“Melhore a letra,
sei que você é capaz!”
Aurea M. Stavale Gonçalves
Psicopedagoga clínica e neuropsicóloga
Credenciada pelo Centro de Avaliação e Encaminhamento
da Associação Brasileira de Dislexia – ABD
São Paulo, SP, BR – 18/08/2014
Quantas crianças já não receberam esse bilhetinho no caderno? E quantas mães não se
perguntaram o que fazer com a letra feia de seus filhos? Para início de conversa, vamos deixar
claro que não é tão simples fazer uma letra bonita, aquela letra redonda “de professora”,
como se dizia.
Não basta decidirmos que apresentaremos as letras no Pré. No primeiro ano, as
crianças estarão escrevendo e lendo e, logo no início do segundo ano, introduziremos a letra
cursiva e... Tudo bem, teremos lindas letras, tudo muito rápido! Será que é necessária tanta
pressa diante de uma tarefa dessa importância e magnitude?
A escrita é objeto de conhecimento social e por meio dela nos comunicamos, nos
integramos, nos expressamos. Vale lembrar que é um sistema de alta complexidade e a
capacidade de usar esse código requer várias integridades. Os principais fatores envolvidos
relacionam-se ao desenvolvimento psicomotor, linguagem auditiva, memória, planejamento,
organização espacial, capacidade de ordenar ideias em sequência, coordenação da mão,
mente, olho. E o mais importante: não se desenvolve só com base no amadurecimento,
precisa ser ensinada.
Todos os movimentos para aquisição da escrita e que são necessários para a grafia das
letras devem ser ensinados. Exercícios de motricidade para coordenação motora, preparação
da escrita, preensão do lápis, cadernos de caligrafia passaram a ser olhados, atualmente, com
desdém e classificados como fora de moda; no entanto deveriam ser retomados. Esse ensino
não precisa ser de forma rígida e monótona. Podem-se inventar labirintos, vôo de bichinhos,
corrida com carrinhos, aviõezinhos para o ensino de cada movimento.
Sendo, pois, a escrita um código, a letra precisa ser legível para que cumpra sua função
de comunicação. Uma letra bonita, elogiada, certamente deixa a criança orgulhosa, ao passo
que a letra ilegível não é privilégio de médicos. Muitas crianças a apresentam, embora se
esforcem para escrever bonito; e o fracasso nessa área pode abalar a autoconfiança e
consequentemente levá-la a evitar o ato de escrever.
Esgotados os recursos de ensino, se a letra “feia”, ilegível, persistir podemos estar
diante de um quadro de disgrafia. Essa é uma disfunção resultante de integração visomotora.
Não há um distúrbio visual e tampouco motor, mas a criança não consegue transmitir as
informações visuais ao sistema motor. É um problema de escrita relacionado à execução que é
realizada com esforço; quando a dificuldade motora é mais abrangente, define-se um
Transtorno da Coordenação Motora.
A disgrafia é bastante frequente nos quadros de dislexia. Dificuldade para escrever
números e letras, a posição das mãos para a escrita, traços irregulares e dificuldade na
coordenação do direcionamento espacial fazem parte do quadro. Algumas intervenções
podem ser feitas para promover uma melhor execução da escrita como adequação ao tipo de
lápis, caneta e caderno para modelos mais anatômicos, maior tempo para realização de tarefa,
adaptação no caderno com reforço de linhas direcionais. Em alguns casos, o uso de letra de
forma ou bastão e uso de computador e suas ferramentas de editor de texto como
instrumento de auxílio na organização da escrita.
Assim, para que se melhore a letra, são necessárias várias habilidades, contribuição
dos professores, além de trabalho sistematizado desde as séries iniciais. Vamos aguçar nosso
olhar e considerar que, muitas vezes, em resposta ao bilhete inicial do nosso texto, de que a
criança não é capaz, mas não porque não queira e, sim, porque não pode.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MAIA H.-org. - Neurociências e desenvolvimento cognitivo, vol. 2, Rio de Janeiro, 2011 ;
MYKLEBUST,H; JOHNSON,D. - Distúrbios de Aprendizagem, São Paulo, Biblioteca Editora
Pioneira de Ciências Sociais, 1993;
SENNYEY, A.; CAPOVILLA F.; MONTIEL J.M. - Transtornos de aprendizagem da avaliação à
reabilitação, São Paulo, Artes Médicas, 2008;
SNOWLING M.; STACKHOUSE J. - Dislexia, fala e linguagem, Porto Alegre, Artmed, 2004.
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