UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO COORDENAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU” EM PRODUÇÃO E REPRODUÇÃO DE BOVINOS BRUCELOSE BOVINA Ricardo Rodrigues Cardoso Goiânia, set. 2006 RICARDO RODRIGUES CARDOSO Aluno do Curso de Especialização “Latu sensu” em Produção e Reprodução de Bovinos Matrícula aq921871 BRUCELOSE BOVINA Trabalho monográfico de conclusão de curso (TCC), apresentado à UCB como requisito parcial para a obtenção de título de Especialização lato sensu, sob a orientação da Professora Sueli Cristina. Goiânia, set. 2006 BRUCELOSE BOVINA Elaborado por Ricardo Rodrigues Cardoso Aluno do Curso de Produção e Reprodução de Bovinos Foi analisado e aprovado com grau: ............................ Rio de Janeiro, ____ de ________________ de ______ . ___________________________ Membro ___________________________ Membro ___________________________ Professor Orientador Presidente Goiânia, set. 2006 ii Agradecimentos Ao Criador do Universo, pela oportunidade da vida; à minha família de origem, pelos exemplos e pelo apoio; à minha esposa, por compreender as minhas ausências; às minhas filhas, pelo estímulo indireto; e à Profª Sueli Cristina, prestada. iii pela boa vontade e orientação SUMÁRIO Página Resumo........................................................................................ iv Parte 1. Prejuízos causados pela brucelose ......................................... 1 1.1. Introdução 1.2. Objetivos 1.3. Questões de estudo 2. Características da doença ......................................................... 5 2.1. Epidemiologia 2.2. Patogenia 2.3. Aspectos clínicos 2.4. Diagnóstico 2.5. Controle e erradicação 3. Conclusões .............................................................................. 19 Referências bibliográficas ............................................................. 20 V CARDOSO, Ricardo Rodrigues (RE) Brucelose Bovina A brucelose é um problema crônico no nosso país. Com o lançamento do Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuberculose Animal (PNCEBT) bovinas, houve motivação no estudo do assunto enfocando aspectos epidemiológicos, patogenia, aspectos clínicos, diagnóstico e controle da doença. O aborto é a principal manifestação da doença, e por si só, já causa grandes perdas. O feto abortado, a placenta e as descargas uterinas, são as maiores fontes de contágio. A via mais comum de infecção é o trato digestivo, e os principais meios de disseminação da doença são os pastos e os cochos de alimento e de água, contaminados. Os touros não são importantes, como transmissores, quando executam a monta natural, mas, na inseminação artificial, o sêmen contaminado transmite a brucelose. O leite contaminado é importante fonte de infecção para o homem. A doença acomete fazendeiros, veterinários, peões e pessoas que trabalham em matadouros. Os diagnósticos clínico e epidemiológico, precisam ser confirmados pelos testes de diagnósticos direto e indireto. Estes últimos, por serem mais rápidos, baratos e menos perigosos, são os mais utilizados, inclusive no PNCEBT. A vacinação tem sido colocada como importante ferramenta para o controle da brucelose. A aprovação da utilização da amostra RB51, que não interfere no diagnóstico sorológico, deve levar a uma diminuição mais rápida das taxas de prevalência e incidência da brucelose bovina. Abstract Bovine Brucellosis. Brucellosis is a chronic problem in our country. With the launching of the National Program of Control and Eradication of the Brucellosis and Tuberculosis Animal (PNCEBT), let us stow motivated in studying the subject focusing aspects clinical epidemiologists, pathogeny, aspects, diagnosis and control of the illness. The abortion is the main manifestation of the illness, and, already cause by itself great losses. The aborted embryo, the uterine placenta and discharges, are the biggest sources of contagion. The infection way most common is the digestive treatment, and the main ways of dissemination of the illness are the grass and the trough of food and water, contaminated. The bulls are not important, as