesquisas que envolvem investigação do desenvolvimento profissional de professores revelam que a aprendizagem de professores é um processo complexo em que múltiplos fatores intervêm, sugerindo uma inter-relação do individual, do social e do organizacional 22 . Concordamos com os autores, ao colocarem o desenvolvimento profissional como um processo de aprendizagem. Pois, também cremos que se compreendermos melhor os processos de aprendizagem, questões referentes ao desenvolvimento profissional de professores poderão ser entendidas de maneira mais propícia. Os procedimentos metodológicos que apresentamos e utilizamos nesta pesquisa foram construídos e modificados num constante refinamento. Não tínhamos, previamente, os procedimentos que seriam usados completamente articulados. O caminhar do grupo, as leituras relacionadas com o tipo de 22 Reveals that teachers‟ learning is a complex process in which multiple factors intervene, suggesting an interrelation of the individual, the social and the organizational. 95 pesquisa e a maturidade da pesquisadora fundamentaram os passos que foram seguidos, ao longo do processo como investigadora iniciante. Esse tipo de aprendizado e procedimento metodológico foi partilhado com a coorientadora fundamentado nos trabalhos de Chapman (2005) e a partir dos indicativos de Lincoln e Guba (1985) sobre as propostas de montagem de pesquisa de cunho qualitativo. Esses autores destacam que o pesquisador deve ter um balizador para que se inicie a pesquisa e para que se tomem os cuidados necessários para a coleta e análise inicial dos dados. Porém, esses balizadores não devem estar fechados, de início, ou quando se apresenta o projeto de pesquisa. Para Lincoln e Guba (1985), uma pesquisa qualitativa pode deixar que o desenvolvimento da investigação indique outros questionamentos e procedimentos a serem implementados. Retratamos as trajetórias e percursos metodológicos que foram trilhados, tentando deixar claro para o leitor o nosso caminhar, as escolhas, os desafios, os acertos e os tropeços vivenciados nesta investigação. 3.1 Idas e vindas para construção do problema Relatamos nesta seção um pouco do nosso caminhar para que o leitor tenha uma visão de como aconteceram algumas idas e vindas referentes a este estudo longitudinal. Seria inviável apontar todos os nossos passos e reflexões, porém, para que possamos ter uma panorâmica da pesquisa, decidimos desvendar os momentos e reflexões considerados mais relevantes. Nossa pesquisa foi se delimitando no decorrer do estudo longitudinal. Desde o início, desejávamos trabalhar com a formação continuada de professores que ensinam matemática nas séries iniciais. Daí surgiu uma proposta para trabalhar com processos de ensino e aprendizagem de matemática para esse nível de ensino. Concluímos que nossa pesquisa estava ampla e complexa. Tínhamos a 96 necessidade de delimitá-la para conseguirmos realizá-la de maneira satisfatória. Por influência de experiências vivenciadas no grupo de estudos mais amplo e de leituras de autores como, por exemplo, João Pedro da Ponte (2002) e Ponte e Serrazina (2003) de Portugal, pensamos inicialmente em trabalhar com a investigação da própria prática. Achamos interessante o assunto e acreditávamos que, com este tipo de abordagem, poderíamos proporcionar momentos em que cada professor pudesse iniciar um olhar para si mesmo enquanto profissional, de maneira mais sistematizada numa proposta de formação continuada. Confiávamos que o nosso grupo de estudos daria a oportunidade de provocar essa reflexão, uma investigação sobre a própria prática. Sabíamos que não seria tarefa fácil, mas acreditávamos inicialmente que seria possível. A partir de alguns questionamentos de colegas e de alguns professores da banca de qualificação I, tivemos a oportunidade de refletir sobre o fato. Este olhar externo contribuiu para apurar nossa “investigação da nossa própria prática”, como pesquisadora iniciante. Alguns comentários, questionamentos e leituras nos levaram a refletir e constatamos que seria complicado colocar a investigação da pesquisadora de sua própria prática, já que definimos abordar a matemática nas séries iniciais e a pesquisadora não trabalha neste segmento de ensino. Também entendemos que relatar as investigações das próprias professoras sobre suas práticas não seria tarefa fácil para uma tese, pois é um trabalho escrito, unicamente, pela pesquisadora. Acreditamos que um resultado satisfatório para a investigação da própria prática seria num trabalho em que cada professora pudesse escrever sobre o desenvolvimento e a sua consecução. Essas e outras colocações nos ajudaram a chegar à conclusão de que precisávamos delimitar melhor nossa pesquisa, pois identificamos que a investigação sobre a própria prática não caberia como eixo central deste estudo de doutorado. Continuamos a incentivar as professoras a investigar suas próprias práticas em matemática por acreditarmos que tal atitude contribui para a reflexão e, consequentemente, para o desenvolvimento profissional delas. Além disso, essa metodologia é utilizada por nós, no outro grupo de estudos, do qual participamos. Logo, estamos convictos que a investigação sobre a própria prática possa contribuir como uma provocação de reflexão crítica por parte do professor. 97 A partir da identificação da inviabilidade da metodologia de pesquisa, voltamos a analisar a delimitação da nossa pesquisa. Pois, conforme já comentamos, estava bem ampla. Tínhamos a formação continuada de professores, a matemática nas séries iniciais e seus processos de ensino e aprendizagem. Verificamos, ainda, que na medida em que o grupo foi se consolidando e o trabalho foi se efetivando, questões referentes aos aspectos cognitivos (conhecimentos, tomada de consciência, metacognição) e aos aspectos afetivos (crenças, concepções, emoções, atitudes) mostraram grande influência sobre o que estava sendo desenvolvido. Com isso, fomos (re) constituindo o problema no cotidiano e a partir desse cotidiano. No decorrer do estudo longitudinal, compreendemos que, para se realizar um trabalho com foco no professor e em suas aprendizagens, precisávamos investigar mais detalhadamente alguns dos aspectos cognitivos e afetivos. Identificamos que nosso estudo estava na interseção ilustrada no diagrama a seguir. Figura 4 - Diagrama de temas Num período posterior à qualificação I, a partir de questionamentos e estudos sobre nossa delimitação da pesquisa, decidimos centrar nosso problema de pesquisa em conhecimentos das professoras e relacioná-los com crenças, concepções e atitudes na prática das aulas de matemática. Porém, identificamos que a situação vivida e as relações surgidas eram mais complexas e abrangiam outros pontos que não estaríamos considerando se pontuássemos apenas conhecimentos das professoras. O movimento do grupo 98 de estudos e de seus participantes era mais amplo e expressava bem o que a professora Denise Meyrelles de Jesus comentou (durante a qualificação I) sobre os fluxos contínuos. Precisávamos analisar a dinâmica dos fluxos contínuos, ou seja, o movimento proporcionado e vivenciado pelo grupo, pois reconhecemos que não conseguiríamos dar conta de relatar, registrar e analisar todos os momentos e todas as situações vivenciadas na dinâmica que o grupo se envolveu. A reflexão que nos provocou os questionamentos foi a de tomarmos consciência de que estávamos trabalhando com pessoas de experiências, de envolvimentos e de propósitos diferentes. E ainda, por vivenciarmos muitos momentos no grupo e em sala de aula, durante as observações não conseguimos revelar a experiência em sua totalidade. Apresentamos algumas das aprendizagens de pessoas que estavam compartilhando algumas vitórias, anseios, práticas, conhecimentos, dentre outras coisas, num fluxo contínuo, que somente pôde ser revelado e identificado em “flashes”. Momentos foram captados ou explicitados de alguma maneira, mas não puderam ser apresentados na sua totalidade e complexidade desse movimento. O que abordamos foi decorrente dos incidentes críticos ou significativos identificados por nós. Tínhamos conhecimento da complexidade que estaríamos enfrentando. Como expressar isso? Qual a melhor forma de identificar e relatar todos estes envolvimentos? Era imprescindível organizar nosso texto e até mesmo nosso foco para que, de certa forma, apresentássemos a amplitude e o movimento que se realizou em relação ao desenvolvimento profissional das professoras no grupo de estudos e a partir dele. Identificamos algumas palavras que definiriam o que queríamos, palavras como conhecimentos, saberes e aprendizagens. Optamos por utilizar „aprendizagens‟, inclusive sem o artigo definido, por termos certeza de que não conseguiríamos abranger todas as aprendizagens. Julgávamos que fossem processos e como tal nem sempre conseguíamos identificar sua totalidade, mas a palavra aprendizagem reforçava o que queríamos compreender. Essas aprendizagens foram de diferentes naturezas, como por exemplo, atitudinais, conceituais e emocionais. As aprendizagens foram muitas, diferentes conforme já comentamos e imprevisíveis. 99 Concordamos com Meirieu (2005), quando comenta a questão da incerteza na aprendizagem. Ele afirma que aprendizagem se insere numa dinâmica, num processo pessoal e de busca pela autonomia. Segundo as palavras do próprio Meirieu (2005, p. 76) “implica num risco, um salto no desconhecido, uma decisão que ninguém pode tomar pela pessoa. De fato, é sempre uma questão de fazer uma coisa que não se sabe fazer para aprender a fazê-la”. Todas as professoras participantes do grupo de estudos viviam um pouco isso, estávamos ali para aprender umas com as outras, para sermos parceiras, enquanto partilhávamos nossas práticas. Para clarear nossa ideia sobre o problema, focalizado nas aprendizagens e sobre nossas perguntas e objetivos, fizemos, a pedido das orientadoras, alguns quadros e esquemas com suas respectivas datas. Isso, com a intenção de registrar um pouco de nossas idas e vindas na construção e estruturação do problema de pesquisa e de seus procedimentos metodológicos, uma ligação direta com as perguntas integradas que relatamos na seção 1.2. Em setembro de 2008, apresentamos para as orientadoras o Quadro 11, onde tentamos relacionar nossas perguntas aos objetivos e apresentar os instrumentos que estávamos utilizando para responder a cada pergunta. Constatamos que cada uma das perguntas estava direcionada, de maneira direta ou indireta, a mais de um objetivo, e precisávamos evidenciar esse fato. Reformulamos o quadro de forma que as nossas perguntas ficassem bem expostas, transformando-o em diferentes esquemas para mostrarmos algumas relações entre perguntas e objetivos. O último esquema é um mapa conceitual que organizamos para entendimento e clareza de nossas ideias sobre a pesquisa como um todo. Ele foi estruturado a partir da expressão „aprendizagens de professores‟, na qual relacionamos e elaboramos as conexões. 100 Quadro 11: Perguntas, objetivos e instrumentos: elaborados em 18/09/08 e atualizado em 26/09/08 Perguntas Objetivos I.Que aprendizagens dos professores A. Identificar algumas aprendizagens participantes podem ser dos professores participantes que destacadas, a partir de foram explicitadas ou percebida, a discussões num grupo partir de discussões no grupo de sobre os processos de estudos e em suas práticas ensino e aprendizagem pedagógicas. de matemática nas séries iniciais? B. Compreender como acontecem algumas aprendizagens e como estas são percebidas ou explicitadas nos encontros do grupo e em práticas pedagógicas pelos professores. II.Como aprendizagens de professores são percebidas e/ou C. Compreender como os diferentes evidenciadas pelos conhecimentos estão articulados e professores, no grupo e relacionados com as discussões do nas práticas, em sala grupo e com as práticas de aula de matemática pedagógicas. nas séries iniciais? D. Verificar como os professores participantes explicitam suas percepções e sua tomada de consciência das relações existentes entre suas crenças, concepções, atitudes e conhecimentos com suas práticas, em relação aos processos de ensino e aprendizagem de matemática. III.Que relações entre crenças, concepções, E. Identificar algumas crenças, atitudes e concepções, atitudes e conhecimentos conhecimentos dos professores relacionados à relacionados aos processos de matemática com as ensino e aprendizagem de aprendizagens dos matemática em diferentes professores são momentos da pesquisa. evidenciados em discussões do grupo ou F. Comparar algumas crenças, em práticas concepções e atitudes de cada pedagógicas? professora, relacionadas aos processos de ensino e aprendizagem de matemática, identificadas em diferentes momentos da pesquisa. Instrumentos Gravações em áudio Textos escritos pelos professores Registros obtidos em sala de aula Avaliações preparadas Entrevistas semi-estruturadas individuais e coletivas Gravações em áudio Registros obtidos em sala de aula Materiais impressos das professoras Avaliações preparadas Entrevistas semi-estruturadas individuais e coletivas Cadernos da observadora Reflexões escritas e compartilhadas por e-mail com coorientadora Gravações em áudio Materiais impressos das professoras Avaliações preparadas Entrevistas semi-estruturadas individuais e coletivas Cadernos da observadora Gravações em áudio Registros obtidos em sala de aula Materiais impressos das professoras Avaliações preparadas Entrevistas semi-estruturadas individuais e coletivas Reflexões escritas e compartilhadas por e-mail com coorientadora Metáforas Textos escritos pelos professores Gravações em áudio Registros obtidos em sala de aula Entrevistas semi-estruturadas individuais e coletivas Reflexões escritas e compartilhadas por e-mail com coorientadora Registros obtidos em sala de aula Entrevistas semi-estruturadas individuais e coletivas 101 I. Que aprendizagens dos professores participantes podem ser destacadas a partir de discussões num grupo sobre os processos de ensino e aprendizagem de matemática nas séries iniciais? A. Identificar algumas aprendizagens dos professores participantes que foram explicitadas ou percebidas, a partir de discussões no grupo de estudos e em suas práticas pedagógicas. Aprendizagens de professoras II. Como aprendizagens de professores são percebidas e/ou evidenciadas pelos professores no grupo e nas práticas em sala de aula de matemática nas séries iniciais? III. Que relações entre crenças, concepções, atitudes e conhecimentos relacionados à matemática com as aprendizagens dos professores são evidenciados em discussões do grupo ou em práticas pedagógicas? B. Compreender como acontecem algumas aprendizagens e como estas são percebidas ou explicitadas nos encontros do grupo e em práticas pedagógicas pelos professores. E. Identificar algumas crenças, concepções, atitudes e conhecimentos dos professores relacionados aos processos de ensino e aprendizagem de matemática em diferentes momentos da pesquisa. C. Compreender como os diferentes conhecimentos estão articulados e relacionados com as discussões do grupo e com as práticas pedagógicas. D. Verificar como os professores participantes explicitam suas percepções e sua tomada de consciência das relações existentes entre suas crenças, concepções, atitudes e conhecimentos com suas práticas em relação aos processos de ensino e aprendizagem de matemática. F. Comparar algumas crenças, concepções e atitudes de cada professor, relacionadas aos processos de ensino e aprendizagem de matemática, identificadas em diferentes momentos da pesquisa. Legenda das setas: Linhas cheias – ligação direta. Linhas tracejadas – ligação indireta Figura 5: Esquema 1 - Elaborado em 01/10/08 e reestruturado em 22/01/09. 102 Figura 6: Esquema 2 – elaborado em 09/12/08 103 Existem outros mapas conceituais e outros esquemas anteriores realizados em seminários para alunos da sub-linha de linguagem matemática, os quais foram desenvolvidos pela professora Vânia Santos-Wagner, em 2006 e 2007 no entanto, o quadro e os esquemas apresentados, ajudam na compreensão do nosso caminhar e do nosso amadurecimento no decorrer da pesquisa. 3.2 Escolhas metodológicas Ao iniciarmos a pesquisa, não tínhamos a certeza dos refinamentos da metodologia de natureza qualitativa a ser utilizada neste estudo longitudinal. Registramos, na primeira qualificação, que a metodologia dependeria do caminhar do grupo. Somente tivemos como apresentar as características deste estudo longitudinal, a partir dos indicativos que foram surgindo juntamente com o caminhar da pesquisa, seguindo os moldes de uma pesquisa qualitativa como é definido internacionalmente. Indicávamos que, dentro desta pesquisa qualitativa, iríamos também trabalhar numa perspectiva colaborativa. Porém, verificamos que esse tipo de caracterização metodológica demandaria maior tempo, disponibilidade e envolvimento de todos os participantes. Não poderíamos garantir a adesão dessas demandas num grupo constituído para estudar práticas e processos de ensino e aprendizagem em matemática nas séries iniciais. Pois, para que o tipo de caracterização metodológica de pesquisa colaborativa pudesse, realmente, acontecer os participantes deviam estar muito mais imbricados em todos os processos da investigação, o que não garantiríamos que acontecesse com o período de que dispúnhamos. Conseguimos constituir um grupo que já possui algumas práticas colaborativas, onde os participantes já possuem certo grau de envolvimento. Porém, nem todos são responsáveis pelo planejamento, implementação, organização e análise dos dados coletados e pela escrita dos relatórios ou desejam executar as incumbências dessas pesquisas. 104 Ao longo dos encontros e por causa da perspectiva humanística, notamos que não ser possível generalizar e analisar o grupo de forma única. Cada professora estava num estágio de desenvolvimento profissional e agindo de forma diferenciada no que se refere a sua participação, interação e vivência no grupo. Estávamos implementando um trabalho, segundo os princípios de uma pesquisa qualitativa, mas que precisava ser relatada como estudos de caso. Concordamos com Stake (1994), ao afirmar que a escolha metodológica por estudos de casos é uma abordagem diferente de estudar „objetos de pesquisa‟. No nosso caso, aprendizagens mais específicas de professoras participantes num grupo de estudos, no qual deveríamos analisar e compreender o caminhar de cada uma delas, assim como as aprendizagens decorrentes das que podem ser percebidas e explicitadas. Para Stake (1994, p. 237), o estudo de casos é ao mesmo tempo o processo de aprendizagem sobre o caso e a produção desta própria aprendizagem 23. Concordamos com o autor, pois, ao mesmo tempo em que aprendemos sobre cada uma das professoras e com suas aprendizagens, também, produzimos aprendizagens pessoal, em grupo e em nível de desenvolvimento de pesquisa, com formação de professores em grupo de estudos. Sabemos que, apresentando este estudo de caso, estamos fazendo algo particularizado: são aprendizagens de professoras que participaram deste grupo de estudos em contexto sobre matemática. Temos a consciência da não generalização de nossas conclusões, mas acreditamos que os casos sirvam de „espelho‟ para muitos outros professores se enxergarem em situações semelhantes e fazerem suas próprias leituras sobre os assuntos abordados e comentados neste trabalho, relacionando-os com suas próprias práticas. O estudo de caso foi por nós escolhido, objetivando expressar a particularidade da situação envolvida e a análise detalhada de cada professora. Ponte (1994, 2006) realizou, em dois momentos diferentes, uma abordagem sobre estudo de casos, e utilizamos essas referências a fim de apontarmos nossa proposta para 23 A case study is both the process of learning about the case and the product of our learning. (tradução nossa) 105 utilização da forma de investigar nossa pesquisa. Concordamos com Ponte (2006), ao mostrar, com detalhes, o que vem a ser um caso. um caso constitui uma entidade bem definida, necessariamente inserida num contexto. O que explica que o caso seja como é são sempre as determinantes internas, a sua história, a sua natureza, as suas propriedades próprias, bem como as influências externas, próximas e distantes, directas e indirectas que recebe do seu próprio contexto. Por isso, no estudo de um caso, seja ele qual for, é sempre preciso dar atenção à sua história (o modo como desenvolveu) e ao seu contexto (os elementos exteriores, quer da realidade local, quer de natureza social e sistêmica que mais o influenciaram) (PONTE, 2006, p. 110). Preocupamo-nos com os determinantes externos e internos e por isso, juntamente com a coorientadora 24 , elaboramos alguns procedimentos e instrumentos de coleta, organização e análise de dados. Sempre com o cuidado de relatarmos todo processo que a investigação esteve envolvida, dando atenção ao que Ponte (2006) chamou de história e contexto. Após definirmos o estudo de caso, como modelo de pesquisa, deparamo-nos com outra situação que necessitava ser envolvida neste processo. Desde o ano de 2007, as professoras, que atuam nas séries iniciais do ensino fundamental, pediram a nossa participação em algumas de suas aulas de matemática, o que aconteceu desde então. Entretanto, à medida que nos envolvíamos com as professoras e seus alunos, em aulas de matemática, percebíamos que estávamos participando, agindo e interagindo de forma ampla nos processos de ensino e aprendizagem de matemática. Constatamos que a metodologia de estudo de caso foi modificada ou incrementada, Acreditamos que, ao formar e desenvolver as práticas realizadas no grupo de estudos, desenvolvemos algumas características da pesquisa-ação. Entendemos que o envolvimento e a metodologia de formação desse grupo é resultado próprio da pesquisa-ação, e que nossa interação e a forma que 24 E-mails trocados e discussões em encontros com a professora coorientadora Vânia Mª Pereira SantosWagner, durante todo o processo de pesquisa. 106 estamos desenvolvendo nessa pesquisa estão de acordo com as propostas identificadas por Barbier (2004) asseverando que: A pesquisa-ação obriga o pesquisador de implicar-se. Ele percebe como está implicado pela estrutura social na qual ele está inserido e pelo jogo de desejos e de interesses de outros. Ele também implica os outros por meio do seu olhar e de sua ação singular no mundo. (BARBIER, 2004, p. 14) Trabalhamos, então, com o procedimento metodológico de estudo de caso, quando olhamos para cada professora em seu contexto diferenciado e em sua interação com o grupo, e que possui algumas características da pesquisa-ação, na formação, constituição e desenvolvimento das atividades do grupo, ao interagirmos e intervirmos inclusive nas atitudes das professoras participantes. Convém ressaltar que essa pesquisa nos ajudou a compreender o processo como um todo, pois, ao mesmo tempo em que intervínhamos na prática precisávamos refletir sobre ela. E como age num ciclo reflexivo está a todo o momento nos colocando frente a novas situações que são produzidas ou discutidas pelo grupo, levando-nos a diferentes práticas educacionais. Concordamos com Fiorentini (2004), quando conceitua que pesquisas com características da pesquisa-ação ocorrem como um processo investigativo de intervenção em que caminham juntas a prática investigativa, a prática reflexiva e a prática educativa. Ou seja, a prática educativa, ao ser investigada, produz compreensões e orientações que são imediatamente utilizadas na transformação dessa mesma prática, gerando novas situações de investigação (FIORENTINI, 2004, p. 69). Nossa proposta com a esta pesquisa propõe discutir e analisar práticas pedagógicas que são desencadeadas a partir de ciclos de reflexão (IBIAPINA, 2008, p. 12). Essa autora também aponta para o trabalho com o professor e não sobre o professor, de modo a trabalhar “na perspectiva de contribuir para que os docentes se reconheçam como produtores de conhecimentos, da teoria e da prática de ensinar, transformando, assim, as compreensões e o próprio contexto do trabalho escolar” (IBIAPINA, 2008, p. 12 – 13). 107 Em nossa pesquisa, realizamos algumas estratégias, as quais foram fundamentais para os resultados apresentados neste trabalho. Fizemos levantamentos iniciais de informações e discutimos nossa proposta de trabalho. Iniciamos com as pessoas interessadas e deixamos o espaço aberto para que novas pessoas pudessem entrar no grupo. Os trabalhos desenvolvidos criaram condições de colaboração, levando ao desenvolvimento de práticas colaborativas, sem dar importância demasiada aos erros, mas considerando a aprendizagem como um processo. Além disso, planejamos ações de estudos e reflexões, por um longo período de tempo, de modo a oportunizar trocas. Essa oportunidade pode envolver as pessoas dando-lhes vez e voz durante o processo de investigação. Como pesquisadora, era participante do grupo, necessitando dialogar com as outras professoras. Notamos que foi um processo de reflexão crítica, onde cada participante agiu como amigo crítico, ajudou os outros refletindo sobre o que pensavam, como faziam e qual a relação entre essas vertentes. Outra estratégia utilizada por nós foi a de partilhar nossos registros e anotações com as participantes de forma crítica e reflexiva permitindo modificações e correções Avaliando, periodicamente, o que e como as discussões e reflexões influenciaram suas práticas e atitudes. Mais do que definir uma metodologia de pesquisa estamos preocupados em desenvolver uma pesquisa qualitativa, envolvendo formação continuada de professores. Concordamos com Fiorentini (2004) ao destacar que um trabalho realizado por professores não precisa seguir, rigorosamente, um enquadramento teórico-metodológico. Mas a coerência, a consistência e a qualidade da investigação sobre o seu trabalho docente devem ser feitas com, atitude cuidadosa, organizada, ética, reflexiva e crítica para privilegiar seu objeto de estudo. Um estudo que contemple os múltiplos aspectos relacionados ao fenômeno educativo de seus protagonistas e utilizando os aportes teóricos que ajudaram no caso específico do estudo que estiver sendo desenvolvido (FIORENTINI, 2004). Após apresentarmos nossas escolhas metodológicas descrevemos sobre nossas ações e nossos percursos nesse caminhar. 108 CAPÍTULO IV: 4 ESCOLHENDO E PERCORRENDO O CAMINHO esde o momento que fizemos nossas escolhas metodológicas, constatamos que era preciso seguir o caminho: deveríamos escolher por onde caminharíamos e como seria o percurso. Para explicitar nossas escolhas e trajetos, colocamos, nessa seção, o contexto e a constituição do nosso grupo de estudos. O início da caminhada foi um tanto demorado, e precisamos de muita persistência, paciência e esperança para formarmos o grupo. Dando sequência, detalhamos procedimentos para coleta, organização e a análise dos dados. Realizamos também uma apresentação de cada professora, sua formação e nossas considerações iniciais sobre a motivação e participação de cada uma, nesse grupo de estudos. Finalmente, fizemos uma panorâmica do caminhar do grupo, na qual registramos uma breve descrição dos encontros vivenciados e das aulas das professoras, Susana e Beatriz, observadas e participadas por nós, durante o estudo longitudinal. 4.1 Panorâmica do caminhar do grupo: contexto, constituição e consolidação Realçamos nesta seção, uma panorâmica das atividades do grupo, desde o contexto no qual está inserido, a constituição e a consolidação com as reuniões de estudo e com as aulas observadas e/ou participadas. Apresentamos, primeiramente, de forma geral e, posteriormente, deter-nos-emos em alguns detalhes, até mesmo contribuindo para o entendimento de nossas justificativas 109 das escolhas de alguns momentos. Os leitores entenderão um pouco de nosso caminhar e verificarão como desenvolvemos o estudo longitudinal. Nossa pesquisa foi realizada no contexto da Prefeitura Municipal de Vitória (PMV). O primeiro contato ocorreu no mês de junho de 2006, com as coordenadoras que acompanhavam a Formação Continuada de 1ª a 4ª séries em 2006, na PMV. O contato inicial serviu para tomarmos conhecimento dos dias de encontros de formações continuadas e da possibilidade em fazer o convite pessoalmente, para os professores das séries iniciais. A princípio, nos meses de junho e julho de 2006, fizemos cartazes na forma de convites, em duas situações diferentes, mas não tivemos retorno por parte de interessados. Buscamos outras formas de falar com os professores, fomos a algumas escolas e fizemos o convite pessoalmente. Em agosto de 2006, marcamos visitas às escolas situadas nas proximidades da UFES. Conseguimos nomes e telefones de pedagogas responsáveis por dez escolas dessa região, mas somente visitamos nove escolas. Dessas, apenas em cinco conseguimos falar com os professores. Foi deixado um convite, marcando um encontro para o dia 30 de agosto de 2006. Com esse contato mais próximo, explicamos nossa proposta com o grupo de estudos. Uma dificuldade enfrentada relacionava-se aos horários e dias dos encontros, pois precisavam atender tanto as professoras interessadas como a pesquisadora. Visitamos também os encontros de formação e explicamos nossa proposta inicial e convidamos os professores para o encontro do dia 30/08/06. No dia marcado, compareceram duas professoras, e iniciamos os trabalhos com elas. Mas continuamos ligando para as professoras interessadas na tentativa de ampliar o grupo. A reunião seguinte ficou marcada para a semana que compreendia do dia 18 ao 22 de setembro de 2006. Devido a problemas relacionados aos dias e horários disponíveis pelas professoras interessadas, marcamos dois dias para atender aos pedidos delas: na segunda e na terça-feira (dias 18 e 19 de setembro de 2006), às 18h30min no prédio do Centro de Educação/UFES. 110 Compareceram duas professoras em cada um dos dias marcados. As que compareceram, na segunda-feira, foram as mesmas que tinham comparecido no dia 30/08, já na terça-feira, foram outras duas professoras. Em comum acordo com as professoras, estabelecemos deixar os encontros marcados para as segundas-feiras no mesmo horário e local. As professoras que permaneceram no grupo foram Susana e Beatriz, que trabalhavam com 3ª e 4ª séries em escolas diferentes da PMV. Intensificamos os trabalhos e tivemos, ao longo do ano 2006, treze encontros. O grupo se formou, a princípio, com as duas professoras, que atuam em séries iniciais, e a pesquisadora. Tentamos, por diversas vezes, motivar outras professoras a participarem do grupo, porém, sem êxito. No ano de 2007, conseguimos a adesão da professora Elisa, porém, por motivos de horários e outros planejamentos, não pôde continuar conosco. Em julho de 2007, a professora Lucia, que atua com matemática, nas séries finais do ensino fundamental, aderiu aos encontros do grupo. Desde sua constituição, a professora Vânia (coorientadora desta pesquisa) participou, presencialmente, sempre que estava no Brasil, ou por meio de conversas telefônicas e troca de e-mails, quando estava na Alemanha. Gostaríamos de deixar claro que o grupo não esteve “fechado” em nenhum momento e se outros professores quisessem participar seriam muito bem-vindos. A preocupação com o tamanho do grupo nos incomodou por algum tempo e foi um ponto de discussão na qualificação I. Porém, com o passar dos encontros, o entrosamento e o conhecimento que fomos adquirindo umas das outras nos levou a compreender que não teríamos problemas em relação ao número de pessoas integrantes do grupo. Acreditamos que o maior envolvimento, o respeito, a interação e a confiança cresceram entre as participantes exatamente pelo fato de pertencermos a um grupo com cinco membros: Susana, Beatriz, Lucia, Vânia e Sandra. Destacamos que, em muitos encontros, a professora Vânia não esteve presente por morar alguns meses na Alemanha. Entretanto, participou das discussões, pois, conversava, por telefone, antes e depois dos encontros com a professora Sandra. Além disso, em muitas ocasiões, a professora Vânia 111 conversava com todos os membros do grupo durante as reuniões, também por telefone, contribuindo, dessa forma, para os planejamentos e ações realizadas no grupo. Essas atitudes permitiram que Vânia se tornasse membro ativo do grupo, mesmo não estando presente, fisicamente, em todos os encontros. Nesse relato, notamos a difícil tarefa de constituição de um grupo por professores voluntariamente, sem ajuda monetária ou certificados. Isso nos leva a alguns questionamentos: “Porque os professores resistem tanto? Eles já sabem? Não querem saber? Sua carga horária é demasiadamente alta que não os permite inserir outras atividades? Não temos resposta, mas acredito que seja interessante, para nós, enquanto formadores de professores, refletirmos sobre essas atitudes. Após a constituição do grupo de estudos, definimos que os encontros aconteceriam todas as segundas-feiras (18h00min às 20h30min), em uma sala, no prédio do Centro de Educação / UFES (IC IV). A escolha do local se deu pelo fato de cada professora atuar em diferentes escolas, e a universidade estar situada num ponto central e ser de fácil acesso. No início das atividades em 2006, tivemos algumas dificuldades relativas à efetivação de alguns encontros, porque não possuíamos uma sala fixa. Mesmo assim, conseguimos cumprir nossa proposta. As reuniões aconteceram semanalmente, salvo quando houve alguns imprevistos (problemas relacionados à saúde, outras reuniões, falta de energia, feriados, férias e vestibulares da UFES, etc.). Os encontros foram suspensos durante as férias escolares, porém, nesse período, cada participante organizava suas propostas de trabalho para o próximo ano. Nos anos de 2007 e 2008, continuamos a nos encontrar, às segundas-feiras, no mesmo horário, em sala reservada pela profª. Vânia Santos-Wagner, no prédio do IC IV/UFES. Alguns momentos aconteceram em locais alternativos, nos períodos em que a universidade ou o IC-IV estavam fechados, como nas bibliotecas e nas casas da pesquisadora ou da Lucia. Em junho de 2008, decidimos nos reunir quinzenalmente, com poucas exceções necessárias. É interessante destacar que para o ano de 2007, as professoras se preocuparam em assumir uma mesma série do ensino fundamental (3ª série), 112 mesmo trabalhando em escolas diferentes. Dessa maneira, elas acreditavam que aproximaríamos as discussões sobre os conteúdos trabalhados das atividades desenvolvidas em sala de aula, mesmo tendo realidades diferentes. Durante o ano de 2007, compreendemos que a ideia de discussões mais próximas seria complicada, exatamente, pela diferença de realidade vivenciada pelas duas professoras. Em vista disso, em 2008, as professoras não mantiveram essa proposta, a professora Susana não continuou trabalhando com sua turma na 4ª série e assumiu uma nova turma de 3ª série. A professora Beatriz continuou seu trabalho com os mesmos alunos e, em 2008, acompanhou-os com a 4ª série25. Consequentemente, no ano letivo de 2008, trabalhamos na coleta de dados com uma das professoras atuando, na 3ª série e outra, na 4ª série. Em maio de 2007 e, mais profundamente, no segundo semestre desse mesmo ano tivemos como proposta, além dos encontros com o grupo, a observação e participação em aulas de matemática das professoras atuantes nas séries iniciais. A observação e a participação nas aulas serviram para que pudéssemos desenvolver, num trabalho conjunto, atividades elaboradas no grupo, em aulas de matemática e conhecer mais de perto o trabalho dessas integrantes. Caso o leitor tenha interesse, registramos todos os encontros realizados pelo grupo de estudos, com as datas que ocorreram e as professoras presentes em cada um dos encontros no anexo D. Pontuamos, de maneira resumida, as principais propostas ou assuntos discutidos. Ressaltamos alguns pontos considerados importantes e alguns pontos que precisavam ser retomados em encontros seguintes, porque não estavam completamente claros quando surgiram o debate. Inserimos, no anexo E, alguns registros num quadro resumo, de cada aula que observamos das professoras Beatriz e Susana nos anos de 2007 e 2008. 25 Praticamente os mesmos alunos tinham trabalhado na 3ª série em 2007, salvo alguns alunos novatos e outros que pediram transferência ou que ficaram reprovados. 113 Apontamos os principais assuntos trabalhados nas referidas aulas, alguns comentários importantes e as principais metodologias ou materiais utilizados e identificados por nós. A partir desse quadro, pode ser vista a quantidade de dados que possuímos. Daí a necessidade de selecionarmos alguns momentos que consideramos importantes e relevantes para apresentar nossa pesquisa. Foram momentos considerados incidentes críticos 26 , aqueles que, de certa forma, contribuíram para as discussões que revelamos neste trabalho. A escolha não significa que os outros momentos foram menos importantes ou não propiciaram aprendizagens, mas os incidentes críticos selecionados representam a decisão feita pelo grupo como os pontos que mereciam destaques e apresentação neste trabalho. Acreditamos que o grupo amadureceu no sentido de discussão e organização com o passar do tempo. As pessoas se comprometeram com o grupo e contribuíram com sua história de vida, por esse motivo, o grupo foi o retrato dos indivíduos que fizeram parte do mesmo. Organizando e analisando alguns dados obtidos no caminhar do grupo, identificamos quatro grandes momentos. Não foram, linearmente concebidos e percebidos. Porém, essa separação ajuda a entender a dinâmica do grupo. Estes momentos podem ser assim distinguidos: I. O início da constituição do grupo correspondeu aos 13 encontros em 2006, quando participavam apenas as professoras Susana, Beatriz e Sandra. A professora Vânia sabia dos encontros, mas não conhecia as professoras e ainda não tinha participado dos mesmos. Foi um momento de estudo exploratório inicial, de constituição do grupo, em que as professoras se conheceram um pouco e começaram alguns trabalhos. Iniciamos, nesse momento, a investigação sobre nossas aprendizagens, nossas concepções, crenças e atitudes em relação à matemática e ao seu ensino e aprendizagem. Foi um momento introdutório de reflexão 26 Explicamos o que consideramos como incidentes críticos ou significativos na seção 4.4. 114 crítica pessoal sobre nossas práticas e atitudes, frente a algumas questões relativas à matemática. II. Num segundo momento, a professora Vânia começou a fazer parte do grupo (a partir de dez/2006). Assim, passamos a ser quatro professoras participantes, cada uma com sua experiência de vida. O grupo se fortaleceu e foi durante esse momento que sentimos necessidade de estarmos em sala de aula, com as professoras que atuavam nas séries iniciais. Esse seria um modo de nos aproximarmos da realidade comentada pelas professoras Susana e Beatriz. III. Um terceiro momento foi quando outras professoras fizeram parte do grupo: a professora Lucia iniciou sua participação em jul/07 e continuou em alguns momentos em 2008. Participou também a professora Elisa, que compareceu a dois encontros. Porém, pelos incidentes críticos, não conseguimos com os dados selecionados inserir as discussões que tiveram a presença dessa professora nas nossas análises. A presença da professora Lucia no grupo foi importante, pois nos provocava a pensar em outras formas de conceber as discussões. No entanto, não tivemos muitos dados dessa professora, por sua descontinuidade causada por problemas pessoais. IV. Período das atividades realizadas em 2008, nas quais o grupo já estava consolidado e tendo características próprias. As professoras se conheciam, suficientemente, para conseguirem trabalhar em grupo de maneira mais consciente e independente. Realizamos algumas descobertas importantes sobre a influência do grupo em nossas aulas de matemática e sobre nossas crenças e atitudes em relação a esse conteúdo. Após abordarmos a panorâmica do caminhar do grupo, apresentamos um pouco sobre cada professora, sua formação, expectativas para a participação neste trabalho e alguns detalhes que consideramos importantes. 115 4.2 O grupo No grupo, as duas professoras que atuam nas séries iniciais, Beatriz e Susana, possuem mais de 15 anos no magistério com turmas de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental. Além disso, já atuaram ou ainda atuam como pedagogas. Trabalham com as séries iniciais, em escolas da rede Municipal de Vitória, mas com alunos completamente diferentes em muitos aspectos. Uma delas trabalha com alunos de um bairro de classe média e a outra, com alunos da classe baixa, com sérios problemas de risco social. Nos encontros, conseguimos, em vários momentos, levantar semelhanças e diferenças entre os alunos e seus comportamentos em relação à matemática, não para compararmos, mas para entendermos que algumas situações acontecem em ambos ambientes e outras são particularidades. Em muitos de momentos, debatemos sobre acontecimentos em sala de aula e percebemos como vivenciamos situações semelhantes em questões de ensino e aprendizagem, mesmo com algumas realidades diferentes. Quando falamos sobre cada professora, relatamos um pouco sobre sua vida acadêmica e a influência desse aspecto em suas práticas. Sabemos que muitos assuntos abordados, neste trabalho, refletem nossos olhares sobre essas professoras, porém tentamos, sempre que possível, captar o que fica explícito nas suas falas e ações sobre elas mesmas. Além disso, pedimos-lhes que lessem o que escrevemos sobre elas para acrescentarem, modificarem ou clarearem algumas de nossas colocações, durante as devolutivas. Conseguimos observar que a professora Beatriz possuía, desde o início, um encantamento com a matemática, apesar de algumas dificuldades, mas a professora Susana possuía certo medo ou aversão à matemática. A professora Susana sempre mostrou consciência de que precisava superar essa atitude frente à matemática para ajudar, de maneira satisfatória, seus alunos. As professoras Sandra, Vânia e Lucia atuam como professoras de matemática e se encantam com a mesma. Um caso interessante que contribuiu para 116 enriquecer as discussões do grupo foi o fato de que as professoras Sandra e Lucia não fizeram magistério e não possuíam experiência com esse nível de ensino. As professoras sabem matemática, mas desconheciam algumas situações vivenciadas nas séries iniciais. As ideias, colocadas a seguir, são exemplos simples, porém importantes, que nos mostram como precisamos dar mais atenção aos nossos professores das séries iniciais e como devemos contribuir para sua formação pessoal e continuada na realização desse tipo de trabalho. E ainda, como podemos, num trabalho em que existe uma parceria entre professores das séries iniciais e os das séries finais do ensino fundamental, organizar momentos de aprendizagem ampla para todos os integrantes dos grupos. Vamos apresentar, de maneira mais sistematizada, das professoras, a fim de que o leitor possa conhecer um pouco mais sobre as profissionais. Foram relatos construídos ao longo do estudo longitudinal, com base em várias atividades realizadas com as professoras do grupo em diferentes momentos. 4.2.1 Professora Beatriz Para o grupo, a professora Beatriz é uma pessoa meiga27 e tímida, pois, em muitos momentos, precisávamos pedir para que ela falasse ou opinasse. Caso contrário, ela ficava quieta ou preferia ouvir mais que falar, principalmente, no início das atividades do grupo. As participantes do grupo também a consideram inteligente, criativa, aberta a novidades, caprichosa e curiosa porque sua atitude nos encontros e em sala de aula mostrou uma “sede” em aprender mais e a descobrir diferentes formas de trabalhar a matemática. A professora Beatriz também nos impressionou por sua calma, em sala de aula, até seu tom de voz transmitia tranquilidade. Podemos dizer que essa professora é uma pessoa 27 Os adjetivos referentes à professora que utilizamos neste parágrafo foram apontados por nós em alguns momentos dos encontros. A listagem de adjetivos surgiu no encontro do dia 15/set/08 a pedido da pesquisadora. 117 corajosa, persistente e perseverante, conforme registros da sua trajetória de vida escolar. A professora Beatriz atua no magistério há mais de trinta anos, graduou-se em Letras Português/UFES e fez pós-graduação em Planejamento Educacional. Atua como professora das séries iniciais em escolas da Grande Vitória, uma da Prefeitura Municipal de Vitória e outra do estado que foi municipalizada para a Prefeitura da Serra. Em 2006, quando iniciamos o grupo, trabalhava como coordenadora desta escola da Serra (que pertencia à rede estadual de ensino). Beatriz afirmou, em vários momentos do grupo, que gosta de ler e de estudar, de lançar desafios para seus alunos e ajudá-los a compreender melhor o que estudam, além disso, gosta de atividades que desenvolvam o raciocínio lógico. Em diferentes momentos do grupo e em nossas observações de aulas de matemática, notamos essa proposta da professora Beatriz, que gosta de desafios e trabalha desta forma com seus alunos. Na realização de uma atividade sobre suas memórias, referentes à matemática, enquanto aluna, ela começou a contar-nos sobre sua vida escolar. Afirmou que somente frequentou escola regular quando fez universidade, antes disso foi, em grande parte, autodidata em relação a sua aprendizagem. Aprendeu a ler, a escrever e a contar com seu pai, agricultor da região montanhosa do Espírito Santo, assim como todos os seus irmãos. Mas não estava satisfeita apenas em ler, escrever e contar, ela quis ir além, e assim estimulada, fez o ensino fundamental num supletivo, por meio do Instituto Universal Brasileiro. Fez inscrição e recebia as apostilas em casa, realizava as atividades e mandava as resoluções pelo correio, conseguindo concluir o ensino fundamental. Ela afirmou que, em muitos momentos durante esse estudo, desenvolvia algumas atividades de matemática por repetição, mas ficava sem compreender a lógica ou por que se fazia daquela forma, pois não tinha um professor que a explicasse. Morava numa região do interior do estado do Espírito Santo, carente de professores, e assim, por ter concluído o ensino fundamental, conseguiu trabalhar como professora das séries iniciais no município. Num programa do governo local, pôde fazer o ensino médio também com caráter de supletivo, no 118 Projeto de Habilitação do Professor não Titulado – Projeto HAPRONT. O curso teve duração de 36 meses, sendo que, durante esses meses, os professores eram submetidos a avaliações e revisões presenciais. Além disso, os professores que participavam do projeto eram visitados em suas escolas para verificação se estavam ou não aplicando em sala de aula o que era ensinado (as teorias) trabalhado no curso28. Todo esse esforço a levou à universidade onde cursou licenciatura em Letras Português/UFES. Foi a primeira vez que fez um curso completamente presencial. Contou-nos que conseguiu fazer a parte discursiva da prova do vestibular porque o seu pai, descendente de alemães, lhe contava histórias de guerras que sua família tinha vivenciado, e esse foi o assunto cobrado na prova discursiva. Quando perguntada sobre seus objetivos ao entrar no grupo, Beatriz afirmou que gostava de matemática e pretendia aprender outras formas de ajudar seus alunos com a aprendizagem dessa disciplina. A participação da professora no grupo foi intensa, na maioria das vezes ela tentou inserir em sua sala de aula, aquilo que discutíamos ou que partilhávamos como propostas nos encontros. Ela comentou, no grupo, que trabalha em sua escola acompanhando os mesmos alunos na 3ª e 4ª séries. Dessa forma, conseguimos acompanhar seu trabalho numa mesma turma durante os anos 2007 (3ª. série) e 2008 (4ª. série). Nesse trabalho, observamos aprendizagens dos alunos, mas não aprofundamos o assunto porque o nosso enfoque foram aprendizagens das professoras. Beatriz nos chamou a atenção por sua postura em relação ao ensino da matemática e seu relacionamento com os alunos. Ela possuia uma preocupação em tentar responder a todos os questionamentos feitos por seus alunos, de sempre desafiá-los com atividades diversificadas que envolvam raciocínio lógico. Ela mesma afirmou que sua preocupação teve fundamento na sua escolarização, conforme já comentado anteriormente. Beatriz afirmou não desejar que seus alunos tivessem alguns sentimentos vivenciados por ela, 28 A professora nos deu mais detalhes sobre esse curso após fazer uma revisão do que tínhamos escrito sobre ela. 119 quando não conseguia entender alguns conceitos. Foram sentimentos relembrados pela professora na atividade sobre a memória, enquanto aluna. 4.2.2 Professora Susana Desde o primeiro encontro, a professora Susana mostrou-se falante 29 , espontânea, corajosa e ousada. Isto foi perceptível pelas participantes do grupo de estudos, por meio de seu envolvimento. Ela não teve medo de se expor, de colocar suas ideias, mesmo sem a certeza de estarem corretas. Também percebemos que a professora é dedicada e organizada. Um exemplo dessa organização foi o seu caderno de anotações dos encontros e seu caderno de planejamento da escola. Durante os encontros e em sala de aula a professora Susana se mostrou inteligente, perceptiva e também teimosa, pois, em diferentes momentos ela queria (ou insistia em) fazer o que era proposto, mas do seu jeito. Normalmente, estava alegre e bem divertida, inclusive nos ajudava a olhar situações de outra forma. Ela chamou nossa atenção por sua criatividade. Reconhecemos isso nos momentos em que partindo de temas ou de situações propostas, ela conseguia fazer relações interessantes entre termos matemáticos e a linguagem conotativa, alguns dos quais destacaremos posteriormente. A professora Susana atua no magistério há mais de 20 anos, fez o curso de Magistério no Instituto de Educação, em Vitória, e graduou-se em Pedagogia pela UFES. Possui pós-graduação em Supervisão Escolar e trabalha como professora das séries iniciais do ensino fundamental e, como pedagoga, em escolas da Prefeitura Municipal de Vitória. Susana, desde os primeiros momentos, afirmou que não gostava muito de matemática e sentia dificuldades em ensinar alguns conteúdos matemáticos. Como trabalhava em escolas que 29 Os adjetivos referentes à professora as quais utilizamos neste parágrafo foram apontados por nós em alguns momentos dos encontros. A listagem de adjetivos surgiu no encontro do dia 15/set/08 a pedido da pesquisadora. 120 estão situadas em zona de risco social, estava constantemente preocupada com questões sociais que envolviam seus alunos. É uma professora bastante comunicativa e participou, ativamente, com comentários e pontos de vista diferenciados. Uma situação interessante em relação à professora Susana foi que, desde o início, ela expôs suas dúvidas sem medo. Tanto que no primeiro encontro (30/ago/06), ela levou uma prova que iria aplicar no dia seguinte e perguntou o que achávamos. A prova era referente a expressões numéricas, contendo apenas um enunciado que era “resolva as expressões numéricas abaixo”, seguida de dez letras com expressões a serem resolvidas. Alguns exemplos das expressões são: 10 x 10 +1 =; 250 x 3 – 750 =; 43 x 13 – 27 =; (6+10) x (4 + 3)= e 530 – (20 – 2 x 5 + 10) =. Antes mesmo que respondêssemos o que achávamos, ela disse que gostaria de fazer diferente, mas não sabia como, afirmou que estava muito „seco‟. Conversamos sobre os seus objetivos para aquela avaliação; após ter-nos explicado, sugerimos-lhe que trabalhasse com resolução de problemas. Chegamos á conclusão de que ela poderia pedir para os alunos escolherem uma entre as expressões e escrevesse um problema cuja solução fosse, exatamente, a expressão escolhida. Outra maneira de desafiar os alunos seria pedindo que eles explicassem como fariam a conta, sem que a resolvessem. As professoras afirmaram que nunca tinham pensado assim e reconheceram que poderia dar certo, Susana aceitou testar. No encontro posterior a esse (que aconteceu 15 dias depois), ela levou as provas resolvidas por seus alunos, pois queria nos mostrar como foi produtiva a mudança sugerida. Estava satisfeita com seus alunos e com a mudança, abordando um novo enfoque. 4.2.3 Professora Sandra Eu, professora Sandra, fui persistente desde o início da constituição do grupo, pois acreditava e acredito que, com esse tipo de iniciativa, pudéssemos 121 aprender mais sobre matemática, principalmente, sobre a trabalhada nas séries iniciais. Acreditava também que esta investigação contribuiria para a educação matemática no que se refere à formação de professores. As participantes do grupo de estudos me consideram uma pessoa meiga, amiga, atenciosa e paciente, por sempre estar disposta a escutar e a dialogar. Outras características destacadas foram inteligência, curiosidade e criatividade, por conseguir envolver de diferentes maneiras as professoras do grupo e propor diversas atividades para o trabalho de matemática em sala de aula. Durante os encontros, eu gostava de instigar e provocar as demais professoras para suscitar discussões sobre os processos de ensino e aprendizagem de matemática, em especial, nas séries iniciais. As professoras me consideram diligente, responsável e estudiosa, pois estive sempre desenvolvendo atividades e propondo sugestões que favoreceram o crescimento do grupo e a sua consolidação. Eu atuo como professora de matemática há cerca de 10 anos, e trabalhei com todos os níveis de ensino básico e superior30. Sou professora de matemática das séries finais do ensino fundamental da Prefeitura de Vitória e professora de ensino superior de uma faculdade particular de Vitória. Também tenho experiência no trabalho com crianças fora da escola, em ambiente religioso há mais de 20 anos. Vários fatores me levaram a possuir curiosidade sobre o que e como crianças das séries iniciais desenvolvem e trabalham com a matemática. Eu já gostava de matemática desde o ensino básico, sempre tive facilidade em aprender os diferentes conteúdos de matemática. Fiz ensino médio técnico e optei fazer licenciatura em Matemática como curso superior. Terminei o curso na Universidade Federal do Espírito Santo, em 2000/2 e já estava trabalhando em sala de aula de ensino médio. A princípio, não pensava em ser professora, mas após ter iniciado o trabalho nessa área percebi que tinha feito a opção 30 Professora do ensino médio por três anos, ensino fundamental há mais de sete anos e professora do ensino superior por, aproximadamente, oito anos. 122 correta para minha vida profissional. Eu gosto de instigar meus alunos a pensar na matemática, gosto de levar os alunos a conjecturar, a buscar relações entre o que eles já conhecem ou que sabem de outras disciplinas com a matemática estudada. Valorizo o que conseguem realizar sozinhos e tento incentivá-los a não desistir perante dificuldades que podem aparecer durante o processo de construção do conhecimento matemático. Essa estratégia foi utilizada por mim para conduzir algumas discussões nos encontros. Tentava valorizar o que as professoras conseguiam fazer e mostrava que elas poderiam ampliar algumas construções delas próprias se persistissem e confiassem mais nelas mesmas. Na seção 1.1, comentamos alguns caminhos trilhados por mim e que me motivaram a realizar esta pesquisa. Atividades como a coordenação de formação continuada, participação em grupos de estudos, organização de materiais para a formação continuada (CeFoCo), ajudou-me a entender a proposta de formação continuada a partir de materiais produzidos por um grupo. Também fui convidada a desenvolver, em 2006 e 2007, encontros com alguns Centros Municipais de Educação Infantil – CEMEI, para trocar ideias sobre a matemática que pode ser trabalhada nesse nível de ensino. Além disso, em 2007 e em 2008, também participei, a convite das escolas de momentos de formação continuada para trabalhar com os professores, gerando discussões sobre a matemática das séries iniciais. Essas foram algumas das experiências e vivências durante o caminhar da pesquisa. 4.2.4 Professora Lucia A professora Lucia tem pouco mais de 10 anos de atividade docente, fez licenciatura em Matemática na Universidade Federal do Espírito Santo e atuava em escola particular da Grande Vitória, com o ensino de matemática nas séries finais do ensino fundamental e com ensino médio. Trabalhou durante sua participação no grupo em escola pública da rede municipal de Vitória. Gosta muito de matemática e artes, consegue levar aos seus alunos alguns 123 conteúdos que mostram a interligação entre essas duas disciplinas, como por exemplo, o origami. É uma pessoa inteligente, persistente, porém teimosa. Essas foram algumas das características que as professoras participantes indicaram para ela. Gosta de aprender coisas novas e de fazer várias ligações e interseções entre a matemática e outras disciplinas. Tinha algumas crenças que são fortes e que causam conflitos em alguns momentos; nem sempre é fácil para ela, quando tem que confrontar algumas coisas novas com as crenças que estão enraizadas. A professora possuía certa resistência em entender ou perceber outros caminhos em algumas situações vivenciadas. Participou de alguns encontros, mas não pôde estar presente da maioria deles, embora tenha contribuído, diretamente, para algumas discussões. Devido a sua falta de conhecimento em relação ao trabalho realizado pelos professores das séries iniciais pode levantar alguns debates importantes para o grupo. Seu objetivo para a participação no grupo foi desejar aprender mais sobre a matemática trabalhada nas series iniciais do ensino fundamental. Porque sentia necessidade de ajudar seus alunos de 5ª série que possuíam algumas dificuldades, e não entendia porque elas apareciam. Tinha uma ampla experiência com escolas particulares, quando iniciou sua atuação em instituição pública. Sentiu muita diferença, e sua participação nos encontros a ajudou a entender um pouco mais sobre a realidade que viveu. Como as outras professoras do grupo tinham ampla experiência com escolas públicas puderam contribuir, com suas vivências, para que ela pensasse e conseguisse perceber as sutilezas, semelhanças e diferenças entre as duas realidades. 124 4.2.5 Professora Vânia A professora Vânia atua há mais de 25 anos como professora, tem ampla experiência em todos os níveis de ensino, desde as séries iniciais até cursos de pós-graduação. Fez curso de magistério no Rio de Janeiro e graduou-se em licenciatura e bacharelado em Matemática na Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – no ano de 1976. Seu mestrado em matemática foi defendido em 1980 na UFRJ e o doutoramento em Educação foi feito em Indiana University, nos Estados Unidos da América e defendido em 1993. Tem mais de 30 anos de atuação como professora nesses diferentes níveis de ensino. Atuou em escolas públicas, do Rio de Janeiro, com séries iniciais e finais do ensino fundamental, e com alunos de licenciatura da UFRJ. Foi integrante do projeto Fundão, na UFRJ, no qual trabalhou com professores sobre educação matemática. Como um dos resultados dessa atuação publicou o livro intitulado “Avaliação de aprendizagem e raciocínio em matemática: métodos alternativos”, em 1997. Desde 1997, trabalha com alunos de mestrado e doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação na Universidade Federal do Espírito Santo. Além disso, organizou, em Vitória, o grupo de estudos voltado para a compreensão dos professores sobre suas próprias práticas já citado anteriormente. Vânia possuía ampla experiência no trabalho com professores sobre suas práticas em sala de aula. Estudou e aprofundou diferentes formas de avaliação de conteúdos matemáticos. Podemos destacar o que foi mais significativo no grupo de estudos que descrevemos neste trabalho, que foi o trabalho em grupo e a utilização da escrita nas aulas de matemática. No encontro do dia 15/set/08 as professoras pontuaram que consideram Vânia como uma pessoa inteligente, amiga, interessada e motivada pelo que faz. Por suas atitudes podemos dizer que é uma pessoa instigante, idealista, esclarecedora e atenciosa. O que nos chamou a atenção foi a persistência dessa professora e sua tentativa de manter uma postura ética. O trabalho neste 125 grupo e no outro que já citamos anteriormente retratam essas características da professora Vânia. 4.3 Procedimentos para coleta de dados Os instrumentos empregados para a coleta de dados foram construídos conforme as necessidades levantadas ao caminhar e ao desenvolver a pesquisa. Apresentamos os instrumentos que usamos, porém destacamos que eles não estão colocados na ordem em que foram aplicados ou desenvolvidos, simplesmente, porque esses instrumentos foram utilizados em diversos momentos. Alguns foram repetidos mais de uma vez e outros perpassaram todo o estudo longitudinal. Às vezes, fizemos modificações que julgamos necessárias, de acordo com a demanda do estudo. Cremos que o mais importante seja conhecer a forma como esses instrumentos foram empregados e por que escolhemos cada um deles. Na exposição das etapas desenvolvidas na pesquisa e nas análises, indicamos quais instrumentos foram utilizados e seus objetivos em cada momento. Apresentamos os instrumentos que usamos e como identificamos cada um deles a seguir: Metáforas Consideramos que metáforas nos auxiliaram no entendimento sobre o pensamento de determinados conceitos, contribuem para entendermos alguns acontecimentos, escolhas e modos de conceber o ensino, e o contexto no qual o professor está inserido, evidencia a maneira que demos sentido à realidade e ao que foi vivenciado por nós. Segundo Chapman (1997, 2005, 2006), elas nos ajudam a entender questões referentes a níveis cognitivo e afetivo dos professores com a matemática e com seus processos de ensino, de aprendizagem e de avaliação. Portanto, podemos dizer que as metáforas se 126 constituem numa forma metodológica que nos mostram um modo de olhar diferentes situações. As atividades utilizando metáforas foram adaptadas de textos escritos por Olive Chapman (2005) após demonstração em um ciclo de três palestras, no PPGE/ Centro de Educação / UFES, e da participação de um grupo de trabalho com a profª. Vânia Santos-Wagner. As pesquisadoras acreditam que metáforas propiciam início de diálogo com as professoras participantes. Temos conhecimento de que „metáforas‟ podem ser utilizadas em outras pesquisas com diferentes propósitos. Porém, nesta pesquisa, a opção foi de desvelar algumas informações de maneira indireta, sobre a relação das professoras com a matemática. Textos escritos pelas professoras: narrativas, memórias positivas e negativas, histórias de aulas e relatos de experiência Para a constituição e integração do grupo, iniciamos com o conhecimento e entrosamento entre as professoras. Para isso, realizamos atividades, envolvendo memórias das professoras enquanto alunas e também professoras, pontuando primeiramente os aspectos positivos e, posteriormente, os negativos relacionados à matemática, seu ensino, aprendizagem e avaliação. O compartilhamento de histórias de aulas, memórias positivas e negativas nos ajudaram a compreender que os acontecimentos, as atitudes e as emoções não devem ser analisados isoladamente. Acreditamos que “trazer à tona” algumas dessas memórias ajudou, no que tange o conhecimento de nós mesmas, enquanto professoras, aprendizes e favorecem o entendimento de outras situações que envolvem o trabalho intelectual e profissional. Trabalhamos, assim, aspectos cognitivos e afetivos e, ao mesmo tempo, possibilitamos uma tomada de consciência de cada uma de nós. Cadernos de bordo da pesquisadora: um sobre o grupo e outro sobre as observações e/ou participações em aulas de matemática de Beatriz e Suzana Organizamos, inicialmente, um caderno de bordo com anotações realizadas durante os encontros, no qual anotamos o máximo de informações possíveis, 127 deixando para detalhar com mais reflexão, num momento posterior. Mesmo quando tivemos o recurso da gravação em áudio, anotamos o que achávamos importante e o que merecesse destaque, essa prática contribuiu muito para o nosso trabalho, quando tivemos problemas com o gravador. Com as anotações obtivemos um histórico de nosso caminhar. Esse caderno nos auxiliou na reconstrução do caminhar percorrido e vivenciado pelo grupo, durante esses dois anos e quatro meses. Possuíamos também um caderno de bordo para a observação e/ou participação das aulas das professoras Susana e Beatriz, separado, em dois blocos, as anotações das aulas dessas professoras. As anotações favoreceram um acompanhamento das aulas e a continuidade do trabalho de cada uma. Numeramos as páginas do caderno, como proposto pela orientadora Ligia, a fim de facilitar a identificação durante as análises dos dados, sendo necessário pelo grande volume de dados que tivemos e para nos auxiliar na escolha dos incidentes críticos ou significativos. É interessante colocar que as anotações foram recortes de aulas que consideramos relevantes e aqueles ressaltados e compreendidos no amplo processo vivenciado na sala de aula de matemática. Constituíram-se de fragmentos das aulas, pois não conseguimos colocar todos os componentes que se encontravam inter-relacionados durante o processo de ensino e aprendizagem desses momentos. Relatos e reflexões escritas e compartilhadas por e-mail com coorientadora Em muitos momentos da pesquisa, fizemos relatos escritos e orais por telefone e e-mail para a co-orientadora Vânia. Discutíamos alguns instrumentos utilizados e preparávamos novos instrumentos, após análises dos resultados obtidos. Os relatos se transformaram em reflexões escritas que fizeram parte de nossas análises iniciais dos dados e do caminhar da pesquisa. Eles foram usados para retomar momentos de aprendizagens. 