A medalha Edília Coelho Garcia que hoje me é conferida, pelo Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Rio de Janeiro tem um significado maior, pelo nome que a enobrece, pelas mãos que me conferem e pela plateia que me distingue. Ao ilustre professor Victor Nótrica, agradeço sensibilizada a indicação de meu nome para ser a primeira a recebê-la. À Diretoria do SINEPE-Rio que o acolheu, por unanimidade, meu melhor agradecimento. É, certamente, com grande emoção e uma honra maior que recebo, nesta manhã de outubro de 2013, a Medalha Edília Coelho Garcia, que faz reviver a admirável educadora, mulher e amiga, que nos deixou em 14 de janeiro de 2012. 1 De modo geral, o agraciado, ao agradecer, conta resumidamente sua trajetória profissional, para que todos conheçam sua caminhada e possam avaliar a justiça da homenagem. Assim procedi, todas as vezes, ao receber medalhas, condecorações, títulos e homenagens. Desta vez, entretanto, não falarei sobre o que fiz ao longo de mais de 60 anos de trabalho pela educação e pela inclusão social dos desfavorecidos. Optei por falar sobre a educadora e a amiga, a quem, me ligou, desde 1965 uma amizade fraternal e que só se tornou mais forte nos 48 anos em que dividimos ideias, ideais, opiniões, fazeres, amizade. Eu a conheci em 1965. Lembro-me como se fosse hoje. Eu acabara de assumir a Secretaria de Educação e Cultura da Guanabara, no Governo Carlos Lacerda e, 2 concomitantemente, a Presidência do Conselho Estadual de Educação. Dias depois de assumir a Secretaria, com a difícil missão de dar continuidade ao magnífico trabalho realizado pelo Professor Carlos Otávio Flexa Ribeiro, fui fazer uma visita ao Conselho de Educação, que funcionava no mesmo prédio da Secretaria – na Avenida Erasmo Braga, 118. Padre Alonso, Vice-Presidente do Conselho, em Exercício apresentou-me aos Conselheiros. Conhecia alguns. Outros – conheci, pessoalmente, naquela tarde. Dentre estes, uma renomada educadora, proprietária do Colégio Brasileiro de Almeida. Seu nome: Edília Coelho Garcia. Muito moça, apoiva-se numa bengala, por grave problema de coluna. Seu belo rosto, iluminado por expressivos olhos azuis demosntrava 3 alegria, segurança, amor pela vida e pela missão de educar. As dores físicas não conseguiam, desde então; afetar seu bom humor e a alegria que irradiava e que a acompanharia sempre. Esta primeira impressão de uma corajosa criatura; de uma mulher em paz com a vida e com o que ela já lhe concedera; de uma pessoa transparente, que dizia o que pensava, educadamente, mas sem rodeios; de uma educadora que não se desviava um instante sequer do compromisso assumido com a arte de educar e com a defesa de uma educação de qualidade para todos, fosse oferecida por uma escola pública ou particular, impressões que eu vislumbrei num curto espaço de tempo e com a troca de algumas palavras, acompanharam nossa relação de amizade, 4 que se tornava a cada ano, mais próxima, mais forte, não só pela coerência de nossas posições em relação à educação, mas que envolveu nossas famílias e que se tornaria eterna. Foram quarenta e oito anos de convivência profissional e pessoal. Somamos nossas experiências em vários momentos, pertencendo aos mesmos Colegiados, às mesmas Academias de Educação, aos mesmos Grupos de Trabalho, à Associação Brasileira de Educação. Nunca disputamos espaços. No meio educacional havia lugar para nós duas e para muitos outros educadores, muitos deles nossos amigos comuns. Nunca divergimos. Defendíamos as mesmas causas, alimentávamos os mesmo sonhos. 5 Algo muito forte nos aproximou e nos uniu para sempre: o amor pela educação, o compromisso em oferecer o melhor de nós duas para a educação brasileira, sobretudo para a educação básica, por entendermos que ali estava o passo decisivo para uma exitosa escolaridade. Além desta afinidade profissional, a afinidade pessoal, fortalecida pelo envolvimento de nossas famílias, foi cimento sentimental que tornou indestrutível a amizade fraternal que tecemos e que alimentamos por quase meio século, sem qualquer divergência, sem qualquer estremecimento. Acompanhamos o crescimento de nossos filhos, vibramos com suas conquistas, sofremos som suas decepções. Fomos depositárias fiéis e discretas dos momentos difíceis que atravessamos, certas da 6 compreensão, do apoio e da palavra amiga que receberíamos. Dividimos momentos de intensa alegria, quer na área profissional, quer na área pessoal. Estivemos lado a lado. Na alegria e na dor. Fomos amigas pessoais e aliadas profissionais. Tive o privilégio de assistir, com intensa alegria o sucesso de sua vida de educadora, e de acompanhar com o coração partido sua força de vontade invulgar para reconquistar, com coragem e tenacidade, o que um primeiro acidente vascular lhe arrebatara: a fala e a possibilidade de escrever. Reaprendeu a falar, com auxílio de uma fonoaudióloga e, evidentemente por sua determinação em fazê-lo. Aprendeu a escrever, fazendo cópias intermináveis, exercitando-se em cadernos pautados, até dominar, novamente, a técnica de 7 escrever. Não escondeu de ninguém este aprendizado. Ao contrário, permitiu que os mais próximos acompanhassem a evolução de suas conquistas. Quando foi obrigada a parar de trabalhar, continuou ativa, aprendeu a pintar, presenteando seus amigos e seus netos com peças que fazia, desde as iniciais até as últimas, que já não apresentavam qualquer senão. Continuou interessada pelas questões educacionais, mantendo-se atualizada pela leitura e pela participação em reuniões. Começou a escrever um livro sobre educação. Contou-me um dia, com o entusiasmo de sempre, sublinhado pelo brilho de seus belos olhos azuis, a estrutura do livro. Escolhera algumas figuras que considerava emblemáticas, na educação, e estava 8 escrevendo sobre o que haviam realizado. Não sei até onde conseguiu chegar. Mesmo com a limitação notória que a levou a uma cadeira de rodas, esteve sempre presente, nas reuniões promovidas pela Academia Brasileira de Educação, nos eventos da Casa de Arte e Cultura Julieta de Serpa, nas festas do jornal Folha Dirigida; nas reuniões da Associação Brasileira de Educação; nos almoços de confraternização. Mas não só, nesses momentos de alegria, reflexão, cultura, debates, homenagens. Também esteve sempre presente, ao lado de seus amigos, na cadeira de rodas, ou amparada por bengalas nos momentos dolorosos de doença, e trágicos, de perdas irreparéveis. Edília Coelho Garcia foi um ser humano iluminado e uma educadora admirável. Tinha brilho 9 próprio. A luz que a iluminava não se apagou. Certamente, ao desaparecer, fulgiu uma estrela a mais na imensidão dos céus, iluminando os rumos da educação brasileira e a vida daqueles que faziam parte de sua constelação terrena. Agora, aquela luz reflete-se na efígie da Medalha Edília Coelho Garcia. É com profunda saudade da grande amiga, com o coração em alvoroço, a alma engalanada pela alegria e a fala embargada pela emoção que agradeço, mais uma vez ao Professor Victor Nótrica, à direção do SINEPE, aos amigos aqui presentes e a todos que prestigiam esse momento inesquecível de minha vida, pelo privilégio de sentir junto ao meu peito o nome e a imagem de Edília Coelho Garcia, pulsando junto ao meu coração como no tempo que a tinha a meu lado. 10