transmitting, when they execute mounts it natural, but, in the artificial insemination, the contaminated semen transmits brucellosis. Contaminated milk is important source of infection for the man. The illness assails farmers, veterinarians, laborers and people who work in slaughter houses. The diagnostic clinical and epidemiologist, need to be confirmed by the diagnostic direct and indirect. These last ones, for being faster, cheap and less dangerous, are used, also in the PNCEBT. The vaccination has been placed as important tool for the control of brucellosis. The approval of the use of sample RB51, that does not intervene with the serological diagnosis, must take to a faster reduction of the taxes of prevalence and incidence of brucellosis bovine. iv 1. PREJUÍZOS CAUSADOS PELA BRUCELOSE 1.1. Introdução A brucelose é uma doença infecto-contagiosa de evolução crônica e caráter granulomatoso típico, causada pelas bactérias do gênero Brucella sp, sendo que nos bovinos ela é causada pela Brucella abortus ( ROXO, 1995; DEL FAVA et al, 2003). POESTER (1984) diz que as principais manifestações entre os animais são os abortos, nascimentos prematuros, esterilidade e baixa produção de leite, e que estes fatores contribuem para uma considerável baixa na produção de alimentos. RADOSTITS et al (1988) revelam que a doença é amplamente disseminada e de grande importância econômica em muitos países do mundo, com grandes perdas: declínio da produção de leite nas vacas que abortam; infertilidade que aumenta o período entre as lactações aumentando o intervalo entre partos; perda de bezerros que em rebanhos de gado de corte representam a única fonte de renda para o produtor; eliminação de vacas valiosas e algumas mortes devido à metrite que sobrevém à retenção de placenta. POESTER (1984) mostra que no homem a manifestação clínica da doença é responsável por incapacidade para o trabalho e redução no rendimento individual, e sendo ele o estágio final na cadeia de transmissão da brucelose, a eliminação do agente nos animais acarreta o desaparecimento da doença na espécie humana. RADOSTITS et al (1988) salientam a importância da enfermidade como causadora da febre ondulante no homem, justificando amplamente sua erradicação. VERONEZI (1976), segundo POESTER (1984), afirma que o primeiro caso de brucelose humana no Brasil foi comprovado sorologicamente na Faculdade de Medicina de Porto Alegre, pelo Prof. Manoel Gonçalves Carneiro, em 1913. ICIBACI (1922), segundo PALMQUIST (2001), fez a primeira referência a uma epizootia de brucelose bovina no Brasil, constatando-a clinicamente na Fazenda Pulador, Estado de São Paulo. MELLO e NEIVA (1930), segundo PALMQUIST (2001), demonstraram definitivamente a existência da doença no Brasil encontrando índice de 38,27% de reações positivas no exame de 81 soros bovinos na Fazenda Modelo, em Nova Odessa, São Paulo, com resultados comprovados pelo isolamento do agente causal. A brucelose animal ocorre de forma endêmica em todas as regiões do Brasil, com prevalências variáveis levantadas nos inquéritos epidemiológicos e nos diagnósticos sorológicos, que demonstram índices de 2,5% a 18,7%. (BRASIL, 1998a, segundo FREITAS & OLIVEIRA ,2005). GENOVEZ et al (1993), segundo DEL FAVA et al (2003), revelam ter sido diagnosticada Brucella abortus em 6,2% (16/ 257) das amostras de fetos bovinos oriundos de rebanhos, na maioria leiteiros, provenientes de vários estados do Brasil, no período de 1985 a 1992. 1.2. Objetivos Este trabalho de revisão bibliográfica tem como objetivo chamar a atenção para a necessidade do controle e erradicação da brucelose no nosso país, para que não ocorram prejuízos econômicos nas propriedades rurais, impedimentos às exportações, custos com programas de prevenção e a transmissão da doença para o ser humano. Com o avanço da pecuária nacional, buscando-se cada vez melhores índices através de novas técnicas para aumentar a produtividade, visando-se inclusive aumentar as exportações de alimentos; não podemos continuar convivendo com a brucelose, colocando em risco a saúde das pessoas que ingerem leite e queijo crus, a saúde daqueles que trabalham em abatedouros, e dos próprios peões, fazendeiros e veterinários, que estão em contato direto com os animais. Esperamos que as estratégias adotadas pelo Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuberculose Animal (PNCEBT) surtam o efeito esperado. 