Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Programa da disciplina de Geomorfologia Litoral
I - Introdução
1 - Enquadramento da disciplina
Na reestruturação do curso de Geografia aprovada durante o ano lectivo de 2000/2001 apenas as
disciplinas do 1º e 2º ano são consideradas obrigatórias.
A partir do 3º ano todas elas apresentam um carácter opcional. Significa, portanto, que as
disciplinas que correspondam a algum aprofundamento de conhecimentos caem todas,
necessariamente, na categoria de disciplinas opcionais. É exactamente nesta categoria que se
inscreve a disciplina de Geomorfologia do Litoral.
Sendo uma disciplina de opção, a leccionar a estudantes do 3º e 4º anos, pressupõe já alguns
conhecimentos de base, apreendidos nas disciplinas de Introdução à Geomorfologia,
Geomorfologia e Geografia Física de Portugal.
Mesmo sendo de carácter elementar ser-nos-á necessário fazer apelo aos conhecimentos obtidos
nessas disciplinas, já que, sendo esta, também, uma disciplina semestral – como são todas as do
actual curriculum – não poderemos dispor de mais do que 15 aulas teóricas e 15 aulas práticas de
2 horas cada, o que implica uma economia de tempo que não se compadece com um programa
em que se repitam as matérias dadas noutras disciplinas.
O apelo aos conhecimentos anteriormente adquiridos terá que estar sempre presente – até para
permitir a concatenação com matérias já ensinadas e a comparação dos conceitos apresentados
pelos diferentes docentes de modo a que os estudantes possam verificar que, embora com
diferentes perspectivas, as ideias de base dos diferentes professores são coerentes entre si.
2 - As lições extraídas de experiência(s) prévia(s) e a selecção das matérias a desenvolver
Desde há vários anos que temos leccionado uma cadeira de Seminário a que chamámos primeiro
de Seminário em Geografia Física-Geomorfologia e depois de Seminário em Geografia Física Geomorfologia Litoral.
Trata-se de uma disciplina anual que vai manter-se até ao ano lectivo de 2003-2004 e se
extinguirá em 2004-2005, quando os estudantes entrados em 2001-2002 atingirem o 4º ano.
Como é natural, esta disciplina é escolhida sobretudo pelos estudantes com afinidades pela área
de Geografia Física,
Como é de esperar numa disciplina de Seminário, temo-nos esforçado para que ela tenha uma
forte incidência no trabalho de campo e permita uma iniciação às técnicas da sedimentologia e
uma utilização intensiva dos computadores (escrita do relatório, cartografia, utilização de folhas
de cálculo, pesquisas na Internet), de molde a que esta disciplina, além de corresponder a uma
espécie de fecho da abóbada do curso e a uma verdadeira iniciação à investigação, possa dotar os
estudantes de diversas ferramentas de trabalho que lhes serão muito úteis na sua vida
profissional.
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Apesar da nossa experiência docente no Seminário de Geomorfologia litoral, desconhecemos
como poderá funcionar uma disciplina semestral em que os estudantes podem ser quer do
terceiro quer do quarto ano e que não poderá ter carácter de Seminário. A redução do tempo
lectivo implica, necessariamente, algumas limitações na amplitude das matérias a tratar e mesmo
no aprofundamento da mesma. Porém, esses condicionalismos, que não ignoramos, só deverão
ser perfeitamente equacionados quando a disciplina for efectivamente leccionada no âmbito
semestral.
Será naturalmente a prática pedagógica a decidir quais os temas a aprofundar e quais aqueles que
poderão ser tratados de forma mais ligeira sem consequências negativas para a aprendizagem dos
estudantes. Neste momento, em vez de um programa demasiado ambicioso, parece-nos mais
correcto focar aqueles temas que reputamos como essenciais. Sabemos que essa escolha é
necessariamente pessoal. Porém, como nos interessa, muito mais do que transmitir
conhecimentos, transmitir metodologias de análise e atitudes relativamente ao estudo do litoral,
parece-nos que as matérias a desenvolver devem ser escolhidas pela sua capacidade de gerar
essas atitudes e de estimular a aprendizagem das metodologias de análise acima referidas.
A importância das heranças na fisionomia actual dos nossos litorais faz-nos pensar que será útil
que os estudantes desenvolvam um pouco mais este tema numa outra disciplina intitulada
Geomorfologia do Quaternário.
Essas matérias faziam parte integrante do Seminário em Geografia Física-Geomorfologia Litoral,
mas o carácter semestral desta nova disciplina não deverá permitir a sua abordagem de forma
aprofundada. Quanto muito poderá ser apresentada a problemática da evolução dos litorais
durante o Quaternário de molde a que essa apresentação sirva de incentivo a que os estudantes
venham a optar por essa disciplina, onde serão tratados temas tais como as variações climáticas e
eustáticas durante o Quaternário que condicionam fortemente a fisionomia actual dos nossos
litorais.
3 – Motivações e objectivos
Nas diversas versões do Seminário que temos leccionado desde1991 temos sempre privilegiado o
estudo do litoral. Com efeito, além do know how que fomos adquirindo sobre os temas ligados ao
litoral, o que facilita, naturalmente, a criação do gosto pela investigação nas mesmas áreas entre
os alunos, o carácter de faixa de contacto que é apanágio do litoral permite uma análise em que
as interacções têm uma importância acrescida, e nessa conformidade permite desenvolver nos
estudantes a compreensão da complexidade dos fenómenos naturais e da sua articulação com as
influências antrópicas. Por isso, além dos aspectos puramente naturais, não esquecemos uma
atenção particular aos aspectos relacionados com o ordenamento do litoral.
Num país em que o processo de litoralização e uma excessiva pressão turística sobre o litoral está
a destruir um dos nossos mais importantes recursos naturais, parece-nos oportuno divulgar a
ideia de que a falta de respeito pelos valores naturais do litoral se arrisca a “matar a galinha dos
ovos de ouro”, convertendo o nosso litoral numa faixa desinteressantemente betonizada, igual a
tantas outras, e só atractiva para um turismo de massas cada vez mais predatório e sem os
resultados económicos que se esperavam e que os investidores desejariam.
Julgamos que a divulgação desta mensagem entre os futuros quadros e os futuros professores é
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um objectivo estratégico já que a sua futura situação profissional lhes permitirá ter um papel
activo na definição das políticas de ordenamento ou na divulgação de ideias no seio das novas
gerações.
4 - O grau de aprofundamento das matérias e a organização dos temas
Como já foi dito acima, uma das nossa principais dificuldades na elaboração deste texto tem a
ver com o facto de a disciplina em questão nunca ter sido dada com o carácter de disciplina
semestral e simultaneamente para estudantes do 3º e 4º ano.
Temos consciência de que o programa proposto poderá vir a revelar-se demasiado ambicioso.
Nesse caso, tentaremos cortar um pouco no aprofundamento das matérias, mas parece-nos
fundamental tocar os vários pontos focados que correspondem, como seriação de temas, a uma
espécie de programa “mínimo”. Isso parece-nos fundamental porque, dada a complexidade das
interacções que se desenvolvem no litoral, se algum destes elementos for completamente
esquecido, os estudantes terão uma visão parcial incompleta, e algo falseadora da realidade.
Chamamos a cada um dos temas “aula”. Com isto queremos dizer que seria o ideal conseguir
fazer a respectiva apresentação numa aula teórica de 2 horas. Todavia, há que contar com a
hipótese de certas matérias colocarem um maior número de problemas aos estudantes e, desta
forma, o esclarecimento das dúvidas poderá implicar uma extensão do tema para uma outra
aula… ou um encurtamento do tempo destinado à aula prática.
5 - O processo de ensino e de aprendizagem e o carácter deste relatório
Temos consciência do carácter por vezes muito técnico das matérias a leccionar. Para ultrapassar
a dificuldade que a maior parte do estudantes tem na compreensão de conceitos e fórmulas
matemáticas, utilizaremos sempre que possível imagens elucidativas. Por isso, este texto se
parece, quiçá demasiado, com uma colectânea de imagens. Pretendemos, com efeito, que, além
de constituir parte de umas provas académicas, este texto funcione como um apoio para os
estudantes e como um embrião - quem sabe? – de um futuro manual.
A escolha deste modo de apresentação, decerto pouco usual, em que a um texto sintético se
segue um álbum de imagens extraídas de diversas fontes, carece de alguma justificação.
Acreditamos que o principal método de investigação na Geomorfologia é, ainda, a observação.
Não só uma observação directa da natureza, mas também uma observação feita através de cartas
e outros documentos pertinentes. Quanto às paisagens litorais, a observação “in loco” seria o
ideal… mas todos sabemos que é improvável conseguir fazer-se mais do que as 3 saídas de
campo que nos propomos realizar. Por isso fizemos apelo a toda a documentação de que
dispúnhamos, digitalizando tudo o que era pertinente e ainda não estava em formato digital.
Utilizámos, também, buscas na Internet, sobretudo no Google (www.google.com). Este site
permite fazer pesquisa de imagens e estamos convencidos de que algumas das imagens
encontradas representam um real enriquecimento deste texto. Além disso, permitem mostrar aos
estudantes que não devem desprezar nenhum meio para obter a informação de que necessitam. A
única ressalva é que devem utilizar toda a informação com um sentido crítico, discutindo e
citando as fontes.
É nossa intenção despertar nos estudantes o desejo de aprofundar as matérias da disciplina ou até
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de avançar por outros temas que lhes interessem e que não tenham sido tratados na nossa
abordagem como docente da disciplina.
6 - Formação versus informação: a importância de transmitir atitudes
Temos plena consciência de que não interessa apenas ensinar matérias aos alunos. Se o papel dos
professores se limitar a tentar transmitir conhecimentos, por muito bem que esse ensino seja
feito, arriscamo-nos a que os estudantes não interiorizem a matéria e não a assimilem – isto é não a transformem numa parte deles mesmos.
Para que isso aconteça é necessário tranformar a informação em conhecimento. Conhecimento
que permita agir, que possa ser aplicado em situações diferentes da situação original.
Por isso, o Professor é importante para transmitir uma atitude perante a Vida e perante a Ciência.
Os grandes Mestres são efectivamente aqueles que têm o dom de transmitir uma atitude de
perpétua curiosidade e de perpétua procura, mas também um método de trabalho que permite que
cada um se vá aproximando, não da Verdade absoluta, que é por definição inatingível, mas de
uma verdade que seja a sua.
Interessa, portanto, que os estudantes tenham uma atitude activa, interrogativa, curiosa em
relação às matérias leccionadas. É por isso que lhes propomos o estudo de temas laterais ou o
aprofundamento de temas dados durante as aulas – para desenvolver, justamente, essa
curiosidade e a capacidade de pesquisa, sem a qual a Universidade não cumpre o seu papel.
Naturalmente que se coloca aqui a questão da informação versus conhecimento. Nos tempos
correntes, em que todos somos submergidos por quantidades imensas de informação, há que
guiar os estudantes e ajudá-los a criar as estruturas mentais que permitam organizar a informação
num todo minimamente coerente e que faça sentido, num esquema aberto que se vai
enriquecendo à medida que se vão adquirindo novas informações.
Justamente, nesta época em que o papel dos professores está posto em causa, já que eles
dificilmente podem competir com a atractividade de outros meios de divulgação tais como a
Televisão ou a Internet, é preciso que todos os professores estejam conscientes de que só podem
vencer essa competição desigual, não fazendo mais do mesmo, mas fazendo diferente, fazendo
um acompanhamento personalizado que assegure que o estudante efectivamente está a
interiorizar, a assimilar aquilo que se pretende transmitir.
7 - Organização das aulas: a importância do apoio da informática.
A disciplina é constituída por aulas teóricas e práticas que, para facilitar a organização de
horários pretendemos que, sempre que possível, fiquem reunidas num conjunto de 4 horas
lectivas seguidas. A concentração das aulas em 4 horas semanais seguidas permitirá a
organização de saídas de estudo frequentes e favorece uma maior maleabilidade na leccionação
das matérias, permitindo também estabelecer uma ligação fácil entre as matérias teóricas e a sua
exploração pelos alunos nas aulas práticas.
No início do ano, será fornecida aos estudantes toda a informação disponível em formato digital.
Os Cds a disponibilizar incluirão:
•
Dados de base a explorar pelos alunos (tabelas de marés, dados do Permanent Service for
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Mean Sea Level) e documentos resultantes de pesquisas na Internet;
• Artigos do Professor em formato pdf (portable document format) sobre temas pertinentes
para a matéria a tratar;
• Outros textos/figuras de base no mesmo formato. Os textos que se seguem serão vertidos
para o formato pdf e distribuído aos estudantes no início das aulas. Pretendemos que sejam o
mais ilustrados possível, de tal forma que possa ser utilizado como fio condutor das aulas
teóricas e a sequência das respectivas figuras seja a matéria prima básica da leccionação. Este
processo permite acrescentar elementos ao texto e, sobretudo, novas figuras que venham a
revelar-se necessárias para a compreensão da matéria;
• O texto que se segue será organizado por temas (ou “aulas”) e será incluído no website da
disciplina. O formato pdf, além de acautelar um mínimo de segurança contra a cópia
indiscriminada dos textos permite “navegar” neles, nomeadamente estabelecendo links internos.
A referência a uma figura, por exemplo, poderá, por um simples clique do rato levar-nos à
própria figura, o que ajuda a minorar os problemas decorrentes das figuras estarem quase todas
postas no fim de cada tema;
• A aparente repetição da informação (isto é: o CD distribuído no início/versus publicação dos
temas na Internet) permite fazer actualizações no desenvolvimento das aulas e parece-nos uma
forma de interessar os alunos nessas modificações, dando-lhes um papel activo na respectiva
pesquisa. Temos a experiência de que entregar demasiada informação aos estudantes é o melhor
modo de eles desenvolverem uma atitude de um certo comodismo, de esperarem que as coisas
venham ter com eles, em vez de fazerem esforços para uma pesquisa e crescimento pessoal.
O conhecimento atempado das fontes de informação permitirá que os alunos preparem também a
aula que vai ser dada de forma a poderem intervir com as dúvidas que a consulta prévia dos
documentos lhes sugira. Este tipo de intervenção permitirá que as aulas não sejam meramente
expositivas mas que os estudantes, tendo já algum conhecimento da matéria a tratar, sejam mais
sensíveis à respectiva problemática e possam levantar dúvidas e dinamizar a discussão, de forma
a tornar a aula mais dinâmica. Outra forma, talvez mais eficaz, de permitir uma certa preparação
dos estudantes do tema a tratar é a indicação de exercícios simples a realizar fora dos tempos
lectivos e definidos no final da aula anterior. Esses exercícios podem ter um carácter
provocatório que induza a discussão entre os alunos e/ou a reflexão de cada estudante em
particular. Um exemplo poderá ser a distribuição de curvas como a de Fairbridge (1961), a
propósito do escalonamento dos terraços marinhos, pedindo aos alunos para discutirem o
significado e extraírem as consequências possíveis desse tipo de situação.
Fotografias aéreas convenientemente seleccionadas poderão permitir a análise de fenómenos de
refracção, difracção e reflexão das ondas.
A construção de gráficos com as variações da altura da maré durante um mês, a partir das tabelas
das marés publicadas pela APDL (Administração dos portos do Douro e Leixões), permitirá aos
alunos reflectir sobre as respectivas variações e sobre as respectivas causas.
Em todos esses casos, estes “trabalhos de casa” deverão funcionar como estímulos no
desencadear de um processo de reflexão dos estudantes ou como motivadores de um interesse
por matérias que, doutro modo, sem esse investimento prático por parte dos estudantes, poderão
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parecer demasiado áridas (caso das marés, por exemplo).
Logo nas primeiras aulas será elaborada uma mailing list com os endereços electrónicos de todos
os estudantes inscritos na disciplina. No caso de documentos pouco pesados eles serão
distribuídos através dessa mailing list. Pretendemos, com isso, estimular a utilização tão intensa
tanto quanto possível de documentos em formato digital.
Será incentivada a utilização desta mailing list para trocar informações entre os estudantes e com
o docente. Tentaremos que esse contacto não se resuma a eventuais pedidos de ajuda por parte
dos alunos e à divulgação de informações por parte do docente. Pensamos que, se as dúvidas
levantadas individualmente pelos estudantes forem do conhecimento dos restantes estudantes
isso poderá estimular a troca de ideias e suscitar outras dúvidas que acabarão por permitir uma
melhor compreensão da matéria.
A discussão por meios electrónicos não anula - antes pelo contrário – a importância da discussão
dos temas nas aulas. Para organizar melhor as aulas e disciplinar um pouco os estudantes, eles
serão incentivados a registar, por escrito, durante a respectiva exposição, as questões que a
matéria teórica lhes suscitar, de forma a que, quando a aula teórica terminar, as questões que não
tenham ficado esclarecidas sejam discutidas.
Outras informações adicionais, bem como os conteúdos definitivos das aulas (Adobe Acrobat)
serão distribuídos entre os estudantes através de um CD-ROM que será coligido no final do
semestre e entregue a todos os estudantes antes do teste teórico-prático.
Além disso, os estudantes serão incentivados a realizar a cartografia constante nos respectivos
relatórios no formato digital, de forma a dominarem quer programas como o Adob Photoshop
quer o Aldus Freehand ou outros que permitam fazer o tratamento de imagens rasterizadas ou
vectorizadas.
Tentaremos, ainda, que cada estudante elabore uma web page muito simples (programa Netscape
Comunicator) de onde constem links para os elementos mais relevantes dos respectivos relatórios
de investigação. Essa página ficará ligada à página já existente da disciplina
http://www.letras.up.pt/geograf/seminario/programa.html
A informação e o treino necessário para a realização destas tarefas será fornecido na parte prática
das aulas.
8 - Métodos de avaliação
Dado o número relativamente pequeno de estudantes que normalmente se inscrevem nas cadeiras
optativas da área de Geografia Física, pensamos que nunca ultrapassará os 30 estudantes, o que
permitirá que a avaliação respectiva seja feita pela modalidade de avaliação contínua. Segundo o
regulamento de avaliação em vigor actualmente (já adaptado ao regime de disciplinas
semestrais):
“A modalidade de avaliação contínua terá um número de provas mínimo a definir pelo docente
no início do ano lectivo e em correlação directa com as matérias a leccionar. Estas devem ser
distribuídas regularmente, consistindo na realização complementar ou em alternativa de vários
tipos de provas: trabalhos escritos e orais, relatórios de leitura ou de trabalho de campo,
elaboração de bibliografias críticas, testes escritos ou orais, etc.”
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Nesta conformidade, pretendemos que na disciplina de Geomorfologia Litoral os alunos sejam
sujeitos às seguintes provas:
1 – Trabalho de grupo (ponderação de 50%).
O trabalho de grupo consistirá no estudo de uma pequena área do litoral português. Dados os tipos
de tarefas a concretizar é desejável que o trabalho seja feito em grupo. Porém, o número ideal de
participantes será de 2 estudantes e só em caos excepcionais se admitirá a formação de grupos
maiores.
Este trabalho deverá basear-se em trabalho de campo feito especificamente para o efeito e
submeter-se-á a um plano do tipo do que se segue:
•
Problemática da questão a tratar;
•
Enquadramento geral (geológico e geomorfológico);
• Análise geomorfológica de pormenor (análise de mapas de grande escala, fotografias aéreas,
rasterização ou vectorização de mapas);
• Recolha de dados e observações de terreno (marés, condições meteorológicas, regimes de
ondulação, fotos, elaboração de perfis de praia, recolha de amostras);
• Análises sedimentológicas (granulometria, morfoscopia) e discussão dos respectivos
resultados;
• Problemas ambientais existentes na área estudada: o impacto dos Planos de Ordenamento da
orla costeira;
•
Conclusões.
Os trabalhos elaborados pelos alunos serão lidos e anotados, sendo discutidos oralmente na
presença de toda a turma. A nota final do trabalho será atribuída por igual aos estudantes
participantes a não ser que se verifique que um deles não participou activamente, caso em que a
nota poderá ser diferenciada.
Estes trabalhos constarão de uma pequena memória escrita e convenientemente ilustrada com
figuras elaboradas por eles ou digitalizadas e adaptadas. Destes trabalhos resultarão
apresentações públicas feitas no âmbito das aulas, recorrendo aos meios informáticos usuais (MS
Power Point) e com o recurso ao data show. Esta apresentação terá como objectivo, além do
aprofundamento científico, o treino da oralidade e da capacidade de fazer apresentações públicas,
bem como o uso das ferramentas informáticas disponíveis para o efeito.
Parece-nos importante que neste domínio da atribuição de notas seja feito um apelo à autoavaliação, de tal forma que os estudantes tenham consciência das qualidades e defeitos do seu
trabalho e possam discutir e finalmente aceitar o escalonamento final dos trabalhos em termos da
sua classificação.
2 - Teste teórico-prático (ponderação de 50%)
Embora este tipo de prova seja pouco simpática para os alunos, parece-nos fundamental para
conseguir avaliar em que medida eles assimilaram a matéria e são capazes de responder de forma
pessoal e criativa às questões postas. Para tentar obviar à tendência que os alunos têm para a
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memorização, as questões postas são essencialmente de tipo prático, ou então pretendem avaliar
em que medida eles aplicam os conhecimentos teóricos para responder a questões concretas.
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II - BIBLIOGRAFIA
Este item contém tudo aquilo que vai ser em princípio usado nas aulas. Porém, em cada aula
serão referidos os textos usados especificamente para essa matéria.
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23
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
III- Tópicos das aulas
1 – Introdução
Dos muitos temas passíveis de serem tratados numa disciplina de Geomorfologia Litoral
escolhemos aqueles que nos parecem indispensáveis para uma compreensão mínima da
problemática do litoral no contexto do País de forma a que estes conhecimentos possam ser
aplicados, com algumas adaptações, a outros contextos climáticos e tectónicos. Os temas
seleccionados perfazem 14 – um número muito próximo do número máximo de aulas de que
disporemos no contexto de uma disciplina semestral. Por isso os temas ficam organizados em
“aulas”. Deste modo, este tipo de organização obriga a uma certa contenção na leccionação das
matérias e a uma uma disciplina auto-assumida que impeça o extravasar excessivo de uns temas
à custa do desaparecimento de outros.
Uma vez que às aulas teóricas se deverão seguir as práticas, a matéria a versar nestas últimas
deverá decorrer da matéria teórica que foi apresentada, correspondendo a uma discussão dos
temas propostos nas aulas teóricas, ou a uma aplicação dos mesmos feita pelos estudantes.
As saídas de estudo deverão realizar-se, em princípio, logo a seguir às matérias versadas nas
mesmas terem sido tratadas nas aulas teóricas. Para serem produtivas, as saídas de campo devem
realizar-se com um tempo (meteorológico…) aceitável.
Por outro lado, é preciso assegurar um mínimo de 4 horas de luz solar…. Essa é uma das razões
pelas quais tentaremos que a disciplina seja colocada no 2º semestre. Se isso não for possível, em
alternativa, as aulas realizar-se-ão durante a manhã, o que permite a realização de saídas de
estudo coincidentes com as marés baixas vivas, onde a exploração das formas rochosas e do
perfil das praias poderá ser feito nas melhores condições.
Devido à impossibilidade de fazer uma programação rígida das saídas de campo, a respectiva
temática é apresentada no final. Todavia elas terão lugar na altura mais adequada (isto é, o mais
próximo possível da leccionação da respectiva matéria teórica) e de acordo com as condições
concretas de funcionamento da disciplina.
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Aula 1: Apresentação dos objectivos, programa, métodos de trabalho e de avaliação.
Definição de litoral e motivações para o seu estudo
Definição do conceito de litoral
O termo litoral é utilizado todos os dias na linguagem corrente, sem se cuidar de fazer dele um
uso rigoroso e, muito menos, de o definir com precisão. A palavra é utilizada como contraponto
à palavra interior e referida, muitas vezes, a propósito do processo de litoralização .
Este processo é correlativo da desertificação do interior e pode ser claramente compreendido em
mapas de datas diferentes (1970 e 1980) que mostram uma densificação da população nas áreas
litorais.
Com efeito, o crescimento económico das últimas décadas centrou-se essencialmente em nós
servidos por boas acessibilidades. Ora, a verdade é que, quer devido à importância histórica dos
portos na estruturação da rede viária, bem como às conhecidas dificuldades de implantação de
uma rede rápida e eficaz no interior do país (em parte devidas à distribuição do relevo, cuja
rugosidade só pode ser vencida com elevados custos) a parte litoral do país tem sido favorecida
face ao interior, sob o ponto de vista económico. Este fenómeno é correlativo do
empobrecimento do interior e do seu esvaziamento humano. A concentração das população nos
centros urbanos do litoral tem como consequência o congestionamento constante das respectivas
infra-estruturas, de que decorre a necessidade de as ampliar e multiplicar permanentemente. Daí
decorre uma evidente sobrecarga ambiental.
Ora, apesar da capacidade de depuração dos ambientes litorais, que alguns pensam ser
inesgotável, eles são, como veremos, ambientes frágeis a vários títulos.
Por outro lado, uma parte significativa da actividade económica em Portugal, depende do
turismo. E o turismo, em Portugal, apesar das louváveis tentativas que têm sido feitas para o
levar para o interior, ainda é muito um turismo de sol mar e praia (D. B. Ferreira, 2001).
25
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Por isso a questão da salvaguarda da qualidade ambiental do litoral é particularmente pertinente.
Mas a salvaguarda deste ambiente complexo e frágil só poderá fazer-se com base num
conhecimento tão aprofundado quanto possível da dinâmica natural dos ambientes costeiros, de
tal forma que esse conhecimento possa ser convenientemente integrado no ordenamento do
território que é, como muitos afirmam, uma das necessidades mais urgentes do país.
Existe, ainda, uma outra motivação, de cariz mais estritamente científico: sendo uma zona de
charneira, de interface, é uma faixa muito rica sob o ponto de vista da complexidade das
interacções entre a litosfera, a hidrosfera, a atmosfera e a biosfera. Isso é um estímulo para a
curiosidade dos estudantes desafiando o seu desejo de aprender e de investigar.
26
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 3 Densidade da população nos concelhos do litoral
O casamento entre uma área estimulante sob o ponto de vista científico e a possibilidade de
aplicação dos conhecimentos poderá ser um valor acrescentado num momento em que a saída
tradicional do curso de Geografia sofre uma importante redução e os estudantes se preocupam,
justificadamente, com as saídas profissionais e com a utilidade social do curso.
Não é tão fácil como parece definir litoral. Tratando-se de uma palavra de uso muito corrente, a
sua utilização em contextos diversos acaba por lhe conceder uma grande amplitude de
significados.
No dicionário da Porto Editora, costa é definida como parte das terras emersas em contacto com
o mar.
Por sua vez, litoral é definido como sendo um adjectivo qualificando aquilo que diz respeito à
27
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
beira-mar ou ainda como um substantivo correspondendo, então, à faixa de terreno junto à costa.
Sendo assim, costa é um conceito mais restrito do que litoral. Quando atentamos na definição
faixa de terreno junto à costa , apercebemo-nos de que não há qualquer precisão relativamente ao
significado da palavra junto.
Assim, a faixa de terreno junto à costa poderá ter extensões muito variadas.
Em M.E. S. A. Moreira (1984) encontramos uma definição que dá conta desse problema:
Litoral: designação dada à faixa do continente que está em contacto com o mar, ou a fenómenos
característicos dessa área. Alguns autores restringem o litoral à faixa entremarés, outros
estendem-no para o interior, por um espaço cujos limites nem sempre são fáceis de definir, e para
o largo, pela linha de rebentação das ondas.
Segundo a mesma autora,”costa” seria:
A faixa da superfície terrestre que se encontra no contacto entre as terras emersas e o mar ou o
oceano. Alguns autores restringem essa faixa apenas ao espaço atingido pelas águas entre os
níveis extremos da maré, outros estendem-na 3 milhas para o interior
Parece óbvio que a precisão da primeira parte da definição (ao espaço atingido pelas águas entre
os níveis extremos da maré) contrasta fortemente com o carácter um tanto artificial da segunda
(3 milhas para o interior). Esta definição vem, mais uma vez, provar o carácter um tanto variável
destes conceitos. No mesmo sentido vai a definição de zona costeira (coastal zone) que poderá
ser definida, de acordo com Carter, (1988), como o espaço em que os ambientes terrestres
influenciam os ambientes marinhos (ou lacustres) e vice versa. A zona costeira tem uma largura
variável e pode variar com o tempo. A respectiva delimitação não é possível, uma vez que os
limites são marcados por gradientes ambientais ou transições. Em cada local, a zona costeira
pode ser caracterizada por critérios físicos, biológicos ou culturais. Estes não precisam de ser
coincidentes e, na verdade, raramente o são.
De todas estas definições parece sobressair a dificuldade de estabelecer limites e o carácter
gradativo que as transições geralmente apresentam.
Por outro lado, parece poder concluir-se que litoral é um conceito mais amplo que costa ou zona
costeira, estendendo-se para o interior por um espaço cujos limites nem sempre são fáceis de
definir. Quando, na linguagem corrente se proferem frases do género 76% da população
portuguesa está fixada no litoral (Joanaz de Melo, 19931), é óbvio que o conceito de litoral é
usado em contraposição com o de interior e segundo critérios essencialmente económicos que
têm pouco a ver com a proximidade da linha de costa ou com qualquer influência marinha ainda
que remota.