128 Gravações em áudio de encontros do grupo e aulas Pedimos e conseguimos a autorização das professoras para gravar em áudio os encontros. Em algumas circunstâncias esquecemos o gravador ou tivemos falhas no funcionamento do aparelho, por esse motivo não temos as gravações de todos os encontros. Nas reuniões em que não possuíamos o recurso do gravador, o volume de informações anotadas no caderno foi mais intenso e, posteriormente, tentava reler minhas anotações e acrescentar alguns comentários importantes. Em algumas aulas, tentamos realizar gravações em áudio, porém o ruído atrapalhava e notamos que não seria viável o uso desse recurso. Ouvimos todas as gravações, e ao analisarmos os encontros, transcrevíamos algumas partes que considerávamos importantes. Ao escutar as gravações, acrescentávamos detalhes nas anotações no caderno, destacando pontos importantes que não tinham sido percebidos no momento do registro. Registros obtidos de atividades trabalhadas em sala de aula: fotos de professoras e de alunos desenvolvendo atividades, fotos de cadernos de alunos, textos escritos pelos alunos e alguns cadernos de alunos. Solicitamos que as professoras levassem, aos encontros do grupo, cadernos e atividades de alunos para conversarmos sobre o trabalho em sala de aula e como seus alunos realizavam o registro. Esse instrumento nos auxiliou a entender e a perceber como as professoras organizavam seus processos de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática. No decorrer do processo, sentimos necessidade de utilizar outros meios de registros, por esse motivo, iniciamos, em julho de 2007, o registro por meio de fotografias. As fotos mostraram um pouco da dinâmica da sala de aula e do que os alunos anotavam nos cadernos. As análises das fotos proporcionaram novos olhares sobre a pesquisa e sobre as professoras no processo de ensino e aprendizagem de matemática. É interessante destacar que, no decorrer do processo de pesquisa, alguns alunos modificaram algumas de suas formas de registro, melhoraram suas letras e a apresentação do que faziam, porque queriam que seus cadernos fossem fotografados. Em muitas aulas, os alunos 129 produziram materiais escritos aos quais tivemos acesso, como: poesias, resumos, cartas e outros. Esclarecemos que algumas das fotos relacionadas nos cadernos foram de aulas observadas e participadas por nós. Porém, não nos restringimos às aulas que foram observadas, pois também tiramos fotos de atividades nos cadernos, mesmo das aulas não observadas. Algumas dessas aulas foram comentadas pelas professoras nos encontros do grupo de estudos ou em conversas informais. As aulas que não foram comentadas, diretamente, pelas professoras, mas que foram fotografadas e forneceram-nos dicas ou pistas sobre a continuidade do desenvolvimento do trabalho dos conteúdos em sala de aula. Materiais impressos e aplicados pelas professoras: provas, listas de exercícios/atividades e livros didáticos Em alguns encontros, foi solicitado que as professoras levassem materiais que utilizavam em sala de aula, tais como: atividades xerocadas, livros didáticos, provas e outros. Muitas vezes, mesmo sem nossa solicitação, as professoras levaram materiais para serem mostrados e discutidos no grupo. Nessas situações demonstravam sentir necessidade de compartilhar seus entusiasmos, seus questionamentos e/ou dificuldades no processo de ensino e aprendizagem de matemática. Isso foi importante, pois desde o primeiro momento do grupo, discutimos e refletimos sobre provas, seus objetivos e como poderíamos continuar a avaliação da aprendizagem. Avaliações sobre a pesquisa Organizamos formulários de avaliação que foram aplicados nos finais dos anos ou em momentos importantes. Avaliações que estavam direcionadas ao que era discutido, sobre a influência do grupo de estudos, em afinidade com nossa atuação nas aulas observadas e em conteúdos matemáticos que se relacionavam com nossa pesquisa. Muitos dos formulários foram resultados de conversas com a coorientadora, em tentativas de elaborar instrumentos de avaliação. Os formulários foram reformulados, diluídos, reestruturados para 130 atender às demandas que apareciam no decorrer da pesquisa. Também fizemos algumas avaliações com os alunos em sala de aula. Entrevistas semi-estruturadas individuais e coletivas Concomitantemente, realizamos entrevistas semi-estruturadas individuais e coletivas, no entanto, as coletivas se destacaram pela estrutura do grupo. Denominamos entrevistas coletivas aos momentos de discussões no grupo de estudos, as quais geraram reflexões e demandaram tempo de debate, em relação a um objetivo específico. Em muitos encontros, já estruturávamos tópicos relacionados a comentários anteriores ou a uma discussão informal, preparávamos perguntas, questões ou tópicos, resultante da necessidade do próprio grupo, surgindo, assim, outros tópicos, outras questões centrais organizadas pelo grupo e que direcionaram nossas discussões. Estamos de acordo com Ponte (2001), ao entender essas narrativas e entrevistas, como conversas informais que tiveram seus temas estruturados pela pesquisadora. 4.4 Identificando e analisando o caminhar: organização e análise dos dados Relatamos, anteriormente, os diferentes procedimentos que geraram dados no decorrer da pesquisa longitudinal. Com base no levantamento, selecionamos e organizamos os dados coletados para analisarmos de forma ampla e aprofundada. Seria inviável, para um trabalho dessa natureza, registrar e analisar todos os dados coletados por sua grande quantidade. Em sequência, apresentamos um pouco dessa seleção, organização e análise dos dados, que consideramos como incidentes críticos ou significativos. A análise aconteceu em vários níveis. Realizamos, paralelamente, aos encontros uma pré-análise e aprofundamos em diferentes níveis de análise até 131 concluirmos com a triangulação dos dados, na qual analisamos a contribuição dos diferentes autores e das teorias que nos embasaram nesta pesquisa para atingirmos nossos objetivos. Selecionamos dos dados coletados, aqueles que se referiram aos momentos significativos ou incidentes críticos. Consideramos como momentos ou incidentes significativos aqueles apresentados pelos professores participantes do grupo, como os que representavam possíveis situações que incluíam sucesso ou insucesso nas situações de ensino (LOPEZ – REAL, 2003). Convém salientar – assim como Lopez-Real (2003) chama atenção –, que os momentos significativos são específicos de determinado professor, no nosso caso do grupo ao qual fazemos parte. Os incidentes escolhidos foram aqueles apontados no grupo, por um ou mais participante, como incidentes que contribuíram, diretamente, para debates e discussões, em vários momentos no decorrer do estudo longitudinal. E outros que ajudaram a responder as perguntas de pesquisa. Após fazermos a catalogação das aulas (anexo E) e dos encontros (anexo D), definimos nossas escolhas das aprendizagens referentes aos conteúdos matemáticos que iríamos apresentar no trabalho. De acordo com os incidentes críticos ou significantes os conteúdos escolhidos foram geometria e resolução de problemas, envolvendo as quatro operações, conteúdos esses que estavam presentes, em diferentes momentos, nos relatos das professoras e nas discussões do grupo em todos os anos do estudo. Quando investigamos aprendizagens e suas relações com os aspectos afetivos, concluímos que os incidentes significativos foram momentos em que as participantes começaram a perceber e a compreender sua própria relação com a matemática, seu ensino, aprendizagem e avaliação. Além disso, alguns aspectos afetivos estiveram presentes nas aulas e nos encontros onde destacamos algumas crenças, concepções e atitudes frente à matemática e ao seu ensino em sala de aula e à aprendizagem docente de alguns conteúdos e metodologias. A integração das professoras participantes nos mostrou alguns incidentes significantes relacionados à parte afetiva. Acreditamos que os 132 momentos ou incidentes significativos possuem influências dos modos de pensar das professoras. E esse está diretamente relacionado com a formação de cada professora, com suas vivências e com a experiência de pertença em relação a esse grupo de estudos. Um fato importante e valorizado nesta pesquisa foi o retorno, que denominamos „devolutiva‟. A troca de informações e as discussões com as professoras, principalmente, em relação aos materiais selecionados e em relação às nossas análises, foi algo privilegiado. Em diferentes momentos ao longo da pesquisa, as professoras contribuíram ao expressarem suas opiniões sobre alguns materiais para análise. Também foram solicitadas a dar seus pareceres, identificando momentos que julgavam importantes ou os incidentes significativos que mereciam destaques. Também solicitamos explicação sobre os motivos que as levaram a não selecionar algumas aulas, com as devidas justificativas. Questionávamos se compreendiam nossa forma de analisar, se havia ressonância ou dissonância com os nossos comentários. Além disso, se gostariam de modificar, esclarecer ou complementar algumas de nossas considerações referentes aos resultados, de modo que nossas interpretações fossem fidedignas. Com esse procedimento, acreditamos ter garantido confiabilidade às nossas interpretações e compreensões. Colocamos essa atitude como uma triangulação das participantes. Um exemplo desse procedimento ocorreu ao selecionarmos dentre o bloco de aulas observadas e participadas, as que julgávamos interessantes de serem detalhadas e analisadas. Pedimos às professoras que nos auxiliassem neste processo de seleção por meio de uma listagem das aulas observadas. Confrontamos as escolhas realizadas pelas professoras com nossas seleções e, em conformidade com os objetivos, escolhemos as aulas que foram detalhadas e analisadas. Em muitos momentos, as aulas selecionadas pelas professoras participantes coincidiram com as escolhidas por nós. Para nós, a coincidência não foi um indício aleatório, mas a revelação de que já conseguimos conhecer as professoras e que o entrosamento se tornou cada vez mais fortalecido no grupo. Um dos motivos foi o fato de termos formado um 133 grupo onde atuamos como parceiros profissionais ou como amigos críticos (KRAINER, 1994, 1998). A triangulação foi realizada com as aulas nas quais participamos, com os dados obtidos nos encontros do grupo de estudo e com outros materiais, como: fotos de aulas e de cadernos de alunos, provas elaboradas pelas professoras, gravações de nossas conversas, ou através dos questionários respondidos em diferentes momentos. Relatamos essas triangulações no decorrer das apresentações das análises e conclusões. Pontuamos alguns dos procedimentos que realizamos para organizar e analisar os encontros do grupo de estudos e as participações de aulas das professoras Susana e Beatriz, sobre a matemática nas séries iniciais: descrevemos sobre nosso caminhar na fase de observação, organização, análise das aulas e reflexões em grupo. Tivemos um total de 73 encontros distribuídos ao longo dos dois anos e quatro meses. Para expor uma panorâmica dos momentos do grupo de estudos, apresentamos, na tabela 1, os números de encontros realizados em cada um dos três anos desse trabalho. Tabela 1- Número de encontros realizados pelo grupo Anos Número de encontros do grupo de estudos 2006 2007 2008 Total 13 36 24 73 encontros Com esses números, podemos inferir a grande quantidade de materiais que puderam ser coletados e compartilhados. Por esse motivo, explicitaremos adiante as nossas escolhas dos encontros, ou partes desses, que serão analisados. Colocamos também justificativas dos tópicos discutidos que foram escolhidos e apresentamos a forma como organizamos o material para que o leitor entenda a dinâmica ocorrida nos ambientes de aula. As observações das aulas das professoras Susana e Beatriz, iniciaram no dia 30 de maio de 2007, ocorriam uma vez por semana, em dia previamente combinado, e duravam o equivalente a 2 ou 3 aulas semanais. Em um primeiro 134 momento, participamos das aulas como ouvintes para que os alunos se acostumassem com nossa presença e se sentissem à vontade para interagir com os outros alunos e com a professora. Além disso, para aprendermos, no próprio contexto da pesquisa, em sala de aula a desempenhar o papel de observadora nesse processo da pesquisa. Depois de um tempo, iniciamos uma maior interação com as turmas, conforme planejávamos durante os encontros. Compreendemos que, aos poucos, as observações tornaram-se participações, pois, de certa forma, fazíamos parte da rotina da sala de aula e realizávamos alguns trabalhos com os alunos. Na turma da professora Beatriz, que acompanhamos por dois anos consecutivos (2007 e 2008), o entrosamento foi maior e, em 2008, não houve problemas com a minha presença nas suas aulas31. Entretanto, nas aulas observadas e participadas da professora Susana, precisamos passar pelo processo inicial de entrosamento e aceitação da turma em relação a minha presença, nos anos de 2007 e de 2008, porque eram turmas diferentes. Por esse motivo, o entrosamento com os alunos dessas turmas foi menos intenso quanto com o dos alunos da professora Beatriz. Ainda dentro das nossas ações neste estudo longitudinal e ampliando mais o entendimento da dimensão deste trabalho, apresentamos um quadro resumo do total de aulas observadas de cada professora que ensina matemática, nas séries iniciais, nos anos de 2007 e 2008. Tabela 2: Número de aulas vivenciadas com as professora Susana e Beatriz Professoras Anos Beatriz Susana 2007 18 aulas 21 aulas 2008 14 aulas 15 aulas Total 32 aulas 36 aulas Os dados coletados rapidamente se transformaram num volume grande de informações e sentimos necessidade de planejar a organização dos mesmos para facilitar nossa análise, conforme já comentamos. Outros materiais, obtidos por meio de folhas xerocadas disponibilizadas pelas professoras, foram 31 Quando a professora Vânia estava em Vitória participava das aulas dessas professoras. 135 organizados em pasta arquivo e separados de acordo com o ano em que foi coletado. Aprendemos muito durante a pesquisa, inclusive após cometer alguns „erros‟ no processo de coletar, organizar e dar o retorno para as professoras. Mas, percebemos os erros e fomos acertando, o que nos ajudou a crescer como pesquisadora ao longo deste estudo longitudinal. Quantificamos a participação de cada uma das professoras. Isso contribui na justificação de nossas escolhas em aprofundar as análises nas aprendizagens das professoras Beatriz e Susana, pelo envolvimento das duas e pela dedicação a este grupo de estudos. A tabela 3 apresenta o total de encontros participados por cada uma das cinco profissionais envolvidas. Colocamos também dados da professora Elisa que não pode continuar no grupo. Tabela 3 – Quadro resumo da participação de cada professora no grupo de estudos Encontros Total de Porcentagem de participação em Professora encontros encontros 2006 2007 2008 Sandra 13 36 24 73 100 % Susana 12 32 22 66 90 % Beatriz 11 33 23 67 92 % 32 Vânia 4 9 8 21 29 % Lucia 9 10 19 26 % Elisa 2 2 3% Com base nesses dados da tabela 3, constatamos que somente a pesquisadora teve 100% de participação. Porém, é verídica a participação das professoras, Susana e Beatriz, em mais de 90 % dos encontros. Assim sendo, muitos dados escolhidos para análise foram àqueles coletados dessas professoras. A professora Lucia compareceu em alguns momentos, a partir de 2007, por isso, não possuímos dados suficientemente para analisarmos. Por sua vez, a professora Elisa esteve presente a apenas dois encontros de 2007, não podendo continuar no grupo por causa do seu local e horário de trabalho. Vânia participou das reuniões, presencialmente, ou por telefone, entretanto, tinha conhecimento do caminhar do grupo. Esses dados numéricos e o fato de Susana e Beatriz atuarem nas séries iniciais do ensino fundamental serviram 32 Esses foram os encontros em que a professora Vânia esteve presencialmente ou com conversas longas por telefone, pois em vários momentos trocava ideias, semanalmente, com a pesquisadora – professora Sandra. 136 para justificar nossas escolhas. Esclarecemos que, em alguns momentos, incluímos dados de todas as professoras, por acreditarmos serem pertinentes. Nessa análise final dos dados, apresentamos alguns resultados da compreensão ocorrida a partir do conhecimento dos dados em diferentes níveis de análise. Fomos desenvolvendo esses níveis de análise, na medida em que foram acontecendo os fluxos contínuos nos encontros e nas observações e participações em aulas de matemática. Destacamos que durante o estudo longitudinal, conversamos por telefone ou trocamos e-mails com a professora Vânia (coorientadora e integrante do grupo) para relatarmos os encontros. Com isso, organizamos os dados coletados e planejamos ações a serem realizadas. Isso contribuiu para entendermos que era preciso refinar as análises em diferentes momentos, foi o que chamamos de „níveis de análise‟. Por isso, acreditamos que, na própria organização dos dados iniciávamos um tipo de análise em nível preliminar. Explicamos a seguir o que consideramos em cada nível e reforçamos a ideia de que eles não foram estáticos ou fechados. Algumas vezes nem percebemos quando passamos de um nível para outro de análise. Denominamos como nível de pré-análise dos dados, os momentos que se referiram às tentativas de relatar, resumidamente, o que foi vivenciado no grupo de estudos ou observado em sala de aula. Líamos, novamente, as anotações, e selecionávamos o que achávamos interessante estar relatando. Acrescentávamos nos cadernos de observação, as novas anotações, dando maior visibilidade para os incidentes críticos ou significativos. Muitas vezes não conseguimos colocar tudo o que observamos no caderno, em momento real em que aconteciam os fatos. Por esse motivo, deixávamos espaços vazios que eram preenchidos em função de um trabalho de busca na memória recente do ocorrido nos encontros e em sala de aula. Após os encontros ou observações ou participações em aula, passávamos para um primeiro nível que denominamos de nível inicial, no qual líamos novamente as anotações, olhando, quando possível, algumas fotos e/ou materiais trabalhados. A digitação total dos materiais obtidos nos encontros e 137 nas aulas se tornou inviável pela quantidade de material que registrávamos a cada semana. Consequentemente, fomos levadas a realizar outro tipo de registro, acrescentando, algumas novas observações e/ou reflexões que recordávamos ou que eram interessantes por instigarem nova análise ou investigação. Também ouvíamos gravações dos encontros para lembrarmos alguns pontos que mereciam ser realçados nos relatos. Esse nível inicial aconteceu, paralelamente, ao processo de coleta de dados. No nível seguinte de análise, necessitávamos de maior sistematização, pois partindo de uma releitura das anotações, fazíamos uma primeira identificação e selecionávamos nossos incidentes críticos ou significativos. Essa fase foi importante, pois nos ajudou a identificar crenças, concepções, atitudes e conhecimentos que foram explicitados pelos professores ou percebidos por nós. Em alguns momentos, tentamos utilizar um referencial de cores para realçar os diferentes conhecimentos dos professores. Porém, essa forma de organizar os dados ficou abrangente e contribuía pouco para olharmos as interconexões existentes nas aprendizagens dos professores. Por tal razão, decidimos fazer anotações mais detalhadas em outro caderno de releitura e análise de dados. Num nível posterior, buscamos correlações entre as discussões no grupo de estudos e as observações ou participações em sala de aula, evidenciando e examinando alguns pontos comuns e alguns conflitantes, caso existissem. Reconhecemos, nesse momento, as ligações entre as metáforas, as narrativas e memórias positivas e negativas, tentando pontuar respostas a algumas das perguntas do projeto. Num nível posterior, relacionamos os entrelaçamentos com as bases teóricas do nosso trabalho. Depois de descrever como identificamos, selecionamos e analisamos os dados, relatamos nossas análises para que o leitor possa vislumbrar este trabalho e os recortes que fizemos. 138 CAPÍTULO V: 5 SEMENTES, FLORES E FRUTOS IDENTIFICADOS E COLHIDOS NA CAMINHADA esse capítulo, registramos nossas análises dos dados coletados e selecionados, conforme já comentamos. A caminhada foi longa, e durante o caminhar fomos, intencionalmente ou não, lançando sementes em aspectos emocionais das professoras nos diferentes solos, algumas delas vimos germinar, outras se perderam. Também nos encantamos e nos surpreendemos com o desabrochar de diferentes flores, que chamaram a atenção de cada uma de nós de uma forma diferente, em relação à aprendizagem em grupo. Observamos alguns frutos relativos aos conceitos matemáticos, alguns em estado inicial, verdes, outros já amadurecendo e sendo colhidos. No decorrer do presente texto, destacamos algumas das sementes, flores e frutos que fizeram parte da história do nosso caminhar em grupo. Selecionamos partes de diálogos que foram transcritos das gravações em áudio de alguns dos nossos encontros ao longo deste estudo. Colocamos alguns grifos, utilizando negrito, chamando atenção para partes das falas que consideramos importantes ou relevantes. Inserimos nossos comentários ao longo das transcrições, sempre que julgamos necessário, para deixar claro nosso destaque nas falas e a importância disso para aprendizagens que ocorreram ou ainda para dar maior significado às nossas escolhas. Esclarecemos que não seguimos uma sequência temporal rígida, porque ao mostrarmos idas e vindas, de alguns assuntos ou os momentos em que discutimos os mesmos no grupo, complementaríamos as análises e daríamos maior sustentabilidade para as afirmações. Tivemos o cuidado de identificar os diálogos com datas e com os nomes das professoras, para que o leitor 139 entendesse o contexto geral do trabalho de maneira ampla. Algumas vezes, voltamos a alguns relatos anteriores pela interação entre os diferentes focos que apresentamos neste capítulo. Dessa forma, pretendemos colocar de maneira evidente e clara algumas análises que ajudaram na construção de argumentos para as conclusões. 5.1 Sementes de aprendizagens em relação aos aspectos afetivos Semelhante à parábola do semeador da Bíblia Sagrada 33 , em muitos momentos dos nossos encontros lançamos sementes. Essas nem sempre caíram em terreno bom e preparado para que a semente desenvolvesse. As sementes lançadas, realmente caíram em diferentes terrenos, beiras de caminhos, terrenos pedregosos, cheios de espinhos e também no terreno bom, pronto para o plantio. Na nossa pesquisa isso também aconteceu, ainda não podemos ter a certeza de que tudo foi apreendido pelas professoras, principalmente em questões referentes aos aspectos afetivos. Mas, trazemos, no presente texto, indícios de resultados das sementes que foram lançadas. Crenças e concepções das professoras em relação à matemática Sabemos que alguns fatores como o que o professor ensina, como ensina, e quais metodologias utiliza estão, intimamente, relacionados com suas crenças e concepções frente à matemática e ao seu ensino, aprendizagem e avaliação. 33 Mt 13, 1 - 23 140 Alguns professores não têm clareza de suas concepções em relação à matemática, outros têm conhecimentos de algumas concepções, mas não conseguem refletir criticamente de modo a entender ou mesmo formar ideia sobre a influência dessas em suas escolhas nas suas práticas pedagógicas. A seguir, percebemos como atividades com uso de metáforas (CHAPMAN, 1997, 2005, 2006) contribuiu para a tomada de consciência de algumas dessas crenças e concepções. Em nossa pesquisa confirmamos o que autores (ERNEST, 1989; GOMEZ-CHACÓN, 2002; SANTOS, 1993ª, 1995, 1997; THOMPSON, 1992) e até mesmo alguns documentos oficiais (PCN´s – BRASIL, 1997) afirmam sobre a necessidade de ter clareza das próprias crenças e concepções para entender as próprias práticas pedagógicas. Observamos, a seguir, como o uso de metáforas nos aproximou do pensamento das professoras sobre a matemática e seu ensino e aprendizagem. Reafirmando que “[...] no contexto de ensino, pensamento metafórico provavelmente está por detrás das histórias que professores contam sobre a sala de aula dele e geram os modos que as situações de sala de aula são formuladas” (CHAPMAN, 1997, p. 209). Indicamos esses indícios ao longo da apresentação. Utilizamos, no nosso segundo encontro de 2006 (18/set/2006), atividades que deixou evidente algumas relações iniciais das professoras Susana, Sandra e Beatriz com a matemática. Baseando-nos em ideias e sugestões de Vânia Santos-Wagner e Olive Chapman34, nós propusemos uma atividade com uso de metáfora para relacionar a matemática com um animal, explicando a justificativa. A questão provocadora para as professoras foi: “Se matemática fosse um bicho seria... porque...” As participantes35 completaram oralmente a pergunta e as respostas estão colocadas no quadro a seguir: 34 Artigos de Olive Chapman (1997; 2005; 2006) e atividades aplicadas pela professora Vânia SantosWagner num grupo de pesquisa, desde 2006, e em aulas de seminários realizados em 2006 e 2007 dos quais participamos. 35 Nesse momento do grupo as participantes eram Susana, Beatriz e Sandra, por esse motivo não temos as respostas das outras professoras. 141 Quadro 12 – Metáfora comparando matemática com um animal para a professora (18/set/06) Profª Para mim, se matemática fosse um bicho 36 seria... porque... (entrevista coletiva ) Susana Barata: porque tenho medo e tem em todos os lugares. Camelo: pela utilidade, é vital na vida no deserto, mas está distante da minha realidade. Bicho de sete cabeças: que dá medo. Beatriz Cavalo: pois preciso dominá-lo, mas quando domino pode ser de grande ajuda. Porém, pode dar coices, mas é bonito. Sandra Pássaro: exemplo águia. Na matemática você tem que tratar e depois tem que empurrar, depois a pessoa tem que aprender sozinha. E depois que a pessoa aprende sozinha, vai enfrentar tempestades, calor, vai voar por lugares bons e ruins, mas vai voar. Comentários adicionais de cada professora (transcrição áudio) “Vou dizer alguma coisa, num é uma coisa que me agrade muito não, chega a dar arrepio”. “Eu tenho medo da matemática, tenho muita dificuldade”. “Eu não sou boa em matemática”. “Eu pego o básico do básico, faço coisas em matemática porque eu preciso no dia a dia, senão não utilizaria”. “Matemática para mim é um desafio, quando eu me proponho a desvendá-lo enquanto não consigo não sossego”. “Para mim é fascinante, por isso é um cavalo”. “De vez em quando ela me dá um coice, mas me fascina”. “Eu adoro jogar buraco, todo final de semana eu jogo. [...] Cada vez eu invento estratégias lógicas, mas também depende da sorte. Mas é fascinante”. “História da águia, me ajuda a entender um pouco da matemática e de sua aprendizagem”. Notamos que a professora Susana comparou a matemática com uma barata, pois estava em todos os lugares e era repugnante, dava „medo‟. Também comparou a um camelo por estar em todos os lugares do deserto e possuir muita importância para a vida das pessoas que moram lá. Mas, está tão distante de sua vida que não consegue ver muita utilidade. Essa visão da professora Susana pode ser comparada ao que Paul Ernest (1989) denomina de visão instrumentista ou utilitarista da matemática, na qual a matemática é um conjunto de regras, esquemas e métodos que nos ajuda com problemas reais. Essa concepção de matemática ficou nítida em sua participação ao longo dos encontros de 2006. Muitas vezes, a professora Susana não compartilhava 36 Indicamos os instrumentos que utilizamos em cada situação apresentada. 142 dos debates de alguns assuntos por não saber como fazer, porque desconhecia o assunto ou por não achar utilidade no que estava sendo discutido com a sua realidade. A professora chegou a afirmar ainda que para ela a matemática era um bicho de sete cabeças, desvelando seu medo e dificuldade em relação à matemática. Podemos concluir desta atividade inicial que a professora Susana começou a participar do grupo com uma crença de que matemática era difícil, porém útil e presente em todos os lugares e que ela somente precisaria usar e ensinar as quatro operações fundamentais (o básico do básico). A professora Beatriz mostra sua fascinação pela matemática mesmo que exige um esforço dela. Comparou a matemática com um cavalo, pois precisa dominálo, mas quando dominava podia ser de grande ajuda, dava coices, mas tinha beleza. Ela disse que gosta de cavalos, assim como de matemática. Ela ainda acrescentou comentando „matemática pra mim é como um desafio, quando eu me proponho a desvendá-lo enquanto não consigo não sossego. É busca de estratégias lógicas‟. Percebemos que esta professora se encanta com a matemática apesar de comentar, em diferentes ocasiões, que não teve a oportunidade de estudá-la em profundidade, devido a sua escolarização. Notamos que sua crença inicial é de que a matemática encanta, mas que há necessidade de saber controlá-la, e ainda, precisamos passar por uma etapa de adaptação ou de entrosamento, com surpresas, agradáveis ou não. Dessa fase inicial, notamos que Beatriz gosta da matemática, acha útil e necessária e, como se sente encantada, deixa-se envolver mesmo com dificuldades. A crença que eu mesma, professora Sandra, coloquei nessa fase inicial foi que a matemática está, intimamente, relacionada ao seu ensino. Está diretamente ligada com o sujeito, é o sujeito que vê a matemática, que lhe dá significado. Penso que, nesse momento, eu não soube diferenciar a matemática do seu ensino, pois a minha resposta parece mais com as características do ensino de matemática e não com a matemática somente. Mas, matemática é algo que é aprendido e o sujeito pode ir além, alcançar vôos, como pontuei. Passa por etapas e necessita da interação com o outro, o papel do mediador 143 (VYGOTSKY, 1988/1934; 1991), para que possa lhe dar suporte no início do caminhar em matemática. No mesmo encontro (18/set/2006), as professoras responderam essa mesma provocação, pensando no que seus alunos responderiam se fossem comparar matemática com um animal. As respostas dadas ajudaram-nos a entender um pouco mais sobre suas crenças e concepções frente à matemática. O quadro 14 apresenta as respostas das professoras: Quadro 13 - Metáfora comparando matemática com um animal para os alunos (18/set/06) Professora Susana Beatriz Sandra Para meus alunos, se matemática fosse um bicho seria... porque... (entrevista coletiva) Meninos: Cachorrinho – pois eles se divertem. Meninas: Bicho de sete cabeças – pois elas têm muitas dificuldades e não gostam. Cavalo: pois precisam dominá-lo, de vez em quando levam coices, mas acham bonito. Pássaro mais simples: querem ser tratados, às vezes estão afobados, mas depois devagar você deve mostrar que ele deve passar pelas etapas, para aprender a voar. Comentários adicionais de cada professora (anotações caderno bordo) Meninos têm mais facilidades com matemática do que meninas. Eu acho que isso é relativo, tem uma menina que acha que não sabe matemática, mas nem é tanto assim. Os alunos normalmente são afobados, querem ir além, porém com uma ânsia muito grande. Chegamos às conclusões de que as professoras Beatriz e Sandra permaneceram com os mesmos bichos, quando relacionam matemática para seus alunos. Já a professora Susana fez uma diferenciação entre meninas e meninos com a matemática. Ela acredita que os meninos possuem maior facilidade com a matemática do que as meninas. Num outro momento do grupo levamos um artigo que comentava exatamente sobre essa diferenciação de gênero, notamos como isso representa um discurso tradicional, que ainda não foi superado. As respostas reforçam nossas colocações anteriores. Algumas crenças e concepções das professoras foram se modificando ao longo dos encontros, e já tínhamos percebido isso em dezembro de 2006. Por exemplo, na última reunião do ano de 2006 (18/dez/06), fizemos uma avaliação 144 sobre a apreciação do grupo como um todo, em relação aos nossos encontros de 2006 e o que desenvolvemos. Nesse dia, reconhecemos que algumas informações e situações que tinham sido trabalhadas não estavam claras nas memórias das professoras, por isso resolvemos realizar novamente a metáfora da matemática com o animal para verificar possíveis mudanças. Provocamos a nova atividade na qual pretendíamos buscar outras informações sobre as crenças e concepções das professoras, em relação à matemática. A seguir, apresentamos um quadro com as respostas das professoras Susana e Beatriz, ao relacionarem matemática com um bicho e também com uma contradição: para mim... matemática nunca seria como... Quadro 14 – Metáforas comparando matemática com um animal e com o que nunca seria. (18/dez/06) Professora Susana Beatriz Para mim, se matemática fosse um bicho seria... porque... (entrevista coletiva) Elefante: é muito pesado. Tigre ou leão: porque tem predador e presa. Cavalo: pode dar coices, mas é bonito, encanta. Comentários adicionais de cada professora (entrevista coletiva) “A matemática já não me assusta tanto. Não sinto medo mais”. “Ele está mais dócil, mas ainda dá uns coices”. Para mim... matemática nunca seria como... (entrevista coletiva) Borboleta: pois não é gracioso, bonito e leve. Rato: porque é repugnante, e tem pavor. Barata: que tem nojo, pavor. Barata: porque gosta de matemática e não de barata. A professora Susana não conseguia lembrar com qual bicho tinha comparado a matemática e ficou bastante tempo pensando, mas sem conseguir lembrar. A professora Vânia fez, então, uma pergunta oposta a aquela que tinha sido feita Nunca podemos comparar a matemática com o quê? Por quê?” Nesse momento tivemos uma surpresa, Susana fez a mesma comparação, com a barata, mas agora num sentido contrário. Ela disse que a matemática nunca seria como um rato ou uma barata, pois eram repugnantes e davam pavor. Foi interessante verificar um início de modificação de sua concepção em relação à matemática. Considerava, após quatro meses de trabalho com o grupo, mesmo com algumas dificuldades e alguns “medos”, que matemática era mais útil e que não deveria ficar longe dela. Susana afirmou, que a mudança na sua 145 resposta à metáfora era devido a sua participação no grupo, pois já se sentia mais segura em relação a alguns conteúdos que estavam obscuros anteriormente. No encontro de dezembro de 2006, a professora Susana afirmou que pretendia continuar no grupo, pois percebia que estava crescendo. No primeiro encontro de 2007 (05/fev/07), pedi para que pensassem em casa e respondessem à seguinte pergunta: “O que é matemática para você”? A resposta deveria ser levada no encontro da semana seguinte, a fim de conversarmos. Porém, somente eu (Sandra) e a professora Beatriz realizamos tal proposta. Susana não elaborou sua resposta nos encontros que seguiram. Apenas no 6º encontro (19/mar/07), conversamos sobre a pergunta inicial. A professora Susana ainda não tinha respondido e no momento decidi provocar, atuando como mediadora, para que discutíssemos sobre nossas ideias em relação à matemática. Partimos para um diálogo que mostra o que as professoras Susana, Beatriz e Sandra debateram sobre a visão de matemática para cada uma. A descrição do diálogo (transcrição do áudio da reunião de 19/03/07) foi interrompida por alguns de meus comentários sempre que senti necessidade de explicação ou detalhamento. Susana: [...] Logo no início eu coloquei isso. Matemática não era algo complicado para mim não. Eu me lembro dessas coisas da minha infância,... Antes de eu entrar na primeira série eu tive umas aulas particulares lá em casa, a C. e a S. que moraram lá em casa, me ensinaram. Quando eu fui para a escola eu já estava préalfabetizada e sabia um pouco de soma. A subtração já era um pouco mais difícil para mim, mas também não era muita novidade. O problema começou quando 37 eu não aprendi divisão na escola, com aquele método tradicional, mesmo. Aí eu carreguei essa dificuldade para o resto da minha vida. Quando eu cheguei à faculdade, advinha qual a matéria que eu achei mais difícil... Claro, tinha que ser a estatística, quase que eu fiquei reprovada nesta disciplina, mesmo usando a calculadora. Pra você ter uma ideia de como formou um bloqueio muito grande... Agora eu coloquei assim, pra mim como professora, o melhor que eu puder,... Os métodos que eu puder usar para minimizar ao máximo as dificuldades desses meninos [alunos], eu vou trabalhar. E também explorar o máximo deles com estes desafios, estas ideias pra quando ele chegar lá na frente olhar a matemática... Porque a gente está acostumada a dar só conta de armar e efetuar e dar uns problemas para resolver, num é Beatriz. E quando ele chegar lá, olha um x lá e num faz ideia do que é aquilo, num sabe o que é uma 37 Como já foi comentado no início do capítulo destacarei nas falas que considero importante ou que nos ajudam a compreender algumas colocações das professoras, utilizando negrito. Em seguida, colocamos nossa interpretação do que destacamos. 146 coluna, num sabe área, num sabe nada. A gente tem que se desdobrar para ensinar. O desafio agora é aproveitar melhor o tempo e ver o que mais a gente consegue dar. Por que esses meninos num sabem nada de geometria? Ah, porque dificilmente a gente num consegue trabalhar geometria. (transcrição do áudio de 19/03/07) Inferimos que a professora Susana expõe momentos de sua infância relatando um pouco sobre um dos motivos de seus „medos‟ frente à matemática. As afirmações e informações da professora nos ajudaram a compreender certas atitudes dela em sala de aula e nos encontros. A partir do que destacamos no diálogo transcrito acima, compreendemos que Susana coloca como primeiro problema a sua aprendizagem de divisão pelo método tradicional. Essa dificuldade seguiu por toda sua vida. Ela deu um exemplo da aula de estatística, na faculdade, como uma das consequências do bloqueio que se formou. Notamos que a professora, estava querendo minimizar esse bloqueio, pois sabia que precisava superá-lo para trabalhar, de maneira coerente, com seus alunos. Destacou ainda, que estava acostumada a trabalhar apenas as quatro operações e alguns problemas. Realidade de muitos professores das séries iniciais. Cremos que a professora Susana estava disposta a modificar algumas de suas atitudes em sala de aula e propôs se colocar em desafio: aproveitando melhor o tempo para trabalhar outros conteúdos em matemática com as crianças. Ela apontou para uma realidade: que a geometria estava ausente das aulas dos alunos das séries iniciais do ensino fundamental. Notamos, portanto, pela própria fala da professora, alguns indícios de sua relação com a matemática, seu ensino, aprendizagem e avaliação. Fala que passou despercebida no momento do encontro, foi quando comentou sobre geometria. Ela afirmou que não conseguia trabalhar a geometria. Posteriormente, propomos uma discussão sobre o ensino de geometria e ela se lembrou da fala que eu não tinha observado. Achamos que ela comentara sobre alguns tópicos de sua vida, seus medos, mas não respondera à pergunta inicial sobre o que era matemática para ela, por isso, continuamos com alguns questionamentos. 147 Eu: Ah, mas você não respondeu o que é matemática. Se você tivesse que explicar para uma criança o que é matemática, como você faria? Qual resposta você daria a ela? Você contou um pouco da sua biografia... Susana: Matemática para mim... Aos poucos... Eu lembro direitinho daquele monstrinho que aquele menino desenhou [aluno] da Beatriz. Ai de repente você vai pensando, ou se você faz uma comparação melhor, como se fosse um quebra-cabeça, entendeu?... Que já vai encaixando as peças. A matemática para mim, ainda... Ainda é um desafio muito grande. Agora é que estou colocando a matemática como um desafio, porque eu estou tendo estes encontros aqui, a gente está desvendando. Porque antes era um horror, tá. O quadro que eu pintaria para a matemática era muito pior do que agora. Com certeza. (transcrição do áudio de 19/03/07) A professora Susana ainda mostra que a matemática é um monstro para ela, lembrando inclusive de um desenho feito por um aluno de Beatriz sobre o monstro da matemática, que está a seguir. Mas, o aluno “E” desenhou o monstro como um „sabe tudo‟ de matemática e que resolvia todos os problemas. Já, a professora Susana, usou a mesma imagem para representar uma coisa não bonita, mas seu medo em relação à matemática. Figura 7 – Monstro da matemática desenhado por aluno de Beatriz em 2007 A sua concepção da matemática começou, depois de, aproximadamente, seis meses de encontros, a modificar, ou pelo menos, se abrir a mudanças. Já pontuava que matemática poderia ser um quebra-cabeça, e que já estava encaixando as peças. Ela indicava em sua fala que sua visão de matemática era pior e que foi se alterando com a participação no grupo. A seguir, na continuidade do diálogo, compreendemos que, realmente, a matemática 148 necessária para ela era somente a que se referia ao básico. Voltamos a pontuar a matemática instrumentalista destacada por Paul Ernest (1989). Como Susana acreditava que, no seu dia a dia, somente precisa da matemática básica, afirmou que somente o básico era importante. Continuamos os questionamentos sobre a relação dela com a matemática, conforme podemos ver a seguir. Eu: Então antes você falaria que matemática era o quê? Susana: Um bicho de sete-cabeças... Um bicho de sete-cabeças, um monstro, assustador... Eu me contentaria só com o básico, mesmo, sabe? Por exemplo: Um carro de quatro rodas e acabou, só para poder andar. O resto era inatingível, entendeu? (transcrição do áudio de 19/03/07) Ficou claro que a professora Susana continuava utilizando metáforas para relacionar à matemática. Além disso, vimos também a questão que ela insistia sempre, que ela precisava apenas do básico para utilizar a matemática no seu dia a dia. Ela pensava que o além do básico era inatingível para ela. Eu: Para você? Susana: É, em algumas situações sim... Agora vai ter concurso para a prefeitura, num vai? Para auditor, R$ 10.000,00 o salário, vai ver a matemática, aplicada, né? Matemática Financeira... Eu: Então de certa forma isso aqui está mudando sua visão de matemática. Susana: Tá. Eu: Se você parasse para olhar, o que você diria que já está mudando? Susana: (pensando) Você faz uma pergunta que agora eu não tenho resposta não. (transcrição do áudio de 19/03/07) Tentamos estimular uma reflexão crítica dessa professora sobre o que, em suas práticas, estava sendo modificado, mas ela ainda não conseguia perceber. Em um encontro em 2008, reparamos que ela conseguia refletir melhor, colocamos seus comentários sobre essas mudanças, a partir da sua participação no grupo 38 . Continuamos a questioná-la sobre o que havia mudado, conforme pode ser visto na continuidade do diálogo. 38 Essa reflexão está apresentada no presente texto na seção 5.3 149 Eu: Por exemplo, o que você não fazia que você faz? Ou o que você fazia que agora não faz mais?... Susana: É o que eu estou falando. Por exemplo, encarar estas questões de colunas, estatística, saber analisar isso aqui [...] Entendeu? Mas agora eu estou mais perto de chegar ao ponto de construir o gráfico sem ter tanto medo. Mas sozinha ainda não, sozinha eu não faço. Algumas coisas que eu não fazia e que agora eu faço. Eu: Essa história do gráfico te marcou profundamente. (transcrição do áudio de 19/03/07) Essa questão do gráfico ocorreu quando a professora Susana cursava o ensino médio e desenhou um gráfico errado, achando que estava correto, e seu professor sabia que estava errado e procurou apenas o erro para mostrar que ele, professor, estava certo. Com essa atitude, o professor não a ajudou a construir o gráfico corretamente. Como isso não foi trabalhado com ela, o erro tomou uma proporção maior, pois ela se sentia incapaz de interpretar gráficos e desenhá-los. Tal ponto não foi trabalhado, profundamente, nos encontros do grupo, mas constatamos que a professora buscou algumas atividades que envolviam gráficos para trabalhar com seus alunos. Ela precisava de ajuda para superar certos obstáculos que a atrapalhavam na matemática, ou de encorajamento para que pudesse superar os medos e traumas. Pontuamos algumas das situações no decorrer da apresentação desta pesquisa. Susana: Ah, mas tem outros casos também, você quer ver também... Problemas aí oh, de porcentagem, números decimais, aquelas contas difíceis, bem mais complicadas, num é cálculo simples, entendeu? De você somar o preço dos produtos que está lá [...] que tem decimal, mas coisas que exigissem de mim um raciocínio mais apurado eu já, já caia. A questão da matemática necessária à vida, para ela se restringia às quatro operações, o que sempre esteve presente nas afirmações da professora Susana. Ela não percebia que, por vezes, realizava alguns cálculos que não envolviam apenas as quatro operações, mas sim outros conceitos matemáticos, como é o caso de raciocínio proporcional para resolver porcentagens. Relatamos, na próxima seção, alguns episódios que mostraram, a professora Susana, a utilização além das quatro operações. Verificamos que alguns conteúdos identificados com dificuldades pela professora Susana estavam, indiretamente ou diretamente, relacionados com a divisão. 150 Conferimos isso com a porcentagem e os números decimais que possuem essa ligação. A análise desse diálogo contribuiu para triangular e confirmar as evidências obtidas por meio dos dados com as metáforas usando animais, pois sabemos que algumas de nossas considerações estão de acordo com outras falas de Susana. Verificamos, na prática, que o professor pode se reconhecer enquanto aprendiz e educador de matemática. A reflexão e autoconhecimento são viáveis, basta ter tempo e saber como trabalhar junto com o professor. Susana se sentia confortável para expressar o que pensava em forma de metáforas confirmando o que Chapman (2005, 2006) afirmou sobre a possibilidade de nos aproximamos do pensamento da professora a partir da utilização de metáforas. Em relação à pergunta inicial, Susana não conseguiu uma resposta fechada. Ela discursou sobre a matemática na vida dela e sobre sua aprendizagem de matemática, o que nos ajudou a entender algumas de suas atitudes. O diálogo, a seguir, é uma continuidade da discussão sobre o que é matemática para cada professora. Neste momento, voltamos o olhar para a professora Beatriz. Percebemos que ela foi mais sucinta ao responder o que é matemática para ela. Essa professora já tinha nos entregado sua resposta por escrito em alguns encontros anteriores à discussão. Por esse motivo, sua resposta estava mais direta. Chegamos a essa diferença ao relatamos as respostas de Beatriz e Sandra. Mas, mesmo assim, constatamos algumas das concepções sobre matemática, presentes nas falas das professoras. Eu: Beatriz, o que é matemática para você? O que você colocou aí? Beatriz: Para mim é uma ciência que tem por base os cálculos, ensina calcular, ensina pensar, quantias, quantidades,... Eu: E como você explicaria isso para uma criança? Beatriz: Para uma criança? ... Eu falaria para ele que a matemática é a ciência que ensina a contar e registrar os cálculos. Que trabalha com quantidades, quantias e fazer os cálculos. Analisando a resposta de Beatriz, notamos que ela afirmou ser a matemática uma ciência relacionada com cálculos, quantias e quantidades. Em diferentes momentos, Beatriz reforçou essa definição de matemática. Quando ela 151 comentou que a matemática é uma ciência que ensina a pensar ela estava, em nossas análises, colocando uma característica da matemática que está ligada ao que Ernest (1989) denominou visão de matemática como resolução de problemas. Com base em suas diferentes respostas aos questionamentos que a fizemos percebemos que ela considerava a matemática como uma estrutura organizada, dinamicamente, e que nos ajuda a calcular e registrar cálculos. A seguir, eu (professora Sandra) expus sobre o que era matemática para mim nesse mesmo encontro (19/mar/07). Acredito que tentei colocar uma definição mais ampla da matemática. Eu (Sandra): Deixa-me falar sobre o que eu escrevi, deixa-me ler, porque senão eu vou inventar outra resposta. Matemática é uma forma ampla que os homens inventaram e foram aos poucos aperfeiçoando, e ainda estão, para organizar, entender, definir e estudar o mundo em suas diferentes dimensões, dimensões pessoais, de relacionamento, comércio, de produção, de beleza e estratégias. Ela surgiu e surge ao longo do tempo, a princípio pela necessidade dos homens e posteriormente pelo aperfeiçoamento desta ciência que serve de base ou instrumento de tantas outras. É algo que nos cerca e nem sempre nos damos conta disso, muitas vezes por não conhecêla bem, ou por não pensarmos que quase tudo que nos envolve de uma forma ou outra a utilizou ou utiliza em uma de suas grandes e diferentes áreas, que não são isoladas, mas que podem se entrelaçar e ajudar umas as outras. A minha resposta passa pela construção da natureza histórica da matemática, da necessidade de construir novos conceitos matemáticos. Acredito que isso se deve à influência do meu aprendizado e da minha formação. Pontuei também que a matemática está relacionada com o mundo de uma forma geral e que está presente em quase tudo, mas as pessoas nem sempre alcançam. Esse tipo de resposta também estava de acordo com o que Ernest (1989) denominou de visão de resolução de problemas para a matemática, construída num contexto social e cultural. 152 Crenças e concepções das professoras sobre o ensino, aprendizagem e avaliação de matemática Colocamos, a seguir, alguns momentos dos encontros do grupo de estudos que estão relacionados com os processos que envolvem o ensino, a aprendizagem e a avaliação em matemática. A avaliação foi um tema que surgiu desde o primeiro encontro, por isso, iniciamos uma relação dialógica sobre avaliação. Com os demais encontros percebemos as relações dessas professoras com o ensino e aprendizagem de matemática. Pontuamos uma atividade que desenvolvemos sobre ensino de matemática, utilizando metáforas para comparar o ensino de matemática com uma profissão. No 6º encontro de 2006 (16/out/06), pedimos para que as professoras respondessem a seguinte metáfora: “Se fosse comparar o ensino da matemática com uma profissão, qual seria? Por quê?” Quadro 15 – Respostas da metáfora entre ensino de matemática e outras profissões Professora Susana Beatriz “Se fosse comparar o ensino da matemática com uma profissão, qual seria? Por quê?” Normalmente o professor de 1ª a 4ª série tem a preocupação maior de ensinar as quatro operações, envolvendo interpretação de problemas. Se fosse comparar com uma profissão, uma delas seria a do confeiteiro ou do padeiro, que adiciona ingredientes, subtrai do total do conteúdo da embalagem do produto, multiplica os produtos e divide a massa em partes iguais no caso da fabricação dos pães. Ao final, é feito o cálculo do preço a ser cobrado tendo em vista a planilha de custos para a fabricação do(s) produto(s). Envolve operações simples, problemas, expressões numéricas, frações, regras diversas, etc. Se incluirmos aí outros fatores como tempo de preparo, entrega, e tudo o mais, você trabalha praticamente tudo em matemática. Lembrou também do boiadeiro, pois tem que percorrer distâncias, contar a boiada, perceber se algum animal morre... O ensino da matemática pode ser comparado com o trabalho do feirante que está, permanentemente, calculando quantias, quantidades, explicando para os seus fregueses o porquê de determinada quantia e pedindo a eles para conferirem. O ensino da matemática pode ser comparado com o trabalho do engenheiro civil que calcula as áreas, faz orçamentos, dá instruções ao mestre de obras, que, por sua vez, as transmite ao pedreiro. Tudo precisa ser milimetricamente calculado para que as peças se ajustem, para que não haja desperdício. 153 Sandra O ensino da matemática pode ser comparado ao da dona de casa que faz compras, pesquisa preços, compara, faz seu orçamento doméstico... Calcula as refeições, dobra receitas e ela as transmite às filhas, à empregada... Ao do agricultor que calcula o espaçamento das covas para o plantio, a quantidade de insumos... Explica ao filho ou ao empregado como proceder... O ensino de matemática está presente em todas?... O ensino de matemática é como o trabalho de um jardineiro, cada aluno é um tipo de planta e devemos saber como „cuidar‟ delas, o ensino precisa utilizar diferentes metodologias. Porque tem que preparar a terra, têm que conhecer as mudinhas, umas gostam mais de sol, outras de sombra. Tem que conhecer cada uma delas, tem que saber quando afofar a terra, quando podar. Tem umas que são venenosas, já outras têm espinhos,... As respostas das professoras confirmam nossas afirmações anteriores sobre crenças e concepções em relação à matemática. A professora Susana relacionou a uma profissão que, em suas ações, desenvolvia fundamentalmente as quatro operações. Ela começou fazendo a afirmação: “Normalmente o professor de 1ª a 4ª série tem a preocupação maior de ensinar as quatro operações, envolvendo interpretação de problemas” (Susana, 16/out/06). A professora fez esse tipo de comentário diversas vezes, o que nos leva a afirmar que isso era muito forte para ela. A resposta de Beatriz abordou várias profissões e suas ações lembravam algo relacionado com matemática. Com sua resposta, entendemos um pouco mais sua preocupação com o aluno. Em sua fala, ela pontuou que alguém deve transmitir ou repassar algo para outro e, por isso, deve ter cuidado. A preocupação com a forma de transmissão da matemática para os alunos foi uma preocupação real desta professora. Ela de certa forma colocou a exatidão da matemática em uma de suas comparações. E terminou com a sensação de que poderia continuar a comparar ou relacionar a matemática com qualquer profissão. Em minha resposta fui um pouco filosófica, coloquei a questão das diferentes abordagens para atingir as individualidades de cada aluno. A importância de conhecer o quê e como se ensina e a quem se ensina, relacionei o ensino de matemática com a jardinagem. É interessante destacar que minha resposta foi parecida com o exemplo dado por Chapman (2006) ao apresentar um exemplo de comparação realizada por um professor em suas pesquisas. Chamamos a atenção para o fato de que a utilização de diferentes estratégias contribuiu para a tomada de consciência por parte das professoras de suas próprias crenças. 154 No encontro de 26/mai/08, pedimos que cada professora participante escrevesse sobre o que acreditava ser um bom professor e descobrimos indícios de crenças e concepções das professoras sobre ensino de matemática (GOMEZ-CHACÓN, 2002). Com base nas respostas transcrevemos nossas conclusões sobre como cada uma concebeu o ensino da matemática. Analisando a resposta dada pela professora Susana verificamos que ela tinha uma preocupação forte com a questão social, pelo que conhecemos da professora deduzimos como isso fica explícito em suas respostas. Um bom professor preocupa-se em estar sempre preparado para avançar o aluno, interessando em tudo que possa ajudar ou atrapalhar nesse processo. Envolve-se, mas sem se comprometer, em questões às vezes muito pessoais, procurando aconselhá-lo em suas decisões e orientando no seu dia-a-dia. Empurra para frente quando vislumbra maiores chances e estende a mão para aqueles que vão ficando para trás... É um mestre em todos os sentidos e está sempre buscando os melhores meios para alcançar seus objetivos. (Susana, 26/mai/08) A resposta dada pela professora Beatriz e se aproxima muito de argumentos colocados por Freire (1996) em Pedagogia da Autonomia: Um bom professor é aquele que consegue motivar o aluno que não é considerado “bom aluno”. Conseguir ótimos resultados com alunos como aluno E, aluno A, aluna C,...[bons alunos] É muito fácil, basta oferece oportunidades para que pensem, propor desafios, instigar o raciocínio de várias maneiras... Os resultados virão, com certeza! O grande desafio é fazer com que alunos como aluna J, aluna P ou aluno G [alunos com dificuldades] comecem a descobrir coisas novas e se encantar com elas. O bom professor, então, é aquele que consegue bons resultados com todos, é o criativo, o que tem percepção rápida, é o paciente... Dedicação às vezes não basta. (Beatriz, 26/mai/08) Defendemos ser preciso refletir sobre nossa abordagem em sala de aula e analisarmos como estamos tratando o conhecimento, qual nossa visão do que seja aprender, ensinar e avaliar. Muitas vezes, sabemos o que queremos dos alunos: que sejam capazes de resolver problemas, conforme os que apresentamos, mas somente a partir da reflexão na e sobre a prática (SCHÖN, 2000/1998) podemos analisar em quais situações contribuímos para que os alunos pensem e raciocinem sobre determinado problema. 155 Eu, professora Sandra, respondi a esse questionamento com a seguinte frase, um bom professor É aquele que consegue junto com seus alunos caminhar, aprender, ensinar, provocar os alunos para pensarem juntos, mediar às discussões, aquele que consegue relacionar falas, atos, acontecimentos com sua matéria e vice-versa quando possível. É aquele que vai além, está aberto a novas questões e novos desafios, que não tem medo de errar, que se preocupa com cada aluno e com a classe. Que está aberto a discussões e quer sempre aprender mais sobre si mesmo, sobre seus alunos no processo de ensino e aprendizagem por meio da reflexão crítica (Sandra, 26/mai/08). Para mim, a educação não estava centrada no professor, somos mediadores, colaboradores, contribuímos para que o aluno aprenda, não fazemos para ele. Apenas organizamos e planejamos atividades, de forma a propiciar momentos em que o aluno possa construir seus conhecimentos matemáticos. Novamente, está de acordo com o que Ernest (1989) coloca sobre professora com visão de resolução de problemas de matemática. Para ele, o professor é um facilitador, que trabalha com seus alunos na forma de construção dos conhecimentos. No encontro de 23/abr/07, pedi para que as professoras redigissem sobre seus primeiros anos de docência. Queríamos provocar reflexões nas professoras e acreditamos também que esta é uma forma de nos conhecermos mais enquanto professoras. A seguir, encontram-se as respostas das professoras Sandra, Susana e Beatriz, com alguns comentários. Sandra: Iniciei dando aulas quando ainda estava na faculdade, cursando o 2º período. Não tinha experiência de sala de aula, de planejamento. Não tinha feito magistério e sentia falta de um aprofundamento didático. Seguia minha intuição, trabalhava numa escola do estado, “Belmiro Teixeira Pimenta” com turmas de 7ª e 8ª séries. Peguei o livro didático que a escola utilizava e comecei a segui-lo. Quando não gostava de como o conteúdo estava exposto ou não gostava das atividades pegava outros livros didáticos e tentava adaptar do meu jeito. Tive muita sorte, pois meu coordenador e minha diretora eram ótimos e me ajudaram bastante. Não me lembro de pedagogas, acho que a escola não tinha. Lembro que a outra professora que trabalhava com 5ª e 6ª séries sempre me perguntava algumas coisas e tirava dúvidas, pois só tinha complementação pedagógica e magistério. Eu gostava, pois me fazia parar para pensar em algumas coisas. Fazia o que achava que daria certo, nem sempre deu, errei muito, mas cresci muito com este primeiro ano de atuação. Tinha vinte anos e gostava de conversar com os alunos e às vezes era confundida com eles. (23/04/07) 156 Uma realidade dos cursos de formação de professores é que os alunos começam a trabalhar antes mesmo de estudarem matérias didáticas e de fazerem estágios. Os professores iniciantes fazem muitas coisas por intuição e quando trabalham num ambiente que contribui para seu crescimento, podem crescer e amadurecer com a experiência inicial. Susana: Não consigo me lembrar de muita coisa. Como professora tinha sempre em mente de que pelo menos pensar no que trabalhar, era necessário para eu dar aulas. Já recorri a cadernos de outros, mas os meus eram sempre garantidos. Procurava sempre que possível, garantir material adequado, mas nem sempre tinha conhecimento necessário para explorar todos eles. Hoje estou bem mais amadurecida e mais experiente na busca de novas opções, principalmente vindas de relatos de outros colegas. Procuro agora é com o pouco tempo que temos para dar conta de tanto conhecimento/informação que temos que dar. (23/04/07) A professora Susana mostrou algumas de suas características em sala de aula, ela precisava ter em mente o que ia trabalhar. Era bem organizada com relação aos seus cadernos de planejamento e anotações. Ela apontou para um problema que atinge alguns professores, eles possuem acesso a diferentes materiais didáticos, mas nem sempre possuem conhecimento para explorá-los. Susana fez uma auto-reflexão e afirmou estava mais amadurecida, pois conseguia escolher melhor entre as opções que possuía para trabalhar com seus alunos. Ela apontou o que havia de positivo em relação às trocas de experiências entre pares. Ouvir relatos de outros professores pode contribuir para um professor se tornar mais experiente e amadurecido. A mediação entre os profissionais contribui para a construção dos significados dos diferentes conhecimentos (Vygotsky, 1988). Beatriz: Antigamente eu passava mais tempo planejando atividades, organizava melhor o meu “plano de aula”, o que era realmente executado na sala de aula. Em compensação fiz muitos “planos de curso” para serem entregues ao pedagogo, que, com certeza nunca foram retirados da gaveta. Tenho uma lembrança muito positiva de uma pedagoga que era o terror da escola, nunca me pedia nada escrito, mas me chamava semanalmente para conversar e me fazia refletir sobre os objetivos de cada atividade que eu propunha aos alunos, analisava junto comigo os resultados e me dizia com frases abertas quando não concordava com algumas atitudes. Era exigente, mas dava todo o suporte que precisava para executar meu trabalho. Aprendi com ela que o aluno está sempre em primeiro lugar. Ela fazia-nos pensar: “será que fizemos tudo o que estava ao nosso alcance? Haveria outra forma? Temos consciência 157 profissional?”, mas por outro lado também sabia dizer: “Também somos limitados...” (23/04/07) Analisando o relato da professora Beatriz, observamos que ela refletiu sobre seu planejamento. Quando estava iniciando o seu trabalho ela „gastava‟ mais tempo planejando. Isso é comum nos professores iniciantes. Ela apontou para um dado que aconteceu em algumas de nossas escolas, os professores fazem planos de curso que ficam apenas nas gavetas. É interessante perceber como uma pedagoga influenciou essa professora de maneira positiva. Ela já contava com a relação dialógica entre pares. O interessante foi notar o trabalho conjunto, a inquirição como ferramenta para incentivo à reflexão crítica da prática. Estamos tratando de aprendizagens de professoras, por isso, investigamos o que elas disseram sobre avaliação. No encontro de 10/set/07, pedimos para que as professoras respondessem ao seguinte questionamento: “Aprender matemática é como... porque...” (CHAPMAN, 1997; 2005; 2006). O quadro 17 apresenta as respostas que as professoras escreveram nesse encontro e, na sequência, colocamos nossos comentários. Quadro 16 – Respostas das professoras sobre a questão: Aprender matemática é como... porque... Professora Susana Beatriz Aprender matemática é como... porque... (relatos escritos) Aprender matemática que ensino para as séries primárias é fácil, mas já nas séries finais e do ensino médio é complicado. Dominar o conteúdo das séries iniciais faz parte do nosso dia a dia, mas ao sinal dos primeiros desafios que envolvem cálculos diversos, descobrir valores, percorrer várias etapas já não domino. Posso comparar então que neste momento aprender matemática é como um filme bem simples de entender que depois vira uma série em que o anterior é necessário para entender o que vem depois. Ou então a um filhote de animal selvagem que quando pequenino todos querem adotá-lo, mas depois ninguém consegue chegar perto. ... É como assistir a um bom filme de enredo complicado. No começo parece difícil de entender, mas não dá para parar; quando se começa a entender, não se tem mais vontade de parar... A cada cena que desenrola esperam-se as consequencias que trará, que implicações terá no decorrer da trama. E quando acaba, fica um gostinho de “quero mais”... Por exemplo, “E o vento levou”, “Doutor Givago”, “Pássaros Feridos”, “Os canhões de Navarone”,... Hoje, minha atenção está sempre voltada para as questões matemáticas. 158 Professora Sandra Aprender matemática é como... porque... (relatos escritos) É como uma criança pequena crescendo. Crescer, porque a princípio você não entende muito bem o que faz, muitas vezes você repete o que os outros fazem, depois aquilo começa a fazer sentido e você quer saber mais, alguns são mais curiosos e buscam mais experiências, outros mais quietos, mas também tem situações novas, desafiadoras, e quando consegue superar limites pode ir além e ficar muito feliz. É aprender a entender os símbolos e usar quando for necessário. Iniciando com a professora Susana, observamos que ela mais uma vez nos mostrou seu vínculo com a matemática. Ao afirmar que aprender matemática nas séries iniciais é fácil, mas em outros níveis é difícil, continuou nos mostrando a sua relação com a matemática, que considera básica. Quando comentou sobre aprendizagem, remeteu-se à própria aprendizagem de matemática. Somente depois de se colocar, enquanto aprendiz de matemática, que teve alguns problemas com a matemática das séries finais do ensino fundamental e do ensino médio, é que fez a comparação proposta pela questão. Susana comparou a matemática a um filme seriado, no qual para entender a sequência é necessário saber o episódio anterior. Podemos associar isso à matemática, ela considerou que somente aprende nessa sequência, onde os conteúdos estão encadeados como elos, no entanto, existe a necessidade de passar por todos eles, seguindo alguns pré-requisitos. Mais uma vez, identificamos com Ernest (1989) ao denominar como visão da matemática utilitarista, na qual a matemática básica é a necessária para o dia a dia. A outra comparação também reforçou a sua relação com a matemática, que, quando „básica‟, todos querem e dominam, mas ao „crescerem‟, os conteúdos passam a ser estudados nas séries finais do ensino fundamental e no ensino médio. Nem colocamos a matemática de nível superior, que, para ela, seria um conteúdo muito além do que considera fácil. A professora Beatriz começou, fazendo, também, sua comparação que também foi com um filme. O interessante foi observar que a justificativa vai em direção oposta à da professora Susana. Ela comparou com um filme que, a princípio, parece difícil de entender, mas que, após se „encantar‟, ficar envolvido com sua história torna-se difícil deixar de querer ver o final. Também demonstrou seu encantamento com a matemática, apesar de ter, certo receio a 159 princípio que foi superado e transformado em algo positivo e motivador para continuar aprendendo. Ela colocou, inclusive, exemplos de filmes antigos dos quais gostou. Terminou sua resposta, comentando que sua atenção, quando a questão foi apresentada, estava voltada para a matemática. A minha resposta (professora Sandra) possuía interseções com as respostas das duas professoras. Afirmo que aprender matemática é como uma criança crescendo. De certa forma estava relacionada com o filhote da professora Susana, mas com uma justificativa oposta. Seria como se envolver após conhecer, assim como na justificativa da resposta da professora Beatriz. Apareceu, também, a questão da curiosidade, da diferença entre os aprendizes, da superação de alguns limites e da satisfação após vencer essa etapa. Considero que, baseada na minha formação em matemática, apontei sobre a linguagem própria da matemática, a partir dos seus símbolos e da necessidade de saber utilizá-los quando preciso. A questão da avaliação esteve presente em muitas das nossas discussões. Porém, sentimos a necessidade em aprofundar o debate e preparamos, para o terceiro encontro de 2007 (26/fev/07), alguns questionamentos sobre o que era avaliar. Colocamos a seguir parte do diálogo realizado, nesse encontro, sobre avaliação. Eu (Sandra): Eu quero que vocês pensem agora rapidinho o que é avaliação para vocês? O que é avaliação de uma maneira geral. [...] Susana: O que é avaliação para mim?... Olha, eu vou dizer uma coisa, alguns vão dizer que eu sou boba. Mas hoje, na minha plena maturidade como professora que estou vivendo hoje, graças a Deus,... Eu vejo que avaliação é para mim, ela é um retorno tanto do meu trabalho quanto do retorno que os meus alunos têm. Hoje um aluno chegou para mim, ele é muito gozador, ele dava muito problema ano passado tanto que ficou reprovado e deu um sururu na escola, que eles tiraram quatro alunos meus e colocaram outros que não eram meus. Tanto que este aluno L veio importado de outra sala. Aí tudo bem, ai ele veio para mim, pois já tinha ficado reprovado com outra professora e isso não dá certo. Deu a entender que comigo ele tava, como diz o outro, se adaptando. Ele me disse: “sabia que você é uma boa professora”. Eu respondi, meu querido, vou dizer uma coisa para você, se você for capaz de no final do ano ler, escrever e calcular melhor do que você chegou hoje, então aí eu serei uma boa professora. Agora, não me pergunte se vou ser uma boa... o que ele queria dizer que eu seria uma professora legal, boa,..;.e eu falei assim, eu não sou boa, mas se chegar ao final do ano e eu ver que você está melhor, aí sim eu vou ser uma boa professora. 