1.3. Questões de estudo O estudo teórico foi dividido nos seguintes tópicos: aspectos epidemiológicos, patogenia, aspectos clínicos, diagnóstico, controle e erradicação. Em aspectos epidemiológicos foram abordadas as vias de infecção e disseminação da brucelose, sua transmissão vertical e horizontal, a importância como zoonose e como a doença provoca perdas econômicas na atividade pecuária. No item patogenia, estudou-se como o microorganismo age no organismo do hospedeiro, revelando seus mecanismos de invasão e sobrevivência. Em aspectos clínicos foram enfocadas a sintomatologia da doença, tanto nos machos como nas fêmeas, variando de acordo com o grau de imunidade do rebanho. Diagnóstico e controle tiveram uma abordagem focada no Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuberculose Animal (PNCEBT), confrontando com os diferentes métodos de diagnóstico, provas e testes, e com as diferentes vacinas e destinação de animais infectados. 2. CARACTERÍSTICAS DA DOENÇA 2.1. Epidemiologia Segundo PAULIN (2003), a Organização Internacional de Epizootias (OIE) classifica a brucelose como doença da lista B, onde estão incluídas as enfermidades que têm importância sócio-econômica e/ou para saúde pública e conseqüências significativas no comércio internacional de animais e seus produtos. No homem, em virtude da possibilidade de a infecção ocorrer pela ingestão do leite contaminado é necessário que este seja pasteurizado, porém, em muitos casos, a doença é ocupacional, pois acomete fazendeiros, veterinários e açougueiros. O agente etiológico pode ser isolado de vários órgãos e a manipulação de carcaças pode representar uma exposição arriscada. ( RADOSTITS et al, 1988). Para POESTER (1984), pode ocorrer a penetração do microorganismo pela pele e mucosas, especialmente a conjuntiva, ao entrar em contato com materiais infectados como fetos abortados, restos placentários, urinas, fezes e carcaças. Ocorre também a inalação de matéria seca de origem animal em instalações como matadouros, veículos que transportam animais e laboratórios. ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD (1986); OFFICE INTERNACIONAL DES DE EPIZONTIES (1987); GARCÍA-CARRILLO(1990); e SECRETARIA DE AGRICULTURA, GANADEIRA Y DESARROLLO RURAL (1995), segundo PAULIN (2003), colocam a brucelose como responsável pela diminuição da produção de carne entre 10 e 15%, dilatação do intervalo entre partos de 11,5 para 20 meses, aumento de 30% na taxa de reposição dos animais, queda de 15% no nascimento de bezerros e queda de 10 a 24% na produção leiteira Ocorre também perda de prestígio para as propriedades acometidas pela doença. O caráter zoonótico da doença também acarreta perdas, na maioria das vezes relacionadas ao custo do tratamento humano e ao período de ausência no trabalho durante a convalescença ( PAULIN, 2003). Com a introdução de fêmea prenhe infectada em um rebanho, sendo esta fonte de infecção mais importante, a doença se difunde rapidamente, produzindo perdas acentuadas por abortos que variam de 50% a 100%, infertilidade temporária ou permanente e baixa produção de leite (POESTER, 1984). ACKERMANN et al (1988), KO & SPLITTER (2003) e SILVA et al (2005), consideram ser o trato gastrintestinal a via mais comum de infecção. Segundo RADOSTITS et al (1988), a doença pode ser ainda transmitida pela penetração na pele e conjuntivas intactas e a pela contaminação do útero durante a ordenha. A inalação é descrita como importante fonte de infecção por KO & SPLITTER (2003) e SILVA et al (2005). A B. abortus alcança sua maior concentração no conteúdo do útero grávido, no feto e nas membranas fetais, que são as maiores fontes de infecção. Os pastos, os cochos de alimentos e a água contaminados, são os principais meios de disseminação da doença.