1
http://www.despodata.pt/geota/Htmls/Activs/cstwatch.htm
28
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 4: Penetração dos nevoeiros de advecção no litoral da região do Porto
Embora este conceito de litoral possa ter a sua utilidade quando aplicado a realidades
essencialmente económicas, preferimos utilizar uma delimitação que se baseie em fundamentos
de ordem física. Assim, propomos que o termo litoral, no âmbito desta disciplina, se refira à
plataforma litoral. Esta poderá ser definida como:
- Uma faixa aplanada, situada a altitudes variadas, na proximidade da linha de costa e limitada,
para o interior, por um rebordo, rigidamente alinhado e contrastante com a referida área
aplanada. A plataforma litoral suporta, frequentemente, numerosos afloramentos de depósitos
genericamente classificados como plio-plistocénicos (M. A. Araújo, 1997) e é limitada, para o
interior, por um relevo muitas vezes nitidamente alinhado (relevo marginal, M. A. Araújo, 1991).
O nosso conceito de plataforma litoral engloba as áreas onde se encontram as marcas do
estacionamento do nível do mar durante o Quaternário, ou depósitos relacionáveis com a
proximidade do nível de base durante o Neogénico. Nesse sentido, torna-se, por um lado, mais
abrangente do que o conceito de M. E. S. A. Moreira (1984), que define plataforma litoral como
antigas plataformas de abrasão que actualmente se encontram a cotas diferentes do nível do mar,
submersas ou emersas, correspondendo respectivamente a fases de transgressão e de regressão
marinhas. Todavia, os sectores submersos serão apenas objecto de referências pontuais a
propósito de correntes (nomeadamente o upwelling) e das variações do nível do mar durante o
final do Pleistocénico e no Holocénico.
A existência de plataforma litoral é um traço comum a praticamente todo o país (C. Teixeira,
29
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
19792) . O conceito de plataforma litoral comporta características topográficas (área
essencialmente aplanada), geológicas (existência de coberturas sedimentares neogénicas) e
mesmo climáticas.
A concentração das isolinhas nos mapas de isotérmicas de Julho, com um traçado paralelo à
linha de costa, na faixa litoral portuguesa, mostra um aumento rápido das temperaturas, nos
meses de verão, à medida que se caminha para o interior.
Esse facto tem a ver, não só com a maior humidade do ar junto à linha de costa, mas também
com certas características específicas do clima litoral.
Embora possa ter um comando sobre a plataforma litoral de pouco mais de 100m, pensamos que
o relevo marginal funciona como uma barreira bastante eficaz à penetração das influências
oceânicas para o interior, nomeadamente no que diz respeito aos nevoeiros de advecção e à
nortada que refrescam consideravelmente a estreita faixa onde actuam.
Embora a escala do mapa seja insuficiente para dar conta destes aspectos com pormenor
suficiente, o extracto que apresentamos parece demonstrar a influência que o relevo marginal
tem na distribuição dos nevoeiros de advecção. Estes, por sua vez, têm um importante papel no
abaixamento das temperaturas máximas estivais.
A coincidência de diversos fenómenos físicos nesta mesma área comprova a respectiva
especificidade e confere ao conceito de plataforma litoral uma operacionalidade que permite que
possa, com vantagens, substituir o conceito de litoral da linguagem corrente, dando-lhe uma
maior precisão.
A zona costeira/litoral como interface.
A zona costeira pode ser caracterizada pela interferência entre diferentes tipos de fenómenos que
se relacionam ora com a hidrosfera (correntes, ondas, marés, variações do nível do mar), ora
com o litosfera (tectónica, estrutura geológica, aportes sedimentares) quer com a atmosfera
(clima, agitação marítima). A variedade de fenómenos em acção converte essa faixa numa
interface extremamente complexa e dinâmica.
Muitas vezes, algumas dessas características devem ser estudadas num âmbito um pouco mais
extenso para melhor poderem ser entendidas e contextualizadas. Daí o interesse em alargar a
nossa análise à plataforma litoral, cuja compreensão será o objectivo principal da disciplina.
A diversidade dos litorais
Uma breve análise da figura extraída de Komar (1998) permitirá ilustrar a forma como jogam os
diferentes elementos dentro dessa interface, conferindo uma imensa variedade às paisagens
litorais.
2
Será interessante lembrar, a este respeito, a frase de C. Teixeira:
“A esse propósito há que aceitar o critério altitudimétrico, plenamente válido no nosso país, onde os diversos níveis
se encontram escalonados desde o Minho ao Algarve, não são conhecidos acidentes tectónicos recentes” (C.
Teixeira, 1979).
30
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Seguidamente serão apresentadas fotografias com exemplos de paisagens litorais em diferentes
tipos de costas dentro do País, da Península Ibérica, noutras regiões europeias e em contextos
climáticos frios e tropicais para ilustrar a variedade que se pode encontrar nos litorais e também
o tipo de abordagem e a atitude científica a desenvolver. Estas imagens farão apelo quer à nossa
experiência (imagens de diversos países da Europa e também de Moçambique) quer a uma
pesquisa feita em Cd-Roms didácticos e na Internet. A referência à origem dessas imagens
destina-se a estimular idêntica capacidade de pesquisa dos alunos.
Aula prática
Discussão dos diversos temas tratados, nomeadamente das questões levantadas sobre
ordenamento do território, fazendo-se apelo à experiência dos estudantes sobre esse tema.
Bibliografia utilizada
ARAÚJO, M. A., (1991) - Evolução geomorfológica da plataforma litoral da região do Porto Edição da autora, Porto, 534 p., c/ anexos (87 p.) e 3 mapas fora do texto.
CARTER, R.W.G. - (1989) - Coastal Environments - An Introduction to the Physical, Ecological
and Cultural Systems of Coastlines, Academic Press Limited. London, 5ª Impressão, 617 p.
DAVEAU, S. e colaboradores (1985) – Mapas climáticos em Portugal. Nevoeiro e nebulosidade.
Contrastes térmicos. Memórias do Centro de Estudos Geográficos, nº 7, Lisboa, 84 p., 2 mapas
fora do texto
FERREIRA, D. B., (2001) - Turismo e Alteração Climática: Cenário Para Portugal no Séc XXI,
livro de Homenagem ao Professor Doutor Gaspar Soares de Carvalho, Ed. M. E. Albergaria
Moreira, A. Casal Moura, H. M. Granja, F. Noronha, Braga, p. 309-321.
MOREIRA, M. E. S. A., 1984) - Glossário de termos usados em Geomorfologia litoral, entro de
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167 p.
SANTOS, F. D, FORBES, K , MOITA, R. (editores) (2002) – Climate change in Portugal.
Scenarios, impacts and adaptation mesures (Siam project), Gradiva, F. C. Gulbenkian, FCT,
Lisboa, 454 p.
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Lisboa, p. 35-46
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 5: Classificação dos litorais essencialmente baseada na situação estrutural
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Aula 2: Origem e características da água do mar. As correntes marítimas
Origem e características da água do mar
Uma brevíssima apresentação da evolução da Terra permitirá aos estudantes enquadrar a origem
e evolução da hidrosfera e também da salinidade da água do mar, vista como um produto da
lixivização substâncias solúveis dos solos e dos alteritos existentes nos continentes, processo que
está em acção desde que as primeiras chuvas começaram a cair sobre a crusta primitiva e que se
desenrolou ao longo de muitos milhões de anos. Com efeito, a água do mar atingiu a sua
salinidade actual apenas há cerca de 700 milhões de anos (A. N. Strahler, 1987).
A água é praticamente um solvente universal – da estrutura molecular da água derivem muitas
das suas propriedades, sem as quais a vida não seria possível, na Terra.
A molécula de água tem uma estrutura ligeiramente dipolar.
Deste modo, a água consegue quebrar as ligações iónicas existentes nas moléculas de
variadíssimas substâncias, o que se traduz na respectiva dissolução. O cloreto de sódio poderá ser
invocado como exemplo (fig. 6).
A figura 7 permitirá uma análise da penetração das radiações luminosas na água, ajudando a
explicar a cor azul/verde dos oceanos e o rápido absorção da energia incidente com a
profundidade. Com efeito, a 1 m de profundidade, apenas 45% da energia incidente continua
disponível.
Distribuição da temperatura e salinidade da água do mar à superfície e em profundidade.
A análise da figura 8 permite ter uma ideia da variação da temperatura, da salinidade e da
densidade da água do mar consoante a latitude e introduzir os conceitos de termoclina, haloclina
e picnoclina.
O balanço da radiação e a circulação geral da atmosfera.
Parece-nos importante lembrar a existência de áreas de excesso de energia e deficit energético
(fig. 9) e a forma como essa situação evolui ao longo do ano. Basicamente, é desse balanço
energético que decorre a circulação atmosférica. A circulação marinha complementa a circulação
atmosférica, mas, dada a maior viscosidade da água, tem um tempo de resposta muito diferente.
Deste modo, a circulação marinha pode colaborar no controle de mecanismos de oscilações
climáticas de período relativamente longo.
A circulação geral da atmosfera e as correntes marítimas
Uma breve referência à circulação geral da atmosfera permitirá recordar a disposição dos
principais centro de acção e os ventos daí decorrentes. Daí partir-se-á para a análise de um mapa
com as principais correntes definindo quais as correntes quentes e frias. O mapa apresentado,
extraído do Atlas Hachette de 2002 (figura 10), tem a particularidade de representar os principais
climas a nível mundial e também os locais onde se faz sentir o fenómeno de upwelling.
As correntes e os ventos: a espiral de Ekman
A análise da figura 11 permitirá recordar o efeito de Coriolis e referir que, entre a direcção dos
33
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
ventos e as correntes marítimas por eles induzidas existe um ângulo de cerca de 45° à superfície
que vai aumentando em profundidade, à medida que o atrito entre as partículas de água aumenta
também. A partir daí é possível introduzir o conceito de espiral de Ekman.
Estrutura vertical dos oceanos e circulação termo-halina
A figura 8 mostra a variação da temperatura, salinidade e densidade da água do mar com a
profundidade. De um modo geral as águas são mais quentes e menos salgadas à superfície do que
em profundidade. Exceptua-se o caso das regiões próximas dos pólos onde a temperatura em
superfície e em profundidade é quase idêntica (e baixa) e onde as águas de superfície, devido à
fusão dos gelos, é menos salgada do que em profundidade. As águas de superfície são
geralmente bem misturadas e relativamente homogéneas até 100m de profundidade. Depois, a
densidade aumenta rapidamente entre 100 e 500m (picnoclina, fig. 8). Abaixo dessa
profundidade, o aumento da densidade torna-se muito lento (J. Riser, 1999).
Porém, quando a densidade das águas de superfície aumenta, devido, por exemplo, à mistura das
águas quentes e salgadas da corrente do Golfo com as águas frias e pouco salgadas do oceano
Árctico, isso acaba por produzir uma massa de água fria e salgada, e por isso bastante densa, que
desce para áreas mais profundas e daí se escoa ao longo da vertente ocidental da dorsal do
Atlântico, até se juntar à circulação profunda que rodeia a Antárctida (fig. 12).
As correntes marítimas e a dissimetria das fachadas oceânicas
Na figura 10 é possível observar a oposição existente entre as fachadas ocidentais e orientais dos
vários continentes quer nas latitudes temperadas quer nas latitudes tropicais. Relativamente ás
latitudes temperadas é de referir, nomeadamente, o contraste entre o clima de Washington e
Lisboa (S. Daveau, 1995).
É de salientar, também, o contraste existente entre os climas da costa ocidental de África e da
costa oriental do mesmo continente. A respectiva análise será ilustrada a partir d o nosso
conhecimento pessoal de Angola e de Moçambique, com alguns documentos fotográficos e
gráficos termo-pluviométricos pertinentes.
Será referida a forma como a circulação atmosférica e as correntes marítimas contribuem para a
criação da referida dissimetria das fachadas oceânicas.
O papel das correntes marítimas na regulação térmica terrestre. A importância da
circulação oceânica nas variações climáticas
A dissimetria climática existente entre os desertos periglaciares canadianos e as regiões agrícolas
e florestais do sul da Escandinávia, situadas à mesma latitude de 60°N demonstra que a
extremidade árctica da corrente do Golfo é a zona de dissipação de calor mais importante do
planeta.
Por isso, é aí que a interacção entre os fenómenos atmosféricos, glaciares e oceânicos é mais
directa (J. Riser, 1999). Deste modo, qualquer alteração na corrente do Golfo terá, obviamente,
consequências decisivas ao nível planetário. O mesmo terá acontecido, como é óbvio, durante o
Quaternário.
O circuito que se observa na figura 12 designa-se, muitas vezes, como conveyor belt (correia
34
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
transportadora) e tem uma importância crucial na regulação climática da Terra.
Mecanismo e importância do upwelling.
A figura 13 permite verificar o ângulo existente entre os ventos e as correntes por eles
provocadas ao mesmo tempo ajuda a compreender a razão do fenómeno de upwelling.
Com efeito, a existência de correntes que afastam as águas do continente (caso, por exemplo das
correntes das Canárias e de Benguela) tem, forçosamente, que provocar uma alimentação em
água profunda.
Sendo as águas frias e profundas ricas em nutrientes, os locais onde se verificam fenómenos de
upwelling correspondem, geralmente, a faixas litorais muito ricas em peixe. É o caso da costa de
Marrocos e da Mauritânia, mas também da costa sul de Angola e, sobretudo, da costa ocidental
da América do Sul, banhada pela corrente de Humboldt.
Alguns aspectos da circulação marítima na costa portuguesa
Embora com menor intensidade, o fenómeno de upwelling também acontece na costa
portuguesa, durante o verão.
O desvio para a direita, devido ao efeito de Coriolis, da corrente originada pela nortada produz
uma corrente de Este para Oeste, obrigando à ascensão de águas frias e profundas para
compensar o movimento das águas superficiais para o largo.
A figura 14 documenta 3 situações de upwelling na costa ocidental da Península Ibérica e tem o
interesse adicional de permitir detectar a influência dos acidentes costeiros neste fenómeno.
Também em Portugal a existência do upwelling tem uma grande importância no rendimento das
pescas, nomeadamente na da sardinha (C. S. Reis et. al., 2002).
Durante o inverno, a existência de ventos de componente sul pode produzir uma corrente que se
desloca de sul para norte ao longo da costa (fig. 15).
A forte descarga de águas dos rios, nomeadamente do Douro, quando em situação de cheia pode
provocar um efeito semelhante ao que se observa na figura 16 (corrente de Davidson):
impulsionada pelos ventos de sul e pelo efeito de Coriolis a pluma das águas dos rios pode ser
arrastada para norte. Pensamos que este efeito poderá estar na origem do aparecimento de
cadáveres do desastre da ponte de Entre-os-Rios tão longe como a enseada de Cariño, a leste do
cabo Ortegal.
Aula prática:
A abundante documentação encontrada em C. S. Reis et. al., no capítulo intitulado Fisheries do
volume de F. D. Santos, Forbes, e Moita, (2002), permitirá estudar a importância do upwelling
na pesca, nomeadamente na da sardinha.
Um outro tema muito interessante e actual poderá ser a análise do fenómeno designado por El
Niño. Para essa hipótese existe documentação em Summerhayes e Thorpe (1998) e em diversos
sites na Internet, entre os quais sugerimos:
http://www.nautigalia.com/elninoylanina/index3.htm
35
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Este assunto permite compreender um pouco melhor as complexas interacções entre a atmosfera
e a hidrosfera a nível global, e permite também, lançar uma ponte para a discussão de temas
como as oscilações e mudanças climáticas.
A análise levada a cabo por B. Lomborg (2002) poderá ser invocada a este respeito. Com efeito,
o fenómeno El Niño não terá existido durante o Holoceno médio (8000-5000 anos BP) quando o
clima global e regional era 1-2°C mais quente do que na actualidade.
Deste modo, parece que o aquecimento não tem uma correlação imediata com o El Niño e a
existência de fortes “El Niño” não deverá ser invocada como prova de uma aquecimento global.
Bibliografia utilizada
ANDERSEN, B. G.; BORNS, H. W. JR., (1994) - The Ice Age World, Scandinavian University
Press, Oslo, 208 p.
LOMBORG, B., (2002) – The skeptical environmentalist- measuring the real state of the World,
Cambridge Univ. Press, 515 p.
DAVEAU, S., (1995) - Portugal Geográfico, ed. João Sá da Costa, Lisboa, , 223 p.
HACHETTE MULTIMEDIA (2002) – Atlas Mondial. Ed. CD Rom, v. 6.1
OPEN UNIVERSITY, (2001) - Ocean Circulation, The Open University, Butterworth
Heineman, Grupo Elsevier, Boston, 286 p.
RIBEIRO, O., LAUTENSACH, H., DAVEAU, S., (1987) - Geografia de Portugal. I. A posição
geográfica e o território, Lisboa, Ed. Sá da Costa, 1987, 334 p.
RISER, JEAN, (1999) - Le Quaternaire; Géologie et Milieux Naturels, Dunod, Paris, 320 p.
SANTOS, F. D, FORBES, K , MOITA, R. (editores) (2002) – Climate change in Portugal.
Scenarios, impacts and adaptation mesures (Siam project), Gradiva, F. C. Gulbenkian, FCT,
Lisboa, 454 p.
STRAHLER, A. N., (1987) Geología Física, Ed. Omega, Barcelona, 629, p.
SUMMERHAYES, C. P., THORPE, S. A. (1998) – Oceanography. An Illustrated guide, Mason
Publishing, Southampton Oceanography Centre, 352 p.
THURMAN, H. V., (1997) - Introductory Oceanography, Prentice Hall, New Jersey, 544 p.
Web sites
http://www.nautigalia.com/elninoylanina/index3.htm
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura: 6: Estrutura dipolar da molécula de água. Ligações iónicas e covalentes
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 7: A penetração da energia solar na água do mar
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 8: Variação da temperatura, salinidade e densidade da água com a latitude e a
profundidade
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 9: Balanço energético de Janeiro e Julho
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 10: Correntes quentes e frias e áreas de upwelling
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 11: Direcção dos ventos versus direcção das correntes marítimas. A espiral de
Ekman
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 12: A circulação em superfície e em profundidade. Conveyor belt
43
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 13: Relação entre a direcção dos alíseos e as correntes por eles geradas. O
upwelling.
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 14: Exemplos de situações de upwelling na costa ocidental da Península Ibérica.
Adaptado de O. Ribeiro, H. Lautensach e S. Daveau, vol. I, 1987
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 15: Circulação ao longo da costa portuguesa em Agosto, Novembro e Dezembro
Figura 16: Corrente de Davidson ao largo da costa da Califórnia
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Aula 3: Ondas3
Como se deslocam as ondas: características gerais dos processos ondulatórios
O movimento mais evidente da superfície do Oceano é o das ondas.
Os fenómenos ondulatórios transmitem energia através da matéria. As partículas materiais
apenas giram ou oscilam para a frente e para trás, ou para cima e para baixo, transmitindo
energia de uma partícula a outra. Efectivamente, quando batemos numa mesa, as ondas sonoras
viajam através dela, mas a mesa propriamente dita não se movimenta.
Existem 3 tipos fundamentais de movimentos ondulatórios (fig. 17):
Nas ondas longitudinais, tal como nas ondas sonoras, as partículas movimentam-se para a frente
e para trás na mesma direcção da propagação da energia, tal como uma mola, alternadamente
distendida e comprimida. A energia pode ser transmitida em todos os estados da matéria (sólido,
líquido e gasoso) através deste movimento longitudinal das partículas.
Nas ondas transversais a energia viaja na perpendicular da direcção de vibração das partículas.
Este tipo de movimento transmite-se apenas nos sólidos.
As ondas que transmitem energia ao longo da interface entre 2 fluidos de densidades diferentes
têm um movimento que combina o das ondas longitudinais e transversais. O caso mais típico é o
da interface atmosfera/oceano. As partículas movem-se em trajectórias circulares. Daí o nome de
ondas orbitais.
Características das ondas
Uma onda ideal (fig. 18) apresenta partes altas (cristas ) e baixas (cavas). A diferença de altitude
entre cristas e cavas é a altura da onda (H). A distância horizontal entre 2 pontos homólogos
consecutivos é o comprimento de onda (L). A relação entre comprimento e altura chama-se
declive da onda (H/L). O tempo que demora a passar uma onda completa é o período (T) da
onda. Frequência (f) é o número de cristas que passa num dado ponto num minuto. É igual a
60/T.
A figura 19 mostra as relações entre comprimento de onda, período e velocidade das ondas
quando em águas profundas. Através do gráfico, sabendo um dos elementos característicos da
onda é possível saber os outros. Assim, uma onda com um período de 8 segundos terá um
comprimento de onda de 100m e uma frequência de 7,5/minuto. A velocidade será 100X7,5, isto
é: 750m por minuto ou 12,5 m por segundo.
As órbitas circulares das partículas de água têm um diâmetro igual à altura da onda. Quando uma
partícula está na crista da onda, move-se no mesmo sentido da propagação da energia. Quando
está na cava, move-se no sentido inverso. Os diâmetros das órbitas das partículas diminuem com
a profundidade abaixo do nível da água parada (nível médio entre a crista e cava), até que a
3
Convém recordar que as marés também são um fenómeno ondulatório. Por isso, as ondas deverão aparecer no
programa antes das marés, para permitir aos estudantes uma reflexão sobre os movimentos ondulatórios que permita
compreender melhor o fenómeno das marés.
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
movimentação das partículas numa onda ideal cessa completamente a uma profundidade igual a
metade do comprimento de onda (L/2). No caso da onda marcada a vermelho na figura 19, os
movimentos cessariam a 50m de profundidade.
• Ondas de águas profundas. As ondas que ocorrem quando a profundidade é maior que
metade do comprimento de onda chamam-se ondas de águas profundas (fig. 21). Não são
afectadas pelos fundos oceânicos.
• Ondas de águas baixas (shallow water waves). São ondas cuja profundidade é inferior a 1/20
do comprimento de onda. No caso da onda da figura 19, isso corresponderia a profundidades
inferiores a 5m. Incluem-se nesta categoria as ondas geradas pelo vento quando se aproximam da
linha de costa (fig. 20), os tsunami e as ondas de maré geradas pela atracção do Sol e da Lua. A
sua velocidade aumenta com a profundidade. A movimentação das partículas em águas pouco
profundas é uma órbita elíptica muito achatada que se aproxima da oscilação horizontal (fig. 21).
Esse movimento oscilatório pode, por isso, afectar o fundo do mar.
• Ondas de transição. As ondas de transição acontecem quando a profundidade é inferior a
metade do comprimento de onda mas maior que 1/20 do comp. de onda. No caso da onda da
figura 19, entre 50 e 5 m de profundidade. A sua velocidade é controlada em parte pelo
comprimento de onda e em parte pela profundidade.
Ondas geradas pelos ventos
Quando o vento sopra, as tensões por ele criadas (fig. 22) deformam a superfície do oceano sob a
forma de pequenas ondas com cristas arredondadas e cavas em forma de "V" e com
comprimentos de onda muito curtos, inferiores a 1,74 cm. Chamam-se rídulas (ripples) e a tensão
superficial da água tem tendência a destruí-las, restaurando a superfície lisa da água (fig. 23,
parte esquerda).
À medida que estas ondas se desenvolvem, a superfície do mar ganha um aspecto irregular, o que
permite uma maior exposição ao vento e uma maior transferência da energia do vento para as
águas. Quando essa energia aumenta desenvolvem-se ondas de gravidade. Estas têm
comprimentos de onda superiores a 1,74 cm e uma forma sinusoidal (fig. 23, parte média).Uma
vez que atingem uma maior altura, a gravidade torna-se a principal força de restauração da
superfície, daí o nome de ondas de gravidade.
Se a energia que lhes é fornecida aumentar, a altura da onda aumenta mais do que o
comprimento. Assim, as cristas tornam-se ponteagudas e as cavas arredondadas (fig. 23, direita).
A energia do vento faz aumentar a altura, comprimento de onda e velocidade das ondas. Mas
quando a velocidade das ondas iguala a dos ventos, já não é adicionada mais energia à onda, que
atinge então a sua maior dimensão. A zona de origem das ondas (em inglês designa-se como
"sea") é caracterizada por uma superfície eriçada por ondas de pequeno comprimento de onda,
com ondas movendo-se em várias direcções e com diferentes períodos e comprimentos de onda
(fig. 24). Este facto deve-se à acentuada variação da direcção e velocidade do vento.
Outros factores que condicionam a energia das ondas são a duração do impulso do vento numa
dada direcção e fetch (distância em que o vento sopra na mesma direcção).
Swell
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Quando as ondas se aproximam das margens oceânicas, onde a velocidade do vento diminui, elas
podem viajar mais depressa que o vento.
Nessa altura o declive da onda diminui e elas transformam-se em ondas com longas cristas
designadas como “swell”. O swell pode deslocar-se ao longo de grandes distâncias sem perda
significativa de energia. Sistemas de ondulação originados na Antártida foram encontrados a
quebrar no Alaska, depois de viajar mais de 10.000 km. As ondas com maior comprimento de
onda serão aquelas que viajam mais depressa, porque, em águas profundas, a velocidade é
função do comprimento de onda (fig. 19).
Padrões de Interferência
Porque o swell de diversas tempestades coexiste no oceano, é inevitável que venham a colidir e
interferir uns com os outros. Isso cria padrões de interferência. Trata-se da soma algébrica da
movimentação que cada uma delas produziria de per si. Quando os sistemas de ondas de 2 áreas
de origem colidem, o resultado pode ser construtivo, destrutivo, e mais frequentemente, misto.
A interferência construtiva acontece quando ondulações com o mesmo comprimento de onda se
encontram em fase, o que significa que as cristas e as cavas coincidem. A onda resultante terá o
mesmo comprimento de onda e uma altura que será a soma das alturas individuais (fig. 25,
esquerda).
A interferência destrutiva acontece quando as cristas de um sistema coincidem com as cavas de
outro. Se os sistemas de ondulação têm características semelhantes, a soma algébrica será zero, e
a energia de um será cancelada pela do outro.
Porém, é mais provável que haja ondas de diversos comprimentos e alturas em cada sistema e
por isso, que se desenvolva uma interferência mista. É por isso que, os sistemas de ondulação
que chegam à costa geralmente têm padrões irregulares com sequências de ondas altas e baixas
(fig. 25, direita).
Ondas livres e forçadas
As ondas forçadas são mantidas pelo vento, de tal forma que as suas características estão
adaptadas a ele.
Nas ondas livres a movimentação dá-se de acordo com os ventos na área de origem mas não
existe uma força que as mantenha em movimento. Mesmo na área de origem, existe uma mistura
entre ondas livres e forçadas. Além disso, dado que o vento é variável, há sempre vários sistemas
de ondas criados em cada área de origem.
Ondas traiçoeiras (Rogue Waves)
Um dos mistérios dos oceanos são as causas das ondas traiçoeiras, ondas maciças que podem
atingir o equivalente a 10 andares de altura (cerca de 30m!). Resultam de raras coincidências
num comportamento normal das ondas. No oceano aberto, uma onda em cada 23 terá mais do
dobro da altura média. Uma em 1175 terá uma altura 3 vezes maior e uma em 300,000, quatro
vezes maior. As hipóteses de ondas realmente monstruosas são raras (uma em biliões) mas
acontecem!
O total de barcos de vários tamanhos perdidos durante um ano é de cerca de 1000! Muitos deles
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
são vítimas destas ondas. Provavelmente elas são devidas a uma interferência construtiva
extraordinária. São mais frequentes a sotamar de ilhas ou baixios e onde ondas de tempestade
chocam contra fortes correntes marítimas tal como a corrente das Agulhas na costa SE de África
onde as ondas de tempestade deslocando-se para NE chocam com a corrente das Agulhas, vinda
de NE. Este é provavelmente o sítio da terra onde se regista o maior número de naufrágios.
Rebentação (Surf)
Quando a profundidade é inferior a 1/20 do comprimento de onda as ondas começam a
comportar-se como ondas de pequena profundidade. A movimentação das partículas é muito
retardada pela acção do fundo e existe um significativo transporte de água em direcção à linha de
costa (fig. 20).
O fundo marinho, a baixa profundidade, interfere com o movimento das partículas na base da
onda, atrasando-a. Por isso, há uma espécie de compressão d as cristas das ondas, o que reduz o
respectivo comprimento de onda. Esse facto é compensado por um aumento da altura.
As cristas tornam-se estreitas e ponteagudas e as cavas tornam-se curvas largas, tal como nas
ondas de alta energia do mar aberto. O aumento da altura acompanhado de diminuição do
comprimento de onda aumenta o declive da onda (H/L). Quando este atinge 1/7, a onda quebra
(fig. 20).
A vaga mais vulgar é a vaga por derramamento (spilling breaker, fig. 26). Esta resulta de um
declive relativamente suave do fundo, que extrai energia mais gradualmente da onda, produzindo
uma massa turbulenta de ar e água que escorre na frente da onda em vez de encaracolar no topo.