160 Eles ficaram pensando... Pra mim avaliação é isso é você ter toda uma gama de coisas e você ter esse retorno, eu tenho pra mim que essa turma vai me dar muito retorno, tudo que eu propuser para eles se eu der da maneira certa e utilizando o material correto, aí a avaliação vai abranger todo mundo. É isso aí, só meter bronca... Avaliação é um processo, tanto é que eu falei com eles... Eu vou copiar Beatriz, sua ideia do asterisco lá [quadro de merecimento que a professora Beatriz utiliza]. Fábia sempre fez isso, só que Fábia sempre carinhosa... Eu: Mas explica [Beatriz] para ela como você faz... Ela [Beatriz] bota na parede... Susana: Usa coraçãozinho, Fábia faz no caderno... e ela fala assim,... Eu: Num é na parede que você faz? [perguntando para Beatriz]... (transcrição da gravação em áudio de 26/fev/07) Percebemos que a professora Susana fez uma reflexão sobre ela mesma, inclusive sobre a maturidade que adquiriu com o tempo, trabalhando como professora. Foi pela maturidade e reflexão que nos mostrou ter opinião esclarecida sobre avaliação, ao afirmar que avaliação representa um retorno tanto para ela como para o aluno. Susana indicou a avaliação diagnóstica da aprendizagem do aluno e em comparação ao início do ano letivo. Reconhecemos mais uma vez, a preocupação dessa professora com a maneira de transmitir os conteúdos e com o material a ser utilizado que, na fala dela, devem ser „corretos‟. Acreditamos que o „correto‟ para a professora significa aquilo que contribui para o aluno se interessar pelo conteúdo trabalhado. No referido encontro, Susana nos deu indícios sobre a resposta, ao questionamento do que vem a ser um „bom professor‟. Ela exemplificou que ser uma boa professora aconteceria quando conseguia fazer o aluno ler, escrever e calcular melhor do que quando começou o ano escolar. Concluímos mais uma vez que a professora Susana dava preferência a ler, escrever e calcular nas séries iniciais. Dando sequência ao diálogo, pedimos à professora Beatriz que nos falasse sobre o que considerava „avaliação‟. Eu: [...] Agora é você Beatriz,... Beatriz: Avaliação para mim,... Concordo com Susana. Avaliação... ela vai trazer um retorno do que ele aproveitou, do que não conseguiu, e do meu trabalho. Se eu avalio o aluno eu me avalio também, se ele não dominou alguma coisa, 161 porque ele não dominou. Quais os pré-requisitos que ele ainda não tem, por que ele não tem, eu não soube formar, eu não soube perceber,... Ele não está pronto, por que não está? Passa por tudo isso. Susana: Você falou em pronto eu lembrei da palavra prontidão. A palavra prontidão me veio agora, ficou tão malhado isso. Beatriz: Não é fácil avaliar não. Tem que perceber... Susana: Não é mesmo não. Beatriz: Até aqui ele vai, até aqui ele domina, ele consegue fazer o problema... (transcrição da gravação em áudio de 26/fev/07) A professora Beatriz nos mostrou uma visão amadurecida da avaliação. Considerou-a como um retorno para os alunos de uma maneira positiva - do que ele aproveitou – e negativa – do que não conseguiu. Avaliar o aluno também é se avaliar, perceber que temos influência no processo de aprendizagem. Beatriz colocou alguns comentários e questionamentos que precisariam ser feitos por nós, professores, quando avaliamos nossos alunos: “Quais os pré-requisitos que ele ainda não tem? Por que ele não tem? Eu não soube formar, eu não soube perceber,... Ele não está pronto, por que não está?”. A professora Beatriz terminou sua fala, comentando que avaliar não é fácil. Notamos, em outros momentos, que a professora Beatriz iniciou um processo de modificação, em suas avaliações, com a participação no grupo de estudos. No 31º encontro de 2007 (29/out/07), pedimos às professoras que completassem o seguinte questionamento: Avaliar se ocorreu aprendizagem em matemática é como... porque... Foi interessante que lançamos o questionamento e cada professora entendeu da sua maneira. Isso nos mostrou como muitas vezes falamos algo e cada pessoa entendeu de uma forma particular, atribuindo seus próprios significados. Patenteamos isso na anotação de cada uma na folha de resposta. Abaixo, transcrevemos as respostas escritas pelas professoras Susana e Beatriz sobre a questão. Professora Susana: Avaliar se ocorreu aprendizagem em matemática. Como? Por quê? Em meu entendimento houve aprendizagem sim, mas não em tudo. Trocando em miúdos, foram dadas aulas de operações, desafios, problemas, tamanhos, relações entre numerais (maior, menor), números pares e ímpares, ordens 162 crescente e decrescente, sucessor e antecessor, numerais ordinais e romanos e sólidos geométricos. Ficou difícil para eles o raciocínio lógico, ou pelo menos para uma boa parte, não querem decorar tabuada e ainda não viram nada sobre frações. Porém, a cada conteúdo dado foi proporcionado a eles momento lúdico onde é estimulada a competição saudável. Meu maior desafio (e talvez o inimigo) é o tempo. Uma pena que tenha de dedicar apenas uma parte, mas procuramos, digo, procuro, integrar o melhor que posso a outros conteúdos. P.S.: Verifico a aprendizagem a partir da independência que demonstram em responderem sozinhos. (Susana, 29/10/07) Quando a professora Susana foi levada a analisar sobre como avalia a aprendizagem de seus alunos, ela fez uma reflexão sobre os conteúdos trabalhados, em especial daqueles que possuíam resultados insatisfatórios. Ela mostrou mais uma vez estar iniciando um nível de metacognição sobre ela mesma, enquanto professora. Em um exame crítico e relacionou o que foi feito com seus alunos, o trabalhado realizado e o que iria desenvolver. Novamente, professora comentou sobre o conteúdo ser trabalhado de forma satisfatória, com materiais adequados. Quando Susana comentou sobre o lúdico, significou que ela queria que seus alunos aprendessem matemática de maneira prazerosa. Também apontou a questão do tempo como prejudicial para o trabalho do professor. Quando a professora Susana comentou que verificou a aprendizagem, a partir da independência e do caminhar autônomo dos seus alunos, ela relacionou essa vivência com a dela mesma, em relação à matemática. Em diferentes momentos constatamos que a professora Susana afirmava ter aprendido algo novo ou (re)construído algum conceito matemático, ao conseguir ser mais autônoma para resolver as questões propostas. A professora Beatriz também nos respondeu ao questionamento e apresentou, alguns indícios sobre o que e como avalia seus alunos. Professora Beatriz: O que fizemos em matemática. Ocorreu aprendizagem? Como? Por quê? Acho que sim, vários alunos hoje evidenciam que possuem ideias claras sobre conceitos como, a ideia de adição, subtração, multiplicação e divisão; utilizaram essas operações na resolução de problemas, fazem associações, 163 descobrem maneiras diferentes de pensar, apontam caminhos diferentes a um mesmo resultado, fazem descobertas. As ideas de frações começam a ficar cada vez mais claras; já identificam frações de unidades e frações de conjuntos; descobrem equivalências, comparam, fazem operações,... Encaram diferentes desafios de lógica e a cada dia conseguem fazer mais progressos. Mas ainda tenho alunos que possuem um raciocínio mais lento, que ainda precisam de mais tempo e de mais presença de professor para “provocar” as diferentes formas de raciocínio,... Falhas minhas: certa ansiedade e ainda acho que falta mais criatividade. Mas estou adorando a oportunidade de ter um grupo, de pertencer a um grupo que me faz pensar e ter um novo olhar sobre a matemática. Ensinei? Sim, mas poderia ter atingido a um grupo ainda maior. Sempre há o que melhorar. A professora Beatriz nos expõe como analisa a aprendizagem de seus alunos. Ela nos mostrou por meio de exemplos, evidenciando casos matemáticos, ao afirmar que devem possuir ideias claras sobre os conceitos ensinados, como utilizar as quatro operações na resolução de problemas, fazer associações, pensar de diferentes maneiras, fazer descobertas e identificar diversas formas de chegar a um mesmo resultado. Nessa reflexão, Beatriz demonstrou estar ciente das diferentes fases de aprendizagem de seus alunos e, novamente, relatou que o professor deve ser um provocador, aquele que auxilia seu aluno, não como um detentor do saber, mas como um incentivador e motivador no processo de aprendizagem (ERNEST, 1989). Um fato interessante, nesse relato, foi a colocação final da professora, quando fez uma autocrítica, pontuando algumas falhas no seu trabalho enquanto professora. Ela comentou sobre a ansiedade e, como veremos, em diferentes momentos, a professora tentou trabalhar nela mesma, principalmente, em relação ao cumprimento de todo conteúdo proposto. Em relação à falta de criatividade notamos que a professora Beatriz não observava algumas coisas que conseguia fazer em sala de aula e que, nós, pesquisadoras percebemos enquanto grupo. Além disso, a professora demonstrou uma análise sobre a participação dela no grupo e o quanto isso a ajudou no seu desenvolvimento profissional. Beatriz realizou uma avaliação sobre seu processo de ensinar, identificando que pode melhorar sua prática, essa atitude demonstra um amadurecimento do nível de consciência cognitiva e emocional. Notamos que as aprendizagens das professoras 164 influenciam nas aprendizagens dos alunos e vice-versa, mostrando a importância em não separá-las. Uma aprendizagem da professora Beatriz foi identificar os pontos fortes e fracos de seus alunos e adequar suas avaliações para atingir um número maior de alunos. Atendendo as propostas de Santos (1997), quando aponta alguns fatores que influenciam a aprendizagem dos alunos a partir da avaliação realizada pelo professor. Essa professora incluiu em suas aulas diferentes tipos de avaliações, não ocorrendo de maneira isolada. Com isso, pôde se aproximar mais dos alunos, em especial daqueles que, aparentemente, possuíam maiores dificuldades com determinados conteúdos matemáticos. A partir dos relatos apresentados nesta seção, confirmamos o que alguns pesquisadores revelam sobre a importância de um grupo de formação que auxilie professores a refletirem criticamente sobre si mesmos, como professores e aprendizes (SANTOS, 1993, 1993a). Um grupo no qual cada participante atue como „amigo crítico‟ dos outros, realçando o que pode servir de exemplos para outros professores e contribuir para buscar alternativas perante as dúvidas ocorridas ou explicitadas. Esse grupo esteve submerso nas emoções e atitudes de cada participante. Emoções e atitudes das professoras frente à matemática ensinada, aprendida e avaliada Quando falamos em emoções e atitudes, estamos comentando sobre algo muito particular de cada indivíduo. Nossas emoções e atitudes estão intimamente relacionadas com nossas experiências pessoais e com nossa história de vida. Conseguinte, fizemos, nesta parte, separação entre as professoras, pontuando o que ficou mais evidente em cada uma, em relação as suas emoções explicitadas e às suas atitudes, durante os encontros e práticas em sala de aulas. Mostramos como identificamos relações com a matemática 165 ensinada, aprendida e avaliada e algumas emoções e atitudes de cada professora. Além disso, como cada uma delas, em maior ou menor profundidade, conseguiu tomar consciência de suas próprias atitudes frente à matemática e ao seu processo de ensino e aprendizagem e avaliação. Limitamos a apresentar alguns indícios dessas emoções e atitudes porque acreditamos ter exposto isso nas outras seções de análise, já que não conseguimos separar emoções e atitudes das outras aprendizagens apresentadas. A professora Beatriz sempre teve uma postura diferenciada em sala de aula, notamos que trabalhava exigindo do aluno uma participação mais ampla. No encontro (30/jul/07), em uma conversa, ela explicou um dos motivos por que age dessa forma, conforme podemos conferir na parte do diálogo transcrito a seguir. Beatriz: [...] Lá no meu bairro,..., o que a gente faz? A gente tenta manter um nível de escola particular. Em cima de tarefa e atividade para casa, principalmente. E tenta nivelar por cima e não por baixo. Por exemplo, eu reconheço que minhas provas, minhas avaliações são além do que deveria ser, dentro do que a prefeitura quer. Eu prefiro sempre olhar para cima... E a gente está conseguindo, as notas baixas são poucas. E quando acontece a gente faz um trabalho para recuperar. Lucia: Você tem alguma prova sua aí? Para eu dar uma olhada? Beatriz: Tenho não... Sandra tem algumas cópias de provas minhas. Lucia: Depois você me mostra. Beatriz: Eu gosto disso, de lançar desafios. Se metade da turma alcançar [completamente ou corretamente] aquilo que eu quero, eu fico... [realizada, ela não completou o pensamento nesse momento, mas falou posteriormente] (transcrição da gravação em áudio de 30/jul/07) Diante da fala dessa professora, evidenciamos que sua atitude relaciona-se ao trabalho da escola, situada num bairro de classe média, em Vitória. A professora acreditava que seus alunos podiam atingir níveis mais elevados de aprofundamento, denominado por ela de „nivelar por cima‟. Realizou um trabalho para atingir esse patamar estabelecido, inclusive pelos alunos com dificuldades. Beatriz afirmou que gostava de lançar desafios e estimular seus alunos, mesmo que alguns desses não consigam resolver sozinhos. O 166 importante para ela era o estímulo e tentativa de solução, o pensar sobre o que foi abordado. Em algumas reflexões provocadas por nós, a professora Beatriz falou sobre ela mesma e suas contradições. A reflexão realizada de forma consciente pela professora estimulou-a a parar e a olhar para si mesma, suas atitudes e suas falas. Beatriz percebeu que, em alguns momentos da sua prática pedagógica, comentou ou afirmou frases que vão contra o que acreditava. A situação foi justificada pela professora por não refletir profunda e conscientemente sobre o que comenta ou faz. Um exemplo disso está explícito na fala da professora que colocamos a seguir. Uma das coisas que mais me cobro é quando não consigo planejar direito o meu trabalho. Ao mesmo tempo em que critico as seis horas de planejamento semanal, porque me tira da sala de aula, do trabalho efetivo com os meus alunos, sou obrigada a reconhecer que sem planejamento também não se consegue avançar muito. (Beatriz, 10/nov/08) A questão do tempo sempre esteve presente nos comentários das professoras e, em especial, da professora Beatriz. Ela exige, dela mesma, muitas respostas e resultados, e fica se cobrando a aprendizagem dos alunos. Como exemplo, um comentário da professora Beatriz sobre sua própria atitude em relação ao cumprimento do currículo, prescrito pela escola e por ela mesma, e sobre as formas como desenvolvia os conteúdos. Acho que o que me atrapalha às vezes é o fato de ser conteudista demais, vejo todo o programa traçado, percebo a sua importância, olho a variedade de recursos que hoje temos disponível e fico ansiosa querendo desenvolver mais e mais conteúdos e o tempo é curto... (Beatriz, 10/nov/08) No final da pesquisa, a professora Beatriz fez outra reflexão sobre suas aprendizagens e afirmou mudanças em sua forma de pensar. Ela ainda se considerava ansiosa, mas afirmou ter aprendido a prestar mais atenção no que necessitava voltar e refazer. Conforme está explícito no diálogo do encontro de 06/out/08, no qual conversávamos sobre nossas aprendizagens: Beatriz: Eu aprendi a ser mais paciente um pouco também. Eu/Sandra: Mais paciente ainda? 167 Beatriz: Ela [Vânia] entendeu aquele dia que eu falei. Eu sou impaciente às vezes com o resultado, eu vou muito longe. Então vocês me ensinaram que às vezes é preciso voltar, é preciso tentar entender porque ele ainda está pensando daquela forma, reconstruir aquele caminho, rever os procedimentos para entender como o menino está pensando... Quando a gente começou na divisão, por exemplo, vocês me deram um toque, quando eu deixei eles (os alunos) mostrarem como tinham entendido a divisão, saíram coisas interessantíssimas. Aqueles desenhos. Lembra? Aquelas outras maneiras de fazer divisão. Então me mostrou a não correr muito com certas coisas, às vezes também. Susana: A gente querer fazer tudo. Beatriz: Eu tenho um pouco disso, para o menino. De lançar conteúdos para o menino e às vezes queimar etapas. Aprendi a andar mais devagar um pouco [com a matéria] pelo menos voltando. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) A professora Beatriz sempre teve uma preocupação com a aprendizagem do aluno, no sentido de completar todo conteúdo traçado para o ano letivo. Ela conseguiu fazer um trabalho intenso e afirmou que uma aprendizagem com o grupo foi fazer análises, voltar aos conteúdos ou atividades que os alunos tiveram mais dificuldades ou „erros‟. Um exemplo dessa atitude tomada pela professora foi o retorno de um problema abordado em uma de suas provas, e os alunos não tiveram sucesso ao resolvê-lo, conforme ela mesma comentou: Eu/Sandra: Deste ano tem algum exemplo que você poderia dar disso, de estar voltando? Beatriz: As avaliações, por exemplo. Aquelas resoluções de problemas, eu percebi que tinha exagerado,... Eu voltava. Fazia tudo de novo, às vezes com números mais simples... Até ficar mais claro para eles. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Esse problema será abordado na seção que trata sobre resolução de problemas. Essa característica da Beatriz demonstoura que seu nível de autorreflexão e de metacognição estava mais apurado e amadurecido com a participação no grupo de estudos. A professora Susana possuía uma emoção negativa em relação à matemática ao iniciar sua participação no grupo. Identificamos na fala seguinte, sua aversão pela matemática e também uma análise de mudança, a partir da motivação gerada pelo grupo, na tentativa de realizar diferentes atividades em 168 sua sala de aula de matemática. Chamamos a atenção para o fato da ideia de reciclar caixas de leite para transformar em cestos de lixo individuais foi da própria professora. Inclusive o trabalho de formas geométricas com seus alunos. Ela mesma percebeu diferenças, em sua prática, após sua inserção no grupo. Susana: Gente isso aqui é uma terapia,..., terapia,... Igual a Sandra me colocou e foi muito bondosa. Porque eu cheguei aqui, com um verdadeiro pavor em matemática. [...] mas eu cheguei apavorada. Eu: Agora fica inventando moda. Susana: Eu me soltei, de certo modo, a gente inventa moda. Onde que eu iria inventar de fazer um lixinho com forma geométrica lá na sala,... Nunca! (transcrição da gravação em áudio de 03/set/07) Esse exemplo mostra uma atitude diferenciada da professora Susana, que, normalmente, demorava mais a inserir em sua sala de aula as propostas do grupo. A princípio, ela tinha que ultrapassar a barreira do „pavor ou medo‟ da matemática, o que acreditamos ter sido superado. A superação levou a professora a inovar e a modificar suas práticas de maneira mais lenta que a professora Beatriz. Acreditamos que isso se deve ao fato da professora Susana estar numa etapa diferenciada de desenvolvimento profissional, em especial, em relação à matemática. Sua própria visão de matemática foi se alterando ao longo do processo, conforme vimos em exemplos de crenças e concepções. A partir de reflexões, sobre algumas atitudes e emoções, relacionadas à matemática e aos seus processos de ensino, aprendizagem e avaliação, notamos que ao longo do processo foi ficando mais claro as relações, entre atitudes e emoções, com os conteúdos matemáticos. Isso esclareceu, para todas nós e, principalmente, para as professoras Susana e Beatriz, o que estava „amadurecido‟ e o que ainda estava „verde‟ em relação aos conteúdos matemáticos que elas sabiam e os que ensinavam. Esclarecemos essa parte na seção seguinte. 169 5.2 Frutos de aprendizagens de conceitos matemáticos aliados às práticas pedagógicas O que chamamos de frutos de aprendizagens de conceitos matemáticos são os indícios que assimilamos sobre as construções individuais desses conceitos, as significações que cada uma dava ao que estávamos discutindo e ao que estava sendo trabalhado em sala de aula. A metáfora do fruto foi colocada, pois sabemos que um fruto passa por processos de formação e de amadurecimento. Ele depende da árvore na qual está inserido, do local em que está plantado, da quantidade de sol, da água que a árvore recebe e transmite. Depende se a árvore é boa, dos seus frutos, da qualidade da semente, da terra e das flores,... Portanto, não depende, exclusivamente, de apenas um fator, mas das relações entre os vários fatores que a envolvem. E, dessa forma, identificamos a construção dos conceitos matemáticos. O processo de construção não depende apenas do indivíduo, mas também do meio em que está inserido, do contexto, da sua constituição histórica e pessoal, dos seus pares. Inferimos também como a construção dos conceitos matemáticos está aliada às práticas pedagógicas. Em muitos casos, ao longo do processo de desenvolvimento deste trabalho, íamos concluindo como essa construção é mais complexa do que imaginamos. E como, muitas vezes, precisamos utilizar diferentes estratégias para construirmos esses conceitos, e como eles vão se formando nas inter-relações entre as pessoas envolvidas e a forma pela qual influenciamos e somos influenciados pelos outros. Afirmamos que os conteúdos matemáticos das séries iniciais que mais se destacaram em nossas discussões foram: o Números: inteiros, decimais e frações. o As quatro operações: adição, subtração, multiplicação e divisão. o Geometria plana e espacial: formas e medidas. Também teve destaque nos debates os temas transversais e sua relação com os conteúdos que poderiam ser trabalhados em matemática. Os conceitos 170 matemáticos foram sendo estudados, a partir da necessidade surgida e apresentada pelas professoras nos encontros. Pela característica da pesquisa não poderíamos definir quais conteúdos seriam de interesse dos professores, pois foi acontecendo a partir da dinâmica do próprio grupo. No decorrer do estudo longitudinal, tivemos vários momentos que nos levaram a refletir sobre nossas práticas e nossas metodologias de ensino. Foram reflexões e discussões que nos levaram a organizar e desenvolver em sala de aula algumas das metodologias de ensino. Destacamos alguns dos trabalhos que foram desenvolvidos pelas professoras durante o estudo longitudinal: o Resolução de problemas. o Realização de trabalhos com grupo de alunos. o Uso da linguagem escrita nas aulas de matemática. o Realização de “Oficinas” com utilização de materiais concretos. A questão relacionada com a forma que executamos a avaliação também esteve presente nas nossas discussões no grupo de estudos. Muitas vezes, debatemos sobre provas a serem aplicadas pelas professoras e provas que já tinham sido aplicadas, por isso organizamos uma abordagem sobre este assunto na medida em que apresentávamos o que escolhemos. Um material que esteve presente desde os encontros iniciais foi o livro da professora Vânia Santos (1997) sobre avaliação. Nós, integrantes do grupo de estudos, conversamos sobre várias atividades propostas por ela e aplicamos em sala de aula com adaptações, quando necessárias. Embora tenhamos abordado vários conteúdos matemáticos no decorrer de nossas análises, decidimos apresentar aqueles que se tornaram incidentes críticos ou significativos. Conforme já citamos anteriormente, aprofundamos as análises na resolução de problemas, em especial as que envolvem as quatro operações fundamentais (adição, subtração, multiplicação e divisão) e em algumas ideias da geometria. Por esse motivo, esta seção está separada em subtítulos que são resoluções de problemas e geometria. 171 Na medida em que apresentamos nossas análises, concluímos que algumas professoras se destacam mais em alguns momentos do que outras. Isso é natural, pois tem relação direta com o que cada professora acha mais relevante, o que cada uma aplicou em sala de aula e com suas crenças e concepções relativas ao que seja ensinar matemática. Na parte de resolução de problemas, a professora Beatriz se destacou mais por gostar de desafiar seus alunos e por acreditar que o desafio seja a forma mais adequada de se trabalhar com alunos em sala de aula. Quanto à geometria, a professora Susana tem pontos fortes, por querer aprender o que não sabia e por gostar de trabalhar mais com materiais concretos em aulas, como oficinas e projetos, resumindo, aulas que envolvem parte prática com os alunos. Deixamos os detalhes para serem apresentados no decorrer do texto, onde colocamos algumas de nossas observações, principalmente, sobre os recortes realizados. 5.2.1 Resolução de problemas Uma das metodologias mais discutidas e abordadas em nossos encontros foi resolução de problemas. Assim sendo, colocamos uma seção própria para o assunto. Porém, não falamos, exclusivamente, sobre a resolução de problemas como metodologia, mas como uma proposta para a discussão sobre os conteúdos matemáticos abordados e discutidos nos encontros do grupo, como as quatro operações e o sistema decimal como um todo. Resolução de problemas e ideias sobre as quatro operações Muitas de nossas discussões partiram de resoluções de problemas, como em um debate que gerou bons frutos sobre ideias que envolvem as operações de adição, subtração, multiplicação e divisão. Normalmente, são conteúdos 172 trabalhados, intensamente, nas séries iniciais e em alguns momentos, conforme fala da professora Susana, já citada na seção 5.1, são conteúdos privilegiados nesse nível de ensino. Mostramos, nesta seção, como as discussões do grupo nos levaram a estudar e aprofundar o tema e como percebemos que sempre existe algo a aprender e que nós, professores, fazemos algumas coisas sem a devida reflexão e conhecimento sobre alguns conteúdos que trabalhamos em nossas aulas de matemática. Apresentamos algumas de nossas discussões sobre o início dos estudos sobre as quatro operações por meio de análise de problemas. A atividade, desenvolvida no encontro do dia 19/mar/07, foi retirada do livro de Santos (1997). A proposta da atividade era de separar os problemas fornecidos por meio das operações semelhantes. Posteriormente os problemas deveriam ser separados por ideias operatórias dentro de cada operação. As professoras receberam a atividade com os problemas separados em tiras de papel e tiveram um tempo para resolverem o que estava sendo proposto antes de discutirmos novamente. Essa atividade foi colocada na íntegra, a seguir. Agrupe estes problemas pelas operações. Depois para cada operação agrupe-os em conjuntos de problemas do mesmo tipo, isto é, problemas que apresentem a mesma ideia operatória. a) Eu tenho 8 bolinhas de gude e João tem 3. Quantas bolinhas eu tenho a mais do que João? b) Eu tenho 2 maçãs e 3 laranjas. Se juntarmos estas frutas com quantas frutas ficarei? c) Eu tenho 3 camisas de cores diferentes e 4 shorts de cores distintas. Quantos trajes distintos eu posso formar? d) Eu tenho 45 bombons e existem 9 crianças que irão reparti-los igualmente. Quantos bombons cada criança irá receber? e) Eu tinha 8 bolinhas de gude. Agora tenho 2. Quantas eu perdi? f) Eu tenho 4 vasos de flores e quero colocar 3 rosas em cada vaso. Quantas rosas eu preciso ter? g) Eu tinha 8 bolinhas de gude, perdi 5. Com quantas eu fiquei? h) Eu tenho 45 balas. Eu vou dar 5 balas para cada criança num grupo. Quantas crianças receberão balas? i) Uma banda escolar tem 8 filas de instrumentista, com 7 membros em cada fila. Quantos alunos estão na banda? j) Sorvete Sem Nome tem 6 sabores de sorvete e 8 coberturas diferentes. Quantos sorvetes de casquinhas diferentes podem ser feitos? k) A biblioteca escolar tem 80 livros sobre cachorros e tem 10 alunos que irão retirar os livros, cada um levando a mesma quantidade. Quantos livros pode levar cada aluno? 173 l) m) n) o) p) q) r) A garagem da UFRJ tem 7 ônibus velhos e 20 novos. Quantos ônibus têm na garagem? Barbara acabou 14 dos problemas para casa e Jose terminou 9. Quantos problemas Barbara terminou a mais do que Jose? Um jardineiro plantou 16 canteiros de margaridas, com 8 mudas em cada canteiro. Quantas mudas ele plantou ao todo? Ana estava inscrita em 6 disciplinas na faculdade. Por causa de falta de tempo para estudar ela trancou 2 disciplinas. Quantas disciplinas ela ainda está fazendo? Joana tem 5 irmãs e distribuiu (sic) para cada uma delas 3 tíquetes para a peça de teatro. De quantos tíquetes Joana precisa? Jose possuía 14 carros. Agora tem 7. Quantos carros ele vendeu? Uma companhia aérea está anunciando 66 passagens com desconto para pessoas que comprem pares de passagens. Quantas pessoas podem comprar um par de passagens? (SANTOS, 1997, p. 77 – 78) O diálogo dessa sequência ocorreu no 6º encontro de 2007 (19/mar/07) e mostra como a discussão sobre a atividade foi rica e como nos chamou a atenção para a necessidade de estudarmos mais sobre as operações fundamentais e as ideias que as envolvem. Colocamos no decorrer do diálogo nossas considerações e análises sobre o que achamos pertinente. Eu (Sandra): Vamos lá... vocês acharam todas as operações,... todas as quatro 39 operações. Vamos falar como nós separamos e verificar se separamos igual. Beatriz: Esta aqui da garagem,... Eu: Essa da garagem é sobre o quê? Beatriz: Adição. E também a das 3 laranjas e 2 maças. Só essas. Susana: Só, isso mesmo. Eu: Só estas duas, né? Quais as ideias que tem aí? Susana: Juntar e... juntar. Eu: Juntar,... e quantos têm. As palavrinhas-chave do primeiro problema. No primeiro tem a palavra “juntar e ficar” e a do segundo problema “quantos têm”. Essas são as palavrinhas que eu comentei que tinha que ter no problema no início, colocar a exigência de que tem que ter a palavrinha,... “juntar”. (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) Começamos analisando os problemas de adição e quando falamos em discutir as ideias neles contida analisamos “palavras-chave” que apareciam na escrita do problema. Essa foi a forma como consideramos as ideias que os problemas 39 As professoras presentes neste encontro foram Sandra, Susana e Beatriz. 174 envolviam. Conseguimos identificar nos problemas de adição as palavras: juntar, ficar e quantos tem. E, no momento, achamos que essas eram as sugestões que envolviam adição. Não estávamos preparadas para uma discussão mais aprofundada sobre isso. Quando estudamos sobre essas ideias que envolvem os problemas relacionados com as quatro operações, entendemos que alguns autores organizam esses tipos de problemas como „estruturas aditivas‟ que envolvem os conceitos de adição e subtração. Analisando, deduzimos que as ideias relacionadas à adição e à subtração eram mais abrangentes do que simplesmente a noção de juntar. Os dois problemas da atividade que dizem respeito à adição, são: 1) Eu tenho 2 maçãs e 3 laranjas. Se juntarmos estas frutas com quantas frutas ficarei? 2) A garagem da UFRJ tem 7 ônibus velhos e 20 novos. Quantos ônibus têm na garagem? A professora Vânia nos mostrou que esses problemas possuem complexidades diferentes. Ambos remetem à ideia de juntar, porém o segundo problema fala de uma mesma entidade – ônibus – já o primeiro problema fala de maçãs e laranjas e as crianças devem perceber que elas fazem parte de uma classificação mais ampla, a das frutas. A ideia de inclusão também é usada em outros conteúdos matemáticos e a falta de trabalho adequado nas séries iniciais pode prejudicar o desenvolvimento de conteúdos posteriores sobre inclusão em álgebra, por exemplo. Não costumamos conversar com nossos alunos sobre essas diferenças. Acredito que, por isso, temos, em alguns momentos, alunos que querem resolver problemas apenas fazendo alguma operação com os números, sem analisar o problema como um todo. Algumas vezes nossos alunos querem encontrar palavras-chave nos problemas, conforme nós, professores, fizemos nessa tarefa, mas não olham a sutileza que envolve cada situação. Queremos chamar a atenção para alguns „vícios‟ que utilizamos ao trabalharmos problemas em nossas salas de aulas. Normalmente, todos os problemas vêm com dados numéricos, precisamos explorar situações-problema que possam ser resolvidos sem colocarmos as quantidades. É preciso aprender a reformular perguntas, contextos, apresentar 175 diferentes significados para uma mesma operação e levar os alunos a terem uma ideia esclarecida e amadurecida sobre resolução de problemas. A forma inadequada de resolver problemas perdura nas séries finais do ensino fundamental e acarreta problemas em níveis de ensino após o fundamental, pois os alunos não conseguem interpretá-los de forma satisfatória. Continuando o relato e análise do diálogo, analisamos os problemas de subtração que identificamos e nossas conclusões sobre algumas ideias envolvidas. Eu: [...] E agora? Vamos passar para outra. Quais que vocês querem agora? Susana: Subtração... José possuía 14 carros, agora têm 7. Quantos carros ele vendeu? Eu: E quais são os outros problemas? Vamos lá... Vamos colocar todos e ver as ideias. Beatriz: Eu tinha 8 bolinhas de gude, perdi 5... Susana: Com quantas fiquei? Eu: Aí tem dois problemas de bolinhas de gude bem parecidos... Susana: Muito parecidos, eu até achei que era erro e elas eram iguais. Eu: É, mas a ideia é completamente diferente... Beatriz: Esse aqui é: eu tinha 8 bolinhas de gude. Agora tenho 2. Quantas eu perdi? Eu: Então a ideia é “quantas fiquei” e a outra “quantas perdi”. Susana: E essa do carro? Eu: “Quantas fiquei”. “Quantos vendeu?” Dá a ideia de quantidade, também. Beatriz: Eu tenho 8 bolinhas de gude e João tem 3. Quantas eu tenho a mais do que João? Eu: É... Quantas a mais. Esse primeiro é quantos vendeu. Susana: Ana estava inscrita em 6 disciplinas na faculdade. Por causa de falta de tempo para estudar, ela trancou 2 disciplinas. Quantas disciplinas ela ainda está fazendo? Num é? Eu: Quantas ela ainda está fazendo?... Essa ideia aí é de quantas fiquei ainda. Essa de quantos vendeu?... Não... É diferente... Mas essa é de quantas ainda ela está fazendo é a ideia de quantos ficou para ela fazer... Ainda é de quantificar... E a outra? Bárbara acabou 14 problemas para a casa e José terminou 9. Quantos problemas ela terminou a mais? Susana: É isso,... quantos a mais... Eu: Ideia de a mais,... então um é a ideia de ficar, perdeu, perdeu e ficou... e a outra ideia é eu tinha tantos, agora eu tenho tantos, quantos eu tenho... essa 176 ideia do perdi e do vendo, elas são mais ou menos a mesma ideia. Pois elas são eu tinha tanto e perdi ou vendi e pergunto com quantas tenho agora. Ela é diferente do fiquei e do tenho agora. Susana: Essas filipetas vão ficar com a gente, né. Eu: sim... (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) Temos nesse diálogo sobre subtração a identificação, seis problemas, conseguimos no momento do encontro elencar as ideias de analisar um resultado a partir da perda e da venda – ideia de „quantos ficou‟ – e novamente não observamos diferenças entre as complexidades dos problemas. Os seis problemas estão expostos em sua forma completa a seguir. Os quatro primeiros remetem à ideia de „quantos ficou‟. Já os dois últimos trazem a ideia de comparação, mas, no momento do diálogo o classificamos como „quanto a mais‟. 1) 2) 3) 4) Eu tinha 8 bolinhas de gude. Agora tenho 2. Quantas eu perdi? Eu tinha 8 bolinhas de gude, perdi 5. Com quantas eu fiquei? José possuía 14 carros. Agora tem 7. Quantos carros ele vendeu? Ana estava inscrita em 6 disciplinas na faculdade. Por causa de falta de tempo para estudar ela trancou 2 disciplinas. Quantas disciplinas ela ainda está fazendo? 5) Bárbara acabou 14 dos problemas para casa e José terminou 9. Quantos problemas, Bárbara terminou a mais do que José? 6) Eu tenho 8 bolinhas de gude e João tem 3. Quantas bolinhas eu tenho a mais do que João? Alguns problemas são parecidos, como os dois primeiros selecionados, n e inclusive levou a um comentário da professora Susana que afirmou ter pensado, a princípio, ser erro e se tratar de um mesmo problema. Em estudos seguintes a esse encontro e conversas com a professora Vânia, percebemos que os propósitos dos dois problemas era verificar quantos ficaram, porém, a complexidade do primeiro exposto acima é maior do que a do segundo. Pois, o primeiro exemplo é um problema direto, já o segundo é um problema inverso (NUNES et al., 2005). Logo, a forma que uma criança deve pensar nesses problemas é diferente, conforme veremos a seguir. 1) Eu tinha 8 bolinhas de gude. Agora tenho 2. Quantas eu perdi? 8 - ? = 2 2) Eu tinha 8 bolinhas de gude, perdi 5. Com quantas eu fiquei? 8 – 5 = ? 177 Adultos não percebem que são estruturas mentais diferentes, pois já dominam esse tipo de problema. Mas, enquanto professores precisamos estar atentos ao abordarmos diferentes tipos, propositalmente, para que nossos alunos possam atingir níveis diferentes de maturidade em relação a esses conteúdos. Como podemos inserir em nossas práticas pedagógicas diferentes abordagens. A ideia referente aos dois últimos problemas explicitados, anteriormente, (problemas 5 e 6) envolvem raciocínio de comparação, inclusive, entre grandezas possuídas por pessoas diferentes. Essa ideia leva a uma comparação relacional dos elementos. É outra estrutura mental, na qual a criança precisa operar com os elementos em relação biunívoca, até perceber a operação de subtração envolvida. Continuando o diálogo sobre a atividade, comentamos sobre os problemas que envolvem a multiplicação e suas ideias. Susana: Agora tem a multiplicação, né. [...] Eu: Multiplicação, vamos lá... Susana: Eu tenho 3 vasos de flores e quero colocar 3 rosas em cada vaso. Quantas rosas eu preciso ter? Combinatória? Eu: Não,... Parcelas iguais,... Susana: Parcelas iguais... Eu: Sim,..., 4 vasos, 3 rosas em cada uma. Parcelas iguais. Susana: Esta daqui está parecendo,..., um jardineiro... Beatriz: Um jardineiro plantou 16 canteiros de margaridas, com oito mudas em cada canteiro. Quantas mudas ele plantou ao todo? Eu: (concordou) um jardineiro plantou 16 com 8 em cada uma,..., parcelas iguais. Susana: Já... Joana tem 5 irmãs e distribuiu para cada uma delas 3 tíquetes para a peça de teatro. De quantos tíquetes Joana precisa?... Também é de parcelas iguais... Eu: Eu acho que essa pergunta está errada. Deveria ser “de quantos tíquetes Joana precisou?”. Se ela já distribuiu... Susana: Alguma coisa está estranha, alguma coisa não está batendo. Eu: Quantos tíquetes ela precisou, se ela já distribuiu, como ela vai precisar ainda? Ela não precisa de mais nada, precisou... 178 Beatriz: Olha como a gente fixa o pensamento em uma palavra. Acontece que distribuir dá a ideia de divisão. Susana: é dá a ideia... Eu: Eu vi isso, mas depois eu parei e olhei que ela distribuiu para cada uma três, então é a ideia de parcelas iguais... Mais o quê? Susana: Uma banda escolar, num é? Tem 8 filas de instrumentista, com 7 membros em cada fila... Agora a ideia de combinatória,... Tem o Sorvete sem nome que tem 6 sabores de sorvete e 8 coberturas... E a outra que eu tenho camisas de cores diferentes e 4 shorts cores distintas. Não é isso? Deu para entender. Com uns probleminhas desses é alguma coisa simples de você está,... né. (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) Identificamos, nos problemas sobre multiplicação, as ideias de parcelas iguais e de combinatória. Em alguns momentos, ficamos com a impressão de ter outras ideias envolvidas com a de parcelas iguais, ou alguma particularidade. Porém, devido nossa falta de conhecimento sobre esses conteúdos, não conseguimos identificar possíveis sutilezas nos problemas. Os problemas de multiplicação identificados foram: 1) Joana tem 5 irmãs e distribuiu para cada uma delas 3 tíquetes para a peça de teatro. De quantos tíquetes Joana precisa? 2) Um jardineiro plantou 16 canteiros de margaridas, com 8 mudas em cada canteiro. Quantas mudas ele plantou ao todo? 3) Eu tenho 4 vasos de flores e quero colocar 3 rosas em cada vaso. Quantas rosas eu preciso ter? 4) Uma banda escolar tem 8 filas de instrumentista, com 7 membros em cada fila. Quantos alunos estão na banda? 5) Eu tenho 3 camisas de cores diferentes e 4 shorts de cores distintas. Quantos trajes distintos eu posso formar? 6) Sorvete Sem Nome tem 6 sabores de sorvete e 8 coberturas diferentes. Quantos sorvetes de casquinhas diferentes podem ser feitos? Os quatro primeiros problemas foram considerados como problemas que envolvem a ideia de „parcelas iguais‟. Mas, o segundo e o terceiro problemas apresentados são classificados em alguns livros (PCN‟s – BRASIL, 1997) como problemas de situações associadas à configuração retangular. Os dois últimos problemas são ligados à ideia de combinatória. Após estudos, observamos que, na relação desses problemas, não apareceu nenhum com a ideia de proporção e nem de multiplicação comparativa (que envolve dobro, triplo, metade). 179 No meio da discussão sobre os problemas, surgiu um comentário sobre uma atividade, que foi desenvolvida com a turma da professora Susana, de elaborar problemas. Na aula, a professora Susana pediu para que seus alunos inventassem problemas, utilizando os números que eram dados nas operações indicadas por ela. Acredito que não percebemos no momento do debate, como precisávamos resgatar essas ideias com os alunos. Isso apenas apareceu após iniciarmos um estudo mais aprofundado sobre as ideias matemática presentes nos problemas. Eu: É interessante ver que, quando você pediu para seus alunos inventarem problemas eles não inventaram problemas como esses. Eles só inventaram problemas de “quantos eu fiquei”. Na verdade a gente anotou errado, é eu tinha, agora eu tenho, e vamos ver a diferença entre o antes e depois... Só tem uma ideia de divisão? Susana: Vamos lá. Uma companhia aérea estava... no caso é só dividir por dois e achar o resultado. Mas eu não soube qual é essa ideia, não. Beatriz: divisão... Eu: Divisão em partes iguais. Susana: É isso mesmo? Dividir em parcelas iguais. E isso? Agora tem o seguinte: eu tenho 45 balas. Eu vou dar 5 balas para cada criança num grupo. Quantas crianças receberão balas? Essa é a que a gente chama de propriedades distributivas. É isso mesmo? Distribuir... Eu: Também em parcelas iguais. Distribuir em parcelas iguais. Susana: Quantas crianças receberão as balas? Formar grupos de 5 e distribuir para as crianças, nove grupos. É isso, distributiva? Beatriz: Agora, esse problema aqui da companhia aérea, pares e passagens. Cada pessoa pode comprar um par de passagens. Tem como comprar um par, dois pares, três pares... Eu: Cada pessoa pode comprar um par de passagens. Qual o maior número de pessoas... Susana: Está um par de passagem... Eu: Tem a palavra um par. Se tivesse somente pares de passagens poderia uma pessoa comprar vários pares de passagens. Susana: Aqui, o do bombom é o inverso da bala. Pois, aqui está dizendo a quantidade e perguntando quanto cada um vai receber. É o contrário, essa ideia aí eu num sei não. Eu: Todas essas ideias são parcelas iguais e a questão da distributiva, o que muda é como você pergunta. Uma você tem 45 e vai dar 5 balas para cada um. O outro você tem 45 bombons e vai dar para 9 crianças. Uma é distributiva e a outra de parcelas iguais. E a da biblioteca? Tem livros e alunos... Também é de parcelas iguais... Quantos livros podem levar cada aluno? 180 Os problemas referentes à divisão foram identificados com uma mesma ideia de parcelas iguais – distributiva. Porém, em diversas falas, reconhecemos como nós, professoras, ficamos incomodadas com alguns problemas e como, algumas vezes, tivemos dúvidas. Os problemas que envolvem ideias de divisão foram: 1) Eu tenho 45 bombons e existem 9 crianças que irão reparti-los igualmente. Quantos bombons cada criança irá receber? 2) A biblioteca escolar tem 80 livros sobre cachorros e tem 10 alunos que irão retirar os livros, cada um levando a mesma quantidade. Quantos livros pode levar cada aluno? 3) Eu tenho 45 balas. Eu vou dar 5 balas para cada criança num grupo. Quantas crianças receberão balas? 4) Uma companhia aérea está anunciando 66 passagens com desconto para pessoas que comprem pares de passagens. Quantas pessoas podem comprar um par de passagens? Após estudos, concluímos que as ideias que envolvem os problemas de divisão são mais complexas do que pensávamos e conhecíamos no momento do debate. Os dois primeiros problemas apresentados são os que envolvem a noção de partição, as quantidades precisam ser distribuídas igualmente. Porém, pessoas diferentes podem realizar operações diferentes para chegar ao resultado. Os dois últimos problemas são relacionados à ideia de cotição (ou quotição), no qual há uma quantidade específica de cotas que se deseja distribuir. A princípio, dá-nos impressão de que essas ideias sejam equivalentes, mas a forma de resolução é completamente diferente para os dois casos. Na partição, podemos distribuir a quantidade nos grupos indicados, colocando apenas um de cada vez, por grupo ou podemos colocar de 3 em 3 ou com outro valor. Nos problemas de cotição, devemos colocar exatamente a quantidade estipulada em cada grupo, não existe a abertura de realizar a ação, distribuindo de diferentes formas. Há algumas dificuldades com relação às ideias matemáticas apresentadas pelas professoras nesses problemas, inclusive em minhas ideias, enquanto licenciada em matemática A realidade nos mostra como nossas formações valorizam a matemática de nível superior e não chamam a atenção para alguns conceitos fundamentais da base do edifício matemático. Esses fatos nos levaram a refletir sobre nossos conhecimentos e sobre nossas formações. Isto 181 gerou a necessidade de estudarmos mais profundamente o assunto. Outras discussões foram realizadas pelo grupo, em diferentes momentos e algumas delas serão apresentadas ao longo deste texto. Como consequência, pesquisamos em alguns livros (NUNES et al., 2005) as diferentes ideias que envolvem cada uma das operações. Aprofundamos os estudos em diferentes pesquisas sobre as estruturas aditivas e multiplicativas, em revistas (Nova Escola, 2007), capítulos de livros (CORREA, 2006, CORREA; SPINILLO, 2004; MORO, 2004; SAIZ, 1996) e, especialmente, em conversas com a coorientadora Vânia. Reconhecemos que entender ideias que envolvem os conceitos matemáticos não é simples e que, muitas vezes, nós não valorizamos isso, ou nem disso tomamos conhecimento. Em encontros posteriores, discutimos sobre o assunto e começamos a pensar mais sobre as diferentes abordagens. Alguns resultados das discussões aparecem nos relatos e nas análises de aulas das professoras participantes do grupo de estudos. Resolução de problemas em aulas de Beatriz Desde a primeira aula que assistimos da professora Beatriz, vimos que abordava grande quantidade de questões envolvendo resolução de problemas. Esse assunto estava de acordo com a visão de matemática que essa professora possuía. Notamos também, que, nas avaliações, Beatriz utilizava questões envolvendo resolução de problemas e raciocínio lógico. Questionada sobre sua aprendizagem nessa área, ela afirmou que: O que mais gostei foi quando aprendi que muitos problemas podem ser resolvidos pela „regra de três‟ ou equações simples com apenas uma incógnita. [...] é bem gratificante achar a solução de problemas apenas pelo raciocínio lógico, sem fórmulas,...” (Beatriz, 18/set/2006). Identificamos que ela se sente desafiada pela matemática, por isso gosta de trabalhar com raciocínio lógico. Apesar das dificuldades explicitadas, Beatriz 182 possui muita curiosidade e gosta de ler e de desafiar a si própria, o que a direciona numa busca de aprender sempre mais. Ela afirmou e continua afirmando várias vezes que não deseja que seus alunos tenham dúvidas como ela teve, o porquê de sua preocupação em ajudá-los na superação de suas dificuldades. Ela falou que participar do grupo a ajudou a entender conceitos ou definições relacionados à matemática que ainda pareciam obscuros. Um exemplo de ideias matemáticas, que não estavam claros para ela, é o conceito ou definição do número , ela afirmou nunca ter entendido, apesar de usar em algumas atividades matemáticas. Tivemos a oportunidade de explicar-lhe por meio de desenhos e palavras, a relação do com o diâmetro e o comprimento da circunferência (nov/06). Um exemplo sobre sua relação com seus alunos e como gosta de trabalhar em matemática, pôde ser percebida na sua escrita sobre uma aula que tinha gostado do que e como realizou e como os alunos dela participaram. Reproduzimos o que ela relatou sobre a aula que considerada positiva. Gosto quando lanço desafios e o aluno, sem muita explicação, apenas com pequenas pistas, consegue chegar à resposta. Exemplo: Propus o seguinte problema: Mamãe comprou ¼ de uma torta para repartir entre mim, meu irmão e ela. Quanto de torta cada um recebeu? Desenhe ou represente e dê uma resposta. Apenas alertei: não se esqueçam de considerar a torta inteira. Depois usei a linguagem matemática: ¼ : 3 = vários alunos acertaram. Em várias situações-problema gosto quando o aluno mostra diferentes cálculos. Sempre os convido para mostrarem no quadro qual foi o “caminho” 40 escolhido. (Beatriz, set/2006) Esse desafio foi aplicado após o trabalho com frações, e ela deixou claro como gosta dessa estratégia de trabalho e como valoriza o raciocínio dos alunos. Observamos que ela transmite para seus alunos, por meio de suas atitudes em sala de aula, a importância ou a facilidade em trabalhar com raciocínio lógico, atividade que ela acha importante e gosta. 40 A partir desse momento estamos colocando falas das próprias professoras. Para diferenciá-las das citações de outros autores, colocamos um recuo de um centímetro de ambos os lados e utilizamos as letras em itálico. Ao início dos diálogos ou ao final de cada fala colocamos o nome da professora e a data das afirmações. 183 Quando estamos trabalhando com resolução de problemas, devemos tomar cuidado com as atividades denominadas „problemas‟ que, na verdade, não o são. Os autores do livro „Aprender Pensando‟ colocam esses tipos de atividades como exercícios tipo papagaio (Carraher, 1986/1983, p. 14). Tal problema somente exige dos alunos que eles sejam capazes de repetir o que o professor acabou de ensinar, entretanto, reconhecemos que essas atividades representam, algumas vezes, a maior parte de nossos exercícios. Muitas vezes, tratamos como problemas o que os alunos nem precisam pensar sobre, apenas retomam os valores e fazem a operação que acabou de ser ensinada. Não afirmamos que eles não sejam necessários, porém, temos convicção que eles não podem ser os únicos tipos de problemas oferecidos aos nossos alunos. Passamos a relatar um exemplo da inter-relação entre aulas observadas e as discussões que foram provocadas no grupo a partir dessa situação. Na aula do dia 16/mai/08, presenciamos uma situação em que a professora apresentou um “verdadeiro problema” para os alunos. Deduzimos que fosse um problema, pois os alunos precisaram levantar conjecturas, buscar alternativas de resolução e não resolveram, de imediato, gerando uma discussão interessante em sala de aula, tanto no sentido professoras X alunos como alunos X alunos, realçando bem as mediações que Vygotsky (1988) comenta em seu trabalho. O problema era o seguinte: Figura 8 – Retirado de uma folha xerocada trabalhada pela professora em 16/05/08 184 Fonte: Folha xerografada pela professora, não possuímos origem dessa atividade. Somente o aluno A conseguiu resolver o problema que tinha ficado para casa como atividade. Com essa informação, a professora não deixou que ele apresentasse sua solução para a turma durante a correção, antes de dar um tempo para os outros resolverem. Foi interessante perceber como alguns alunos, com nossa ajuda, e algumas dicas, conseguiram reorganizar suas estratégias e chegar bem próximo ao resultado do problema. Beatriz pediu que eles desenhassem a estrada e os telefones no caderno para verem se isso os ajudaria a pensar. Nesse caso, os alunos teriam que ir além do que haviam estudado, eles não podiam apenas fazer uma divisão, tinham que pensar nas condições impostas pelo problema, o que foi mesmo para os alunos um “problema”, porque precisavam pensar, relacionar as informações e desenvolver uma estratégia com base no que já haviam estudado, mas somente isso não bastava. A maioria dos alunos não só iniciou com a divisão 630 por 14, como chegou também à resposta 45 km, mas lia a informação que estava evidenciada no desenho, juntamente com o problema e parava de resolver. Quando a professora pediu para que eles desenhassem, eles viram quantos espaços havia na estrada, que deveriam ser iguais: Telefones 1 0 km 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 630 km Algumas das perguntas que lhes fazíamos eram: O que você quer dividir: os telefones ou a estrada? Em quantas partes devemos dividir a estrada? O que você terá que fazer? O que o seu desenho está mostrando? A partir dos questionamentos eles chegaram à conclusão de que deveriam dividir a estrada em 15 parte iguais e não 14, como haviam pensado anteriormente. A divisão não se referia ao número de telefones, mas sim aos espaços que ficariam entre 185 os telefones, e assim eram 15 espaços, logo a divisão deveria ser por 15 e não por 14. Dividindo 630 por 15 encontravam 42 e terminavam o cálculo. Depois, no momento da correção, a professora mostrou que eles, exceto o aluno A, não tinham respondido à pergunta do problema. E concluiu com eles que deveriam localizar em que quilômetro estava localizado cada telefone, chegando ao resultado do problema. Notamos que alguns alunos queriam colocar a solução 42 como resposta, pois acreditavam que os problemas tivessem uma única solução a ser destacada. No caso, eles estão vivenciando o que comentamos, anteriormente, sobre os problemas com uma só solução. A situação foi uma das muitas que conseguimos presenciar sobre a interação da professora com seus alunos. E observamos que a professora em diferentes momentos deu mais atenção aos processos de resolução de cada aluno, tentando levá-los a ampliar suas análises sobre os problemas e a experimentar caminhos alternativos na busca de estratégias para a resolução de problemas. A atitude da professora Beatriz foi contra ao que apontam Gonçalez e Brito (2005), ao afirmarem que: Em muitas salas de aula, é observado que apenas as respostas certas dos alunos são aquelas passiveis de recompensa, sendo dada pouca ou nenhuma atenção aos diferentes procedimentos que o estudante usa para resolver um problema. Ocorrendo situações como essa, o ensino pode apresentar um desvio, pois é enfatizado apenas o produto final e não o processo. Embora a resposta final correta seja desejável, o excesso de cobranças e punição quando ocorrem as respostas erradas acabam gerando atitudes negativas e alta ansiedade durante as provas e exames (GONÇALEZ; BRITO, 2005, p. 224). Após discutirmos com a coorientadora sobre a aula, ela nos indicou alguns caminhos que utilizamos para reforçar as discussões no grupo de estudos. Pedimos para ela comentar a aula num grupo de estudos (dia 19/maio/08), e isso gerou discussões enriquecedoras em torno do trabalho com resolução de problemas e sobre como enunciados de problemas podem levar a diferentes interpretações. Nós utilizamos esse tipo de estratégia a fim de provocar as professoras para narrarem suas experiências durante, contribuindo para 186 discussões e reflexões das situações vivenciadas e adquirindo aprendizagem por experiências, dando maior significado ao que foi vivido em sala de aula. No encontro, pedimos que cada participante reescrevesse o problema do telefone com outros valores, modificando algumas informações e/ou perguntas. A seguir, apresentamos os problemas que elaboramos e algumas discussões que fizemos sobre as novas propostas. Essas discussões representaram aprendizagens de conhecimento pedagógico matemático e conhecimento matemático pelas participantes. A primeira proposta de reescrita do problema do telefone apresentada pela professora Beatriz foi a seguinte: Numa estrada há 5 telefones distribuídos em distâncias iguais. Se a estrada tem 125 quilômetros qual é a distância entre os telefones? (Beatriz, 19/mai/08) Levantamos alguns questionamentos: Será que está claro o que significa telefones distribuídos em distâncias iguais? A estrada começa com um telefone (km zero) ou este é colocado num ponto posterior ao início da estrada? As distâncias são iguais apenas entre eles ou em relação ao início e ao fim da estrada, também temos que analisar? Se colocássemos um desenho ficaria mais claro para o leitor do problema? Conversamos um pouco sobre os questionamentos e, ao longo de nossas discussões, a professora Beatriz reformulou seu problema, pensando em facilitar o entendimento de quem o ler. Com as modificações, o problema de Beatriz ficou da seguinte forma: Numa estrada há 5 telefones distribuídos em distâncias iguais. Se a estrada tem 125 km determine: a) Qual é a distância entre os telefones? b) Se o primeiro telefone estiver no início da estrada, em quais quilômetros estarão os outros? (Beatriz, 19/mai/08) Ela não gostou da sua reescrita do problema e acreditava que o poderia melhorar, para ficar mais compreensível. Com questionamentos apresentados e outros argumentos, concluímos que nem sempre é fácil elaborar problemas 187 ou reescrever um que já temos. Pedimos às outras professoras que também apresentassem suas reescritas. O problema da professora Susana ficou da seguinte forma: Numa estrada de 500 km há 10 telefones de socorro. As distâncias entre eles são iguais. Em que quilômetros estes telefones estão localizados sabendo que eles começam no quilômetro 10? (Susana, 19/mai/08) Foram interessantes os comentários da professora, pois ela apresentou o problema e já iniciou uma explicação de como ela resolveria. Susana disse que colocou 10 telefones para a conta ficar mais fácil, pois 500 divididos por 10 é igual a 50. Reiniciamos a discussão quanto aos números de telefones ou dos espaços entre eles. Solicitamos à Susana que nos respondesse como tinha pensado, ela exemplificou com um desenho semelhante ao reproduzido a seguir. A nosso pedido, a professora Susana desenhou a estrada e marcou os 500 km (traços na parte superior do desenho) e depois foi colocando os telefones a partir do km 10 e distribuiu-os de 50 em 50 km (traços mais grossos abaixo da linha horizontal). 0 50 10 100 60 110 150 160 200 250 210 300 350 400 450 260 310 360 410 500 km 460 Na fala da professora Susana ela queria que o último telefone ficasse no fim da estrada, mas não foi isso que ocorreu. Então ela acrescentou a sua explicação: sobraram 40 km, logo 40 dividido por 10 é igual a 4, basta acrescentar 4 em cada distância entre os telefones. Levantamos outros questionamentos: Essa é uma solução para o problema da forma como ele está escrito? O problema possui outras soluções? Se a resposta for afirmativa, quais? Temos que colocar mais alguma informação ao problema para que sua compreensão seja a obtenção de uma única solução? Precisamos sempre de problemas com uma única solução? Discutimos algumas dessas colocações e questionamentos e percebemos que ao resolvermos problemas, queremos chegar a uma resposta única. Será que isto é sempre possível? É necessário? Entendemos que não, pois, podemos trabalhar com problemas que envolvam mais de uma solução, ou que não tenha solução. Devemos desmistificar algumas crenças e 188 concepções em relação à resolução de problemas. Depois dessa discussão ficou claro o porquê da frase do problema: “E também são iguais as distâncias entre o começo da estrada e o primeiro telefone e do último telefone até o fim da estrada.” Os problemas apresentados pelas professoras Sandra e Lucia são os seguintes: Numa estrada de 180 km gostaria de colocar telefones a cada 30 km, sendo que o primeiro fica no início da estrada e o último no fim da estrada. Quantos telefones terão neste trecho de estrada? (Sandra, 19/mai/08) Numa estrada de 630 km, há 11 telefones de socorro. As distâncias entre os telefones são iguais. Sabendo que no início e no fim da estrada há telefone e que no percurso todo, a distância entre um telefone e outro é a mesma, em que quilômetros da estrada estão os 11 telefones? Qual a distância de um telefone para o outro? (Lucia, 19/mai/08) Conversamos sobre algo bastante comentado conosco pela professora Vânia: a diferença entre as diversas maneiras de reescrever um problema e as dificuldades que podem surgir dos diferentes níveis de organização mental necessária à reelaboração dos problemas; e inventar problemas nem sempre é tarefa fácil, mas muitas vezes não temos consciência disso. O resultado foi que cada professora pensou diferente, uma tentou modificar alguns indicativos (profª Lucia), outra tentou modificar a pergunta (profª Sandra) e as outras modificaram as quantidades e alguns indicativos (profª Beatriz e Susana). Foi um exemplo de experiências vividas em sala de aula, com resolução de problemas, que contribuíram para nossas discussões no grupo de estudos. Com exemplos desse tipo, sentimos a riqueza e amplitude de discussões que podem gerar situações vivenciadas em sala de aula. e como podem contribuir para a construção de aprendizagens sobre conhecimentos pedagógicos matemáticos e sobre o ensino e aprendizagem de matemática. Na nossa pesquisa, vivenciamos essas práticas e discussões para ajudar as professoras a refletirem sobre suas práticas com resolução de problemas. Realizando, assim, um trabalho mais produtivo com a formação de professores conforme foi apontado por Chapman (1997) ao afirmar que : 189 Nós precisamos compreender o conhecimento do professor e o significado pessoal de uma perspectiva mais ampla se nós quisermos aprender deles para ser capazes de trabalhar com professores mais eficientemente, particularmente em situações onde é necessário ajudá-los a construir e/ou reconstruir as experiências pessoais deles para aperfeiçoar e/ou mudar o ensino deles para refletir, por exemplo, recomendações de reformas atuais. Logo, com uma contribuição desta situação o intento é sugerir uma possível interpretação holística de uma perspectiva do professor de ensino de resolução de problemas e criar consciência do potencial desta interpretação como uma base de pesquisas subseqüentes e programas de desenvolvimento do professor sobre o ensino de resolução de 41 problemas (CHAPMAN, 1997, p. 204) (tradução nossa). Para entender nossa aprendizagem sobre avaliação e sua relação com o ensino e aprendizagem de matemática colocamos o relato que segue. Beatriz planejou um trabalho em sala de aula um dia após uma avaliação, em março de 2008. É interessante destacar como atitudes utilizadas pela professora, tais como, caminhar entre as carteiras, observando os trabalhos dos alunos e dialogar com eles sobre o que registraram, puderam levá-la a uma reflexão que influenciou na sua prática. Após observar durante a avaliação como seus alunos da 4ª série (5º ano) resolviam um problema de divisão, com resto não nulo e pensar sobre os questionamentos e comentários que aconteceram, a professora Beatriz decidiu que precisaria retomar problemas que alguns alunos tiveram dificuldades. Por isso, a professora iniciou uma das aulas observadas, explicando que estava abordando, novamente, o assunto por causa da prova realizada no dia anterior, onde tinha percebido que alguns não haviam conseguido resolver uma das questões propostas. Disse também que acreditava ter isso ocorrido pelo fato de alguns alunos não prestarem atenção no enunciado e por quererem resolver os problemas apenas mecanicamente. O problema da prova, que gerou essa reflexão e atitude por parte da professora, possui algumas particularidades em sua interpretação. Na escrita do problema, apenas uma das informações para sua resolução estava 41 We need to understand the teacher‟s knowledge and personal meaning from a broader perspective if we are to learn from them to be able to work with teachers more effectively, particularly in situations where it is necessary to help them to construct and/or reconstruct their personal experiences to enhance and/or change their teaching to reflect, for example, current reform recommendations. Thus, as a contribution to this situation, the intent of this paper is to suggest a possible holistic interpretation of teacher‟s perspective of teaching problem solving and to create awareness of the potential of this interpretation as a basis of further research and teacher development programs on teaching problem solving (CHAPMAN, 1997, p. 204). 190 presente, a outra deveria ser identificada na ilustração, conforme podemos observar a partir da foto seguinte: Ele deveria que dividir as crianças e grupos de 14 crianças, ele ia separar mais o que sobrou 8 crianças. Ele deverá fazer 15 viagens. A solução do problema consiste numa divisão com resto não nulo. Como os alunos procuraram resolver, utilizando apenas o algoritmo da divisão, alguns tiveram dificuldades para determinar o que aconteceria com o resto. Segundo o depoimento da professora, ela formulou algumas perguntas no momento da avaliação para que as crianças fossem levadas a pensar sobre o problema. Algumas das perguntas foram as seguintes: “todas as crianças irão? (era um passeio)”; “não ficou nenhuma criança para trás?”; “Se você fosse o motorista o que você faria?” Algumas crianças conseguiram resolver a questão, mas apareceram as mais variadas respostas em relação ao resto como, por exemplo: “um pai foi levar as crianças que sobraram”; “tiveram que voltar para casa”; “coloca um a mais no último banco porque só tem dois alunos”. Mas mesmo assim, alguns alunos não conseguiram resolver corretamente a questão e ignoraram o resto da divisão. A partir da comprovação desse fato pela professora, ela decidiu que deveria abordar novos problemas dessa natureza para levantar alguns questionamentos com os alunos e ajudá-los a interpretar e resolver problemas de divisão com resto não nulo. Nessa situação ao tentarem apenas utilizar o algoritmo da divisão algumas crianças se desligaram do contexto da situação e apenas se preocuparam em resolver a operação. Reparamos que o caso é bem diferente do que relatamos na primeira situação, em maio de 2007, quando as mesmas crianças resolveram os problemas de divisão, usando diferentes procedimentos e relacionando sempre com o contexto proposto em cada problema. 