Plantas hemiparasitas usam mais água que suas hospedeiras?
Caroline Côrrea Nóbrega, Claudia Pandolfo Paz, Diogo Borges Provete, Felipe Cito Nettesheim, Oswaldo
Cruz Neto
disponibilidade dela no substrato, as
Introdução
Parasitas são organismos que
plantas enraizadas no solo devem evitar
obtém seus recursos de um organismo
a
hospedeiro podendo causar danos e
fechando os estômatos (Tyree 2007). O
eventualmente a morte deste hospedeiro
mecanismo de controle estomático pode
(Begon et al. 2006). Plantas são
evitar o embolismo e aumentar a chance
organismos comumente parasitados por
de sobrevivência do indivíduo. Porém,
outros organismos, tais como moscas e
presumivelmente plantas hemiparasitas
vespas minadoras que causam lesões
não necessitam de um controle para
nas folhas e diminuem a sua área
evitar a perda de água, já que germinam
fotossintetizante, ou fungos e bactérias
sobre os ramos da hospedeira e estão
que podem ter uma alta taxa de
conectadas ao seu xilema (Schulze &
crescimento populacional dentro do
Ehleringer 1984; Davidson & Pate
hospedeiro
que
1992). Assim, plantas hemiparasitas
podem ser fatais. No entanto, plantas
poderiam apresentar altas taxas de
também podem parasitar outras plantas.
fotossíntese,
Um dos tipos de parasitismo por plantas
fariam um uso mais conservativo da
é o realizado pelas hemiparasitas que,
água.
causando
doenças
perda
excessiva
desse
enquanto
recurso
hospedeiras
apesar de fazerem fotossíntese, utilizam
Uma forma de inferir sobre o
uma planta hospedeira para absorver a
uso de recursos hídricos por plantas é
água e os nutrientes diretamente do
medir a taxa de transpiração. A taxa de
xilema da planta parasitada (Lambers et
transpiração
al. 2008).
inevitável da fotossíntese, porque a água
Plantas
hemiparasitas
é
uma
consequência
podem
é perdida para a atmosfera enquanto os
apresentar diferentes estratégias de uso
estômatos estão abertos para absorver o
dos recursos em relação às suas
CO2 (Field et al. 1989). Apesar de a
hospedeiras. Quando a demanda de
transpiração ser um processo passivo
água pela atmosfera é maior que a
acionado
pela
diferença
na
1 disponibilidade
de
água
(potencial
recipiente com água e os mantivemos
hídrico) entre solo e atmosfera, ela pode
submersos.
ser controlada ativamente pela planta
Para
medir
a
taxa
de
com o uso de hormônios que sinalizam
transpiração das hemiparasitas e de suas
a abertura e fechamento dos estômatos
hospedeiras, montamos um experimento
(Tyree 2007). Nosso objetivo foi testar
com os ramos acondicionados dentro de
se de fato existe diferença no uso de
sacos plásticos vedados contendo água.
recursos hídricos entre hemiparasita e
Pesamos os ramos junto com os sacos
hospedeira. Nossa hipótese é que a
com água a cada 20 min entre 11h10 e
planta
um
12h50. Como a saída de água dos sacos
mecanismo mais conservativo para
vedados pode ocorrer apenas com a
evitar perda de água em relação à planta
transpiração realizada
hemiparasita.
Consequentemente,
diferenças de peso dos sacos com os
esperamos que a taxa de transpiração da
ramos entre os intervalos de tempo
espécie hemiparasita seja maior que a
devem representar a transpiração dos
taxa de transpiração da hospedeira.
ramos. Dividimos o peso perdido pelos
hospedeira
utilizaria
pelas
folhas,
sacos com os ramos pela área foliar de
cada ramo para controlar o efeito das do
Métodos
no
tamanho das folhas sobre o fluxo de
Parque Nacional do Arquipélago de
água. Calculamos a taxa de transpiração
Anavilhanas, localizado no curso médio
como de cada ramo como (peso/área
do Rio Negro (02ο 47’ S, 60ο 48’O),
foliar)/tempo. Como a planta hospedeira
Amazonas. Amostramos ramos de cinco
possui folhas compostas e a planta
exemplares de uma espécie de planta
hemiparasita possui folhas simples,
hospedeira (Fabaceae: Mimosoideae) e
tivemos que adotar formas diferentes
outros cinco ramos de Phthirusa sp.