Nas vagas em voluta a crista da onda adianta-se muito em relação à sua base e desaba por falta
de apoio. Estas vagas em voluta formam-se em praias com um declive moderado (fig. 26).
Se o declive da praia e a altura da onda foram muito acentuados, a onda quebra sobre a forma de
grandes rolos ou vagalhões (surging breakers, fig. 26). É o que acontece com as vagas de
tempestade (Moreira, M.ES.A, 1984).
Refracção das ondas
As ondas começam a arquear-se e os comprimentos de onda a tornarem-se mais curtos quando os
sistemas de ondulação "sentem o fundo" ao aproximar-se da linha de costa.
É raro que o ângulo de aproximação à praia seja exactamente 90°. Por isso, alguns sectores
começarão a "sentir o fundo" mais cedo e atrasar-se-ão em relação ao resto da onda. Disso
resulta uma curvatura da frente da onda que se designa como refracção da onda (fig. 27-A).
Na figura 27-B, vemos como uma topografia de fundo irregular atrasa certas partes da onda que
se aproxima da costa.
A refracção distribui energia de uma forma desigual na praia. Se construirmos linhas
perpendiculares à frente das ondas, e as espaçarmos de modo que a energia nesses sectores seja
sempre igual, obtemos linhas ortogonais (fig. 27-B) que nos ajudam a compreender como a
energia das vagas se distribui. As ortogonais convergem nos promontórios e divergem nas baías.
Por isso a energia e a erosão será maior nos promontórios e mais dispersa nas baías, onde pode
ocorrer acumulação de areias. A maior energia nos promontórios é demonstrada pela existência
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
de ondas mais altas.
Difracção das ondas
A difracção pode definir-se como um encurvar das ondas à volta de objectos. Permite que a
ondulação penetre nos portos e por detrás de barreiras (fig. 28). A difracção acontece porque
qualquer ponto de uma onda pode ser uma fonte a partir da qual a energia se propaga em todas as
direcções.
Reflexão das ondas
Nem toda a energia das ondas é consumida quando elas esbarram contra a linha de costa. Uma
parede vertical, tal como um molhe, pode reflectir a ondulação de volta para o oceano, com
pouca perda de energia (fig. 29). A reflexão das ondas nas barreiras costeiras ocorre segundo um
ângulo igual ao ângulo de incidência.
Nas condições de ondas perpendiculares ao obstáculo, a reflexão produz ondas estacionárias (fig.
30). Estas resultam de duas ondas do mesmo comprimento que se movimentam em direcções
opostas. As partículas continuam a mover-se na horizontal e na vertical, mas não existe o
movimento circular que se vê numa onda progressiva. Estas ondas são caracterizadas pela
existência de linhas ao longo das quais não existe movimento vertical (linhas nodais). Nos
antinodos há uma alternância entre subidas e descidas e a movimentação é inteiramente vertical.
A altura da onda estacionária teoricamente pode atingir o dobro da altura da onda incidente, o
que pode traduzir-se em problemas na estabilidade dos navios junto aos cais de acostagem.
Storm Surge
Os centros de baixa pressão são acompanhados por um empolamento da superfície da água, que
acompanha o movimento da depressão. Quando a tempestade se aproxima da costa a parte desse
empolamento onde os ventos se dirigem para o lado da terra (fig. 31) produz uma subida do nível
do mar afectando a linha de costa. As storm surges podem ser altamente destrutivas nas costas
baixas sobretudo se coincidirem com uma maré alta.
Tsunami
Os japoneses chamam às grandes ondas destrutivas que ocasionalmente penetram nos seus
portos, tsunami, ou "ondas de porto". Trata-se de ondas que têm origem nos sismos, por vezes
impropriamente chamadas "tidal waves," o que, a ser uma designação correcta, implicaria uma
falsa relação com as marés.
Os tsunami são criados pela movimentação de falhas. Isto origina sismos e também mudanças
bruscas no nível da água à superfície do mar. Eventos secundários tais como avalanches
submarinas produzidas pelo jogo das falhas, ou destacamento de icebergs dos inlandsis e sua
queda no mar também podem originar tsunami (fig. 32).
Uma vez que o comprimento de onda dos tsunami excede 200 km trata-se, necessariamente, de
ondas que se comportam como sendo de águas pouco profundas. Por isso, a sua velocidade é
sempre determinada pela profundidade da água.
No mar aberto movem-se a velocidades superiores a 700 k/h, com alturas de 0,5m. Por isso,
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
passam facilmente desapercebidos. Porém, em águas pouco profundas, tornam-se mais lentos e a
água começa a acumular-se contra a linha de costa, podendo ultrapassar 30m de altura e entrando
nos portos com efeitos destruidores.
Um tsunami pode ter uma onda única, mas a libertação da energia sísmica geralmente origina
várias ondas.
O Oceano Pacífico é aquele que é mais sujeito a tsunami, porque se situa numa área
particularmente instável (anel de fogo do Pacífico), com sismos violentos frequentes.
Em 27 de Agosto de 1883, a ilha volcânica de Krakatoa (hoje Indonésia) explodiu e quase
desapareceu. Originou-se um tsunami com mais de 30m que matou mais de 36000 pessoas. A
energia desta onda chegou até às Ilhas Britânicas. Nestas circunstâncias os barcos devem fugir
dos portos e sair para ao mar alto, ao contrário do que deve fazer aquando dos ciclones.
Será referida, também, a importância do tsunami que se seguiu ao sismo de Lisboa de 1755 (fig.
33).
Aula Prática
Observação da fotos aéreas seleccionadas para identificar padrões de reflexão refracção e
difracção das ondas.
Pesquisa no site:
•
http://www.hidrografico.pt/wwwbd/
Instituto hidrográfico: Rumos e períodos de ondulação. Casos de storm surges e suas
consequências no nível atingido pelo mar.
Bibliografia
KOMAR, P. D., (1998) - Beach Processes and Sedimentation, Prentice Hall, New Jersey, 543 p.
MOREIRA, M. E. S. A., (1984) - Glossário de termos usados em Geomorfologia litoral, Centro
de Estudos Geográficos, Linha de acção de Geografia das Regiões Tropicais, relat. nº 15, Lisboa,
167 p.
THURMAN, H. V., (1997) - Introductory Oceanography, Prentice Hall, New Jersey, 544 p.
Figura 17: Tipos de ondas
52
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 18: Características essenciais das ondas orbitais
Figura 19: Relações entre o comprimento de onda, o período e a velocidade das ondas
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 20: Modificações sofridas pelas ondas quando se aproximam da linha de costa
Figura 21: Ondas de águas profundas, intermédias e pouco profundas
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Figura 22: A transmissão da energia do vento para as ondas
Figura 23: Ondas de capilaridade e de gravidade
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 24: Área de origem da ondulação e Swell
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Figura 25: Interferência de ondas
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 26: Vagas por derramamento, em voluta e em rolo (surging)
Figura 27-A: A refracção das ondas quando se aproximam da costa
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Figura 27-B: Refracção das ondas
Figura 28: Reflexão das ondas
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Figura 29: Difracção das ondas
Figura 30: Ondas estacionárias
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Figura 31: Storm surge
Figura 32: Processo de criação dos tsunami
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Figura 33: O tsunami que se seguiu ao sismo de Lisboa de 1755
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Aula 4: Marés
Mecanismos das marés, maré directa e reflexa
No fundo, as marés funcionam como ondas de baixa profundidade, já que apresentam
comprimentos de onda de milhares de kms e alturas que atingem os 15m.
As marés terrestres são produzidas pela atracção gravitacional do Sol e da Lua. Como é sabido,
segundo a lei de Newton, essa atracção é directamente proporcional às massas e inversamente
proporcional ao quadrado da distância. Porém, no processo gerador de marés, a
proporcionalidade refere-se ao cubo da distância (Thurman, 1997).
Devido a esse facto e uma vez que a Lua está estar muito mais próxima da terra que o Sol, a
força geradora das marés por parte do Sol é igual a 46% da força da Lua (fig. 34).
A Terra e a Lua formam um conjunto que gira em torno do Sol. Nesse movimento de translação
o conjunto Terra-Lua é representado pelo centro comum de gravidade, ou baricentro. Este situase dentro do manto terrestre, a 4700 km de distância do centro da terra (fig. 35).
É este baricentro que descreve uma órbita elíptica em relação ao Sol (fig. 36). Quer a Terra quer
a lua descrevem órbitas mais complexas e relativamente sinuosas.
Todos as partículas pertencentes à Terra descrevem círculos de raios iguais, à volta do baricentro
(fig. 37).
A força centrípeta requerida por todas as partículas da Terra para as manter em rotação é igual
em todos os pontos da Terra. Porém, a força da gravidade exercida pela Lua varia consoante a
posição de cada ponto terrestre em relação à Lua (fig. 38). Da subtracção dos vectores da força
centrípeta e da força gravitacional resulta um outro vector, em azul na fig. 38, que corresponde à
força das marés.
Deste modo, as forças de maré tendem a empurrar a água para 2 bojos em lados opostos da
Terra, sendo que um deles se posiciona directamente sob a Lua (maré alta directa, fig. 39) e o
outro fica directamente oposto (maré alta reflexa). Porém, de cada vez que a Lua passa pelo
meridiano do lugar a preia-mar, só se faz sentir um pouco mais tarde devido ao atrito das massas
(água e fundo) e à necessidade de vencer a inércia. Pelo mesmo motivo, numa lua nova ou lua
cheia a maré de maior amplitude só ocorre algum tempo depois, período que pode ir até 36 horas
e tem o nome de idade da maré.
Além disso, o intervalo de tempo entre duas passagens da Lua pelo mesmo meridiano (dia lunar)
não coincide com o dia solar de 24 horas. Isto acontece porque, ao longo de um dia solar a Lua
gira 12° e 12’no seu movimento de translação, em sentido directo. Por isso, para o observador
voltar à posição inicial relativamente à Lua, é necessário que a Terra gire mais 12° e 12’, o que
corresponde aproximadamente a 50min (fig. 40).
Marés vivas e mortas
Embora a força das marés provocadas pelo Sol corresponda apenas a 46% da das marés lunares,
é evidente que a posição dos bojos solares, que teoricamente, circulam pela hidrosfera
independentemente dos bojos lunares, acabam por interferir com as marés lunares, acentuando-as
(marés vivas) ou contrariando-as e diminuindo a respectiva amplitude (marés mortas (fig. 42).
63
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
É dessa interferência que resulta a existência de marés desiguais ao longo de um mês lunar (fig.
43), sendo que as marés vivas acontecem a cada Lua nova e a cada Lua cheia e as marés mortas
acontecem nos quartos crescente e minguante.
Outras variações na amplitude das marés. Marés equinociais
Uma vez que as amplitudes da maré são maiores quando a Terra está mais próximo do Sol ou da
Lua, as variações na distância da Terra a cada um deles acabam por interferir na amplitude das
marés.
A figura 44 mostra como essas distâncias podem variar.
Mas existem ainda outros factores a ter em conta. O plano da órbita da Lua faz um ângulo de 5°
com o plano da eclíptica. Significa isto que a Lua pode atingir uma declinação máxima de 28,5°
para Norte ou Sul do Equador (23,5+5°). Como o plano da órbita da Lua sofre um movimento de
precessão com a duração de 18,6 anos, o resultado acaba por produzir variações complexas, em
que, por exemplo, a declinação máxima da Lua pode atingir apenas 18,5° 9,3 anos depois do
início do ciclo (fig. 46). Este ciclo deve ser tido em conta para a avaliação das variações do nível
do mar.
À passagem pelo Sol no plano do Equador corresponde uma maior aproximação entre os bojos
de maré solares e lunares, o que reforça a amplitude das marés. Assim, as marés vivas
equinociais são marés particularmente fortes e este conceito tem consequências práticas, por
exemplo na definição de domínio público marítimo, que, segundo a legislação, compreende:
“Faixa ao longo de toda a costa marítima cuja largura é limitada pela linha da máxima preia-mar
de águas vivas equinociais e a batimétrica dos 30m” (Dec-Lei 93/90, de 19 de Março).
Considerando o grande número de variáveis a ter em conta, é interessante considerar quais as
condições que produziriam a maior força de maré: a amplitude máxima da maré deverá
corresponder a uma situação da Terra em perihélio, com a Lua em perigeu e em sizígia e quando
o Sol e a Lua tiverem declinação zero. Esta situação ocorre apenas de 1600 em 1600 anos e a
próxima acontecerá no ano 3300.
Marés diurnas, semi-diurnas e mistas
Se a Terra fosse uma esfera coberta por um mar de profundidade uniforme, haveria 2 marés altas
de amplitudes diferentes em cada dia lunar, o que significa que teriam um período de 12:25
minutos (metade do dia lunar). A maré mais próxima da “ideal” pode, por isso, designar-se como
maré semidiurna.
A maré diurna tem apenas uma maré alta e uma maré baixa cada dia. O período é de 24h e
50min.
As marés mistas correspondem a situações com algumas características de marés semidiurnas e
outras de marés diurnas. Muitas vezes há duas marés altas e duas marés baixas em cada dia
lunar, mas as duas marés sucessivas têm alturas significativamente diferentes. Estas
desigualdades são maiores quando a Lua está sobre os trópicos (marés tropicais, fig. 47), do que
quando a lua está sobre o equador (marés equatoriais).
Também pode haver alguns dias ao longo de mês em que as marés têm um período de 24h50min,
64
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
tipicamente diurno (fig. 49).
A existência destes dois últimos tipos de marés (diurnas e mistas) explica-se pelo facto de a
Terra ter uma superfície muito irregular, com continentes separando oceanos de formas
irregulares.
A existência de marés diurnas ou semidiurnas tem uma grande importância na definição do
tempo de estacionamento do nível do mar nas diferentes altitudes compreendidas entre os níveis
das marés mais baixas e mais altas.
Com efeito, no caso das marés semi-diurnas é ao nível das marés altas e baixas médias que o
tempo de estacionamento é maior (fig. 50). Nas marés de tipo diurno, o mar estaciona mais
tempo perto do nível médio.
A existência de certos fenómenos meteorológicos (ciclones tropicais, depressões subpolares
muito cavadas) pode provocar, como vimos no capítulo anterior, fenómenos do tipo storm surge.
De uma maneira geral, as variações da pressão atmosférica traduzem-se sempre por variações no
nível do mar. Essas variações constam das tabelas das marés e destinam-se a corrigir o nível
calculado para as marés por processos astronómicos. Assim, uma pressão 20cm de mercúrio
inferior ou superior à pressão normal de 760mm traduzir-se-á num empolamento ou numa
depressão da superfície das águas de 27cm (tabelas das marés, APDL).
Estas alterações, amplificadas pelo efeito de subida do nível do mar quando existe um vento que
se dirige do mar para a Terra (fig. 31) acabam por interferir com o desenvolvimento das marés
(fig. 51). Conhecida a amplitude esperada das mesmas, calculada por processos astronómicos, é
possível saber qual a variação que fica a dever-se aos fenómenos meteorológicos.
Dinâmica das marés: linhas cotidais e pontos anfidrómicos
Os bojos formados pela atracção da Lua situam-se na respectiva vertical (maré alta directa) e do
lado oposto da Terra (maré alta reflexa). À medida que a Terra roda, o referido bojo,
correspondente à onda de maré desloca-se também no sentido directo (fig. 52).
O facto de os oceanos estarem compartimentados em bacias faz com que a circulação das marés
se feche dentro de cada uma dessas bacias e se faça à volta de um ponto central (o ponto
anfidrómico), situado aproximadamente no centro de cada bacia oceânica e em cada hemisfério.
A maré pode ser vista, assim, como uma onda em que as duas cristas estão separadas por 20.000
km (metade do diâmetro do Equador). Trata-se de ondas muito longas. Como vimos no tema
anterior, com uma profundidade abaixo de 1/20 do comprimento de onda as ondas comportam-se
como ondas de baixa profundidade, cuja velocidade é determinada pela profundidade4.
Como todas as ondas que se aproximam de terra, a onda de maré sofre um aumento de altura à
medida que a profundidade diminui. Pelo contrário, em direcção ao centro da bacia oceânica, a
altura da onda de maré diminui até se anular no ponto central, o chamado ponto anfidrómico,
4
Neste caso, a profundidade limite é de 1000 km, muitíssimo superior à profundidade das bacias oceânicas que se
situa entre 4-5km.
65
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
onde todas as linhas cotidais (linhas que unem os pontos onde a maré alta é simultânea) se
cruzam (fig. 53).
Podem criar-se diversos pontos anfidrómicos, sempre que as bacias oceânicas sofrem uma certa
compartimentação, como é o caso do mar do Norte, que funciona como uma bacia independente
do resto do Atlântico Norte (fig. 54).
As correntes de maré seguem este padrão rotativo nas bacias oceânicas (fig. 55), mas são
convertidas em correntes alternantes nas margens dos continentes. A velocidade máxima destas
correntes acontece aquando da enchente e da vazante, quando o nível da água está entre o nível
da maré alta e da maré baixa.
A diminuição de profundidade e o carácter reentrante de algumas baías pode provocar uma
amplificação da maré, como no caso da Baía de Fundy, onde a amplitude da maré atinge 17m.
Macaréu
O macaréu (fig. 56) é uma onda de maré que força o seu caminho ao longo dos rios. É comum
em rios com o Amazonas, onde o fenómeno se designa de Pororoca (que significa grande
estrondo em língua tupi).
Ocorre na mudança das fases da Lua (2 dias antes, no dia e 3 após a Lua), principalmente nos
equinócios, mais intensamente nos períodos de maré viva. O fenómeno começa quando as águas
das marés vindas do oceano chegam à desembocadura de um rio, formando elevações que podem
ter até dezenas de metros de comprimento e que se movem rio acima com velocidade de 30 a 50
Km/h. O encontro entre as águas provoca ondas que podem alcançar até 5m de altura avançando
rio adentro. Este choque das águas tem uma força tão grande que é capaz de derrubar árvores e
modificar o leito do rio.
Amplitude das marés
A esse respeito os litorais podem classificar-se como micromareais (amplitude máxima inferior a
2m); mesomareais (entre 2 e 4m) e macromareais (mais de 4m). As marés na costa portuguesa
são do tipo mesomareal, com amplitudes máximas próximas dos 4 m (Agenda das marés,
APDL).
A figura 57 mostra a relação existente entre a amplitude das marés e os diferentes tipos de
paisagens litorais.
É curioso verificar que os deltas e as ilhas barreira predominam em ambientes micromareais,
enquanto que os estuários em forma de funil e as planícies vasosas (mud flats) predominam nos
ambientes macromareais.
Aula Prática
•
Análise das tabelas de marés (APDL; Associação Nacional de Cruzeiros).
•
Construção de gráficos (fig. 58) e sua interpretação.
Bibliografia utilizada
66
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
APDL - Administração dos Portos do Douro e Leixões, (2002) – Agenda 2002
PETHICK, J. - (1984) - An Introduction To Coastal Geomorphology, London, Edward Arnold,
260 p.
PUGH, D. T. - (1987) - Tides, Surges And Mean Sea Level, John Wiley and Sons, Chichester,
472 p.
SANTOS, F. D, FORBES, K , MOITA, R. (editores) (2002) – Climate change in Portugal.
Scenarios, impacts and adaptation mesures (Siam project), Gradiva, F. C. Gulbenkian, FCT,
Lisboa, 454 p.
THURMAN, H. V., (1997) - Introductory Oceanography, Prentice Hall, New Jersey, 544 p.
Websites
http://www.edinfor.pt/anc/ancfmares.html
http://www.hidrografico.pt/wwwbd/
http://www.geog.ouc.bc.ca/physgeog/contents/8r.html
http://www.surfway.com.br/link_interview/interview_pororoca.htm
67
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 34: Importância relativa das marés geradas pela Lua e pelo Sol
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 35: O sistema de rotação Terra-Lua. O baricentro
69
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 36. Trajectórias seguidas pela Terra e pela Lua ao longo do ano
70
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 37: Rotação Terra-Lua: todos os pontos da Terra descrevem trajectórias idênticas
em torno do baricentro. A força centrípeta que mantém o sistema em rotação conjunta é
igual em todos os pontos da Terra.
71
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 38: A existência de forças gravitacionais diferentes consoanter a posição de cada
ponto em relação à Lua implica a existência da força de maré
72
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 39: Maré alta directa e reflexa
Figura 40: Dia Lunar: ao longo de um dia solar a Lua gira 12° e 12’. Por isso, para o
observador voltar à posição inicial relativamente à Lua, é necessário que a Terra gire mais
12° e 12’. Desta forma, o dia lunar tem 24h e 50min.
73
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 42: Marés vivas e mortas
74
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 43: Interferência entre as marés lunares e solares
75
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 44: Variação da distância da Terra ao Sol e da Terra à Lua
Figura 45: Fases da Lua e variação da distância da Lua à Terra e da declinação lunar
(Março de 1981)
76
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 46: Variação da declinação da Lua: ciclo de 18,6 anos.
Figura 47: Variação na amplitude das marés durante o dia: as marés tropicais
77
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 48: Variação da declinação solar ao longo do ano: as marés equinociais
78
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 49: tipos de marés. Semidiurnas, mistas e diurnas
79
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 50: variações na altura da maré devidas a causas meteorológicas: storm surge de
14-16 de Outubro de 1987 na costa portuguesa
80
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 51: Permanência do nível do mar a diversas alturas. Caso de marés semidiurnas e
diurnas.
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 52: Propagação da onda de maré
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 53: Linhas cotidais e pontos anfidrómicos a nível do globo
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 54: Linhas cotidais no Atlântico
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 55: A propagação da maré ao longo da costa ocidental da Península Ibérica
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 56: A penetração da maré ao longo de um estuário (macaréu)
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 57: Relação entre a o tipo e a frequência de diversos tipos de paisagens costeira e a
amplitude das marés
Altura (m)
Amplitude das marés para Lisboa (Tejo)
Outubro 2000
4,5
4,0
3,5
3,0
2,5
2,0
1,5
1,0
0,5
0,0
1
2
3
4
5
6
7
8
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
dias
Fonte: Associação Nacional de Cruzeiros, 1999 (http://www.edinfor.pt/anc/ancmar-200010.html)
Marés
Figura 58: Gráfico das marés para Lisboa. Outubro de 2000
87
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Aula 5: Variações do nível do mar
Os temas anteriores visaram demonstrar a dinâmica marinha, como um dos elementos da
interface Litosfera-Hidrosfera-Atmosfera, bem como as relações que ela estabelece com os
outros membros desta trilogia (exemplo: as ondas e as correntes e a sua relação com os
fenómenos atmosféricos, os tsunami e a sua relação com a litosfera).
O estudo rápido da hidrosfera não ficaria completo sem uma focalização nas variações do nível
do mar. Com efeito, o nível do mar é um conceito da maior importância para a evolução
geomorfológica dos continentes. Além disso, o nível do mar juntamente com os processos de
erosão e/ou fornecimento de sedimentos ao litoral controlam a evolução dos litorais,
nomeadamente a situação de avanço ou de recuo da linha de costa (fig. 59).
Nível do mar como um conceito relativo
O conceito de nível do mar é (quase) sempre um conceito relativo. A figura 60 representa, no
sector da esquerda, os diferentes processos que contribuem para as variações eustáticas, globais,
do nível do mar. Do lado direito apresentam-se os processos que jogam do lado dos continentes e
que interferem com as variações eustáticas.
As variações eustáticas têm um carácter global, enquanto que os movimentos que se verificam
no continente são claramente localizados no espaço.
Do que fica dito, deduz-se facilmente que a variação do nível do mar é a resultante das
tendências eustáticas e das tendências que se verificam do lado do continente. Significa isso que
as variações eustáticas podem ser ampliadas ou reduzidas, na sua amplitude, pelos movimentos
do continente.
Até há pouco tempo medíamos o nível do mar relativamente a um ponto que supúnhamos fixo. O
problema é que a pretensa estabilidade dos continentes está cada vez mais posta em causa.
Só a partir do momento em que se conseguiu fazer observações a partir do espaço, via satélite
(fig. 61) foi possível identificar as deformações na superfície do geóide (fig.62).
O geóide pode ser definido como a superfície equipotencial que seria assumida pela superfície do
mar na ausência de marés, variações de densidade da água, correntes e efeitos atmosféricos.
Sabe-se hoje que existe um afastamento do geóide relativamente à superfície ideal do elipsóide
que pode atingir cerca de 100m para cima ou para baixo, acabando por conduzir à existência de
deformações na superfície do geóide de cerca de 180m (fig. 62)! De facto, as subidas e descidas
da superfície do geóide dependem de fenómenos de convecção verificados ao nível do manto
terrestre (Encyclopaedia Universalis, 1998, p. 263). Este facto é um obstáculo de peso à
construção de curvas da variação absoluta do nível do mar, válidas para toda a Terra. Com efeito,
embora o eustatismo geoidal possa ser um fenómeno relativamente lento, os seus efeitos, acabam
por poder ser relevantes em prazos relativamente longos, por exemplo à escala dos 2,5 milhões
de anos admitidos como duração do Quaternário… (J. Riser, 1999).
A variação do nível do mar ao longo do Fanerozóico e as lições a extrair dessa variação
Dada a complexidade do tema, em que jogam elementos cuja escala crono-espacial é muito
variável, parece-nos que um enquadramento cronológico, será útil e permitirá aos estudantes
88
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
estruturarem devidamente a sua compreensão do mesmo.
A emergência da teoria da tectónica de placas permitiu re-elaborar a hipótese do tectonoeustatismo. Com efeito, os continentes passam por fases alternadas de agregação e de rifting
(exemplo: formação da Pangea no final do Paleozóico e sua fragmentação no início do
Mesozóico).
A agregação de continentes diminui, naturalmente, a área de plataforma continental envolvente e
acaba por aumentar, deste modo, por aumento da profundidade média, a capacidade das bacias
oceânicas. Daqui decorre uma descida do nível do mar.
Pelo contrário, a existência de processos de rifting com intumescência térmica e elevação dos
fundos oceânicos na área das dorsais acaba por produzir uma diminuição da capacidade das
bacias oceânicas e transgressões generalizadas (A. Hallam, 1992). Trata-se de processos muito
lentos. A taxa de variação do nível do mar por causas tectono-eustáticas anda à volta de 1cm por
cada 1000 anos. As variações eustáticas devidas a estes fenómenos podem atingir valores entre
100 e 300m.
As variações glácio-eustáticas são muito mais rápidas (da ordem de 1cm por ano) e atingem
valores da mesma ordem de grandeza.
A fusão total dos glaciares da Antárctida e Gronelândia provocaria uma subida do nível do mar
da ordem dos 65-80m (A. Hallam, 1992). Juntando a esses valores os 120-140 m de variação do
nível do mar deste o máximo do Würm até à actualidade (J. M. A. Dias et. al., 1997), obtém-se
um valor entre 185 e 220m. Porém, não são os glaciares de montanha que podem provocar
grandes variações eustáticas, mas as grandes acumulações de gelo do tipo inlandsis. Esses
inlandsis demoram muito tempo a formar-se, o que faz com que apenas durante períodos
limitados do Fanerozóico essa causalidade possa ser invocada (fig. 63).
Nesta figura verificamos que existem processos de acumulação de gelo no interior dos
continentes, conduzindo à existência de níveis eustáticos baixos (assinalados com I, na figura),
nos seguintes períodos:
1. Final do Precâmbrico;
2. Transição do Ordovícico para o Silúrico;
3. Carbónico e Pérmico;
4. Quaternário.
Durante o resto do tempo um estado em que o efeito de estufa predominaria (assinalado com G
na figura), os níveis do mar seriam geralmente altos.
Para chegar à curva geral da variação eustática durante o Fanerozóico (fig. 64), é preciso contar
com os efeitos, já referidos, do tectono-eustatismo. É possível, nomeadamente, ligar a fase de
descida eustática do final do Paleozóico-início do Mesozóico com a construção da Pangea.
A contínua subida do nível do mar durante o Mesozóico poderá ser explicada, pelo contrário,
pela abertura e expansão dos oceanos que teve lugar durante o Mesozóico.
As colisões continentais da tectónica alpina poderão explicar a tendência geral para a descida do
nível do mar que se verifica durante o Cenozóico.
89
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Como é evidente, até pela análise das 2 curvas constantes da figura 64, existem ainda muitas
dúvidas a este respeito, mas há, apesar de tudo, uma certa concordância de conjunto. Também
nos parece útil salientar que se trata de fenómenos muito complexos dos quais escolhemos as
causalidades mais óbvias para ilustrar a interferência entre diferentes tipos de fenómenos, a uma
escala temporal da ordem das centenas de milhões de anos. Esta abordagem permite, ainda,
recordar elementos aprendidos durante disciplinas anteriores (Geografia Física de Portugal),
estruturando-os numa visão mais vasta e abrangente e facilitando a respectiva assimilação.
Variações do nível do mar durante o final do Cenozóico: a influência do diastrofismo
Durante o Neogénico verificou-se uma tendência geral para um progressivo arrefecimento (fig.
65). Essa tendência acentua-se durante o Quaternário, com fortes variações climáticas
(glaciações e períodos interglaciares, fig. 66) que se traduzem em importantes variações do nível
do mar5.