( RADOSTITS et al, 1988). O aborto é a fonte mais comum de contágio, mas fêmeas que não abortam produzem crias fracas, junto com as quais são eliminadas brucelas suficientes para manter a infecção no rebanho. As bactérias são encontradas no exsudato vaginal por até seis semanas após o parto ou aborto (POESTER, 1984). Para RADOSTITS et al (1988), a transmissão horizontal se dá geralmente pela contaminação direta. Outras fontes como moscas, cães, ratos, carrapatos, botas infectadas, forragens, e outros objetos inanimados, não são consideradas importantes como medidas de controle, apesar da possibilidade de introdução da doença. Ele ressalta ainda a disseminação da infecção por contato da cauda contaminada com a conjuntiva ou com a pele intacta de outro animal, e também a disseminação durante a ordenha. Esta tem pouca importância para o aborto, mas não no teste de aglutinação do leite e consumo humano. BATHKE (1988); ACHA & SZYFRES (1986), segundo PAULIN (2003), dizem que no leite, a eliminação do agente começa cerca de duas semanas após o parto ou abortamento e pode persistir durante meses. Embora haja risco de transmissão venérea da brucelose do touro para a vaca através da monta natural, considera-se que seja baixo e pouco importante devido às barreiras existentes na mucosa vaginal. Já na inseminação artificial, o sêmen é depositado diretamente no útero, ocorrendo transmissão da doença. (ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD, 1986, segundo PAULIN, 2003). A capacidade de sobrevivência da Brucella em condições naturais é grande se comparada a de outras bactérias patogênicas não esporuladas, sobretudo, em ambiente úmido ao abrigo da luz solar direta, pH neutro e em ambiente contendo matéria orgânica (ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD, 1986, segundo PAULIN, 2003). Geralmente, a remoção dos animais infectados, a limpeza e a desinfecção de locais contaminados (eliminar toda matéria orgânica antes da aplicação dos produtos é essencial para que atinjam sua total eficácia) e o vazio sanitário de no mínimo dois meses são suficientes para evitar a sua transmissão (GRASSO-PAULIN, 2000; PAULIN, 2003). As vacas são mais susceptíveis à doença, sobretudo, quando prenhes e quase todas permanecerão cronicamente infectadas, com o agente presente no útero e linfonodos (BISHOP et al., 1994, segundo PAULIN, 2003). Vacas não gestantes expostas a pequenas quantidades de brucelas podem desenvolver a condição de portadoras assintomáticas. Filhos de vacas brucélicas se infectam durante a gestação, com a Brucellas persistindo em seus pulmões e linfonodos regionais, ou ao ingerirem leite contaminado, podendo albergar o agente nos linfonodos que drenam o trato gastrointestinal, e excretar brucelas nas fezes (ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD, 1986, segundo PAULIN, 2003). Entretanto, após seis a oito semanas sem ingerirem o leite tornam-se livres, pois até os seis meses de idade os bezerros são pouco susceptíveis à infecção e geralmente infectam-se de forma transitória (ACHA & SZYFRES, 1986, segundo PAULIN, 2003). 2.2. Patogenia Com a penetração do microrganismo no trato gastrointestinal, ocorre a endocitose pelas células epiteliais do intestino delgado, particularmente as células M das placas de Peyer, alojando-se nos linfonodos regionais onde se proliferam dentro dos fagócitos (ACKERMANN et al, 1988; ANDERSON et al, 1986a , segundo SILVA et al, 2005). Após esta multiplicação inicial, ganham a corrente sangüínea por meio do duto torácico, dentro dos macrófagos ou livres no plasma. Vários períodos de bacteremia podem ocorrer. A partir da circulação, difundem-se para os tecidos do hospedeiro, colonizando principalmente órgãos ricos em células do sistema mononuclear fagocitário, quais sejam, baço, fígado e linfonodos (principalmente os supra mamários), onde podem acarretar alterações inflamatórias e anátomopatológicas caracterizadas por granulomas difusos levando à esplenomegalia, hepatomegalia e, às vezes, hiperplasia linfóide (BISHOP et al., 1994, segundo PAULIN, 2003). Os órgãos de predileção são aqueles em que há maior