191 Para a professora, esse tipo de problema era simples e os alunos não teriam empecilhos ao resolvê-los; ela se impressionou com as respostas e as dúvidas dos alunos, pois não entendia porque eles tinham tanta dificuldade em analisar o resto. Esse fato contribuiu para seu aprendizado em relação ao conhecimento dos alunos. Ela acreditava, como muitos professores, que ao ensinar problemas de divisão, os alunos já saberiam quando tinham que analisar o resto e quando não era necessário. Isso é identificado em pesquisas sobre resolução de problemas de divisão, Saiz (1996) comenta na conclusão de uma pesquisa dessa natureza que: As crianças carecem de recursos para reconhecer se sua solução é errada ou não. Na realidade, não chegam a analisar se o número obtido é o resultado do problema. O quociente obtido pela aplicação do algoritmo nem sempre coincide com o número procurado: a partir dele é necessário proceder a uma escolha levando em conta o problema concreto por resolver (SAIZ, 1996, p. 170). Nessa aula, a professora colocou o seguinte no quadro: Copie, pense e resolva: Em uma excursão, uma escola precisa levar 467 alunos. Ela contratou um ônibus que pode levar até 40 crianças. a) Quantas viagens deverão fazer para levar todas as crianças, sabendo que, no máximo, só poderá levar 1 a mais? b) E se fossem 2 ônibus? c) Você acha que isso seria possível? Por quê? Ela nos explicou que pensou num problema similar ao da prova, mas com uma dificuldade maior, já que poderia ter um tempo maior para discuti-lo com os alunos, em sala de aula. Por esse motivo, ela colocou números maiores, tanto no total de alunos como em cada parte a ser levada pelo ônibus, e colocou ainda a questão que poderia levar uma criança a mais em cada viagem. É interessante destacar as diferentes formas de intervenção utilizada pela professora para instigar os alunos a pensar e de fato refletir sobre o problema. Depois de dar um tempo para cada um copiar no caderno e pensar em que estratégias usariam, ela pediu para que os alunos lessem com os olhos acompanhando sua indicação com o dedo no quadro. Ela também pediu para que alguns alunos comentassem com suas palavras o que tinham entendido. É uma estratégia bastante utilizada pela professora na resolução de problemas, 192 principalmente com os alunos que possuem dificuldades. Logo depois, ela iniciou alguns questionamentos: vamos pensar do jeito que deveria ser na realidade... Primeiro o ônibus leva 40 crianças, depois mais 40... e assim vai... Que conta é essa que vamos fazendo grupinhos? Alguns alunos responderam que seria a divisão. Outros falaram que o ônibus poderia levar 40 ou 41 crianças, mas um deles disse que não fazia diferença, pois o número de viagens seria o mesmo. Como desdobramento da conversa coletiva, alguns alunos conseguiam resolver o problema, mas ainda não conseguiam entender a importância de se analisar o resto. Por isso, a professora Beatriz colocou, oralmente, outra questão para tentar esclarecer o tópico. A questão era a seguinte: imaginem se eu tivesse 59 balas em meu armário (eu não tenho), mas se eu tivesse e quisesse distribuir entre os meus 26 alunos presentes hoje... Eu vou dar 2 balas para cada um e sobram 7 balas. O que posso fazer com estas balas? Sortear, guardar, ficar para mim... mas as balas existem, não posso esquecê-las. A professora esperava que, com o exemplo, os alunos conseguissem resolver o problema inicial, pensando no resto. Depois dessa orientação, ela pediu para que alguns alunos fossem ao quadro mostrar como tinham resolvido, explicando sua solução. A professora Beatriz trabalha dessa maneira e consegue fazer com que os alunos valorizem suas diferentes formas de resolução e saibam argumentar sobre o quê e como fizeram. Em alguns momentos, os alunos não conseguem explicar direito o porquê, fazem de determinado jeito e outros colegas ajudam, tentando explicar as soluções. Identificamos no caso do aluno G, que apresentou a seguinte resposta: 467 |40 -40 11 067 - 40 27 27 - 11 16 R: 12 viagens. A professora questionou-o sobre a operação 27–11, porém ele não soube responder por que tinha feito assim e a que resultado tinha chegado. A aluna C explicou que essa subtração era se acontecesse do motorista levar 1 criança a mais em cada viagem, já que sobraram 27 alunos e o motorista já tinha feito 11 193 viagens, mas que não adiantaria, pois ainda sobrariam 16 alunos. Assim sendo, ainda precisaria fazer mais uma viagem, totalizando 12 viagens em qualquer uma das situações, levando 40 ou 41 crianças. Outros alunos realizaram as duas divisões, por 40 e por 41, verificando que sobrariam crianças em ambas, sendo necessárias 12 viagens. Outra atitude da professora a qual valorizamos e queremos destacar foi a aplicação numa prova posterior a esse episódio, de outro problema que envolvia a ideia de análise do resto de um problema de divisão. A professora consegue avaliar se sua estratégia de retomar os problemas não solucionados pela maioria dos alunos foi adequada. Porém, ela conseguiu na nova versão pedir para eles representarem por escrito suas ideias de solução. Foi outra estratégia metodológica discutida nos encontros do grupo. Colocamos, abaixo, a questão da prova e uma resposta de um aluno selecionado. Questão 7 da prova de maio/08 Figura 9 – Exemplo de questão da prova de Beatriz que envolve escrita – aluno A Resposta deste aluno: “Irá 23 crianças sentadas e + 5 crianças espremidas e no outro ônibus irá 23 crianças sentadas e + 6 crianças espremidas” A professora, novamente, apresenta em sua prova um problema, como o trabalhado, no qual os alunos deveriam identificar o que seria feito com o resto. As nossas discussões nos grupos fizeram com que ela refletisse sobre como desenvolver e analisar o mesmo raciocínio em diferentes momentos de sua aula de matemática. Outro fato que podemos abordar foi o de alguns alunos terem inventados problemas de divisão com resto com a ideia de passeio e ônibus que deveriam 194 separar. Ideias parecidas com as trabalhadas em sala de aula, normalmente, acontece quando pedimos aos alunos para inventarem problemas. Figura 10 – Questão da prova sobre elaboração de problemas – resposta aluno C 54 alunos vão a um parque. A escola alugou um ônibus que tem capacidade para 32 alunos. Quantas viagens o ônibus terá que fazer? Vão sobrar alunos? Quantos? R: O ônibus vai fazer 2 viagens. Na segunda irá levar os 22 alunos que sobraram. Trabalhar com diferentes representações, também, foi uma abordagem da professora Beatriz. Ela valorizava sempre as diferentes formas de soluções dos alunos e encorajava-os a buscar outras formas de representar ou que analisassem como os colegas haviam respondido. Por considerar que essa forma seja adequada para se trabalhar com alunos é que concordamos com Nunes et al. (2005), quando afirmam que [...] os professores precisam encontrar maneiras com que os alunos registrem suas estratégias de resolução de problemas para que elas possam ser discutidas, validadas e comparadas entre si. A explicação do raciocínio ajuda o aluno a compreender melhor suas próprias estratégias e ajuda o professor na tarefa de oferecer feedback e propor situações que levem o aluno a novas formas de abordar o problema (NUNES et al., 2005, p. 68). Muitas atividades realizadas com os alunos de Beatriz contribuíram para reforçar essa afirmação de Nunes et al. (2005). Nossa aprendizagem do conhecimento pedagógico matemático foi reforçando cada vez mais com tais situações. Essa situação levou-nos a apresentar um artigo no 2º Seminário Internacional de Pesquisa em Educação Matemática – 2º SIPEMAT/2008 (SILVA; SANTOS-WAGNER, 2008). 195 Resolução de problemas em aulas de Susana A professora Susana, desde os encontros iniciais explicitou, por meio de suas falas, seu „bloqueio‟ com a divisão. Em um de seus relatos sobre suas memórias (seção 5.1), enquanto aluna de matemática, ela afirmou que teve dificuldades em aprender a dividir. O episódio da sua vida escolar interfere na sua prática de sala de aula, e transparece em certas atitudes de Susana. Por exemplo, em uma aula de Susana (13/ago/07), a professora Sandra inventou alguns probleminhas de adivinhações para os alunos, conforme tinham comentado no grupo, na semana anterior. As adivinhações eram as seguintes: a) Sou um número par maior que 120 e menor que 130. A soma dos meus algarismos é 11. Que número eu sou? b) Sou um número impar menor que 200. Meu algarismo da dezena é 3 e a soma dos meus algarismos é 9. Que número eu sou? c) Sou um número ímpar. Estou entre 40 e 50. Sou divisível por 3. Qual número eu sou? No encontro do grupo de estudos, a professora Susana comentou sobre essa atividade e disse que a professora Sandra „pegou pesado‟ com a última adivinhação. Susana falou com a outra participante: “O último problema foi mais difícil, pois eu não gosto de divisão”. Nesse momento, a professora Sandra interveio e perguntou se ela tinha percebido o que havia feito em sala de aula. A professora Susana não percebeu que disse aos seus alunos: "Agora prestem atenção, pois chegou a parte mais difícil da minha aula." (Susana, 13/ago/07). Ela não percebia, mas em algumas de suas afirmações em sala de aula deixava transparecer sua concepção de que divisão é difícil, possivelmente influenciando as concepções de seus alunos em relação à divisão. A professora Susana analisou sua colocação e disse que prestaria mais atenção às suas afirmações em sala de aula. Apresentamos, a seguir, um exemplo de nossas análises iniciais e discussões no grupo de estudos sobre um acontecimento ocorrido na sala de aula da professora Susana no dia 03/mar/08. Tentamos revelar nossas primeiras 196 análises a partir da descrição da aula na qual a professora dava continuidade ao trabalho realizado com a “oficina do material escolar”. Susana aproveitou algumas situações e alguns problemas, envolvendo as quatro operações, inventados por seus alunos para abordar conceitos matemáticos sobre números, que ela julgou necessários e pertinentes para a compreensão dos números decimais e suas operações. Em nossas análises iniciais, sentimos necessidade de estarmos desenvolvendo discussões mais aprofundadas no grupo de estudos sobre a multiplicação pelo número 10 e sobre a representação decimal. Destarte, no encontro do grupo do dia 03/mar/08, mesmo dia da observação da aula, voltamos a questionar sobre esses assuntos. Nossa proposta era de levantar questionamentos para provocar a reflexão crítica, uma reflexão sobre a ação (SCHÖN, 2000) e conseguir entender os procedimentos adotados pela professora ao desenvolver a atividade. Durante a aula de matemática citada, ocorreu um fato que nos chamou a atenção. A professora Susana propôs o seguinte problema para seus alunos: Anny Gabrieli comprou na papelaria 2 cadernos de R$ 2,00 cada, 1 cx de lápis de cor por 2,00, estojo de canetinhas pelo mesmo preço, apontador e borracha por 1,00 cada, 1 régua por 1,50 e lápis por 50,00. Como você faria uma tabela disso? No momento da aula, ficamos em dúvida sobre o motivo que levou a professora Susana a colocar o preço do lápis como R$ 50,00. Em outro momento, ela comentou que colocou, de propósito, o valor de 50,00 para o lápis, pois havia utilizado alguns dados apresentados por seus alunos, em outra atividade. Na ocasião, a professora Susana notou que uma de suas alunas havia colocado o valor de R$ 50,00 para o lápis e decidiu utilizar nesse problema para levantar os questionamentos sobre a lógica do preço e da escrita. Ela compreendeu, durante o desenvolvimento da atividade anterior, que oralmente sua aluna tinha falado cinquenta centavos, mas tinha escrito cinquenta reais (50,00). Utilizar essa forma de escrita num problema seria uma situação provocadora e interessante, para levantar algumas discussões com seus alunos. 197 Durante a aula, quando os alunos começaram a ler e copiar o problema proposto pela professora também começaram a questionar o valor do lápis, comentando inclusive que somente um lápis de ouro poderia custar aquele valor. A aluna, que tinha escrito isso na tarefa, explicou que ela queria ter escrito 50 centavos e não 50 reais. A professora Susana aproveitou a situação para questionar seus alunos sobre como deveriam escrever 50 centavos. Algumas propostas foram colocadas por eles, dentre as respostas, destacamos a do aluno que disse que deveria ser 00,50. Nesse momento, a professora perguntou se haveria necessidade de escrever dois zeros antes da vírgula. Outro aluno observou que o zero deveria ser colocado após o 50 ficando 0,500. Logo, a professora Susana iniciou alguns questionamentos sobre a fala do aluno: “colocar outro zero depois do 0,50?”. Ela comentou que ficariam 500 centavos, o que assustou alguns alunos que perguntaram se com 500 centavos daria para comprar alguma coisa. A explicação dada pela professora foi que 500 centavos correspondem a 5 reais, logo dava para comprar alguma coisa. Além disso, ela afirmou que 500 centavos poderiam ser pensados como 500 moedas de 1 centavo. Assentou também que 1 centavo corresponde a 1 centésimo de 1 real, isto é, poderíamos repartir 1 real em 100 pedaços e 1 desses representa 1 centavo. Foi interessante acompanhar o pensamento da professora, a partir dos 500 centavos e como ela conseguiu articular alguns conteúdos na abordagem. Ficamos incomodados com a escrita dos 500 centavos, que não foi abordada pela professora, sabíamos que 0,500 não representa o valor de 500 centavos. Por causa dessa inquietação, no encontro do grupo de estudos, aproveitamos a oportunidade para conversar, discutir e verificar sua justificativa e sua explicação para o fato de que não estava bem explicado: se 0,500 corresponde a 500 centavos. Seguindo a proposta de trabalho do grupo nesse mesmo dia (03/mar/08), começamos alguma discussão comentando com os demais participantes, os acontecimentos ocorridos durante as aulas. Então, a professora Susana repetiu seu pensamento em relação à representação dos 500 centavos. Aproveitamos 198 para levantar alguns questionamentos e perguntamos à professora, pois pensava que 0,500 significava 500 centavos. Ela respondeu que era porque tinha acrescentado um zero e mostrou outro exemplo de que 0,10 se transformaria em 100 centavos. Para a explicação, ela realizou a seguinte multiplicação: 0,10 10 logo, 100 centavos; 0,100 Na ideia da professora Susana, acrescentar um zero ao final de um número é o mesmo que multiplicar por 10, tanto que ela fez a multiplicação por 10 quando queria nos mostrar que 0,10 acrescido de um zero ao final, ficando 0,100 seriam os 100 centavos. Discutimos sobre a sua multiplicação e o valor da vírgula, ela sabia que dava 1 real (1,00) mas não tinha conseguido observar isso na sua operação. Assim fomos desconstruindo algumas crenças e percepções da professora sobre a escrita de números decimais e sobre a multiplicação de um número por 10. Pedimos para a professora Susana que escrevesse cinco centavos. A princípio ela escreveu 0,5 e logo percebeu sozinha que essa representação correspondia a 50 centavos e não a 5 centavos. Após, ela mesma escreveu corretamente 5 centavos = 0,05. Aproveitamos para conversar sobre os milésimos que, em algumas ocasiões, aparecem na nossa vida, como por exemplo, nos postos de gasolina que utilizam os milésimos para o preço dos combustíveis (ex.: 2,599) ou em competições esportivas como na natação que a diferença entre os competidores é de milésimos de segundo. Também discutimos, a partir desse evento, questões relacionadas aos decimais: leitura de números decimais, correspondência de valores (ex.: 3,02 = três unidades de real e 2 centavos, que por sua vez era igual a 302 centavos), multiplicação de um número por 10, acréscimo de zeros em um número decimal, dentre outras coisas relacionadas ao nosso sistema monetário. E conseguimos ajudar a professora Susana a (re) construir alguns conceitos sobre esses assuntos. Nossas aprendizagens sobre os conhecimentos matemáticos estavam sendo 199 construídas, além das relacionadas as avaliações sobre as aprendizagens dos alunos. É importante destacar como se faz necessário estarmos observando algumas regras que são apresentadas nas escolas, no caso, a multiplicação de um número por 10, 100 ou 1000. Normalmente, apresentamos uma regra prática com a qual afirmamos que, nesses tipos de multiplicações, apenas devemos acrescentar zero(s), um, dois ou três (dependendo da multiplicação) ao final da escrita do número. Em que situações isso é verdade? O que significa acrescentar zeros? Será que nós, professores de matemática, formadores de professores estamos dando atenção devida a esse tipo de colocação? Será que acreditamos que isto é algo simples e que não precisa ser explicado? São perguntas que nos levaram a refletir. O pensamento da professora sobre o acréscimo de zeros não estava errado, se estivéssemos trabalhando com números inteiros, mas reconhecemos que ela conhecia a regra, mas não sabia em quais situações poderia utilizar. Naquele encontro e, posteriormente, acreditamos que ocorreu (re) significação do conteúdo matemático e da forma como trabalhamos o assunto em sala de aula para as participantes. A professora Vânia ligou para a casa da professora Lucia, durante esse encontro, e conversou conosco sobre algumas das questões relacionadas ao assunto. Em suas falas posteriores, a professora Susana disse ter entendido que a regra prática de acrescentar zeros à direita devia ser analisada melhor. Disse, também, que percebeu que em números decimais acrescentar zeros não significa mudar de valor, na verdade seria somente escrever a mesma coisa de diferente forma. E que, principalmente, os números decimais precisam ser tratados com mais cuidado, coisa que ela ainda não se tinha preocupado. As professoras Lucia, Vânia e Sandra aprenderam que algumas regras simples podem confundir quem não entende seu funcionamento, ou não presta atenção às restrições da regra, ou ainda não percebem a relação existente entre a matemática e a língua materna. Entenderam que acrescentar zeros possui 200 significados diferentes nos diferentes contextos. Além disso, nós concluímos que algumas pessoas não possuem clareza do trabalho com números decimais e que a forma como ensinamos determinados assuntos aos alunos podem influenciar o entendimento deles em relação ao conteúdo. Até mesmo levar-nos ao erro, caso realizamos afirmações, em particular de regras ditas „práticas‟, sem o devido cuidado. A professora Vânia nos chamou atenção para a necessidade de relacionarmos os significados matemáticos associados aos significados da língua materna. O episódio nos mostra como foram ricas as discussões no grupo de estudos de situações que aconteciam em sala de aula. Aprendemos umas com as outras que o processo de pensamento e desenvolvimento de determinadas operações é muito mais complexo do que pensamos. Refletir sobre situações práticas, em aulas de outros professores, proporcionou-nos ampla reflexão crítica sobre o fato ocorrido e sobre nós mesmas enquanto professoras e aprendizes. Um fato ocorrido no final de 2008 nos chamou a atenção a situação que relatamos. Em um momento de reflexão sobre nossas aprendizagens ao longo desses dois anos e quatro meses de participação no grupo de estudo, a professora Susana lembrou-se dos 500 centavos. Começou a questionar outras situações e confessou que não tinha compreendido, totalmente, a multiplicação com números decimais. Susana afirmou que compreendeu que 500 centavos representavam 5 reais, mas que ainda não tinha entendido, completamente, sobre o assunto. Iniciamos uma discussão e fomos provocando a professora Susana para que pudesse (re) construir e aproveitar as ideias estruturadas sobre operações com números naturais, para construir ideias de operações com números decimais. Concluímos que, numa formação continuada, é importante dar voz ao professor e retomar questões discutidas anteriormente. Portanto, acreditamos numa formação em que os professores se sintam parceiros e „amigos críticos‟. Onde não é vergonha dentro do grupo profissional fazer perguntas sobre alguns conhecimentos matemáticos, relações sobre diferentes conhecimentos matemáticos e sobre conhecimento pedagógico matemático. Somente, assim, é que terão liberdade para exporem suas dúvidas da forma como aconteceu com nosso grupo. Mostramos que estamos 201 trabalhando na perspectiva de formação junto com as professoras (SANTOSWAGNER, 2003; LLINARES e KRAINER, 2006), conforme tínhamos proposto. 5.2.2 Geometria A geometria esteve presente em muitas discussões e também organizamos muitos estudos sobre o tema (BROITMAN; ITZCOVICH, 2007; CLEMENTS; BATTISTA, 1992; FRAGA, 2004; NACARATO; PASSOS, 2003; PAVANELLO, 2004). As pesquisas demonstram que professores, por não terem aprendido geometria enquanto estudantes, possuem, certa insegurança, ao lidar com o assunto em sala de aula (PAVANELLO, 2004). As professoras Susana e Beatriz não tinham estudado geometria enquanto aprendizes. A professora Beatriz por ter feito ensino fundamental a distância, e Susana por ter visto superficialmente, em sua formação básica, porém não lembra muita coisa. Comentamos que Sandra e Lúcia influenciaram debates e estudos sobre geometria. Exemplificaremos isso, colocando na primeira parte desta seção algumas das discussões ocorridas no grupo de estudos. Depois, descreveremos parte da repercussão nas aulas de matemática das professoras Beatriz e Susana. A geometria nos encontros do grupo de estudos Desde o inicio dos encontros, entendemos que as professoras comentavam muito sobre resolução de problemas e as quatro operações fundamentais, mas falavam pouco em geometria. Isso fato confirma nossa afirmação acerca de suas crenças iniciais sobre matemática, na qual a geometria estava ausente. 202 Como professora e pessoa que gosta muito de geometria me sentia incomodada com essa ausência da geometria nos nossos debates. Em 2007, no 6º encontro (19/mar/07), tivemos algumas discussões iniciais sobre a geometria e por que ela não estava presente nas aulas de matemática de alguns professores, inclusive nas aulas de Beatriz e Susana. O diálogo, a seguir, foi realizado após discussão sobre „o que é matemática para você?‟42. Depois de algumas discussões, provocamos questionamentos sobre por que a geometria não aparecia em algumas de nossas definições sobre a matemática, foi o momento inicial de discussões aprofundadas sobre a ausência da geometria nos debates do grupo de estudos. Eu: [...] Mas a gente ou vocês sentiram falta de alguma coisa, quando vocês colocaram aí? Susana: Faltou a comparação com outras, como base... Eu: Mais o que?... Uma coisa que nenhuma das duas colocou... Eu coloquei, mas de forma aberta, e foi de certa forma até bom. O que ainda não está claro na nossa definição de matemática... Você (Susana) falou em desafio, quebra cabeça, básico, porcentagem, decimais, problemas... o que não apareceu ainda? A Beatriz falou em quantias, quantidades, cálculo, mas o que não apareceu ainda? Susana: Falei em raciocínio lógico, geometria... Eu: Falou agora... Susana: Falei em geometria, tanto que eu não dava tempo de ensinar. (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) Realmente, a professora Susana tinha comentado que não ensinava geometria, pois não dava tempo. A falta de tempo foi o motivo por „abandonar‟ a geometria em suas aulas, confirmando outra visão de senso comum entre muitos professores, quando se referem à ausência de geometria das suas salas de aulas (FRAGA, 2004; LORENZATO, 1995; PEREZ, 1995). Não percebemos o comentário anterior dela sobre geometria, mas mesmo assim não reconhecíamos que em nossas definições aparecia a geometria explicitamente. Eu: Falou quando estava antes, mas na definição ninguém falou das formas, que é a ciência que nos ajuda a entender as formas. Eu apenas coloquei a questão da 42 Esse diálogo com as respostas a essa pergunta está na seção 5.1.1 203 beleza do mundo, eu coloquei assim: organizar e entender o mundo... Mas porque não está claro isso? Porque não está clara a geometria na nossa cabeça? Beatriz: Chegou aonde eu queria. Eu nunca trabalho muito a geometria. Susana: Num dá tempo,... Dá tempo Beatriz? Beatriz: [...] É coisa para pensar. O máximo que eu trabalho é o perímetro e área. Susana: Acabou, é isso... Eu nem isso trabalhei. (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) As professoras concordaram com a colocação sobre a ausência da geometria nos nossos comentários. Beatriz iniciou uma abertura, pois demonstrou que estava disposta a discutir sobre o assunto. Reconheceu que trabalhava o mínimo e citou apenas os conteúdos de perímetro e área como aqueles que são trabalhados por ela, em relação à geometria. Novamente, Susana falou sobre o tempo não permitir o trabalho com a geometria e reconheceu que nem os conteúdos de perímetro e área ela trabalhava em suas aulas de matemática. Continuando o diálogo, tivemos uma discussão de como poderíamos abordar geometria, juntamente, com outros conteúdos matemáticos. Eu: Mas as vezes, a gente acha que não dá para trabalhar, lembra aquele problema dos palitos, que é para fazer as continhas na seqüência e para ver quantos palitos vai gastar? Querendo ou não a geometria está por trás. Se você fizer de palito de fósforo. Susana: Eu sei, você tem que remover alguns palitinhos para formar tantos... Beatriz: Eu vi que estes dias a professora de artes ela estava trabalhando com eles formas de figuras, eu quero ver o que ela abordou para aproveitar, eu achei legal aquilo. (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) Essa atitude de predisposição em buscar alternativas para o que estava sendo discutido de forma a levar para a sala de aula da professora Beatriz foi bem comum durante o nosso estudo. A partir da ideia proposta, ela já pensava em caminhos para buscar alternativas de trabalhos. Isso pode ser visto na frase dela anteriormente, quando lembra o trabalho da professora de artes sobre as figuras, e como ela poderia aproveitar o início de abordagem da geometria. A postura da professora Susana era diferente, precisava se convencer de que estávamos propondo algo importante e que valia a pena ser trabalhado em sala de aula. Ela tinha que assimilar a importância da geometria para ela, 204 primeiramente, para depois levar a seus alunos alguma atividade, abordando esse conteúdo. Na continuidade do diálogo, após uma interrupção de outras conversas que apareceram, mostramos um pouco do porque escolhi estudar geometria no mestrado e das minhas análises sobre nossas atitudes, enquanto professores de matemática em relação à geometria. [...] Eu: A questão da geometria tem que... É uma coisa... Porque a gente diz que não dá tempo de trabalhar? Susana: dá sim... Eu: É porque a gente quer trabalhar separada. Susana: Exato, no contexto dá para trabalhar. É isso que eu ia falar. Eu: Mas a gente não aproveita o contexto. Quantas vezes que a gente não aproveita o contexto para trabalhar. Por exemplo: por que a gente não aproveita para trabalhar quanto estamos trabalhando frações? Da para trabalhar com tanta geometria... Por que não trabalhar outras coisas enquanto a gente trabalha com problema que envolva perímetro, pois eles têm que saber a definição de perímetro... E isso é uma coisa... Num é de vocês não. Pra mim também foi Mia difícil enxergar a geometria. Para mim hoje é mais fácil, porque eu me apaixonei por geometria. Tanto que minha dissertação é sobre geometria. Mas tem muita coisa legal de geometria que dá para trabalhar com os meninos quando estamos trabalhando com outras matérias. E quando a gente fala da definição de matemática isso me incomoda de tal maneira que, por exemplo: Porque eu estudei a geometria no meu mestrado? Um dos motivos é que meu aluno do ensino médio perguntou quando íamos estudar matemática novamente quando estávamos trabalhando geometria. Para ele geometria não era matemática. Mas na nossa definição, a gente não inclui geometria na matemática. E se a gente fala pro menino que matemática é só para fazer cálculo e contar, e não coloca a questão das formas. Nós estamos excluindo a geometria da matemática, continuamos a excluir. Susana: É porque a gente não explora isso... Beatriz: Bem lembrado, eu já tinha percebido no que eu faço. A gente não prioriza a geometria. Susana: Exatamente, falou bem, usou a palavra certa, a gente não prioriza. Ou então não sabe aproveitar o que tem do aluno. Desenho por exemplo, esse desenho aqui é o que: é um retângulo? É um quadrado? Por que é um quadrado? (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) Na minha fala ficou esclarecido o quanto concepções e crenças de um professor podem influenciar nas escolhas que faz sobre os conteúdos a serem 205 trabalhados, sobre o tempo gasto com cada atividade e como isso influencia sua prática em sala de aula (PONTE; CHAPMAN, 2006). A provocação gera diferentes reflexões por parte das professoras Susana e Beatriz. Por um lado, a professora Beatriz comentou que já tinha iniciado uma reflexão sobre o assunto, e chegou à conclusão que não priorizava a geometria em suas aulas de matemática. Por outro, a professora Susana concordou e começou a dar exemplos de como poderia aproveitar melhor o que já é trabalhado, para abordar alguns conceitos geométricos. Eu: Você quer ver, dá uma volta com ele pela escola para ele identificar a geometria, mais lugares que tem as diferentes formas. Isso é bom para eles perceberem. Isso aqui [codificação] é uma forma de olhar a geometria. Porque tem que ter o raciocínio visual. Ele tem que ver as formas, isso é um trabalho que envolve conceitos geométricos. É o que falo, a gente trabalha, mas nem sempre tem a noção que está trabalhando. E a gente tem que ter essa noção para poder chamar a atenção, porque [...] quando você trabalha estas formas com seus alunos e pedir para eles identificarem as diferenças eles começam a ter a percepção visual. A questão de desenhar o mapa é questão visual. Se eles não têm essa percepção fica mais difícil a geometria. [...] é legal também pedir para eles desenharem a casa deles, sai cada casa que a gente morre de rir... eu gostava de fazer isso quando trabalhava com a 5ª série... Sai casa sem porta, sem janela, aí eu brinco que ninguém pode entrar. Pode usar o papel quadriculado que fica mais fácil. Susana: (cantando) Era uma casa muito engraçada... [...] (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) Colocamos alguns exemplos de como podemos desenvolver atividades simples e trabalharmos a percepção visual. Pesquisas destacam que a visualização é uma das primeiras habilidades geométricas que as pessoas adquirem. O objetivo, no momento, era levar as professoras a refletir que elas podem trabalhar geometria em suas aulas de matemática e em outros conteúdos, como o caso da construção e interpretação de mapas em geografia. Indiquei alguns materiais que poderiam colaborar no trabalho com a geometria como papel quadriculado para a representação da casa de cada aluno. A professora Susana, normalmente, fazia suas ligações com outras coisas e começou a cantar uma música, que pode ser trabalhada, ao fazer a representação da casa com os alunos. Na continuidade do diálogo, eu tentei colocar um dos motivos por que muitos professores não trabalham com a geometria. 206 Eu: Mas eu queria puxar para essa questão da matemática, quando a gente vai trabalhar a matemática. E é essa visão que a gente passa para os alunos, a visão que a gente tem é a que passamos para eles, sem querer. Porque se eu não chamo atenção deles para certas coisas, aquilo vai passar... Beatriz: Aí depois quando ele chegar vai lá à frente ele vai precisar e vai ficar... Eu: Aí ele aprende a geometria com somente fórmulas, aquela coisa chata, e aí detesta geometria. Lógico, só aprendeu as fórmulas, não aprendeu fazer nada... Quando a gente chegar mais na frente vamos ver como trabalhamos. Beatriz: Da maneira como nós a gente foi trabalhado... os cálculos, resolução de problemas nunca foi discutido [geometria]... Pois na roça, todo mundo sabe matemática de montão, né. O papai cobrava muito da gente. Eu: Mas eles também sabem muita geometria, mas eles não passam. Por exemplo, para medir, para saber a distância, como fica melhor uma cerca, geometria... Beatriz: Meu pai sempre gostou disso, queria muito aprender como fazer cálculo de madeira,..., mas até hoje ele não sabe. Eu: Mas é tão fácil [para cálculo de volume],... Basta multiplicar mais uma vez... (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) A professora Beatriz fez uma reflexão sobre como aprendeu matemática e como não tinha sido discutida a geometria na sua aprendizagem com seu pai. Referimo-nos ao conhecimento da geometria das pessoas que trabalham com plantações, mas que nem sempre é transmitida como um conteúdo escolar, mas sim como conhecimento prático que as pessoas precisam ter para realizar plantações e outras atividades próprias desses meios. Temos evidências, uma vez mais, de que a aritmética acabou sendo mais valorizada que a geometria. Eu: Por exemplo, o diâmetro da circunferência, dá para trabalhar com eles. Medindo com cordas... Susana: Num tem um negócio de “pi” [π]? Eu: Tem sim, é o comprimento da circunferência dividida pelo diâmetro. Dá para trabalhar isso... Comprimento pelo diâmetro. [...] Eu: Vamos olhar nos encontros como a geometria está colocada no livro didático. Susana: Olha, aí vou dizer que esse é um problema, se a gente for seguir o livro didático fica ruim, pois no meu livro está no final [geometria]... Se for seguir o livro não dá para trabalhar. Eu: Mas vamos ver como está no livro didático e depois nós vemos o que vamos fazer. (transcrição da gravação de áudio de 19/mar/07) 207 Analisando o diálogo como um todo, constatamos que a geometria fica à parte do planejamento das professoras Beatriz e Susana, Beatriz afirmou que trabalha apenas com perímetro e área. Nos questionamos sobre os outros conceitos geométricos abordados. E a construção desses conceitos pelas crianças nas séries iniciais, como ficam? Isso vai ao encontro a minha pesquisa de mestrado (FRAGA, 2004) onde pesquisei sobre geometria. Muitos professores revelam que não ensinam geometria por falta de tempo e/ou por estar no fim do livro. As falas de Susana não estão diferentes dessa constatação e as de Beatriz mostraram que poucos conteúdos são trabalhados em geometria. Em outros momentos vivenciados pelo grupo, verificamos que a questão da geometria estava além de apenas não ser trabalhada, mas consistia num obstáculo epistemológico para as professoras em certo sentido. Elas tinham dificuldades com alguns conceitos e, por esse motivo, não trabalhavam geometria com seus alunos de modo satisfatório. Em encontros posteriores algumas atividades sobre geometria foram levadas para o grupo. Trabalhamos a questão das vistas superior, lateral e frontal, utilizando caixas de fósforos e alguns outros conceitos que serão apresentados. Os trabalhos ajudaram nas discussões sobre conceitos que envolvem a geometria e para compreensão do quanto precisamos realizar esse tipo de discussão com outros professores, para que o ensino da geometria aconteça de forma satisfatória em nossas salas de aula. Num outro momento, durante o 10º encontro (07/05/07), a professora Beatriz já tinha iniciado o trabalho com geometria. Ela se sentiu à vontade para afirmar que estava com dúvidas e para nos perguntar. Isso gerou um debate interessante que levou à discussão de várias ideias diferentes. Beatriz: Agora eu comecei trabalhar geometria, pois às vezes a gente costuma deixar para o final, mas nem sempre trabalhamos direito. Vânia: E às vezes não dá tempo, né. Beatriz: Desta vez, eu estou querendo fazer diferente. Só que eu percebi que a gente não tem certos conceitos bem formados. Vânia: Quais, por exemplo? Você acha que não temos bem formados. Beatriz: O livro traz alguns conceitos. 208 Vânia: Mas só para dar alguns exemplos. Beatriz: Por exemplo: essa atividade propõe para que os alunos identifiquem figuras cujas linhas não se cruzam. Ai eu fiquei na dúvida. Sandra: Tem alguns livros aqui, talvez ajudem... Vânia: Vê se você acha alguma atividade parecida... Susana: Eu sempre me esqueço de trazer meu livro. (transcrição da gravação de áudio de 07/mai/07) Percebemos que nossa conversa com as professoras, em encontros anteriores estava surtindo efeitos, Beatriz fez uma reflexão sobre como abordava a geometria em suas aulas e decidiu modificar o quadro. No momento, a professora Beatriz levou uma situação em que foi trabalhar com atividades no livro que geraram dúvidas para ela mesma. Ela afirmou que existe muitas vezes uma construção incompleta dos conceitos geométricos por parte dos professores. Talvez esse seja o primeiro passo para a mudança de comportamento do professor. Analisar seus pontos fortes e fracos e buscar de diferentes formas a superação dos pontos fracos. No caso da Beatriz, ela pode e teve abertura e coragem de se mostrar perante o grupo e pedir ajuda. Vânia: E você Susana, já começou a trabalhar com geometria? Susana: Ainda não. Por quê? Eu vou trabalhar geometria quando eu introduzir o meu projeto do Lixo. Pois eu vi num livro que a Sandra trouxe que trabalhava com sucatas para reciclar. O rolo de papel, de alumínio,... 43 Eu: É o livro do Lorenzato , de laboratório de matemática.. Susana: tem a questão das latas, das caixas. Mas uma embalagem que sobre o quadrado [forma de cubo] eu num sei de onde tiraria não. Eu tenho uma lá que vou guardar a sete chaves. Vânia: Mas em algumas indústrias de cosméticos você pode encontrar. [...] (transcrição da gravação de áudio de 07/mai/07) A professora Susana também iniciou um processo de reflexão sobre o ensino de geometria, mas tomou outra decisão. Ela decidiu que iria iniciar o trabalho com geometria dentro de outro projeto, sobre o lixo, que foi elaborado por ela, juntamente, com a escola que trabalha e nós demos a ideia de trabalhar algo 43 LORENZATO, Sergio (org.). O laboratório de ensino de matemática na formação de professores. Campinas: Autores Associados, 2006. 209 sobre geometria. Pois, sabemos que quando falamos em materiais recicláveis, podemos abranger uma gama grande de sólidos geométricos de vários tipos. Foi uma atitude diferente, mas que também foi um passo diferenciado para o trabalho com a geometria. Mostrou-nos outro nível de conhecimento, que relaciona conceitos matemática com conceitos de outras disciplinas. Enquanto a professora Susana comentava sobre seus planos para o trabalho com a geometria, a professora Beatriz procurava em um livro didático um exemplo semelhante ao que ela queria nos perguntar, e que gerou suas dúvidas. Beatriz: [voltando à questão das atividades e das dúvidas] Esse aqui eu acho que é parecido com este aqui. Por exemplo, estes aqui são segmentos de retas. [apontando para os lados da figura] Vânia: Segmentos de retas, certo. Beatriz: Que se cruzam. Não!? Eu: Não eles se encontram... Para se cruzar tem que ultrapassar um pelo outro. Vânia: Eles têm um ponto de encontro. Beatriz: Mas a reta não é infinita? Sandra: A reta sim, mas aí é só um segmento. Vânia: Mas é só um segmento. Beatriz: Ah, a palavra segmento. Vânia: O segmento foi até ali e ele parou. Eu posso imaginar que por aqui passa uma reta toda, mas quando estou com ele aqui é um segmento, chega aqui e ali, ele parou. Eu poderia pensar que se eu tivesse uma linha ou uma estrada que estaria continuando. Mas para esta figura eu peguei somente esta parte. Eu: é delimitado. (transcrição da gravação de áudio de 07/mai/07) A professora Beatriz nos mostrou, por meio de um exemplo, qual era sua dúvida. Ela afirmou que os segmentos de retas no polígono de cruzam, mas com dúvida. Beatriz se baseou na definição da reta ser infinita para analisar o segmento de reta. Se a reta é infinita, a atividade não teria respostas, já que todas as figuras teriam linhas que se cruzavam. A definição de reta estava 210 correta, mas gerou uma dúvida na definição de segmento de reta, este seguia as mesmas características das retas? Beatriz começou a fazer associações com o que já sabia, e isso a levou a ter dúvidas. A atividade nem falava no termo „segmento de reta‟, mas ela fez a associação para aproximar sua identificação com o que já conhecia. Nossa discussão bastou para que a professora conseguisse entender a diferença entre reta e segmento de reta e compreendesse a atividade. Vânia: Mas porque, por exemplo,... Susana,... Dá uma olhada aqui nesta figura. Porque essas figuras assim... Estranhas também são boas. Porque a gente trabalha normalmente com as crianças com figuras mais fáceis. Vou pensar, por exemplo, neste lado da face da porta que eu vejo é uma face retangular. Porque ela tem largura, espessura e tudo, e olhando como um todo é um objeto tridimensional. Mas cada face dela é um retângulo. Para a criança é mais fácil ver isso daqui [posição frontal da porta]. Mas se eu trabalhar somente com isso daqui, quando eu colocar alguma figura estranha dessa ou outra coisa, ela fica apavorada. Então também é bom a gente trabalhar com figuras não regulares. Que aqui você vê... Beatriz: Como a gente é „clínico‟ em coisas simples e não está acostumada a dar valor e trabalhar com essas coisas em sala de aula. Vânia: E a gente é assim, pensa bem. Como têm bijuterias, coisas de brincos, anéis,... Como as pessoas gostam de bijuterias com coisas bem diferentes... A gente começa a trabalhar com as crianças quase sempre... Ela até falou nas caixas, caixa retangular, quer dizer com as faces retangulares, quadradas. Mas tem coisas ali com cubo ou paralelepípedo que são coisas simples. Mas que têm outras com coisas bem diferentes. Mas tem algumas sucatas que não são simples e temos que parar para pensar, como vou ver daquele objeto e tentar ver... (transcrição da gravação de áudio de 07/mai/07) A professora Vânia chamou a atenção para algumas diferenças em trabalharmos sempre o que já é conhecido pelas crianças. Como o caso da porta que possui faces retangulares em oposição ao que é, a princípio, „estranho‟ para elas. É muito mais ameno trabalhar com coisas que já temos a noção; coisas muito diferentes, nós ficamos apreensivos e podemos ter certo receio. Na continuidade do diálogo observamos que alguns conceitos mal construídos estão presentes nas ideias das professoras. Sandra: Exemplo as garrafas... Susana: Olha só a garrafa de água. Olha a forma geométrica da garrafa. Vânia: Sim, é toda diferente do que você esperaria. 211 Susana: É um cilindro, mas não é um cilindro reto. É curvo. Eu: Não é um cilindro. Susana: Num é não? É o que? Eu: Não tem uma forma definida... Não tem uma forma definida, mas não é um cilindro. [Vânia continuou a tentar mostrar as partes que compõem a garrafa] Vânia: É como se fosse composta de várias formas, tem as entradas, aqui já afunila. [...] agora eles fazem isso em relação ao nosso visual. Porque quanto mais fora do padrão mais nos chama a atenção. Podemos olhar pedacinhos dela, mas ela como um todo, ela lembra uma forma cilíndrica. Mas não é. Susana: Engraçado, então ela é uma forma geométrica sem nome. Eu: Sim, e que não são trabalhadas normalmente. Vânia: Sim, e que são as formas que mais chamam a atenção no mundo hoje em dia... (transcrição da gravação de áudio de 07/mai/07) Normalmente, associamos a figura do cilindro aos corpos arredondados parecidos com as garrafas (estamos falando de garrafas de água com várias reentrâncias). A professora Susana afirmou que a garrafa de água, que tínhamos sobre a mesa, era um cilindro não reto, mas sim um cilindro curvo. E ficou surpresa quando afirmei que não se tratava de um cilindro. Ela queria que essa figura geométrica tivesse um nome específico. A professora Vânia mostrou que poderíamos identificar figuras conhecidas em pedaços da garrafa, mas não afirmar que a garrafa era um cilindro, apenas lembra uma forma cilíndrica. Concluímos com esse episódio que os conceitos não estavam completamente formados pela professora Susana. Ela conhecia algumas propriedades do cilindro, mas não conseguia identificar outras que impedem esse objeto de ser denominada uma figura cilíndrica. A professora estava analisando o objeto muito mais pelo visual do que, comparativamente, pelas propriedades da imagem conceitual de um cilindro. Susana: Por exemplo, o copo é uma forma geométrica, é um cone. Só que é um cone tipo assim fechado. Vânia: É um tronco dele. Beatriz: É um tronco de cone. Susana: Isso, eu diria assim é uma fração de cone... Num deixa de ser, num é? Eu: É!? 212 Susana: Ele num é uma parte do cone? Vânia: Mas você teria que pensar nessas palavrinhas. Fração ou parte. Ele é uma parte daquele cone. Mas para eu poder dizer que é uma fração eu tenho que verificar se são partes iguais. E eu tenho que ver em relação a que partes iguais nós estamos falando. É de uma figura do papel, ou é sobre a quantidade de volume que tem aqui dentro. Por exemplo, se eu quiser dividir esse refrigerante, e cada uma tomar um quarto, eu só posso falar isso se eu garantir que a quantidade de líquido em cada um deu exatamente a mesma coisa, que é a quantidade de líquido. Se não fosse igual, por exemplo, o meu eu coloco a metade, o outro coloco só um dedinho, outro até aqui e esse coloco cheio, eu não posso dizer que estamos bebendo um quarto do refrigerante. Mas nós estamos dividindo a quantidade em quatro partes. Mas não estamos trabalhando com a fração. Susana: não, não é fração. Vânia: Repara como nós podemos usar as palavras às vezes... Ele está fracionado, está dividido em partes. Mas não é ainda uma fração. Mas pode ser que conseguimos ter... Por exemplo, um escultor ele faz medidas para organizar sua escultura e pode determinar a fração. Eu: Para dividir em partes iguais, em frações, o copo deveria ter divisões diferentes para ter partes iguais. [pensando no volume] Perto da borda deveria ser mais estreito. Susana: É, isso não é um bom exemplo. Vai mostrar isso para os alunos. É melhor utilizar um rolo de papel toalha ou rolo de papel higiênico. Que é reto, não muda... (transcrição da gravação de áudio de 07/mai/07) Outra aprendizagem complementar sobre o conhecimento matemático e o conhecimento pedagógico matemático relacionado a identificação apenas visual de objetos matemáticos foi quando a professora Susana buscou, no copo, um exemplo para o cone. Mas ela tem conhecimento de que não atende todas as características de um cone, pois fala em „cone fechado‟, em fração ou parte do cone. O nome correto seria tronco de cone, que já não era conhecido pela professora Susana. A professora Vânia trouxe uma discussão interessante sobre o uso impensado de certas palavras como fração e parte. Consideramos que, muitas vezes, utilizamos ambas as palavras como sinônimas e nem sempre elas são. Devemos, portanto, tomar cuidado com nossos argumentos ao definirmos algumas figuras para os alunos. Não afirmamos que não podemos aceitar essas definições de crianças que estão iniciando o trabalho com a geometria. Porém, chamamos atenção para o fato de que nós, enquanto professores, precisamos refletir sobre o que falamos e como falamos e 213 definimos certos conceitos para nossos alunos. Essas situações mostram como a professora Susana estava num nível inicial de conhecimento geométrico, pois afirmou que não tinha estudado isso em sua formação inicial e nem na educação básica. A formação inicial inadequada sobre a geometria a levou a aprender como a maioria das pessoas, apenas com experiências práticas que, normalmente, se restringem ao visual e não ao entendimento das propriedades que envolvem os objetos geométricos. Na continuidade do diálogo, houve um retorno à discussão inicial sobre a dúvida da professora Beatriz. Isso mostra mais uma vez o caráter dinâmico de um diálogo, no qual não damos conta de realizar sequências fechadas de pensamento, já que uma ideia se encadeia com outra, e modificamos o rumo da conversa. Contudo, percebemos que o grupo tem uma preocupação em voltar ao início das discussões e retomá-las. [...] Susana: Mas quando você [Beatriz] falou, qual dificuldade que era? Beatriz: Eu num lembro direito. Eu esqueci o nome qual era. Eu: Não era quando eles começavam a falar de polígonos, não? Linhas poligonais. Segmentos de retas... Beatriz: É alguma coisa assim. Eles pedem para marcar os polígonos... [...] Susana: Então a dificuldade estava no livro, é isso? Beatriz: Não, a minha dificuldade em entender alguns conceitos... Na palavra. Vânia: Mas, por exemplo, agora que a gente começou a conversar sobre isso... Mesmo que divagamos, mas deu... Beatriz: Já começou a clarear algumas coisas... Eu: Quando se cruzam eles chamam de linha poligonal... Deixa-me ver se tem algum exemplo aqui. [procurei no livro didático que tinha em mãos um exemplo de linha poligonal] [...] Vânia: Mas tem algumas figuras que é assim... Vânia: E tem alguns que falam assim ó... Sandra, como é o nome disso? Eu: Alguns autores chamam de polígonos, outros não. 214 Vânia: O que tem de diferente é que algumas são mais fáceis de olhar as regularidades, como nos retângulos, quadrados, losangos,... Mas quando é nestas figuras estranhas não é tão simples... (transcrição da gravação de áudio de 07/mai/07) Ademais, buscamos outros exemplos para mostrar como não é tão simples identificar características de figuras geométricas. Sabíamos que precisaríamos retomar esses assuntos, e que a conversa já estava contribuindo para que as professoras percebessem a necessidade de uma maior formação dos conceitos geométricos. Percebemos a necessidade de usarmos protótipos nas construções de conceitos, precisamos identificar e trabalhar com exemplos e contra-exemplos para obtermos as características necessárias para a formação adequada do conceito geométrico ou outro conceito matemático. Na sequência do diálogo, a professora Beatriz mostrava uma atividade que selecionou para trabalhar com os seus alunos. Além disso, observamos como o grupo contribuiu para que as professoras pensassem em outras possibilidades a partir das atividades propostas e discutidas por elas. Beatriz: Eu peguei outro livro para trabalhar algumas atividades para eles. Eu gosto deste livro. Por exemplo, nesta atividade. Em cada grupo de figuras há uma intrometida, eu achei legal isso daqui. Vânia: Ah, é o que a gente falou hoje, a intrometida é a que não segue os mesmos padrões de regularidade. Tem que descobrir quem é a intrometida. [...] Beatriz: Eu estava buscando atividades e aproveitei de um livro velho e achei essa atividade. Vânia: Está vendo que legal. Beatriz: Ele dá o exemplo, e o aluno tem que identificar qual é a diferente e explicar por que... Vânia: Isso aqui é importante, pois todas as outras têm segmentos de retas e esta não tem nenhum. Ela tem que identificar o que em cada uma delas, o que foge do normal em cada uma delas. Beatriz: Tem que ter bastante percepção... Por exemplo, aqui tem somente quadrilátero e uma não é. Não é isso? Vânia: Isso, porque aqui tem mais um lado... E você repara que isso cai em provas de concursos e testes psicotécnicos, testes de raciocínio,... para ver se as pessoas tem percepção visual. Beatriz: Agora, se ele responder que isso aqui tem linhas curvas, ele terá respondido corretamente? 215 Vânia: Está. Eu: Se ele falar que esta linha está torta já está bom. Vânia: E aqui já esta mostrando ideias matemáticas que demoraram séculos para chegar [pensando na geometria não-euclidiana]. Esse triângulo aqui, que dá ideia de outra geometria,... mas que demoraram séculos para descobrir. Eu: Na nossa geometria não é triangulo. É triângulo numa outra geometria, mas na euclidiana que usamos não é. [...] Vânia: O interessante aqui é pedir para que os alunos digam o que viram de parecido nas outras. Porque aqui na atividade está pedindo para descobrir quem é o intrometido e por que. Isso está ótimo, mas também tem a outra. Explique o que as outras figuras semelhantes. Eu: Algumas vezes podemos ter alunos que já nos respondam o que tem de semelhante quando tentam explicar porque a figura escolhida é a intrometida. Vânia: Sim, às vezes, mas não podemos garantir que todos os alunos busquem estas semelhanças e se pedirmos... (transcrição da gravação de áudio de 07/mai/07) A atividade selecionada pela professora pedia que os alunos identificassem, a princípio, visualmente qual figura era a intrometida, aquela que não atendia às mesmas características das outras. Ao solicitar que as crianças justificassem suas escolhas a atividade passou a exigir que as crianças prestassem atenção em algumas características das figuras expostas. As características ou propriedades poderiam ser em relação à forma do lado da figura (reto ou curvo) ou à quantidade de lados. Esse tipo de atividade é importante, pois exige do aluno a percepção visual e a identificação de propriedades das figuras expostas. É interessante observar como surgem propostas de alterações das atividades. Vânia sugeriu que Beatriz pedisse que seus alunos identificassem diferenças entre a figura intrusa e também as semelhanças entre as outras figuras. Ampliando, dessa forma, a abrangência da atividade. A professora Beatriz aceitava, de prontidão, as sugestões apontadas pelo grupo e tentava realizálas em suas aulas de matemática. Em relação à proposta da professora Vânia de ampliar a atividade para que pudesse pedir aos alunos que buscassem mais propriedades, ela realizou uma adaptação e aplicou em aula e na avaliação escrita que realizou. Colocamos, a seguir, a atividade que fez parte dessa 216 avaliação na qual Beatriz utilizou a sugestão da professora Vânia. Ela apresentou um grupo de figuras e pediu para que os alunos circulassem a intrometida e, em seguida, apresentassem suas justificativas para a escolha da figura intrometida, e as características das outras que são semelhantes. Figura 11 – Parte da prova da professora Beatriz sobre figuras geométricas Fonte: Prova escrita da professora Beatriz No 12º encontro de 2007 (21/mai/07), dentre outras propostas, conversamos sobre algumas definições de polígonos em geometria. Debatemos com as professoras o conceito de triângulo, de quadrado e de ângulo. A atividade foi realizada a partir de estudos, leituras e experiências anteriores com atividades semelhantes (SANTOS, 1997; FRAGA, 2004; LINDQUIST; SHULTE, 1994). Ao 217 termos conhecimento de que as professoras Susana e Beatriz ainda não estavam com alguns conceitos geométricos, totalmente, formados, fomos motivando uma (des) construção do que seja um triângulo para provocarmos uma (re)construção. Realçamos algumas sequências de argumentos 44 que foram colocados durante o debate que aconteceram em relação à discussão. Os argumentos eram escritos no quadro, enquanto a pesquisadora colocava figuras que atendiam às definições dadas, mas que desconstruíam a ideia de que apenas com os argumentos apresentados conseguiríamos obter apenas o triângulo. Atividades como essa já foram abordadas por outras professoras e pesquisadoras, podemos citar Santos (1997) e Lopes e Nasser (1996). Discutimos, a seguir, a sequência apresentada pela professora e alguns exemplos de nossos contra-argumentos, a partir de figuras e tentativas de aproximação da definição, a mais coerente e aceita matematicamente. Acrescentamos alguns comentários na sequência de cada definição dada pelas professoras mostrando como argumentamos com elas sobre as „falhas‟ na definição defendida. Iniciamos, perguntando para as professoras o que era um triângulo e colocamos a pergunta no quadro. O que é um triângulo? Figura com três lados. Figura 12 – Desenhos de figuras com três lados que não são triângulos Desenhamos no quadro figuras com três lados, mas que não representavam triângulos na geometria euclidiana, não abordamos as análises na geometria não-euclidianas nesse momento. Exemplo: figuras com lados curvos e figuras abertas. 44 Figura com três segmentos de reta Não temos gravação desse encontro porque houve problema com o gravador. Os argumentos e figuras apresentados representam os que foram anotados por mim no meu caderno de observação dos encontros. 218 Figura 13 – Desenhos de figuras com três segmentos de retas sem ser triângulos Utilizamos segmentos de retas, mas mostramos que podemos obter figuras com três segmentos de retas abertas e que não formam triângulos. Três segmentos de reta que se encontram Figura 14 – Desenhos de triângulos e não triângulos Desenhamos um triângulo, mas também outra figura composta com três segmentos de retas, porém que não se encontram nos vértices, ultrapassam os lados. Formam triângulos em seu interior, entretanto, não são considerados triângulos. Três segmentos do mesmo tamanho que se encontram sem ultrapassar Figura 15 – Desenhos de triângulos que não possuem os segmentos do mesmo tamanho. Discutimos com as professoras a necessidade de termos os lados dos triângulos com o mesmo tamanho. Será que se os lados não forem do mesmo tamanho não teremos triângulos? Três segmentos de reta que se encontram sem ultrapassar o ponto de encontro. Na definição não utilizamos mais os desenhos, as professoras apenas buscavam uma forma coerente de definir triângulos, sem deixar margem para que pudéssemos definir um não triângulo ou excluir triângulos. 219 “Triângulo é um polígono de três lados.” Por fim, uma delas me perguntou como aparecia nos livros didáticos, e eu afirmei que normalmente a definição de triângulos dependia da definição de polígonos. Isso foi estudado por mim quando realizei minha pesquisa de mestrado, o leitor poderá ter mais detalhes em Fraga (2004). Da mesma forma, abordamos o que seria um quadrado. As professoras utilizaram algumas informações que obtiveram do debate sobre o que era um triângulo. Porém, como o quadrado possui outras particularidades, elas precisaram buscar alternativas diferenciadas para chegar à definição de quadrado. Mostramos a sequência de tentativas de definição, conforme anotamos no nosso caderno, juntamente com suas representações por meio de desenhos: O que é um quadrado? Polígono de quatro segmentos de reta. Figura 16 – Desenho de polígono de quatro lados que não é quadrado. Elas já iniciam com o uso da palavra polígono. E utilizam segmentos de retas, comentamos que, por se tratar de polígonos, precisamos ter segmentos de retas. Além disso, desenhamos uma figura que não é um quadrado, mas que atende à definição dada inicialmente. Polígono de quatro lados iguais. Figura 17 – Desenho de polígono com quatro lados iguais e que não representa quadrado. Um polígono de quatro lados iguais pode ser um losango, sem necessariamente, ser um quadrado. E mostramos com um desenho essa hipótese. 220 Polígono de quatro lados iguais que possui dois segmentos paralelos de mesmo tamanho. Figura 18 – Desenho de polígono com quatro lados iguais e segmentos opostos paralelos. Prosseguimos com o losango e mostramos que continua com segmentos paralelos e de mesmo tamanho. Faltava mais alguma coisa para ser um quadrado. Polígono de quatro lados, mesmo tamanho de lado, de cima paralelo com o de baixo e de um lado paralelo com o outro lado. Observamos na definição, apenas outra tentativa de relacionar os lados paralelos, mas que atendesse ao exemplo do losango, embora não pudéssemos garantir o que fosse „lado de cima ou de baixo‟. Polígono de quatro lados de mesmo tamanho que possui quatro ângulos retos. Figura 19 – Desenho de quadrados A professora Beatriz se lembrou do ângulo reto e da necessidade de confirmar a definição de um quadrado, partindo de seus ângulos. Entretanto, depois de longo debate, conseguimos chegar a uma definição coerente para quadrado. A professora Susana afirmou, a princípio, que não existe ângulo reto, discutimos com ela sobre ângulos. Ela se ateve à palavra „reto‟, o que vinha a ser um ângulo reto. Se era „reto‟ então não poderia formar ângulo, explorando o significado a partir da diferenciação entre linguagem materna e linguagem matemática. Ela chamou os ângulos de „fechado‟ e „aberto‟. Depois de algumas conversas conseguimos mostrar a Susana que o ângulo com 90º era denominado de ângulo reto. Questionamo-nos sobre nossas formações e as deficiências que levam a conhecimentos frágeis ou incorretos. Sentimos a 221 necessidade das formações, iniciais e continuadas, estarem atentas as possíveis incompreensões ou fragilidades dos conceitos matemáticos. As situações apresentadas aqui refletem resultados semelhantes realizados por outros pesquisadores (PAVANELLO, 2004), como professores que possuem dificuldade em explicar conceitos geométricos, não conseguem abordar esses conteúdos de maneira adequada. Pavanello (2004) aponta que o problema vem da formação do professor e afirma que: As dificuldades de professores no reconhecimento de figuras geométricas planas, de seus elementos e propriedades, e, portanto, em atividades de classificação, indica que o trabalho pedagógico realizado com eles nas diferentes instâncias de sua formação não lhes permitiu elaborar devidamente seus conceitos sobre as figuras planas. (PAVANELLO, 2004, p. 135) Acrescentamos que isso reflete, não apenas, no reconhecimento de figuras planas, mas em suas definições, como foi o caso apresentado anteriormente. Faz-se importante investigarmos as formações iniciais e sugerirmos que formações continuadas abordem esses assuntos. Caso contrário, continuaremos com professores e, consequentemente, alunos que não constroem conceitos geométricos de maneira adequada. Chamamos a atenção para o fato de que resolver a deficiência na formação de professores não é tarefa simples. Podemos dar um exemplo do que estamos afirmando com um episódio vivenciado pelo grupo. Tínhamos trabalhado algumas construções de conceitos de polígonos em 2007, porém, em 2008, no 16º encontro (15/set/2008), enquanto trabalhávamos com o geoplano circular, surgiu novamente o assunto de definições de figuras poligonais e a professora Susana recomeçou a questionar algumas ideias em relação a esses conceitos. O episódio exposto a seguir, demonstra algumas dificuldades encontradas em formações continuadas e que nem sempre conseguem acompanhar o professor no desenvolvimento das construções de seus próprios conceitos e seu trabalho em sala de aula. Necessitamos acompanhar, mais de perto, o trabalho do professor em sua formação e de trabalhar, em diferentes momentos, o conteúdo que queremos discutir, para certificar que o participante construiu seus próprios conceitos de maneira adequada. 222 Reiniciamos, nesse encontro, a discussão sobre algumas definições de figuras como: de triângulos, de retângulo e também de ângulos. Apresentamos partes da gravação das discussões para mostrar como precisamos retomar, em alguns pontos, e desestabilizar a professora para que atribuísse significado aos conceitos geométricos trabalhados. A proposta inicial era analisar as atividades que tinham sido preparadas para o trabalho com o geoplano circular nas salas de Beatriz e Susana. Após lermos as atividades, decidimos que seria interessante realizá-las com o grupo. Por esse motivo, a professora Susana pegou quatro elásticos com cores diferentes e formou figuras geométricas no geoplano circular (figura 20). Figura 20 – Geoplano com construções da professora Susana Iniciamos um debate, com a professora, sobre as figuras que tinha construído no geoplano. O diálogo mostra a necessidade que tivemos em levá-la a repensar nos conceitos, definições e nomenclaturas das figuras geométricas. [...] Eu/Sandra: O que você fez aí? Susana: Eu fiz uma bandeirinha... Um polígono, né? Lucia: Um polígono côncavo ou convexo? Susana: Não sei. Lucia: A gente fala convexo ou não convexo? Eu: Que figura é essa? Susana: Pra mim é uma bandeirinha... Eu: Tenta lembrar-se do ano passado. 223 Susana: Ele tem 5 lados... Eu: E como é o nome de um polígono que tem 5 lados?... Susana: É polígono... Eu: Mas ele tem um nome específico... E qual o nome de um time que é campeão por cinco vezes? Susana: Pentacampeão. É isso? Eu: E agora qual é o nome desse polígono? Susana: Pentágono,... É isso? (transcrição da gravação em áudio de 15/set/2008) A professora Susana não se lembrava da nomenclatura dos polígonos. Porém, notamos que a partir do momento que conduzimos o seu pensamento, agindo como mediadoras (VYGOTSKY, 1988/1934), essa professora conseguiu lembrar-se do pentágono. A professora Lucia, quis ir além, e pensou em polígonos convexos e não convexos, mas essa discussão não teve continuidade nesse encontro. Com o elástico rosa, ela formou um trapézio, mas, quando questionada sobre qual figura seria, afirmou se tratar de um retângulo. Começamos a questioná-la sobre o que a levava a afirmar que aquela figura era um retângulo. Ela se baseou apenas na visualização da figura formada. Vejamos o diálogo sobre essa construção. [...] Eu: Mostra... Conta o que você fez. Susana: Um pentágono [apontando para a figura feita com o elástico lilás], fiz um retângulo, embora que não tenha ficado assim perfeitamente... Um retângulo. Lucia: Será que existe retângulo perfeito? Vânia: Será que existe o retângulo imperfeito ou ele tem outro nome? Susana: Eu acho que ele tem outro nome... Mas os lados dele não ficaram iguais não. Eu: Mas isso aí é um retângulo? Susana: Isso aí... Eu estou achando que pode ser um triângulo... Eu: Como que é? [admirada] Susana: Na minha experiência como aluna de geometria, isso pra mim é um retângulo... Mas isso daqui... a base é maior... Mas eu não sei. 224 Vânia: Então olhe em volta aqui na sala, o que tem que te lembra formas retangulares. Susana: Bom,..., a mesa, capa do livro, a porta, o piso, o quadro,..., o mural, a folha de chamex,... Vânia: Mas, por exemplo, aqui, o que tem,... Vamos ver se você em todos esses que você lembra uma forma retangular o que eles têm de parecido... Para até ver se isso vai ser um retângulo ou não. Susana: O que eles têm, assim... Dois dos lados são exatamente do mesmo tamanho. Entendeu? Vânia: E o que mais que eles têm também? Por exemplo, se você imaginar uma linha passando por aqui por cima... Como se fosse uma estrada, uma rua,... Diz pra mim Susana. Susana: Ah tá, eles são paralelos... Só que elas são paralelas e jamais se encontram. Vânia: E você também falou o que? Repete o que você falou... Você falou que esse lado é igual a esse, e esse é igual a esse [relacionando os lados opostos de um retângulo] e são paralelos. Vê agora o que você fez [construção no geoplano] Susana: Esse é paralelo a esse, mas não são do mesmo tamanho. Então não vai poder ser um retângulo. (transcrição da gravação em áudio de 15/set/2008) A professora Susana lembrava algumas características dos retângulos, e identificou, na sua construção (com elástico rosa da fig.18), a ausência dos lados iguais. Porém, como ela não se lembrava da nomenclatura correta, afirmou que a figura era um retângulo, o nome conhecido que mais se aproximava da construção realizada. Após essa abordagem, essa professora, concluiu que não se tratava de um retângulo. Vânia continuou a desestabilizála e abordou sobre os ângulos, que chamou a princípio de „cantos‟ de um retângulo. Essa discussão gerou amplo debate sobre ângulos agudos, retos e obtusos, nos quais a professora Susana chamou de „fechado, igual e arreganhado‟. Não abordamos todo debate em relação a essa discussão, porém, afirmamos que Susana se baseou na visualização do ângulo, analisando sua abertura. Depois desse debate, voltamos à construção discutida inicialmente, com o diálogo a seguir. [...] Eu: Mas agora vamos pensar em outra coisa... Essa ideia do ângulo foi interessante... Vamos olhar novamente aqui... Essa figura rosinha sua, ela é um retângulo? Vamos voltar... É um retângulo ou não é um retângulo? 