Devido à retenção de gelo no interior dos continentes, durante a última glaciação, o nível do mar
terá descido entre 120-140 m relativamente ao nível actual, o que se traduziu numa modificação
importante da linha de costa, sobretudo em locais onde a plataforma litoral é extensa e com
pouco declive na parte próxima dos continentes (mar do Norte, fig. 67) e num recuo da linha de
costa de 30-40km ao largo do Porto (J. M. A. Dias, 1997, fig. 68).
A fig. 69 representa uma proposta sobre a variação do nível do mar a partir de 20.000 BP. Um
dos aspectos mais interessantes diz respeito à inversão da tendência para uma subida rápida do
nível do mar que se verifica de 11.000 a 10.000 BP: durante esse período, que corresponde a uma
importante fase de arrefecimento (Dryas recente) verifica-se uma descida do nível do mar que
atinge perto de 20m. A subida é retomada por volta de 10.000 BP e prolonga-se até cerca de
5.000BP, quando o mar atinge, aproximadamente, o nível actual.
A transgressão flandriana tem uma importância muito grande na configuração actual dos nossos
litorais. Devido a esta transgressão, quase todos os litorais do globo correspondem a costas de
submersão. Exceptuam-se aquelas que foram directamente submetidas às glaciações e que,
sujeitas à sobrecarga dos grandes inlandsis sofreram um processo de afundamento durante a
glaciação (glacio-isostasia), do qual ainda estão a recuperar actualmente. A recuperação
isostática permite-lhes subir na crusta a uma velocidade que pode atingir 1m por século em
certos locais da Escandinávia.
A situação das áreas envolventes dos inlandsis corresponde a uma situação oposta: aquando da
glaciação, o afundamento da crusta sob o peso dos inlandis vai deslocar material infracrustal que
se desloca para a periferia dos inlandsis onde vai ascender provocando, nessas áreas, a existência
de um rebordo soerguido (forebulge, fig. 70).
A recuperação isostática das áreas anteriormente glaciadas vai fazer-se à custa da migração desse
material infracrustal. Por isso, na área do forebulge vai haver uma tendência à subsidência que
5
Os terraços resultantes dessas variações do nível do mar e da sua interferência com fenómenos diastróficos serão
objecto de um maior desenvolvimento quando nos referirmos à evolução da plataforma litoral da região do Porto
durante o final do Cenozóico.
90
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
vai acentuar a submersão provocada pela subida eustática. Essa tendência é responsável por uma
parte da subida relativa do nível do mar que se verifica nas áreas em questão (fig. 71), o que
poderá exagerar os dados relativos à variação do nível do mar acrescentando aos valores
puramente eustáticos, uma componente de subsidência (Pirazzoli, citado por R. Paskoff 2001, p.
25).
A uma escala maior, à volta da ilhas Britânicas, as taxas de variação relativa do nível do mar,
(fig. 72) mostram mudanças importantes entre locais bastante próximos, o que significa que
existem, decerto, circunstâncias locais (possivelmente sediadas no continente) que interferem
com a variação puramente eustática.
A representação (fig. 73) das tendências da variação do nível do mar nas estações maregráficas
da Península Ibérica incluídas na base de dados do PSMSL (Permanent Service for Mean Sea
Level) , ilustra:
1. Uma grande variação no comprimento das séries (os quadradinhos cor de rosa mostram o
número de anos que foram considerados para definir essa tendência). É evidente que os
dados só podem ser comparados, em rigor, se disserem respeito exactamente ao mesmo
período. Infelizmente, não é esse o caso.
2. Uma grande variabilidade de tendências, que se acentua na fachada norte (proximidade
dos Pirinéus e dos Cantábricos) e na fachada SE (proximidade da Cordilheira Bética). A
coincidência entre as maiores irregularidades e a situação junto de faixas tectonicamente
activas não deixa lugar para grandes dúvidas: as principais diferenças na variação do
nível do mar ficam a dever-se aos diferentes comportamentos tectónicos dos sectores em
causa.
Um fenómeno que ainda não foi referido é a hidro-isostasia. Para o ilustrar podemos recorrer à
fig. 74. Nesta figura verificamos que existe uma tendência para um fenómeno de subsidência que
afecta sobretudo as áreas submersas e que vai diminuindo à medida que nos aproximamos do
continente. O traçado das curvas e o seu paralelismo relativamente ao litoral sugere que se trata
de um fenómeno relacionado com o aumento da coluna de água que exerce pressão sobre os
fundos oceânicos que se verificou devido à transgressão flandriana. Esse aumento de pressão
contribuiu para um afundamento das ditas bacias, levando a uma deslocação de matéria
infracrustal para a área situada sob os continentes, que sofrem, assim, uma subida relativa (R.
Paskoff, 2001, p. 15).
A tendência para a erosão dos continentes e para a sedimentação nos fundos oceânicos tem
consequências análogas: um afundamento das bacias oceânicas e um levantamento nos
continentes (isostasia devida à erosão, fig. 60).
As áreas claramente subsidentes a nível do globo, onde a subida do nível do mar ultrapassa os
2mm/ano correspondem a sectores tectonicamente deprimidos (fig. 75) que muitas vezes
“atraem” cursos de água importantes que aí desaguam, construindo deltas. Ora, a acumulação de
sedimentos que ocorre nestas áreas produz fenómenos de subsidência por isostasia que tendem a
perpetuar a acumulação deltaica, que pode, assim, atingir vários milhares de metros. Porém, se
por qualquer motivo a sedimentação deixar de compensar a subsidência (o que pode acontecer
devido à construção de barragens, por exemplo), a subida do nível do mar pode provocar
invasões marinha importantes. É o caso, por exemplo do delta do Nilo depois da construção da
91
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
barragem de Assuão (R. Paskoff, 2001).
A fig. 76 representa as curvas da variação relativa do nível do mar em diversas estações
maregráficas. Com excepção de Estocolmo, onde joga o processo de recuperação isostática
acima referido, todas as outras apresentam em maior ou menor grau, uma tendência para a
subida.
Esse fenómeno também é visível no mapa da Figura 77. Trata-se de um mapa obtido por
altimetria espacial (fig. 61) e pretende mostrar a taxa de variação do nível do mar em mm/ano.
Uma vez que a maior parte das áreas estão representadas a cores quentes, isso significa que há
um predomínio de sectores onde se verifica uma subida do nível do mar. Como explicar essa
subida do nível do mar, que é independente das movimentações do continente de que falámos
atrás?
A influência das variações climáticas: a pequena idade do gelo e o aquecimento que se lhe
seguiu
Com vimos, um período de arrefecimento (exemplo: Dryas recente) pode traduzir-se em
variações importantes do nível do mar. Porém, mesmo variações climáticas muito mais
atenuadas têm reflexos nas curvas eustáticas (fig. 78). Esta figura representa a variação eustática
de 1700 a 1970.
O período anterior a 1825 corresponde à pequena idade do gelo que terá produzido uma certa
descida do nível do mar.
O período posterior a 1825 apresenta uma subida do nível do mar de cerca de 12 cm em cerca de
150 anos.
A variação eustática representada na figura acontece essencialmente por duas ordens de razões:
1. Um aquecimento global do clima traduz-se quase sempre numa diminuição da quantidade
de água retida nos continentes sob a forma de gelo, fazendo aumentar a quantidade
existente nos oceanos.
2. Além disso, um aquecimento produzirá uma expansão da água dos oceanos por puro
efeito térmico (termo-eustatismo, cf. fig. 60). Segundo R. Paskoff (2001) a expansão
térmica da água do mar será responsável de 0,3 a 0,7mm de subida do nível eustático.
O quadro da figura 79 representa, na coluna B, as tendências de variação do nível relativo do mar
a partir do registo de marégrafos com séries de mais de 70 anos. A esses valores devemos
acrescentar o valor da subsidência ligada à isostasia pós-glaciar, para obter os valores da subida
eustática. Fazendo um agrupamento das estações próximas (por exemplo, Lagos e Cascais), a
média dá valores da ordem de 1,92mm/ano.
Esta subida, só por si, embora possa produzir um recuo na linha de costa em média 100 vezes
superior, portanto da ordem de 19cm /ano (R. Paskoff, 1984), não é o fenómeno mais importante
para a erosão costeira, pensando-se que a variação do nível do mar contribuiu apenas com 10%
para a produção desse recuo (J.M. A. Dias et al. 1997).
Porém, quando a esta subida se associa uma subsidência do continente (deltas, periferia das áreas
glaciadas e sectores onde a exploração de lençóis freáticos ou de petróleo provoca um
92
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
abatimento dos terrenos) podem desencadear-se invasões marinhas importantes.
A recente subida do nível do mar e as projecções para o futuro
Nos últimos tempos tem-se instalado, primeiro na comunidade científica e depois na opinião
pública, um certo alarmismo relativamente às previsões de subida do nível do mar. Esse
alarmismo foi despoletado, a nosso ver, pelas previsões contidas no relatório do IPCC
(Intergovernmental Panel for Climate Change) de 1991 (fig. 80).
O relatório de 2001 (fig. 81), embora acabe por ter uma configuração semelhante, apresenta uma
maior complexidade, o que demonstra que muitas mais variáveis foram tomadas em linha de
conta. Verifica-se que as estimativas médias, onde se encontram a maior parte dos cenários
traçados apresentam uma proposta de subida do nível do mar, no ano de 2100 relativamente ao
ano 2000, de cerca de 35cm. Ora, esse valor é idêntico à estimativa mais baixa apresentada 10
anos antes. É no mesmo sentido que vão as afirmações do “Summary for police makers”
(http://www.ipcc.ch/pub/spm22-01.pdf):
“Furthermore, it is very likely that the 20th century warming has contributed significantly to the
observed sea level rise, through thermal expansion of sea water and widespread loss of land ice.
Within present uncertainties, observations and models are both consistent with a lack of
significant acceleration of sea level rise during the 20th century”.
É no mesmo sentido que vão as previsões da maior parte dos especialistas. Com efeito, na figura
82 verifica-se que as primeiras projecções sobre a variação do nível do mar, em 1983, admitiam
valores máximos de 3,5m de subida no final do século XXI. Em 2001, a previsão máxima do
IPCC é de cerca de 75 cm (fig. 81). E quanto à previsão mínima admite-se que ela possa ser de
apenas 10cm (o que, curiosamente, se assemelha à variação da curva de Mörner de 1973 – fig.
75).
Prática
Variações do nível do mar segundo o PSMSL – obtenção e manuseamento das bases de dados e
sua transformação em folhas de cálculo (Excel). Construção de curvas da variação do nível do
mar para diversos locais do mundo em diferentes contextos tectónicos (fig. 83). Definição das
respectivas tendências e comparação das diferentes curvas.
Bibliografia
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
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http://www.ipcc.ch/
http://www.ipcc.ch/pub/spm22-01.pdf
Coastal Geology group da Universidade do Hawai
http://www.soest.hawaii.edu/coasts/csrg1.html
94
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 59: O papel das variações relativas do nível do mar no avanço ou recuo da linha de
costa
Figura 60: Os factores em jogo nas variações relativas do nível do mar
95
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 61: Processo de determinação do nível do mar a partir da altimetria espacial
96
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 62: Deformações da superfície do geóide
Figura 63: As grandes fases na evolução do nível do mar durante o Fanerozóico e a sua
relação com o efeito de estufa (G. de Greenhouse) e com as fases de glaciação (I de Ice)
97
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 64: Duas curvas eustáticas para o Fanerozóico
98
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 65: Variação climática no final do Cenozóico (extraído de Andersen e Borns, 1994)
99
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 66: Variação climática e do nível do mar durante o Quaternário (fig. extraída do
site http://www.soest.hawaii.edu/coasts/csrg1.html)
100
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 67: Configuração da linha de costa e rede de drenagem na área das Ilhas Britânicas
e do mar do Norte
101
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 68: Variações da linha de costa de Portugal a partir de 18.000BP
102
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Figura 69: Proposta de variação do nível médio do mar na margem continental portuguesa
desde o último máximo glaciário
Figura 70: O rebordo do inlandsis e o seu colapso no período pós-glaciar
103
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 71: Taxa das variações relativas do nível do mar nas áreas glaciadas e na sua
periferia
104
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 72: Recentes variações do nível do mar à volta da ilhas Britânicas. É de notar a
existência de variações importantes na taxa de variação mesmo em locais bastante
próximos.
105
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Figura 73: Tendências da variação relativa do nível do mar verificadas nas estações
maregráficas da Península Ibérica
106
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Figura 74: Subsidência versus levantamento devidos a fenómenos de hidro-isostasia
107
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Figura 75: Localização dos litorais subsidentes a nível do Globo
108
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 76: Variações recentes do nível médio relativo do mar em 6 estações
maregráficas
109
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 77: Taxa de variação do nível do mar no período de Janeiro de 1993 a Dezembro de
2000
110
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 78: Variação do nível do mar de 1700 até 1970
111
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 79: Tendências no comportamento do nível relativo do mar em diferentes locais do
mundo, com base em séries maregráficas com mais de 70 anos.
112
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Figura 80: As projecções do IPCC: relatório de 1991 (extraído de E. Bird, 1993)
Figura 81: As projecções do IPCC (relatório de 2001:
Extraído de: http://www.ipcc.ch/pub/spm22-01.pdf
113
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Fig. 82: As taxas de variação do nível do mar, respectivos intervalos e sua variação no
tempo
114
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7300
Cascais
7200
7100
7000
6900
6800
6700
Fonte: Permanent Service for Mean Sea Level (PSMSL)
6600
1882
1902
1922
1942
1962
Figura 83: A curva do marégrafo de Cascais
115
1982
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Aula 6: Costas rochosas
Introdução: definição de costas rochosas
Ao contrário da vasta bibliografia existente para os litorais arenosos, a bibliografia para os
litorais rochosos é relativamente escassa e baseia-se muito nos textos de Sunamura e também nos
de Trenhaile. Isto acontece, a nosso ver, porque, num meio tão dinâmico como é a interface entre
o mar e o continente, uma evolução rápida e espectacular parece ser mais atractiva do que uma
evolução relativamente lenta, e onde os métodos de investigação têm que ser obrigatoriamente
adequados a essa relativa lentidão de processos.
Antes do mais é importante definir o que se entende por costa rochosa e apresentar alguns dos
respectivos elementos morfológicos (fig. 84). Segundo Sunamura (1992), costa rochosa é uma
costa em arriba, composta por material consolidado, independentemente da sua resistência. No
mesmo texto, Sunamura propõe-se estudar costas compostas por materiais que vão desde o
granito ou basalto até materiais pouco coerentes como os depósitos glaciares.
Factores a considerar na evolução das costas rochosas
Os factores a considerar na evolução das costas rochosas são, basicamente, a energia das ondas e
o tipo de rocha. Porém, a energia da ondulação depende da quantidade de sedimentos que se
sobrepõem ao substrato rochoso. Essa quantidade depende do balanço sedimentar de cada troço
costeiro que depende, por sua vez (fig. 85):
•
do fornecimento de sedimentos de e para a plataforma continental;
•
da deriva litoral;
•
dos sedimentos trazidos pelos rios;
•
dos materiais resultantes da erosão das arribas.
Os sedimentos existentes sobre o substrato rochoso, por um lado contribuem para o seu desgaste,
funcionando como abrasivos, mas, por outro, podem protegê-lo da acção das ondas. Porém
quando a cobertura sedimentar é suficientemente espessa para impedir que a acção das ondas
actue sobre o bedrock, estamos já na presença de uma praia.
Tipos de ondas na base das arribas e sua dinâmica
Há 3 tipos de ondas que podem ocorrer na base de uma arriba quando a onda incide
paralelamente à linha de costa (fig. 86): ondas estacionárias, ondas a quebrar e ondas já
quebradas.
A respectiva ocorrência depende da relação entre a profundidade na base da arriba e a
profundidade a que as ondas quebram. Se a profundidade na base da arriba for superior à
profundidade a que um tipo específico de onda pode quebrar6, formam-se ondas estacionárias.
Se a profundidade for idêntica a esse valor, a onda rebenta sobre a arriba. Se a profundidade for
6
O que acontece quando o declive da onda, que corresponde à altura/comprimento de onda, é superior a 1/7
(Thurman, 1997).
116
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
inferior, a onda rebenta mais para o largo e já chega rebentada à base da arriba (fig. 86).
Uma vez que o declive da onda é muito condicionado pelo atrito com o fundo, a ocorrência de
cada uma destas hipóteses depende basicamente do declive deste e das características da
ondulação. Isto significa que, num sector costeiro determinado, quando as ondas são de pequena
altura podem originar ondas estacionárias. A variação da pressão que estas exercem com o tempo
é relativamente pequena (fig. 87, a), mas pode ir-se acentuando à medida que a onda se torna
mais alta, tornando-se cada vez mais dissimétrica até que o rebentar da onda origina um grande
pico de pressão, praticamente instantâneo (fig. 87, b). Se tiverem mais do que essa altura crítica,
as ondas chegam à base da arriba já quebradas e, embora a sua passagem corresponda a um
aumento grande de pressão estamos muito longe do pico que acontece no caso anterior (fig. 87,
c).
O problema da pressão dinâmica sobre as arribas produzida pelo quebrar das ondas é analisado
na figura 88: verifica-se que não há acordo entre os diferentes investigadores e que,
provavelmente, o máximo de pressão deverá situar-se ao nível da água parada (still water level,
swl), ou um pouco acima desse nível.
A resistência das rochas: alguns apontamentos sobre a meteorização em ambiente litoral
Para além da resistência mecânica dos minerais componentes e da susceptibilidade à alteração
química (dependentes, essencialmente da composição das rochas), a existência de fracturas e
descontinuidades de diversos tipos tem um papel primordial na definição da capacidade que uma
determinada rocha tem de resistir às pressões mecânicas do tipo daquelas a que estão sujeitas as
rochas batidas pelas ondas.
Um outro factor é a “fadiga” que as rochas adquirem justamente devido a compressões cíclicas
do tipo das que ocorrem com o quebrar das ondas. Essa fadiga induz uma microfracturação que
diminui a resistência da rocha, cujas depressões e reentrâncias poderão vir a ser alargadas e
depois exploradas por acção das ondas, de molde a facultar o arranque de pedaços de rocha.
Como pode ver-se na figura 89, o aumento do número de ciclos de pressão diminui a resistência
à fadiga das rochas. O mesmo acontece com a saturação da rocha: a existência de água diminui
fortemente o limite de fadiga das rochas.
Na figura 90 pode ver-se que o aumento de profundidade produz uma significativa diminuição da
porosidade numa rocha granítica e um correlativo aumento da resistência. A porosidade da rocha
próximo da superfície deve-se, essencialmente, à meteorização química a que as rochas ricas em
feldspato estão especialmente sujeitas.
A água do mar próxima da superfície está geralmente saturada de carbonatos. Porém, durante a
noite, alguns organismos produzem CO2 e, por isso, a água torna-se, de novo, capaz de dissolver
o carbonato de cálcio.
A crioclastia, a haloclastia e a hidroclastia podem ser particularmente activas em meio litoral.
Por outro lado, os fenómenos de descompressão são responsáveis pela abertura de fracturas
paralelas à superfície topográfica, que são muito importantes em rochas graníticas.
Também os seres vivos são responsáveis por fenómenos de bio-corrosão e têm um papel muito
activo no alargamento das fracturas nas faixas litorais.
117
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Processos de erosão nas arribas
Quando as ondas escavam a base da arriba esta torna-se instável devido ao aumento de declive e
à instabilidade provocada pelo sub-escavamento (fig. 91). Essa instabilidade induz movimentos
de massa de diversos tipos (queda de blocos, deslizamentos e fluxos de detritos). A forma e a
intensidade desses movimentos depende muito do tipo de rocha e da respectiva estrutura, bem
como do clima que pode facilitar ou não certos tipos de meteorização (química nos climas
tropicais, mecânica nos climas frios e áridos).
Os movimentos de massa espalham detritos na base da arriba, o que significa que a erosão não
pode continuar enquanto eles não tiverem sido transformados em materiais transportáveis pelas
ondas e correntes litorais.
Quando as ondas batem na face da arriba, há uma força compressiva que actua
perpendicularmente à arriba. Se a arriba tem fracturas, o ar situado nos interstícios é
violentamente comprimido. Quando a onda recua, dá-se um processo de descompressão. Desta
forma os interstícios da rocha são alargados e a rocha vai-se fragmentando por um processo de
arranque (“quarrying”, Sunamura, 1992). A descompressão que ocorre no refluxo da onda ajuda
ainda a transportar os materiais desagregados.
As ondas, armadas com os detritos arrancados à arriba vêem a sua força aumentada. Deste modo,
os choques destes materiais com as rochas vão contribuir para o arranque de partículas de
diversos tamanhos. Este processo acaba por produzir um polimento característico na superfície
das rochas.
A força de ataque da onda ocorre quase instantaneamente , mas, ao contrário de forças actuantes
noutros ambientes, sofre mudanças cíclicas de acordo com a amplitude das marés.
É difícil quantificar os resultados da acção das ondas sobre rochas com descontinuidades
(devidas à estratificação, xistosidade ou tectónica) e ainda menos determinar de forma
quantitativa a importância do tipo e grau de meteorização das rochas na definição da velocidade
de recuo das arribas. É de esperar, todavia, que um ataque cíclico, como aquele a que são
submetidas as rochas no ambiente costeiro, intensifique a fadiga das rochas e diminua a sua
resistência.
O uso de modelos de laboratório esbarra com algumas dificuldades. Não é fácil criar um produto
que, em ambiente de laboratório, tenha um comportamento semelhante ao das rochas num
ambiente natural. Todavia, o uso de areia cimentada tem dado bons resultados. Mais difícil ainda
é modelizar as descontinuidades existentes nas rochas.
Na figura 92 é possível ver o resultado duma modelização feita com ondas já quebradas: quando
se atinge um certo limiar (20 horas de experiência), as areias resultantes da desagregação do
cimento na área do entalhe produzido pelas ondas (no nível da água parada: still water level)
aumentam a velocidade de escavamento. Porém, a partir das 30 horas essa velocidade estabilizase porque a referida acumulação de areias dissipa a energia das ondas (fig. 93). Com efeito, em
arribas compostas por sedimentos terciários na Califórnia verificou-se que o recuo das arribas se
tornou mais lento à medida que a praia se ia alargando. Com 20m de largura de praia, o recuo
das arribas era já muito lento e cessava completamente quando a praia atingia 60 m de largura
(Sunamura, 1992).
118
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Mesmo em plataformas de erosão marinha cobertas normalmente por praias, se uma tempestade
arrastar as areias, as ondas podem atingir a arriba que se torna temporariamente activa e pode
sofrer um recuo apreciável, desde que seja constituída por rocha pouco resistente.
De um modo geral, é nas grandes tempestades, quando as ondas têm uma maior energia e o nível
do mar está sobrelevado devido a storm surges, que se verificam maiores recuos das arribas. Ora,
justamente nessa altura, é difícil fazer observações directas. Por isso, muitas vezes, a velocidade
de recuo das arribas estuda-se através de fotografias aéreas ou até, com base em grafitti datados.
Os movimentos de nas arribas podem ser de diversos tipos, como pode ver-se na figura 94.
Podem ir desde a simples queda de blocos (94-a), ao seu basculamento com queda posterior (94b). Os deslizamentos (94-c) podem ser de tipo planar ou rotacional. Em rochas apropriadas
podemos encontrar fluxos de detritos (94-d).
Erosão submarina do bedrock
A erosão nas costas rochosas não se processa só na base das arribas, mas também ao longo do
fundo marinho que se desenvolve a partir da base da arriba. Neste domínio a informação
existente é muito menos abundante do que a que respeita à erosão na base das arribas. Esse facto
fica a dever-se à dificuldade de avaliação devida à lentidão do processo e ao facto destas
plataformas estarem total ou parcialmente submersas.
A força de ataque das ondas aumenta quando existem sedimentos mobilizáveis em contacto com
a plataforma. Quando a cobertura se torna demasiado espessa essa força deixa, como é óbvio, de
exercer-se. A resistência da rocha é um factor da maior importância, que depende tanto da
respectiva composição como das descontinuidades que a afectam.
A erosão vertical das plataformas é muito mais lenta que o processo de escavamento dos
entalhes7 da base das arribas. A respectiva relação varia entre 2-5% (Sunamura, 1992).
Além disso, o escavamento das plataformas, fazendo aumentar a sua profundidade acaba por
reduzir a intensidade das forças que actuam sobre os fundos. Trata-se, por isso, de um processo
que se auto-limita e que se torna mais lento com o tempo, desde que o nível do mar não sofra
oscilações.
É pertinente, por isso, definir qual o nível de base da rebentação (=surf base, Sunamura 1992)
que corresponde à profundidade a que as ondas quebram em situação de tempestade. Essa
profundidade anda à volta de 10m em costas abertas.
Plataformas de erosão marinha
Os nomes atribuídos a estas plataformas são muito variados, sobretudo em língua inglesa
(Sunamura, 1992, p. 139). Todavia, uma das designações que é mais utilizada é a de plataforma
de abrasão marinha que dá conta de um dos processos actuantes na sua elaboração. Porém, dado
que o afeiçoamento destas plataformas não se deve só a este processo, parece-nos melhor a
designação de “plataforma de erosão marinha” (Tricart, 1977).
7
Temos vindo a utilizar a expressão “entalhe basal” que preferimos à palavra “sapa” (Moreira, 1984) como tradução
para encoche e notch.
119
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
A cota destas plataformas pode ser muito interessante para a identificação de movimentos
tectónicos… mas antes de nos lançarmos nessa via é necessário compreender o mecanismos da
sua formação.
Na figura 95 podemos ver os resultados de experiências com modelos reduzidos levadas a cabo
por Sunamura, das quais se podem extrair algumas conclusões:
• A cota das plataformas talhadas em rochas resistentes é superior à das plataformas talhadas
em rocha branda.
• As plataformas criadas por ondas quebradas evoluem mais lentamente do que as criadas por
ondas a quebrar. As ondas a quebrar são capazes de rebaixar mais facilmente a superfície em
que actuam e produzem, por isso, plataformas mais baixas. Como é evidente, se a
profundidade existente for inferior à profundidade a que as ondas de tempestade quebram,
dentro das referidas ondas, só as já quebradas poderão embater na arriba.
• Dado o ponto anterior, torna-se evidente que a amplitude das marés vai, também, interferir
no resultado final.
Na figura 96 é possível observar os três tipos fundamentais de morfologia nas costas rochosas:
plataforma descendo para o mar, plataforma horizontal e arriba mergulhante.
Dado que é usada correntemente, utilizaremos também a designação de plataformas do tipo A
para as plataformas com declive em direcção ao mar e do tipo B para aquelas que são
aproximadamente horizontais (Sunamura, 1992). Dentro de cada um destes grandes tipos pode
haver muitas variedades (Sunamura, 1992) dependentes de:
• tipo de rocha e respectiva estrutura,
• condições de meteorização o e clima,
• marés,
• exposição à ondulação,
• herança de pequenas variações do nível do mar.
As arribas mergulhantes podem corresponder a antigas arribas submersas por movimentos
tectónicos ou por subida do nível do mar. Também pode tratar-se de escarpas de falha ou
corresponderem a uma actividade vulcânica recente. As margens dos fiordes também funcionam
como arribas mergulhantes. De um modo geral estas arribas mergulhantes recuam muito pouco,
porque os fundos marinhos, nas suas proximidades, se situam abaixo do nível de base da
rebentação (fig. 99). Com efeito, as ondas só afectam o fundo se este estiver acima deste nível e
se puderem arrancar alguns sedimentos do mesmo fundo.
Doutra forma, a reflexão das ondas provocada pelas arribas mergulhantes pode produzir ondas
estacionárias com pouco efeito erosivo (fig. 86).
Parece haver também a tendência para estas arribas mergulhantes ocorrerem em rochas bastante
resistentes.
A principal diferença entre as plataformas de tipo A e B é a existência de um degrau abrupto
separando a área aplanada das zonas mais profundas (fig. 96).
Quanto à cota de início das plataformas de tipo A, Sunamura parece inclinar-se para a ocorrência
a uma cota próxima do nível médio das marés altas, mas insiste na existência uma certa
variabilidade espacial.
120
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
C. Andrade (2002), num estudo sobre as plataformas de erosão marinha na costa portuguesa
apresenta perfis (fig. 97) com 2 sectores: um sector de declive mais baixo situado abaixo do nível
médio do mar (1). Acima do nível médio desenvolve-se uma rampa (2), com um declive mais
elevado que termina no nível das marés mais altas.
Este modelo parece-nos adequado ao que temos observado na linha de costa entre Vila do Conde
e Espinho (fig. 98), onde as plataformas encontradas parecem corresponder ao tipo A.
Segundo Sunamura (1992) a existência de um degrau nas plataformas de tipo B significa,
basicamente, que a força das ondas não é suficiente para vencer a resistência da rocha, embora se
deva dizer que as opiniões dos investigadores variam bastante quanto às causas de ocorrência de
um ou outro tipo de plataformas e que as plataformas do tipo B parecem ser particularmente
enigmáticas. Segundo Sunamura, estas plataformas acontecem porque, durante a transgressão
flandriana, o degrau que limita as plataformas sofreu uma submersão rápida que o transformou
numa arriba mergulhante. Porém, a complexidade da evolução do nível do mar durante o
Holocénico e a possível interferência com movimentos tectónicos e com ajustamentos isostáticos
introduz muitas incertezas nesta explicação.