para calcular a área foliar de cada
(Loranthaceae),
planta
espécie. Calculamos a área foliar da
hemiparasita que cresce sobre os ramos
planta hospedeira pela média da área de
das hospedeiras nas áreas de igapó. Para
cinco folíolos escolhidos aleatoriamente
minimizar a entrada de ar nos vasos de
multiplicada pelo número total de
xilema, coletamos os ramos, cortamos a
folíolos do ramo. Calculamos a área
sua
foliar da hemiparasita pela soma da área
Realizamos
este
espécie
extremidade
dentro
estudo
de
de
um
2 elíptica de todas as folhas dos ramos
apresentaram um aumento contínuo nas
utilizados no experimento.
taxas de transpiração no final da manhã,
Durante
o
período
do
atingindo valores máximos às 12h10,
experimento, medimos a temperatura e
um
a umidade relativa do ar no mesmo
evaporativa. Nas plantas hospedeiras,
momento da pesagem dos ramos. Para
conforme a demanda evaporativa da
estimar a demanda de água na atmosfera
atmosfera
no
transpiração diminuíram. Neste horário,
momento
do
experimento
e
período
de
grande
aumentou,
das
uma
transpirar em média 4,84 vezes mais
aproximação do Déficit de Pressão de
que sua hospedeira. Após esse horário, a
Vapor (DPV) dividindo a umidade pela
demanda
temperatura medidas a cada 20 min.
diminuiu gradativamente, a taxa de
Quanto maior esta razão, menor deverá
transpiração das plantas hospedeiras
ser o DVP.
aumentou e a das hemiparasitas se
evaporativa
da
chegou
de
a
calculamos
hemiparasita
taxas
relacionar com a taxa de transpiração
plantas,
planta
as
demanda
a
atmosfera
tornou menor. Durante todo o período
Resultados
de estudo, a variação na taxa de
A taxa de transpiração das
transpiração foi maior nas amostras de
plantas hemiparasitas foi maior que da
hemiparasitas que nas amostras de
hospedeira durante todo o período de
hospedeiras.
estudo (Figura 1). Plantas hemiparasitas
Figura 1. Variação nas taxas de transpiração de plantas hospedeiras e hemiparasitas (eixo y da esquerda),
com relação à demanda evaporativa da atmosfera – DPV (eixo y da direita) em uma área de Igapó no
Parque Nacional Arquipélago de Anavilhanas. Barras verticais representam o erro padrão.
3 raízes inundadas e submetidas à falta de
Discussão
Em ambientes com limitada
oxigênio, como é o caso do ambiente
disponibilidade de água em pelo menos
estudado (Worbes 1986), a conservação
uma época do ano, o sucesso adaptativo
da água deve ser uma estratégia
de muitas plantas pode estar relacionado
favorecida. Paradoxalmente ao excesso
à
a
de água do ambiente, as plantas vivem
a
uma situação de estresse hídrico uma
uma
vez que a atividade das raízes é
possível estratégia está relacionada ao
reduzida. Nessas situações, a respiração
fenômeno conhecido como depressão
nas raízes cessa e consequentemente a
do meio-dia. De acordo com esse
entrada de água não ocorre (Meyer
processo muitas espécies fecham seus
1991). Assim, é possível que estas
estômatos no período de maior demanda
plantas reduzam a perda de água
evaporativa
também com o fechamento estomático.
capacidade
de
fotossíntese,
maximizar
minimizando
transpiração.
Nesse
da
normalmente
contexto,
atmosfera,
ocorre
qual
meio-dia
Plantas hemiparasitas, por outro
(Lambers et al. 2008). Nesses casos,
lado, não apresentaram evidências de
picos de transpiração predominariam no
controle da transpiração. O fato de a
fim da manhã e fim da tarde, com
transpiração ter aumentado à medida
fechamento estomático próximo ao
que cresceu a demanda evaporativa da
meio-dia e conseqüente diminuição da
atmosfera, indica que as folhas de
transpiração e atividade fotossintética.
hemiparasitas
Por outro lado, plantas com suprimento
dependentes da pressão de vapor da
de água adequado, como no caso das
atmosfera.
hemiparasitas, apresentam um pico de
reforça esta possibilidade refere-se a
transpiração
maior
ao
consequentemente,
ao
o
meio
dia
maiores
e
taxas
fotossintéticas.