disponibilidade de elementos necessários para seu metabolismo, como o eritritol ou eritrol (álcool polihídrico de quatro carbonos), que está presente no útero gravídico, tecidos mamários e ósteo articulares e órgãos do sistema reprodutor masculino (CARTER, 1991, segundo PAULIN, 2003). Para SAMARTINO & ENRIGHT (1993), segundo SILVA et al (2005), essa afinidade da B. abortus por estes tecidos se dá pela presença de elevadas concentrações de eritrol e também de progesterona na placenta. .B abortus é um dos poucos organismos com a capacidade de transformar eritrol em fonte de carbono e energia. A partir do quinto mês de gestação, a concentração do eritritol eleva-se atingindo níveis máximos próximo ao parto, estimulando a multiplicação da bactéria de forma crescente (BISHOP et al., 1994, segundo PAULIN, 2003). Na fêmea, a infecção deixa de ser latente geralmente no terço final da gestação, quando o tecido córionalantoideano está bem desenvolvido e há disponibilidade dos metabólitos. Neste período, a multiplicação da brucela é intensa e as endotoxinas liberadas após sua destruição (CARTER, 1991, segundo PAULIN, 2003) geram lesões na placenta, principalmente, no tecido córion alantoideano, levando a um processo inflamatório dos tecidos e órgãos, causando placentite necrótica dos cotilédones, resultando no seu descolamento pela lise das suas vilosidades (GRASSO-PAULIN, 2000; PAULIN, 2003). Essas lesões comprometem a circulação materno-fetal, prejudicando sua respiração e alimentação, podendo levá-lo à morte. Nos casos agudos da doença, quanto maior a necrose, maior a chance de ocorrer abortamento, único sintoma aparente na maioria das infecções brucélicas (BATHKE, 1988, segundo PAULIN, 2003). Por outro lado, quanto menos intensa a necrose maior será a deposição de fibrina e mais tardio o abortamento. Nesse caso, pode ocorrer a retenção de placenta, ou a gestação vir a termo, porém gerando produtos fracos que poderão morrer em alguns dias. O quadro pode evoluir para metrite ou endometrite crônica e conseqüente subfertilidade, infertilidade ou esterilidade (TIMONEY, 1988, segundo PAULIN, 2003), com ou sem presença de corrimento vaginal (ACHA & SZYFRES 1986; BATHKE, 1988, segundo PAULIN, 2003). RADOSTITS et al (1988) e NICOLETTI (1980), segundo SILVA et al (2005), revelaram que pode ocorrer infecção congênita em bezerros recém-nascidos, como resultado de uma infecção uterina, e persistindo em pequena quantidade de bezerros que podem apresentar resultados sorológicos negativos até que ocorra, quando novilhas, o aborto ou nascimento de bezerro infectado na primeira gestação. Essas novilhas são consideradas animais com infecção latente, e importantes na manutenção da doença no rebanho. As vacas que nunca foram cobertas e as não grávidas podem se infectar mas perdem os anticorpos humorais mais depressa do que aquelas que contraíram a enfermidade durante a prenhez. Nas adultas e não grávidas, a infecção se localiza no úbere, e se ocorrer prenhez, o útero se infecta nas fases de bacteremia periódica do úbere, sendo este clinicamente normal (RADOSTITS et al, 1988). A brucela é classificada como parasita intracelular facultativo. Contrariamente a outras bactérias patogênicas, fatores clássicos de virulência como exotoxinas, flagelos, fímbrias, cápsulas e outros não são encontrados. Os fatores envolvidos com a patogenicidade são aqueles que permitem a invasão, sobrevivência e multiplicação no interior das células do hospedeiro (GORVEL & MORENO, 2002, segundo SILVA et al, 2005). Essa localização tem provável importância para sua sobrevivência no hospedeiro, e também pode ser uma explicação para os títulos transitórios que ocorrem em alguns animais após episódios isolados de bacteremia e para a ausência de títulos em animais com infecção latente (RADOSTITS et al, 1988) . 