Nas áreas relativamente estáveis, as plataformas formadas pelo estacionamento do mar no
máximo holocénico foram sofrendo algumas modificações devido às acções posteriores que
sofreram. As medidas por MEM (micro elevation meter, fig. 100) dão valores aparentemente
baixos, mas ainda assim, significativos (0,2-0,7mm/ano em grauvaques, na costa SE da
Austrália).
Dado que estes processos podem ter funcionado durante cerca de 6000 anos, podemos ter como
valor mínimo 1,2 metros e como máximo 4,2, o que está longe de ser negligenciável!
Algumas formas de erosão características
Embora sejam formas muito interessantes e às vezes espectaculares, os entalhes basais em rocha
não calcária têm sido pouco estudados. A figura 95 representa entalhes associados a plataformas
do tipo A [a), b), c) e a arribas mergulhantes, d)]. O papel da abrasão é óbvio até pelo facto de as
rochas aparecerem polidas (fig. 101). A figura 99 mostra claramente que a cota a que eles são
mais profundos varia mesmo em condições experimentais, aparecendo quer ligeiramente acima
do nível da água parada, quer ligeiramente abaixo. A existência de marés introduz novas
complicações na definição da altura a que os entalhes se desenvolvem.
Há um certo predomínio de entalhes ao nível médio, mas podem aparecer até cerca de 1m acima
e até, nas áreas abrigadas, o máximo escavamento acontece perto do nível das marés baixas.
Na área que estudámos, os entalhes aparecem frequentemente ligados à existência de fracturas
que são aproveitadas pela erosão marinha. Muitas vezes essas fracturas são oblíquas em relação à
linha de costa e forma-se uma espécie de corredor de erosão, ao longo do qual se desenvolve um
entalhe contínuo cuja cota vai subindo desde o limite exterior, do lado do mar, até ao limite
interior, acompanhando a cota da plataforma de erosão marinha que se desenvolve na sua base
(figs. 103 e 104)
Sempre que a rocha é passível de dissolução, o desenvolvimento dos entalhes torna-se mais
evidente e encontram-se, em ambientes tropicais, formas espectaculares (fig. 105). Nessas
121
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
condições também se podem encontrar interessantes formas de pormenor (vasques, tafoni),
diversificadas consoante o tipo de rocha em presença.
As grutas correspondem a aberturas nas arribas em que em que a profundidade é maior que a
abertura. Aparecem em rochas relativamente resistentes explorando as descontinuidades nelas
existentes (fig. 106). Devido à existência da própria cavidade, os fenómenos de compressão e
descompressão actuam nas grutas de forma particularmente forte, o que contribui para a sua
evolução e manutenção.
Quando as ondas, atacando ambos os lados de um promontório, conseguem perfurá-lo, pode
formar-se um arco (fig. 107). Os arcos são formas relativamente efémeras. Quando a parte
superior colapsa o arco desaparece e passamos a ter um”sea stack” (pináculo, penhasco). Porém,
nem todos os pináculos resultam da destruição de arcos: diques de rochas resistentes intruídos
em materiais mais brandos podem resultar em formas deste tipo (fig. 110).
A submersão de áreas previamente carsificadas pode originar formas como os arcos da Ponta da
Piedade (Lagos, fig. 109).
As marmitas têm uma forma cilíndrica e são escavadas por acção de materiais abrasivos de
diversos tamanhos. Têm uma secção predominantemente circular . Geralmente são mais largas
do que fundas. A existência de depressões prévias, por vezes ligadas à passagem ou cruzamento
de diaclases (fig. 111) poderá permitir uma acumulação de materiais e o seu turbilhonar
desenvolverá o efeito abrasivo típico das marmitas.
As bacias de dissolução aparecem em rochas calcárias. Apresentam um fundo plano e
desenvolvem-se a partir de pequenas depressões, por dissolução de calcite durante a noite,
quando se dá uma diminuição do PH devida à respiração dos seres vivos que vivem nessas
depressões. Depois há uma remoção dos produtos residuais por acção das águas do mar. Estas
depressões estendem-se lateralmente, conservando paredes verticais e podendo originar
depressões mais amplas e com um contorno irregular por coalescência de várias bacias pequenas
(fig. 112). Estas bacias designam-se, por vezes, pelo termo francês (vasques).
Tafoni e alveólos: caracterizam-se pela existência de depressões na superfície das rochas.
Aparecem em rochas ígneas (granitos, basaltos) mas também em diversos tipos de grés. As suas
dimensões podem ir de alguns cms a vários metros. Encontram-se em vários ambientes e não só
no meio litoral, mas também em áreas com uma certa secura. São devidos, essencialmente, a
fenómenos de desagregação mecânica (halo e hidroclastia). No caso de ocorrerem na zona
costeira aparecem na zona da salsugem, acima do nível das marés mais altas (fig. 113).
Bibliografia utilizada:
ANDRADE, C. ET AL., (2002) – Shore platform downwearing and cliff retreat in portuguese
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
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Paris, SEDES, 345 p.,
Web site:
http://www.trekdiary.com/99mad5.html
Prática:
Depois de enunciados os principais processos geomorfológicos que actuam nas costas rochosos,
a aula prática será construída a partir da identificação dos referidos processos em actuação em
diversas situações quanto à litologia e ao clima. Esse trabalho será feito a partir de fotografias
selecionadas, algumas das quais estão incluídas neste texto.
Figura 84: Paisagens e terminologia nos litorais rochosos
123
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 85: O balanço sedimentar num determinado sector costeiro
Figura 86: Tipos de rebentação na base das arribas
124
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 87: Distribuição das pressões actuando na base das arribas com ondas
estacionárias, a quebrar ou já quebradas
Figura 88: Distribuição vertical da energia produzida pelo quebrar das ondas
125
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 89: Relação entre a fadiga dos materiais, o número de ciclos de pressão e a
existência ou não de água
Figura 90: O papel da profundidade e da decorrente diminuição da porosidade na
126
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
resistência de uma rocha granítica
Figura 91: o sistema de recuo das arribas: a erosão basal é essencial para um recuo
contínuo da arriba.
Figura 92: Velocidade de recuo de uma arriba artificial e formação de uma praia na sua
frente. O entalhe desenvolve-se obliquamente, originando uma rampa.
127
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 93: Velocidade de escavamento de uma arriba composta de areia aglutinada por um
cimento.
128
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 94: Movimentos de massa nas arribas
129
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 95: Formas de entalhes basais em rocha não calcária
130
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 96: Os três tipos fundamentais de morfologia nas costas rochosas: plataforma
descendo para o mar, plataforma horizontal e arriba mergulhante
131
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 97: Perfis de algumas plataformas de erosão marinha situadas na costa portuguesa
132
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 98: Antiga plataforma de erosão marinha; é de notar a existência de um sector
inferior, com baixo declive (1) e uma rampa (2) que, neste caso tem um declive de cerca de
13° (Praia de Vila Chã, Vila do Conde). Nesse momento o nível do mar estava praticamente
no nível médio. A seta corresponderia ao nível médio do mar contemporâneo da
plataforma. Este situar-se-ia claramente acima do nível actual
Figura 99: Tipos e desenvolvimento de entalhes basais em ambiente de laboratório
133
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 100: Costa da Galiza: colocação de instrumentos de medida da degradação da
superfície em plataformas de erosão marinha (Micro Elevation Meter, MEM), feita sob a
supervisão de A. Trenhaile.
134
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 101: Entalhe basal em gneisses muito resistentes. Rochedo do Srª da Pedra,
Miramar, V. Nova de Gaia
135
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 102: Entalhe basal e rochas pedunculadas na praia de Salgueiros, V. Nova de Gaia
Figura 103: Entalhe basal desenvolvendo-se em rampa a partir do nível da maré baixa.
Praia de Vila Chã, Vila do Conde
136
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 104: Entalhe basal desenvolvendo-se em rampa e plataforma de erosão marinha
adjacente (parcialmente coberta de areias). A sul da Praia de S. Paio, Labruge, Vila do
Conde
137
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 105: Formas litorais (plataformas do tipo B) em diversos tipo de rocha, nas regiões
tropicais
138
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 106: O aproveitamento das superfícies de descontinuidade no desenvolvimento de
uma pequena gruta no granito calco-alcalino de Lavadores. Esta reentrância desenvolve-se
acima do nível das marés mais altas, numa área muito exposta e deverá corresponder a
uma herança de um nível relativo do mar ligeiramente mais alto
139
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 107: Arcos de erosão: Praia de As Catedrais, Litoral Norte da Galiza, entre Foz e
Ribadeo (Concelho de Barreiros, Província de Lugo).
140
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 108: Fotografia aérea da praia das Catedrais, com indicação de algumas das
direcções estruturais mais relevantes
Figura 109: Aspecto do carso exumado da Ponta da Piedade (Lagos, Algarve). Frente ao
arco podem ver-se 2 pináculos (sea stacks)
141
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 110: Pináculo resultante de um dique intruído nas rochas basálticas (Madeira.
Extraído do site http://www.trekdiary.com/99mad5.html
142
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 111: Conjunto de marmitas orientadas pela acção de fracturas: Praia de Lavadores
(V. Nova de Gaia)
143
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 112: Bacia de dissolução no beach rock da Praia do Xai-Xai (Moçambique)
Figura 113: Alvéolos nos gneisses biotíticos muito resistentes do rochedo do Sr. da Pedra
(Praia de Miramar, V. Nova de Gaia). Altitude: cerca de 9m acima do nível médio das
águas do mar.
144
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Aula 7: Litorais móveis: praias e dunas litorais
Introdução: costas rochosas versus litorais móveis
Ao contrário do que o senso comum poderia levar a pensar, o mar é um consumidor e não um
criador de areias. É fácil compreender isso, já que o mar, mesmo se actua com muita energia, fálo numa estreita faixa. Os rios, pelo contrário actuam sobre quase toda a superfície terrestre, e
levam os produtos da meteorização das imensas superfícies continentais e da erosão que
efectuam até ao mar, onde são depois mobilizados e distribuídos pelos litorais. Uma análise mais
aprofundada sobre a origem dos sedimentos litorais é visível na figura 114.
Na aula anterior quando falávamos das plataformas de erosão marinha dissemos que, se a
cobertura sedimentar for suficientemente espessa para impedir que as ondas ataquem a
plataforma de erosão, já teremos uma praia e não uma costa rochosa.
Com efeito, o recuo de uma arriba fará com que, a pouco e pouco, as ondas deixem de atacar a
parte interior da plataforma de erosão marinha. Nesse caso, desde que haja sedimentos
disponíveis, esta será coberta de materiais, de tal forma que praticamente deixa de funcionar e a
arriba será transformada em arriba estabilizada. A continuação do processo, com manutenção ou
ligeira descida do nível do mar transformará a arriba numa arriba morta (fig. 115).
Por outro lado, a erosão das areias das praias, muitas vezes faz aparecer as plataformas que lhes
servem de suporte.
Uma boa parte das praias do norte de Portugal, entre Caminha e Espinho, está ou pode vir a
sofrer esse fenómeno.
Uma breve análise das cartas geológicas de escala 1:50.000 permitiu-nos avaliar a extensão das
áreas onde, segundo a referida cartografia, o bed-rock entra em contacto directo com o mar.
Verifica-se que corresponde a 23% do perímetro total estudado (figura nº 116).
Os sectores arenosos correspondem a mais de metade da área em apreço.
Foi necessário introduzir uma categoria que abrangesse as áreas onde areias de praia e
afloramentos do bed-rock coexistem. Este aflora pontualmente, constituindo arribas baixas
(praias de Lavadores, da Foz do Douro, de Labruge), ou "rochedos" que emergem das areias da
praia e se elevam acima do nível médio das águas do mar. Essas áreas têm uma
representatividade (25% do total) semelhante à do litoral rochoso.
Existe uma relação genética evidente entre esses três tipos de litoral.
Como as praias arenosas estão assentes sobre afloramentos rochosos, a erosão das areias pode
fazer aflorar as formações graníticas ou metamórficas do Maciço Hespérico. Desse modo, o
troço em questão passa a entrar na categoria de "praia com rochedos". Este processo pode ser
ocasional ou estacional, sucedendo durante as tempestades de inverno.
Noutros locais, quando os afloramentos rochosos se desenvolvem a cota mais elevada,
constituem pontões rochosos circundados por pequenas arribas mergulhantes. Estes troços
rochosos, geralmente pouco elevados (as arribas não ultrapassam os 20 metros) e de pequena
dimensão, raramente são contínuos. Geralmente, nas suas reentrâncias, instalam-se praias
arenosas mais ou menos extensas (praias de bolso).
145
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Neste capítulo estudaremos os litorais móveis. Isto significa que, além das praias arenosas
trataremos também, na medida do possível, as praias constituídas por elementos grosseiros
(calhaus, blocos). Uma vez que as praias e as dunas constituem um sistema em que há uma
constante troca de sedimentos faz sentido estudá-las no mesmo capítulo.
Perfil de praia. Terminologia básica
Trata-se de um tema algo difícil. Com efeito, a existência de terminologia em inglês e em
francês, bem como variações importantes dentro destas duas línguas, faz com que exista uma
certa confusão que não convém que seja transmitida aos estudantes.
Um dos esquemas mais simples é o que reproduzimos na fig. 117, da autoria de R. Paskoff.
O modelo de Guilcher (fig. 118) é um pouco mais complexo, juntando ao esquema de base
alguns elementos adicionais que podem ajudar os estudantes a situar algumas das estruturas
típicas de cada um dos sectores.
O esquema de Moreira (1984, fig. 119) tem a vantagem de nos apresentar designações em
português com os equivalentes em francês e inglês que são sempre úteis, dado que muita da
bibliografia disponível se encontra em inglês.
As praias têm nomes específicos em certos tipos de ocorrência. Serão, por isso, definidas as
noções de praia de bolso, tombolo (fig. 121), flecha litoral ou restinga, praia em ponta e ilha
barreira (fig. 120).
Rebentação e construção dos cordões litorais
Quando as vagas quebram, a onda que estava num processo de translação, uma vez que as baixas
profundidades atrasavam a sua progressão pela base, vai formar o jacto de rebentação que sobe
pela face da praia. Nessa subida ele vai arrastar sedimentos que deposita quando a sua força se
esgota. Segue-se o refluxo, em que a água transportada pela onda desce pala face da praia. Como
é evidente, a capacidade de transporte do refluxo depende da quantidade de água que desce a
face da praia. Por isso, a porosidade dos materiais da praia é muito importante. Se a porosidade
for baixa, uma boa parte dos materiais transportados pelo jacto de rebentação vai ser arrastada
até à linha de inflexão, de onde podem ser mobilizados na próxima onda. Mas se a praia for
constituída por materiais grosseiros, a maior parte da água infiltra-se e o refluxo tem muito pouca
capacidade. As acções construtivas predominam e o declive da praia torna-se maior.
É isso mesmo que se pode verificar na figura 123.
Do mesmo modo, o jogo entre o jacto de rebentação e a ressaca ajuda a explicar a formação das
cúspides de praia (fig. 124) Estas são formas rítmicas que podemos encontrar em muitas praias,
onde também é possível identificar bermas devidas à existência de marés vivas e de ondas de
tempestade, que constróem cordões litorais a cotas mais elevadas (fig. 125).
Regra de Brunn. Perfil de verão e de inverno.
Na figura 126 é possível analisar as consequências de uma variação do nível do mar no perfil de
uma praia. Segundo a regra de Brunn, a profundidade a que cobertura de sedimentos se situa
mantém-se constante. Logo, uma subida do nível do mar vai implicar uma sedimentação sobre o
fundo até se atingir a mesma profundidade. Ao mesmo tempo, existe uma migração da linha de
146
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
costa para o interior. Uma subida do nível do mar implica por isso uma erosão na face da praia e
acumulação destes sedimentos na área imersa.
Este fenómeno pode funcionar a diferentes escalas temporais. Assim, durante o inverno, devido à
existência de ondas de tempestade e a possível sobre-elevação de origem meteorológica (storm
surge) tudo se passa como se houvesse uma subida do nível do mar. O perfil torna-se mais tenso
junto à antepraia (no sentido que lhe é atribuído por S. Carvalho, ver fig. 119), podendo escavarse uma arriba nas dunas. A praia emersa vê o seu perfil rebaixado por erosão e os sedimentos
resultantes desse processo são depositados nas áreas imersas (fig. 127).
A regra de Brunn permite, de uma forma empírica, ter uma ideia do recuo da linha de costa
correspondente a uma determinada subida do nível do mar. Esse recuo na horizontal está
estimado num valor maior em cerca de 100 vezes do que a subida do nível do mar. Significa isso
que a subida calculada para as diversas estações maregráficas com séries longas (aula 5, cerca de
1,9mm/ano) acabaria por produzir, só por si, um recuo anual da linha de costa de 1,9cm.
São justamente estas subidas e descidas temporárias que produzem situações de embutimento de
perfis de praia mais baixos em perfis mais altos que originam as bermas (fig. 128).
A distribuição dos calhaus nos depósitos de praia: imbricação e estruturas sedimentares.
Já na figura 118 era possível comparar a forma de imbricação dos calhaus típica dos depósitos
marinhos com o tipo de imbricação existente em formações fluviais. Na figura 129 é possível ver
que, nas praias de calhau, o tipo de imbricação pode variar consoante a posição dentro da praia.
Pensamos ser interessante referir as estruturas sedimentares típicas de ambientes de praia
(estratificação entrecruzada de tipo planar, fig. 130), bem como as marcas de corrente
(assimétricas, fig. 131) e de ondulação (simétricas), bem como o papel que as estruturas
sedimentares podem ter na identificação de depósitos fósseis.
Através da figura 132 é possível compreender a razão pela qual quando se inicia um processo de
erosão numa praia, os grãos de minerais pesados têm tendência a ser deixados, enquanto que os
grãos de quartzo são arrastados. Desse facto resulta um enriquecimento muito visível das praias
em erosão nos ditos minerais pesados (fig. 133).
A deriva litoral: corrente em zig-zag
Como já vimos na aula 3, quando as ondas se aproximam obliquamente da linha de costa elas
começam por sofrer um fenómeno de refracção. Mesmo assim, quando a onda rebenta, o jacto de
rebentação tem um traçado oblíquo em relação à linha de costa. Já o refluxo vai fazer-se segundo
a força da gravidade, isto e: perpendicularmente à linha de costa e segundo a linha de maior
declive. Deste modo, também os sedimentos arrastados pelas ondas sofrem uma movimentação
em zig-zag. De tudo isto resulta um processo de deriva ao longo do litoral (deriva litoral), cuja
orientação pode variar no tempo, consoante a direcção dos ventos dominantes e da ondulação
deles resultante. Este processo define, no essencial, o sentido do transporte das areias ao longo da
linha de costa e vai ser fundamental na construção de formas litorais dependentes dessa deriva
(flechas litorais ou restingas, fig. 120).
147
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Dunas litorais
A movimentação das areias pelo vento, necessária à criação de dunas, depende de diversos
factores:
•
disponibilidade em areias finas e secas,
•
ausência de vegetação,
•
ventos eficazes (só os ventos que têm uma velocidade superior a 16km/h conseguem
mobilizar as areias).
Como estas condições são frequentes nas regiões litorais, os litorais são locais favoráveis à
constituição de dunas.
Entre as praias e as dunas que se situam na sua retaguarda estabelece-se uma relação de
complementaridade (fig. 135). Com efeito, durante o verão (fig. 127), a deflação pode exercer-se
numa área relativamente extensa de areia seca. Durante o inverno, todavia, uma parte das areias
já acumulada sob a forma de dunas pode ser arrastada para o mar indo constituir uma reserva de
areias que poderá ser lançada, de novo, na costa, na situação de bom tempo.
A travagem do vento quando surgem as primeiras irregularidades no terreno (fig. 136) é a
principal causa que vai levar a um depósito de areias. Este pode fazer-se a favor de tufos de
vegetação halófita que vão colonizando a antepraia. Para isso é necessário que esta fique fora da
acção das ondas durante algum tempo, o que implica, pelo menos, uma situação de equilíbrio na
praia. Uma descida do nível do mar, ou processos de acumulação muito intensos, originando
uma progradação do litoral e o abandono de antigos cordões litorais podem favorecer, como é
evidente, a acumulação de campos dunares mais ou menos extensos
As dunas embrionárias originadas pela acumulação de areias nos tufos de vegetação da antepraia
são designada por nebkas. A coalescência de diversas nebkas origina uma duna frontal,
grosseiramente paralela à linha de costa e com um perfil mais ou menos simétrico. A circulação
do ar a sotavento da duna frontal cria turbilhões que acabam por originar a formação de
depressões interdúnicas (fig. 137).
Em situações em a vegetação é escassa ou inexistente ou em que o fornecimento de areias é
muito abundante, podem formar-se dunas livres, ou barkhans. Estas dunas, em forma de
crescente com a convexidade face ao vento, apresentam um perfil dissimétrico em que a face
exposta ao vento tem um declive entre 5° e 10° e a face a sotavento tem um declive elevado, da
ordem dos 30-33° (Paskoff, 1985, fig. 138).
Desenvolvimento sequencial de dunas litorais
Muitas vezes, atrás da duna frontal existem outras cristas dunares, formadas em períodos
anteriores.
A figura 139 mostra como pode fazer-se o desenvolvimento sequencial de um sistema de dunas.
Num litoral em que haja uma certa progradação podem existir várias cristas dunares mais ou
menos paralelas, correspondendo a sucessivas dunas frontais progressivamente mais antigas à
medida que nos afastamos do mar.
À medida que uma crista de dunas perde a sua ligação à praia, ela deixa de receber areias e cria148
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
se uma tendência à erosão. Esta pode ser materializada pelos “blow outs”, depressões de forma
semi-circular existentes na face da duna (fig. 139). Estes blow outs têm tendência a acentuar-se e
a migrar para o interior. Como se vê na crista dunar mais antiga (fig. 139), essa migração acaba
por deixar na sua frente braços afilados que têm uma direcção aproximadamente paralela à dos
ventos dominantes e que se podem designar como dunas longitudinais. Na sua retaguarda
encontram-se dunas de forma parabólica. Estas dunas têm um desenvolvimento contrário ao das
dunas do tipo barkhan. Com efeito, embora a forma seja também em crescente, no caso das
dunas parabólicas a concavidade situa-se do lado onde sopra o vento, ao contrário do que se
passava com as barkhans.
A análise desta figura parece-nos particularmente interessante porque nos parece haver muitas
analogias entre o processo que ela descreve e a situação que se encontra na costa portuguesa,
entre Espinho e Aveiro (fig. 140).
Dunas actuais e dunas fósseis
Muitas vezes coexistem, no mesmo espaço, diversos sistemas de dunas. Elas reconhecem-se quer
através da orientação das suas cristas, que podem representar ventos dominantes contrastantes
com os actuais, quer, sobretudo, através do tipo de pedogénese que sofreram.
Assim, na figura 140 foi possível identificar um conjunto de dunas antigas, que aparecem na
parte mais a leste do mapa e que apresentam um horizonte ferro-húmico bastante consolidado.
Este horizonte, designado geralmente por surraipa, aparece, também cortado em arriba, nas
praias de Cortegaça e de Maceda, sob as areias de dunas mais recentes.
O corte de Cortegaça é particularmente interessante (fig. 141).
A sobreposição de diversos conjuntos dunares ocorre noutros locais (fig. 142). Embora as
propostas existentes para as idades das dunas das Landes e das dunas da região de Cortegaça
sejam diversas, o conjunto tem analogias notórias, nomeadamente pelo facto de existir um
sistema de dunas antigas com uma crosta aliótica em ambos os casos. Essas analogias não
passaram despercebidas a R. Paskoff que escreveu um artigo justamente sobre as semelhanças
entre as dunas das Landes e as dunas da região da Gândara (que, por sua vez, têm analogias
evidentes (Araújo, 1991) com as dunas de Cortegaça.
Se as dunas consolidadas do Norte do país se apresentam geralmente com um fácies semelhante
ao descrito para as dunas de Cortegaça, na região de Lisboa (Magoito, Oitavos), a sua
consolidação fica a dever-se ao carbonato de cálcio. O mesmo acontece na região de Porto Côvo
e Vila Nova de Milfontes, onde o grés calcário que constitui a duna consolidada sofreu um
processo de carsificação, mantendo, no conjunto a forma típica de uma duna (fig. 143).
Aula Prática:
Apesar do carácter relativamente elementar que a disciplina tem que ter, para se adaptar ao
tempo disponível, parece-nos que é fundamental fazer o tratamento granulométrico e
morfoscópico de areias de praias e de duas amostras de areias de dunas (dunas actuais e dunas
fósseis da região de Cortegaça). Como se trata de análises algo demoradas, cuja técnica os alunos
deverão dominar para poderem incluí-las nos seus trabalhos, poderemos utilizar mais 6 horas,
(ao todo 8 horas) correspondentes às aula práticas dos próximos temas, para levar esse trabalho a
149
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
efeito.
Além dos procedimentos básicos da granulometria, os alunos deverão aprender:
•
A identificar o grau de rolamento dos grãos de acordo com os índices e os critérios
propostos por G. S. Carvalho (1966, fig. 144),
•
A distinguir entre a forma e o aspecto de superfície dos grãos de areia (fig. 145),
•
A identificar os principais tipos de aspectos de superfície dos grãos (Esquiroloso,
Picotado, Picotado-Brilhante, Brilhante e Fosco, isto é: E, P, PB, B, F, ver fig. 146),
•
Como introduzir os dados da granulometria e da morfoscopia em folhas de cálculo já
preparadas para o efeito,
•
Como construir curvas cumulativas e espectros morfoscópico das amostras tratadas.
•
Como construir gráficos comparativos dos diferentes tipos de amostras (a título de
exemplo, ver fig. 146).
Bibliografia utilizada:
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 114: Ganhos e perdas de areias numa praia. As praias de calhaus têm ganhos e
perdas semelhantes, exceptuando no que diz respeito à acção do vento.
152
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 115: Arribas vivas, estabilizadas e mortas.
Tipologia da orla costeira entre Caminha e Espinho
Rochosa
23%
Arenosa
52%
C/rochedos
25%
Figura 116: Tipologia da faixa costeira entre Caminha e Espinho.
Figura 117: Perfil de praia: o esquema simples de R. Paskoff.
153
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 118: Perfil de praia. Terminologia francesa de A. Guilcher.
154
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 119: Morfologia das praias: comparação de diferentes terminologias.
Figura 120: Tipos de praias consoante a respectiva configuração.
155
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 121: Tombolo formado pela ponta da Gafa na praia do Mindelo (Vila do Conde).
156
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 123: Relação entre o declive da praia e o calibre dos materiais que a formam.
157
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 124: Modo de formação dos crescentes de praia.
Figura 125: Crescentes de praia na Praia do Norte (a Norte do promontório da Nazaré).
158
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 126: Ilustração do princípio de Bruun.
Figura 127: Variação do perfil de uma praia entre a situação de verão e a situação de
inverno.
159
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 128: Bermas de praia. Foto extraída de
http://www.pol.ac.uk/india/IND_updatefw.html
Figura 129: Variações de declive e tipo de sedimentação numa praia de calhaus.
160
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 130: As variações no pendor das lâminas numa praia reflectem diferenças no
declive da face da praia. Figura extraída de:
http://www-geology.ucdavis.edu/~GEL109/SedStructures/SedStructures.html
Figura131: Marcas de corrente em depósitos litorais. Foto extraída do site
http://www.pol.ac.uk/india/IND_updatefw.html
161
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 132: Processo que explica a erosão predominante nos grãos de quartzo ou feldspato
relativamente aos grãos de minerais pesados.
Figura 133: Enriquecimento em minerais pesados de uma praia em erosão. Praia de
Francelos (Vila Nova de Gaia).
162
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 134: Corrente em zig-zag e deriva litoral
Figura 135: Complementaridade no sistema praia-duna.
Figura 136: O papel dos obstáculos na formação das dunas embrionárias.
163
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 137: O vento vindo do mar, ao soprar sobre a duna frontal, desenvolve turbilhões
que explicam a formação de depressões interdúnicas.
Figura 138: Dunas do tipo barkhan formadas por vento que sopra da terra para o mar.
Julho de 2002, Narbonne Plage, costa do Languedoc, França.
164
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 139: Desenvolvimento sequencial de um sistema de dunas litorais.
165
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 140: Sistemas de dunas ao Norte da laguna de Aveiro.
166
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 141: Praia de Cortegaça: as setas separam os 3 conjuntos dunares existentes.
1: Duna mais antiga, finipleistocénica. Os níveis argilosos representam charcos ou lagoas interdúnicas. Idade do
nível intermédio: 13810±380 BP.
2: Duna do início do Holocénico: consolidada por uma pedogénese do tipo podzol. Podem distinguir-se o horizonte
A, acinzentado, de lexivização e o horizonte Bhs (horizonte espódico). Idade dos carvões do horizonte A: 5885±75,
BP.