225 Susana: [pensando] Eu já estou começando a achar que não. Pois a ideia de retângulo pra mim... as linhas aqui tem que ter o mesmo tamanho e não são. Mas também não sei dizer que figura é essa. [neste momento eu modifiquei o trapézio representado por ela para evidenciar o lado menor] Eu: E se eu fizesse isso aqui você saberia me falar qual figura é essa? Susana: Deixa eu tentar lembrar... Trapézio, num é? Eu: E essa daqui? [voltando para o desenho original] Vânia: Porque esse fica mais fácil... Você reparou porque, esse daqui... Susana: Seria um trapézio também... Vânia: Porque aqui estava o ângulo muito... para disfarçar... Quando coloca aqui vira quase um retângulo... Porque que algumas crianças na escola quando estuda o trapézio... Elas têm dificuldade com esse que é quase um retângulo. Porque o desvio do ângulo foi muito pequeno. E quando você trouxe para cá, o desvio era maior e ela de cara já sabia o nome... Eu: E aqui ela não sabia nem o nome... Vânia: Mas você repara que... Por que a gente tem tão pouca paciência com alunos nas 7ª ou 8ª séries... Isso daqui ela esqueceu o nome porque não é a praia dela, mas quando você trouxe pra cá ela falou quase que imediatamente trapézio. Eu: Mas eu sabia que ela ia falar... Vânia: Sinal que você sabe isso, mas isso aqui é um erro visual que a gente tem... pra quem não vê isso muito é normal, mas você viu como você conseguiu agora... (transcrição da gravação em áudio de 15/set/2008) Se baseando na visualização, Susana conseguiu, facilmente, identificar a figura construída quando o trapézio ficou visualmente mais nítido. Dessa maneira, ela observou que sua construção inicial também era um trapézio, com ângulos próximos de 90º, por esse motivo ela o nomeou de retângulo. Continuamos a identificar as outras figuras construídas, no geoplano circular, pela professora Susana. O triângulo (construído com o elástico amarelo, fig. 18), levou a discussões interessantes sobre sua definição, que não foram discutidas neste estudo. A professora Susana definiu triângulo como um polígono de três lados. Chegamos a perguntá-la sobre a definição de polígono, que tinha sido discutida no encontro de 2007, porém, a professora não se lembrava mais, um novo debate foi realizado. Ao final da transcrição do diálogo, colocamos uma foto do quadro (fig. 21) após as discussões, para que o leitor pudesse acompanhar os desenhos realizados e debatidos. 226 Eu: E se você fosse ensinar triângulo para seus alunos, como você definiria? Como você iria colocar agora para eles? Susana: Seria exatamente essa... Polígono com três ângulos e três lados. Eu: Mas e se o menino fala assim: e o que é um polígono? Susana: Eu pediria para ele olhar no dicionário. [risos] ou eu daria uma resposta para eles... Eu: E qual é a resposta? Susana: Não lembro... A definição de um polígono... [Lucia foi ao quadro desenhar algumas figuras para desequilibrar a professora Susana e conduzir a discussão sobre polígonos] Lucia: [mostrando uma linha fechada curva] Isso é polígono? Susana: Não... Isso parece mais pra mim um círculo. Pra mim esse não é polígono não. Lucia: E esse segundo? Susana: Esse é. Lucia: E porque esse é polígono e esse não. Qual a diferença entre os dois... Susana: Pra mim, polígono tem lados e ângulos. Lucia: e esse outro? É polígono? Susana: Também não é polígono. Lucia: Por quê? Susana: Porque é aberto. Não está fechado. [...] Lucia: Então agora fala pra mim o que é polígono... Polígono é o que? Susana: Polígono é uma figura com ângulos... Com lados, que se fecham... Que se completam, que se fecham... [...] Lucia: E esse daqui? [apontando para a construção de uma figura com dois lados retos e um curvo] tem ângulos, é fechada, com lados... É polígono? Susana: Pra mim é, mas não da forma convencional... Porque pra mim tem que ser reto... Tem lado reto. [...] Susana: Mas que pobreza, heim... Se eu soubesse que conversaríamos sobre polígono hoje teria estudado... [risos] (transcrição da gravação em áudio de 15/set/2008) A partir das construções de exemplos e contra-exemplos, a professora Lucia foi desestabilizando Susana e fazendo-a refletir sobre características que estava pontuando para a definição de polígono. Acreditamos que o desenvolvimento da definição seja importante e necessitamos analisar os exemplos e contra- 227 exemplos. Dessa forma, vamos de acordo com o que Rina Hershkowitz (1994, p. 16) afirma quando diz que “a definição, portanto pode ser considerada como um critério para instâncias de classificação entre exemplos conceituais positivos e negativos [por nós denominados de contra-exemplos]”. A professora Susana foi clareando e (re) construindo os conhecimentos geométricos. Algo parecido já tinha sido realizado no encontro de 2007, mas Susana precisava repensar e reformular suas definições de polígono. Foi interessante perceber que precisamos estar atentos aos momentos de cada um, pois aprendemos de maneira diferenciada e, muitas vezes, não levamos isso em conta ao trabalharmos com alunos ou ao realizarmos formações iniciais e continuadas. Esse relato confirma, mais uma vez, o que Nacarato e Passos (2003) já afirmavam sobre a formação de geometria deficitária obtidas pelas professoras das séries iniciais. Também sobre o pouco conhecimento geométrico, inclusive em relação “ao reconhecimento de figuras geométricas, sem, no entanto, chegar a distinguir nem mesmo os aspectos figurais dos conceituais” (NACARATO; PASSOS, 2003, p. 69). Confirmamos a necessidade de focalizar formações continuadas nesses tópicos deficitários de matemática. Figura 21 – Quadro com desenhos e definição de polígono Queremos destacar que a interação entre os componentes do grupo deu abertura para essa professora afirmar, em diferentes momentos, que não sabia ou não se lembrava dos conteúdos discutidos. Ela não se sentiu constrangida ou menosprezada por não lembrar, mas participou, de maneira interativa, das discussões e foi construindo seus próprios significados. A sua última fala 228 demonstrou seu bom humor e sua clareza de que para discutir alguns assuntos precisaria estudar anteriormente. O trabalho com o geoplano circular produziu bons frutos, apresentamos num evento de Educação Matemática parte do que foi desenvolvido com alguns alunos e algumas de nossas aprendizagens (HOFFMAN; SANTOS-WAGNER; SILVA, 2009). A geometria nas aulas de Susana Em diferentes momentos, a professora Susana mostrou sua admiração pelos trabalhos com materiais concretos e lúdicos que o ensino da geometria pode proporcionar. Susana estava preocupada em proporcionar aos seus alunos uma matemática diferente, encantou-se com o trabalho com a geometria, apesar de afirmar que possuía dificuldades. No grupo, ela mostrou que estava disposta a aprender mais sobre geometria. Colocamos, a seguir, uma sequência de aulas da professora Susana que revela um pouco do que fizemos em 2007, com sua turma de 3ª série. Escolhemos essas aulas para serem relatadas por causa do nosso envolvimento com essa turma e o trabalho inicial que realizamos sobre geometria com Susana. Destacamos, em linhas gerais, o que aconteceu durante as aulas, identificando os pontos para os quais queremos chamar a atenção, relacionando parte de aprendizagens das professoras ao trabalho com geometria nas séries iniciais. Colhemos informações de nossas anotações no caderno da pesquisadora, referentes às aulas de Susana. Colocamos algumas fotos para darem ideia do que realizamos e das produções dos alunos. 229 10ª aula: realizada dia 03/set/07 Professora Susana pensou em fazer uma oficina sobre sólidos geométricos intitulada por “oficina de geometria” para trabalhar a questão da reciclagem. Para isso, propôs aos seus alunos que fizessem uma lixeirinha individual com metade da caixa de leite que tinham arrecadado para essa atividade. Eles deveriam encapar as caixas de leite cortadas e enfeitá-las como quisessem para que pudessem utilizar sobre a mesa e não jogar lixo no chão. Os alunos estavam dispostos em grupos de, no máximo, quatro crianças. Alguns alunos já tinham iniciado essa atividade e deram apenas continuidade e ajudavam os demais colegas. Como a maioria havia realizado a tarefa eu me intrometi e perguntei se não poderíamos trabalhar com as planificações dos sólidos geométricos. Ela afirmou que não tinha pensado nisso, mas que seria interessante. Pediu para que eu conduzisse essa parte da aula e que desenvolvesse a atividade de planificação com seus alunos. Eu pensei que seria uma boa oportunidade para orientá-la sobre como os alunos podem ir além de nossas expectativas. Iniciando a atividade, pedimos para que cada grupo de alunos pegasse uma das caixas que tinha sido mostrada pela professora Susana e tentassem desenhá-la aberta, somente utilizando, a princípio, a imaginação, não podendo nesse primeiro momento desmontar ou cortar a caixa para realizar a planificação. No início os alunos ficaram apreensivos e perguntavam como poderiam fazer sem abrir a caixa, porém com o tempo e com o encorajamento que lhes dávamos, começaram a desenhar, utilizando diferentes estratégias. Uma delas foi a de contornar os lados das caixas, outros utilizavam réguas para realizar as linhas retas, mas não realizavam medidas nas caixas que tinham em mãos. Alguns ainda desenharam à mão livre, sem se preocuparem com a utilização de materiais que poderiam representar as linhas retas dos contornos das caixas. 230 Figura 22 – Alunos fazendo as planificações em 03/set/07 Um fato interessante foi que eles queriam mostrar seus desenhos e perguntar se tinham realizado corretamente a atividade. Todos os alunos realizaram essa atividade e não houve aluno que deixou de fazer como acontecia em outras atividades. Alguns copiavam as planificações de outros colegas do grupo. Eles nos entregaram as planificações e tivemos resultados bem interessantes, com detalhes e com os significados iniciais dessas superfícies em suas planificações. Para nós, professores, esses significados iniciais representaram „erros‟ matemáticos que precisavam ser discutidos em outros momentos. Figura 23 – Planificações dos alunos da professora Susana de paralelepípedos Verificamos que esses alunos não representaram todos os lados da caixa que escolheram, mas já foram bem interessantes as planificações, por serem as 231 primeiras tentativas e a representação da visualização desses alunos. Um fato que merece destaque foi a escrita da palavra retângulo feita por ambos os alunos, identificando as figuras geométricas planas que representam os lados desse sólido geométrico. Mesmo tendo realizado o desenho à mão livre, esses alunos quiseram destacar que as caixas que escolheram eram compostas de retângulos. Isso mostra certo conhecimento de algumas figuras planas, por parte desses alunos, a partir da visualização. Esse fato está de acordo com o que Hershkowitz (1994a, p. 20) afirma quando cita que “crianças nos estágios iniciais criam suas Imagens Conceituais basicamente visualmente”. Figura 24 - Planificações dos alunos da professora Susana de paralelepípedos e cubo No primeiro desenho, o aluno teve outra imagem mental de como abriria a caixa em forma de cubo, mesmo sem representar todas as faces. O segundo desenho mostra que esse outro aluno não representou a planificação, mas como ele visualizava a caixa. Esses tipos de desenhos são comuns em crianças que ainda não amadureceram suas visualizações ou imagens mentais. Na verdade, concordamos com Nacarato e Passos (2003) que, nesses casos, os alunos não representaram a planificação, conforme foi requisitado, mas o desenho da caixa. 232 Figura 25 - Planificação de aluno da professora Susana de um cilindro A planificação do cilindro foi bem interessante, pois eles utilizaram o fundo da lata de leite em pó para desenhar as bases do cilindro, mas não conseguiram visualizar ou perceber como seria a representação planificada da superfície lateral do cilindro. A aula estava encerrando e não tivemos a oportunidade de complementar algumas discussões, com os alunos sobre suas planificações. Porém, sabíamos que era necessário discutir, em outros momentos, as planificações com os significados construídos pelos alunos, para a construção adequada do conhecimento sobre esses objetos. Um caso parecido com esse foi exposto por Nacarato e Passos (2003). Essas autoras explicam algumas diferenças entre planificação e desenho do objeto afirmando que essa atividade possibilitaria integrar quatro elementos fundamentais: o objeto (lata de refrigerante), o desenho, a planificação e o conceito. [...] o desenho, no nosso entender, é mais fácil que a planificação, uma vez que esta exige uma compreensão e visualização das transformações ocorridas do objeto tridimensional para o bidimensional e vice-versa [...] Para realizar uma planificação com sucesso, o sujeito deve ser capaz de pensar nos dois tipos de transformação, ou seja, exige uma manipulação mental (NACARATO; PASSOS, 2003, p. 73). A professora Susana não tinha pensado em termos dessa aula. Assim eu ministrei as atividades até para mostrá-la que não é tão difícil trabalhar essa parte inicial da geometria com os alunos desse nível de ensino. Contudo, não tivemos tempo hábil para ampliar, nesse dia, algumas discussões sobre os „erros‟ dos alunos em suas representações. No encontro do grupo que ocorreu no mesmo dia (03/set/07), Susana comentou que ela teve a iniciativa de trabalhar com geometria (produção das lixeirinhas), após sua inserção no grupo, mesmo sem ter, completamente, o domínio do conteúdo ou da forma de abordagem. Isso demonstra uma volitude da professora em ir além de seus limites e agir diferentemente em suas aulas. Por essas razões, a geometria foi 233 considerada por nós como uma janela descoberta. O diálogo, a seguir, mostra o comentário da professora sobre a geometria e a influência do grupo. Susana: Uma coisa que a Sandra me colocou e ela foi muito bondosa, é que cheguei aqui com certo pavor de matemática... eu cheguei aqui apavorada... Sandra: E hoje fica inventando moda lá nas aulas. Susana: Hoje eu invento mesmo. Eu me soltei assim, de certo modo. A gente inventa moda. Aonde, que eu teria coragem de fazer oficina com as formas geométricas? Nunca! (transcrição da gravação em áudio do encontro de 03/set/07) Ao final, combinamos continuar as atividades em geometria na semana seguinte, mas a professora não sabia como continuar. Por esse motivo, me comprometi em dar continuidade a esse trabalho até para incentivá-la com algumas possíveis atividades. Uma das atividades levantadas pelo grupo foi a de abordar alguns conceitos básicos dos sólidos geométricos como o “rolar” ou “não - rolar”, que discutimos posteriormente nesse trabalho, quando relatamos essa atividade. Aprendemos sobre o conhecimento de nossos alunos e em especial, sobre conhecimentos matemáticos de geometria. 11ª aula de 2007 – realizada dia 11/set/07 A proposta dessa aula era de continuar com a “oficina de geometria”. Os alunos estavam dispostos na sala em grupos de quatro alunos e alguns sólidos geométricos já estavam colocados sobre algumas mesas no fundo da sala. A professora Susana propôs um desafio em forma de pergunta: „Rola ou não rola?‟ Propomos aos alunos para tentarem empurrar alguns sólidos, para verificarem se rolavam. Susana começou pedindo que tentassem rolar a lixeirinha que eles construíram e que estava sobre a mesa. Alguns questionamentos sobre o que é rolar surgiram. Alguns alunos acreditavam que como as lixeirinhas viravam, isso seria „rolar‟, conversamos sobre esse verbo e entramos num acordo que „rolar‟ é diferente de capotar ou virar sobre os lados. Dessa forma, „rolar‟ significava deslizar sobre o chão ou mesa e não virar algumas vezes. Os alunos chegaram à conclusão de que a lixeirinha não rolava, nem a caixa de creme dental. Já o rolo de papel alumínio rolava sim, pois deslizava no chão sem muito esforço. 234 Destacamos nossa aprendizagem sobre a importância de definir o que estamos adotando com cada palavra que trabalhamos com nossos alunos. Um exemplo disso foi a questão do solido geométrico “rolar” ou “não rolar”. Precisamos definir o que significa rolar quando falamos em sólidos geométricos. Se buscarmos em dicionários, vamos encontrar várias definições tais como: mover-se sobre si mesmo; ir rodando; revoluteando; deslocar-se (um objeto) girando ou movendo sobre si mesmo; rodar sobre uma superfície; fazer avançar (uma coisa) obrigando-a a dar voltas sobre si mesmo. Analisando algumas definições dos corpos redondos percebemos que usam dessa característica para identificá-los. Percebemos que é importante fazer a diferenciação entre as superfícies planas e não planas que compõem os sólidos geométricos. Dessa forma, notamos que não podemos trabalhar com um conceito de maneira isolada, precisamos identificar as diferentes variáveis que estão inter-relacionadas no que estamos desenvolvendo para que possamos estar preparados para desenvolver um trabalho adequado. Na matemática e também na física existe uma diferença entre deslizar e rolar, sólidos geométricos são colocados numa superfície inclinada e os corpos redondos realizam o movimento de rolamento e os poliedros não rolam, mas deslizam dependendo da inclinação. É interessante colocar a diferenciação entre rolar em qualquer direção ou sobre todas as suas superfícies e rolar apenas em algumas de suas superfícies. Outros sólidos foram utilizados e testados pelos alunos para verificarem quais rolavam e quais não rolavam. Nessa atividade percebi que alguns alunos confundiam e trocavam a nomenclatura dos sólidos geométricos com algumas figuras planas. Podemos citar o exemplo do cubo sendo denominado de quadrado. Nesse momento, notei que precisávamos trabalhar de forma mais sistemática a fim de contribuir para a compreensão dos alunos quanto a algumas diferenças e dos nomes dos sólidos que estávamos trabalhando. Os alunos dessa turma eram bem agitados e, nesse dia, estavam ainda mais agitados por causa da aula diferenciada em grupo. Para controlar um pouco a agitação, resolvemos realizar uma brincadeira, no estilo de gincana, com 235 algumas regras para ver se conseguíamos trabalhar melhor. Eu propus que a cada resposta correta o grupo ganhasse um ponto e se conversassem ou atrapalhassem o colega ou outro grupo, perdia um ponto. Precisamos de paciência para que os alunos entendessem e respeitassem as regras, mas acreditamos que tenha sido bom para eles começarem a realizar tarefas com regras impostas para sua realização. Esses alunos tinham muita dificuldade em seguir regras, mas sabíamos que esses tipos de atividades levam um tempo para os alunos acostumarem. Comentamos aqui sobre normas sociais e sobre contrato didático, que deve ser trabalhado a cada dia nas aulas. Poderíamos apontar vários autores que debatem sobre esses limites e sobre o contrato didático em sala de aula, mas não faremos nesse momento porque mudaríamos nosso foco da pesquisa. Um fato interessante que merece destaque foi o fato de que em várias aulas presenciamos um acordo da professora com seus alunos que funcionava como garantia de organização e silenciamentos dos alunos. A professora apagava a luz sempre que seus alunos estavam muito agitados, falando alto, andando pela sala, brincando, dentre outras travessuras. Ela somente acendia a luz após os alunos se organizarem e ficarem em silêncio. Acreditamos que isso seria um tópico importante para ser detalhado em outro momento. Começamos a atividade, pedindo para que eles relacionassem cada sólido geométrico representado por uma embalagem com alguma coisa de que eles se lembrassem. Na medida em que apresentávamos os sólidos trabalhávamos a nomenclatura matemática. Colocamos, a seguir, algumas das respostas desses alunos, em relação a comparações de cada sólido correspondente com formas ou objetos conhecidos por eles. Cone: parece com a forma da casquinha de sorvete, chapéu de bruxa, ponta da lona do circo, ponta do lápis e o cone de trânsito. Cilindro: parece com a forma de um cano, poste, lápis, rolo de papel higiênico e com rolo de macarrão. Paralelepípedo: caixa de leite, caixa de remédio e caixa de sapato. Cubo: parece com um dado. 236 Esfera: parece com a forma da bola futebol, bola de gude, sol, lua e com o globo ocular. Pirâmide: pirâmides do Egito. Temos consciência de que alguns dos exemplos do nosso mundo físico não representam perfeitamente os sólidos geométricos trabalhados. Estávamos trabalhando naquele momento com a visualização e a representação mental que cada criança realizava em suas comparações. Sabíamos que se tratava de um estágio inicial de identificação dos objetos geométricos, mas acreditamos, assim como Hershkowitz (1994a, p. 58), que essa “visualização é um instrumento necessário na formação dos conceitos geométricos”. Posteriormente, voltamos à discussão dos sólidos geométricos que rolavam e os que não rolavam. Cada grupo deveria falar um objeto e sua relação com o „rolar‟. Na sequência, colocamos alguns exemplos dados por esses alunos: Rolou: lápis, caneta, lata, rolo de papel alumínio, cone e esfera. Não rolou: caixas de creme dental e de leite, cubo, pirâmide e prisma ortogonal (caixa de presente que estava sobre a mesa). Após perceber que alguns alunos faziam confusões com nomenclaturas de figuras planas e espaciais decidi comentar algumas diferenças entre esses dois tipos de entes geométricos. Quando iniciei a atividade, a professora Susana perguntou se poderíamos falar como „planos geométricos‟ ao invés de figuras planas, fazendo a comparação com os „sólidos geométricos‟. Afirmei que poderíamos falar em figuras geométricas planas, porque planos geométricos poderiam ser confundidos com outros entes geométricos, diferentes das figuras planas que desejávamos identificar. Nesse exemplo podemos perceber que a professora Susana também estava, nesse momento, construindo seus próprios conhecimentos geométricos e fazendo correlações. Após o recreio, pedimos que as crianças realizassem a planificação de uma das embalagens que parecia com um paralelepípedo para darmos continuidade à aula anterior, na qual eles já tinham planificado. Porém, dessa vez, eles 237 poderiam abrir, cortando em uma das dobras da caixa. Os alunos não tiveram dificuldades nessa atividade. A maioria contornou a embalagem depois de aberta, e pedi para eles representarem as dobras nas suas planificações. Alguns alunos desenharam as dobras pontilhadas e outros com linhas cheias. Chamei a atenção deles para o fato de que nas embalagens existiam algumas partes que serviam para o seu fechamento (abas das caixas), mas que não eram necessárias para a planificação do paralelepípedo. Contudo, não pedi que eles retirassem as mesmas de seus desenhos, pois estávamos representando as embalagens abertas. Conversamos um pouco sobre a esfera e como seria difícil sua planificação. Nessa ocasião, aproveitei para perguntar se eles sabiam o porquê do nome „caneta esferográfica‟. Para realizar uma associação com algo conhecido pelos alunos perguntei-lhes o que acontecia, quando alguém rolava uma bola molhada no chão. Eles prontamente responderam que ficava uma marca molhada no chão. Fiz, então, a comparação com a caneta, disse que a caneta esferográfica tinha uma pequena esfera na ponta e que girava enquanto escrevíamos, deixando uma marca de tinta no papel. Os alunos acharam interessantes, e uma aluna comentou: “a bolinha vai pegando a tinta de cima e levando para baixo girando”. A professora Susana também desconhecia esse fato. Comentei também sobre a planificação do cilindro, que alguns tinham realizado de maneira imprópria, na aula anterior de geometria. Aproveitei para abrir uma parte interna de proteção de um perfume mostrando a planificação do cilindro. Eles acharam diferente e interessante, pois tinham uma imagem visual imprópria dessa planificação (fig. 5). Para finalizar esse momento, pedimos que os alunos escrevessem em seus cadernos algumas coisas que conversamos. Eles deveriam registrar de maneira escrita, alguns exemplos de coisas que vemos e utilizamos que se perecessem com as formas dos sólidos geométricos que estudamos. Para isso, coloquei os nomes dos sólidos no quadro e pedi que copiassem. A maioria dos alunos conseguiu realizar as comparações e elencar os exemplos. Acreditamos 238 que esses alunos precisavam entender que a escrita ou o registro é uma importante forma para reforçar o raciocínio e a construção dos conceitos (SANTOS, 1997; VYGOSTSKY, 1988/1934). Ao final, a professora Susana comentou que gostou muito da aula, apesar da agitação das crianças. Conversamos sobre a possibilidade e necessidade de realizar outras atividades escritas, para que os alunos continuassem a trabalhar com esses conceitos. Comentei que estávamos realizando apenas algumas atividades iniciais, mas que precisávamos reforçar o assunto em outros momentos. Percebi que a professora aprendeu a realizar essa atividade com seus alunos e continuou a construção de alguns conceitos geométricos que não estavam, completamente, organizados em sua mente. 12ª aula de 2007 –– realizada dia 18/set/07 Nesse dia, quando cheguei, a professora estava conversando com a pedagoga. Ao iniciar a aula de matemática, ela trabalhou três contas utilizando a multiplicação por um número de dois algarismos. Ao final dessa atividade, os alunos foram para o recreio e indaguei à professora qual seria o planejamento. Questionei se ela continuaria as atividades de geometria, e ela me disse que trabalharia com o livro. Nessa semana, a professora Susana não pode comparecer ao encontro do grupo, por esse motivo, não planejamos juntas as atividades para a semana a que estamos nos referindo. Propus, então, que desenvolvêssemos a atividade comentada anteriormente no grupo, de fazer construções geométricas com canudinhos. Dessa forma, após o recreio, iniciamos a construção das estruturas de alguns sólidos geométricos com os alunos. O material foi distribuído por alguns alunos e, no primeiro momento, construímos um tetraedro ou pirâmide de base triangular. Um fato interessante foi que as duas alunas portadoras de necessidades especiais, que eram acompanhadas pela estagiária, participaram, juntamente com os outros alunos, dessa atividade de geometria. Aliás, diferentemente de outras situações, elas participaram de todas as atividades de geometria que desenvolvemos e não tiveram problemas na execução. 239 Na construção da pirâmide, alguns alunos se mostraram impacientes, demonstrando mais uma vez que possuíam dificuldades em trabalhar com regras, com sequência de tarefas. Outras reações também foram detectadas por nós: alguns queriam que nós, professoras, fizéssemos para eles, outros ficavam sem paciência e deixavam de continuar a construção, alguns tinham dificuldade em amarrar o nylon, dentre outras. Mas em grande parte os alunos se sentiram motivados e envolvidos com a realização da atividade. A professora Susana escreveu todos os passos que seguimos na construção, ou seja, ela escreveu passo a passo tudo o que fizemos. Porém, não consegui anotar o que ela colocou no quadro e não há registro disso em meu caderno de pesquisadora. Figura 26 – Construções de pirâmides com canudinhos Ao acabar a construção da pirâmide de base triangular aproveitei a estrutura feita por canudinhos e comentei com os alunos sobre os nomes relacionados aos sólidos geométricos, utilizando a pirâmide. Falei das arestas, dos lados e da base. Identificando dessa forma os lados triangulares, justificando o porquê do nome pirâmide. Aproveitei a situação e comentei sobre os prismas, mostrando os elementos desse sólido. Nessa aula, construímos também uma pirâmide de base quadrada ou retangular, dependendo dos canudinhos recebidos por cada criança. Os alunos gostaram da atividade e mesmo com algumas limitações e agitações todos participaram. Isso foi considerado como um ponto positivo. Outro ponto positivo foi o fato de a professora Susana ter visto que seus alunos estavam produzindo além do que ela esperava. Ela estava aprendendo como poderia trabalhar com „oficinas‟ sobre geometria com seus alunos. Ao final, a professora comentou 240 que tinha certeza que eles aprenderam mais sobre geometria e que não se importava com a agitação dos alunos, desde que eles estivessem aprendendo. Queremos chamar a atenção para o fato de a professora ter comentado que foi bom ter aprendido essas coisas sobre geometria, mas que gostaria de ter aprendido há 20 anos, pois dessa forma teria utilizado essa atividade em outras turmas, com as quais já trabalhou nesses anos. Percebemos com essa fala que Susana afirma não ter o costume de abordar geometria por não conhecer e não ter aprendido em sua formação inicial. Essa fala demonstra que essa professora já está desenvolvendo a consciência metacognitiva, importante passo da tomada de consciência dela sobre o que sabe e o que ainda precisa aprender. A situação vivida motivou-a a refletir sobre sua aprendizagem, influenciando a metacognição (SANTOS, 1993, 1993a, 1994, 1997). Confirmamos, a partir da fala de Susana, a situação apresentada por nós, o estudo de geometria na educação básica, na pedagogia e nas licenciaturas foi de certa forma abandonado ou deixado de lado nos últimos 30 anos nos currículos brasileiros (LORENZATO, 1995). Como ponto negativo, indiquei a pouca paciência por parte de alguns alunos com esse tipo de atividade, que exige concentração e habilidade manual. Alguns ficavam irritados e acabavam estragando seus materiais e os dos outros. Outros queriam que as coisas acontecessem do jeito deles, e não, conforme planejamos a atividade. A forma de trabalhar, com os alunos, vai ao encontro com o conhecimento que temos deles. Precisamos construir normas sociais com os alunos nas aulas e inserir regras claras no contrato didático estabelecido e que precisa ser renegociado a cada aula. O conhecimento dos alunos nos leva a refletir sobre problemas com os limites, de cada aluno, e da turma como um todo. Na aula do dia 24/set/07, eu entreguei à professora Susana uma folha com atividade, envolvendo alguns conceitos trabalhados por nós sobre geometria. Essa folha de atividade foi planejada para ser realizada de forma escrita e pode ser vista no anexo B. Ela gostou e disse que utilizaria com seus alunos num outro momento. 241 14ª aula de 2007 – realizada em 01/out/07 A professora Vânia me acompanhou nessa aula. Quando chegamos a professora Susana comentou que tinha iniciado o trabalho com a folha de atividades de geometria que eu levara para seus alunos. Seu planejamento para a aula desse dia seria terminar a folha e que poderíamos realizar outra atividade como brincadeira sugerida por Vânia. Novamente, os alunos foram divididos em grupos de, no máximo, quatro crianças. Susana iniciou comentando sobre o filme „Harry Potter‟ para trabalhar questões de regras a serem seguidas. A professora Susana sempre esteve perspicaz para aproveitar as oportunidades e relacionar o que estava sendo construindo com seus alunos em aulas com a realidade do mundo atual ou com outras situações que eles pudessem entender e correlacionar. Após terminarem de responder a folha sobre sólidos geométricos, iniciamos outra atividade de perguntas e respostas em forma de jogo. A primeira coisa que trabalhamos com os alunos foi sobre as „regras do jogo‟, na tentativa de ajudá-los a compreender que precisamos seguir regras e não podemos fazer as coisas como queremos. Eles deveriam fazer silêncio, responder às perguntas por escrito, e não, em voz alta, não atrapalhar os outros grupos, com isso ganhariam pontos positivos e se atrapalhassem perderiam pontos. Após esclarecermos as regras, entregamos uma folha A4 em branco para cada grupo, na qual os alunos deveriam escrever suas respostas. Decidimos que eu, professora Sandra, faria as perguntas e a professora Vânia anotaria no quadro a pontuação de cada grupo. Susana ajudar-nos-ia circulando pelos grupos já que conhecia todos os alunos melhor do que nós. Ao iniciar o „jogo‟, alguns alunos começaram a responder em voz alta. Demorou um pouco para perceberem que deveriam conversar apenas com os membros do seu grupo, e que falando alto poderiam dar a resposta para outro grupo. Algumas perguntas que fizemos foram: Que forma é essa [mostrando um cilindro]? O cone rola ou não rola? Qual o nome do sólido geométrico que tem este formato [paralelepípedo]? O que tem na sala que se parece com a forma de um cilindro? Quantas faces tem um cubo? Esse número de faces é 242 par ou ímpar? Cabe notar que os alunos se confundiram mais com o que seria um número par ou ímpar do que com o número de faces que possui um cubo. Figura 27 – Atividade em grupo em forma de jogo sobre geometria Após o recreio, as professoras Vânia e Susana iniciaram outra atividade com os doces que Vânia havia levado para os alunos. Elas esconderam uma caixa de pirulitos dentro de uma sacola escura e as crianças deveriam apalpar, sentir o peso e a forma para tentarem descobrir o que estava escondido. A professora Susana brincou de forca com eles, para descobrirem que tinha pirulito dentro da sacola, eles ficaram felizes e, como sempre, agitados. Antes de mostrar o que tinha dentro da sacola a professora Vânia e, principalmente, Susana trabalharam outros conteúdos como peso total, peso individual, e quantidade. Susana gosta de aproveitar diferentes oportunidades que surgem em suas aulas para abordar, de maneira rápida, outros tópicos que podem relacionar com o que estava sendo visto. Susana mostrou-nos em diferentes momentos que tenta articular e integrar outros conhecimentos que possui em suas aulas. A princípio, ela relacionava muito com questões sociais e de outras disciplinas. Depois da participação no grupo, ela começou a relacionar com outros conteúdos matemáticos também. A tomada de consciência de Susana, percebendo que conseguiria relacionar e articular bem os conhecimentos de matemática, com outros assuntos e com o conhecimento geral de currículo foi algo observado por nós. Aos poucos, com o desenvolvimento dessa atividade foi ficando mais e claro para os alunos as normas sociais de aula e o contrato didático estabelecido e negociado por nós. Os alunos foram aprendendo a 243 aceitar e respeitar seus próprios limites, os dos colegas e os de outras pessoas. Figura 28 – Alunos tentando utilizar diferentes sentidos para descobrir forma geométrica Em aulas posteriores trabalhamos outras atividades que envolviam geometria como foi o caso do trabalho com as folhas da série „A‟, a mais conhecida por nós é a folha de papel „A4‟. E atividades com origami, com a participação da professora Lucia, que esteve presente em uma aula, trabalhando com as crianças alguns origamis. Muitas dessas atividades que foram desenvolvidas em geometria foram utilizadas na apresentação dos trabalhos realizados, em 2007 por essa turma na Mostra Cultural da escola que ocorreu em 30 de novembro de 2007. No ano de 2008, a professora Susana continuou o trabalho com a geometria, algumas atividades ela conseguiu realizar sozinha com sua outra turma de 3ª série. Ela adquiriu autoconfiança para iniciar o trabalho com seus alunos na construção de conceitos geométricos. Em alguns momentos, participamos com ela e contribuímos nas aulas de geometria, mas não abordamos neste trabalho, pois tiveram interseções com as aulas ministradas em 2007. A seguir, aparecem algumas fotos de alunos e 2008 trabalhando a geometria das embalagens, numa oficina de sólidos geométricos, organizada pela professora Susana. Notamos que, mesmo estando ainda construindo seus próprios conceitos geométricos, essa professora modificou suas aulas e acrescentou a 244 abordagem de geometria. Isso reflete bem o que Nacarato e Passos (2003, p. 136) comentam, quando afirmam que “o professor aprende e incorpora novas práticas tendo como ponto de partida os saberes experienciais partilhados”. Nesse caso, o que ela pôde vivenciar conosco em aulas de geometria no ano de 2007. Figura 29 – Oficina sobre sólidos geométricos – turma da professora Susana 2008 A geometria nas aulas de Beatriz A professora Beatriz começou a realizar o trabalho com os conteúdos geométricos em suas aulas de maneira independente, sem a nossa participação nesses momentos iniciais, somente a partir das propostas do grupo, conforme indicamos. Ela havia afirmado que, por insegurança, trabalhava apenas questões referentes às medidas, à área e ao perímetro. No entanto, a partir de nossas discussões e leituras, no grupo de estudos, ela se sentiu motivada a trabalhar outros conceitos de geometria, com seus alunos na 3ª série, em 2007, e na 4ª em 2008. Relatamos, a seguir, uma sequência de aulas da professora Beatriz em 2008, com sua turma de 4ª série, na qual trabalhamos a construção de alguns conceitos geométricos. Escolhemos essas aulas porque delas participamos de forma ativa, juntamente, com a professora. 245 4ª aula de 2008 – realizada dia 11/abr/08 A professora já estava trabalhando com sólidos geométricos quando chegamos para observar e participar de sua aula. Os alunos estavam sentados em duplas e no quadro, havia um programa, a ser cumprido durante a aula. Queremos destacar que escrever o programa do dia, no quadro, consistia numa ação realizada pela professora, para que seus alunos pudessem ter um panorama do trabalho desenvolvido nas aulas. A sequência, referente à geometria dessa aula consistia em: sólidos geométricos, planificação, confecção de caixinhas e trabalhos com canudinhos. A professora já havia trabalhado uma pergunta que estava no quadro: “Onde a geometria está presente no nosso dia a dia?” As respostas também foram la registradas e cada aluno as copiou em seu caderno. Beatriz valoriza muito o registro escrito e sempre pede que seus alunos copiem ou anotem o que trabalharam nas aulas. Os alunos foram instigados a desenhar a planificação de uma caixa (um paralelepípedo), utilizando a imaginação, uma folha de papel A4 e outros materiais como a régua. A princípio, eles não poderiam abrir uma caixa para ver como seria, deveriam usar apenas a imagem mental que tinham da caixa aberta e, assim, desenhariam sua planificação. A maioria dos alunos fez por tentativa e desenharam de diferentes formas a planificação do paralelepípedo. Houve alunos que perguntaram se seus desenhos estavam corretos ou como poderiam concretizar a tarefa, apenas imaginando, alguns tentavam dobrar a folha inteira para entender como deveriam cortar; e outros, ainda, cortavam a folha e depois desenhavam em outra folha, identificando seus próprios erros. Ressaltamos a importância de deixar os alunos experimentarem, testarem suas hipóteses e tirarem suas conclusões. Para a aquisição de conhecimentos geométricos, consideramos fundamental o uso de diferentes formas para construir esses conceitos (HERSHKOWITZ, 1994a,1994b; NASSER; TINOCO, 2004). 246 Depois dessa atividade, foi proposto aos alunos que realizassem um desenho sobre a visualização de um objeto, fazendo uma junção de suas vistas: lateral, frontal ou superior. Para isso, foi colocada uma caixa de sapato (amarela) num lugar visível por todos, e cada um teria que desenhar a parte da caixa que conseguia ver de onde estivesse sentado. Não podendo levantar ou sair do lugar. Os alunos desenharam conforme suas imagens mentais e o ângulo de onde tinham visto a caixa e, posteriormente, a pedido da professora Vânia, alguns deles apresentaram, seus desenhos para a turma explicando e mostrando as partes que conseguiam ver de seus lugares (conforme figura, a seguir). Figura 30 – Caixa para representar a vista e alunos desenhando Alguns alunos precisaram de orientações sobre o que desenhar. Dessa forma, nós percorríamos as carteiras e conversávamos com os alunos, mostrando e questionando-os sobre suas visualizações. Acredito que foi uma atividade bem interessante, pois eles perceberam que observamos os objetos, de maneira diferenciada dependendo do campo de visão de cada um e da posição na qual observamos o objeto. Para que crianças trabalhem com desenhos em perspectiva é necessário que elas aprendam a ver, interpretar e produzir significado daquilo que está a sua frente. Nacarato e Passos (2003) citam as pesquisas de Freudenthal (1983)45 sobre esse assunto e afirmam o que acabamos de registrar. É uma questão de 45 FREUDENTHAL, Hans. Didactical Phenomenology of Mathematical structures. D. Reidel: Dordrecht, 1983. 247 aprendizagem, o trabalho e desenvolvimento de perspectiva. Essas autoras ainda apontam a intervenção pedagógica como importante para que os alunos possam ler, interpretar e realizar representações planas de objetos tridimensionais. Foi o que presenciamos nessa aula de Beatriz, pois, com nossas conversas, dicas, e questionamentos, os alunos foram capazes de realizar suas representações. Figura 31 – Professora Vânia conversando com o aluno sobre seu campo de visão. Figura 32 – Alunos explicando o que desenharam a partir da visualização da caixa. A professora Beatriz retomou a planificação e deu continuidade à atividade. Ela abriu, cuidadosamente, uma caixa de remédios por uma de suas dobras e foi exibindo aos alunos como seria a caixa aberta. Percorrendo a sala, ela pedia aos alunos que comparassem com o que tinham desenhado em suas planificações. Beatriz sugeriu que os alunos cortassem suas planificações e tentassem montar uma caixa. Com essa atividade, alguns reconheceram “erros” que tinham cometido, ao identificarem que faltavam ou sobravam faces 248 (partes) do paralelepípedo e não conseguiam montar de maneira completa o sólido. Perceberam, enquanto montavam que, era necessário corrigir algumas planificações para que pudessem obter uma caixa quando a montavam. Nacarato e Passos (2003) abordam esse tipo de atividade e o trabalho com os alunos, afirmando que: Quando se imagina a construção de algum objeto específico, como uma caixa, não se pode iniciar tal construção sem antes “ver”, na mente, o que ainda não pode ser visto com os próprios olhos. Tal destreza exige aprendizagem e deve ser sistematicamente construída em diferentes momentos, tanto na escola como fora dela. Entretanto, na escola, essa capacidade poderá ser explorada com a análise de aspectos visuais de uma figura geométrica, de modo que se torne possível desenhá-la. Para desenhar um objeto geométrico, é preciso que o indivíduo seja capaz de imaginar o resultado final, antecipar mentalmente e inferir corretamente a forma plana (bidimensional) e as transformações necessárias para apresentá-la na forma espacial (tridimensional) (NACARATO; PASSOS, 2003, p. 83). Concluímos que essa atividade contribuiu, como as autoras comentam na citação acima, para iniciar a formação da habilidade de relacionar as representações planas, tendo em vista à construção do objeto tridimensional pelas crianças. Atividades desse tipo contribuem para a formação da imagem conceitual, quando as pessoas utilizam tentativa, análise e reformulação da construção do sólido geométrico está desenvolvendo a imagem conceitual do objeto. A atividade apresentada, a seguir, também trabalha com a construção final do objeto a partir da construção de suas partes. Após encerrarmos a atividade, iniciamos a construção de uma estrutura de pirâmide com canudinhos e fios de nylon. Cada aluno recebeu seis pedaços de canudinhos e um pedaço de fio de nylon. Realizamos com eles a construção, sendo, primeiramente, a composição de um triângulo, utilizando três canudinhos. Posteriormente, adicionamos, ao fio de nylon, mais dois canudinhos, formando assim o segundo lado de nossa pirâmide 46 ; e para finalizar, acrescentamos o último pedaço de canudo para compor o terceiro lado de nossa pirâmide. Completando, amarramos o fio de nylon. Questionei, aos poucos, alguns detalhes que poderiam ser abordados, a partir da 46 Apesar de ser uma estrutura composta apenas de arestas e vértices, utilizamos a nomenclatura pirâmide, ao nos referimos a essa construção. 249 construção que fizemos. Enquanto eu comentava, ou quando os alunos respondiam aos meus questionamentos, a professora Beatriz anotava, no quadro, algumas palavras-chave. Comentei que construímos pirâmide de base triangular, e quando todos os canudinhos (representando nossas arestas) fossem iguais, teríamos um tetraedro. Chamei a atenção dos alunos para as faces da pirâmide que são triangulares, diferentes das faces que eles desenharam ao realizarem a planificação. Mostrei que tínhamos formamos uma estrutura sem as faces, apenas com as arestas e os vértices, e fizemos a contagem do número desses componentes. Depois, pedi emprestadas algumas pirâmides dos alunos, fui mostrando que, se juntássemos, poderíamos obter outros poliedros diferentes (conforme figura a seguir) e expliquei que eles poderiam construir, com canudinhos e fio de nylon, outras estruturas de sólidos geométricos. Essa atividade ficou como proposta da professora Vânia a fim de que eles fizessem em casa. Figura 33 – Pirâmides construídas pelos alunos e delimitação de outros sólidos com pirâmides. Esse tipo de atividade contribuiu para a construção do conceito por parte do aluno, pois eles tiveram a possibilidade de manusearem, de realizarem a construção e não apenas de observarem um professor fazer. Clements e Battista (1992) afirmam ser importante a utilização de materiais manipuláveis, porém, como incentivo para o início da construção de conceitos geométricos. Concordamos com Nacarato e Passos (2003, p. 44) ao afirmarem que: O processo de observação passiva não garante a apreensão das propriedades do objeto. Porém, quando o professor permite a manipulação ou, inclusive, a construção do objeto, a compreensão da estrutura, sua percepção espacial pode ser mais completa. 250 A professora Beatriz pediu que eles escrevessem em seus cadernos o que fizeram na aula desse dia, e que não se esquecessem dos termos matemáticos aprendidos durante a atividade e de informações que poderiam ser visualizadas nas anotadas no quadro. Ainda levantou algumas perguntas para ajudá-los a pensar no que escrever, tais como: “Por que fizemos essa atividade? O que aprendemos? Como realizamos a atividade?” O texto deveria ser realizado nas duplas, mas alguns alunos fizeram seus registros sozinhos. Essa professora agiu, conforme Santos (1997) indica em seu livro sobre avaliação, que o professor precisa formular perguntas para ajudar seus alunos a alargar o raciocínio crítico e a apresentar argumentos e justificativas ao resolverem atividades propostas. Figura 34 – Alunos realizando registros escritos sobre o que trabalharam na aula do dia 11/04/08. A questão do registro escrito foi uma forma encontrada pela professora, a partir de discussões no grupo de estudos, para se aproximar do que seus alunos entenderam sobre o que estava trabalhando. Novamente, Beatriz encerra a atividade fazendo uso da linguagem escrita em aulas de matemática, reconhecendo como um procedimento que auxilia o aluno na construção de conceitos e clarear seus pensamentos e compreensões sobre os conceitos matemáticos explorados em aula. Além disso, a linguagem escrita permitiu a essa professora apreciar, ao longo do trabalho, o que seus alunos foram compreendendo da aula e o que julgaram importante (Santos, 1993,1997) Ressaltamos que cada aluno, ou dupla de alunos, se concentrou no que mais lhe chamou a atenção, mostrando a riqueza desse tipo de atividade. Exporemos alguns exemplos, para mostrarmos como percepções ocorrem de diferentes formas e como alguns alunos são mais detalhistas do que outros. 251 Alguns alunos escreveram apenas sobre a construção da pirâmide, conforme abordado anteriormente. Outros, foram mais detalhistas e colocaram, passo a passo, a construção, e houve os que escreveram de uma maneira geral. Confirmamos essas afirmações através das fotos e de suas respectivas transcrições. Texto em grupo Geometria Hoje, dia 11 de abril de 2008, tia Sandra nos ensinou a fazer formas geométricas com canudinhos e nylon, nós fizemos uma pirâmide. Primeiro nós fizemos um triângulo, depois pegamos mais 2 canudos e formou mais um triângulo, enfim pegamos o último canudo e formamos uma pirâmide. No final de tudo, tia Sandra mostrou que dá para fazer outras formas com mais pirâmides. Figura 35 – Registro escrito do grupo A de alunos sobre a aula de 11/04/08 Fazendo pirâmides Hoje dia 11 de abril nós criamos pirâmides com canudos cortados em três pedaços a pirâmide. A pirâmide é feita toda de canudos, agora vou mostrar como se faz: 1º. Pegamos seis canudos e 1 pedaço de nylon. 2º. Juntamos três e fazemos um triângulo. 3º. Juntamos mais dois, formou 2 triângulos. 4º E juntamos mais 1 e formamos uma pirâmide. 5º. Pulamos algumas mais difíceis de explicar, porque não falamos onde colocar o fio de nylon é muito difícil. Fim. Figura 36 - Registro escrito do grupo B de alunos sobre a aula de 11/04/08 252 Hoje, dia 11 de abril de 2008, tia Sandra e tia Vânia nos ensinaram a fazer uma pirâmide com canudinhos e fio de nylon. Vamos mostrar como se faz: Primeiro pegamos dois canudos e passamos o fio. Depois por outra ponta do fio (a maior) passamos mais um canudo, damos um nozinho e formou um triângulo. Passamos mais dois canudos pela maior ponta. Pela ponta menor passamos o último canudo, passamos por outro canudo e damos um nó. Pronto! Está feito quer ver!? Figura 37 - Registro escrito do grupo C de alunos sobre a aula de 11/04/08 Outros grupos abordaram, em suas escritas, outras atividades efetivadas na aula. Esses alunos também pontuaram, de forma mais geral, o que realizamos, sem destacar detalhes do procedimento das construções e atividades. Hoje, eu e minha amiga fizemos muitas coisas diferentes, começamos com um desenho que nós tivemos que imaginar como seria uma caixa aberta. E depois, nós tivemos que desenhar o que nós estávamos vendo da caixa. E também, fizemos uma pirâmide de canudos, foi divertido, mas é meio complicado, é um nó dali, um nó daqui e pronto, aqui está nossa pirâmide. Foi um dia muito legal. Figura 38 - Registro escrito do grupo D de alunos sobre a aula de 11/04/08 É interessante destacar que o grupo deixou explícito, estar a diversão presente, nesse tipo de atividade, como também houve quem demonstrasse ou falasse isso em aula, durante a realização das atividades. Concordamos com Dana (1994/1987), ao afirmar que atividades com geometria são diversões, tanto para crianças como para professores, e que esse talvez seja o beneficio implícito mais importante do trabalho com a geometria. 253 Hoje, dia 11/04/09 fizemos geometria imaginando a caixa aberta e também fizemos uma pirâmide de canudos e linha de nylon e também tivemos que observar a caixa da mesa que a gente estava e desenhar. Explicação 1. [desenho da planificação] caixa Bom a professora deu folha chamex para a gente desenhar a caixinha e depois ela abriu a caixinha, cortava e montava a caixa. 2. [desenho de seis canudos] canudos Bom, a gente também fez uma pirâmide de canudos que a tia... [Sandra ensinou...] Figura 39 - Registro escrito do grupo E de alunos sobre a aula de 11/04/08 Após a realização da atividade com canudos, professora Vânia e eu (professora Sandra), precisamos sair e não pudemos acompanhar o restante da aula desse dia. Porém, analisando o caderno de alunos, posteriormente, a essa aula, constatamos que Beatriz tinha produzido com seus alunos um „texto coletivo‟ 47 sobre a construção da pirâmide. Decidimos registrar esse texto coletivo para mostrar a sintetização dos registros da sequência de trabalho desenvolvido nessa aula. Quadro 17 – Texto coletivo escrito pelos alunos de Beatriz sobre pirâmides Texto coletivo: Fazendo pirâmide Hoje nós aprendemos com nossas professoras visitantes a fazer sólidos geométricos usando canudinhos e fio de nylon. Todos receberam 6 canudos e um fio de nylon. Com 3 deles fizemos 1 triângulo depois com mais 2 conseguimos fazer mais outro triângulo e com o último canudo, unindo-o aos triângulos num mesmo ponto obtivemos uma pirâmide de base triangular. A pirâmide de base triangular é um tetraedro porque possui 4 faces [iguais a triângulos eqüiláteros]. Este tetraedro possui 6 arestas e 4 vértices. Observamos que a pirâmide de base triangular possui 12 ângulos internos [ângulos das faces]. 47 Vamos aprofundar a questão da produção de textos coletivos realizados por essa professora, quando relatarmos a aula do dia 06/05/08. 254 Ao analisar essa sequência de atividades, envolvendo a escrita, podemos afirmar que a formação dos conceitos geométricos foi enriquecida, pois os alunos precisavam rever o que entenderam, como aprenderam, utilizar termos corretos e organizar seus pensamentos para que outras pessoas pudessem entender o que escreviam. Acreditamos, assim como Sandra Santos (2005, p. 128) que a linguagem escrita pode ser vista tanto como um instrumento para atribuir significados e permitir a apropriação de conceitos quanto como ferramenta alternativa de diálogo, na qual o processo de avaliação e reflexão sobre a aprendizagem é continuamente mobilizado (p. 128). A professora Beatriz inseriu a utilização da escrita em suas aulas e percebeu que, realmente, poderia manter um diálogo com seus alunos, com base nos textos produzidos por eles, fosse individualmente, fosse coletivamente. Notamos que os alunos conseguiam expressar suas ideias, cada vez mais de forma coerente, a partir da realização desse tipo de atividade em diferentes momentos (SANTOS, 1997; POWELL; BAIRRAL, 2006; LOPES; NACARATO, 2005). Além disso, a construção dos conceitos ficava mais clara, e eles podiam atribuir significados ao que estavam trabalhando. 5ª aula de 2008 – realizada dia 18/abr/08 Quando a profª Vânia e eu chegamos, a professora Beatriz já estava distribuindo embalagens aos alunos que não tinham levado de casa. Depois, solicitou-lhes que as observassem e as analisassem, durante um determinado tempo, para depois mostrarem aos colegas e conversarem com eles. Após alguns minutos, Beatriz começou a questioná-los sobre as embalagens e as características das mesmas. A maioria tinha, em mãos, caixas de remédios e deduziam que eram paralelepípedos. A professora fazia perguntas para ajudar seus alunos a comentar, de uma forma mais completa, as características das embalagens. Algumas das perguntas feitas por ela foram: “Que forma você acha que tem esse objeto? Dos poliedros, qual seria? Quantas faces ela tem? Essa caixa lembra o que? Como são as faces? Quantos vértices têm? E quantas arestas?” Ela também trabalhou com a questão do rolar ou não rolar. 255 Abordou assim vários conceitos trabalhados em aulas anteriores. É interessante observar como os alunos vão adquirindo o vocabulário matemático adequado, após o início do trabalho. Percebemos que a professora teve influência sobre isso, pois fazia questão de utilizar o vocabulário matemático adequado nas suas falas. Alguns alunos tinham embalagens que não possuíam faces com formas regulares, também apareceram cilindros, e isso foi aproveitado pela professora para abordar sobre algumas características apresentadas nas embalagens que utilizamos. Essa atividade foi interrompida por alguns minutos para que os alunos fossem cantar o hino nacional os outros alunos da escola. Quando retornamos à sala de aula, um aluno mostrou uma embalagem e a identificou como um poliedro de 10 faces, o que chamou a atenção por ter sua base ortogonal (com oito lados). Após constatação do aluno, iniciei uma abordagem sobre a nomenclatura desses tipos de sólidos. Falei então, sobre os prismas, sobre suas duas bases iguais e suas faces laterais em forma de retângulos. Depois, continuei com alguns questionamentos, tais como: “Para ser um prisma precisa ter apenas faces quadradas ou retangulares? Um paralelepípedo é um prisma ou não?” Partindo desses questionamentos iniciais, desenhei alguns prismas no quadro e escrevi uma definição, conforme pode ser visto na figura a seguir. Expliquei que os nomes dos prismas são diferenciados pelas bases que, por sua vez, são formadas por polígonos. Figura 40 – Quadro com desenhos e definição de prismas 256 Eu comentara, anteriormente, que as faces laterais dos prismas eram retangulares, mas lembrei de que as faces laterais devem ser identificadas como paralelogramos, abrangendo, de forma mais geral, os diferentes prismas. Destaquei que, quando as faces laterais são formadas por retângulos, esse sólido é chamado de „prisma reto‟, e quando as faces laterais são formadas por um paralelogramo oblíquo esse sólido geométrico recebe o nome de „prisma oblíquo‟. Figura 41 – Alunos realizando registros em seus cadernos Após essa abordagem, a professora Beatriz pediu aos alunos que abrissem suas embalagens, o quanto possível, pois algumas eram de plástico ou de outro material que não permitia o recorte. Eles deveriam fazer isso para desenharem a planificação das embalagens em seus cadernos. Comentei, em continuação, sobre a rigidez dos triângulos, para exemplificar a situação, montei um prisma com canudinhos e fio de nylon. Essa construção permitiu que o prisma ficasse móvel, podendo ficar reto ou oblíquo, de acordo com o modo como o seguramos. Em sequência, coloquei canudinhos nos lugares das diagonais das faces, e assim nas faces foram aparecendo triângulos, a estrutura foi ficando rígida e se transformando em um paralelepípedo. Passei entre as carteiras para que os alunos observarem como a estrutura ficava rígida, após inserir as diagonais e formar os triângulos. Ao descobrirem a rigidez do triângulo, eles deduziram em quais lugares poderiam identificar triângulos para dar rigidez à estrutura. Os alunos demonstraram ter 257 compreendido com exemplos do armário de aço, no telhado e lembraram-se outras situações como nos portões e portas. Ainda durante essa atividade, expliquei que estava colocando as „diagonais‟ de cada lado, e a professora Vânia passou a conversar com eles sobre esse ente matemático. Após alguns desenhos, os alunos foram convidados a expor, com suas próprias palavras, o que entenderam ser uma diagonal. Algumas respostas dos alunos foram: “É uma linha que vai ligar dois pontos. É uma linha que vai servir como suporte. Eu entendi que diagonal é um segmento de reta que une dois vértices. Segmento de reta interno que liga dois vértices”. Um dos alunos sugeriu que procurássemos em um dicionário, a definição de diagonal. Em um dos dicionários estava escrito: diagonal – “segmento de reta que une vértices não adjacentes de um polígono, segmento de reta que une vértices em faces não adjacentes de um poliedro”. Outra definição falava de diagonal principal, relacionando ao assunto de matrizes. A professora Beatriz pediu que eles escrevessem a definição de diagonal de acordo com o entendimento de cada um. Figura 42 – Trabalho sobre diagonais: abordagem profª Vânia e caderno com anotações 7ª aula de 2008 – realizada dia 09/mai/08 Quando cheguei, a professora Beatriz estava trabalhando história com seus alunos. Após terminar essa parte da aula, ela pediu que os alunos pegassem o 258 caderno de matemática para que dessem continuidade ao texto coletivo sobre as aulas de geometria, que havia sido apresentado no dia anterior. Conforme já comentamos, essa professora trabalhou muito com a escrita nas aulas de matemática. Uma das formas encontradas por ela foi a produção de textos coletivos, na qual ela sugeria um tema e todos poderiam dar palpites do que seriam capazes de registrar sobre o assunto. Isso levava os alunos a refletir e a buscar na memória o que tinham aprendido ou visto sobre o tema tratado. A professora, algumas vezes, instigava os alunos a falar sobre uma parte da aula ou da forma como tinham realizado determinada atividade. A escrita de texto coletivo era um momento de revisão de conteúdos e do que, realmente, ficou marcado para os alunos de uma maneira geral. Vamos transcrever como foi feita a abordagem realizada pela professora para a construção do texto coletivo e, no anexo C, colocamos o texto completo. Para reiniciar a escrita do texto coletivo, a professora pediu para uma aluna ler o que já tinham produzido anteriormente. Transcrevemos o texto inicial, lido pela aluna, escrito pelos alunos na aula anterior. Texto coletivo Nós aprendemos que sólidos geométricos são sólidos que ocupam lugar no espaço e têm lados com formas geométricas. Conhecemos os poliedros (sólidos que possuem muitas faces). Ao desmontar caixinhas em formas de paralelepípedos, prismas de base triangular e ortogonal, observamos que obtivemos regiões planas. Depois de relembrarem o que já tinham escrito, os alunos continuaram a dar suas opiniões. Em algumas circunstâncias a professora pedia a ajuda deles para modificarem ou para clarearem as ideias de colegas. Eles começaram completando sobre o trabalho com as embalagens. Quando contornamos um dos lados da caixinha obtivemos uma figura geométrica plana de lados formados por linhas retas, são os polígonos. A professora questionou durante a escrita sobre o nome das figuras planas que têm linhas retas e que delimitam uma região do plano. Como alguns alunos responderam poliedros, a professora chamou-lhes a atenção, pois já tinham 259 estudado isso durante algum tempo, desde a 3ª série, e ainda confundiam a figura plana da espacial. Uma aluna lembrou que eram os polígonos e completou a frase anterior. Percebemos como é importante trabalhar, em diferentes momentos, as nomenclaturas dos sólidos geométricos e das figuras planas para que os alunos não confundam. Beatriz continuou fazendo uma provocação: “Que tal a gente colocar os nomes de alguns polígonos que nós aprendemos?” Ela sugeriu que eles elaborassem um quadro com o nome de alguns polígonos, de acordo com o número de lados (conforme quadro, a seguir). Durante a organização do quadro, algumas colocações importantes foram realizadas. Alguns alunos comentaram que o polígono de quatro lados era o quadrado, no que a professora explicou que é quadrado somente quando tiver algumas características especiais, como o fato de terem lados iguais. Outro aluno lembrou que o nome mais apropriado seria quadrilátero e não quadrado. Eles continuaram o texto coletivo, até construir o quadro, conforme visualizamos a seguir. Aprendemos que há polígonos que recebem nomes diferentes de acordo com o número de lados. Nome do polígono Triângulo Quadrilátero Pentágono Hexágono Heptágono Octógono Eneágono Decágono Undecágono Dodecágono Pentadecágono Icoságono Número de lados 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 15 20 Durante a construção desse quadro, a professora Beatriz foi realizando ligações sobre os nomes dos polígonos para que os alunos revisassem e se aprofundassem no assunto. Um exemplo disso foi a nomenclatura do polígono de quinze lados. Ela relacionou ao fato de o Brasil ganhar um campeonato por cinco vezes, eles comentaram que seria pentacampeão. Depois complementou, pedindo para que tentassem dizer o nome do polígono de 15 lados, utilizando a informação do referente ao polígono de 5 e de 10 lados. Os 260 alunos fizeram tentativas até que um deles sugeriu o pentadecágono, nome correto desse polígono. Uma fala importante da professora nesse momento e que representou um pouco de sua crença em relação à aprendizagem e ao trabalho de escrita em matemática, embora com certo grau de radicalismo, foi: “aquilo que a gente não escreve, a gente esquece.” Essa professora acreditava na importância do registro, mas não tinha o costume colocá-lo em prática nas aulas de matemática. Após sua inserção no grupo, ela percebeu que seria possível e viável realizar esse tipo de atividade, também, nas aulas de matemática e começou a fazê-lo de forma interessante e com bons resultados. Ela instigou os alunos a lembrar outros assuntos trabalhados nas aulas de geometria. Um dos alunos lembrou que tinham realizado a vista da caixa sobre a mesa e começaram a pensar em como registrar isso. A escrita ficou da seguinte forma: Fizemos uma experiência onde observamos uma caixa sentados em posições diferentes, com ângulos de visão também diferentes. Assim alguns alunos apenas viram dois lados da caixa, outros viram três lados e também teve quem viu somente um lado. Isso prova que os objetos adquirem formas diferentes de acordo com nosso campo de visão. Também aprendemos que diagonal é o que une dois vértices opostos na região interior do polígono. Nesse texto coletivo, os alunos também pontuaram o trabalho realizado sobre as diagonais dos polígonos. Eles fizeram algumas atividades envolvendo diagonais e tiveram que definir diagonal com suas próprias palavras. Eles resumiram esse estudo com a última frase do texto acima. Após a conclusão dessa parte, a professora Beatriz pediu que seus alunos olhassem nos cadernos, em seus registros para se lembrarem do que tinham estudado sobre geometria. Alguns alunos comentaram sobre outros conteúdos que não faziam parte do conteúdo de geometria que tinham estudado. Beatriz pediu para eles olharem com cuidado e analisarem antes de comentarem. Depois disso, alguns alunos lembraram que trabalharam com perímetro de 261 polígonos e fizeram diferentes atividades. E continuaram a escrita do texto coletivo comentando sobre perímetro. Estudamos o perímetro que é a soma das medidas dos lados de um polígono. Com canudinhos, confeccionamos pirâmides de base triangular. Quando a professora Sandra confeccionou um cubo, teve dificuldades porque ele ficou deformado. É que os quadrados não tinham firmeza como os triângulos da pirâmide, então, a professora Sandra colocou suportes em diagonais que dividiram as faces quadradas em triângulos. Colocou, também, mais uma diagonal interna no poliedro. É interessante lembrar que o triângulo é a única figura geométrica rígida, firme, por isso vemos a utilização de suportes em diagonal em várias construções. Quando planificamos as caixinhas, tentamos, antes disso, desenhar como imaginávamos que seriam. Poucos de nós acertamos, pois esquecemos que as caixas precisam ter as bordas (mais uns ladinhos) para colar os lados da caixa. Alguns alunos se lembraram de outros fatos, como o fato de juntar algumas pirâmides para formar outros poliedros, mas que não foram inseridos no texto coletivo. Ao final dessa atividade, a professora comentou sobre alguns alunos que possuem problemas com a escrita e acrescentou: “Só escreve bem, quem escreve muito.” Isso realça, mais uma vez, a importância que a professora Beatriz dá a questão do registro escrito. Ela terminou essa aula, comentando que existe uma relação entre português e matemática, e que o texto coletivo que tinham escrito era narrativo e informativo. A professora Beatriz abordou esses tópicos sobre geometria em atividades realizadas em aulas posteriores e em avaliações, dando continuidade ao trabalho desenvolvido. A parte referente à geometria do livro didático também foi utilizada para reforçar e complementar o trabalho com esse conteúdo. Diferentes atividades envolvendo geometria, foram desenvolvidas pela professora Beatriz, em 2007 e 2008. Mas, não relatamos e analisamos neste trabalho. Colocamos apenas uma parte para que o leitor possa entender o que ocorreu. As outras atividades perpassam por caminhos parecidos de desenvolvimento do que foi exposto. Podemos citar o trabalho em 2007 com as medidas das folhas tipo “A”, que mesclou com uma produção artística e com 262 poesias que foram escritas pelos alunos, para a Mostra Cultural realizada pela escola em novembro de 2007. Ainda podemos evidenciar a poesia sobre geometria escrita no coletivo da turma, também para esse evento. Colocamos a seguir a poesia sobre geometria e algumas fotos que identificam esse evento. Quadro 18 – Poesia sobre geometria escrita pelos alunos de Beatriz na 3ª série em 2007. Natureza geométrica Vida e matemática Matemática colorida Da simetria das folhas Verdes ou amarelas E as pétalas das flores? Com suas cores Unindo seus pontos Podemos traçar Os triângulos das orquídeas Os quadriláteros das papoulas Os pentágonos dos hibiscos, mimos-de-vênus Ou graxas dos incultos Os hexágonos dos lírios Os múltiplos polígonos das rosas E as abelhas? Com seus hexágonos perfeitos Que armazenam o mel dourado Com o néctar da flor Triangular Quadrangular Pentagonal Hexagonal Oh, geometria! E as aranhas? Oito pernas, uma aranha Dezesseis pernas, duas aranhas Vinte e quatro pernas, três aranhas Cada uma com sua teia Branca, transparente Um fio, dois fios, três fios,... Descrevendo formas Triangulares, Quadriláteras Pentagonais Eneagonais Decagonais... Um de seus lados? Várias diagonais... Oh, matemática, Onde eu olho, Eu te vejo Com suas cores e suas formas. A geometria começou a estar presente com mais frequência nas aulas da professora Beatriz após sua inserção no grupo de estudos. Colocamos anteriormente (seção 5.2.1), afirmações dela sobre o pouco trabalho de geometria e como o grupo a levou a valorizar esse conteúdo matemático. Pelo que apresentamos, percebemos que ela utilizou de diferentes recursos para iniciar a construção dos conhecimentos geométricos com seus alunos. 