Outra
variação
mais
constatação
entre
amostras
que
de
hemiparasitas que de hospedeiras, o que
indica que hemiparasitas foram mais
A menor taxa de transpiração
encontrada
estavam
nas
hospedeiras,
dependentes das variações atmosféricas
momentâneas.
Como
plantas
independente do horário analisado, deve
hospedeiras regulam ativamente a perda
ser resultado de uma estratégia de uso
de água, isto deve implicar em menores
mais conservativo da água. Em espécies
variações
de
transpiração
quando
vegetais que periodicamente têm suas
4 submetidas a mudanças na demanda
trabalho,
evaporativa da atmosfera.
positivamente. E ao Helder Espirito-
O
fato
apresentarem
de
hemiparasitas
menores
taxas
de
transpiração e maior variância entre
Santo
e
sempre
ao
contribuindo
Marcelo
que
deram
sugestões valiosas para melhorar a
qualidade do manuscrito.
amostras indica a existência de uma
estratégia distinta da hospedeira, quanto
Referências
ao uso de água. Porém, se a alta taxa de
Begon, M., C.R. Townsend & J.L.
transpiração da hemiparasita prejudica a
Harper.
planta hospedeira a ponto de influenciar
individuals to ecosystems. Oxford:
seu sucesso reprodutivo, é possível que
Blackwell Publishing.
existam outros mecanismos de proteção
da
planta
hospedeira
Ecology:
from
Davidson, N.J. & J.S. Pate. 1992. Water
a
relations of the mistletoe Amyema
hemiparasita. Assim, futuros trabalhos
fitzgeraldii and its host Acacia
poderiam avaliar adaptações nas plantas
acuminata.
hospedeiras
Experimental
que
minimizariam
a
hemiparasitas
e/ou
contra
2006.
potencialmente
germinação
Botany,
of
43:1459-
1555.
a
Field, C.B., T. Ball & J.A. Berry. 1989.
quantidade de água absorvida do xilema
Photosynthesis: principles and field
das
techniques. In: Plant physiological
hemiparasitas.
reduziriam
das
Journal
Em
particular,
avaliar a taxa de transpiração das
ecology:
hemiparasitas e de suas hospedeiras
instrumentation (Pearcy, R.W., J.R.
quando elas estão conectadas pode
Ehleringer, H.A. Mooney & P.W.
revelar se plantas hospedeiras possuem
Rundel, eds.). London: Chapman
algum tipo de controle de saída de água
and Hall.
para a suas parasitas.
field
methods
and
Lambers, H., F.S. Chapin & T.L. Pons.
2008. Plant physiological ecology.
Agradecimentos
New York: Springer.
Meyer, U. 1991. Feinwurzelsysteme
Agradecemos muito a Rafael
und
Mykorrhizatypen
als
Oliveira pela orientação e apoio nesse
Anpassungsmechanismen
in
trabalho. Ao Paulinho Enrique que
zentralamazonischen
U¨
acompanhou o desenvolvimento do
berschwemmungswa¨ldern,
igapó
5 und várzea. Ph.D. thesis, University
of Hohenheim.
Watling, J.R. & M.C. Press. 2001.
Schulze, E.D. & J.R. Ehleringer. 1984.
Impacts of infection by parasitic
The effect of nitrogen supply on
angiosperms
growth and water-use efficiency of
photosynthesis.
xylem tapping mistletoes. Planta,
3:244-250.
162: 268-275.
host
Plant
Biology,
Worbes, M. 1986. Lebensbedingungen
Tyree, M. T. 2007. Water relation and
hydraulic
on
architecture.
In:
und
Holzwachstum
zentralamazonischen
in
U¨
Functional plant ecology (Pugnaire,
berschwemmungswa¨ldern. Scripta
F. I. & Valladares, F., eds). Boca
geobotanica
Raton:
Geobotanik
CRC
Press
17,
der
Lehrstuhl
fu¨r
Universita¨t
Go¨ttingen. 83 pp.
6 
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