3: Duna sub-actual. Já sofreu alguma pedogénese. Possivelmente corresponderá à pequena idade do gelo
167
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 142: Corte esquemático e interpretação do sistema dunar das Landes.
Figura 143: Duna consolidada por cimento carbonatado: a sul de Porto Côvo.
168
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 144: Definição dos graus de rolamento dos grãos de quartzo (muito angulosos,
angulosos, sub-angulosos, arredondados, redondos e muito redondos). Extraído de G. S.
Carvalho, 1966.
169
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 145: Relação hierárquica entre forma, grau de rolamento e aspecto de superfície
dos grãos.
170
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
100%
Figura 146: Aspectos de superfície dos diferentes tipos de depósitos estudados0,6
90%
0,5
80%
70%
0,4
%F
60%
%B
0,3
50%
%PB
%P
40%
0,2
30%
%E
RM
20%
0,1
10%
0%
0
Fluvial fóssil Fluvial actual Form. cob.
Mar. fóssil
171
Mar. actual Eólico actual Eólico fóssil
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Aula 8: Estuários, deltas e lagunas
Nesta aula abordaremos os locais onde os rios encontram o mar - estuários e deltas e também as
lagunas. Todos estes ambientes têm em comum a existência de pântanos e o facto de conterem
água doce ou salobra na proximidade do litoral.
Estuários
Trata-se do sector terminal dos rios, até onde o canal fluvial é percorrido pelas correntes de maré.
Muitas vezes os estuários correspondem a sectores alargados dos cursos de água, o que faz
sentido se pensarmos que grande parte dos litorais nossos contemporâneos são litorais de
submersão (fig. 59), que resultaram da invasão marinha de vales fluviais que, durante as
glaciações, sofreram um escavamento importante, a favor de uma descida do nível do mar
estimada entre 120 e 140m (aula 5). É o caso também do Rio Douro, em que o fundo do
respectivo paleovale, junto à foz, está a 50 m de profundidade (A. Carvalho, 1988).
Como é óbvio, a amplitude das marés (aula 4) é determinante na caracterização dos estuários. No
caso dos estuários micromareais a penetração da maré faz-se até pouca distância da costa. No
caso dos estuários macromareais acontecerá o contrário. Se a acção das marés enfraquece, outras
acções (ondulação, deposição de sedimentos continentais) podem tornar-se dominantes.
Segundo R. Paskoff (1985) a definição de estuário implica uma ampla abertura sobre o mar. Ora,
esta abertura só poderá manter-se se houver um equilíbrio entre os sedimentos transportados pelo
rio e a respectiva capacidade de escoamento. Além da amplitude das marés, as variações
relativas do nível do mar, o clima reinante na bacia vertente e o respectivo grau de florestação,
controlando o tipo e quantidade de sedimentos, acabam por ter um papel importante na
caracterização dos estuários.
Pode dizer-se que estes têm sofrido, de um modo geral desde que se atingiu o máximo da
transgressão flandriana, há 5-6000 anos, um processo de colmatação que é extensivo, como
veremos, a muitas lagoas litorais.
Dinâmica e hidrologia dos estuários
As duas forças essenciais em acção nos estuários são a força da corrente fluvial e a força das
marés.
A importância da corrente fluvial depende, como é evidente, do seu caudal e da velocidade com
que as águas vêm animadas. Em período de cheia, por exemplo, as plumas túrbidas produzidas
pelos rios podem seguir-se até distâncias importantes, no seio do oceano (ver figs. 16 e 146).
A corrente fluvial é contrariada pela força da maré enchente. Pelo contrário, ela vai sofrer um
reforço assinalável pela corrente da vazante.
Ao chegar ao estuário a força da corrente fluvial amortece-se, por diminuição do declive e pela
resistência oferecida pela água do mar e acaba por anular-se.
A maré enchente penetra ao longo do canal fluvial até distâncias variáveis consoante o caudal do
rio e a amplitude das marés. Por vezes, a subida da maré ao longo de um estuário origina o
fenómeno do macaréu (fig. 56).
172
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
À medida que a maré enchente vai avançando ao longo do rio, a sua amplitude vai-se reduzindo,
até desaparecer completamente.
No máximo da maré alta, o nível do mar é mais elevado que o nível da água no rio. Daí a
penetração da água do mar ao longo do rio, ou enchente.
Pelo contrário, no máximo de maré baixa, o nível da água é bastante mais alto no rio que no mar,
porque à água do rio se juntou a água a água marinha que nele penetrou durante a enchente.
Por isso, a favor desse desnível, se faz uma descarga, durante a vazante, que pode atingir
velocidades elevadas.
Na figura 148 pode ver-se como varia a velocidade no estuário consoante o nível da maré. Quer
durante a maré baixa quer durante a maré alta não há corrente alguma e a água está praticamente
parada. É nos momentos em que a maré está no seu ponto médio que se atingem as velocidades
mais elevadas. Este facto tem, como é óbvio, importantes consequências em termos de
sedimentação, já que a ausência de corrente durante a maré alta vai produzir a deposição de
sedimentos transportados em suspensão ou resultantes da floculação das argilas com origem
fluvial em contacto com as águas marinhas ricas em iões.
Se, numa situação de cheia coincidirem marés altas vivas e uma sobre-elevação meteorológica
do tipo storm surge (fig. 31), o rio não consegue escoar água que transporta. Esta vai-se
acumulando, e fazendo subir o respectivo nível junto à foz e originando cheias importantes.
Esse fenómeno pode ser particularmente intenso em rios que se mantenham encaixados até perto
da foz, porque num vale estreito a cheia tem tendência a subir mais rapidamente.
É justamente isso que acontece com o Douro e daí o temor, para as populações ribeirinhas do
Porto e Gaia, de que os períodos de cheias coincidam com marés vivas.
A cunha salina
A penetração da maré num estuário faz-se através de uma maré de salinidade (Paskoff, 1985) que
normalmente fica muito aquém da maré puramente dinâmica.
Com a água do mar é mais densa, existe a tendência para que a água doce fique a sobrenadar a
água salgada. Porém há sempre alguma mistura. Mas a intensidade dessa mistura depende das
velocidades relativas e volumes das duas correntes.
Designam-se por correntes residuais as correntes de mistura entre as águas do rio e do mar (J.
Pethick, 1984).
A forma como se organizam as correntes residuais nos estuários depende da relação entre as
quantidade de água marinha e fluvial. Há 3 tipos de situações (J, Pethick, 1984):
1. Estuários de cunha salina, em que predomina a corrente de água doce,
2. Estuários com uma mistura parcial, em que predomina a corrente de maré,
3. Estuários com uma mistura total, que são estuários muito largos em que as marés
predominam.
Nos estuários de cunha salina uma pequena amplitude de maré coexiste com um grande caudal
173
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
fluvial. Uma vez que as águas do mar são mais densas que as águas do rio, elas insinuam-se sob
as águas fluviais constituindo uma cunha salina (fig. 149). A mistura entre a água do rio e do mar
é pouco intensa. Como as correntes residuais são fracas a carga de fundo do rio dificilmente é
transportada até ao mar, parando junto do vértice da cunha. A pequena amplitude da maré ainda
dificulta mais a mistura das águas.
A corrente fluvial domina os processos deste tipo de estuário. A carga sólida que é trazida até ao
vértice da cunha acumula-se aí e pode formar barras de material relativamente grosseiro. A
maior parte da carga em suspensão vai ser arrastada até ao mar, onde se deposita rapidamente e
dada a pequena amplitude da maré pode originar deltas. O caso mais conhecido é o do Mississipi
(fig. 147).
Nos estuários com uma mistura parcial, o caudal do rio é relativamente fraco e a mistura entre
água doce e salgada é muito mais intensa (fig. 150). Por isso, para restabelecer o equilíbrio, há
uma substituição por nova água salgada. Isso, juntamente com correntes de maré fortes provoca
uma entrada de sedimentos marinhos dentro do estuário. Os mais grosseiros serão depositados
rapidamente, mas os mais finos poderão subir até ao limite da penetração da maré salina. Um
exemplo deste caso é o Tamisa.
Os estuários em que há uma mistura total de águas, apresentam aberturas maiores do que 500m e
podem não ter variações de salinidade na vertical, mas apresentam variações intensas na
horizontal. A influência da força de Coriolis tende a empurrar a água doce para a margem direita
e a água salgada para a margem esquerda (fig. 151).
Paskoff (1985) introduz uma ideia interessante: uma diminuição de caudal devida a uma
estiagem, juntamente com a existência de marés vivas, pode transformar um estuário do 1º tipo,
temporariamente, num estuário do tipo 2.
Algumas reflexões sobre o estuário do Douro
No caso do rio Douro, o estuário tem 22 km de comprimento, sendo a propagação da maré
limitada a montante pela barragem de Crestuma. A penetração salina depende do caudal do rio e
da amplitude da maré e só pode atingir a barragem em condições de caudal excepcionalmente
baixo. Quanto à respectiva abertura, na figura pode ver-se que ela tem cerca de 1110m, o que
permitiria, em princípio, classificá-lo como um estuário de mistura total.
Porém, o Cabedelo reduz em muito a sua largura. Na foto da figura 152 ela pouco ultrapassa os
100m, mas a largura da barra varia consoante a configuração e a posição do Cabedelo, a qual tem
variado bastante nos últimos 150 anos (fig. 153). Nesta figura é possível ver que as áreas de
maior profundidade do canal fluvial se situam encostadas à margem direita, o que sugere o efeito
de Coriolis.
Pensámos que o encostar da corrente fluvial à direita será o motivo pelo qual o Cabedelo se
desenvolveu na margem esquerda.
O provável jogo do efeito do Coriolis parece, assim, confirmar a hipótese de inclusão do estuário
do Douro dentro deste último tipo de estuários.
174
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Movimentação dos sedimentos nos estuários
Os materiais mais grosseiros que são transportados pelos rios por rolamento ficam na parte
interior do estuário porque a perda de velocidade devida à diminuição de do declive diminui a
competência do rio. As areias conseguem caminhar mais para jusante, mas o avanço da cunha
salina dificulta a sua progressão.
Na maior parte dos estuários existe uma zona onde os sedimentos finos em suspensão estão
muito concentrados - o corpo lodoso (bouchon vaseux, Paskoff, 1985, fig. 154). Este núcleo de
sedimentos vasosos em suspensão resulta da floculação das argilas trazidas pelo rio em contacto
com as águas salinas que circulam para montante ou para jusante de acordo com as marés. Situase próximo do ponto nodal que é o ponto de convergência onde se anulam as correntes de fundo
que sobem o estuário e a corrente fluvial que desce ao longo dele. Actualmente, com a
urbanização e industrialização das margens do rios, uma parte do corpo lodoso é constituída por
poluentes, pelo que o seu estudo tem um grande interesse prático. Nas épocas de cheia pode ser
lançado no mar (Moreira, 1984), fazendo então parte da constituição da pluma túrbida (fig. 147).
A decantação da água turva acontece sobretudo durante os períodos em que se dá a sua
imobilização, que coincidem sobretudo com as marés altas. A capacidade de aderência de que
gozam as partículas de dimensão inferior à das areias (<62µ) faz com que, uma vez depositadas
seja difícil remobilizá-las. Esse facto permite que as acumulações vasosas se vão repetindo em
cada ciclo de maré e, por isso, elas acabam por ser um traço dominante da sedimentação
estuarina.
Os deltas
Os deltas correspondem à foz de um curso de água em que os aluviões fluviais se acumulam em
vez de serem redistribuídos pelas vagas e correntes litorais.
Deste modo, os deltas caracterizam-se por um avanço da terra em relação ao mar. É justamente
esse traço que identifica os deltas. Muitas vezes o rio divide-se em vários braços, mas essa não é
uma condição absolutamente necessária. No fundo, um delta representa o oposto de um estuário,
porque no caso do delta as acções fluviais, de origem continental, dominam sobre as acções
marinhas (Paskoff, 1985).
Os deltas actuais são holocénicos mas sobrepõem-se muitas vezes a deltas mais antigos em locais
subsidentes, o que explica a existência de espessuras de mais de 10.000m de sedimentos
deltaicos, por exemplo no delta do Níger.
As dimensões são muito variáveis, mas em todos os casos há uma certa indecisão nos limites
entre o mar e a terra.
Existem frequentemente, dentro dos deltas, condições para a formação e acumulação de
hidrocarbonetos, o que faz com que a sua génese e estrutura tenham sido muito estudadas
ultimamente. O delta do Mississipi (fig. 147) é, sem dúvida, o mais estudado de todos.
Condições de formação dos deltas
É preciso que o rio tenha uma grande capacidade de transporte e que transporte efectivamente
uma grande quantidade de sedimentos. Assim os rios das altas latitudes, que transportam muitos
detritos resultantes da crioclastia, bem com os das regiões de clima continental, mediterrâneo e
175
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
tropical com estação seca, têm condições favoráveis à existência de deltas.
Quanto mais fracas forem a ondulação e as correntes marítimas, mais difícil será a dispersão dos
sedimentos trazidos pelo rio e portanto mais provável será a sua acumulação pontual formando
um delta.
Assim, é mais provável formar-se um delta no fundo duma baía do que no mar aberto.
O mesmo pode dizer-se das marés, já que uma forte amplitude induz fortes correntes de descarga
nos estuários, propiciando a evacuação dos sedimentos. Assim, com marés muito fracas, da
ordem dos 0,5m, o Mediterrâneo é um mar favorável à formação de deltas, até porque está
rodeado por uma série de cadeias montanhosas recentes que fornecem cargas sólidas importantes
aos cursos de água que nele nascem.
A estabilidade do nível do mar, ou mesmo uma ligeira descida, é uma condições importante.
Porém, muitos dos deltas situam-se em áreas subsidentes por motivos tectónicos, a que se junta
uma subsidência por carga sedimentar e uma outra componente devida à compactação dos
sedimentos (fig. 155). Desta forma, a subsidência no delta do Mississipi varia entre 0,3 e 1m por
século. Deste modo, os sucessivos deltas abandonados pelo rio aquando de mudanças de curso
vão ficando submersos.
O delta do Nilo, depois da construção da barragem de Assuão tem vindo a sofrer de problemas
decorrentes da erosão costeira e da submersão e salinização de terras agrícolas, situadas
sobretudo no local de braços abandonados do rio (fig. 156).
Lagunas
As lagunas típicas encontram-se nas costas baixas de acumulação. São extensões aquáticas
alongadas, desenvolvendo-se paralelamente ao litoral e isoladas deste por cordões litorais ou por
restingas (fig. 157).
A comunicação com o mar faz-se através de passagens mais ou menos numerosas existentes
nesse cordão. Mesmo quando não têm comunicação directa com o mar sofrem a influência das
marés.
As costas com lagunas correspondem a 13% dos litorais ao nível do globo (Paskoff, 1985). São
ambientes muito produtivos sob o ponto de vista biológico.
As lagunas podem aparecer em muitas circunstâncias. Mais do que enunciá-las e tentar fazer a
sua sistematização parece-nos que interessará aos estudantes compreender algumas das lagunas
mais emblemáticas a nível do país e dar, também, alguns exemplos estrangeiros (Veneza, Bilene)
relativamente aos quais dispomos de alguma documentação que reputamos de particularmente
interessante.
O caso da laguna de Veneza
Sem dúvida que a laguna mais conhecida a nível do globo é a laguna de Veneza8. A figura 158
8
Veneza é um lugar que retira a sua magia da água, das gôndolas e dos palácios. A decadência da cidade é dada de
forma magistral no livro de Thomas Mann e no filme de Luchino Visconti. Mas uma parte da melancolia que a
176
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
mostra a sua localização relativamente ao delta do Pó, no fundo do mar Adriático. A forma como
se desenvolve a pluma de turbidez do rio Pó mostra claramente que a deriva litoral se desenvolve
de NE para SW.
A cidade dos Doges foi construída sobre ilhas pantanosas localizadas entre o continente e o Lido,
que é a língua de areia que fecha a laguna (fig. 159).
Aparentemente, a área da cidade terá sofrido uma descida de 30 cm desde 1890 (Dawson, 1992)
em parte devida à extracção de águas subterrâneas. Com efeito, a subsidência na área de Veneza
é de 3-5mm por ano, mais do dobro das áreas envolventes. Tornou-se mais lenta a partir de 1975,
quando essa extracção parou. Mas a tendência geral para a subsidência não se deve só às
actividades antrópicas. Há uma tendência regional comprovada pelo facto de a praia do último
interglaciar, que geralmente aparece entre 2 e 8m, aparecer a uma profundidade de –70m na
região de Veneza (Dawson, 1992).
Porém, a carga turística que envolve a cidade pode contribuir para o problema. Assim, a erosão
provocada pela trepidação dos barcos a motor (vaporetti) nos canais também tem a sua quota
parte no afundamento desta cidade cujo encanto provém da sua própria fragilidade.
A subsidência da área de Veneza explica uma subida do nível do mar, que é mais intensa do que
aquela que aconteceria por causas puramente eustáticas. Daí resulta que as invasões marinhas
(acqua alta, fig. 160) sejam cada vez mais frequentes, ao sabor de marés vivas e de ventos
(scirocco) que empurrem as águas do Adriático para Norte. O ano pior terá sido 1996, com 101
episódios superiores a 80 centímetros. Em 1966 atingiu-se um nível da água 1,94 m acima do
nível médio (fig. 161).
Com uma altura de 100 cm apenas 4% da superfície do centro histórico é invadida pela água.
Com 110 cm a percentagem sobe para 12%. As passerelles entram em acção a partir de 120 cm,
quando 35% do centro histórico fica inundado. A 130 cm (70% da superfície invadida) os efeitos
começam a ser graves e com uma altura de140 cm (90% da superfície invadida) a situação é
dramática9, como aconteceu já no mês de Novembro de 2002. Com efeito, no dia 16 atingiu-se a
altura de 1,47m e os efeitos na cidade foram confrangedores (fig. 159). Neste caso, o scirocco
soprando 36 horas seguidas, fez subir 20cm o nível da maré astronómica, já de si relativamente
elevado (+1,27).
O desvio de canais fluviais que depositavam os seus sedimentos na laguna foi feito para impedir
um processo de colmatação que seria inelutável. A verdade, porém, é que sem os aportes
sedimentares vindos do continente, e com o alargamento das passagens na restinga para permitir
a entrada de grandes navios, a penetração da água salgada na laguna intensificou-se e isso
contribuiu para a compactação das vasas (Paskoff, 1985). O aumento da profundidade e o
alargamento das passagens na restinga produziu uma aumento da amplitude da maré de13 cm
num século, o que poderá relacionar-se com o aumento do número e da intensidade dos casos de
envolve, vem do carácter inexorável do seu afundamento, da luta incessante para manter vivo um milagre que dura
há séculos…
9
http://www.venicebanana.com/acqua.htm
177
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
acqua alta. Mais uma vez se prova que as intervenções humanas no litoral, ao mexer nos
delicados equilíbrios existentes têm consequências muitas vezes inesperadas e frequentemente
desagradáveis. No caso da laguna de Veneza, a colmatação que seria o seu destino natural foi
substituída pela ameaça de uma anexação pelo mar. A tendência evolutiva foi completamente
invertida por acção do homem (Paskoff, 1985).
A Ria de Aveiro
A Ria de Aveiro corresponde a uma extensa área lagunar, com cerca de 50km de extensão em
latitude situada entre as praias do Furadouro, a Norte e de Mira, a Sul (fig. 162). Durante o
máximo flandriano, o mar invadiu uma extensa área, criando uma reentrância da linha de costa
que poderia, efectivamente, ser descrita com o uma “ria”, no sentido de “vale fluvial invadido
pelas águas do mar”.
Sabe-se que, em 922 Ovar ainda era um porto de mar. No fim do século XV a restinga estaria à
latitude da Costa Nova. Durante a “Pequena Idade do Gelo” a descida do nível do mar, e um
possível acréscimo no fornecimento de sedimentos devido a uma situação de tipo mais resistático
provocada pelo abaixamento da temperatura poderá ser responsável pelo avanço muito rápido da
restinga. Efectivamente , no “Resumo histórico da barra de Aveiro” publicado juntamente com a
reimpressão (1947) da Memória Descritiva de Luís Gomes de Carvalho, datada de 1808, afirmase que em 1575 terá começado a ruína do porto de Aveiro, a partir de um inverno muito rigoroso
que fez entupir a barra com areias. De 1736 a 1750 apenas entraram 15 navios da barra de
Aveiro.
A profundidade da água na laguna não deveria ser muito grande. Por isso, os cursos de água que
nela desaguavam começaram a fazer um trabalho de assoreamento bastante rápido, criando uma
série de ilhotas que começam a notar-se na figura 162 B. À medida que se foi desenvolvendo
uma restinga que crescia de Norte para Sul, a capacidade de escoamento dos sedimentos vai
ficando cada vez mais reduzida e a colmatação da laguna vai-se intensificando.
Em 1756 a restinga estava no areal de Mira e tinha fechado completamente a laguna. Essa
situação estava a matar o porto e a cidade de Aveiro, que no século 16 tinha tido uma época de
ouro e, além disso, provocava uma grave insalubridade nestas áreas pantanosas que deixaram de
ser invadidas pelo mar e de sofrer a acção directa das marés.
Depois de vários estudos e tentativas falhadas, a barra de Aveiro foi finalmente aberta, no local
onde hoje se situa, em 1808.
A necessidade de construir diques para proteger a entrada do porto da invasão de areias da deriva
litoral tem produzido um assoreamento assinalável na parte da restinga situada a norte dos diques
e a inevitável erosão a sul (fig. 163).
Outras lagoas existentes na costa portuguesa
A Ria Formosa (fig. 164) é outro grande acidente lagunar, fechado por um sistema de ilhas
barreiras. Segundo Thomas e Goudie (2000) ilhas barreiras são formas geralmente arenosas,
alongadas, paralelas à costa e separadas dela por uma laguna. Não estão ligadas ao continente
nas extremidades e estão fraccionadas por aberturas por onde passam as correntes de maré (ver
também a fig. 120).
178
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Na costa portuguesa abundam corpos lagunares mais pequenos e com origens diferenciadas em
que predominam processos de barragem que os cordões litorais (Esmoriz) ou os sistemas de
dunas costeiras (Ervideira) fazem relativamente a pequenos eixos de drenagem. Estes são
impedidos de desaguar no mar e acabam por formar planos de água cujos fundos, devido a
condições geológicas favoráveis ou por acumulação de argilas de decantação, acabam por se
tornar impermeáveis, garantindo a manutenção da lagoa.
Designam-se correntemente como lagoas. Pensamos, à semelhança do que é dito em Daveau,
(1988) a propósito da Ria (haff-delta?) de Aveiro que nem sempre há interesse em substituir a
linguagem popular por termos pretensamente eruditos que se arriscam a ser mal entendidos e mal
utilizados pelo público.
A evolução das lagunas litorais
As lagunas e lagoas litorais têm uma tendência geral à colmatação. Com efeito, a existência de
uma barra arenosa (ilha barreira, restinga) que fecha a laguna vai dificultar a exportação dos
sedimentos que para ela seja arrastados pelos cursos de água, pelo mar, ou pelo vento. A
existência de marés fortes pode ajudar à limpeza desses sedimentos. Porém, para que isso
aconteça, é necessário que as passagens existentes nas lagunas e que fazem a comunicação com o
mar estejam desimpedidas. Muitas vezes é necessário o homem intervir. Na costa portuguesa
esse trabalho é realizado na altura das marés vivas equinociais, aproveitando-se assim, a grande
amplitude da maré e a força da vazante para arrastar alguns dos sedimentos que atapetavam o
fundo da laguna.
Porém, a existência de algas nos fundos funciona como uma armadilha para os sedimentos. Daí
que a apanha das algas tivesse uma importância vital na preservação do ecossistema lagunar da
Ria de Aveiro. A substituição do moliço por adubos químicos levou a uma diminuição desta
actividade e ao desaparecimento de muitos dos barcos moliceiros. Trata-se de um caso exemplar
em que uma modernização apressada tem consequências nefastas que se fazem sentir tanto a
nível do património natural como do património cultural.
No caso de uma subida do nível do mar (fig. 165) podem acontecer duas situações. Se a subida
for suficientemente lenta para poder ser acompanhada por uma deslocação do cordão litoral, ele
vai-se deslocando na plataforma continental e acaba por reconstituir-se a um nível mais alto,
preservando-se, assim, quer a laguna quer o cordão litoral que a separa do mar. Neste caso,
poderemos encontrar antigos sedimentos lagunares sobrepostos por praias ou dunas. Este
fenómeno pode, aliás, acontecer mesmo que as variações do nível do mar sejam muito pequenas,
desde que uma modificação na dinâmica litoral ou seu balanço sedimentar produza um recuo do
sistema praia-duna que o obrigue a invadir uma laguna situada na sua retaguarda.
Porém, se a transgressão for muito rápida, o cordão litoral fica submerso e a laguna desaparece
(fig. 165, B).
Circulação dentro das lagunas
A circulação dentro das lagunas efectua-se através das correntes induzidas pelos ventos. Estas
correntes induzem um processo de deriva que acabam por criar pequenas flechas litorais. Se
estas forem oblíquas em relação ao desenvolvimento geral da laguna, acabarão por a segmentar
num rosário de bacias arredondadas, orientadas, no seu conjunto, de acordo com a orientação
179
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
geral da laguna original. A situação representada na figura 166 merece ser ilustrada com o caso
da lagoa do Bilene (fig. 167, Moçambique).
Pântanos marítimos
Encontram-se nas diversas situações descritas ao longo desta aula. Com efeito, podem aparecer
nos estuários, nos deltas e nas lagunas e lagoas litorais. Parece-nos, por isso, que deverão ser
estudados neste momento, quando concluímos este tema.
Os pântanos da zona temperada compreendem duas partes. Uma inferior, de vasa nua,
denominada slikke e uma superior, em que a vasa está colonizada por vegetação geralmente
designada schorre. Os termos em questão são de origem holandesa e parecem-nos preferíveis a
outras designações de origem anglo-saxónica quiçá menos expressivas e menos esclarecedoras.
O slikke é a parte mais baixa de um espraiado pelítico inundada em todas as preiamares mortas e
descoberta nas baixa-mares (Moreira, 1984). Trata-se de uma plataforma com muito pouco
declive constituída, na parte inferior por vasa mole e na parte superior por uma vasa mais
consistente que estabelece a passagem, através de um degrau nítido, para o schorre (fig. 168).
O schorre (Moreira, 1984) corresponde a uma plataforma de vasa consolidada, revestida por um
solo halo-hidromorfo e colonizada, nas zonas extratropicais, por vegetação herbácea (sapal). Nos
climas tropicais a colonização é feita por vegetação arbustiva/arbórea e designa-se como mangal
(fig. 169). O schorre só é coberto nas preiamares vivas e nas tempestades. É recortado por canais
de maré (fig. 170), onde apenas aflora a vasa nua.
Na figura 171 é possível comprovar a distribuição destes tipos de ambientes a nível mundial. É
importante salientar que se trata de ambientes muito produtivos sob o ponto de vista biológico,
onde muitas espécies de animais marinhos nascem e passam pelas primeiras fases de
desenvolvimento. Por isso, a sua destruição devida a processos erosivos ou a sua contaminação
por poluentes terá reflexos negativos na actividade piscatória das áreas para onde esses
organismos vão viver no estado adulto.
Aula Prática:
Continuação do tratamento de sedimentos de praia e de duna. Granulometria e morfoscopia das
areias de depósitos de tipo lagunar. O significado dos depósitos lagunares na caracterização da
evolução geomorfológica do litoral da região do Porto. O caso dos depósitos da praia da Aguda
(fig. 172)
Bibliografia utilizada
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dos efectivos trabalhos hidráulicos empregados na abertura da barra de Aveiro, segundo as
ordens do Príncipe regente, Nosso Senhor), com um “Resumo histórico da barra de
Aveiro”, Col. de Reimpressões do “Arquivo do Distrito de Aveiro”, sep. do vol. XIII do
180
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
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apostila a um mapa, "Biblos", Coimbra, Vol. XXII, p. 1-35.
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http://www.venicebanana.com/acqua.htm
181
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 147: A pluma do Mississipi. Imagem extraída de:
http://earthobservatory.nasa.gov/Newsroom/NewImages/Images/modis_mississippi_sed_lrg
.jpg
182
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 148: Variação da velocidade da corrente consoante a fase da maré
183
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 149: Correntes residuais e transporte de sedimentos nos estuários de cunha salina
184
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 150: Correntes residuais num estuário de mistura parcial
Figura 151: Correntes salina e fluvial num estuário de mistura total
185
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 152: Estuário do rio Douro em 1995
186
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 153: Evolução do Cabedelo nos útimos 150 anos (fonte: Administração dos portos
do Douro e Leixões, APDL)
187
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 154: O corpo lodoso e a sua movimentação num estuário com cunha salina
Figura 155: Factores em jogo na evolução de um delta
188
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 156: Problemas de erosão no delta do Nilo devidos à retenção de sedimentos na
barragem de Assuão.