263 5.3 Flores de aprendizagens em grupo de estudos Aprender em grupo ou a partir de discussões realizadas em grupo acontece de forma diferente com cada integrante. Utilizamos a metáfora das flores, pois acreditamos que durante esse longo processo de pesquisa, tivemos a oportunidade de vivenciar e vislumbrar a beleza e delicadeza do que conseguimos aprender. Essa atitude de admiração e encantamento perante „flores‟ representa um pouco dos nossos sentimentos enquanto pertença ao grupo que nos proporcionou momentos de troca e crescimento tanto pessoal quanto profissional. Quando contemplamos flores, sentimos a delicadeza de cada uma, as diferenças físicas e aromas que possuem. Quando analisamos nossa aprendizagem em grupo, também podemos perceber sutilezas pessoais, diferenças de atitudes, emoções e envolvimento de cada participante. Quando analisamos flores, apreciamos algumas que ainda estão em fase de botões, começando a desabrochar, e outras estão, completamente, abertas e mostrando toda sua beleza. Descobrimos também que algumas se escondem ou superam obstáculos, como os espinhos. Na aprendizagem em grupo também nos deparamos com espinhos, dificuldades que vivenciamos durante o caminhar. Porém, devemos contemplar a beleza do que conseguimos superar nessas dificuldades. Essa multiplicidade de aprendizagens com suas sutilezas, dificuldades e encantamentos é o que pretendemos apresentar nessa seção. Desejávamos que as professoras sentissem que faziam parte de um grupo, que gerasse um sentimento de pertença. Isso teria como consequência o fato de que cada uma de nós influenciava e estava sendo influenciada pelas demais participantes. Sabíamos que cada professora se encontrava em um momento diferenciado de desenvolvimento profissional, portanto viveríamos o grupo de maneira diferenciada. O respeito para com o trabalho individual foi algo escolhido e realizado por nós. Tínhamos como objetivo que as professoras percebessem e encarassem os encontros como espaços de trocas, de respeito, de lugar seguro, onde não precisássemos fingir que sabíamos. 264 Espaços onde pudéssemos expor anseios, vitórias e derrotas, tendo o apoio que necessitássemos. E foi nesse espaço que convivemos e aprendemos em grupo. O interesse e entrosamento entre os participantes do grupo é algo que merece destaque. Depois de mais de dois anos de encontros, conseguíamos conhecer umas as outras e nos comunicávamos apenas com um olhar. Já nos entendíamos, quando havia acontecido algo com alguma das professoras ou quando uma de nós não estava se sentindo bem. Acreditamos que isso era devido ao nosso entrosamento e as afinidades que se desenvolveram ao longo do estudo. Até mesmo quando a professora Vânia estava na Alemanha, conseguíamos, por meio de telefonemas e e-mails, realizar a todo tempo uma interação entre o grupo. Assim sendo, destacamos vários momentos do caminhar do grupo, embora não possamos definir bem ou separar integralmente o que foi o caminhar do grupo do o caminhar individual. Essas coisas estão imbricadas, afinal o grupo de estudos foi constituído pelas professoras e o que cada participante fez dele. 5.3.1 Aprendizagem coletiva Destacamos nesta parte nossa interação enquanto grupo, ressaltando algumas aprendizagens que foram evidenciadas pelas professoras participantes, em alguns encontros. Como as professoras utilizaram metáforas para compararem a relação delas com a matemática e também em relação às aulas de matemática, decidimos nos apropriar dessas metáforas para questioná-las. No 20º encontro, realizado no dia 30/jul/07, no qual a professora Lucia começou a participar conosco, pedimos a Susana e a Beatriz para comentarem sobre suas aulas de matemática, após a participação delas nos encontros do 265 grupo. Essa abordagem foi sugerida, por telefone, pela professora Vânia para que Lucia entendesse um pouco do que já estava sendo discutido e para que tivéssemos um retorno das próprias professoras sobre a participação no grupo. O diálogo seguinte mostra um pouco desse momento. Foi importante como situação provocadora de reflexão e pudemos observar qual era a visão das professoras sobre os encontros do grupo no momento em que ocorreu este diálogo: Eu/Sandra: Eu queria rapidinho, que vocês pensassem e falassem olhando para a realidade de vocês. Isso é ideia de Vânia. Cada uma pensasse,... A Susana falou para a gente ano passado que a matemática na sala dela era como... Como o que Susana? Susana: Como arroz e feijão. Eu: Então nós já vamos fazer um ano agora no final de agosto. O que você avalia nas suas aulas que você já conseguiu colocar alguns ingredientes, o que você já conseguiu modificar. A sua avaliação,..., de você, a partir da participação neste grupo... E vai pensando... E a Beatriz, na questão de lançar coisas diferentes, como a divisão,... Beatriz: A multiplicação,... Eu: ... Do „cavalo dar menos coices‟. Cavalo mostrar mais a beleza e a fascinação dele,... Beatriz: Já está dando para ver que está dando menos coices. (transcrição de gravação em áudio de 30/jul/07) Na minha fala, fiz menção às metáforas utilizadas por elas ao se referirem à matemática e às suas práticas em sala de aula. As professoras entenderam o que estava sendo proposto e continuamos o diálogo, dando respostas às minhas colocações. Eu: Fazer uma avaliação desses meses, quase um ano, principalmente desse semestre do ano [2007]. Pois, ano passado a gente estava mais se conhecendo,... Como está sendo este primeiro semestre em relação a vocês e em relação a mudanças que vocês observam,... se já observam, que começou a acontecer na prática de vocês. Vamos lá, quem quer começar? Depois eu vou falar também. Beatriz: Pra mim eu acho que sim. As minhas aulas de matemática, eu acho que são melhores. São mais criativas, são mais interessantes, eu tenho mais prazer nas minhas aulas de matemática. Tanto que os cadernos dos meus alunos começaram a encher, eu tive que dar uma paradinha esta semana, porque português estava ficando,..., tenho que me policiar. Porque eu gosto da matemática e adoro quando surgem assim,... Como ensinar de maneiras 266 diferentes. Igual a divisão, essa multiplicação que a gente ensinou com as linhas. (transcrição de gravação em áudio de 30/jul/07) A professora Beatriz afirmou, mais de uma vez, seu encantamento pela matemática e observou que alguma coisa tinha modificado em suas aulas. Ela cita a questão da criatividade, das aulas estarem mais interessantes e diferentes. Beatriz fez uma reflexão até mesmo sobre o tempo que estava dedicando à matemática, observou que precisava se controlar para que as outras disciplinas não ficassem prejudicadas, por causa da sua empolgação com a matemática. Isso mostrou certa maturidade por parte dessa professora. Ela estava gostando mais de suas aulas de matemática, porque já atingia alguns de seus objetivos iniciais, desde que começou no grupo: descobrir maneiras diferentes de trabalhar a matemática com seus alunos. Mas, ao mesmo tempo, sabia que deveria refletir sobre como estava desenvolvendo esse trabalho, para não dar maior importância a isso e deixar outros conteúdos sem serem trabalhados. Na sequência do diálogo, Beatriz explica sua colocação sobre a metáfora do cavalo. Eu: E você acha que seus alunos estão percebendo isso também?... Do início do ano para cá. Eles também estão encantados com essa matemática? Beatriz: Eu acho que sim. Eu não vejo eles falando: “Ah não, hoje é aula de matemática”. Que bom, todo mundo gosta. Eu não vejo isso. Eu: Alguma coisa que você quer mais destacar? Beatriz: Quanto aos „coices do cavalo‟, eu coloquei isso mais para mim. Porque sempre vão surgir desafios para mim, eu não domino a matemática como vocês... Eu: Do que vocês. Mas a gente, às vezes... Beatriz: O cavalo está cada vez mais bonito, porque estou aprendendo,... Lucia: Sabe quanto tempo eu fiquei para entender... eu fiquei sexta, sábado e domingo para conseguir entender, que comecei a cair a ficha... [...] Beatriz: Isso que eu chamo de coice, quando eu fico tentando entender uma coisa e não... (transcrição de gravação em áudio de 30/jul/07) Beatriz acreditava que seus alunos olhavam para as aulas de matemática com outros olhos. A professora tentou explicar a metáfora do cavalo e dos coices, 267 comentando que ela não domina a matemática como acredita que nós dominamos (nós: eu, Lucia e Vânia, professoras formadas em Licenciatura em Matemática). O fato de não dominar a matemática de um modo mais amplo a leva a ter desafios, dificuldades, e isso ela comparou com os coices que pode levar dos cavalos. Ela também acreditava que, como estava aprendendo, já não levava tantos „coices‟, e o cavalo se transformava em outro mais bonito, mais domesticado. Lucia comentou que nós, professoras, formadas em matemática, também enfrentamos dificuldades com alguns conteúdos. Isso mostrou que não sabemos várias coisas de matemática e que, mesmo assim, nos encantamos com ela. Susana aproveitou essa fala para destacar um episódio que tinha passado em relação à matemática. Susana: E a gente não sabe. Isso aconteceu comigo. Tinha que ser o aluno M, ele me pegou no flagrante horroroso. Mas também não me deixei por rogado, eu peguei o livro e falei assim: „tá e daí, é melhor eu olhar no livro do que ensinar errado para vocês,... Agora faz favor de prestar atenção [falando para o aluno M]‟. sabe qual foi, eu também exagerei com eles. Mas agora eu estou aproveitando cada oportunidade para introduzir um novo conceito. Por exemplo, surgiu uma conta lá que a menina foi no supermercado fazer compra. Eu aproveitei aqueles numerais lá depois da vírgula, para falar de décimo e centésimo. Porque se eu deixar para depois eles nunca vão aprender esse conceito. Então eu peguei o QVL, fui lá no quadro, fiz o QVL com eles fiz a unidade, a dezena e continuei o quadro depois da unidade. Porque isso está trabalhando no livro lá no final. Mas surgiu a oportunidade e eu já trouxe para eles na sala. Então meu cardápio aos poucos, Sandra, está variando. Essa abordagem aqui foi produtiva, eu ampliei número, não dei nada difícil, procurei dar dentro do alcance deles. Às vezes, é fácil até demais, posso até dar mais difícil se eu quiser. Mas já sei, sem que eles tomem um susto muito grande, então eles foram um pouco mais... E a grande novidade que eu estou botando e que estou gostando de trabalhar com eles toda semana religiosamente, é a questão de desenvolver o raciocínio lógico matemático. É uma coisa que eu não tinha trabalhado, que eu estou introduzindo e está muito bom. Então meu cardápio aos poucos ele está ficando mais temperado, está mais gostoso. Ainda não está uma ceia, mas... (transcrição de gravação em áudio de 30/jul/07) A professora Susana fez uma reflexão sobre suas atitudes em sala de aula. Já percebe que está aproveitando as situações para introduzir, a partir da necessidade ou oportunidade, alguns conceitos que seriam trabalhados posteriormente. Afirma que, com essa atitude, tenta „variar o cardápio‟ retomando a metáfora utilizada por ela, desde o inicio dos encontros, 268 conscientizando-se de que ainda deve continuar a modificar algumas de suas atitudes e aponta-nos situações concretas de mudanças, de aprendizagens. Ela começou sua reflexão crítica, comentando sobre um acontecimento na aula de matemática que a levou a buscar ajuda no livro didático. Ressaltou que, algumas vezes, ocorrem situações para as quais não nos preparamos, antecipadamente, mas que podemos buscar soluções possíveis para aquele momento. Foi interessante notar que essa professora esteve sempre aberta a afirmar que precisava de ajuda, assumia suas interrogações e procurava solução para suas dúvidas. Quando a professora comenta sobre raciocínio lógico matemático, ela está considerando o uso de problemas ou desafios nos quais os alunos se deparam com situações em que precisam utilizar a lógica. Susana aplicou diversas atividades extras baseadas em problemas dessa natureza. Beatriz: Experimenta colocar uns problemas desafiantes de vez em quando. Susana: Isso é o que eu quero fazer. Quero que você traga para mim, para eu jogar para eles. Mas agora eu já vou mudar, Sandra, eu vou começar a botar aqueles meninos para trabalhar mais assim, em grupo, para eles virem ao quadro, eu não quero mais ficar me estressando. Eu: Mas isso eles não faziam antes? Susana: Não, mas estão doidos para fazer. E eu estou achando que está na hora de eu soltar esses meninos [alunos], está na hora de eu largar de mão um pouco esta questão de ficar chamando muito a atenção. É porque eles não estão gostando da forma que estou trabalhando direto com eles no quadro. Eles querem participar mais. Eles ficam num tititi, aquele bate papo, aqueles olhares atravessados, eles mostram que querem participar de forma diferente. Estou fazendo... Beatriz: De repente eles fazendo probleminhas, trabalhar em duplas para que um ajude o outro. Susana: A gente já fez isso, né Sandra? Já fizemos,... uma vez só, tem que fazer mais,... (transcrição de gravação em áudio de 30/jul/07) Mais uma vez a professora Susana se mostra com vontade de modificar algumas de suas práticas. Ela não tinha paciência de colocar os alunos para corrigirem os exercícios no quadro. A correção era realizada por ela para ganhar tempo, os alunos, normalmente, só copiavam empobrecendo as discussões que essa correção poderia gerar. as soluções, 269 Eu: E a Susana em relação à matemática? Susana: Ihhhh,... bom, eu aprendi um pouco mais, se eu fosse hoje encarar um concurso eu não faria não. Eu ... Eu: Mas a matemática que você ensina. Esquece o concurso. Como está você com essa matemática que você ensina? [...] Susana: Veja bem, a gente vai dominando aos poucos. A matemática para eu ensinar, não tenho grandes dificuldades não. A não ser quando muda o assunto assim, porcentagem é um pouco mais complicado. Eu sei o básico. 10% por exemplo. Números inteiros,... Se você der, por exemplo, a porcentagem de 30000 tirar 24% eu não sei, eu sei arredondar alguma coisa aí. 24% de 30 alunos, com nota baixa. É uma coisa que eu não sei fazer. eu não sei ainda de cabeça. Vai chegar próximo do 7, mas... Eu: E como você sabe que vai chegar próximo do 7? Qual foi a conta que você fez de cabeça? Susana: O dez com dez dá 20, o caso vamos colocar que 10% de 30 são 3, 3 e 3 são 6, dá mais ou menos 7. 24% daria um número quebrado 6,8 não? Mas é uma coisa que eu não domino. Lucia: Olha que legal, ela tem tanta naturalidade de falar. Susana: Não domino. Um número redondo eu sei calcular. 20% de 30 alunos, são 6. Mas não me bota para transformar isso em fração, pois é um conceito que eu não aprendi. Você já me ensinou, porque se for por 100, então seria 20 sobre 100. Lucia: Eu acho muito legal porque você coloca isso numa boa, assim, as pessoas tendem a esconder, as coisas, às vezes ficam com vergonha,... Eu: Mas o nosso grupo está assim,... Quantas vezes eu falo assim, eu não sei como se ensina isso lá na 1ª série, 2ª ou 3ª série... Lucia: Eu fui dar uma oficina para o pessoal de 1ª a 4ª série, mas como o pessoal tem dificuldade em dizer assim, eu não sei... Tem quantas coisas que a gente,..., resolve agora,... Susana: Eu dei hoje,..., Sandra viu, os problemas que eu trabalhei hoje, foi „mamão com açúcar‟. Só para somar,... A única coisa mais difícil, que eu fiquei com raiva de mim depois, foi que se eu tivesse planejado com vontade mesmo, eu teria trabalhado o último problema primeiro. Porque ele foi mais trabalhoso, os meninos já estavam mais agitados, mais dispersos. Eu querer trabalhar aquele conteúdo todo 9 horas da manhã e eles já querendo ir ao banheiro fica difícil. São esses mínimos detalhes que a gente que às vezes eu me pego pecando. Cada coisa tem que estar milimetricamente planejado. Eu: A Susana vai provocando eles, por exemplo, ela foi somar 155 com 24 e ela colocou o 2 debaixo da centena. Imediatamente eles gritaram: „professora está errado, você não sabe não professora‟. Susana: Eu gosto de provocar eles,... [...] (transcrição de gravação em áudio de 30/jul/07) 270 Essa fala de Susana mostra, mais uma vez, a naturalidade que ela tem em afirmar que possui dificuldades, que não domina a matemática de maneira mais ampla, que só sabe o básico. Isso impressiona a professora Lucia, pois muitas vezes convivemos com profissionais que tendem a esconder suas fraquezas. Nesse grupo, Susana se sentia à vontade para se expor, sabia que não seria ridicularizada. Podemos afirmar que Susana estava construindo determinada aprendizagem sobre o conteúdo de porcentagem, pois, em diferentes momentos tivemos discussões sobre esse conteúdo nos encontros. Utilizamos diferentes atividades, para trabalhar porcentagens, e aproveitamos algumas situações para aprofundar os debates sobre esse assunto, como quando a professora Beatriz estava trabalhando esse conteúdo em suas aulas e discutimos algumas atividades. Notamos que, Susana reflete, criticamente, sobre sua postura em sala de aula, realizando uma reflexão sobre a ação (SCHÖN, 2000/1998). Ela percebeu que deveria ter modificado a ordem de trabalho por conhecer a turma e afirmou que faltou planejamento, mesmo sendo essa professora muito organizada em relação ao seu planejamento diário. A professora demonstra que reflete a partir de seu conhecimento dos alunos. Acreditamos que essa abertura, essa confiança e pré-disposição em se expor devem-se ao fato do tipo de grupo formado. Na interação entre os membros do grupo, no respeito ao outro, na tentativa de mostrar novos caminhos, o diálogo foi sendo construído e fortalecido a cada encontro. Participávamos, no propósito de nos ajudar mutuamente, não apenas criticar ou apontar defeitos. Levantávamos questionamentos sobre os conteúdos e trocávamos informações que serviam para a construção dos conceitos matemáticos. Aprendemos, portanto, a agir como grupo que realizava um trabalho colaborativo, onde cada um tinha suas fortalezas e fraquezas que eram colocadas à disposição do grupo e do caminhar juntos. Com a interação, o conhecimento do outro e a influência pelo grupo pode ser notada com o que aconteceu no 5º encontro de 2008 (07/abr/08). Nessa ocasião, pedimos as professoras presentes (Susana, Beatriz, Sandra e Vânia) um relato sobre uma aula das professoras Susana e Beatriz que tivesse marcado ou chamado a atenção, no ano de 2007 ou de 2008. A proposta era 271 que cada uma tentasse relatar uma aula, destacando os pontos pelos quais selecionou a mesma. As professoras Sandra e Vânia preferiram relatar uma aula de Susana e outra de Beatriz que tinham observado. Nessa oportunidade, notamos como algumas coisas marcaram a todas nós, do grupo, e como isso nos envolveu. As professoras Sandra, Beatriz e Vânia relataram uma mesma aula de resolução de problemas de divisão não exata que a professora Beatriz tinha aplicado em algumas semanas anteriores, após uma avaliação, e que tínhamos participado. Essa aula foi comentada e analisada por nós na seção 5.2.1.2 deste trabalho. Acreditamos que o envolvimento da professora Beatriz com a turma e a participação dos alunos foram um dos motivos que levaram essas professoras a escrever sobre uma mesma aula sem fazerem nenhum comentário anterior entre elas. A seguir, colocamos o que cada professora escreveu sobre essa mesma aula, pois queremos dar visibilidade ao que estamos pontuando sobre a aprendizagem coletiva e sobre os incidentes críticos ou significativos que nos motivaram a fazer nossas escolhas. Relato escrito de Beatriz sobre uma de suas aulas em 2008: Resolução de problemas Uma das minhas aulas de que gostei e da qual agora me lembro é a última que dei sobre resolução de problemas. Percebi que vários alunos sentiram dificuldade na avaliação numa questão muito simples: tratava-se de calcular quantas viagens um ônibus teria que fazer para transportar 115 crianças tendo capacidade para levar 8 crianças de cada vez. A pergunta do problema era: como seria feito o transporte? A dificuldade estava na resposta, uma vez que a divisão não era exata. Levantei algumas perguntas tais como: todas as crianças irão? (era um passeio) não ficou nenhuma criança para trás? Se você fosse o motorista o que você faria? Depois de levados a pensar, muitos acertaram: 115 |__8____ 35 14 3 Faria 15 viagens ou nas três últimas levaria uma criança a mais. Houve também algumas respostas tais como: “um pai foi levar as crianças que sobraram.”; “tiveram que voltar para casa”; e outras parecidas, mas grande número de alunos não deu importância ao resto. No dia seguinte, elaborei outros problemas com a mesma pergunta e dificultei os números. Eram 467 crianças de uma escola que iriam a uma excursão. A escola contratou apenas dois ônibus que poderia levar 40 crianças de cada vez. Se forçasse daria para levar apenas uma criança a mais. Quantas viagens fariam? Houve várias soluções, ou seja, caminhos para chegar a resposta. Primeiro o aluno foi levado a ler silenciosamente, depois fiz algumas perguntas simples: do que está falando o texto do problema? Viagens? Excursão? Como serão feitas as viagens? Quantas viagens serão necessárias? 272 A professora Beatriz mostrou, com suas afirmações, como analisou questões dadas nessa prova e como a reflexão a levou a preparar uma aula sobre o mesmo assunto. Percebemos que a reflexão levou-a a modificar seu planejamento, provocando mudança de ação (LLINARES; KRAINER, 2006). Ela, inicialmente, analisou as soluções dos alunos e notou que alguns sentiram dificuldades numa resposta considerada simples por ela – um problema de divisão com resto não nulo. Beatriz identificou que a dificuldade de seus alunos consistia em analisar o resto, não nulo, quando formularam suas respostas. Tentou ajudá-los, levantando algumas questões, mas mesmo assim, alguns alunos não pensaram no resto ao responderem a questão. Relato escrito de Vânia sobre uma aula da professora Beatriz em 2008: Eu me lembro de algumas aulas delas com os alunos resolvendo problemas. Ficou bem marcada a aula da semana retrasada. Chegamos à escola 7:15 h e toda a escola estava no pátio e os alunos estavam cantando o hino. Fomos com os alunos da 4ª série e a professora Beatriz para a sala. Ela colocou no quadro brevemente a agenda do que tinha planejado para aquele dia e me lembro que colocou: problemas, desafios e multiplicação russa. Ela disse que parece que alguns alunos não pensaram muito ou estavam distraídos na prova de matemática que ela tinha dado. Ela disse que já tinha olhado as provas e que observou que existiam dificuldades em alguns problemas. Ela colocou no quadro algumas situações-problema de divisão que envolvia uma escola com 497 ou 467 crianças para levar para uma excursão, que o ônibus podia levar 40 ou 41 crianças e quantas viagens o ônibus precisava fazer. Disse que poderia levar até mais 1 criança. Disse para eles lerem e pensarem em como resolver. Depois de uns 5 ou 10 minutos, pediu para eles lerem silenciosamente com os olhos e ela foi apontando para cada palavra no enunciado. Depois foi circulando pela sala indo ver os cadernos dos alunos o que tinham feito e fazia alguns comentários e conversava com eles. Após outros 5 ou 10 minutos ela foi solicitando que os que tivessem terminado levantassem o braço e foi o aluno H no quadro colocar o raciocínio dele. Relato escrito de Sandra sobre uma aula da professora Beatriz em 2008: Aula sobre resolução de problemas – divisão com resto Após uma análise inicial a professora passou no quadro dois problemas semelhantes aos que os alunos “erraram” ou se confundiram na prova para ver se eles percebiam os erros e ver se conseguiam retomar o que queria trabalhar. Um problema era o do ônibus para o passeio da escola, este poderia levar 40 ou 41 crianças. Os alunos faziam a divisão, mas alguns se esqueciam de olhar novamente o problema e o que ele queria. Não poderia levar somente algumas crianças, logo deveriam analisar o que fazer com o resto. 273 Quando a professora pediu para eles pensarem na situação e imaginarem ficou mais fácil para eles. Alguns falaram que seria o motorista e como fariam... A questão da escrita do pensamento, colocando-o explícito também foi rica, pois os alunos perceberam que os ajudariam interpretar o problema. A valorização das diferentes respostas também é interessante, pois mostra que podemos chegar a uma solução por vários caminhos, isso tem ligação com o emocional das crianças. Notamos que as professoras, Vânia e Sandra, identificaram algumas atitudes da professora Beatriz de forma semelhante. A verificação de que uma mesma aula marcou as três professoras nos mostra como influenciamos e somos influenciados pelo grupo, no qual fazemos parte. Nessa mesma ocasião, em relação às aulas da professora Susana, as professoras Sandra e Vânia também escolheram relatar sobre a mesma aula de 2007, onde foi desenvolvido um trabalho de grupo com revisão de alguns conteúdos que tinham sido trabalhados em sala de aula referentes à geometria espacial, operações e resolução de problemas. Já a professora Susana, relatou outra aula, também sobre geometria, mas que possui intersecção com a citada acima. Os relatos são apresentados, a seguir. Relato de Susana sobre uma de suas aulas em 2007: Atividade: oficina de sólidos geométricos Era mais umas das muitas oficinas que tivemos no ano de 2007. Já fizeram dobraduras, produziram folhas dos mais variados tamanhos a partir da folha A4, pintaram, compraram, venderam,... Mas a oficina com sólidos geométricos, foi sem dúvida, uma das mais divertidas e interativas que tiveram e sem nenhuma reclamação... A sala foi arrumada com as cadeiras dispostas em círculo e algumas mesas no centro. Por cima delas, embalagens de todo tipo: caixas de sapato, remédios, pizzas, perfume, latas de leite, Neston e tudo mais que foi arrecadado. A pergunta era: o que rola e o que não rola? Por quê? Todos querendo fazer caixa quadrada rolar, o outro mais esperto descobria que era com a lata, o cone, o rolo de papel alumínio ou plástico... E a hora que todos queriam fazer: rolar os mesmos [alunos] no chão... Chato foi depois, tentar escrever no papel em forma de atividade, mas a experiência anterior, havia sido inebriante... 274 No relato feito por Susana, percebemos que ela destacou as diferentes atividades realizadas que envolviam geometria, no ano de 2007. Essa professora gostava de realizar aulas diferentes, que denominava de „oficinas‟. Para ela, as aulas precisavam ser interativas e divertidas para atrair os alunos para a matemática. Ela detalhou a forma como a sala foi organizada e apresentou algumas questões que chamaram sua atenção. Inclusive o fato dos alunos quererem rolar no chão, como alguns sólidos geométricos. É interessante notar a afirmação de Susana sobre a parte chata da oficina, o trabalho com a escrita. Ela não estava acostumada a encerrar suas atividades pedindo aos alunos que escrevessem ou sintetizassem suas ideias. A escrita nas aulas de matemática não era tão valorizada por essa professora, nesse momento da pesquisa. Relato de Vânia sobre uma aula da professora Susana em 2007: Uma aula da professora Susana em 2007 – Lembro-me com alegria do dia em que chegamos à sala de Susana e que os alunos, trabalhando em grupo, foram resolvendo os problemas e atividades e que íamos dando fichas coloridas valendo pontos para eles. Foi muito rico observar os alunos ajudarem uns aos outros e a emoção deles quando Sandra ia corrigindo as atividades de cada grupo e dizia a cada etapa quantas fichas cada grupo ganhava a partir do que tinham acertado em suas atividades individuais. Lembro-me que Sandra conseguiu dosar a dificuldade das atividades melhor neste momento do que aconteceu na turma de Beatriz. Foi muito bom ver o olhar de felicidade dos alunos quando acertavam as contas, os problemas, o reconhecimento dos sólidos geométricos e ver que grupo ganhou. A professora Susana mostrou estar surpresa com o empenho que muitos alunos tiveram e de ver que eles resolveram atividades bem variadas e com diferentes níveis de dificuldades. Outra aula que me lembro foi a aula que Susana foi trabalhando com folha de papel A4 e foi registrando no quadro as relações entre os diferentes papéis que foram aparecendo. Relato de Sandra sobre uma aula da professora Susana em 2007: Aula do trabalho em grupo: revisão e ampliação das operações, geometria,... Os alunos precisam se acostumar a trabalhar em grupo. Eles não conseguiam por causa da agitação, importância em colocar regras bem claras no início e cumprilas. Cada grupo recebia apenas um papel com as questões, cada componente do grupo deveria ajudar os demais colegas. O grupo era composto de 4 alunos e os papeis que recebiam tinha 4 questões, uma para cada um, todos deveriam participar. Os alunos se envolviam esperando ansiosos o relato do que acertaram. Interagiam e conversavam entre si e discutiam as soluções encontradas. 275 Tivemos a preocupação em colocar níveis semelhantes de dificuldade[para cada grupo]. Percebemos como ele se concentraram e como se envolvem com atividades deste tipo. A parte de geometria que tínhamos trabalhado de forma lúdica ficou bem clara para eles e eles conseguiram atingir os objetivos propostos nesta atividade. Em relação ao grupo como um todo, eles perceberam que todos devem e podem participar, pois, as diferenças entre eles, do grupo que ganhou para o grupo que ficou em último lugar foi pequena. Os relatos, das professoras Sandra e Vânia, mostraram que foi possível e importante a realização dessa atividade em grupo na turma da professora Susana. Vânia destacou a surpresa da professora Susana com a reação e participação de seus alunos. Sandra apontou a interação e aprendizagem dessas crianças com atividades em grupo. Intuímos, com esse exemplo, que o entrosamento, o conhecimento das outras professoras e nossa interação, após um longo trabalho no grupo, nos proporcionou algumas aprendizagens. Aprendemos que a professora Beatriz gosta de trabalhar com resolução de problemas, já a professora Susana se encantou mais por trabalhos envolvendo geometria. Isso influenciou nosso olhar e nossa escolha para o relato de uma aula. Afinal, essas aulas foram vivenciadas de maneira integral pelas professoras e por todos do grupo. De diferentes maneiras, oportunizamos discussões sobre alguns eventos críticos de sala de aula que conduziram nosso olhar. Isso indica que o olhar não é neutro, está repleto de nossas convicções e de outras que são colocadas, a partir das pessoas que convivem conosco, como é o caso dos participantes do grupo de estudos. Esse envolvimento e influência devem ser considerados como fatores importantes ao se tratar de trabalhos em grupos, durante um tempo considerável. Aprendemos, coletivamente, a importância do respeito para com o trabalho de cada profissional. Compreendemos a necessidade de escutar, umas às outras, e deixar espaço para as trocas de experiências. Foi necessário, até mesmo, respeitarmos momentos de desabafos, mas não nos restringíamos a eles, mas aproveitamos para conduzir discussões interessantes. Situações que envolviam questões sobre o ambiente escolar: caso de violência na escola, 276 interesse e desinteresse dos alunos; questões sociais; questões políticas e educacionais; e situações de ordem religiosa. A influência do grupo estava presente nas falas e atitudes das professoras envolvidas, e notamos isso nas respostas ao questionário, em agosto de 2008, sobre o grupo de estudos e a influência nas práticas, em aulas de matemática. Mesmo a professora Lucia, que não pode estar em todos os encontros, afirma que sua prática sofreu influências e mudanças, a partir dos momentos com o grupo, como podemos ver na sua fala. “Percebo que o meu olhar para com os alunos da 5ª série é bem diferente dos anos anteriores, conversando e ouvindo as professoras do grupo, noto o motivo das dificuldades e/ou obstáculos enfrentados pelos alunos [...]. Ouvir as professoras de 1ª a 4ª séries tem auxiliado a mim e principalmente, os meus alunos a fazer de forma mais suave, a transição da 4ª série para a 5ª série. Sabemos que essa ruptura, como qualquer outra é dolorida. Reconheço que o grupo tem sido de fundamental importância nesse processo.” (Lucia, ago/08) Entendemos que as professoras passaram por algumas mudanças, que elas mesmas retratam em suas falas. Concordamos com Conlinvaux (2007), ao afirmar que a aprendizagem deve ser analisada a partir das mudanças e transformações que ela promove. Nas professoras que participaram dessa pesquisa, notamos que elas tiveram algumas „novas‟ formas de ver, conceber, pensar e fazer a matemática, seu ensino, aprendizagem e avaliação, em suas salas de aula. Conlinvaux (2007) pontua todas essas afirmações quando comenta sobre a aprendizagem e a emergência de novidades. Pensar a aprendizagem como processo e como movimento implica necessariamente concebê-la como transformações e mudanças associadas a constâncias e permanências. Mas a característica definidora da aprendizagem, em nosso entender, reside nas mudanças e transformações que ela pode promover. No entanto, não são quaisquer mudanças ou diferenças que podem ser qualificadas como aprendizagem: interessam mais particularmente os processos de mudança caracterizados como emergência de novidades, isto é, aqueles processos em que aparecem condutas que indicam novas formas de ver, pensar, fazer ou falar (CONLINVAUX, 2007, p. 35 36). A emergência de novidades implica transpor os limites do já vivido, conhecido e interpretado, por si mesmo ou por outrem, criando novas formas de ser, novas formas de pensar, falar e agir que rompem com a repetição e as amarras da tradição (CONLINVAUX, 2007, p. 36). 277 Nos exemplos apresentados anteriormente, notamos que existiu ao longo do desenvolvimento desta pesquisa a emergência de novidades. Cada professora vivenciou isso de maneira diferenciada, mas a partir da pertença e entrosamento com o grupo. O que destacamos neste texto, foram alguns pontos referentes à essas aprendizagens que nos chamaram a atenção. Acreditamos que muitos foram os momentos que poderíamos destacar a partir das emergências de novidades. Em alguns momentos, perguntamos, de maneira mais direta, a opinião das professoras sobre os encontros, suas participações no grupo e as influências dessa interação em suas aulas de matemática. No encontro do dia 06/out/08, fizemos alguns questionamentos às professoras para realizarem uma avaliação e retrospectiva, em relação aos encontros anteriores, pois desejávamos obter mais dados para compreender como as professoras percebiam a influência dos encontros em suas práticas e em suas aprendizagens. Transcrevemos o diálogo ocorrido, nesse dia, comentando alguns itens pertinentes. Eu/Sandra: Quais foram os momentos assim, que vocês percebem, por exemplo, daqueles encontros iniciais em 2006 quando a gente começou os encontros... Pode só falar que está gravando... o que você lembra do comecinho dos encontros o que mais chamou a atenção? Susana: Sei lá... O que mais chamava mais a atenção foi a maneira, eu ver como estava trabalhando a matemática em sala de aula, como que isso abriu uma nova perspectiva. Ano passado (2007) então foi mais produtivo, entendeu? Em relação a isso... Você vê que... O primeiro encontro que a gente teve eu vim assim, com uma prova na mão, você lembra? Você me deu dica, os meninos fizeram numa boa, foi ótimo aquilo, já comecei inovando, né... Como assim dizer, já comecei montando isso aí...Não deu para aproveitar muito, naquele ano (2006), pois já estávamos finalizando, muitas coisas já estavam encaminhadas... Mas, o que mais me chamou a atenção aqui foi exatamente os debates, quanta coisa que a gente aprendeu aqui, fazendo... Trabalhos... Você vê que os conteúdos eram as mesmas coisas, mas as práticas diferenciadas, a maneira como foi aplicado... Eu sei que o que mais chamou a atenção foi isso, foi essa mudança, na... de você passar... (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) A professora Susana mostrou que, a participação no grupo, a levou a uma reflexão crítica sobre a forma na qual trabalhava com seus alunos, nas aulas de matemática. Ela falou que „abriu uma nova perspectiva‟, isso foi possível pela coragem e desprendimento que a professora teve, desde o primeiro 278 encontro. Susana afirmou que práticas diferenciadas foi o que mais marcou enquanto mudanças e aprendizagens. Na continuidade do diálogo vemos a posição da professora Beatriz. Sandra: Na didática... Susana: Exatamente, na didática. Essa mudança... A gente sabia de tudo aquilo, mas as abordagens... Eu: E para você Beatriz? Beatriz: Isso que a Susana falou... Das abordagens diferentes. Aquela parte de explorar a escrita na matemática, que foi uma coisa que... Até me levou a pensar no projeto... E a reflexão que a gente passou a fazer em cima do que a gente está fazendo, se antes eu já tinha uma preocupação com isso, agora eu tenho muito mais... pensar... na relevância dos conteúdos,se aquilo ali é necessário, se pode abrir caminhos ou não... Aprofundar coisas, às vezes a gente ficava em dúvida se deveria ou não ensinar. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) A professora Beatriz concorda com Susana e afirma que, as abordagens diferenciadas, foram aprendizagens dela com a pertença ao grupo. Citou como exemplo a exploração da escrita nas aulas de matemática. Acrescentou um dado importante, Beatriz afirmou que a reflexão provocada a partir do que faziam em sala de aula foi importante para que pensássemos na relevância de conteúdos matemáticos. Ela afirmou que possuía certa preocupação com essa relevância e o aprofundamento de conteúdos matemáticos, mas que ficou mais significativo, após nossas discussões em grupo. Percebemos que a professora Beatriz está num nível de consciência diferente da professora Susana. Ela consegue colocar alguns exemplos, de maneira mais clara, e afirma que tinha iniciado um processo de reflexão sobre essas questões. Temos, a partir dessas falas, evidências concretas de um início de desenvolvimento metacognitivo das professoras. Pois, elas estão tomando consciência delas mesmas sobre o que sabem, sobre o que mudaram, o que melhorou e o que ainda precisa melhorar (SANTOS, 1993). Outros exemplos foram colocados, pela professora, conforme podemos ver a seguir. Eu: Como, por exemplo? Beatriz: Como, por exemplo, geometria... Como por exemplo, porcentagem mesmo. 279 Eu: Susana, tem alguma coisa que você acha sobre essa questão de aprofundar [conteúdos]? Susana: Há sim, eu tava aqui olhando [caderno de anotações dela] como a gente foi trabalhando esta questão de fração, por meio do tangran, por meio do... quer ver? Até mesmo com as formas geométricas. Lembra que você me sugeriu, aquilo não me sai da cabeça, eu não usei aquilo, mas ainda vou ter a oportunidade de usar. Usar o pente de ovos, as metades das frutas... a fração com o bolo, é... Eu: Beatriz, você já trabalhava com frutas para iniciar frações? Beatriz:. Ahhh, sim... Eu: Você sempre começava com frutas? Beatriz: Sim... Começava com frutas, maça, laranja,... (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) A professora Beatriz comentou sobre a geometria e Susana procurou em suas anotações do caderno, o que poderia colocar como exemplo. Susana lembrou uma aula que Beatriz fez com seus alunos, ao iniciar a abordagem de frações, envolvendo frutas. Aproveitei para perguntar se isso era uma prática para essa professora e tive a confirmação, afirmando gostar de trabalhar dessa forma. Eu também me posicionei em relação à nossa aprendizagem. Eu: Pra mim, eu acho que... Pra mim Sandra. Cresceu muito esta questão dessa troca. De eu enxergar a... a matemática da 1ª a 4ª séries com outros olhos. Eu já tinha começado, mas eu acho que aqui deu para clarear bem, como que a gente estar... Ajudando até, como Lucia fala... Nossos alunos de 5ª a 8ª série a partir do nosso conhecimento da matemática da 1ª a 4ª séries. Acho que... Essa visão foi fantástica para mim. Ter a possibilidade de ver este outro lado. Fala Susana. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Eu comento sobre a troca e o meu olhar diferenciado sobre a matemática ensinada nas séries iniciais do ensino fundamental. Afirmo que isso nos ajuda a entender e colaborar com nossos alunos de outras séries de ensino. Eu aqui não comentei, mas essa influência ocorreu também com minha prática em turmas de nível superior em relação às suas dificuldades na base da estrutura do edifício matemático. Susana: É o que eu penso... Aqui eu aprendi a dar valor a questões pequenas, como por exemplo, a questão dos desafios... eu botei lá e faço. Conforme dei para a aluna La. Foi um desafio a altura para ela, toda hora ela ia à minha mesa, mas eu não, ela precisava olhar... Eu vi que ela estava cansada e que nem junto 280 com um coleguinha ela não conseguiu fazer... [...] Agora ano passado,... que foi, assim, o „pulo do gato‟...sabe, eu tô assim, ainda vai acontecer, né. Acho que estou assim, muito devagar, mas... já trabalhamos o geoplano, já a próxima oficina... ah, esta oficina dos carros, nossa, como os meninos gostaram. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Susana comenta sobre a sua aprendizagem de utilizar desafios. Ela comenta como está devagar, isso mostra o que tínhamos percebido, ela está num nível de desenvolvimento profissional e metacognitivo diferente das outras professoras do grupo. Precisa de mais tempo para incorporar as ideias que indicamos de trabalho em sala de aula e as construções dos conteúdos matemáticos. Mas, já está ousando em suas aulas de matemática naquilo que se sente segura ao fazer. Eu: E você trabalhou mais? Susana: Ainda não. Não fechei, vou trabalhar mais coisas... Você tem que dar um tempo para fechar as oficinas. Eu: E a tabuada de 4? Eles fizeram? Utilizaram as rodas dos carros? Susana: Fizeram, mas não usaram os carros. Eu: Na verdade, o primeiro ano, foi muito... Acredito eu... Aqueles 5 meses, né, de 2006, não, 4 meses... do dia 30 de agosto a dezembro... acho que é isso, 3 meses e meio. Aqueles 3 meses e meio em 2006, foi para a gente se conhecer e ver qual seria a proposta real do grupo. Acho que é bem... foi o início assim, pra gente poder ver como a gente iria tentando caminhar em 2007 e 2008. Que foi o começo de tudo, né. Que aí a gente pode ver que em 2007 as coisas fluíram mais, a gente conseguiu que as coisas acontecessem mais fácil. Agora também (2008), continuou fluindo. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Com o meu comentário, notamos um pouco daquilo que vivenciamos, nos dois anos e quatro meses. Eu acabei fazendo uma reflexão sobre o primeiro momento que mencionei no início desta seção, de que os encontros de 2006 ajudaram na constituição e consolidação do grupo. Susana: Eu acho que ano passado, a greve sempre atrapalha muito. Este ano [greve]... Ano passado acho que foi muito mais produtivo, por incrível que pareça. Agora que os meus meninos estão começando a experimentar uma matemática assim, mais... „gostosa‟... ainda tem essa coisa aí,... eu vou ter que parar e analisar, ai que eu vou poder trabalhar,... Um problema que eu gosto de parar e analisar com eles, ai que eu vou começar a deixar soltar,... Vou dar para os pais a tarefa para eles fazerem em casa e ajudarem os filhos, não vou mais ficar assim, ocupando todas as minhas aulas só para dedicar para 281 corrigir e mandar copiar exercícios. Porque senão qual o tempo que eu vou ter, é muito ruim, não tem condições,... Ainda tenho que trabalhar a geometria, os polígonos, os sólidos geométricos, vou trabalhar sobre tamanho de folhas com eles [folhas medidas padrão A – A4]... Vou trabalhar também a questão de frações, que eu vou querer entrar, quero entrar neste sentido aí, porque vai é uma coisa que vai fazer falta para eles. Eu quero que a eles tenham uma base, eu quero que eles tenham essa base...[...] e quando a gente trabalha estes desafios. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Susana mostrou seus planejamentos e o que estava fazendo diferente com seus alunos. No momento da pesquisa, a professora fez reflexões críticas de maneira mais autônoma e pontuou algumas circunstâncias que pretendia mudar de atitude. Percebemos certo amadurecimento, por parte dessa professora, sobre ela mesma enquanto profissional e professora que ensina matemática. Beatriz: Eu estava lendo aqueles artigos da Vânia, como devemos trabalhar com problemas... Eu: Se vocês fossem falar de vocês, da aprendizagem de vocês, em relação ao nosso grupo. O que vocês podem falar que vocês aprenderam não só aqui, mas a partir de discussões daqui. A partir do que levamos para a sala de aula... Algumas coisas vocês já falaram. Mas se eu falasse assim, se eu for olhar para a Sandra, o que a Sandra aprendeu? O que a Susana aprendeu? Susana: nossa gente, eu aprendi tanta coisa gente. Por exemplo, essa maneira aqui de trabalhar a multiplicação, como é que é? O modo... é... o chinês. Essa questão dos polígonos, assim... Como é que você chega lá pra poder... é... Trabalhar essas coisas... Essa conta aqui que você faz para arredondar, né. Você inverter os numerais para chegar ao mesmo resultado... Isso é muito interessante. A gente sabe que as ordens dos fatores não alteram o produto, até outro dia eu expliquei isso para os meninos. Quando eu fui fazer a tabela multiplicação de cinco, Sandra, eu inverti, eu num coloquei de um até dez primeiro, eu coloquei o cinco de cima em baixo, para eles fazerem esta comparação. Agora quando você inverte a dezena e a centena das duas posições e dá o mesmo resultado... Pra mim foi uma coisa surpreendente, eu não sabia. Pra mim, 36 é número e 63 é outro. Eu: Mas é... Eles são mesmo diferentes. Susana: Exatamente,... Mas mesmo assim, dá resultado. Eu: A multiplicação de 24 por 63 e de 42 por 36 dá o mesmo resultados, mas 36 é diferente de 63. Susana: mas eu achava que os resultados deveriam dar diferentes. Eu não achei que essa inversão dezena com cente... dezena com unidade pudesse produzir o mesmo resultado. É uma coisa inédita para mim. Aqui como, por exemplo, 276 e 672, os algarismos foram os mesmos, quer dizer, você encontra esta correlação entre os numerais... eu aprendi muito, essa questão dos desafios. Isso aqui 282 que trabalhou a questão dos códigos, isso eu achei meio complicado, num trabalhei não. Porque dá muito trabalho... entendeu? Tem muita coisa,... tem muita coisa também que não deu para fazer, não dá. Olha que são 5 aulas que dou por semana, mas eu vejo que não deu pra explorar tudo. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) A professora Susana folheava o seu caderno e comentava outros exemplos. É interessante destacar que ela comentou que aprendeu determinado assunto trabalhado por nós, mas ao mesmo tempo, pergunta como resolve esse assunto. Isso mostra que, muitas coisas que fizemos no grupo, ficaram apenas como informação e não como aprendizagem. Concluímos que, algumas vezes, existe uma confusão conceitual ou generalizações indevidas, por terem acontecido apenas informação ou apresentação, como novidade. Se elas não levaram para sala de aula e nem discutimos em outros encontros, certamente, não houve muita chance das professoras transformarem as informações em aprendizagens. Eu: Mas sem ser com a questão das atividades, pra você [Beatriz]... Beatriz: Conceitos de geometria,... Ficaram mais claros, por exemplo, a letra PI. Conceito de PI, não sabia o que significava. Susana: Tem relação com o tamanho da circunferência. Não é isso? Eu: Quase, mas tem a ver. Susana: Tem a ver. É uma multiplicação que foi feita. É o comprimento mais o diâmetro. Eu: Mais o diâmetro? Susana: Não é, é o comprimento dividido pelo diâmetro. Beatriz: Eu já esqueci, tava claro. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Discutimos, num encontro de novembro de 2007, a questão do número π. A professora Susana lembra algumas coisas e quando levada a repensar conseguiu chegar ao significado correspondente. Em alguns momentos, os debates ocorridos no grupo levaram as professoras a repensarem suas práticas, ou a confirmar a importância de utilização de materiais ou abordagem de forma diferenciada no desenvolvimento de 283 conteúdos matemáticos. Exemplificamos isso, com os comentários das professoras sobre livro didático, a seguir. Beatriz: Às vezes afirmar alguma coisa também, que às vezes não estávamos muito seguras. Como por exemplo, eu sempre trabalhei muito com o livro, eu vi que é por aí mesmo, tenho que utilizar o livro didático sim, aproveitá-lo para trabalhar. Susana: Agora que eu estou sentindo que eu vou utilizar o livro didático da maneira melhor. É bom você pegar o livro,... Eu não me arrependo como fiz até hoje, pois é conhecimento. Mas eu vou trabalhar de outra maneira, não vou mais pegar para... (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Essa questão do livro didático foi um ponto que já discutimos e que percebemos como foi demorado, para a professora Susana, entender que deveria agir diferente em relação ao uso do livro didático. Mas, notamos nessa fala que ela estava tentando agir, diferentemente, e aproveitar o que o livro didático podia contribuir para sua abordagem em sala de aula. Outro fato interessante que podemos destacar, em relação ao entrosamento do grupo, foi nossa surpresa com os cartazes de „boas vindas‟ que foram escolhidos, pelas professoras Beatriz e Susana, para serem colocados nas portas de suas salas em 2008. As fotos a seguir mostram esses cartazes. Figura 43 – Cartazes de boas vindas, respectivamente, das salas de Beatriz e Susana 284 Elas não combinaram anteriormente a escolha do mesmo cartaz, foi surpreendente para nós quando deparamos com a mesma mensagem de boas vindas. Acreditamos que seja mais do que coincidência, estávamos envolvidas e refletindo sobre as mesmas coisas e isso as levou a escolherem o mesmo cartaz para colocar em suas portas de salas de aula. Conversamos com as professoras e elas afirmaram que a mensagem refletia o momento que estavam vivendo e como gostariam de acolher as pessoas que chegassem até suas salas. Evidenciamos, nesse aspecto, que a participação em grupo com as características construídas, por nós, durante esse estudo, integra a pessoa do professor como um todo. Conforme Nacarato e Passos (2003, p. 136) afirmam, “a situação de grupo é fundamental para a mudança da cultura profissional”. Acreditamos que ocorreram mudanças em todas nós, enquanto pessoas e profissionais da educação, a partir da pertença ao grupo. A aprendizagem de cada uma sofreu influência do grupo que também foi influenciado por cada uma das componentes. 5.3.2 Aprendizagens evidenciadas por participantes a partir da experiência coletiva no grupo Após evidenciar aprendizagens ocorridas no grupo, explicitaremos algumas aprendizagens pessoais. Nesta seção, pontuamos, de forma mais direta, algumas aprendizagens das professoras Susana, Beatriz e Sandra. Remeteremos a alguns comentários anteriores para fortalecer nossas afirmações, quando for pertinente. Susana e a aprendizagem em grupo 285 Susana fez uma comparação bem interessante, em relação a suas aulas de matemática, utilizando uma metáfora. Em diferentes momentos, ela voltava à metáfora inicial para fazer uma reflexão sobre sua prática em aula de matemática e as influências do grupo. Ela afirmou, no último encontro de 2006 (18/dez/06), que suas aulas eram um cardápio limitado, como „feijão com arroz‟, somente o básico, o conhecimento simples e mais sucinto que o aluno precisava saber. Porém, garantiu que não estava satisfeita em trabalhar na matemática somente com o básico, que para ela significa as quatro operações: adição, subtração, multiplicação e divisão. Afirmou algumas vezes que pretendia modificar essa situação e disse que gostaria de ter a oportunidade de oferecer um „cardápio‟ mais variado a seus alunos, onde eles pudessem escolher entre diversas opções, além do básico. Descobrimos que, quando a professora falava de diversas opções queria dizer, por exemplo, trabalho com geometria, atividades com resolução de problema e com materiais manipuláveis. Por causa das suas dificuldades e certa „aversão‟ à matemática ela precisava de mais apoio para transformar o „cardápio de feijão com arroz‟ em outro mais variado e nutritivo. No ano de 2007, notamos algumas alterações tanto na visão de matemática, como sobre concepções e sobre algumas afirmações dessa professora. Aproveitamos a lógica da professora e utilizamos a sua própria metáfora para questioná-la sobre seu „cardápio‟, em outros momentos. Ela iniciou comentando que sua „dieta‟ ainda estava desequilibrada, mas que já estava tentando acrescentar aos poucos algumas outras opções. A professora Susana afirmou que estava tentando realizar em suas aulas práticas pedagógicas e atividades diferentes das quais realizava anteriormente, como é o caso de levar problemas lógicos, os desafios, e trabalhar matemática com seus alunos de uma maneira mais ampla. Durante alguns encontros em 2007 e em 2008, Susana comentou que conseguiu modificar algumas formas de trabalhar a matemática, ampliando, assim, seu „cardápio‟, mesmo que ainda faltassem algumas outras iniciativas. Susana apontou a importância do grupo nessa mudança de atitude, e afirmou, em diferentes momentos, que o grupo foi um „divisor de águas‟ na sua vida. A seguir, está parte de um diálogo do encontro do dia 06/out/08, no qual ela 286 retoma a metáfora anterior e explica a questão do grupo ser um “divisor de águas”. Susana: olha só... o que eu posso falar que eu aprendi aqui... Eu: Ou a partir de (da participação do grupo)... Susana: Sabe o que acontece... eu aprendi praticamente tudo o que foi passado aqui porque eu não sabia nem a metade e não fazia parte da minha prática. Por exemplo, nem pense que eu me prendia trabalhar frações, que eu achava que era uma coisa que eu não precisava trabalhar. Porque, uma colega que é professora de matemática, muito respeitada, muito boa até, quando eu trabalhava com a 4ª séries perguntei o que eu precisava ensinar para eles para que eles fizessem uma boa 4ª série. Ela me disse: Susana, eles só precisam das quatro operações, só isso. Porque se esses meninos chegarem lá sabendo as quatro operações, você já fez um bom trabalho. Então nunca mais eu me preocupei em ficar dando qualquer outro tipo de conteúdo, a não ser as quatro operações. Então tudo chegou para inovar, então no final das contas tudo o que eu trabalhei envolvia realmente indiretamente ou diretamente as quatro operações, mas que de várias maneiras. E eu perdi muita coisa de ensinar para os meninos por causa disso,... no que eles mediam, no que tinham desafios, o que eles tinham que fazer vários tipos de cálculos, quer dizer, tudo envolviam as quatro operações, de uma maneira bem ampla. Eu ficava só ficava nas continhas e problemas. Eu só ensinava o QVL e problemas, só. Quer dizer, isso foi muito pobre, lembra que eu falei naquele ano lá o cardápio, que Vânia lembrou depois. O cardápio que eu achava que era muito „arroz com feijão‟ e precisava aumentar,... a oferta ali na matemática. Então tudo o que veio aqui, Sandra, veio acrescentando. Por isso que eu falei que depois destes encontros foi um divisor de águas. A minha prática antes e depois, entendeu. Foi muito diferente, entendeu? (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) A professora Susana demonstrou estar mais consciente e fez uma reflexão crítica sobre o porquê trabalhava apenas com as quatro operações. Isso aponta para o problema que comentamos, para outros professores, em relação aos conteúdos matemáticos abordados nas séries iniciais. A professora de matemática, citada por Susana, que era considerada uma boa professora, fez a afirmação que os alunos das séries iniciais precisam, apenas, saber as quatro operações. A professora Susana, mostra nessa fala, que passou a agir conforme essa orientação. Pela nossa prática, notamos que essa fala é comum entre alguns professores de matemática. Contudo, a professora Susana percebeu que poderia continuar trabalhando com as quatro operações de outras maneiras, abordando-as em outros conteúdos. A partir da pertença ao grupo, ela foi refletindo sobre o que fazia e experimentando outras propostas 287 de atividades e abordagens de conteúdos matemáticos. Afirmou que sua prática se modificou, ao longo da participação dos encontros, e por isso afirmou que esse grupo foi um „divisor de águas‟, na sua prática profissional. Na continuidade do diálogo, verificamos que, por falta de alguns encontros em 2008, por problemas de saúde da pesquisadora, Susana realizou atividades que representaram uma tentativa de retorno ao que fazia anteriormente, porém, percebeu, sozinha, que não obtinha os resultados esperados. Eu: E o que você fez este ano que você percebeu esta diferença, que não fazia da mesma forma? ... O que aconteceu este ano que você viu que realmente você estava diferente? Susana: Quando eu quis durante um período [junho e julho de 2008, quando não conseguimos nos reunir por motivos de doença da pesquisadora] fazer como... com eles usando só o QVL e dei uma prova para eles fazerem sem base nenhuma. Só dei a conta, e aí? A turma toda lá embaixo, o resultado foi zero. Pra mim foi zero. Foi muito negativo, pra mim as notas despencaram. Quer dizer, todo o trabalho que havia sido feito antes... Quer dizer, eu acreditei que aquilo fosse uma coisa passageira, que eu não fosse perder, digamos assim... o meu tempo com aquilo, foi só uma passagem rápida. Mas que eu vi que não valeu à pena, marcou muito. E vi que não dava mais para eu fazer aquilo como antes. Por isso que era muito problema. Que eu tinha problemas de aprendizagem e vi que não dava mais certo, num é mais por aí. Entendeu? Num dava. Num dá mais só pra trabalhar a matemática com armar e efetuar e resolver problemas, num dá... Pior mesmo foi saber que os alunos iam para a 4ª série sem saber dividir... (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) A professora Susana verificou que seu trabalho havia modificado e não agia como antes de pertencer ao grupo de estudos. Mas, no momento em que precisei ficar afastada por um período de aproximadamente dois meses e meio ela tentou agir como fazia antes do grupo. Com os resultados obtidos, durante essa experiência, ela notou que não sabia agir como anteriormente. O grupo já havia influenciado! Pensava que poderia realizar as atividades da mesma maneira, porém, não era mais possível. No final da sua fala, afirmou que não conseguia trabalhar em matemática somente com atividades de: armar, efetuar e resolver problemas. Acreditamos que ela percebeu, mesmo estando, ainda, em processo de compreensão e de interiorização, que quando influenciamos e somos influenciados pelo grupo, na qual participamos, entramos num processo de mudança. Cada professora modificou suas crenças e atitudes em relação à 288 matemática, de maneira diferenciada, mas observamos que não podemos ter as mesmas atitudes que tínhamos antes de pertencer ao grupo de estudos. Eu: Então você acabou de falar que a matemática não é mais... somar... Susana: Armar e efetuar e resolver problemas. Eu: E agora ela é o que? Susana: Agora ela é muito mais que isso. Entendeu? Engloba muito mais. Envolve resolução de problemas do dia a dia, envolve desafios, envolve até oficinas. Entendeu? Que foi marcante ano passado. Se não fosse aquele trabalho, eu enlouquecia com aquela turma. Rsrsrs... Ainda bem houve esse trabalho. E esse ano os meus alunos, agora eles começaram a sentir o gostinho... (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Podemos notar, nesse diálogo, um crescimento do processo de reflexão da professora, como consegue exibir um desenvolvimento de sua metacognição e como já possui consciência de suas atitudes (SANTOS, 1993; RIBEIRO, 2003). Além disso, notamos também, como cada professor é formado e se forma na instituição de trabalho, no meio em que está inserido e a partir das pessoas com as quais convive. E que seu desenvolvimento profissional se dá em meio a todas essas características que permeiam seu contexto social, emocional e profissional (LLINARES e KRAINER, 2006). O fato do professor de matemática que comenta que, alunos das séries iniciais, precisam saber apenas as quatro operações e como isso influenciou o trabalho de Susana e como influencia a atividade de outros professores desse nível de ensino, o mais importante foi a professora ter feito uma reflexão crítica de sua própria prática individual. A definição de matemática também foi modificada, ela afirmou, nesse encontro, que matemática representava mais do que „armar, efetuar e resolver problema‟, já envolvia alguns desafios, oficinas (geometria) e problemas do dia a dia. Nesse mesmo encontro (06/out/08), a professora Susana comentou sobre ela em relação à matemática e percebemos que ela se encontrava num processo. Em diferentes momentos, notamos a necessidade de retomar certos conceitos ou conteúdos matemáticos com essa professora, para que ela compreendesse e aprofundar suas construções de significados. Ela estava num processo diferenciado e com consciência disso, conforme podemos verificar na sua fala, a seguir. 289 Susana: Tudo valeu à pena, tudo valeu a pena mesmo. Mas eu ainda estou assim... Eu vou assumir, que estou como se fosse uma criança, no meio de um monte de novidades, ainda preciso explorar mais, tomar muito conhecimento... Aquele material que você preparou para trabalhar com as unidades, dezenas e centenas, eu ainda não trabalhei com aquilo. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Essa fala da professora Susana mostra, claramente, o que comentamos, ou seja, o fato de estar num estágio de desenvolvimento profissional diferente da professora Beatriz. Ela afirmou que, estava como uma criança, no meio de várias novidades e que precisa de um período maior para explorar, aprofundar e tomar conhecimento. Tem consciência de sua condição de estar construindo significados e precisar ir além. No anexo A, mostramos, na íntegra, as respostas das professoras ao questionário proposto para analisar a influência do grupo em suas aulas de matemática. Nessa ocasião, perguntamos sobre suas aprendizagens e obtivemos como resposta da professora Susana o seguinte: O que posso afirmar que aprendi como professora neste período de participação no grupo? Susana: Muitas coisas, diferença entre ouvir de outros sobre suas aulas e o seu agir na sala. O que aprendi de matemática neste período que me marcou? Susana: Muita coisa, todos os conteúdos além das 4 operações. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Essa professora destaca a diferença entre ouvir alguém comentar sobre suas aulas e seu agir. Acreditamos que, muitas vezes, Susana não refletia de maneira crítica e aprofundada algumas de suas atitudes, em sala de aula. Quando passamos a mostrá-la algumas situações, como o exemplo colocado por nós sobre sua dificuldade com a divisão e como levava isso para seus alunos, ela parou para pensar sobre o assunto. Novamente, afirmamos que a reflexão crítica não acontece de maneira natural por todas as pessoas, precisa muitas vezes, ser provocada. Em relação aos conteúdos matemáticos, Susana afirmou que aprendeu todos os conteúdos que foram além das quatro operações. Comentamos, 290 anteriormente, como ela ampliou seus conhecimentos matemáticos, a partir de discussões. Acreditamos que, mesmo em relação às quatro operações, todas nós ampliamos nossos conceitos após os debates e os estudos realizados. Explicitamos, anteriormente, várias falas dessa professora afirmando sobre suas aprendizagens, destacamos nessa parte apenas algumas outras que não tinham sido contempladas. Beatriz e a aprendizagem em grupo A professora Beatriz chegou ao grupo com uma visão positiva da matemática. Ela não possuía aversão a matemática, sua proposta de inserção ao grupo era de aprofundar seus conteúdos e buscar formas diferenciadas de trabalhar a matemática com seus alunos. Detalhamos, anteriormente, algumas afirmações de que sua ideia inicial teria sido atendida e ampliada. Colocamos, a seguir, alguns pontos que consideramos importantes para complementar essas falas anteriores e aprofundar suas colocações em relação às suas aprendizagens. No encontro do dia 06/out/08, a professora Beatriz explicitou algumas de suas considerações sobre as aprendizagens que acreditava ter alcançado com a participação no grupo de estudos. Eu: Mas sem olhar aqui (caderno), sem ser estas coisas pontuais. Beatriz: O que a gente aprendeu... Eu: A Beatriz começou a falar, que os conceitos geométricos que ficaram mais claros... Beatriz: Como poderíamos dizer...acho que eu aprendi a aprender. Eu: Aprendeu a aprender de novo? Beatriz: A pesquisar mais, a gente esquece muita coisa então tem que estar sempre relembrando. O professor tem que estudar sempre. Isso foi o que eu aprendi de mais importante neste grupo todo. Susana: Que a gente nunca sabe nada, aproveitar o tempo agora. 