2.3. Aspectos Clínicos NICOLETTI (1980); ADAMS (2002), segundo SILVA et al (2005), consideram que para o estabelecimento e desenvolvimento da doença dependem a idade, o estado reprodutivo, a resistência natural e o estado imunológico do animal, a via de infecção, a dose infectante e a virulência da cepa infectante. Nas fêmeas gestantes não vacinadas e altamente suscetíveis, ocorre aborto após o quinto mês de gestação. O feto geralmente nasce a termo nas gerações subseqüentes, embora possam ocorrer o segundo e terceiro abortos. A retenção de placenta e a metrite são as seqüelas comuns do aborto. A segunda é, normalmente, conseqüência de infecções mistas, e pode ser aguda, com septicemia seguida de morte, ou crônica, levando à esterilidade (RADOSTITS et al, 1988). Os fetos abortados variam em aspecto, que vai desde o sem pêlo, abortado entre o quarto e sétimo mês, até o totalmente desenvolvido e sem lesões (POESTER, 1984). No aparelho reprodutivo masculino, a brucela pode levar à reação inflamatória do tipo necrosante nas vesículas seminais, testículos e epidídimos, com aumento de seu volume uni ou bilateral, provocando subfertilidade, infertilidade ou esterilidade. Como seqüela pode haver atrofia do órgão afetado, como pode ser observado na Figura 4 (ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD, 1986, segundo PAULIN, 2003). SANTOS et al (1998) e SILVA et al (2005), revelam que a vacina B19 pode causar lesões no testículo, embora com baixa freqüência. Embora sinais como febre, anorexia e depressão, possam aparecer nas primeiras semanas de infecção, normalmente eles são inaparentes ( CAMPERO et al,1990, segundo SILVA et al , 2005). No aparelho locomotor, causa infecções articulares levando a bursites, principalmente nas articulações carpianas e tarsianas e espondilites, especialmente nas vértebras torácicas e lombares, podendo também atingir medula óssea e bainha dos tendões. (BATHKE, 1988; ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD, 1986). PARDI et al. (1956); LANGENEGGER et al (1975); MUSA et al. (1990); RIBEIRO et al. (2003), segundo FREITAS & OLIVEIRA (2005), revelaram que as bursites são lesões compatíveis com infecções localizadas causadas por brucelas em bovinos e outros animais e cujos exsudatos apresentam elevados títulos de anticorpos que, em muitos casos, são mais altos que os títulos séricos, de modo que esse tipo de lesão tem sido apontado como um referencial para o diagnóstico da brucelose em bovídeos abatidos e mesmo em outras espécies acometidas de lesões semelhantes observadas no criatório. Tem sido observada em animais jovens, provenientes de rebanhos livres vacinados com a cepa B19, uma artrite supurada progressiva e erosiva, que parece estar relacionada a uma resposta imunológica crônica contra a amostra vacinal. Os antígenos da B19 se depositariam na membrana sinovial das articulações levando a uma artrite imunomediada (BRACEWELL & CORBEL, 1980, WYN-JONES et al., 1980; segundo SILVA et al., 2005). 2.4. Diagnóstico POESTER et al (2005), revelam a importância dos testes diagnósticos: A correta identificação de animais infectados é uma das bases de um programa de controle ou de vigilância epidemiológica da brucelose bovina. Para se alcançar este objetivo são utilizados vários testes diagnósticos que, em função de suas características de sensibilidade e especificidade, de facilidade de realização, de custo e de disponibilidade, são empregados de maneira distinta nas diferentes situações epidemiológicas que se apresentam. Os diagnósticos clínico e epidemiológico, baseados nos abortos, nascimento de bezerros fracos, esterilidade de machos e fêmeas, e a história do rebanho, proporcionam a suspeita inicial da doença. Essas suspeitas precisam ser confirmadas pelas técnicas sorológicas (diagnóstico indireto) ou pelo isolamento e identificação do agente etiológico (diagnóstico direto) (POESTER et al, 2005). POESTER (1984) diz que o método sorológico é o mais usado, pela simplicidade de execução e interpretação. Utiliza-se o antígeno, que é colocado frente a fluidos orgânicos, para descobrir-se anticorpos de infecção. PAULIN (2003), considera que o sorodiagnóstico é a base do combate à brucelose em rebanhos, permitindo o monitoramento tanto de propriedades como de regiões inteiras, além de vigiar zonas de onde a doença já foi erradicada. O teste com antígeno acidificado tamponado (AAT), o teste do anel do leite (TAL), o teste de redução pelo 2-mercaptoetanol (2ME), o teste de fixação de complemento (FC), os ensaios imunoenzimáticos (iELISA- ELISA indireto; cELISA- ELISA competitivo) e o ensaio de polarização fluorescente (FPA), são exemplos de provas sorológicas, sendo que, atualmente no Brasil pelo PNCEBT, estão aprovados para diagnóstico o AAT (como teste de triagem), o TAL (para monitoramento ou vigilância sanitária), e o 2-ME e o FC (como testes confirmatórios) (POESTER et al, 2005 e BRASIL, 2004). O método de diagnóstico mais conciso e inequívoco é a identificação do agente etiológico (POESTER, 1984). POESTER et al (2005), citam como métodos de diagnóstico diretos o isolamento e identificação, a imunoistoquímica e a reação em cadeia da polimerase (PCR). TEIXEIRA, VALLE (1996); NIELSEN, EWALT (2004), segundo POESTER et al (2005), consideram o isolamento e identificação como técnica de referência para o diagnóstico da brucelose, porém, sendo um processo demorado e dependente de laboratórios especializados e com segurança biológica, pois a Brucella sp é classificada como microrganismo de nível 3 de biossegurança. O exame bacteriológico é executado a partir de espécimes suspeitos semeados em meios de cultura especiais. Depois de isolada, a brucela é identificada até gênero estudando-se suas características culturais, tintoriais, morfológicas e bioquímicas (BATHKE, et al., 1988; NIELSEN, 1995, segundo PAULIN 2003). 2.5. Controle e Erradicação O controle da brucelose pode ser feito a nível de estabelecimento, com medidas higiênicas, bom manejo dos animais e vacinação, e a nível regional ou mesmo nacional, com esquemas bem montados de vacinação e eventual eliminação de animais infectados, contribuindo grandemente para a diminuição da doença (POESTER, 1984). A sistematização de medidas sanitárias, seja em um rebanho ou uma região, estado ou país, é de grande importância para o sucesso no controle e erradicação da brucelose. O emprego de programas de vacinação sistemática dos animais jovens com vacinas vivas, tem conseguido diminuir o número de animais susceptíveis à infecção por B. abortus (LAGE et al, 2005a). A vacinação pode não eliminar a brucelose, mas pode ser utilizada como base para sua a erradicação, que requer identificação do animal infectado considerando-o como fonte de infecção, e sua eliminação do rebanho (RADOSTITS et al, 1988). SCHURIG et al, (2002), segundo LAGE et al, (2005a), colocam as vacinas vivas atenuadas, elaboradas com as amostras B19 e RB51, como sendo as mais utilizadas, na atualidade, nos programas de controle da doença. A vacinação de bezerras com a amostra B19, em todo o território nacional, está entre as ações obrigatórias do PNCEBT . Sua implantação, na maioria dos estados, já ocorria no início de 2004, com exceção de algumas partes da região norte e nordeste. O estado de Santa Catarina é uma exceção à implantação da vacinação obrigatória, em função da baixa prevalência da doença neste estado (LAGE et al, 2005b). A vacina B19 é produzida segundo normas internacionais com amostra viva (que possui maior capacidade em ativar macrófagos) da B. abortus estirpe B19. Ela é estável, não se multiplicando em presença de eritritol e causando mínimas reações locais e sistêmicas após sua inoculação (ALTON et al., 1988), segundo PAULIN (2003). ADAMS (1990), segundo PAULIN (2003), revela que o grau de proteção varia dependendo da idade da fêmea, via de aplicação, dose da vacina, dose de desafio, e que se utilizada de forma convencional, protege de 60% a 75% contra o abortamento. LAGE et al (2005a), consideram de 70-80% a redução da infecção nos animais vacinados com a B19, que quando aplicada em fêmeas próximas à puberdade, leva a formação de anticorpos que se confundem com os anticorpos de infecção nas provas sorológicas. É recomendado que a vacina seja aplicada em fêmeas com idade entre três e oito meses, não interferindo na imunidade passiva (três meses), e não interferindo no diagnóstico sorológico na fase adulta. Para animais precoces, como raças européias e raça zebu de elite, a