Figura 157: Elementos constitutivos de uma laguna
189
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 158: O delta do Pó e a laguna de Veneza
Figura 159: Imagem de satélite da laguna de Veneza
190
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 160: Veneza durante a ”acqua alta” de 16 de Novembro de 2002
Altura máxima atingida pela Acqua Alta (cm acima do nível médio)
200
180
160
140
120
100
1927
1932
1937
1942
1947 1952
1957
1962 1967 1972
1977
1982
1987 1992 1997 2002
Dados extraídos de http://www.pegacity.it/justice/viagiustizia/4250/acqualta.htm
Figura 161: Valores máximos da altura da água atingidos em cada ano, de 1927 até 16 de
Novembro de 2002 em Veneza
191
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 162: A evolução da Ria de Aveiro
192
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 162: O corte artificial na restinga de Aveiro
Figura 164: Imagem de conjunto da Ria Formosa
193
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 165: Evolução de uma laguna afectada por uma transgressão marinha
Figura 166: Evolução por segmentação das lagunas litorais
194
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 167: Processo de segmentação na lagoa do Bilene (Moçambique)
Fonte: reunião de das folhas 1180 (parte) e 1181 da carta de Mocambique de escala 1:50.000
Figura 168: Schorre e Slikke nos estuários do rio Maputo (Moçambique) e do rio Sado
(Portugal).
195
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 169: Aspecto do mangal junto à restinga da Praia dos Pescadores (Maputo,
Moçambique)
Figura 170: Canal de maré: região de Maputo (Moçambique)
196
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 171: Distribuição das áreas de mangal e de sapal a nível do globo.
197
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 172: Depósitos lagunares encontrados na praia da Aguda (Vila Nova de Gaia) em
Outubro de 2002. O seu aparecimento fica a dever-se à erosão produzida pela implantação
do quebra mar destacado da Praia da Aguda.
198
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Aula 9. O final do Cenozóico. Evolução dos litorais durante o final do Cenozóico.
Introdução
O texto que se segue funciona como a primeira parte deste tema. Este texto corresponde,
essencialmente, a uma introdução à “lição de síntese” sobre a evolução dos litorais durante o
Cenozóico, em que é apresentado como exemplo o caso da plataforma litoral da região do Porto.
A variação climática no final do Cenozóico: o porquê da sua inclusão neste programa.
A nosso ver, os litorais nossos contemporâneos não podem ser vistos desligadamente da sua
evolução ao longo do Quaternário. Isso acontece não só porque existem diversas marcas ou
relíquias dessa evolução que ainda são patentes aos nossos olhos, mas também porque o passado
é, frequentemente, a chave do presente e contém as explicações que clarificam muitos dos
acontecimentos e da evolução do presente.
Desde há muito tempo que estes temas nos apaixonam. Todavia, actualmente, parece-nos que a
sua relevância é ainda maior. Com efeito, as discussões existentes acerca do aquecimento global
e do efeito de estufa têm tido um grande destaque nos media e entre a opinião pública. Parecenos que, como geógrafos físicos, através do “recuo” que caracteriza aqueles que lidam com
escalas cronológicas longas, poderemos ter um papel no esclarecimento da opinião pública e no
equacionamento dos problemas que afectam a Terra enquanto sustentáculo da nossa existência
individual e colectiva.
A visão que perpassa em alguns textos recentes, dos quais destacámos Riser (1999) e Williams
(1998), tem, a nosso ver, um grande interesse pedagógico, na medida em que faz interagir a
ciclicidade da hipótese de Milankovitch com a distribuição de continentes e oceanos, comandada
pela tectónica de placas. Daí decorrem, como veremos, consequências importantes para a
circulação oceânica.
Também a tectónica alpina, criando novos relevos, vai estimular o processo de acumulação de
neves que se auto-alimenta, pelo menos até um certo ponto.
O próprio aumento da produtividade biológica dos oceanos e, até, a meteorização das rochas
(acrescida devido à formação das cadeias de montanhas) vai consumir CO2 atmosférico
diminuindo o papel do efeito de estufa e criando, assim, condições para o desenvolvimento das
glaciações.
Sabemos que existem, ainda, muitas dúvidas, a este respeito. Não sabemos se alguma vez se
saberá explicar todo este processo. Mas parece-nos que a discussão do mesmo pode ter um papel
formativo importante e levar os estudantes a interessar-se por estes temas e, desta forma, a
realizarem a aprendizagem da complexidade dos fenómenos e das interacções em jogo, bem
assim como do carácter provisório que têm todas as explicações científicas .
É evidente que aquilo que lhes será dito é apenas uma introdução feita em linhas muito gerais,
que poderá funcionar como “aperitivo” para uma disciplina de Geomorfologia do Quaternário
que também existe no curriculum, mas cuja abertura em termos efectivos, uma vez que também é
uma disciplina de opção, não parece provável a curto prazo, devido à sobrecarga de trabalho dos
docentes da área de Geografia Física.
199
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
O complexo jogo das interacções na criação de condições de arrefecimento ao longo do
Cenozóico
A propósito da variação do nível do mar vimos como o clima começou a sofrer uma tendência
geral para o arrefecimento a partir de meados do Oligocénico (fig. 65).
Esse aspecto tem uma grande importância no registo sedimentar e pode ajudar a distinguir entre
as formações terciárias e as quaternárias porque, de um modo geral, se passa de climas que
permitem grandes alterações (com caulinite e gibsite) a formações aluviais de tipo torrencial, em
que os conteúdos em caulinite e gibsite diminuem drasticamente.
Juntamente com esse arrefecimento aparecem oscilações que se vão tornando cada vez mais
intensas durante a segunda parte do Pliocénico (curva da direita, respeitante ao registo
encontrado em terra). Essa tendência acentua-se durante o Quaternário, com fortes variações
climáticas (glaciações e períodos interglaciares, fig. 66) que se traduzem em importantes
variações do nível do mar.
Aparentemente (M. Williams et al., 1998), a modificação da distribuição dos continentes e
oceanos, decorrente da movimentação das placas litosféricas pode ter tido um papel muito
importante no condicionamento da circulação marinha em volta da Antárctida.
No início do Cenozóico não havia gelo na Antárctida. As temperaturas deveriam estar à volta de
18°C nos mares envolventes. Porém, a subida da Austrália, em latitude, há 50 MA (fig. 173),
bem como a abertura do estreito de Drake abriram uma passagem que permitiu a formação da
corrente circumpolar. Esta passou a rodear completamente a Antárctida e a funcionar como uma
barreira, impedindo as correntes quentes das latitudes baixas de atingirem estas latitudes. À
medida que se vai dando o arrefecimento, a criação de mantos de neve vai propiciar o aumento
do albedo e o processo vai intensificar-se por uma retroacção positiva.
Em meados do Miocénico havia já um inlandsis na Antárctida (comprovado pelos blocos
transportados pelo gelo que se encontram no registo geológico).
O reforço dos contrastes térmicos, por sua vez, aumenta a velocidade dos ventos. Esse facto pode
intensificar o upwelling e a produtividade biológica e, por essa via, aumentar a captação do CO2
pelos oceanos e reduzir a quantidade do CO2 existente na atmosfera.
No final do Miocénico há um arrefecimento que vai corresponder a uma regressão de 40-50m.
Este processo é concomitante com a secagem do Mediterrâneo, com formação de enormes
quantidades de evaporitos10. Este evento foi designado como “a crise de salinidade do
Messiniano” e provocou uma diminuição geral da salinidade do mar em 6%. Esse facto permite
que o congelamento da água do mar se pode dar a temperaturas mais altas. E este é mais um
fenómeno que reforça o arrefecimento global, ao permitir a criação de mares gelados com um
albedo importante.
O aparecimento das condições para as glaciações do Quaternário
10
Aparentemente, a quantidade de sais precipitados corresponde a cerca de 40 vezes a quantidade total de sal que o
Mediterrâneo normalmente contém, o que significa que o processo foi um processo continuado, que se desenrolou
durante muito tempo (M. Williams et al., 1998).
200
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Depois de um certo aquecimento no início do Pliocénico as condições climáticas deterioraram-se
(fig. 174). No final do Pliocénico começam a encontrar-se blocos transportados pelo gelo
incluídos no registo sedimentar do hemisfério Norte, o que significa que as glaciações até aí
confinadas ao hemisfério sul e à Gronelândia11 começam a estender-se para as grandes áreas
continentais do hemisfério Norte.
Esse facto marca o início do Quaternário. É possível que o fecho do estreito do Panamá tenha
contribuído para o desencadeamento da corrente do Golfo. Ora, o aporte de águas aquecidas para
latitudes elevadas tem como consequência uma intensificação da queda de neve, o que tem
consequências para o aumento do albedo e para a criação de retroacções positivas para a
glaciação.
Há cerca de 2,4 MA (fig. 65, repetição) já havia mantos de gelo nos continentes do hemisfério
Norte. A partir daí observam-se alternâncias rítmicas com um período próximo de 41.000 anos.
Essa situação de oscilações frequentes e relativamente pouco intensas vai até cerca de 0,9 MA. A
partir daí as oscilações frias tornam-se muito mais intensas e o respectivo período passa a rondar
os 100.000 anos. Essas variações, que são deduzidas da análise do conteúdo em isótopos de
oxigénio dos sedimentos dos fundos marinhos12, vêm comprovar a influência que as variações na
órbita da Terra, e as consequentes variações da quantidade de calor que é recebida nos diferentes
locais, devem ter na determinação das variações climáticas do passado.
Na figura 175 é possível analisar os diferentes ciclos que podem influir neste processo: a
excentricidade da órbita, com um período de 100.000 anos, a obliquidade da eclíptica, com um
período de 41.000, e a precessão dos equinócios, cuja periodicidade pode variar entre 23.000 e
19.000. A conjugação dos diferentes ciclos produz uma curva da variação da insolação, em
Julho, entre 60 e 70° de latitude Norte, que se adequa muito bem às variações de temperatura
efectivamente verificadas.
Parece evidente, todavia, que as influências exteriores não podem explicar tudo. Doutro modo,
os ciclos glaciação/interglaciar teriam existido ao longo de toda a história da Terra, o que não
aconteceu (cf. fig. 63). Por outro lado, as variações na insolação são muito pouco intensas e é
bastante discutido qual o mecanismo pelo qual são amplificadas de molde a originar as variações
climáticas com que nos deparamos durante o Quaternário.
Uma das hipóteses mais recentes a esse respeito explora uma ideia já relativamente “antiga”
segundo a qual há uma correlação entre as manchas solares e períodos de arrefecimento
climático. A explicação para essa correlação poderá estar no facto de que os raios cósmicos
produzem iões que, juntamente com as pequenas partículas da baixa atmosfera podem criar as
11
A criação dos glaciares na Gronelândia parece ter tido início no final do Miocénico, há cerca de 7 MA (M
Williams et al., 1998).
12
A água é constituída por 2 isótopos de oxigéno: O16 e O18. o O16 é mais leve e, por isso, evapora-se mais
facilmente. Durante os períodos glaciares há uma grande quantidade de água retida sob a forma de gelo nos
continentes. Significa, por isso, que os oceanos vêm a sua água enriquecida no isótopo mais pesado. A variação da
relação entre o O16 e o O18 incluídos nos organismos marinhos, dá indicações sobre a temperatura e sobre a
quantidade de água retida nos glaciares, e portanto, sobre o nível do mar. Uma mudança de 0,11‰ no carbonato dos
foraminíferos plantónicos representa uma variação de 10m no nível do mar.
201
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
bases para o desenvolvimento de nuvens baixas. Estas têm como resultado final arrefecer a
Terra.
Por isso, um factor que aumente a intensidade dos raios cósmicos provocará um arrefecimento.
Ora, as manchas solares relacionam-se com tempestades magnéticas e reforçam a magnetosfera
que, por sua vez protege a terra dos raios cósmicos. Este processo complexo poderá explicar por
que motivo um menor número de manchas solares (por exemplo, o mínimo de Maunder que
coincidiu com a Pequena Idade do Gelo) acaba por desencadear um processo de arrefecimento
(Lomborg, 2002).
Além disso, o arrefecimento da Terra não se prolonga indefinidamente. As temperaturas nunca
desceram mais do que 5-9° abaixo do actual. Isto significa que há um feed-back negativo a partir
de certos limiares. Com efeito, se a temperatura descer muito, a evaporação reduz-se e a queda
de neve também, o que pode contribuir para um balanço negativo de acumulação para os
glaciares envolvidos, diminuir a intensidade do albedo e provocar uma diminuição da área
glaciada ou mesmo o seu desaparecimento.
Com efeito, há uma notória dissimetria no estabelecimento de uma glaciação: a entrada numa
época fria é muito lenta, mas a saída da glaciação é muito rápida (fig. 66, repetição), o que
mostra a existência de um mecanismo de feed-back negativo que controla a deglaciação. No
processo de arrefecimento funciona um feed-back positivo. Esta circunstância desenha uma
evolução em forma de “dente de serra” que é típica da evolução climática durante o Quaternário
(fig. 66, repetição).
É muito interessante pensar nas relações existentes entre a evolução climática durante o fim do
Würm e a situação da terra relativamente ao ponto da sua órbita em que se verifica o perihélio.
Com efeito, actualmente o perihélio situa-se no início de Janeiro. Significa isso que a grande
obliquidade dos raios solares para o hemisfério Norte é compensada por uma maior proximidade
do Sol. Por isso, os invernos do hemisfério Norte não são muito frios. Porém quanto ao
hemisfério Sul, é preciso pensar que o verão austral acontece quando a Terra está no perihélio e o
inverno austral quando ela está no afélio. Ora isso vai representar verões tendencialmente mais
quentes e invernos mais frios do que os do hemisfério Norte.
Justamente, a partir de 11.000 BP a situação estava invertida. Deste modo, o verão do hemisfério
norte acontecia com a Terra no perihélio: esse facto acelera a fusão dos glaciares do nosso
hemisfério. A discussão detalhada desta evolução pode ser seguida em Riser (1999, p. 202 e
seguintes) e é muito interessante porque explica, entre outras coisas, as variações climáticas que
se sucederam no Sahara no final do Würm e no início do Holocénico.
Limites e métodos de estudo do Quaternário
Os limites cronoestratigráficos utilizados para o Quaternário variam bastante consoante os
autores. Tem sido muito referido o limite de 2,4 MA (Riser, 1999). Porém, já em Williams et al.,
(1998) o limite proposto é de 1,8 MA. Como se vê na figura 65, ambas as hipóteses são
defensáveis, embora Riser defenda que o limite de 2,4-2,5 MA é mais utilizável para o
estabelecimento de correlações inter-regionais porque corresponde a um importante episódio frio
e seco que está amplamente documentado.
202
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
E dado o avanço dos conhecimentos neste domínio, é provável que, no futuro, nos possamos
inclinar por uma ou por outra com base em novos dados que hoje ainda não se encontram ao
nosso alcance….
Na figura 176 podemos observar a proposta de Riser (1999) para cronologia do Quaternário. Já
na figura 179 encontramos uma cronologia pormenorizada sobre o Tardiglaciário e o
Holocénico. Parece-nos muito importante que sejam fornecidas aos estudantes tabelas deste tipo
que lhes permitam orientar-se no meio das datações e tentativas de correlação que se encontram
na literatura especializada.
É importante referir alguns dos métodos que podem ser utilizados no estudo do Quaternário
(datações por potássio-árgon, C14, termoluminescência e luminescência estimulada
opticamente13, paleomagnetismo, dendrocronologia, estudo das varvas, etc.). É sobretudo
importante dizer que eles se aplicam a horizontes cronoestratigráficos diferenciados e que alguns
deles ainda apresentam um grau de insegurança apreciável, para além dos custos elevados.
Porém, dada a complexidade do estudo do Quaternário e a possibilidade de haver recorrência de
fácies é evidente que toda a investigação acaba por se confrontar com a necessidade de obter
datações.
Evolução do clima durante o Pleistocénico médio
Existe um grande contraste entre a vegetação e a fauna fini-terciária e a do final do Quaternário.
Essa alteração fez-se ao longo do tempo, à custa de numerosas oscilações. Porém, uma fase fria e
seca cerca de 2,4-2,5MA, bem documentada em todo o mundo (Riser, 1999) estabelece
definitivamente os regimes climáticos típicos do Pleistocénico e por isso é usado como limite em
muitos locais.
Um importante episódio frio e seco foi assinalado na China, através de um loess
excepcionalmente espesso e grosseiro. Na mesma altura, o planalto do Tibete parece ter sido
soerguido algumas centenas de metros, o que mais uma vez mostra a interferência entre
fenómenos climáticos e tectónicos na produção de eventos geomorfológicos documentados no
registo sedimentar.
As fases interglaciares do Pleistocénico inferior e médio correspondem a climas quentes com
uma vegetação densa. Uma vez que as condições eram essencialmente biostáticas havia uma
redução acentuada dos fenómenos erosivos em comparação com os períodos frios, em que, quer
13
Termoluminescência e luminescência estimulada opticamente: os minerais naturais têm quantidades vestigiais de
radionucleídos que libertam radiações alfa, beta ou gama que ionizam os átomos do mineral, libertando electrões
que ficam presos nas imperfeicões da rede cristalina.
O aquecimento do mineral liberta esses electrões e origina uma emissão luminosa que é proporcional à quantidade
de energia recebida pelo mineral. Em 1985 descobriu-se que em vez do aquecimento poderia submeter-se o mineral
a uma radiação electromagnética. Esse processo designou-se como luminescência estimulada opticamente. Neste
processo mede-se a dose de radiação acumulada depois da última exposição aos raios solares. Conhecendo a dose
anual a que o sedimento estaria sujeito, é possível saber a respectiva idade (Riser, 1999).
203
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
a ablação produzida pelos glaciares quer as condições periglaciares existentes na sua periferia
originavam quantidades muito apreciáveis de sedimentos detríticos transportados pelos rios até
ao litoral.
Esse facto terá produzido mudanças importantes na tipologia dos litorais que disporiam de uma
maior quantidade de elementos grosseiros durante os períodos frios e de materiais mais finos e
em menor quantidade durante os períodos interglaciares.
No interglaciar Mindel-Riss (estádio 11 ou Holstein, fig. 176) teria havido um clima bastante
mais quente do que o actual, o que se traduziria em praias fósseis situadas a altitudes que
atingiriam os 20m nas regiões estáveis. Pensa-se que essas temperaturas anormalmente altas para
um interglaciar poderiam explicar-se, tal como no caso do interglaciar actual (Holocénico) por
uma fraca obliquidade do eixo da Terra, um perihélio no Outono e uma fraca excentricidade da
eclíptica.
Estas condições teriam permitido uma fusão parcial da calote da Gronelândia e da parte ocidental
da Antárctida.
O Pleistocénico recente: o Eemiense
No interglaciar Riss-Würm (estádio 5, Emiense), o nível do mar seria 4-5m mais alto que o
actual, nas zonas estáveis. A curva isotópica da figura 178 mostra que terá havido 2 máximos de
temperatura (e portanto do nível do mar, ver nota supra) à volta dos 125.000 BP, separados por
uma ligeira regressão. A mesma figura permite dizer que o nível do mar, nessa altura, terá
atingido cotas ligeiramente superiores à actuais.
O Pleistocénico recente: a última glaciação
O crescimento das calotes de gelo ter-se-á iniciado por volta de 115.000 BP. Na figura 178 é
possível identificar diversas fases, sempre com o desenho típico de “dente de serra”, mas com
uma tendência geral para um aumento do conteúdo em O18, o mesmo é dizer, para o
estabelecimento de uma glaciação. É possível identificar diferentes fases (fig. 177) a partir das
quais foram definidos os estádios isotópicos que correspondem, actualmente, a termos correntes
no domínio do Quaternário, cujo sentido é necessário que os estudantes apreendam para poderem
descodificar a literatura recente sobre este assunto.
Dentro das glaciações o clima não foi uniforme. Assim, é possível identificar os chamados
“estadiais”, que correspondem a fases de frio intenso e os interestadiais, que são períodos
frescos, em quer o clima sofre uma notória suavização.
Também durante o Tardiglaciar foi possível identificar ciclos sob a forma de “dentes de serra”
(fig. 180). Este ciclos têm colocado muitos problemas aos investigadores porque dado o período
de duração relativamente curto, não podem ser associados às variações orbitais.
Os eventos de Dansgaard-Oeschger (Williams et al., 1998) duram entre 1.000-3.000 anos.
Podem corresponder a mudanças de 8° na temperatura média.
Os eventos de Heinrich correspondem a uma escala de 5.000-12.000 anos. Correspondem a
conjuntos de interestadiais progressivamente mais frios que terminam numa imensa descarga de
icebergs.
204
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Com efeito, a possibilidade de obter uma melhor resolução no estudo e na datação destes
fenómenos, permitiu perceber que cada ciclo pode decompor-se numa fase de arrefecimento
progressivo em que o tamanho da calote aumenta. No estádio final desse crescimento acontece
uma libertação maciça de icebergs que induz um arrefecimento à superfície da água do mar e
diminui a precipitação no continente próximo. Assim, esta fase fria é seguida por um rápido
aquecimento que inicia um novo ciclo.
O máximo de extensão dos glaciares teve lugar entre 21.000-17000 BP.
O Tardiglaciar e o Holocénico
No período compreendido entre 13.000 e 12.000 BP verifica-se um aquecimento em que as
temperaturas atingem valores quase semelhantes às do Holocénico (Bølling-Allerød, fig. 180)
com um curto período frio de permeio (Dryas antigo). Nessa altura, no hemisfério norte a
insolação, durante o verão era superior à actual e continuou a aumentar até a um máximo em
11.000 BP. O nível do mar seria cerca de 40 m inferior ao nível actual (fig. 69).
O Dryas recente interrompe este período de aquecimento. O Dryas recente durou 1000 anos e
implicou avanços dos glaciares escandinavos da ordem de 30-40km. O nível do mar tornou a
descer para cotas de -60m (fig. 69).
Foi este o último período frio. Depois dele inicia-se o Holocénico. Aos 10000 BP, o Atlântico já
não tinha gelo à superfície, durante o inverno. As últimas moreias escandinavas têm datações de
9.200 BP.
Durante o Holocénico as oscilações climáticas são mais frequentes e muito menos intensas do
que nos períodos anteriores (fig. 180).
Algumas fases de arrefecimento coincidem com fases de libertação de icebergs no Atlântico
Norte, segundo uma frequência de 1430 anos. O último evento teria sido a Pequena Idade do
Gelo (1450-1890).
Os litorais durante o final do Cenozóico: enquadramento geral e problemas metodológicos
Como acabámos de ver, à complexidade da evolução dos litorais, anteriormente tratada, dada a
sua situação de interface, há que juntar o diastrofismo, que geralmente tem lugar em faixas de
transição entre o continente e o oceano (fig. 74), as variações climáticas que aconteceram nos
últimos tempos do Cenozóico e as variações eustáticas delas decorrentes.
Na figura 181 podemos ver um modelo dos diferentes tipos de terraços a que as variações
cenozóicas do nível do mar podem conduzir. Já vimos que o processo de arrefecimento climático
e de constituição dos inlandsis levou a que no final do Miocénico tenha havido um arrefecimento
que vai corresponder a uma regressão de 40-50m. A fusão total dos glaciares da Antárctida e
Gronelândia provocaria uma subida do nível do mar da ordem dos 65-80m (A. Hallam, 1992).
Juntando a esses valores os 120-140 m de variação do nível do mar deste o máximo do Würm até
à actualidade, obtém-se um valor entre 185 e 220m de diferença entre o nível mais alto e o nível
mais baixo do mar dentro do Cenozóico. Quer isto dizer que, contando apenas com as variações
eustáticas, podemos encontrar restos de litorais cenozóicos separados por essa diferença de cotas.
Como estamos, actualmente, num período interglaciar, portanto caracterizado por um nível
205
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
relativamente alto do mar admite-se que, de acordo com os valores acima referidos, poderemos
ter antigas linhas de costa submersas até uma profundidade de 120-140m. As linhas de costa
acima do nível actual do mar corresponderiam a altitudes de 65-85m, isto é à altura de água que
foi subtraída aos oceanos devido à formação dos inlandsis da Antárctida e da Gronelândia. Por
isso, admitindo que houve, durante o Terciário, um processo de crescimento dos inlandsis,
mesmo nas áreas ditas “estáveis”, a tendência é para que os depósitos mais antigos se situem a
cotas mais elevadas. Como é óbvio, se aceitarmos como correctos os valores de 65-85m para a
espessura da camada de água subtraída ao mar desde o Miocénico o critério para essa
estabilidade será que os depósitos do Miocénico inferior não devem ultrapassar os 65-85m.
Significa isto que, quando se ultrapassa um valor dessa ordem de grandeza, começa a haver uma
grande probabilidade de a área em questão ter sofrido um levantamento tectónico (fig. 182). A
esse respeito, a análise da curva da Fairbridge (fig. 183) torna-se bastante esclarecedora: os
pontos mais altos da curva apresentam uma tendência persistente para a descida, o que poderá
relacionar-se com o efeito combinado do eustatismo e do diastrofismo.
Por exemplo, na Calábria existem oito linhas de costa quaternárias que se desenvolvem até 177m
de altitude (Riser, 1999), o que significa que se trata de áreas que estão a sofrer uma subida.
Como seria de esperar isso sucede em muitas outras áreas. Se analisarmos a distribuição dos
depósitos quaternários nas colunas estratigráficas de algumas cartas geológicas portuguesas, ou
mesmo no trabalho de síntese de Ribeiro et al. (1979) apercebemo-nos que as formações
quaternárias mais antigas (Siciliano I) se encontram a altitudes de 100-110. Esse facto de per si
já nos indica que elas estão muito provavelmente soerguidas. Mas se isso é assim, então como
utilizar as altitudes para caracterizar e fazer a cronologia dos depósitos? É óbvio que a ideia das
praias levantadas que se podem seguir do Minho até ao Algarve, que foi referida logo no início
deste programa cai pela base. Com efeito, se os depósitos estão soerguidos, então é improvável
que o seu soerguimento seja perfeitamente homogéneo ao nível de todo o país. Poderá haver
algumas homogeneidades, sim, mas apenas a nível local, quanto muito regional e nunca a nível
do país.
Na plataforma litoral da região do Porto, os depósitos presumivelmente pliocénicos situam-se a
altitudes de 124m. Como, em princípio, de trata de depósitos formado no Pliocénico, quando o
nível eustático já tinha descido algo em relação à situação pré-glaciar (o inlandsis da Antárctida
existiria desde meados do Miocénico, cf. Williams et al., 1998) o seu soerguimento poderá ser
avaliado da seguinte forma:
Admitindo que a fusão dos inlandsis corresponderia a uma coluna de água de 82 m (Williams et
al., 1998) e que, no Pliocénico uma espessura entre 60 e 40m já tinha sido subtraída aos oceanos.
Abstraindo dos efeitos tectono-eustáticos, teríamos:
124 - (82-40)=82
ou 124 – (82-60)=102m
Isto significa uma subida no mínimo de 82m e no máximo de 102m para os depósitos de fácies
planície aluvial litoral (portanto próxima do nível de base) da região do Porto. Essa subida terá
que ser explicada essencialmente pelo diastrofismo.
Porém, também há sectores litorais a sofrer subsidência (fig. 75). Como vimos atrás, a região de
206
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Veneza está a sofrer subsidência, de tal forma que o Eemiense, que geralmente aparece entre 2 e
8m, se encontra aqui a uma profundidade de –70m (Dawson, 1992).
Como é evidente, os depósitos emersos das áreas “estáveis” ou aqueles que se encontram
soerguidos eram os únicos que eram facilmente observáveis. Os depósitos cenozóicos em vias de
afundimento deverão estar embutidos uns nos outros, sendo os mais antigos os que se situam a
maior profundidade. Por isso, só por sondagens podem ser observados. É perfeitamente natural,
por isso, que a cronologia do final do Cenozóico das faixas litorais tenha sido estabelecida com
base em depósitos essencialmente soerguidos…
Com efeito, as designações “clássicas” para o final do Cenozóico (Calabriano, Siciliano,
Milaziano, Tirreniano) foram definidas no Mediterrâneo, área muito activa tectonicamente, e
onde os depósitos do Cenozóico estão deformados. No fundo, a atribuição “crono-estratigráfica”
baseada nos critérios do eustatismo foi um grande equívoco, de que sofreram, durante décadas,
os estudos geológicos e geomorfológicos sobre o Cenozóico do litoral.
Daí a reflexão de Ferreira (1983) a propósito da hipótese de C. Teixeira sobre a submersão das
rias galegas: “Nesse artigo (1944: Tectónica plio-pleistocénica do noroeste peninsular) o autor
debate-se com uma evidente contradição que consiste em tentar provar a existência de
movimentos tectónicos recentes com base na presença ou ausência de praias e terraços, datados
pela sua altitude “.
Todavia, o eustatismo existe, como vimos na altura própria e também no início desta aula.
Se reflectirmos sobre a tendência geral de subida dos continentes relativamente aos oceanos
devida a razões de ordem isostática (fig. 74) é possível que, em alguns casos, as taxas de subida
se assemelhem (Barbosa e Barra, 2000) e que, por isso, depósitos aproximadamente da mesma
idade possam estar a altitudes semelhantes.