291 Beatriz: O tempo passa e a gente esquece, então a gente tem que reaprender, aprender coisas novas. Aliar aquilo que já sabe, usar a criatividade e melhorar. Enfim, refletir sobre o que se está fazendo. Que a gente muitas vezes não pode, se não tivesse esse grupo, nem estaria fazendo até hoje porque na escola você não tem espaço para isso. Então aqui que a gente fez, fez uma reflexão sobre a matemática, levou para outras áreas, não ficamos só na matemática... (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) A professora Beatriz realizou, nesse momento, uma reflexão importante. Ela afirmou que aprendeu a aprender, mas percebemos que é de uma nova forma. Beatriz afirma que, um professor, tem que estudar sempre, isso mostra a visão dela com a questão da aprendizagem. Ela falou em reaprender, aprender coisas novas, não pode ser do mesmo jeito que antes. Ela comenta que devemos aliar o que já sabemos, precisamos usar a criatividade e melhorar. Com base na reflexão, que ocorreu no grupo, faz um comentário sobre os espaços que são oportunizados na escola. Ela afirma que trabalha num lugar que não possui a possibilidade de proporcionar a reflexão da forma que trabalhamos no grupo durante os encontros. Implicitamente notamos uma crítica ao tipo de formação realizado pela escola que Beatriz trabalha. Esse ambiente escolar não proporciona espaço para tomada de consciência, para reflexão crítica e para crescimento profissional. Sua fala mostra que, esse tipo de formação permanente do professor, foi vivenciado por nós no grupo de estudos. Em sua fala, Beatriz cita que fomos além, ampliamos a discussão para outras áreas. Ela conseguiu visualizar essa interseção em sua prática e pontua alguns detalhamentos importantes, como podemos ver no diálogo a seguir. Eu: Como por exemplo? Beatriz: Como por exemplo, língua portuguesa. Susana: Até aqui em outras coisas... Você lembra que teve um passeio que você levou os meninos na aldeia de índios. Você explorou as formas geométricas lá na aldeia, está aqui. [Conversamos sobre os cadernos e as anotações] Eu: Quando você fala na língua portuguesa, você está falando o que? Beatriz: Na língua portuguesa, por exemplo, quando a gente está criando um problema, está explorando a língua, a leitura deste problema está 292 interpretando. Quando a gente troca as palavras, vê as incoerências, resolve os problemas, vai olhar, rever,... Estruturas frasais. [...] sempre a gente debateu sobre comportamentos, entender determinados comportamentos, às vezes eu chegava angustiada e trocávamos ideias e eu saia daqui diferente, com outra visão. Eu acho que tudo foi muito bom. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) A professora Beatriz comenta a interseção da matemática com a língua portuguesa. Coloca exemplos de como essa disciplina se relaciona com a resolução de problemas. E no que apresentamos, anteriormente, notamos como ela incorporou essa relação entre as duas disciplinas em suas aulas. Quando analisamos as falas da professora Beatriz, afirmamos que ela se pronuncia menos que Susana. Porém, quando averiguamos sua escrita, percebemos que ela consegue se expor e deixar transparecer mais. Na avaliação escrita sobre a influência do grupo e das aprendizagens, ela foi detalhista e pontuou questões relevantes. Colocamos a seguir o que ela respondeu sobre sua aprendizagem (11/ago/08). O que posso afirmar que aprendi como professora neste período de participação no grupo? Beatriz: Acho que reaprendi que é preciso estar sempre procurando superação, é preciso “aprender a aprender” como diz Saviani. O que aprendi de matemática neste período que me marcou? Beatriz: Aprendi noções básicas de geometria, aprendi a repensar conceitos, outras formas de fazer operações matemáticas, outras formas de propor atividades. (transcrição da gravação em áudio de 06/out/08) Novamente, a professora Beatriz coloca o „aprender a aprender‟, ela apresenta isso como uma reaprendizagem. Isso nos mostra que, muitas vezes, sabemos que enquanto professoras, precisamos estar em constante aprendizado, mas as situações que vivenciamos e a necessidade de nos adaptarmos a essa sociedade que exige o rápido, o imediato, nos faz esquecer isso. Em relação à matemática, essa professora afirma que aprendeu noções básicas de geometria. Ela não tinha estudado isso em sua formação e realizava o básico que tinha aprendido ou que estava no livro. Com o que foi 293 apresentado na seção 5.2.2.3, percebemos que essa professora utilizou muitas atividades envolvendo geometria em suas aulas. Ela também pontuou sobre a questão de repensar certos conceitos matemáticos e exemplificou com a questão das operações fundamentais. Conforme citamos, a ampliação dos conceitos, envolvendo as quatro operações, foi uma aprendizagem para todas nós. Algo bem explicitado por Beatriz sobre suas aprendizagens, após inserção no grupo, foi a metodologia, a abordagem dos conteúdos em aulas de matemática. Essa afirmação da professora vai ao encontro com sua proposta de inserção no grupo. Sandra e a aprendizagem em grupo Eu, professora Sandra, pesquisadora deste trabalho, sou professora de matemática e pesquisadora iniciante e estou aprendendo como fazer pesquisa e como ser professora pesquisadora. Esta pesquisa ajudou-me a entender como ocorrem alguns processos de ensino e aprendizagem de matemática em professores e alunos. Aprendi a me conhecer, enquanto professora e aprendiz, de matemática. Deixei isso explícito na minha resposta ao questionário avaliativo da influência do grupo no encontro de 11/ago/08. O que posso afirmar que aprendi como professora neste período de participação no grupo? Sandra: Aprendi a me conhecer, a entender porque faço determinadas coisas de determinada forma, a prestar mais atenção nos meus alunos e no que falam, a entender melhor que os alunos fazem algumas coisas e não percebemos, a perceber que falamos algumas coisas e que muitas vezes as pessoas entendem outras. Inicialmente, eu tinha um olhar superficial em relação ao ensino de matemática nas séries iniciais do ensino fundamental. Tinha consciência da importância em conhecer mais sobre esse espaço de aprendizagens, suas dificuldades e vantagens. Mas não tinha tido a oportunidade de estudar mais profundamente 294 os processos de ensino, aprendizagem e avaliação, nesse nível de ensino. Dessa forma, afirmo que, ao longo dos encontros, meu olhar foi se modificando em relação ao ensino e aprendizagem de matemática, nas séries iniciais. Estou mais atenta às dificuldades dos alunos, a necessidade de se utilizar várias estratégias para atingir os diferentes alunos e suas maneiras de aprendizagem. Acredito que o ensino de matemática, nas séries iniciais, é complexo e que o professor das séries finais deveria, pelo menos, entender os processos de construção do conhecimento, nesse nível de ensino. Afirmei isso, algumas vezes nos encontros, como podemos verificar na minha afirmação no encontro de 06/out/08, quando falávamos sobre as aprendizagens que o grupo nos permitiu. Eu: Pra mim, eu acho que... Pra mim Sandra. Cresceu muito esta questão dessa troca. De eu enxergar a... a matemática da 1ª a 4ª séries com outros olhos. Eu já tinha começado, mas eu acho que aqui deu para clarear bem, como que a gente estar... Ajudando até, como Lucia fala... Nossos alunos de 5ª a 8ª série a partir do nosso conhecimento da matemática da 1ª a 4ª séries. Acho que... Essa visão foi fantástica para mim. Ter a possibilidade de ver este outro lado. Fala Susana. Posso afirmar ainda que estou aplicando algumas coisas aprendidas no grupo em minhas aulas, inclusive nas do ensino superior. Estou mais atenta aos alunos que precisam de ajuda na construção do conhecimento matemático. Tento retomar alguns conceitos matemáticos, com diferentes estratégias, para que eles possam entender ou buscar as informações importantes, que não estão presentes mais em suas mentes e que precisam para desenvolver as atividades propostas. Isso pode ser exemplificado com casos de alunos que possuem dificuldade com funções. Fiz uma interação diferenciada, pela participação em dois grupos de estudos. Um deles, foi o relatado nesse trabalho com professoras das séries iniciais e com foco de discussão nos processos de ensino, aprendizagem e avaliação de matemática, nesse nível de ensino. Outro foi, desde 2006, a participação no projeto coordenado pela professora Vânia Maria Santos-Wagner com professores de diferentes níveis de ensino e com discussões relacionadas a diferentes áreas da matemática numa visão mais geral. Assim, pude fazer uma 295 interface dos dois trabalhos e contribuir, para ambos, no sentido de enriquecer as discussões de um grupo com acontecimentos ou trocas realizadas no outro grupo de estudo. Também oportunizei um trabalho, no qual consegui fazer uma intercessão dos dois grupos em relação ao geoplano circular. No ano de 2007, durante o período de investigação, fui convidada a participar e desenvolver algumas atividades junto a um grupo de educação infantil num Centro Municipal de Educação Infantil – CEMEI. Esse trabalho foi desenvolvido, juntamente, com a professora Vânia Maria Santos-Wagner, que em alguns momentos pode participar dos encontros propostos pelo CEMEI. Nessa oportunidade, pude ter outro olhar relacionado à educação infantil, às propostas de atividades iniciais voltadas para o desenvolvimento de alguns conceitos de matemática que são estudados, posteriormente, em níveis subsequentes. Nas discussões dos grupos de estudos, tive um papel de provocadora, levantando questionamentos sobre acontecimentos das aulas, pois tinha observado e participado das mesmas. Conhecia algumas situações ocorridas durante o processo que mereciam ser debatidas ou evidenciadas. Situações que pudessem provocar a discussão sobre os conteúdos matemáticos e de processos de ensino e aprendizagem de matemática, como foi o caso citado anteriormente das definições de triângulo e quadrado, na geometria euclidiana plana. Essas provocações resultavam em reflexões críticas, reflexões sobre a ação (SCHÖN, 2000/1998) por todas as participantes, ao olhar para uma situação de sala de aula, sejam de suas aulas ou das outras professoras, as participantes se reconheciam em situações parecidas. Bolzan e Izaia (2006) comentam sobre a aprendizagem para a docência na educação superior e afirmam que: As noções de aprendizagem como processo de apropriação e compartilhamento, bem como de professor reflexivo, podem balizar caminhos para que o docente do ensino superior construa, paulatinamente, uma compreensão genuína de sua função como formador (BOLZAN, ISAIA, 2006, p. 497). 296 Eu acredito que, mesmo em formações como a que realizamos, nós pesquisadores, construímos essa compreensão da nossa função como formadora. Por esse motivo, precisamos estar junto com professores e entendermos que também aprendemos quando participamos desse tipo de formação. Relatamos com detalhes vários caminhos trilhados, por nós, nesta pesquisa. O leitor pôde ter uma ideia da riqueza deste trabalho, lembrando que não utilizamos todos os dados coletados. Para organizar nossa investigação, pontuamos na próxima seção as respostas às nossas perguntas e os resultados que conseguimos atingir do nosso objetivo geral. 297 CAPÍTULO VI: 6 FAZENDO UM BALANÇO DO CAMINHO PERCORRIDO: CONSIDERAÇÕES E IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS estacamos, neste capítulo, algumas de nossas considerações, implicações pedagógicas e, consequentemente, nossas conclusões deste estudo longitudinal. Encerrando o trabalho, fizemos um balanço do caminho percorrido, analisando os frutos colhidos, o que conseguimos ver e perceber e o que identificamos para outro caminho ou escolha. Separamos esta seção em três partes. A primeira é um fechamento das aprendizagens que ocorreram nesse caminhar. Retornamos às perguntas e aos nossos objetivos, tentando apontar o que conseguimos identificar ou alcançar, a partir da pesquisa. Na segunda parte, colocamos algumas reflexões sobre esse caminhar, realçamos o que verificamos, a partir do desenvolvimento da investigação, e o que pode ser utilizado por nós, futuramente, e por outros pesquisadores que fizerem pesquisas deste tipo. Por fim, pontuamos algumas implicações do estudo que consideramos relevantes de serem comentadas. 6.1 Algumas aprendizagens decorrentes do caminhar Organizarmos uma formação continuada em contexto, por meio de um grupo de estudos, com professoras das séries iniciais conforme nossa proposta para este trabalho. Focalizamos numa dinâmica em que foi possível agir nesse grupo discutindo, interagindo, vivenciando a matemática desse nível de ensino 298 e agindo entre nós como „amigos críticos‟. De agosto de 2006 a dezembro de 2008, buscamos compreender algumas aprendizagens das professoras, em especial de Susana e de Beatriz, decorrentes da participação no grupo. A partir do entrosamento e da efetivação do grupo, atuamos junto com as professoras, aproximamo-nos cada vez mais delas e de suas práticas em aulas de matemática. No processo que se desenvolveu, ouvíamos e éramos ouvidas, valorizamos os saberes e fazeres das participantes, de maneira que, com a metodologia utilizada, cada uma tinha a sensação de ser, realmente, integrante, podendo opinar, lançar propostas e dar sua contribuição ao grupo. Essa atuação estava de acordo com nossa escolha metodológica de realizar uma pesquisa com perspectiva humanística, na qual “os professores são tratados como pessoas que têm algo de valor para contribuir e não como objetos de estudo. Suas ações são vistas como tendo significados em suas situações ou contextos”48 (CHAPMAN, 2006, p. 111). Para compreendermos algumas aprendizagens das professoras participantes, iniciamos um processo de provocação e aprofundamento da reflexão crítica sobre a prática. Não temos a pretensão de apontar ações/reações das professoras mediante participação no grupo, mas mostrar que essa processualidade de ações proporcionou uma tomada de consciência por parte das envolvidas, levando a aprendizagens a partir de uma construção de conhecimentos, cada qual dentro do que era possível, em seu desenvolvimento profissional (MIZUKAMI et. al., 2002). Percebemos a importância do convívio coletivo e da interação entre as participantes, pois nesse tipo de envolvimento cada um oferece o que sabe e, estando aberto para ouvir e analisar posições diferentes das suas, adquire outras formas de ver o mundo, de se ver nele e de compreender seu papel no exercício profissional (MIZUKAMI et al., 2002, p. 43). 48 Teachers are treated as persons who have something of value to contribute and not as objects of study. Their actions are seen to have meaning in their situations or contexts (CHAPMAN, 2006, p. 111). 299 Afastando-nos do contexto dos encontros e das aulas das professoras Susana e Beatriz, procuramos analisar os dados coletados e compreender algumas aprendizagens, não nos esquecendo do complexo e amplo contexto em que as aprendizagens ocorreram. Foi necessário ficarmos atentas às emoções e às atitudes das professoras, no que diz respeito à matemática, em especial a algumas de suas concepções e crenças e de seus processos de mudanças ao longo do desenvolvimento da pesquisa. Tendo como base nosso objetivo geral, analisar aprendizagens das professoras em uma formação continuada ocorrida num grupo de estudos sobre matemática nas séries iniciais e em suas práticas pedagógicas, desenvolvemos o que segue. Destacamos, separadamente, as perguntas de investigação e apresentamos o que ficou mais forte em cada uma delas. Tentamos apresentá-las dessa forma, porém, sempre que necessário apontamos algumas inter-relações com outras perguntas e com as aprendizagens relacionadas. I. Que aprendizagens das professoras participantes se destacam num grupo de estudos e em suas práticas pedagógicas? Podemos afirmar que não prevíamos algumas aprendizagens observadas no decorrer deste estudo longitudinal. Sabemos que as aprendizagens ocorreram de forma diferenciada, e cada professora teve um tipo de aprendizagem decorrente de onde se encontrava em seu desenvolvimento profissional, no momento da pesquisa. Afirmamos também que, durante essa caminhada, algumas resistências e algumas dúvidas foram sendo quebradas ou modificadas. Conseguimos identificar algumas aprendizagens das professoras ao analisarmos as construções dos diferentes conhecimentos que se deram ao longo do processo. A partir desta pesquisa, confirmamos que as aprendizagens se deram na produção de significados e na apropriação de conceitos e que 300 estão, diretamente, ligadas à construção dos diferentes conhecimentos, da mesma forma apontada por Llinares e Krainer (2006). No capítulo 5, destacamos algumas conhecimentos dos das evidências conteúdos da matemáticos, construção de conhecimento diferentes pedagógico matemático, conhecimento de currículo de matemática das séries iniciais e conhecimento dos alunos, construídos pelas professoras participantes. Apresentamos, a seguir, uma síntese dessas aprendizagens que foram evidenciadas e/ou percebidas por nós, durante a investigação e que merecem registro. Algumas aprendizagens de conteúdos matemáticos que ficaram mais evidentes e significativas foram aquelas relacionadas à resolução de problemas, envolvendo as quatro operações e a geometria. De acordo com as próprias professoras, as quatro operações representam o foco central de trabalho nas séries iniciais do ensino fundamental – Susana afirmou isso em diferentes momentos. Ao aprofundarmos nossos olhares para atividades, envolvendo resolução de problemas levados pelas professoras ao grupo, constatamos que aprenderíamos mais sobre o assunto. Identificamos que dominamos o algoritmo das operações e nem sempre analisamos as sutilezas que abraçam cada problema e nem as diferentes formas de pensar dos alunos. Nossos estudos foram intensificados sobre a construção dos conceitos que compreendem as quatro operações fundamentais e sobre as particularidades, na forma de pensar, relacionada aos diferentes processos de estrutura que podem ser formados por uma pessoa ao resolver problemas que envolvam tais operações. Muitas vezes, nós, professores, não damos importância às nuances das operações e, por esse motivo, deixamos de realizar um trabalho adequado com os alunos para que esses compreendam as sutilezas e diferenças de significados dentro de uma mesma operação. Isso foi percebido intensamente no trabalho realizado com a professora Beatriz sobre divisão com resto não nulo. No qual aprendemos que precisamos estar mais atentas para como os alunos resolvem esses tipos de problemas, mas se confundem ao apresentarem os resultados. Notamos também que devemos abordar, em 301 diferentes momentos, durante o processo de ensino e aprendizagem, um mesmo conceito para que este seja construído por professores e alunos de forma significativa e adequada. Aprendemos que se faz necessário um trabalho de avaliação contínua, para identificação de dificuldades na construção dos conceitos. Ressaltamos que trabalhos como a escrita da forma de pensar um problema e sua solução, a invenção de problemas pelos alunos e ainda a explicação para outros colegas de como o processo de solução contribui para a construção dos conceitos e superação de obstáculos de aprendizagem que porventura surjam (SANTOS, 1993, 1997; SANTOS-WAGNER, 2003). Após a execução dessas atividades, não garantimos que todos os alunos se apropriaram do conceito e conseguiram construir, de maneira adequada, o significado da divisão com resto não nulo. Porém, afirmamos que um trabalho realizado dessa natureza concorreu para que um maior número de alunos conseguisse atingir níveis mais significativos de compreensão. Consideramos que essas formas de abordagens foram aprendizagens do conhecimento pedagógico matemático por todas nós e, em especial, por Beatriz. O trabalho abrangendo as quatro operações, possibilitou-nos outras aprendizagens. Em relação ao conhecimento pedagógico matemático, notamos que algumas crenças e concepções das professoras induzem suas práticas, como foi o caso de Susana. Ela acreditava que o trabalho com continhas (conforme denominava), com o quadro valor de lugar (QVL) e com problemas isolados, envolvendo as operações fosse suficiente para o desenvolvimento das crianças na construção desses conceitos. Durante os encontros, ela concluiu quanto a importância de se realizar outros tipos de abordagens e de aproveitarem as oportunidades em sala de aula para aprofundarmos diferentes conteúdos matemáticos. Verificamos, porém, que essa professora conseguia fazer inter-relações de várias disciplinas de maneira surpreendente, inclusive valorizando questões sociais – aprendemos essa forma de atuação com ela. No entanto, ela não tinha percebido que poderia fazer a mesma coisa com os conteúdos matemáticos. Aos poucos, ela mesma verificou que essa conexão era possível e que trazia benefícios para a aprendizagem de seus alunos e também para a própria Susana, uma visão mais ampla da integração dos 302 conteúdos matemáticos. Questionamo-nos sobre as formações, tanto inicial como continuada, dessa professora e refletimos sobre algumas possíveis lacunas com relação às formações de um modo geral. Percebemos que o currículo de matemática foi visto como conteúdos isolados e que deveriam ser trabalhados separadamente; essa visão prejudica um trabalho adequado para a estruturação da base do edifício matemático pelos alunos (PCN – BRASIL, 1997). Ressaltamos a importância de formações continuadas em contexto, conforme nosso grupo de estudos, que pôde ouvir a professora, compreender qual sua visão, discutir e analisar outras possibilidades, além de verificar na prática como outros modos de atuação seriam possíveis. Supomos que foram situações desse tipo que levaram Susana a afirmar que o grupo foi um divisor de águas em sua profissionalização e em sua prática. A forma de visualizar e de realizar outras possibilidades para sua atuação em aulas de matemática, percebendo o currículo de matemática como um sistema amplo e com várias conexões entre seus conteúdos, contribuiu para essa visão diferenciada. Importa realçarmos que formações iniciais e continuadas precisam estar atentas para quais visões de matemática e de seu currículo, eles já possuem e quais estão ajudando a construir. É imprescindível que se mostrem cada vez mais, aos futuros professores e aos que já atuam, as inter-relações entre os conteúdos matemáticos e entre estes com os de outras disciplinas. Desmistificando e modificando, dessa forma, algumas crenças e concepções de matemática que existem, em especial com os profissionais que atuam nas séries iniciais. A aprendizagem de conteúdos matemáticos relacionados à geometria pôde ser percebida e/ou evidenciada pelas professoras de diferentes maneiras. A princípio, identificamos que as professoras não tiveram formação adequada sobre os conceitos geométricos e, por isso, tinham dificuldades nas formulações dos próprios conceitos e também em trabalhá-los em suas aulas. Essa constatação vai ao encontro de resultados de várias pesquisas sobre o tema, como a de Nacarato e Passos (2003) e a de Dana (1994/1987). Nossa pesquisa também confirmou uma situação percebida por Dana (1994/1987): a inadequada formação em geometria influencia diretamente na abordagem 303 desse conteúdo nas aulas de matemática. Susana não abordava nenhum conteúdo geométrico em suas aulas e Beatriz afirmou que trabalhava apenas com questões referentes a medidas, área e perímetro. Essas escolhas representavam frutos da insegurança e do desconhecimento das professoras quanto aos conceitos geométricos e quanto às forma de abordagem com os alunos. Ressaltamos, novamente, a importância da atuação do grupo. Ao se sentirem respeitadas e pertencentes a um grupo que tinha um desejo diferente de apontar „erros‟ ou „problemas‟ em suas práticas, Susana e Beatriz sentiramse seguras ao afirmar que não trabalhavam a geometria de maneira adequada e que possuíam consciência sobre o que as levou a tomar tal atitude. Sob influência de Lucia e minha, iniciamos abordagens de alguns conceitos e conteúdos geométricos que cativaram as professoras Susana e Beatriz. Identificamos que, além de realizarmos atividades para que as professoras pudessem (re) construir alguns conceitos geométricos, precisávamos desenvolver atividades que mostrassem como abordar esses conteúdos em aulas de matemática. Essa aprendizagem de conhecimento pedagógico matemático proporcionou uma participação ativa de minha parte e da de Vânia nas aulas de Susana e Beatriz. A insegurança das professoras com a geometria nos levou a assumir algumas de suas aulas e a conduzir as atividades, mostrando alguns possíveis caminhos para abordagem desse conteúdo. Foi um importante aprendizado, já que desejávamos trabalhar junto com elas, e ao mesmo tempo, organizar nossas propostas para ajudá-las a vislumbrar caminhos possíveis. Susana se identificou com algumas dessas atividades, envolvendo geometria as quais poderiam ser abordadas como oficinas de matemática e passou a utilizá-las em suas aulas, ampliando assim seu „cardápio‟. E melhor, percebemos que os alunos reagiam entusiasmados às atividades e interagiam, intensamente, entre si, inclusive aqueles considerados especiais (portadores de necessidades especiais). A maneira pela qual desenvolvemos os trabalhos no grupo de estudos, dando voz às professoras e ouvindo as mesmas, ajudou-nos a compreender a necessidade de trabalhar, em diferentes momentos, as construções de alguns 304 conceitos matemáticos, como foi o caso de Susana com a (re) construção dos conceitos ligados aos polígonos. Isso nos mostra que não podemos garantir que, em uma única apresentação ou formação, as professoras se apropriem dos conceitos ou conteúdos trabalhados. E mais ainda, ao final da pesquisa ainda não podemos garantir que todos os conceitos geométricos, incluindo polígonos foram construídos por Susana, por exemplo. Mas, acreditamos que já desestabilizamos suas construções conceituais e avançamos em algumas abordagens, realizando assim, um desequilíbrio cognitivo nessa professora, assim como aconteceu com Beatriz. Em nossa pesquisa, houve oportunidade de termos mudanças interpessoais e intrapessoais, ocorrendo em nossos diálogos e em nossas atividades (VYGOTSKY, 1988). Confirmamos o que alguns autores (DAVIS; NUNES; NUNES, 2005; FERREIRA, 2003, 2003a; SANTOS, 1993, 1995) comentam, sobre a necessidade de agirmos, tanto em formações iniciais ou continuadas, para provocarmos desequilíbrios cognitivos em conceitos construídos e aceitos como verdadeiros, como também desequilíbrios emocionais em relação às crenças e às concepções a respeito de matemática e de seu ensino. Uma aprendizagem para nós, enquanto formadoras de professores, foi registrarmos diferenças entre as formas de agir no grupo e de desenvolver as diferentes abordagens efetuadas em sala de aula. Além disso, termos consciência do objetivo de cada integrante do grupo, no intuito de desenvolvermos atividades que pudessem levá-las a atingir seus objetivos. Um exemplo disso foi o caso de Beatriz que desejava ampliar seus conhecimentos matemáticos e buscar novas metodologias de trabalho para suas aulas. Quando começamos a discutir questões referentes a conhecimentos geométricos, ela pôde tirar suas dúvidas, se motivou e se encorajou a abordar esse conteúdo. Ampliando, inclusive, a nossa proposta de estudo para tais conceitos matemáticos. Destacamos ainda, como aprendizagem de conhecimento pedagógico matemático, a utilização de diferentes metodologias e ações diferenciadas em aulas de matemática. O uso de diferentes linguagens (oral, escrita, pictórica, 305 dentre outras), em aulas de matemática, de acordo com as propostas apresentadas em Santos (1997), contribuiu para nos aproximar dos modos de pensar dos alunos. A professora Beatriz abordou a linguagem escrita de forma que os alunos descrevessem os passos para o desenvolvimento das questões apresentadas, a fim de produzir textos individuais e coletivos, poesias e cartas. Como teve sua formação em língua portuguesa, associou a isso a proposta da professora Vânia e de outros pesquisadores sobre a utilização da linguagem nas aulas de matemática (SANTOS, 1997; POWELL; BAIRRAL, 2006). Confirmamos, a partir da prática das professoras e de nossas participações nas aulas, que o aluno precisa experimentar e vivenciar muitas situações em que tenha que verbalizar e expressar suas ideias sobre as soluções de atividades em matemática (SANTOS, 1997, p. 24). Aprendemos também a diferenciar formas de ensinar e de interagir com os alunos, nos diferentes níveis de ensino que atuamos. Mostramos neste trabalho algumas situações específicas das professoras Susana e Beatriz, mas também colocamos afirmações das outras professoras. A professora Lucia afirmou que modificou seu olhar para o aluno da 5ª série (6º ano), ao conhecer algumas práticas realizadas e conteúdos trabalhados nas séries iniciais. Eu mesma afirmei que modifiquei minha forma de agir com alunos do nível superior, através do conhecimento de outras práticas das professoras participantes do grupo de estudos. Professora Vânia comentou sobre o quanto pôde aprender, em particular, com as professoras Beatriz e Susana sobre outras formas de dialogar e de interagir com os alunos das séries/anos iniciais e como o grupo de estudos permitiu que todas nós tivéssemos momentos de desequilíbrios cognitivos e de aprendizagens de conhecimentos pedagógico matemático e outros. Ao partilharmos nossas experiências e nossos anseios, discutindo e buscando alternativas para as situações apresentadas, aprendíamos diferentes formas de lidar com nossos alunos. Em comentários durante os encontros e nas observações/participações em aulas, percebemos que Beatriz tentava sempre prender a atenção de seus alunos e motivar a participação dos mesmos nas atividades e debates de suas 306 resoluções. Aprendemos com ela a dar tempo aos alunos para apresentarem suas soluções e debaterem com os colegas as dúvidas. Diagnosticamos também a necessidade de trabalhar as diferenças em sala de aula e valorizar cada aluno, mesmo com suas limitações. Discutimos em diferentes momentos, a realização de trabalhos em grupos com os alunos, o que nos levou a explorar, em sala de aula, algumas possibilidades de atividades em grupo. Com isso, aprendemos a superar nossas restrições e dúvidas quanto a esse tipo de atividade. Segundo Beatriz, a maior dificuldade em realizar trabalhos em grupo, era acreditar que a agitação dos alunos prejudicaria a aprendizagem. Aos poucos, ela foi superando esse obstáculo em sua forma de agir e percebeu que poderia obter bons frutos no trabalho em grupo com seus alunos. Susana não teve tanta resistência e conseguiu incorporar, em sua prática, o uso de trabalho em grupos, abordando diferentes conteúdos. Durante a pesquisa, essa professora teve turmas agitadas, mas afirmou, em diferentes momentos, que não se importava em trabalhar em grupo, mesmo que seus alunos ficassem agitados, desde que eles pudessem estar aprendendo matemática de maneira agradável. Em diferentes momentos, discutíamos questões referentes à avaliação dos conteúdos abordados. Enquanto debatíamos sobre as avaliações realizadas pelas professoras, intensificávamos nossa reflexão crítica sobre avaliações de aprendizagem. A professora Beatriz asseverou que aprendeu a dosar o nível de dificuldade das questões formuladas, possibilitando assim uma maior satisfação de todos os alunos e dela própria. Também lançava na prova alguns desafios, como questão extra, para incentivar os alunos situados além da média da turma. Ademais, aprendemos a importância de analisar os erros cometidos pelos alunos e de encarar os mesmos como formas de nos questionarmos sobre os procedimentos de ensino e de procurar modos de incentivar os alunos a corrigir alguns desses erros e a reconstruir alguns conceitos. As discussões do grupo sobre as avaliações e os resultados das mesmas foram importantes para a construção desses conhecimentos e consequentes aprendizagens. 307 Em 2006, Susana nos motivou a abordarmos sobre avaliações, quando levou uma de suas provas, que continha apenas atividades do tipo „arme e efetue‟, sem nenhum contexto ou problemática. Em todo o processo, percebemos que, com a influência do grupo, ela iniciou uma busca de abordagem diferenciada na forma de realizar suas avaliações. Em alguns momentos, a professora poderia ter sido mais ousada, mas sabemos que ela se encontra num momento diferenciado de desenvolvimento profissional, em um estado inicial de consciência sobre suas crenças, suas concepções, seus conhecimentos e suas estratégias de abordagem e de avaliação de conceitos matemáticos. Ela estava perdendo o medo da matemática e da forma de tratar os conteúdos em suas aulas. Susana define, claramente, o momento vivido por ela ao afirmar que estava como criança descobrindo várias coisas diferentes e que precisa de um tempo maior para entender e se apropriar de todas as novidades. Mostrando assim, como a dinâmica vivenciada pelo grupo, na qual agimos como „amigos críticos‟, foi determinante para o início de mudança de atitude dessa professora. Eram olhares externos que compreendiam e vislumbravam outras possibilidades, sem destacar falhas, erros ou intimidar a professora, intermediadores que proporcionavam outros caminhos, confrontando e desequilibrando. Enfatizamos ainda, como um processo de formação se dá de maneira lenta e contínua, qual uma formação permanente e que depende do modo que é vivenciado para provocar mudanças em práticas. Algumas evidências de aprendizagem de conhecimento pedagógico matemático da professora Susana foram sua organização dos conteúdos, inserindo desafios e trabalhos com diferentes metodologias. Quando comentamos sobre a organização dos conteúdos, queremos nos referir à ampliação dos conteúdos matemáticos trabalhados por essa professora. Ela buscou, independentemente, problemas do tipo „desafios‟, que implicavam raciocínio lógico matemático, para tratar em suas aulas. Um fato interessante, merecedor de destaque, é que apesar de Susana ter afirmado que possuía medo da matemática, gostava de trabalhar com esse tipo de raciocínio. Pensamos que a professora Susana teve uma formação inadequada, mas nos encontros observamos que ela realizava articulações da matemática, de forma 308 plausível, com o que sabia. Essa diferenciação da forma de aprender é característica de aprendizagem do adulto, que deve ser analisada de maneira diferenciada. Precisamos estar atentos às possíveis conexões que alunos e professores fazem ao construírem conceitos matemáticos. Considerávamos não adequada a maneira pela qual a professora Susana trabalhava com o livro didático. No desenvolver deste estudo, conseguimos mostrar-lhe outras formas de trabalhar com o livro didático que pudessem atingir, de maneira mais satisfatória, seus objetivos em relação às abordagens dos conteúdos matemáticos. Isso representa um exemplo de outras aprendizagens que aconteceram e que não selecionamos para apresentação detalhada neste trabalho. Tendo uma postura de amigos críticos e tentando compreender a realidade das professoras, fomentávamos possíveis transformações para algumas mudanças. Um exemplo foi a contribuição que o grupo deu para a visão da professora Susana sobre o potencial de seus alunos, pois verificamos que, em alguns momentos, ela não trabalhou nossas propostas por acreditar que estava longe do alcance de seus alunos. Tinha uma visão focalizada nas dificuldades que seus alunos possuíam em relação à defasagem de conteúdos. Propusemos que realizasse atividades diferenciadas, com uso de materiais concretos, já que gostava desse tipo de atividade, mas não a tratava de maneira ampla. Susana denominou esses momentos de uso com materiais concretos e aulas diferenciadas de „oficinas‟. Em suas oficinas, ela conseguiu abordar conceitos geométricos, a linguagem escrita de seus alunos e problemas, envolvendo as quatro operações. Com isso, as integrantes do grupo conseguiram mostrar a Susana que seus alunos poderiam ir além do que ela esperava e que nisso acreditasse que fossem capazes. Com nossa participação em suas aulas, mostramos que determinadas atividades poderiam ser realizadas por seus alunos, apesar das limitações deles. Um fato interessante que deve ser destacado foi dar tempo para que ela aceitasse, compreendesse e acreditasse que nossas propostas valiam a pena ser colocadas em prática. Isso serve de indicação para outras formações 309 continuadas, o professor precisa ter tempo, estar ciente e disposto a realizar as propostas, se assim não for, não obterão os resultados esperados. Também estávamos à disposição da professora e atuando junto com ela em sua sala de aula. O que passou uma segurança maior para ela, ao aceitar ousar e modificar algumas de suas práticas. Formadores de professores precisam estar conscientes de que mudanças serão possíveis enquanto professores sintam necessidade e vontade de arriscar ou de experimentar novas propostas metodológicas. Formas de estabelecer e implementar o contrato didático, juntamente com os alunos, foi algo debatido por nós em diversos encontros e que representam aprendizagens de todas nós sobre o conhecimento pedagógico. As professoras Susana e Beatriz construíam, no início do ano, juntamente com seus alunos, algumas normas de convivência que estavam relacionadas com o contrato didático. Essas normas com deveres e direitos ficavam afixadas em suas salas e eram retomadas durante o ano. Quando retornei para as minhas turmas de ensino fundamental, no ano de 2009, percebi que precisava trabalhar um pouco desse contrato didático com meus alunos de 7ª e 8ª séries. A atuação no grupo ocorreu de maneira tão intensa que, muitas vezes, realizamos algumas práticas que incorporaram detalhes do que foi debatido pelo grupo, sem que percebêssemos, conscientemente, tal ato. A aprendizagem que ocorreu em todas as integrantes sobre o conhecimento dos alunos se deu após discussões e questionamentos. A partir das trocas de experiências, compreendemos que necessitávamos ter um olhar diferenciado dos nossos alunos, assim como fazíamos no grupo com as outras participantes e suas experiências diversificadas. Muitas vezes dividíamos anseios e frustrações de situações vivenciadas por alunos e após ouvirmos opiniões de nossos „amigos críticos‟, conseguíamos vislumbrar opções para a situação apresentada. Um fato que demonstra isso ocorreu nas aulas de Beatriz, ao iniciar um trabalho diferenciado com um grupo de alunos com dificuldades em matemática. Ela denominou esse grupo de alunos de „grupinho‟ e nos encontros do grupo a questionamos quanto a adequação. Após refletirmos 310 sobre as denominações, que a sociedade e nós mesmos colocamos, ela decidiu chamá-los de „colaboradores‟, já que queria inserí-los e colocá-los para realizar as tarefas propostas de maneira mais intensa. Esse trabalho teve resultados positivos para a maioria dos alunos. Outro fato aconteceu ao trabalharmos com os problemas de divisão com resto não nulo, ao falarmos das pessoas que sobravam. Susana, que sempre estava preocupada com questões sociais referentes aos alunos, chamou-nos a atenção, pois ninguém gosta de pertencer às sobras. Em outras ocasiões, chegávamos ao encontro com alguns problemas ocorridos com alunos ou trabalhos e partilhávamos, buscando outros olhares e possibilidades de tratarmos a situação. Com esses exemplos, queremos destacar que nossas discussões foram além dos conteúdos matemáticos, assim como nossas aprendizagens, possibilitadas pela dinâmica realizada pelo grupo, conforme apresentamos nas respostas ao questionamento da pergunta III. Uma aprendizagem importante para todas nós foi a de identificar que, momentos em salas de aula de matemática e de troca de experiências, entre professores, podem tornar-se fonte de conhecimento local e em contexto. Esse conhecimento permite olhar de maneira diferenciada para nossas próprias práticas e para outras, identificando o que somente um olhar mais atento e que não está acostumado com a situação pode revelar – esse foi um dos papéis do amigo crítico. Muitas vezes, a professora Beatriz comentou que nós, enquanto grupo, conseguíamos enxergar situações e perspectivas que ela não havia percebido em suas aulas. Acreditamos que esse fato vai ao encontro do que Mizukami et al. (2002, p. 49) afirmam: “quando os professores descrevem, analisam e fazem inferência sobre eventos de sala de aula, eles estabelecem seus próprios princípios pedagógicos”. Portanto, essa afirmação corrobora que a reflexão pode oferecer oportunidades de objetivar suas teorias práticas/implícitas (SANTOS, 1993). Em nossa pesquisa, conseguimos reforçar o que Llinares e Krainer (2006, p. 442) destacam sobre a importância da reflexão crítica, colocando-a como “elemento chave nos processos do desenvolvimento e requer para além da aprendizagem desde que assuma que 311 reflexão é um modo pelo qual os professores continuem aprendendo sobre ensino e sobre eles próprios enquanto professores”. Queremos destacar que talvez, uma das aprendizagens mais importante e significante que concretizamos nesse grupo aconteceu nas práticas: realizávamos uma investigação da própria prática. Dessa forma, precisávamos olhar para nós mesmas e identificar nossas fortalezas, fraquezas, sucessos e insucessos em relação à matemática. Ou seja, fomos aprendendo a desenvolver nossa consciência metacognitiva (SANTOS, 1993, 1997), sobre nós próprias, enquanto professoras. E fomos praticando em diversas situações do estudo a consciência metacognitiva, ao pararmos em conjunto e sozinhas, para rever e refletir sobre momentos e situações de sala de aula. Havíamos de estar em constante formação e reflexão crítica, e cremos que seja o que Beatriz afirmou, ao comentar que o mais importante acontecimento foi a visão de que precisamos „aprender a aprender‟. Formadores que atuam em formações iniciais e continuadas precisam estar atentos para essa questão. Em nossa pesquisa, avançamos o que Santos (1993) pontuou sobre a consciência metacognitiva de futuros professores, mostramos que isso deve ocorrer ao longo do desenvolvimento profissional em uma formação permanente. A questão da metacognição está relacionada aos aspectos cognitivos e afetivos, abordamos. Focalizamos a seguir, alguns pontos importantes que ocorreram no grupo vinculados a esse assunto. II. Que relações entre aprendizagens de professoras e alguns aspectos afetivos podem ser evidenciadas num grupo de estudos de matemática? Comentamos, anteriormente, que utilizamos algumas metáforas para nos aproximarmos do pensamento do professor e desvelarmos algumas crenças, concepções e emoções. Apresentamos, na seção 5.1.1, algumas crenças e concepções das professoras em relação à matemática. Analisando as suas respostas, em diferentes momentos da pesquisa, realizamos uma comparação 312 e chegamos a algumas mudanças em relação às crenças e concepções sobre matemática das professoras participantes. A professora Beatriz possuía uma visão positiva da matemática, tinha consciência de suas limitações, mas acreditava que poderia superá-las e aprender o que não sabia. A questão do domínio da matemática foi algo apresentado por ela. Constatamos que essa professora possuía uma visão da matemática como algo útil e indispensável, mas que havia certas sutilezas, que ela desconhecia ou que podia surpreendê-la. Tendo consciência da formação deficitária em matemática, buscou, algumas vezes, por iniciativa própria, aprender o que não foi possível em sua formação. Em diferentes momentos, a professora criou uma metáfora comparando a matemática a um cavalo, mas, nos encontros finais, ela afirmou que conseguia dominá-lo melhor, pois já tinha aprendido alguns conceitos matemáticos dos quais possuía dúvidas, e o „cavalo‟ estava dando menos coices. Devido essa visão positiva da matemática, apenas tendo algumas restrições relacionadas com assuntos que não sabia, Beatriz conseguiu aprofundar sua aprendizagem de conceitos matemáticos e desenvolver muitas das propostas debatidas nos encontros em suas aulas. Gostava de aprender sobre outros conteúdos que não dominava ou mesmo desconhecia. Ela buscava superar as dificuldades e tentava levar para suas aulas diferentes atividades, ampliando assim suas aprendizagens. A relação com o grupo foi importante, a fim de que ela pudesse levantar suas dúvidas e dificuldades e conseguisse algumas respostas ou caminhos para superá-los. O seu fascínio pela matemática e algumas iniciativas do grupo a levaram a buscar caminhos diferenciados para estudar esta disciplina. Quando olhamos as respostas da professora Susana, visualizamos uma mudança real de suas crenças em relação à matemática. Desde o início, ela afirmou a utilidade da matemática, considerando-a essencial para a vida humana. Em diferentes metáforas, ela buscou associar a matemática a algo útil e presente em todos os lugares, caracterizou a matemática numa visão instrumentalista (ERNEST, 1989). Também mostrou que possuía medo da matemática e que pensava estar muito longe desse conhecimento, mesmo 313 sabendo que a matemática estava em todos os lugares. O interessante foi o caso da comparação com a barata, conforme citado anteriormente. Ela mudou radicalmente sua resposta, compreendemos que a matemática se transformou em algo que não lhe causava nojo ou repulsa. Ela descobriu uma matemática que não tinha sido visualizada antes por ela, as outras integrantes do grupo, por serem apaixonadas por matemática, conseguiram mostrar-lhe outras possibilidades. Afastou-se da matemática por suas experiências anteriores e acreditava não ser possível aprender mais do que o „básico‟. À medida que ela começou a se abrir para a matemática e aceitar outras possibilidades, deixouse contagiar pela paixão das outras integrantes e começou a modificar sua crença. Constatamos que a construção de conceitos e conteúdos matemáticos, começou a fluir, e a matemática deixou de ser um bicho de sete cabeças. A influência do grupo foi fundamental, ela não era excluída por ter „medo‟ da matemática, ao contrário, tentávamos mostrar-lhe outros caminhos, outras escolhas e por consequência outras atitudes frente a matemática. Sua inserção no grupo permitiu-lhe olhar a matemática de maneira diferente, conforme já citado, passando a identificar alguns conteúdos com os quais poderia trabalhar em sala de aula. Ao final da pesquisa, Susana estava como criança, conforme ela mesma disse, necessitando descobrir mais sobre a matemática que começou a encantá-la. As professoras Vânia e Sandra visualizavam a matemática como algo bonito, que está em muitos lugares e possui interseções entre os diferentes conceitos. Consideram que o interesse pela matemática pode ser descoberto por qualquer pessoa, mesmo por aquelas que possuem crenças negativas sobre a matemática. Acreditam que os conhecimentos podem ser (re) construídos e que podemos criar diferentes espaços para que a matemática seja trabalhada. Vânia acredita que a matemática pode abrir novas possibilidades. A crença dessas professoras reflete-se em suas atitudes de encarar a matemática como uma busca de novos horizontes e novas aprendizagens. A partir dos resultados de nossa pesquisa, confirmamos a importância em analisar crenças, concepções e emoções em relação à matemática para 314 compreendermos algumas das atitudes e conhecimentos das professoras. Reforçamos, assim, o que Ponte e Chapman (2006) apontam ao afirmarem sobre a importância de serem estudadas crenças e concepções dos professores em investigações que se analisam conhecimentos e práticas de professores, objetivando a compreensão do fazem e porque fazem de determinada maneira. Nos encontros do grupo, as professoras comentavam sobre suas experiências enquanto alunas e professoras de matemática. Sabemos que, enquanto elas buscavam em suas memórias essas experiências, o afeto relacionado a essas situações ficava aflorado. As vivências e experiências que aconteceram ao longo do estudo permitiram que o afeto e as crenças relativas à matemática foram se tornando conscientes. Isso realça a importância de levarmos os professores a refletir sobre suas próprias crenças e concepções para que entendam algumas de suas atitudes em relação à matemática (ERNEST, 1989; GÓMEZ CHACÓN, 2003). Quando Bruner (1997) aborda a questão da memória na construção e constituição das narrativas retoma o papel do afeto, ressaltando que, ao tentarmos lembrar algo estamos mais propensos a recordar algum afeto que esteja relacionado ao que deve ser buscado na memória. Essa situação foi vivenciada pelas integrantes do grupo quando relatavam suas memórias positivas e negativas. Esse afeto pode ser positivo, algo que foi bom; ou negativo, quando algo foi desagradável. O que Bruner (1997) acrescenta à forma de analisar as narrativas envolvidas pelo afeto é que essas estão diretamente relacionadas à dimensão interpessoal. Ele afirma que recordar o passado também serve a uma função dialógica (BRUNER, 1997, p. 56). Assim, quando nós, professores, contamos histórias do passado, estamos relatando algo que tem uma dimensão afetiva e uma dimensão dialógica com as outras pessoas que estão ouvindo, como visto em diferentes momentos do grupo. Percebemos o afeto envolvido, como o caso de Susana e seus medos em relação à matemática e a Beatriz com seus encantamentos, principalmente em relação à resolução de problemas. As relações identificadas nesses casos são aquelas referentes às vivências 315 anteriores de cada professora. Cada participante trouxe para o grupo suas memórias positivas e negativas em relação à matemática, e suas colocações e aprendizagens estavam diretamente relacionadas a essas memórias. Ou seja, foi possível percebermos a ressonância que nossas histórias tinham com as histórias, experiências, afetos e crenças das outras (CHAPMAN, 2005; SANTOS-WAGNER, 1999, 2003, 2006). Sabendo que algumas aprendizagens ocorreram pela dinâmica que conduzimos o grupo, concluímos que, ao conhecermos umas as outras, cultivamos o respeito e a confiança. Atuar junto com as professoras agindo como „amigos críticos‟ foi fundamental para os resultados desta pesquisa. Essa atuação contribuiu para que interagíssemos de forma ampla nas aulas das professoras, entendendo e compreendendo as diferentes situações ocorridas. Concordamos com Mizukami et al. (2002) ao destacarem a confiança como importante para a convivência em grupo com ações colaborativas, como foi o nosso caso. Estes autores ressaltam que, em alguns momentos, essa confiança é necessária até mesmo para aceitarmos outros pontos de vista. Isso ocorreu no grupo e acreditamos que o respeito tenha sido o ponto forte para superar esses momentos. Eles afirmam que a confiança é uma necessidade nos projetos colaborativos. Trata-se, no entanto, de noção complexa e multifacetada. Os membros depositam plena confiança em seus pares, de forma a partilharem confidências e a falarem aberta e criticamente. Essa forma de confiança vai além da mera escuta e da tolerância e inclui o sentido de que quem fala será levado a sério e suas ideias serão escutadas com interesse, servindo de base para reformulações. Inclui também a confiança – alimentada pela inquirição dialógica – que os membros devem ter em relação ao grupo, de forma a tolerar ambigüidade, momentos continuados de desentendimentos, não partilha dos mesmos pontos de vista e discussão continuada, mesmo quando for desconfortável se colocar no lugar do outro (MIZUKAMI et al., 2002, p. 145). Confirmamos em nossa pesquisa a importância da confiança e do respeito apresentada por esses autores. Corroboramos da necessidade desses aspectos para a realização de práticas colaborativas, apesar das diferentes visões entre as participantes. Realizamos um trabalho junto com as professoras, e não um trabalho sobre elas e suas práticas. Incentivamos de 316 maneira positiva as suas ações e buscas por formas diferenciadas de trabalhar a matemática. Isso também colaborou para a valorização do que cada uma fazia, identificando, principalmente, aquilo que realizavam e que funcionava em suas práticas e não apenas as falhas. III. Como percebemos a influência do grupo de estudos de matemática nas aprendizagens das professoras participantes? A influência do grupo nas aprendizagens das professoras pôde ser percebida pela dinâmica que constituiu o trabalho grupal. Acreditamos que um primeiro motivo para que este trabalho tenha repercutido nas práticas das professoras teve início na constituição do grupo. As professoras aceitaram nosso convite, não foram obrigadas a participar dessa formação continuada, nem estavam presentes por causa de um certificado, ou de recebimento monetário ou retorno imediato; desejavam participar do grupo – ponto positivo, pois estavam abertas ao debate, buscaram isso. Ao atuarem como integrantes, as professoras puderam opinar sobre os objetivos e metas desenvolvidas no grupo. Durante todo o processo, as pesquisadoras comportaram-se como integrantes, aprenderam juntas, e com a forma com que conduziram o grupo, partilhando e discutindo as metas, tiveram a possibilidades de analisar aprendizagens das professoras juntamente com elas e por elas. As participantes agiam como „amigos críticos‟, tendo olhares e agindo como mediadoras, como observadoras, como profissionais ou como participantes. Esse modo de agir foi a principal influência do grupo de estudos nas aprendizagens das professoras, pois possibilitou toda interação e ações realizadas, levando-as às aprendizagens. A percepção por parte das professoras participantes se deu muitas vezes pela provocação da reflexão crítica, de modo a instigá-las, devido ao que nos apresentavam e ao que partilhavam conosco em situações de troca. Isso vai ao encontro do que Mizukami et al. (2002) comentaram sobre a abertura das salas de aulas em locais de pesquisa, gerando conhecimento local. Ampliamos a 317 ideia de que “os professores aprendem a partir da inquirição de sua vida profissional e dentro de contextos bastante variados entre si” (MIZUKAMI et al., 2002, p. 152), pois compreendemos que eles precisam ter consciência de suas crenças e concepções e como estas influenciam suas práticas. As aprendizagens aconteceram de forma significativa por termos envolvido as professoras em todas as fases do trabalho. Elas se inseriram no grupo por vontade própria através do nosso convite e ali permaneceram, sendo como peças fundamentais em sua constituição e efetivação. Criamos condições de confiança a fim de que as professoras se sentissem seguras para expor suas ideias, apresentar suas dúvidas, propor soluções e discutir abertamente sobre o que e como pensavam cada consideração apresentada. Nossa investigação vem ao encontro das conclusões de Mizukami et al. (2002) afirmando que Envolvidas em situações de partilha e de trocas significativas, as professoras mostraram estar mais propensas a assumir o controle de sua própria aprendizagem a partir de desenvolvimento metacognitivo baseado em inquirição orientada (reflexão e ação sistemáticas). Cabe destacar que a qualidade dos relacionamentos é central para o sucesso desse desenvolvimento. O sucesso só é possível se os membros da organização desenvolverem confiança e compaixão, considerando as diferenças, já que a diversidade é construída sobre elas. (MIZUKAMI et al., 2002, p. 181). Aprender a conviver, aceitando as diferenças, sabendo ouvir, buscar compreender pontos de vistas dicotômicos e valorizar o saber/fazer das outras participantes foi algo construído durante nosso percurso. Havemos de nos conhecer enquanto pessoas diferentes e profissionais que tiveram experiências e formações diferenciadas. Aprender a respeitar a opinião da outra e pensar nas ideias, nas propostas e nos argumentos não foi tarefa fácil, principalmente para pessoas diferentes, mas que tinham um propósito em comum, estudar matemática das séries iniciais. Dos desafios vivenciados, citamos o exemplo da professora Susana que, em muitos momentos, precisava estar convicta de que o que propúnhamos iria trazer benefícios para ela e para seus alunos. O processo de aprendizagem dessa professora foi bem diferenciado, pois primeiramente, ela precisava suprir seu medo em relação à matemática, a fim de, posteriormente, vivenciar outras 318 realidades. Já a professora Beatriz se mostrou mais aberta a aceitar algumas aprendizagens, porquanto gostava de matemática e queria aprender e utilizar novas formas de abordar alguns conteúdos matemáticos com seus alunos. Desenvolvemos um tipo de formação na qual aprendemos a trabalhar em grupo, destacando o que Krainer (1998, 1994) chama a atenção para o que é ação, autonomia, reflexão, rede de suporte e troca de ideias. Esse tipo de formação continuada, na qual trabalhamos junto com os professores, agindo como „amigos críticos‟ e respeitando outros pontos de vista foi considerado por nós como um tipo de formação que promoveu mudanças. Confirmando, assim, o que Llinares e Krainer (2006) apontam sobre a necessidade de entendermos melhor os professores e as mudanças em suas práticas para considerarmos quais fatores influenciam no desenvolvimento profissional desses. Nosso trabalho confirma que a colaboração entre professores pode influenciar esse desenvolvimento profissional. As aprendizagens docentes em nosso grupo de estudos foram ocasionadas por uma construção coletiva onde “implica o estabelecimento de um processo de interação e de mediação entre regulação interpsicológica e regulação intrapsicológica, de maneira que as interações e as mediações favoreçam as trocas cognitivas e os docentes avancem em seus processos formativos” (BOLZAN; ISAIA, 2005, p. 496). As regulações apresentadas sugerem que as professoras tenham aprendido a regular os seus processos cognitivos, metacognição. Isso considerando os diferentes pontos de vista das demais participantes do grupo, dos seus alunos, o que proporcionou um processo de interiorização a partir da mediação (VYGOTSKY, 1988). Esta pesquisa não tinha o objetivo de constituir um grupo colaborativo, por acreditarmos que seria arriscado, de início, admitir que as ações e direcionamentos que são próprios desse tipo de grupo aconteceriam. Porém, mesmo não tendo como meta esse tipo de grupo, podemos afirmar que conseguimos estruturar, constituir e vivenciar um grupo colaborativo, no qual a estruturação, as metas, as dinâmicas realizadas, a integração entre as participantes e as experiências partilhadas conduziram a novos conhecimentos 319 num grupo que teve práticas colaborativas (PETER-KOOP; SANTOSWAGNER; BREEN; BEGG, 2003). Na processualidade vivenciada pelo grupo, conduzimos uma formação continuada em contexto – considerando as professoras como sujeitos aprendentes –, a qual resultou em aprendizagens de diferentes conhecimentos que puderam ser notadas nas mudanças em suas práticas. 6.2 Refletindo sobre o caminho percorrido Colocamos algumas reflexões, como pesquisadoras que aprenderam a desenvolver pesquisas, a cada passo dado, neste trabalho. Destacamos, positivamente, que estudos longitudinais como este por nós desenvolvido, requerem muita dedicação, comprometimento, responsabilidade, persistência e volitude, tanto por parte dos pesquisadores como das participantes. Pontuamos como ponto positivo o desenvolvimento dessas características a cada uma de nós, integrantes do grupo. Cremos que os resultados obtidos somente foram possíveis pelo envolvimento que um trabalho longitudinal pudesse garantir. Pudemos nos conhecer e respeitar os tempos-espaços de cada profissional, interagindo de forma ampla e sensata a cada encontro. Desde o conhecimento do outro, do trabalho junto com, conseguimos fazer com que cada uma pudesse percorrer seu caminho, aflorar para novas visões e, a seu tempo, colher os frutos lançados que caíram em solo bom. Esse trabalho possibilitou, pelo seu tempo e desenvolvimento, a interação entre as participantes, colocando-as como „amigos críticos‟, parceiras e envolvidas, de tal forma a se sentirem parte do trabalho, tendo voz ativa nas discussões e decisões de um grupo de estudos. Entretanto, precisamos reformular alguns objetivos, atitudes e modos de pensar e agir para que pudéssemos seguir adiante durante a pesquisa. 320 Algumas vezes, por ansiedade ou inexperiência deixamos de dar a devida importância a momentos ou situações que poderiam gerar bons debates. Também não deixamos claro que precisávamos das escritas das professoras para confrontar com nossas próprias anotações, o que ocasionou algumas dificuldades ao pedimos que elas voltassem ou revisassem algum tópico trabalhado por nós nos encontros. Gostaríamos de ter realizado uma devolutiva mais sistematizada, aos pais e alunos das turmas das professoras Beatriz e Susana do que conseguimos coletar e desenvolver nesses dois anos de acompanhamento em aulas de matemática. Isso não foi possível no período trabalhado, mas não descartamos a hipótese de desenvolver algum trabalho com este intuito. Fundamentados nos trabalhos desenvolvidos, não podemos garantir que todas as professoras construíram da mesma forma todos os conhecimentos. Certamente, cada professora realizou suas próprias construções, de acordo com seus próprios interesses e momento de desenvolvimento profissional. Mas, cremos que aguçamos a curiosidade referente à matemática em cada uma de nós. As avaliações contínuas que realizamos ao longo deste estudo, sobre o que fizemos, como fizemos, o que gostamos, o que não gostamos, quais foram nossas aprendizagens, em quais momentos sentimos dificuldades, como aprendemos a nos conhecer, a analisar e a refletir sobre as esferas do emocional e cognitivo, contribuíram para gerar em nós uma consciência metacognitiva. Pois, olhávamos para nossa própria cognição, como estávamos desenvolvendo e caminhando nesta pesquisa. Evidenciamos alguns benefícios que a participação no grupo trouxe para cada componente, em relação às aprendizagens das professoras e para o grupo como um todo. Inicialmente, não tínhamos clareza sobre o que faríamos e quais resultados conseguiríamos, porém, ao iniciarmos nossa caminhada, reconhecemos que estávamos trabalhando como „amigos críticos‟, respeitando as diferenças e levantando possibilidades de trabalhos, mudanças e crescimento profissional. Ajudamo-nos mutuamente, influenciamos e fomos 321 influenciadas pelas demais componentes. Ao passar do tempo, notávamos, em nós mesmos, algumas características das outras professoras, porém, estávamos envolvidas de tal forma que, algumas vezes, não percebíamos o quanto aplicávamos o que havíamos aprendido com o grupo. Outra reflexão realizada por nós, em diferentes situações, foi a preocupação com a continuidade do grupo. Estávamos submergidas por diferentes sentimentos como medos, anseios e emoções particulares de cada uma, porque não sabíamos como o grupo continuaria o caminhar. Enquanto pesquisadoras, tínhamos a preocupação de como o trabalho desenvolveria ao longo dos anos, mas desde a interação entre as componentes essa preocupação foi ficando menor e percebi o quanto estávamos envolvidas e como a realidade do grupo fazia parte de cada uma de nós. Na qualidade de professora de matemática e também como formadora, percebi a necessidade de buscar teorias apropriadas para um estudo aprofundado dos conteúdos matemáticos, inclusive daqueles que consideramos fáceis, como foi o caso das operações fundamentais. Entendemos que poderíamos iniciar essa busca pela prática de sala de aula, pois, dessa forma, conseguiríamos partir da necessidade dos professores. Chamamos atenção para a importância de diferenciarmos as ações utilizadas num estudo longitudinal, como o que realizamos, para termos a oportunidade de abrir caminhos, por meio da vivência do grupo. Precisamos de ações que não fossem fechadas, que possibilitassem adaptações de acordo com o caminhar do grupo ao longo do estudo, principalmente, em pesquisas sobre formação de professor. Em relação à metodologia utilizada para a análise de dados, queremos ressaltar que a construção de diferentes níveis de análises, começando da organização dos dados até a profundidade de relacioná-los com as bases teóricas, ajudou-nos a „cozinhar os dados‟, criar uma inter-relação com os mesmos. No decorrer dos níveis de análise, conseguimos reformular algumas 322 ações no grupo e organizar nossas categorias com base nas evidências apresentadas pelos próprios dados da pesquisa. Também tivemos momentos de dificuldades e algumas limitações. Uma delas foi o fato de trabalharmos com um grupo particular, num contexto específico, o que nos impossibilitou afirmar que as evidências e conclusões a que chegamos aconteceriam com outros grupos, mesmo em situações semelhantes. A seleção dos dados ocorreu, analisando os incidentes que consideramos críticos ou significativos, nesses dois anos e quatro meses. O que apresentamos neste texto foi o que selecionamos e são resultados de nossas escolhas e do nosso olhar. E ainda, se os mesmos dados fossem analisados por outro pesquisador, poderiam revelar outros focos não percebidos ou não evidenciados por nós. Fazendo um panorama do caminho percorrido neste doutorado, pontuamos que muitas possibilidades surgiram ao longo do caminhar. Tivemos que escolher por quais estradas percorrer, encarar os obstáculos encontrados e por decidir quais iríamos ultrapassar e qual a forma como deveríamos ultrapassálos. Alguns foram fáceis de serem superados, outros foram colocados de lado e buscamos outros caminhos. Se tivéssemos que trilhar, novamente, esse caminho sabemos que continuaríamos apostando nas professoras e em suas capacidades. Valorizaríamos, mais uma vez, as experiências de cada um e seus saberes, pois acreditamos que cada pessoa possui muito a contribuir, partilhar, ensinar e aprender. Não nos preocuparíamos tanto em formar um grupo com um número grande de participantes, porém faríamos de tudo para que cada professor (a) se sentisse integrante ao grupo e parceiro no caminhar. Cometemos alguns „erros‟, não aproveitamos algumas oportunidades, deixamos de nos aprofundar em alguns estudos, perdemos algumas informações, aplicamos alguns instrumentos indevidamente, tivemos que reformular outros instrumentos, adaptando-os às nossas realidades e demoramos muito para retomar alguns assuntos. Continuaria anotando muitas informações em meus cadernos, aliás, quero destacar que as anotações nos cadernos me ajudaram a viver novamente alguns encontros, ler minhas 323 anotações revelou sentimentos em mim sobre as fases desse caminhar que me fizeram refletir, olhar para o caminho percorrido e reconhecer detalhes de cada participante ao longo do caminho. 