idade para a vacinação deve ser reduzida para até seis meses. BATHKE (1988), segundo PAULIN (2003), admite que fêmeas vacinadas com a vacina B19 na idade correta estarão protegidas por um período de sete anos após a vacinação. A B19 pode ser patogênica para machos e quaisquer outras espécies incluindo o homem, devido à virulência residual que conserva. Leva os machos a permanecerem com títulos vacinais por toda vida, além de haver a possibilidade de desenvolverem orquite. A vacinação de fêmeas prenhes pode provocar abortamento, sobretudo no terço final da gestação (ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD, 1986) segundo PAULIN (2003). Em função da virulência residual e dos inúmeros relatos de infecções acidentais, principalmente entre veterinários e vacinadores, é importante a utilização de material de proteção individual, máscara, óculos, luvas e avental de manga longa, e seringa descartável durante a vacinação (LAGE et al, 2005a). A vacinação com a amostra RB51, em animais com idade superior a oito meses, foi aprovada recentemente pelo MAPA. Esta amostra não interfere no diagnóstico sorológico, pela sua característica rugosa (SCHURIG et al, 2002; POESTER et al, 2004, segundo LAGE et al, 2005b). A utilização desta vacina tem por objetivo aumentar a imunidade do rebanho, sem interferir no diagnóstico, levando a uma diminuição mais rápida das taxas de prevalência e incidência da brucelose (LAGE et al, 2005b). A RB51 não deve ser aplicada em fêmeas prenhes, apesar dos poucos relatos de abortos, nem em machos. Deve ser adotada em situações de intensificação do diagnóstico sorológico, em fases avançadas de erradicação. As medidas de segurança devem ser as mesmas adotadas para a amostra B19. (LAGE et al, 2005b). ORGANIZACION...(1986), segundo LAGE et al (2005a), nos revela que o sacrifício de animais infectados é uma das principais estratégias de controle utilizadas em países que conseguiram a erradicação da brucelose. LAGE et al (2005b) observam que, segundo as normas do PNCEBT, os animais reagentes positivos deverão ser marcados com um “P” contido em um círculo de oito centímetros de diâmetro, no lado direito da cara. Estes animais deverão ser abatidos em frigorífico sob serviço de inspeção oficial, num prazo máximo de trinta dias. 3. CONCLUSÕES A brucelose é doença que acomete o rebanho brasileiro desde a década de 30, e ainda hoje se convive com os prejuízos econômicos decorrentes. Valores como 10 a 15% para diminuição da produção de carne, intervalo entre partos em torno de 20 meses, queda de 15% no nascimento de bezerros, revela as perdas que se têm, enquanto não se consegue controlar e erradicar a doença. A Brucella sp é um parasita intracelular facultativo, e esta característica pode explicar os títulos transitórios em alguns animais e a ausência de títulos em animais com infecção latente, dificultando o diagnóstico. A vacinação de bezerras com idade entre três e oito meses, como ação obrigatória do PNCEBT, vem permitir que diminua a prevalência da doença no Brasil. Este fato já ocorreu em Minas Gerais, onde caiu para 1% a prevalência de animais infectados (LAGE et al, 2005b), provando o impacto positivo da vacinação. A padronização do diagnóstico da doença é outro passo importante, mas são necessários profissionais sérios e laboratórios idôneos, para que os animais infectados sejam, realmente, marcados com o “P” no lado direito da cara e sacrificados sob serviço de inspeção oficial. Se não tiver o ser humano íntegro, que exerce sua profissão com dignidade, continuarão sendo vistos animais descartados de suas fazendas de origem e vendidos para outros fazendeiros como animais sadios. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACKERMANN, M.R.; CHEVILLE, N.F.; DEYOE, B.L. Bovine ideal dome Iymphoepithelial cell: endocytosis and transport of Brucella obortus strain 19. Vet. Pathol., v. 25, p. 28-35, 1988. BRASIL. Secretaria de Defesa Agropecuária, Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento. Instrução Norminativa N° 6 de 8 de janeiro de 2004. 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