‘O ACIDENTE DE FLIC’:
A APRESENTAÇÃO DO ACONTECER CLÍNICO COMO NARRATIVA BRINCANTE
1,
2,
Fabiana Follador e Ambrosio Walkíria Cordenonssi Cia Tânia Maria José Aiello Vaisberg
Pontifícia Universidade Católica de Campinas
A partir da concepção de que o conhecimento científico constrói-se
tendo como elemento fundamental a interlocução com a
comunidade acadêmica, entendemos ser de suma importância que
a apresentação dos estudos em andamento, das idéias que habitam
os grupos de pesquisa, seja realizada com o rigor necessário.
Tratando-se de investigações em psicanálise, disciplina que tem seu
exercício fundamentalmente ancorado no acontecer inter-humano,
a comunicação de resultados muitas vezes passa por apresentações
de material clínico, por recortes de sessões terapêuticas, por
depoimentos de participantes de pesquisa. Evidentemente a
divulgação deste tipo de material requer que alguns cuidados sejam
respeitados.
Com os avanços tecnológicos, ao tornarem acessíveis na web teses,
dissertações e artigos, o problema é recolocado, pois, ao que tudo
indica, torna-se cada vez mais fácil a identificação dos casos pelos
próprios pacientes e por terceiros. Considerando esse quadro,
apresentamos uma forma de registrar o acontecer clínico, com o
intuito de preservar os aspectos afetivo-emocionais essenciais,
registrando o caso sob roupagem ficcional que dificulte ou até
impossibilite o reconhecimento, tanto da própria pessoa, como de
terceiros.
Trata-se de uma proposta inspirada na transicionalidade
winnicottiana, que denominamos "narrativas brincantes".
OBJETIVO
Intencionamos verificar o uso de narrativas
psicanalíticas brincantes como estratégia
heurística na produção de conhecimento.
Compreendemos que a necessidade de
apresentação de material clínico na pesquisa
psicanalítica deve ser problematizada,
levando em conta o impacto invasivo
causado a partir da auto-identificação dos
pacientes nas comunicações dos analistas.
METODOLOGIA
Elaboramos estudo fundamentado na substituição de relatos
literais de sessão pela apresentação de registros do acontecer
clínico sob a forma de narrativas brincantes, de caráter ficcional, no
contexto do grupo de pesquisa. As associações livres, hipóteses e
compreensões produzidas pelos pesquisadores diante destas
narrativas são anotadas e, num segundo momento, comparamos as
percepções clínicas do grupo com aquilo que surge a partir dos
relatos não ficcionais dos mesmos casos.
3
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A utilização deste tipo de proposta vem revelando-se bastante
produtiva no contexto dos grupos de pesquisa. Uma vez que pretende,
ao mesmo tempo, dificultar maximamente a auto-identificação dos
pacientes/participantes, bem como assegurar a apresentação do
acontecer clínico, compreendemos que tal procedimento abrange o
cuidado com o rigor científico, mas também atenta à preservação do
bem-estar psicológico dos participantes/pacientes, efetivando um
cuidado ético.
Flic é um pingüim que habita o sul do
continente. É agitado e adora cuidar dos outros pingüins que o
procuram freqüentemente pedindo ajuda. Nunca passa
despercebido quando chega em algum lugar, pois é brincalhão e
demonstra muita vivacidade através da sua extroversão. Mas, de
fato, ninguém conhece Flic, pois por trás daquele esforço em
demonstrar sempre uma grande alegria, existe alguém que se
sente muito sozinho e que possui muita dificuldade em expor os
seus sentimentos. Essa situação fez com que ele há alguns
anos procurasse ajuda nas reuniões
que são realizadas pelos
pinguins-de-olhos-amarelos.(...)
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concedida a Marcelo Marques.
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Artes Médicas, p. 82-93, 1994.
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1
Doutoranda em Psicologia pela PUCCAMP, bolsista CNPq.
2 Assistente de Coordenação da Ser e Fazer e Responsável pela Oficina de Cores.
3 Profa. Livre Docente pelo IPUSP, orientadora dos programas de pós graduação do IPUSP e da PUCCAMP.
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