6.3 Novas janelas, novos caminhos: desdobramentos da pesquisa Queremos destacar algumas consequências e novos direcionamentos de pesquisa que podem ser retirados no nosso trabalho. São novas possibilidades, novas janelas e portas que se abrem, novos caminhos que foram ou que podem ser trilhados, um novo olhar... Indicamos que, para a professora Susana, um desdobramento que se destacou foi nossa inserção na formação continuada, em 2008, na escola em que trabalha. verificamos que Susana encarou as formações ocorridas na escola como outro momento de aprendizagem. Ela quis, muitas vezes, nesses momentos de formação, partilhar com as demais professoras da escola o que havia compartilhado conosco no grupo de estudos. A participação dessa professora e de seus alunos na Mostra Cultural da escola, na qual atua, também foi relevante, ela mostrou muitas das atividades de matemática produzidas por nós com seus alunos. Susana tem consciência de que precisa estudar mais matemática, mas estamos certas de que fizemos diferença no seu modo de encarar a disciplina. Para a professora Beatriz, o desdobramento foi maior em relação aos alunos e o que fizeram em relação à matemática. Eles iniciaram a escrita de um livro de resolução de problemas com os próprios problemas, inventados por eles, baseados nos conteúdos trabalhados. Além disso, queremos ressaltar que a vontade de estudar, além do que já sabia, aflorou na professora Beatriz. Ela 324 continuou a participar no encontro do grupo maior, organizado pela professora Vânia, em 2009, e está buscando superar suas limitações em relação aos conteúdos matemáticos que não domina. Acreditamos que ela continuará seus estudos, aprofundando-se na matemática e na sua interseção com outras áreas, como a língua portuguesa. Damos alguns indicativos para alguns órgãos governamentais que trabalham com formação de professores, no nosso caso, a prefeitura de Vitória, para que tentem acompanhar professores que estão em formações continuadas, promovam ações futuras para que essas professoras e outras que possuam diferentes modos de trabalho, possam partilhar suas experiências. Podem ser encontros na forma de oficinas, relatos de experiência, alguma maneira de colocarem as professoras para mostrar o que realizam e contribuem para a aprendizagem dos seus alunos. Explicitamos que, para essas professoras, uma valorização profissional que aconteceu durante os encontros do grupo foi o fato de termos apresentado parte de trabalhos realizados em suas salas de aulas de matemática em congressos, como o Seminário de Matemática – SEMAT que aconteceu no CEFETES-Vitória, em novembro de 2008 e o Simpósio Internacional de Pesquisas em educação Matemática – SIPEMAT, ocorrido em Recife, em agosto de 2008. No caso do II Semat, a professora Beatriz participou da apresentação do relato de experiência – o que foi muito produtivo. Ela também apresentou um trabalho no Congresso Regional na Bahia, no ano de 2009, como parte do que desenvolveu com seus alunos em relação ao geoplano circular. Temos muitos materiais que ainda não foram analisados. Como desdobramento desta pesquisa, desejamos analisar alguns desses dados não escolhidos e apresentá-los em forma de artigos em revistas. Almejamos escrever esses artigos juntamente com as professoras que participaram da investigação, pois consideramos que as descobertas e conclusões às quais chegamos pertencem ao grupo e não somente à autora deste trabalho. 325 Esperamos que, este trabalho possa contribuir para outras investigações e que os acertos e erros que cometemos possam servir de panorama para quem quiser trabalhar com formação continuada, inclusive nós mesmas. Ao longo do percurso deste caminhar, analisando as anotações nos nossos cadernos, deparamo-nos com muitas interrogações, alguns erros, muita história, vidas que se interligavam e escreviam os passos de um caminhar. Em meio a essas idas e vindas, acertos e erros, escutamos uma música, intitulada “O caderno”, que nos ajudou a superar os momentos difíceis, os „erros‟, e a caminhar em frente. Ela representa uma metáfora, e nós a analisamos com outro olhar. Colocamos sua letra a seguir: O caderno Cantor: Padre Fábio de Mello Compositor: Toquinho Sou eu quem vou seguir você do primeiro rabisco até o bê-a-bá em todos os desenhos coloridos vou estar a casa, a montanha, duas nuvens no céu e um sol a sorrir no papel Sou eu que vou ser seu colega, seus problemas ajudar a resolver lhe acompanhar nas provas bimestrais, você vai ver Serei de você confidente fiel, se seu pranto molhar meu papel Sou eu que vou ser seu amigo, Vou lhe dar abrigo, se você quiser Quando surgirem seus primeiros raios de mulher A vida se abrirá num feroz carrossel E você vai rasgar meu papel O que está escrito em mim comigo Ficará guardado, se lhe dá prazer A vida segue sempre em frente, o que se há de fazer Só peço a você um favor, se puder Não me esqueça num canto qualquer [MENSAGEM] Eu não sei se você se recorda do seu primeiro caderno, eu me recordo do meu. Com ele eu aprendi muita coisa, foi nele que eu descobri que a experiência dos erros Ela é tão importante quanto às experiências dos acertos Porque vistos de um jeito certo, os erros, Eles nos preparam para nossas vitórias e conquistas futuras Porque não há aprendizado na vida que não passe pelas experiências dos erros O caderno é uma metáfora da vida, Quando os erros cometidos era demais, eu me recordo, Que a nossa professora nos sugeria que a gente virasse a página. 326 Era um jeito interessante de descobrir a graça que há nos recomeços. Ao virar a página, os erros cometidos deixavam de nos incomodar e a partir deles, A gente seguia um pouco mais crescido. O caderno nos ensina que erros não precisam ser fontes de castigos. Erros podem ser fontes de virtudes! Na vida é a mesma coisa, o erro tem que estar a serviço do aprendizado; Ele não tem que ser fonte de culpas e vergonhas. Nenhum ser humano pode ser verdadeiramente grande sem que seja capaz de reconhecer os erros que cometeu na vida. Uma coisa é a gente se arrepender do que fez! Outra coisa é a gente se sentir culpado. Culpas nos paralisam. Arrependimentos não! Eles nos lançam pra frente, nos ajudam a corrigir os erros cometidos. Deus é semelhante ao caderno. Ele nos permite os erros pra que a gente aprenda a fazer do jeito certo. Você tem errado muito? Não importa, aceite de Deus essa nova página de vida que tem nome de hoje! Recorde-se das lições do seu primeiro caderno. Quando os erros são demais, vire a página! [FINAL] O que está escrito em mim comigo Ficará guardado, se lhe dá prazer A vida segue sempre em frente, o que se há de fazer Só peço a você um favor, se puder Não me esqueça num canto qualquer Novos caminhos, novos rumos, a vida segue em frente, o que se há de fazer? Só peço a você, um favor se puder... Não se esqueça dos professores, da formação permanente, desse caminhar, num canto qualquer... 327 REFERÊNCIAS ABRANTES, Paulo; SERRAZINA, Lurdes; OLIVEIRA, Isolina. A Matemática na Educação Básica. Lisboa: Ministério da Educação, Departamento de Educação Básica, 1999. Disponível em: <http://www.dgidc.minedu.pt/fichdown/matemat.pdf> Acesso em: 23/jul/09. ALARCÃO, Isabel. Ser professor reflexivo. In: ALARCÃO, Isabel (Org.). Formação reflexiva de professores. Estratégias de supervisão. Porto, Portugal: Porto, 1996a, p. 173-188. ______. Reflexão crítica sobre o pensamento de D. Schön e os programas de formação de professores. In: ALARCÃO, Isabel (Org.). Formação reflexiva de professores. Estratégias de supervisão. Porto, Portugal: Porto, 1996b, p. 1136. ______. Professores reflexivos numa escola reflexiva. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2004. BAIRRAL, Marcelo A. Natureza do conhecimento profissional do professor: contribuições teóricas para a pesquisa em educação matemática. 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O que você acredita que faz, em relação às aulas de matemática, da mesma forma que antes da participação do grupo? Mais dinamismo, desafiar o raciocínio. 3. Modificou alguma coisa em minhas aulas a presença de Sandra, Vânia e/ou Lucia (aulas Susana)? Se sim, o que? Tudo, as tarefas em grupo, os desafios, a oficina de origami... 4. Houve contribuição do grupo para minhas aulas de matemática? Justifique. No grupo nós discutimos o que trabalhamos e há troca de ideias 5. Se houve, qual foi (é) a contribuição do grupo para minhas aulas de matemática? o No sentido de planejamento: Mais segurança em inovar com trabalhos diferenciados (inclusive em outras disciplinas) o Em relação aos conteúdos selecionados: Mais variedades. “Variedade de cardápio” o Em relação às metodologias desenvolvidas: Também mais variado o Outra contribuição que gostaria de destacar: As ideias fluem também em relação a outras disciplinas. 6. O grupo influenciou suas decisões em sala de aula? Se sim, dê exemplos ou comente cada um dos itens que sofreu influências em relação a decisões tomadas em sala de aula: o Com os alunos Pensando melhor no que cada um desenvolve melhor o Com os conteúdos Preocupação em aumentar os assuntos, sem perder de vista o básico. o Com as avaliações Valorizando todo trabalho feito e não só as provas o Com as tarefas propostas o Com os planejamentos Mais coerências e seguimento das ações. 7. O que posso afirmar que aprendi como professora neste período de participação no grupo? Muitas coisas, diferença entre ouvir de outros sobre suas aulas e o seu agir na sala. 8. O que aprendi de matemática neste período que me marcou? Muita coisa, todos os conteúdos além das 4 operações. 2 Questionário respondido por Beatriz em 06/10/08 O grupo de estudos e a minha prática em aulas de matemática: 1. Percebo mudanças na minha prática de aulas de matemática? Se sim, em que? Sim. Desde que começamos o nosso grupo de estudos analiso minhas práticas, e penso criticamente em cada conteúdo ou estratégia para desenvolvê-lo. 2. O que você acredita que faz, em relação às aulas de matemática, da mesma forma que antes da participação do grupo? 343 Oferecer muito conteúdo, tenho ainda uma grande preocupação em “dar conta do programa” e se possível, ir além. 3. Modificou alguma coisa em minhas aulas a presença de Sandra, Vânia e/ou Lucia (aulas Susana)? Se sim, o que? O que mudou foi a reflexão sobre a prática, não consigo mais dar aulas de matemática sem planejamento (quando faço me sinto culpada). 4. Houve contribuição do grupo para minhas aulas de matemática? Justifique. Muitas. Tivemos várias sugestões de práticas diferentes que deram muito certo. Uma delas foi a utilização da escrita nas aulas de matemática. 5. Se houve, qual foi (é) a contribuição do grupo para minhas aulas de matemática? o No sentido de planejamento: Sempre que posso planejo minhas aulas de matemática com critério, os encontros já adiantavam este trabalho. o Em relação aos conteúdos selecionados: Em relação aos conteúdos deu-me a oportunidade de esclarecer dúvidas que eram minhas. o Em relação às metodologias desenvolvidas: Muitas estratégias diferentes foram sugeridas e desenvolvidas em sala de aula com sucesso. o Outra contribuição que gostaria de destacar: A oportunidade de estudo que trouxe de volta a minha velha sede de saber, o meu inconformismo diante de situações difíceis. 6. O grupo influenciou suas decisões em sala de aula? Se sim, dê exemplos ou comente cada um dos itens que sofreu influências em relação a decisões tomadas em sala de aula: o Com os alunos Acho que até a maneira de me relacionar com os alunos hoje, é mais tranqüila, já me atrevo a fazer grupos, duplas,... Eu era tradicional demais! o Com os conteúdos Acho que hoje dou mais valor à geometria e à escrita na matemática. o Com as avaliações Avaliações com oportunidades para todos, questões desafiantes, médias e simples para que todos tenham oportunidade de mostrar o que sabem. o Com as tarefas propostas Da mesma forma que as avaliações estou sempre propondo atividades mais interessantes, muito material foi fornecido nos encontros, materiais riquíssimos. o Com os planejamentos Confesso que não tive tempo de aproveitar 100% do material. Mas sempre ao planejar penso “o que Sandra ou Vânia pensariam disso?” 7. O que posso afirmar que aprendi como professora neste período de participação no grupo? Acho que reaprendi que é preciso estar sempre procurando superação, é preciso “aprender a aprender” como diz Saviani. 8. O que aprendi de matemática neste período que me marcou? Aprendi noções básicas de geometria, aprendi a repensar conceitos, outras formas de fazer operações matemáticas, outras formas de propor atividades. 3 Questionário respondido por Sandra em 11/08/08 O grupo de estudos e a minha prática em aulas de matemática: 1. Percebo mudanças na minha prática de aulas de matemática? Se sim, em que? Sim. Hoje procuro pensar mais no que proponho aos alunos: atividades, avaliações, discussões. ( nas aulas do ensino superior) 2. O que você acredita que faz, em relação às aulas de matemática, da mesma forma que antes da participação do grupo? Repetir várias vezes e de maneiras diferentes as abordagens do conteúdo. 344 3. Modificou alguma coisa em minhas aulas a presença de Sandra, Vânia e/ou Lucia (aulas Susana)? Se sim, o que? 4. Houve contribuição do grupo para minhas aulas de matemática? Justifique. Sim, com certeza. Cada pessoa do grupo mostra algumas coisas importantes, como por exemplo: paciência (Beatriz), organização (Lucia), interação com outros focos (Susana) e responsabilidade com os outros (Vânia). 5. Se houve, qual foi (é) a contribuição do grupo para minhas aulas de matemática? o No sentido de planejamento: Vendo as professoras e seus planejamentos, estou mais organizada e me preocupando com um planejamento que seja bom para cada aula, pensando inclusive nas organizações do tempo. o Em relação aos conteúdos selecionados: o Em relação às metodologias desenvolvidas: Penso sempre em abordar algumas atividades de diferentes maneiras, utilizar bastante a resolução de problemas, os trabalhos em grupos,... o Outra contribuição que gostaria de destacar: Gostaria de destacar que quando penso no grupo penso em aprendizagem, como aprendemos a cada dia, como podemos perceber certas coisas de outras formas, as relações que devem existir entre a vida real e a escolar, a organização dos conteúdos e das metodologias,..., um novo olhar para a matemática trabalhada nas séries iniciais,... 6. O grupo influenciou suas decisões em sala de aula? Se sim, dê exemplos ou comente cada um dos itens que sofreu influências em relação a decisões tomadas em sala de aula: o Com os alunos Estou ainda mais paciente e tentando colocar aqueles que têm mais dificuldades para pensarem com minha ajuda nas aulas. o Com os conteúdos o Com as avaliações Estou pensando mais sobre como colocar cada questão na avaliação, como fazer avaliação onde o aluno pode colocar como pensou e como resolveu a atividade proposta, colocar sempre uma questão fácil e uma que exija mais raciocínio... o Com as tarefas propostas Tento diversificar as atividades propostas para que diferentes alunos possam participar. o Com os planejamentos Penso muito nos tempos, nas aprendizagens coletivas,... 7. O que posso afirmar que aprendi como professora neste período de participação no grupo? Aprendi a me conhecer, a entender porque faço determinadas coisas de determinada forma, a prestar mais atenção nos meus alunos e no que falam, a entender melhor que os alunos fazem algumas coisas e na percebemos, a perceber que falamos algumas coisas e que muitas vezes as pessoas entendem outras. 8. O que aprendi de matemática neste período que me marcou? Relação entre frações e decimais com uso do material dourado; 4 Questionário respondido por Lucia em 11/08/08 O grupo de estudos e a minha prática em aulas de matemática: 1. Percebo mudanças na minha prática de aulas de matemática? Se sim, em que? Sim, percebo que o meu olhar para com os alunos da 5º serie é bem diferente dos anos anteriores, conversando e ouvindo as professoras do grupo, noto o motivo das dificuldades e/ou obstáculos enfrentados pelos alunos. 2. O que você acredita que faz, em relação às aulas de matemática, da mesma forma que antes da participação do grupo? Organização, planejamento, contrato didático. 3. Modificou alguma coisa em minhas aulas a presença de Sandra, Vânia e/ou Lucia (aulas Susana)? Se sim, o que? 4. Houve contribuição do grupo para minhas aulas de matemática? Justifique. Sim, ouvir as professoras de 1º a 4º serie tem auxiliado a mim e principalmente, os meus alunos a fazer de forma mais suave, a transição da 4ª série para a 5ª série. Sabemos que 345 essa ruptura, como qualquer outra é dolorida. Reconheço que o grupo tem sido de fundamental importância nesse processo 5. Se houve, qual foi (é) a contribuição do grupo para minhas aulas de matemática? o No sentido de planejamento: o Em relação aos conteúdos selecionados: o Em relação às metodologias desenvolvidas: o Outra contribuição que gostaria de destacar: 6. O grupo influenciou suas decisões em sala de aula? Se sim, dê exemplos ou comente cada um dos itens que sofreu influências em relação a decisões tomadas em sala de aula: o Com os alunos Ser mais tolerante e compreensiva com os erros cometidos pelos alunos da 5º série. o Com os conteúdos Sim. Aprendi o “QVL” e outras formas de cálculo ensinadas pelas professoras da 3º e 4º séries. o Com as avaliações o Com as tarefas propostas o Com os planejamentos 7. O que posso afirmar que aprendi como professora neste período de participação no grupo? A fazer um planejamento, discutir estratégias de ensino, olhar provas feitas por alunos, sugerir mudanças na forma de avaliação. Ainda que isso possa ser paradoxal, o que eu faço aqui no grupo, não faço e não vejo acontecer nas escolas. Logo, aqui eu me sinto num lugar rico e estimulante para repensar minhas práticas pedagógicas. 8. O que aprendi de matemática neste período que me marcou? Entender e compreender a matemática ensinada nas séries iniciais. 346 Anexo B - Atividade sobre geometria trabalhada na turma da professora Susana em setembro de 2007: Atividades de geometria: Sólidos geométricos 4. Escreva os nomes dos objetos da cena abaixo que lembra os seguintes sólidos geométricos: a. Paralelepípedo _________________________________________________ b. Cilindro _______________________________________________________ c. Cone _________________________________________________________ d. Cubo _________________________________________________________ 5. Relembrando os nomes dos sólidos geométricos que conversamos e fizemos em sala de aula quando estudamos: Pirâmide a. Quais destes sólidos rolam em alguma posição? ____________________________________________________________________ b. Quais destes sólidos não rolam em nenhuma posição? ____________________________________________________________________ 6. Escreva os nomes dos objetos da cena a seguir que lembram os sólidos geométricos que vimos anteriormente: _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ ______________________________________________________________ 347 7. Troque ideias com seus colegas e com outras pessoas e responda: a. Por que na ilustração aparecem quatro latas de lixo?_____________________ __________________________________________________________________ b. Qual a importância da coleta seletiva de lixo? __________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ c. O que podemos fazer em nosso dia-a-dia para diminuir a quantidade de lixo produzida em nossas casas? _______________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ d. O que você gostou de aprender com estas atividades anteriores? __________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ __________________________________________________________________ 8. Invente uma história sobre uma das cenas anteriores e escreva nas linhas a seguir: ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ 348 Anexo C - Texto coletivo desenvolvido na aula de Beatriz do dia 09/mai/08 Nós aprendemos que sólidos geométricos são sólidos que ocupam lugar no espaço e tem lados com formas geométricas. Conhecemos os poliedros (sólidos que possuem muitas faces). Ao desmontar caixinhas em formas de paralelepípedos, prismas de base triangular e ortogonal, observamos que obtivemos regiões planas. Quando contornamos um dos lados da caixinha obtivemos uma figura geométrica plana de lados formados por linhas retas, são os polígonos. Aprendemos que há polígonos que recebem nomes diferentes de acordo com o número de lados. Nome do polígono Número de lados Triângulo Quadrilátero Pentágono Hexágono Heptágono Octógono Eneágono Decágono Undecágono Dodecágono Pentadecágono Icoságono 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 15 20 Fizemos uma experiência onde observamos uma caixa sentados em posições diferentes, com ângulos de visão também diferentes. Assim alguns alunos apenas viram dois lados da caixa, outros viram três lados e também teve quem viu somente um lado. Isso prova que os objetos adquirem formas diferentes de acordo com nosso campo de visão. Também aprendemos que diagonal é o que une dois vértices opostos na região interior do polígono. Estudamos o perímetro que é a soma das medidas dos lados de um polígono. Com canudinhos confeccionamos pirâmides de base triangular. Quando a professora Sandra confeccionou um cubo, teve dificuldades porque ele ficou deformado. É que os quadrados não tinham firmeza como os triângulos da pirâmide, então, a professora Sandra colocou suportes em diagonais que dividiram as faces quadradas em triângulos. Colocou, também, mais uma diagonal interna no poliedro. É interessante lembrar que o triângulo é a única figura geométrica rígida, firme, por isso vemos a utilização de suportes em diagonal em várias construções. Quando planificamos as caixinhas, tentamos, antes disso, desenhar como imaginávamos que seriam. Poucos de nós acertamos, pois esquecemos que as caixas precisam ter as bordas (mais uns ladinhos) para colar os lados da caixa. 349 Anexo D – Quadro de encontros do grupo de estudos Encontros Data Quadro 19 – Detalhamento dos encontros do grupo Profªs. presentes Principais propostas ou assuntos discutidos Pontos importantes que merecem destaque Pontos que precisam ser analisados Susana, Beatriz e Sandra Já pude perceber que a prof. Beatriz gosta de desafiar seus Identificação da memória alunos e foi isso que a trouxe ao positiva enquanto professoras grupo. Já a prof. Susana, não de matemática. gosta muito de matemática e Uso de metáforas em relação apenas usa o necessário, ela quer à matemática. perder esse “medo” de matemática. Os motivos que realmente trouxe cada uma ao grupo. Questões referentes ao jogo nas aulas de matemática. Susana, Beatriz e Sandra Identificação de memórias enquanto alunas nas aulas de matemática. Troca de experiências sobre resolução de problemas, envolvendo expressões numéricas inventadas pelos alunos e respondidos da maneira que eles conseguissem. A profª S. mostrou que tentou fazer diferente com os encartes de jornais. Profª B. conseguiu nos mostrar como trabalha resolução de problemas, com novos conteúdos, em sala de aula. Questões referentes ao jogo. Trabalho com material de encarte de supermercado. Cálculo mental. Problemas de lógica. Conteúdos que deveríamos estudar mais. Professora querendo mostrar que está tentando trabalhar com a interdisciplinaridade e com as propostas que estamos dando nos encontro. Voltar a conversar sobre os conteúdos que precisamos discutir mais e em outros momentos. Conteúdos que pretendemos estudar mais. Fração e proporção. Conversas sobre as diferentes bases: sistema decimal e medidas de horas, minutos e segundos. Voltar em discussões sobre proporções. Avaliação – Metáfora do ensino da matemática. Livros didáticos. A professora Susana está tentando colocar em suas avaliações algumas das propostas do grupo. Precisamos retomar a discussão sobre os livros didáticos. 4º. 02/10 G Questões referentes à avaliação. Susana e Sandra 5º. 09/10 Susana (S), Beatriz (B) e Sandra As professoras chegaram com vontade de partilhar suas Conhecendo os participantes. experiências, foi bem Apresentação da proposta e interessante. escolha dos dias e horários de Já pude perceber que as trabalho. professoras poderão ajudar muito, e que as discussões serão interessantes. Beatriz e Sandra 6º. 16/10 G 3º. 25/09 2º. 18/09 G49 1º. 30/08 2006 Susana, Beatriz e Sandra 49 Os encontros que possuem a letra “G” são os que temos gravações em áudio. Trabalho diferenciado sobre medidas realizado pela professora Beatriz. Decimais e frações. Susana e Sandra Conversa sobre atividades para a introdução de frações. Divisão de um número por uma fração. Abertura da professora e confiança para mostrar que possui dificuldades com o trabalho de frações. Conversar mais sobre este conteúdo “frações”. Susana, Beatriz e Sandra Discussões sobre o trabalho de frações inter-relacionado com proporção e porcentagem. Conversas sobre interdisciplinaridade, divisão do tempo das disciplinas e livro didático. A troca de experiências e os relatos do que está sendo discutido no grupo está ficando mais intenso. Discussão sobre a abordagem simultânea de frações, porcentagens e proporção, para iniciar a ideia de regra de três. Questão do uso do livro didático, em especial pela professora Susana. Susana, Beatriz e Sandra Discussão das realizações das propostas do grupo Conversa sobre o livro didático apresentado pela professora Beatriz. Conversa sobre o ensino e aprendizagem de medidas de comprimento e peso. Discussão sobre divisão. Reflexão da professora Beatriz sobre como utiliza o livro didático. Relatos e reflexões sobre os trabalhos em sala de aula. Dificuldades encontradas pela professora Susana em efetuar e ensinar divisão por número com dois algarismos e números decimais. Dificuldades com a divisão. Questionamentos sobre os sistemas de medidas e a resolução de problemas. Dúvidas sobre o trabalho com geometria que foi comentado rapidamente. Susana, Beatriz, Vânia e Sandra Questões de relacionamentos e comportamentos em sala de aula. Relato para Vânia das professoras sobre os encontros do grupo e porque quiseram participar. Apresentação do livro didático da profª Susana. Conversas sobre resolução de problemas. Conversa sobre o número π. A primeira vez que a professora Vânia participa do encontro presencialmente. Uso do livro didático e divisão do trabalho em sala de aula. Indicações da professora Susana dos projetos que gosta de realizar: projeto Natal Reflexão de cada professora sobre a participação no grupo. Susana, Beatriz, Vânia e Sandra Conversa sobre materiais levados pelas professoras. Tabuadas com nº maior que dez. Relato sobre o projeto de Natal pela profª Susana e sobre o projeto com idosos pela profª Beatriz. Conversas sobre o trabalho das quatro operações . O envolvimento das professoras com seus projetos. Reflexões sobre o trabalho com as quatro operações. Discussões sobre desafios matemáticos. 12º. 11/12 G 11º. Data 10º. 23/10 G 9º. Sistema de medidas e atividades. Fração. 06/11 8º. Susana, Beatriz e Sandra 20/11 7º. Profªs. presentes 27/11 Encontros 30/10 350 Principais propostas ou assuntos discutidos Pontos importantes que merecem destaque Pontos que precisam ser analisados Uso do livro didático Escolha e divisão dos conteúdos ao longo do ano. Discussão sobre resolução de problemas. Ampliar as reflexões sobre o trabalho com as quatro operações. 13º. 18/12 Encontros Data 351 Profªs. presentes Susana, Beatriz, Vânia e Sandra Principais propostas ou assuntos discutidos Encerramento das atividades de 2006. Reflexões e avaliações sobre este trabalho inicial no grupo. Uso de metáforas sobre matemática. Uso de folha com avaliação sobre os encontros. Pontos importantes que merecem destaque Pontos que precisam ser analisados Reflexões das próprias professoras sobre estes encontros em 2006. Comparação e análise Reflexões das profª sobre o das metáforas. trabalho delas em sala de aula e uso de metáforas pela profª Susana sobre suas aulas. 5º. 05/03 4º. 13/03 3º. 26/02 G 2º. 12/02 G 1º. 05/02 G 2007 Susana, Beatriz e Sandra Conversas gerais e sobre o primeiro dia de aula. Contrato didático em sala de aula. Organização e planejamento das atividades do grupo. Organização das professoras com as aulas iniciais do ano letivo. Troca de atividades para organizar o contrato didático em sala de aula. Contrato didático como fica ao longo do ano. Responder para o próximo encontro: “o que é matemática para você?” Susana, Beatriz, Vânia (tel) e Sandra Conversa sobre a sondagem realizada no início do ano com os alunos. Conversa com Vânia por telefone e propostas de trabalhos iniciais envolvendo resolução de problemas. Propostas de atividades matemáticas. Abertura das professoras em planejarmos juntas atividades para serem trabalhadas em sala de aula. Sondagem em matemática realizada pelas professoras, com comentários. Uso da questão: “o que é matemática para você?” Atividades diferenciadas propostas pelo grupo. Sondagem realizada somente no início do ano ou durante o mesmo. Como fazem isso posteriormente? Conversar sobre os planejamentos para o ano. Susana, Beatriz e Sandra Relatos e análises das metáforas (somente Beatriz) e do mapa conceitual de matemática feitos pelos alunos. Uso de perguntas: “o que é avaliação para você?” Discussões sobre o trabalho com as quatro operações. Reflexão das professoras sobre as respostas dos alunos nas metáforas e nos mapas conceituais. Início da conversa sobre avaliação e Beatriz comentou como faz uso do quadro de merecimento. Reflexões sobre realização de planejamento conjunto e sua inviabilidade. Avaliação. Atividades envolvendo as quatro operações. Planejamento conjunto. Susana, Beatriz e Sandra Conversa rápida sobre as metáforas sobre matemática dos alunos da professora Susana. Conversas sobre operações interessantes. Mesmo sem local adequado as professoras quiseram mostrar o que estavam realizando. Não conseguimos realizar totalmente o encontro por falta de espaço físico. Susana, Beatriz e Sandra Relatos das atividades realizadas em sala de aula. Conversas e análise sobre atividades do livro de Avaliação da profª Vânia. Conversas sobre reportagem da revista Nova Escola. Abertura maior para discussão de conteúdos e atividades que podem ser trabalhadas. Trabalhar as diferentes ideias envolvendo cada operação. Continuar questões sobre avaliação. 10º. 11º. 12º. 13º. 02/04 23/04 30/04 07/05 9º. 14/05 8º. 21/05 7º. 28/05 6º. 19/03 G Encontros Data 352 Profªs. presentes Principais propostas ou assuntos discutidos Pontos importantes que merecem destaque Pontos que precisam ser analisados Susana, Beatriz e Sandra Conversas sobre códigos utilizados por diferentes povos (proposta do outro grupo de estudos). Discussão sobre: “o que é matemática para você?” Conversas sobre atividades diferenciadas. Discussão sobre quatro operações. Discussão sobre as ideias envolvidas com cada operação: adição, subtração, multiplicação e divisão. Conversa sobre o que cada uma entende por matemática que já tinha sido iniciado e não concluído. Ideias relacionadas com as operações. Conversa sobre avaliação e como devemos realizar nossas reflexões sobre a mesma, antes, durante e após a aplicação. Susana, Beatriz e Sandra Conversas sobre avaliações aplicadas pelas professoras e sobre como montam as provas. Discussões sobre questões relacionadas a avaliações. Continuar discussão sobre avaliações. Susana, Beatriz e Sandra Conversas sobre atividades de frações, comparações de números, problemas e geometria. Relatos sobre as provas aplicadas. Discussões sobre alguns referenciais utilizados por nós professores para ensinar determinados conteúdos, exemplo da comparação de números com os sinais se maior e menor, por Susana. Voltar nas discussões sobre atividades e sobre falas nossas em sala de aula. Beatriz e Sandra Conversa sobre realizar o projeto sobre os idosos com esta nova turma. Discussões sobre atividades para trabalhar geometria espacial. Discussão sobre alguns sólidos geométricos: prismas. Continuar discussões sobre geometria e frações. Susana, Beatriz, Vânia e Sandra Reflexões sobre as atividades realizadas pelo grupo em 2007. Conversas sobre atividades envolvendo geometria. Reflexões sobre as diferenças entre as turmas e a falta de possibilidade de realizar um planejamento único. Enriquecimento de discussões após a reflexão do que já fizemos em 2007. Retomar as discussões sobre avaliações. Susana e Sandra Susana apresentou folha com atividade interdisciplinar sobre água envolvendo fração e porcentagem. Conversa sobre o caderno de planejamento de Susana. Conversas sobre como podemos Retomar discussões trabalhar de diferentes formas as sobre frações, atividades envolvendo frações e porcentagem e porcentagem. proporcionalidade. Susana, Beatriz, Vânia e Sandra Resolução de problemas. Porcentagem trabalhada com malha quadriculada. Interdisciplinaridade. Discussão das definições de diferentes polígonos. A professora Beatriz mostrou que está conseguindo trabalhar matemática de maneira interdisciplinar, exemplo prova de geografia. Discussões sobre as definições de alguns polígonos, construção e desconstrução de ideias. Beatriz, Vânia e Sandra Retorno da parte escrita no meu projeto sobre as professoras. Discussão sobre diferentes formas de trabalhar a divisão. Reflexões sobre nossas formações iniciais. Reflexão da professora Beatriz sobre sua participação no grupo a partir da leitura do texto do projeto. Decisão de observarmos uma aula das professoras. Retomar discussões sobre as definições em geometria. Procurar conversar sobre “prova dos nove”. Proposta de observação de aulas. Retomar a parte da formação inicial de cada professora. Continuar com o retorno para as professoras sobre nosso estudo. 19º. 20º. 21º. Retorno a discussões sobre os textos referentes à resolução de problemas. Retomar discussão sobre uso de malha quadriculada para trabalho com porcentagens. Susana, Beatriz e Sandra Retorno da parte escrita no meu projeto sobre as professoras. Conversa sobre o artigo referente a campo multiplicativo da revista Nova Escola. Susana, Beatriz e Sandra Discussão sobre a atividade Realização de avaliação investigativa. encontros maio e junho 2007. Apresentação pela profª Susana Atividade de investigação sobre uma adivinhação numérica. matemática. Discussão sobre atividades. investigativas e possível aplicação em suas sala de aulas. Susana, Beatriz e Sandra Reflexões das professoras sobre a realização da atividade investigativa em suas aulas. Conversas sobre outras atividades matemáticas. Ampliação destas reflexões. Susana, Beatriz e Sandra Questionamentos sobre o trabalho de divisão no QVL. Relatos sobre atividades realizadas em sala de aula com a presença da profª Sandra. Atividades sobre perímetro e área usando malha quadriculada. Comentários da profª Susana sobre como seus alunos participaram e resolveram os problemas envolvendo divisão. Retorno a atividades sobre perímetro e área. Novas reflexões sobre atividades aplicadas em sala de aula e sobre a atuação dos alunos. Susana, Beatriz e Sandra Relato das atividades desenvolvidas em aula de matemática. Multiplicação chinesa. Comentários gerais das professoras sobre as aulas. Reflexões mais aprofundadas, não conseguimos realizar, pois estávamos em local inadequado. Susana, Lúcia, Beatriz e Sandra Apresentação da profª Lucia. Relatos sobre as atividades trabalhadas no mês de julho. Reflexões das professoras sobre suas aulas de matemática após a participação no grupo de estudos. Ampliar estas reflexões. Susana, Beatriz e Sandra Reflexões sobre as aulas de matemática e as influências do grupo de estudos. Atividades para trabalhar leitura dos números. Reflexão da professora Susana sobre como tem ampliado o conteúdo trabalhado com os alunos. Profª Beatriz colocou a dificuldade dos alunos com a proporcionalidade. Retomar questões referentes a proporcionalidade. 04/06 Data Apresentação feita pela professora Beatriz sobre o que discutimos na semana anterior sobre a resolução de problemas envolvendo divisão utilizando representações diferentes e como trabalhou isso em sala de aula. 11/06 18º. Susana, Beatriz e Sandra Conversa sobre as visitas as escolas e observações das aulas. Discussão sobre resolução de problemas envolvendo divisão utilizando representações diferentes. Trabalho com textos sobre resolução de problemas. Uso de malha quadriculada. 18/06 17º. Pontos que precisam ser analisados 27/06 16º. Pontos importantes que merecem destaque 02/07 15º. Principais propostas ou assuntos discutidos 09/07 14º. Profªs. presentes 06/08 Encontros 30/07 353 Discussões sobre avaliações. Conversas sobre os trabalhos interdisciplinares e o uso do livro didático. Reflexões das professoras que mostrou como estão acostumadas a trabalhar em sala e sobre o próprio trabalho com a matemática. Discussão sobre campo multiplicativo. Uso do livro didático. 29º. Data 28º. 13/08 27º. 20/08 26º. Susana, Beatriz, Lúcia e Sandra Relato sobre da professora Beatriz sobre a aula que Conversas sobre os cotidianos introduziu o conteúdo de das salas de aula. frações. Atividades variadas para A professora Lucia está trabalhar as operações. começando a entender a dinâmica do grupo de estudos. 03/09 25º. Relato sobre o que estamos realizando em sala de aula. Conversa sobre o QVL Trabalho com a revista Nova Escola – especial matemática. Susana, Lúcia, Beatriz, Elisa e Sandra Análise da prova aplicada pela professora Beatriz. Troca de materiais e atividades. Relato sobre tempo de serviço com algumas colocações. A participação da profª Elisa foi boa. Reflexão da profª Susana sobre o Continuar com reflexões que o grupo está contribuindo sobre nossa vida em sua prática, inclusive com a profissional. superação de alguns „medos‟, exemplo a geometria. 10/09 24º. Susana, Lúcia, Beatriz e Sandra Susana, Beatriz e Sandra Conversas gerais sobre sala de aula. Discussões sobre objetivos de cada atividade que aplicamos em aula. Uso de metáfora para comparar com a aprendizagem matemática. Algumas discussões provocam reflexões, muitas vezes não Retomar a discussão dos refletimos sobre nossos objetivos objetivos das atividades ao desenvolvermos determinada propostas. atividade. 17/09 23º. Principais propostas ou assuntos discutidos Beatriz, Elisa e Sandra Participação da professora Elisa Relatos sobre as atividades de mostrou que em algumas escolas sala de aula e sobre a relação a atenção central é dada ao dos alunos com a matemática. português. 24/09 22º. Profªs. presentes Susana, Lúcia, Beatriz e Sandra Conversas sobre atividades de geometria. Atividade relacionada com a folha A4 e outras sobre raciocínio lógico. Leitura e discussão de folha cedida por Lucia sobre resolução de problemas. Interação entre as professoras. Discussão sobre as atividades de Retomar questões raciocínio lógico e as referentes a generalizações que elas podem generalizações. desenvolver. 01/10 Encontros Susana, Lúcia, Vânia, Beatriz e Sandra Discussões sobre trabalho tradicional e construtivista. Relatos sobre atividades desenvolvidas em aulas. Discussão sobre nossos olhares sobre o que estamos desenvolvendo com os alunos. Planejamentos para o 4º bimestre. 08/10 354 Susana, Lúcia, Vânia, Beatriz e Sandra Discussão sobre a reflexão e como devemos trabalhar isso em nossa prática. Relato das atividades das aulas de matemática. Pontos importantes que merecem destaque Pontos que precisam ser analisados A professora Susana ficou admirada com o fato da Analisar a revisa Nova professora Lucia não conhecer o Escola. QVL. Ampliar as discussões sobre multiplicação e divisão. Verificar se as outras professoras do grupo concordam com estas discussões. Retomar discussões sobre o planejamento e nossos olhares sobre nossas práticas. Organização da mostra científica com as atividades matemáticas Retomar discussão sobre selecionadas. nossas reflexões. 35º. 36º. Susana, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Discussão sobre frações de unidades e de quantidades. Uso de questionamentos sobre avaliação. Organização de atividades para trabalho com frações. Retomar questões respondidas sobre avaliação. Susana, Beatriz e Sandra Dobradura de caixas com prisma triangular. Participação das professoras na realização das dobraduras. Discussões sobre geometria espacial. Susana, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Atividade de combinação. Organização das apresentações da mostra cultural. Combinação matemática. Susana, Beatriz, Vânia e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Atividades de dobraduras. Discussões sobre trabalhos em grupo. Discussão sobre nossa reflexão sobre a própria prática. Reflexões sobre as atividades desenvolvidas e sobre os relacionamentos em sala de aula. Continuar estas Discussões sobre as reflexões discussões. vivenciadas e as influências do grupo de estudos. Susana, Lúcia, Vânia, Beatriz e Sandra Confraternização. Avaliação oral sobre nossos encontros. Susana, Lúcia, Beatriz e Sandra Apresentação das provas aplicadas pelas professoras. Avaliação escrita relacionada às atividades desenvolvidas no ano de 2007. Análise da avaliação realizada pelos alunos a pedido da pesquisadora. 19/10 Comentários e reflexões da profª Susana referentes à atividade Organização de realizada em grupo sobre atividades de revisão. geometria. 29/10 34º. Relato das atividades das aulas de matemática. 05/11 33º. Pontos que precisam ser analisados 12/11 32º. Pontos importantes que merecem destaque 19/11 31º. Principais propostas ou assuntos discutidos 26/11 30º. Profªs. presentes Susana, Vânia e Sandra 17/12 Encontros Data 355 Discussão dos planejamentos para o próximo ano. Discussão sobre as análises das professoras sobre as respostas dos alunos. Discussão sobre avaliações destes tipos. 1º. 18/02 2008 Susana, Beatriz e Sandra Conversas gerais sobre os primeiros dias de aulas. Planejamento para o início das atividades. Perceber como as professoras estão implementando atividades Conversar sobre o e propostas sugeridas no ano planejamento passado. novamente. Discussão sobre os objetivos das atividades. 25/02 Maior reflexão por parte das professoras na aplicação das atividades. Discussão sobre a palavra „desafios‟. 03/03 G Susana, Lúcia, Beatriz, Vânia (tel) e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Discussão sobre situação vivenciada na sala de aula sobre números decimais. Discussão sobre os 500 centavos Retomar multiplicação e sobre multiplicação por 10 por decimais. com números decimais. Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Atividades diferenciadas para trabalhar o raciocínio lógico. A professora Beatriz explicou melhor como trabalha a questão dos números decimais e o sistema monetário. Discussão sobre estas reflexões. Susana, Beatriz e Sandra Apagão UFES. Susana, Beatriz, Vânia e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Discussões sobre fatos fundamentais na matemática. Reflexões sobre nossa participação no grupo e os desdobramentos nas aulas de matemática. Reflexões das professoras sobre o caminhar de cada uma no grupo de estudos. Ampliar estas discussões. Susana, Lúcia, Vânia, Beatriz e Sandra Discussões sobre o resto nas divisões. Relato das atividades das aulas de matemática. Relações entre as atividades de aulas com as religiosas. Reflexões das professoras sobre atividades realizadas em sala de aula. Conversas sobre avaliação Discussão sobre avaliação. Susana, Lúcia, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Discussão sobre a resolução de problemas com resto não nulo. Discussões sobre a importância de analisar o resto em divisões. Retomar estas discussões. Lúcia, Beatriz e Sandra Discussão sobre a definição de divisão. Trabalho com texto sobre divisão. Reflexão sobre nossas próprias definições sobre divisão. Definição sobre divisão. Susana, Lúcia, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Discussão sobre resolução de problemas. Reescrita do problema do telefone. Reflexão sobre uma atividade em grupo. Discussão sobre a resolução de problemas. G 24/03 10/03 G Susana, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Discussão e reflexão sobre nossa própria prática em matemática e a influência do grupo. 6º. 7º. 8º. 9º. 07/04 5º. Pontos que precisam ser analisados 14/04 4º. Pontos importantes que merecem destaque 28/04 3º. Principais propostas ou assuntos discutidos 05/05 2º. Profªs. presentes 19/05 Encontros Data 356 Discussão sobre o que consideramos como problemas, desafios e exercícios. Principais propostas ou assuntos discutidos Susana, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Conversas sobre as oficinas da professora Susana e da prova aplicada por Beatriz. Discussão sobre atividades em grupo e sobre avaliações. Discussão sobre atividades em grupo e sobre avaliações. 02/06 Susana, Lúcia, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Discussão sobre as ideias relacionadas com a divisão. Discussão sobre as ideias relacionadas com a divisão: partição e quotição. Elaboração de problemas com as duas ideias da divisão. Discussão sobre as ideias relacionadas com a divisão: partição e quotição. 09/06 Susana, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Discussão sobre resolução de problemas. Organização com a professora Discussão sobre Susana dos problemas resolvidos resolução de problemas. por seus alunos. 30/06 Susana, Beatriz e Sandra Reflexões sobre as atividades realizadas em aulas. Reflexões sobre as atividades Relato das atividades das realizadas em aulas. aulas de matemática. 11/08 G Susana, Lúcia, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Reflexões sobre a falta de encontros no mês de julho. Questionário sobre influência do grupo – anexo B. Reflexões sobre a falta de encontros no mês de julho. Decisão de fazer Mudança na ação da profª encontros a partir desta Susana com a ausência do grupo data de 15 em 15 dias. e sua reflexão. Susana, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Multiplicação chinesa Tangran. Discussões sobre o trabalho com o livro didático. Discussões sobre o trabalho com o livro didático, principalmente a professora Susana. Questionamentos e reflexões sobre os horários das aulas e as dificuldades de trabalhar com os alunos. Discussão sobre o uso do livro didático. Proposta de trabalho diferenciado com o livro nas aulas de Susana. Susana, Lúcia, Vânia e Sandra Trabalho com o geoplano circular. Ângulos. Definições de diferentes polígonos e da circunferência. Discussões sobre as relações entre as definições e as palavras feitas pela professora Susana. Discussão e conflito cognitivo sobre definições. Proposta de realização de atividades com o geoplano circular em sala de aula. Susana, Lúcia, Vânia, Beatriz e Sandra Discussões sobre definições de alguns polígonos a partir das discussões sobre o geoplano circular. Relato das atividades das aulas de matemática. Questionamentos sobre os fatos marcantes da vida profissional. Discussões sobre definições de alguns polígonos a partir das discussões sobre o geoplano circular. Questionamentos sobre os fatos marcantes da vida profissional. 10º. 11º. 14º. 15º. 16º. 17º. 22/09 13º. 15/09 G 12º. 26/05 G Data Profªs. presentes 25/08 Encontros G 357 Pontos importantes que merecem destaque Pontos que precisam ser analisados Reflexões sobre resolução de problemas. 22º. 23º. 24º. Trabalho com porcentagem e regra de três. Reflexões sobre as aprendizagens das professoras no grupo. Susana e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática e sobre as situações vividas nas escolas. Organização das apresentações dos trabalhos das profª para o II Semat. Organização das atividades para sala de aula – geometria. Participação das professoras na organização das apresentações dos trabalhos das profª para o II Semat. Organização das apresentações dos trabalhos das profª para o II Semat. Susana, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Identificação dos objetivos com as atividades que serão apresentadas no II Semat. Participação das professoras na organização das apresentações dos trabalhos das profª para o II Semat. Organização das apresentações dos trabalhos das profª para o II Semat. Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Organização das atividades de apresentações dos trabalhos realizados. Organização das atividades de apresentações dos trabalhos Organização das realizados: idosos e resolução de atividades. problemas. Susana, Vânia, Beatriz e Sandra Relato das atividades das aulas de matemática. Discussão sobre cálculo de áreas de polígonos. Discussão de definições de retângulo e triângulo retângulo. Discussões sobre números decimais: comparações, multiplicação e outras operações. Discussão sobre cálculo de áreas de polígonos. Discussão de definições de retângulo e triângulo retângulo. Reflexões sobre a geometria e sua abordagem em aulas de matemática: o que faziam e Ampliar estas reflexões. como fazem após participarem do grupo. Reflexão da professora Susana sobre suas aprendizagens em relação aos números decimais, retorno ao que já tinha sido discutido. Susana, Vânia, Beatriz e Sandra Planejamento para 2009. Uso de metáforas comparando com a matemática. Pedido de colocação de três ou quatro objetivos para cada uma das participantes do grupo. Discussão sobre como estamos nos conhecendo enquanto grupo. Discussão sobre as modificações dos planejamentos dos anos Planejamento para 2009. anteriores. Reflexões sobre o grupo e propostas de continuidade. Susana, Lúcia, Vânia, Beatriz e Sandra Encerramento do ano com confraternização. Avaliação oral sobre a participação no grupo. 06/10 Data Discussões sobre o trabalho com o livro didático, modificada pela professora Susana em sua prática. Trabalho com porcentagem e regra de três. Reflexões sobre as aprendizagens das professoras no grupo. 20/10 21º. Susana, Beatriz e Sandra Questionamentos sobre os fatos marcantes da vida profissional. Discussões sobre o trabalho com o livro didático. Reflexão sobre o olhar de cada professora para os encontros anteriores do grupo. Questionamentos sobre as aprendizagens das professoras no grupo. 27/10 20º. Pontos importantes que merecem destaque 10/11 19º. Principais propostas ou assuntos discutidos 01/12 18º. Profªs. presentes 08/12 Encontros 15/12 358 Pontos que precisam ser analisados Planejamento para 2009. 359 Anexo E – Quadros das aulas observadas de Beatriz e Susana Aulas da professora Beatriz Aula Dia Quadro 20: Apresentação das aulas vivenciadas com a professora Beatriz Assuntos trabalhados Comentários importantes Metodologias utilizadas ou formas de trabalho 30/05 Problemas divisão. p. 1 - 6 22/06 Problemas divisão inventados pelos alunos. Atividade investigativa “explorando números”. p. 7-10 05/07 Medidas comprimento. Problemas. Subtração diferente explicada pelo filho da pesquisadora. p. 11-20 11/07 Formulação e resolução de problemas. Multiplicação com linhas. p. 21 - 26 01/08 Continuação da discussão da multiplicação com linhas. Problemas retirados do livro de avaliação da Profª Vânia. p. 27 - 30 09/08 Problemas divisão, proporcionalidade. Divisão por 10. p. 31 - 35 16/08 Frações – ideias iniciais. p. 37 - 42 8ª. 06/09 Frações: revisão e ampliação dos conceitos. Formas geométricas e divisão em partes iguais. Frações no relógio. p. 43 - 50 9ª. 13/09 Ano letivo de 2007 Frações mistas e impróprias. p. 51 - 58 1ª. 2ª. 3ª. 4ª. 5ª. 6ª. 7ª. Encaminhamento de alunos no quadro para resolver Variedade de representações e importância exercícios. que cada aluno dá a resolução do colega. Realização de leitura com os alunos para entenderem os problemas. Os alunos possuem pré-conceitos em relação Realização de atividades aos que sabem e aos que não sabem em grupos. matemática. Resolução de problemas Como a professora aborda os conteúdos com individualmente. os alunos. Apresentação de um aluno Comentários dos alunos sobre as atitudes da sobre o que viu na professora e dos colegas. televisão: a respeito de uma subtração diferente. A professora consegue envolver os alunos em atividades coletivas. A professora valoriza seus alunos e desta forma incentiva-os. Dificuldades com atividade de proporção. Realização de invenção de problemas com toda a turma analisando. Trabalho em duplas. Alunos com dificuldades em trabalhar com números escritos de forma diferente. Comecei a tirar fotos dos cadernos. Resolução individual de problemas. Foi muito interessante como a professora abordou este tema com os alunos e como relacionou isso com a representação e a notação. Utilização de frutas para dar ideia de frações. A professora explorou as frações de diferentes formas. Utilização de barbantes, palmos e outros instrumentos para ideias de fração. Trabalho com figuras geométricas cortadas em folhas de A4. A professora trabalhou com exemplos e depois com exercícios. Abordagem no quadro e realização de atividades em folhas xerocadas. 17ª. 18ª. 20/09 03/10 16ª. Realização de atividades em grupos de 4 alunos cada. Utilização de fichas com questões para cada grupo. 11/10 15ª. A profª Vânia estava presente. Os alunos participaram dessa atividade de forma intensa. Tabuada. Jogo como revisão. p. 76 - 78 25/10 14ª. A profª Vânia estava presente. Realização de atividades no quadro. Utilização do metro para mostrar suas subdivisões. Realização de atividades com folha xerocada. Correção dos exercícios de medidas de comprimento e frações. barra de chocolate. Frações equivalentes. p. 67-75 Correção dos erros na prova pelos alunos. Propriedade associativa da adição. p. 79 - 83 01/11 13ª. Problemas envolvendo frações. A professora dá atenção aos alunos com Apresentação de problemas Introdução a décimos e dificuldade, mas chamava-os de “grupinho”, no quadro para serem centésimos. agora passou a considerá-los como resolvidos p. 59 - 66 colaboradores. individualmente. Folhas tamanhos “A”. Trabalho com frações em relação as comparações dos tamanhos A. p. 84 - 89 Os alunos gostaram muito da atividade e interagiram bem. Fizemos investigações com estas folhas. Utilização da folhas de papel tamanho “A4” para os alunos fazerem dobraduras e recortes. 07/11 12ª. Metodologias utilizadas ou formas de trabalho Preparação dos materiais para a mostra cultural: poesia matemática, plantas em garrafas, caixas de presentes, artes com folhas tamanhos A. p. 90 - 91 Os alunos foram separados em grupos de acordo com o que faziam melhor e preparavam os materiais para serem apresentados. Trabalhos em grupos com propósitos diferentes. 08/11 11ª. Comentários importantes Artes com folhas tamanhos A. Poesias; problemas sobre reciclagem. p. 92 -93 A professora organizou um momento para que discutissem sobre uma entrevista que fariam com um estrangeiro de visita no Brasil. Realização de atividades em grupos e individuais. Entrevista com filho de fundador Os alunos questionaram sobre as atividades do bairro. de matemática já que estávamos presente. p. 94 - 95 Conversa com a turma e realização de anotações coletivas no quadro. Alguns alunos não conseguem trabalhar com Trabalho em duplas sobre a os colegas dos grupos e precisam da nossa prova que tinha realizado. intervenção. 21/1 1 10ª. Assuntos trabalhados 06/1 2 Aula Dia 360 Frações e Decimais. p. 96 - 101 Aprendi muito nesta aula. Utilização de material dourado. 2ª. 29/02 1ª. Texto “Carnaval em família” e problemas. p. 104 - 106 Leitura e realização das Os alunos gostaram de ler o texto e depois atividades contidas no resolver as atividades propostas. Apesar de texto discutido no grupo de compararem com as aulas de português. estudos. 07/03 Ano letivo de 2008 Classes e ordens de números, escrita de numerais. Problemas de divisão. p. 107 - 113 Metodologia da professora em manter a Correção no quadro com os atenção dos alunos. Destaque para o estilo de alunos e resolução de linguagem utilizado em jornais e revistas. problemas. Assuntos trabalhados Comentários importantes Revisão de atividades realizadas numa prova. Vânia participou deste dia. Importante o Problema no quadro para retomar retorno que a professora deu aos alunos e alguns pontos conflitantes na como organizou sua aula em relação a isso. prova realizada no dia anterior. p. 114 - 123 Metodologias utilizadas ou formas de trabalho Diálogo conjunto a partir de problema apresentado no quadro. 11/04 18/04 25/04 Quatro operações. Perímetro. p. 128 - 132 09/05 Construção de texto coletivo sobre as aulas de geometria. p. 133 - 137 16/05 Resolução de problemas e elaboração de problemas de divisão com resto não nulo. p. 138 - 141 30/05 Revisão de frações. p. 142 - 145 Resolução de problemas. p. 146 - 150 Resolução e criação de problemas em duplas. p. 151 – 152 Professora Vânia estava presente. A professora passou um problema das olimpíadas de matemática para eles resolverem e depois eles inventaram problemas parecidos. Resolução e criação de problemas semelhantes. Criação e resolução de problemas. p. 153 - 154 Os alunos estão resolvendo problemas inventados pelos colegas, e inventando outros parecidos. Os alunos já estão colocando no computador os problemas inventados. Sentei com alguns alunos e perguntei como eles tinham pensado para inventar os problemas. Resolução e criação de problemas. 13ª. Atividade geoplano circular – parte inicial. O grupo de estudos mais amplo participou deste encontro. Utilização de geoplano circular e de folhas xerocadas. 14ª. Atividade geoplano circular – parte final. O grupo de estudos mais amplo participou deste encontro. Utilização de geoplano circular e de folhas xerocadas. 4ª. 5ª. 6ª. 7ª. 8ª. 9ª. 10ª. 11ª. 12ª. 10/10 Exploração dos sólidos geométricos: rola e não-rola, planificação, arestas, faces e vértices, nomenclatura e diagonais. P. 126 - 127 06/06 Uso de materiais A professora pediu que eu participasse da manipuláveis e construção aula trabalhando os sólidos construídos com de sólidos geométricos canudinhos. com canudinhos e fio de nylon. Sólidos geométricos e planificações. p. 124 - 125 25/09 3ª. 28/03 Aula Dia 361 Os alunos interagiram bastante. Também participei bastante da aula. Uso de materiais manipuláveis que os próprios alunos trouxeram de casa: embalagens. Os alunos mediram alguns objetos da classe. Realização de atividades com fita métrica e materiais diversos que estavam em sala de aula. É bem interessante esta dinâmica de fazer textos coletivos com os alunos. Utilização do quadro e pincel para construção coletiva do texto. A professora pede aos alunos que tenham paciência, pois cada um tem seu tempo de pensar e conseguir fazer a atividade. Resolução de problemas a partir de folha xerocada. Correção dos exercícios e da prova, pois alguns alunos tiveram dificuldades em Realização de revisão da algumas questões. O aluno M estava fazendo prova. outra atividade. A professora percebeu enquanto os alunos Resolução de problemas a faziam que uma das atividades tinha um grau partir de folha xerocada. de dificuldade maior do que ela imaginava. 362 Aulas da professora Susana Dia Assuntos trabalhados 1ª. 30/05 Comparação entre números. Sinais de maior (>) e menor (<). Antecessor e sucessor; decomposição de números. p. 202 – 207 2ª. 25/06 Quadro 21: Apresentação das aulas vivenciadas com a professora Susana 3ª. Uso de atividade. folha com Os alunos sentiram dificuldades em trabalhar com os problemas com letras Resolução e correção de diversas para resolverem, pois não problemas no quadro. entendiam que deveriam voltar ao Uso do QVL. problema inicial. A professora envolve a turma na resolução de problemas que eles já tinham copiado no Resolução de problemas caderno. A professora resolveu os do livro. exercícios logo após ter pedido para que eles respondessem. A professora passou algumas Aplicação de atividade no multiplicações e pediu para os alunos quadro. respondessem. Realização de atividades A professora lê com os alunos e depois de no quadro. um tempo resolve com eles no quadro. Uso QVL. Atividades ideias de divisão. p. 242-248 A professora pediu a alguns alunos Utilização de atividades ajudarem uma colega. em folhas. Aplicação de atividade A professora questiona e leva os alunos a em folha e correção de pensarem. exercícios. 6ª. Operações de multiplicação. p. 232 – 234 Ditado de numerais; ordem crescente dos números. Adivinhações com números. p. 235 - 241 27/08 Atividades de lógica e números ordinais. numeração romana. p. 249 – 254 03/09 Oficina geométrica; planificação de A proposta da professora foi modificada e Utilização de folhas para caixas e latas. conseguimos trabalhar com a planificação desenhos. p. 256 - 257 de alguns sólidos geométricos. 11ª. 11/09 12ª. 18/09 20/0 8 30/07 Problemas envolvendo as quatro operações. p. 217 – 222 06/08 Resolução de problemas Os alunos utilizaram diferentes no quadro que deveriam representações e conseguiram fazer os ser respondidos problemas. individualmente. Resolução de problemas. p. 223 – 231 8ª. Realização de exercícios e correção dos mesmos no quadro. Problemas envolvendo divisão. p. 212 – 216 5ª. 7ª. Metodologias utilizadas ou formas de trabalho 02/07 Ano letivo de 2007 A professora faz comparações entre a vida real e os conceitos matemáticos. A professora em alguns momentos afirma que algumas atividades são difíceis, mas que muitas vezes eles de divertem. A professora achou que a atividade era difícil para seus alunos e que eles iriam se Atividade investigativa “explorando enrolar com as respostas; e na realidade os números”. alunos não se interessaram muito pela p. 208 – 211 atividade, acredito que seja por falta de conhecimentos. 13/08 4ª. Comentários importantes 09/07 Aula Sólidos geométricos: rola, não rola; Atividade interessante que todos os alunos Realização de atividade o que parece, faces. participaram. em grupo. p. 258- 263 Realização de atividade Multiplicação por números com Os alunos se envolveram nas atividades, no quadro. dezenas e unidades. mas tiveram dificuldades nas Montagem de sólidos Construção de sólidos geométricos. multiplicações. geométricos com P. 264 – 269 canudos. 9ª. 10ª. 363 Dia 21ª. 24/09 20ª. 01/10 19ª. 08/10 18ª. 29/10 17ª. Filme pequeno príncipe. p. 289 - 291 06/11 16ª. Atividade em grupo com revisão do que tinha sido trabalhado: antecessor e sucessor, escrita dos Os alunos interagiram bastante nesta aula. números, comparação entre os A professora ficou surpresa com a atuação números e nomenclatura dos sólidos dos alunos. geométricos. p. 281 - 285 Atividade com a folha tipo A. p. 292 - 293 13/11 15ª. Revisão geometria em grupo. p. 277 - 281 Origami. p. 294 - 295 21/11 14ª. Números ordinais. Numeração romana. Atividade de lógica. p. 270 - 276 Uso de folhas para Origami e início da investigação da Relacionamos a folha A4 com outras folhas origami. matemática da Folha A4. tipo A. Realização de atividade p. 296 - 297 quadro. 30/11 13ª. Metodologias utilizadas ou formas de trabalho Assuntos trabalhados Mostra cultural. p. 298 - 299 O Felipe estava presente e ajudou com a Uso de papéis coloridos construção de alguns origami numa oficina. para origami. 03/12 Aula Avaliação do trabalho do ano (carinhas). p. 300 Aplicação de folha de Fui a escola apenas para fazer uma avaliação levada pela avaliação com as crianças sobre a pesquisadora. matemática que tínhamos estudado. Comentários importantes Aplicação de exercícios A professora trabalha perguntando aos no quadro e uso de folha alunos o que eles entenderam. com problemas de lógica. Conseguimos fazer com que os alunos se Uso de materiais interessassem e participassem da atividade. manipuláveis para Participação da professora Vânia. geometria. Formação de grupos de 4 alunos. Uso de tirinhas de papel com questões. Não teve aula de matemática neste dia, pois Realização da aula na era o dia do livro e a escola preparou uma biblioteca da escola com programação especial. uso de vídeo. Uso de folhas “A4” Os alunos investigaram e relacionaram as coloridas para dobraduras folhas tipo A e fizeram muitas tarefas. e comparações. Participação de Lucia nesta aula com as Uso de folhas coloridas dobraduras. A professora e os alunos para que os alunos gostaram da novidade. fizessem origami. 28/02 Um pouco de história dos números egípcios p. 301 – 303 03/03 Problema referente à oficina de compra e venda. p. 304 – 308 10/03 Atividade envolvendo texto e perguntas de matemática p. 309 – 312 4ª. 17/03 Comparação de números; quatro operações. p. 313 – 317 5ª. 24/03 Ano letivo de 2008 Fatos fundamentais da adição p. 318 – 322 2ª. 3ª. Novos alunos pois a turma é nova, eles Uso de livro didático ainda não me conhecem. A professora trabalhou de forma Realização de atividade interessante a questão de como se escreve no quadro. 50 centavos. A professora questionou sobre o erro e Aplicação de folha com sobre algumas dificuldades em relação ao atividades texto. Dificuldade em entender os problemas dos Realização de atividade alunos em relação a esta matéria no quadro A professora trabalhou os fatos Uso de materiais fundamentais de diferentes maneiras. manipuláveis Escola em greve p. 323 - 326 Conversa informal entre Susana, Sandra e Vânia sobre o trabalho dela. 14/0 4 1ª. 364 Dia 15ª. 19/05 14ª. 26/05 13ª. 05/06 12ª. 03/07 11ª. 29/08 10ª. Problemas sobre a oficina de supermercado p. 337 - 340 Atividade com o QVL p. 341 - 344 19/09 9ª. Problemas envolvendo as quatro operações p. 335 - 336 Correção de exercícios de resolução de problemas; Surgiram coisas interessantes durante a Atividade proporção com os correção; os alunos participaram muito na carrinhos atividade com os carrinhos; p. 345 - 351 02/10 8ª. Oficina supermercado p. 331 - 334 Resolução de problemas envolvendo A condução das discussões pela professora Resolução de problemas expressões numéricas. foram interessantes no quadro p. 352 – 358 07/10 7ª. Trabalho com material dourado – adição p. 327 - 330 Atividade 1 geoplano com grupo Vânia W. e J. estavam na sala e trabalhamos Utilização de geoplano atividades livres envolvendo geoplano circular e de folhas circular. xerocadas 14/10 6ª. Metodologias utilizadas ou formas de trabalho Assuntos trabalhados Atividade 2 geoplano grupo Vânia W. e J. estavam na sala e trabalhamos Utilização de geoplano atividades dirigidas envolvendo geoplano circular e de folhas circular. xerocadas 22/10 Aula A professora fez uma dinâmica Oficina de sólidos geométricos: rola Uso de embalagens diferenciada para trabalhar alguns ou não rola e planificação. diversificadas e folhas conceitos envolvidos com os sólidos p. 359 - 361 para desenhos geométricos. Comentários importantes Os alunos já tinham conhecimento do Uso de material dourado material dourado Uso de materiais Os alunos participaram e a professora manipuláveis: pediu para listagem e preços embalagens A professora distribuiu fichas, mas os alunos tiveram dificuldades, mudamos de Uso de fichas com estratégia após não conseguir os resultados problemas esperados. Os alunos ficaram com preguiça de fazer, e Resolução de problemas depois a professora corrigiu com eles. A professora trabalhou um problema para Uso de QVL para cada que os alunos fizessem uso do QVL. aluno Realização de atividades no quadro e giz Caso de carrinhos em miniatura