Porém, não podemos esquecer a existência de uma tectónica diferencial. Como veremos no final
desta aula, dedicada ao exemplo do estudo da plataforma litoral da região do Porto, os
fenómenos de neotectónica não podem ser esquecidos e a área em questão teve, aparentemente,
um comportamento diferencial ao longo do Cenozóico.
Quando se está em situação de levantamento tectónico, como é evidente, a erosão predomina
sobre a acumulação. Por isso, alguns dos depósitos podem ter sido destruídos. A sequência
dificilmente estará completa (vide Ferreira, 1983). Além disso, os depósitos geralmente são
muito pouco espessos. Trata-se, geralmente, de pequenos afloramentos, muitas vezes remexidos,
com uma interpretação que tem que ser muito fina e cautelosa, por causa das recorrências de
fácies e da incidência da neotectónica.
Naturalmente que a melhor forma de compreender este puzzle passa pela datação absoluta dos
depósitos. Mas as técnicas disponíveis não se podem aplicar a muitos deles. Por exemplo, no
litoral do Noroeste da Península, a acidez dos solos fez desaparecer qualquer vestígio de
carbonatos. Apenas métodos do tipo da termo-luminescência podem ser empregues… e muitas
vezes não existem nestes depósitos, frequentemente cascalhentos, areias com os requisitos
necessários para esse tipo de datação.
Todavia, em certos locais privilegiados, uma subida tectónica intensa criou uma espectacular
escadaria de terraços de coral. Um caso muito conhecido é o da península de Huon na Nova
207
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Guiné (figuras 184 e 185, Pethick 1984). Esses terraços podem ser datados através do método do
Urânio-Tório (que permite datações até a um limite de 500.000 anos). Adicionalmente, existem
dados de O18 (http://www.ngdc.noaa.gov/paleo/coral/newguinea.html) que permitem representar
as variações de O16/O18 nos recifes de coral fóssil e também no coral vivo.
A datação dos diversos níveis de terraços, juntamente com o conhecimento de alguns pontos
chave de uma curva bem estabelecida de variação do nível do mar permitiu calcular uma curva
do levantamento tectónico (fig. 185, C) e deduzir, a partir daí, uma curva derivada da variação do
nível do mar durante os últimos 400.000 anos. Isto é: foi possível separar a movimentação
tectónica e o eustatismo, e isso corresponde à resolução de um problema que afectou os
estudiosos destes temas durante décadas, desde que se teve consciência do interesse do estudo
dos terraços marinhos e das interferências quase inextrincáveis entre tectónica e eustatismo na
sua formação.
Noção de terraço. Formação dos terraços do litoral
Segundo Moreira (1984), “terraço marinho é um depósito de sedimentos litorais (de praia ou de
plataforma) que aparece a um nível diferente do que foi construído, devido a variações do nível
do mar”. Nesse sentido, os terraços submersos da figura 181 também são terraços marinhos.
A figura 186 mostra, de forma esquemática, as fases de formação de um terraço marinho:
1. Período interglaciar: aumento do declive da vertente devido ao escavamento feito pelo
mar na sua base. Formação de uma plataforma de erosão com uma cobertura sedimentar
de origem marinha;
2. Fase de glaciação: Regressão marinha. O depósito marinho é coberto por uma formação
solifluxiva de origem continental;
3. Novo período interglaciar: a transgressão marinha faz recuar a vertente criando uma nova
arriba. O antigo depósito marinho foi transformado num terraço coberto por um depósito
solifluxivo.
A figura 187 mostra uma fotografia de uma situação idêntica à descrita no esquema. Este tipo de
ilustração parece-nos muito interessante porque permite uma apreensão visual imediata de um
fenómeno relativamente complexo. Além disso, este esquema é particularmente útil para a
compreensão do que se passa na plataforma litoral da região do Porto, de que nos ocuparemos
noutro local.
Bibliografia utilizada
ANDERSEN, B. G.; BORNS, H. W. JR., (1994) - The Ice Age World, Scandinavian University
Press, Oslo, 208 p.
BARBOSA, B. A. P. S., e BARRA, A., (2000) – Problemática da cartografia dos depósitos
quaternários, Estudos do Quaternário, nº 3, APEQ, Lisboa, p. 15-20
BIRD, E. C. F., (2001) – Coastal Geomorphology. An introduction, J. Wiley & Sons, 322 p.
208
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
DAVEAU, S., (1993) - A Evolução Quaternária da Plataforma Litoral, O Quaternário em
Portugal. Balanço e Perspectivas. Lisboa, APEQ, Colibri, p. 35-41.
FERREIRA, A. B. (1983) - Problemas de evolução geomorfológica quaternária do noroeste de
Portugal, Cuadernos do Laboratorio Xeoloxico de Laxe, nº 5, VI Reunion do Grupo
Español de Traballo de Quaternario, A Coruña, p. 311-330.
FERREIRA, A. B., (1993) – As rañas em Portugal: significado geomorfológico e estratigráfico,
O Quaternário em Portugal. Balanço e Perspectivas. Lisboa, APEQ, Colibri, p. 7-15.
FRANCO, H., (1998) - Millennial scale climate variability: A low-order model relating Heinrich
and Dansgaard-Oeschger events, http://es.epa.gov/ncer_abstracts/fellow/98/franco.html
(arquivo encontrado em Novembro de 2002).
LOMBORG, B., (2002) – The skeptical environmentalist - measuring the real state of the World,
Cambridge Univ. Press, 515 p.
MOREIRA, M.E.S.A., (1984) - Glossário de Termos Usados em Geomorfologia Litoral,
Estudos de Geografia das Regiões Tropicais, Nº 15) - C. E. G., Lisboa, 167 p.
PETHICK, J. - (1984) - An Introduction To Coastal Geomorphology, London, Edward Arnold,
260 p.
RIBEIRO, A. et al., (1979) - Introduction à la Géologie Générale du Portugal, Serviços Geol.
Portugal, Lisboa, 114 p.
RISER, J., (1999) - Le Quaternaire; Géologie et Milieux Naturels, Dunod, Paris, 320 p.
WILLIAMS, M. A.J., DUNKERLEY, DE DECKKER, D. L. P., KERSHAW, A. P., STOKES T.
J., (1998) - Quaternary Environments, 2ª ed. Edward Arnold, London, 329 p.
http://earthobservatory.nasa.gov/Library/Giants/Milankovitch/milankovitch_2.html
http://es.epa.gov/ncer_abstracts/fellow/98/franco.html
http://www.ngdc.noaa.gov/paleo/coral/newguinea.html
http://www.ngdc.noaa.gov/paleo/pubs/tudhope2001/tudhope.html
http://www.usd.edu/esci/Figuras/BluePlanet.html
Aula Prática:
Análise sedimentológica (granulometria e morfoscopia) de depósitos fluviais, de terraços
marinhos e de depósitos solifluxivos.
209
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 173: Reconstrução do padrão das principais correntes marítimas durante o mais
recente ciclo de desintegração continental.
210
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 174: Reconstituição das temperaturas de superfície dos oceanos nas altas
latitudes setentrionais durante o Cenozóico. As temperaturas elevadas do início do
Cenozóico deram, gradualmente, origem a condições frias durante o Quaternário.
211
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 65 (repetição): Variação climática no final do Cenozóico (extraído de Andersen e
Borns, 1994)
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 66 (repetição): Variação climática e do nível do mar durante o Quaternário (fig.
extraída do site http://www.soest.hawaii.edu/coasts/csrg1.html)
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 175: Os ciclos de Milankovitch
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 176: Proposta de Riser (1999) para uma cronologia do Quaternário
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 177: Os estádios isotópicos: os últimos 140.000 anos
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‰ O18
0
Age
25000
50000
75000
100000
125000
150000
175000
200000
225000
250000
-31
-33
-35
-37
-39
-41
-43
-45
ftp://ftp.ngdc.noaa.gov/paleo/icecore/greenland/summit/grip/isotopes/gripd18o.txt
Figura 178: Curva isotópica para a Gronelândia. Dados extraídos de
ftp://ftp.ngdc.noaa.gov/paleo/icecore/greenland/summit/grip/isotopes/gripd18o.txt
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Figura 179: Cronologia do Tardiglaciar e do Holocénico
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Figura 180: Curvas isotópicas do Tardiglaciar e do Holocénico
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 181: Evidência de variações do nível do mar: terraços marinhos emersos e
submersos
Figura 182: A interacção entre o eustatismo e a isostasia podem produzir praias levantadas
que se estendem para além da amplitude dos níveis eustáticos
Figura 183: A curva de Fairbridge sobre as variações do nível do mar durante o
Quaternário e a sua disposição em escadaria Figura 3
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 184: Os terraços de coral na Península de Huon (Nova Guiné)
221
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 185: A separação entre a curva eustática e a subida tectónica na península de Huon
(Nova Guiné)
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Figura 186: Processo de desenvolvimento de um terraço marinho
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 187: Fotografia da situação descrita na figura 186.
Aula 10: Fragilidades versus ordenamento do litoral
Esta tema será conduzido de uma forma ligeiramente diferente do habitual.
Partindo do princípio que os estudantes foram reflectindo sobre as matérias tratadas, é de supor
que, no final do Semestre, eles estejam habilitados a pensar sobre a questão da fragilidade dos
litorais. Assim, o papel do Professor deverá ser o de suscitar, através de imagens e documentos
previamente escolhidos, a discussão dos temas, sugerindo pistas para a sua exploração e depois,
no final, tentar fazer uma sistematização dos temas discutidos, eventualmente através de um
organigrama, necessariamente provisório e incompleto mas que traduza a consciência que os
alunos tenham adquirido acerca da dinâmica que perpassa nos litorais.
A erosão costeira
Segundo Bird (1993), cerca de 90% dos litorais a nível do globo estão num processo de erosão.
Se uma parte desse problema resulta da subida do nível do mar posterior ao fim da Pequena
Idade do Gelo, pensa-se que a variação do nível do mar contribuiu apenas com 10% para a
produção desse recuo (J.M. A. Dias et al. 1997). Sabemos, pela regra de Brunn, que uma subida
do nível do mar tem um impacto no recuo da linha de costa 100 vezes maior. Isso é suficiente
para pôr os litorais numa situação de um certo stress, mas só por si não pode explicar um
fenómeno com a amplitude que a erosão costeira apresenta.
A retenção de sedimentos nas barragens é uma explicação que tem sido muito utilizada.
Efectivamente, se atentarmos nos dados de Mota Oliveira (1990, fig.188) apercebemo-nos de
que o rio Douro perdeu cerca de 86% da sua capacidade de alimentação do litoral devido à
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
construção das barragens. Efectivamente, esse processo levou a uma diminuição muito
significativa da bacia que efectivamente drena para o mar através do Douro (fig. 189). Dada a
proximidade entre a barragem de Crestuma e a Foz do Douro, o Douro foi mesmo o rio que mais
capacidade de transporte de sedimentos terá perdido.
A subida do nível do mar também obriga os rios a entulharem os seus estuários de forma a
atingirem um novo perfil de equilíbrio de acordo com o novo nível do mar. Essa camada de
sedimentos, em estuários largos, pode representar uma parte não negligenciável do problema.
Uma outra explicação que tem sido avançada levanta a hipótese de que se tenha esgotado o stock
de sedimentos que o mar, durante a transgressão flandriana, arrastou para a costa (Paskoff, 1985,
Granja e Carvalho, 1995). Muitos deles foram retrabalhados, originando sistemas dunares
fixados por vegetação que já não são capazes de reabastecer em areias a faixa costeira, a não ser
quando o avanço do mar entalha arribas nesses cordões dunares, como é o caso da praia de
Cortegaça (fig. 141).
É evidente que a vulnerabilidade das regiões costeiras à erosão depende de muitos outros
factores. Um dos mais decisivos tem a ver com o substrato geológico. O processo de erosão é
potencialmente muito mais rápido em arribas constituídas por material pouco consolidado do que
em arribas graníticas ou de calcários maciços. O exemplo das arribas algarvias a leste dos Olhos
de Água é bem conhecido (figura 190) e foi consideravelmente acelerado pela construção dos
molhes que protegem a entrada da Marina de Vilamoura (ver também a fig. 206).
Um dos problemas da área de Espinho e das praias que desde Espinho se estendem para sul é que
as areias de praia assentam sobre depósitos do final do Pleistocénico ou mesmo do Holocénico,
muito pouco consolidados, que não oferecem uma resistência significativa ao avanço do mar.
Outro factor a ter em conta tem a ver com a situação tectónica. Por muito lentos que sejam os
movimentos tectónicos, o facto de actuarem em intervalos de tempo muito longos faz com que a
sua influência não deva ser negligenciada. É possível que a rápida erosão que se verificou em
Espinho, a partir de meados do século 19, se relacione com a hipótese de um basculamento para
Sul, de origem tectónica, da faixa litoral a sul do Douro em direcção à Orla Ocidental mesocenozóica (Araújo, 2002).
Como vimos na aula sobre as variações do nível do mar, as regiões na periferia de áreas que
sofreram glaciação estão submetidas, actualmente, a um processo de subsidência que contribui
para que os problemas de erosão possam ser aí particularmente graves (figs 71 e 72).
O papel das obras de defesa e protecção costeira
Face aos problemas de erosão que as populações costeiras enfrentam, normalmente reivindica-se
a construção de obras de protecção e defesa. Estas podem ser de diversos tipos:
•
Obras longitudinais aderentes (enrocamentos, paredões);
•
Obras longitudinais não aderentes (quebra-mares destacados);
•
Obras transversais (molhes, esporões).
Porém, ao perturbar o desenvolvimento normal da deriva litoral todas as obras transversais
225
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
acabam por reter sedimentos a barlamar. Essa retenção de sedimentos vai provocar um deficit a
sotamar, que resulta, normalmente, num recuo da linha de costa (fig. 191). Se houver valores
patrimoniais importantes a defender é evidente que se vão construir novos esporões que vão
exportar o problema para sotamar. O caso de Espinho é paradigmático: as obras de defesa de
Espinho provocaram uma erosão tão forte em todas as praias a sul desta cidade que em menos de
15 anos a linha de costa se modificou como pode ver-se na figura 192 (o mapa é de 1978 e as
fotografias aéreas de 1995).
Mesmo os quebra-mares destacados (fig. 193) podem ter um papel importante na evolução da
linha de costa. É o caso do quebra-mar da praia da Aguda, acabado de construir na Primavera de
2002 e que já tinha provocado uma importante erosão na praia da Granja em meados de Outubro
deste ano (fig. 172).
As obras de protecção aderente (paredões, enrocamentos) têm consequências muito mais
negativas que os quebra-mares destacados. Na figura 194 é possível ver como, para evitar o
recuo de uma duna em processo de erosão se constrói um paredão. Este, não produz uma
absorção da energia da ondulação e origina, pelo contrário, um processo de reflexão que aumenta
a energia disponível para fazer ablação. A praia acaba por desaparecer completamente.
Porém, as obras de protecção costeira funcionam em certos casos. A figura 195 mostra como a
construção de quebra-mares destacados na costa mediterrânica de Espanha criou pequenos
tombolos, contribuindo para uma considerável acumulação de sedimentos.
Porém é preciso não esquecer que a energia da ondulação no Mediterrâneo não tem nada a ver
com aquela que se pode encontrar no Atlântico. O mesmo se pode dizer das marés que, no
Mediterrâneo apresentam amplitudes da ordem do 0,5m, contra os valores de cerca de 4m de
amplitude máxima em marés vivas que ocorrem na costa portuguesa.
A título de exemplo vale a pena reproduzir o texto e a figura de Carter (1988, figura 196) acerca
da destruição parcial do molhe de Sines, ocorrida em 26 de Fevereiro de 1978, em que blocos de
42 toneladas foram destruídos ou deslocados por ondas de 10m de altura, devido essencialmente
a fenómenos de convergência da ondulação que reforçaram o seu poder de ataque.
A alimentação artificial das praias tem sido utilizada em diversos locais, conhecidos dos
estudantes (Copacabana, praia da Rocha, no Algarve e também na praia Azul, a Norte de
Espinho). Este processo pode servir de complemento aos outros métodos de defesa costeira.
Porém, não está isento de dificuldades: o seu custo é muito elevado e não é fácil encontrar areias
que permitam um bom uso balnear (as areias de dragagens muitas vezes estão poluídas). Em
litorais muito energéticos, como é a costa ocidental portuguesa, é um processo que tem que se
repetir periodicamente, com as consequências que se calculam em termos económicos.
Mais económico e igualmente interessante sob o ponto de vista de reposição do equilíbrio natural
da linha de costa é o processo de by-passing, através do qual as areias retidas a barlamar, por
exemplo, de uma estrutura portuária, são aspiradas e recolocadas a sotamar dessa estrutura.
Porém, nem sempre os interesses económicos permitem que essa solução seja adoptada…
Na figura 163 é possível ver o crescimento da praia e da duna situada a norte do esporão que se
situa na saída da barra de Aveiro, protegendo-a do entulhamento que a deriva litoral provocaria
naturalmente. A acumulação de areias nesse troço é muito intensa… mas intensa era também a
226
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
circulação de camiões de areia que retiravam as areias de S. Jacinto para as levar daí para a
construção civil. Falava-se de uma camião de areia por minuto (Prof. Veloso Gomes,
comunicação oral, Outubro de 1996).
Entretanto, à míngua de areias, a Costa Nova e a Vagueira iam sendo protegidas à custa do erário
público…
As dunas e a protecção das praias
Na perspectiva de um intercâmbio dentro do sistema praia-duna, a existência de dunas funciona
como um dos melhores elementos de defesa costeira. Porém, o uso balnear intensivo das praias
acaba por destruir, devido ao pisoteio das dunas, a sua vegetação. A figura 197 mostra o papel da
vegetação na resistência das dunas à erosão. As sendas formadas pelo pisoteio podem ser
aproveitadas pelo vento para criar corredores de deflação, que podem transformar-se em blowouts. Em período de tempestades, estes blow outs (fig. 198) são muitas vezes sede preferencial de
galgamentos (washover) por onde o mar penetra, destruindo parte do cordão dunar e produzindo
um processo de salinização nas áreas baixas existentes no reverso das dunas (fig. 137).
Daí que o planos de ordenamento da orla costeira (POOCs) tenham empreendido a construção de
passadiços que permitem o acesso às praias (fig. 199), preservando a vegetação que protege as
dunas.
A consciência deste facto, que começa a ser criada entre os organismos responsáveis pela
preservação do ambiente, tem contribuído para a implantação de paliçadas nas dunas frontais das
nossas praias (fig. 200).
(Des)ordenamento versus educação ambiental
Esta nova consciência ambiental levou algum tempo a ser implementada. Durante décadas, as
pessoas foram construindo habitações de férias clandestinas nas dunas e noutros locais afectos ao
domínio público marítimo (fig. 201). A destruição que tem vindo a ser empreendida (Portinho da
Arrábida, Costa da Caparica) é uma medida dolorosa, mas de grande significado na educação
cívica e ambiental do público. É pena que o processo da Ilha de Faro, onde ao problema da
ocupação muitas vezes ilegal se junta uma erosão preocupante, não tenha sido implementado
com a mesma coragem política…
Porém, no caso de prédios legais como as torres de Ofir (fig. 202), a intervenção pública torna-se
mais difícil e fica dependente da vontade política que, como já se viu, pode mudar com os
governos.
A utilização intensiva das áreas litorais para fins turísticos deve obrigar a um processo de
ordenamento que obedece a alguns princípios elementares. A figura 203 enuncia esses princípios
de uma forma gráfica:
•
As estradas litorais devem ser perpendiculares e não paralelas à linha de costa.
•
Os parques de estacionamento devem ficar situados atrás do cordão dunar e ter uma forma
que conduza os utentes para a utilização de passadiços.
•
Os passadiços devem ser a única forma de transposição do cordão dunar. Este deve ser
protegido através de sebes que dificultem o mais possível a passagem para as dunas.
227
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Sabemos, porém que todas essas boas intenções esbarram contra a ignorância e a falta de
civismo. Assim, a bonita ponte pedonal construída na praia de Labruge, que ficou pronta na
primavera de 2002, no verão deste ano já apresentava sinais de vandalismo (figura 204).
Quer isto dizer que, além das boas intenções e das boas políticas ambientais por parte das
entidades interessadas, é preciso que o público compreenda a utilidade dessas medidas e esteja
empenhado em defender o seu património ambiental e cultural.
Infelizmente, o triste espectáculo das praias e dunas transformadas em lixeiras (fig. 205) não foi
ainda erradicado, e coexiste com obras apreciáveis e estimáveis como a da ponte pedonal da
figura 204…
A poluição das praias
A poluição da faixa costeira resulta, em boa parte, do facto de o litoral ser uma área onde se
acumulam muitas das pessoas e das actividades económicas que existem no nosso país (ver figs
1 e 2). As principais cidades de Lisboa e Porto situam-se em estuários que recebem os efluentes
domésticos e muitos efluentes industriais não tratados.
Os rios são usados como um meio de nos desembaraçarmos do lixo. Ora, esse lixo levado até ao
mar acaba sempre por ser redistribuído nas praias, mas não sem antes os plásticos terem
contribuído, para a morte (por sufocação ou por ingestão), de um número apreciável de animais
marinhos.
Pior ainda do que a poluição de que falámos, dada a capacidade de sobrevivência e de
contaminação dos hidrocarbonetos, é aquela que resulta das marés negras, como aquela que
acaba de se produzir na Galiza e que está prestes a atingir a costa portuguesa. Aí, os
conhecimentos de ondas e marés, mas também da geomorfologia do litoral podem ter um papel
decisivo na prevenção e na definição das áreas de maior risco e da melhor maneira de protegêlas.
A posição de Portugal, na rota de um intenso tráfego marítimo, acaba por levar à invasão
periódica de sectores mais limitados da costa por uma série de marés negras de menores
dimensões, que são o resultado da lavagem dos tanques dos petroleiros, feita quer no alto mar
quer junto à linha de costa.
Os POOCs (Planos de Ordenamento da Orla Costeira)
À falta da consciência ambiental por parte do público, a atitude das entidades públicas terá que
ser o ponto de partida nesse processo e devem ser encarecidos os esforços feitos nos últimos anos
no sentido de produzir, aprovar e implementar os POOCs (Planos de Ordenamento da Orla
Costeira, figura 206).
Os POOCs nem sempre contaram com um conhecimento suficiente do terreno. Algumas vezes
esse desconhecimento permitiu, pelo menos, que os mapas de condicionantes contenham erros de
identificação (fig. 207) e propostas desajustadas à realidade geomorfológica do terreno
(construção de passadiços em áreas de arriba, por exemplo).
Porém, num país onde imagens como a da figura 205 ainda são comuns, os POOCs foram um
razoável começo.
228
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Ainda não sabemos se, no confronto entre os POOCs e os PDMs (a definição das áreas de
protecção entra frequentemente em conflito com as áreas destinadas à construção previstas nos
ditos PDMs), a lei mais forte (isto é, os POOCs) vai levar a melhor sobre os mais fortes (isto é,
os promotores imobiliários e as autarquias que querem aumentar a receita da contribuição
autárquica…).
Talvez, por isso mesmo, nunca se viram tantas construções a serem iniciadas no litoral
(concretamente na praia de Labruge) como nas vésperas dos momento em que o POOC
Caminha-Espinho começou a ser implementado…
Aula Prática
Com base nos documentos apresentados na aula teórica, e ainda:
•
textos encontrados na Web;
•
recortes de jornais (nomeadamente as crónicas de Luísa Schmidt no Expresso);
•
mapas incluídos no POOC Caminha Espinho;
•
legislação aplicável;
será feita uma discussão deste tema, da qual resultará a construção de um organigrama do tipo do
apresentado na figura 208.
Bibliografia utilizada
ARAÚJO, M. A., (2002) - Relative sea level, diastrophism and coastal erosion: the case of
Espinho (Portuguese NW coast), publicado nas Actas do Congresso Internacional Littoral
2002, organizado pela Associação Eurocoast-Portugal, Vol. 2, p. 125-132.
BIRD, E. C. F., (1993) - Submerging Coasts. The Efects of a Rising Sea Level on Coastal
Environments, John Wiley & Sons, Chichester, 184 p.
BIRD, E. C. F., (2001) - Coastal Geomorphology. An introduction, J. Wiley & Sons, 322 p.
CARTER, R.W.G. - (1989) - Coastal Environments - An Introduction to the Physical, Ecological
and Cultural Systems of Coastlines, Academic Press Limited. London, 5ª Impressão, 617 p.
DIAS, J. M. A. et. al. (1997) - Evolução da linha de costa, em Portugal, desde o último máximo
glaciário até à actualidade: síntese dos conhecimentos, Estudos do Quaternário, APEQ, Lisboa,
p. 53-66. Aula 10: riscos e ordenamento
DEPARTMENT of the ENVIRONMENT - (1995) - Coastal Planning and Management: A
review of Earth Science information needs, HMSO, London, 186 p.
GRANJA, H. M, SOARES DE CARVALHO, G. - (1995) - Sea-Level Changes During the
Pleistocene-Holocene In the NW Coastal Zone of Portugal. In Terra Research, Blackwell
Science, p. 60-67.
229
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
KOMAR, p. D., (1998) - Beach Processes and Sedimentation, Prentice Hall, New Jersey, 543 p.
MOTA-OLIVEIRA, I. B., (1990) - Erosão costeira no litoral Norte: considerações sobre a sua
génese e controlo, Actas do 1º Simpósio sobre a protecção e revalorização da faixa
costeira do Minho ao Liz, Inst. Hidráulica e Recursos Hídricos, Porto, p. 201-221.
PASKOFF, R. - (1985) - Les littoraux - impact des aménagements sur leur évolution, Col.
Géographie, Paris, Masson, 185 p.
PASKOFF, R., (2001) - L’élevation du Niveau de la Mer et les Espaces Côtiers, Institut
Océanographique, Col. Propos, 190 p.
SANTOS, F. D, FORBES, K , MOITA, R. (editores) (2002) – Climate change in Portugal.
Scenarios, impacts and adaptation mesures (Siam project), Gradiva, F. C. Gulbenkian,
FCT, Lisboa, 454 p.
THURMAN, H. V., (1997) - Introductory Oceanography, Prentice Hall, New Jersey, 544 p.
VILES, H., SPENCER, T. - (1995) - Coastal Problems - Geomorphology, Ecology and Society
at the Coast, Edward Arnold, London, 350 p.
MINISTÉRIO DO AMBIENTE E RECURSOS NATURAIS-FBO, (1999) - POOC
Caminha-Espinho, Cartas de condicionantes, Plantas de Síntese e Planos de Praia, Lisboa
Figura 188: Comparação entre a carga sólida transportada pelos rios do Norte de Portugal
numa situação natural e após a construção das barragens
Minho
Âncora
Lima
Neiva
Cávado
Ave
Douro
Actual
sediments
Natural situation
0
400000
800000
1200000
1600000
230
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 189: Redução da área das bacias de drenagem portuguesas devido à construção das
barragens
Figura 190: Recuo das arribas a leste de Quarteira (Vale de Lobo, Algarve).
231
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
232
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 191: O impacto das obras transversais na dinâmica da linha de costa
Figura 192: Comparação entre o mapa topográfico 1:25.000 (folha 143-Espinho, 1978) e
as fotografias áéreas do site http://ortos.igeo.pt/ortofotos/
233
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 193: O impacto de um quebra-mar destacado na evolução da linha de costa
Figura 194: A construção de um paredão na frente de uma duna em processo de erosão
234
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
acaba por produzir uma reflexão das ondas que tende a aumentar a energia disponível
para o transporte das areias.
Figura 195: Quebra-mares destacados na costa mediterrânica de Espanha
235
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 196: Análise da destruição do molhe de Sines (Fevereiro de 1978).
236
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 197: O papel da vegetação na resistência das dunas à erosão. Praia de Cortegaça.
Figura 198: Corredores de deflacção cortados em arriba pelo avanço do mar. A Sul da
praia da Torreira.
Figura 199: O passadiço de Francemar permitiu minorar a degradação das dunas. Ano de
2000.
237
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 200: Paliçadas na praia de Labruge: Novembro de 2002. É perfeitamente visível o
processo ondulatório que produz a deposição das areias a sotavento das paliçadas.
Figura 201: Ocupação clandestina das margens da ribª de S. Pedro, na Praia Velha (S.
Pedro de Muel), nos anos 80.
238
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 202: Dois casos de construção na praia ou na duna frontal: barra de Aveiro e as
tristemente célebres Torres de Ofir.
Fig 203: Esquema sobre as tácticas que podem ser usadas para minorar o processo de
degradação das dunas.
239
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 204: Ponte pedonal de Labruge, sobre o Rio Donda. Agosto de 2002.
Figura 205 : Depósito de lixos domésticos e da construção civil sobre a arriba da praia de
Labruge (2001).
240
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 206: Os POOCs e as grandes regiões estruturais de Portugal
241
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 207: Carta de condicionantes do POOC Caminha-Espinho.
242
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 208: As respostas da sociedade à elevação do nível do mar
Aula 14: Sumário: Apresentação dos trabalhos dos alunos
Os trabalhos serão entregues algum tempo antes, de modo a poderem ser lidos e anotados pelo
Professor.
Cada grupo de alunos fará uma curta apresentação dos seus trabalhos. Essa apresentação será
feita de preferência através do data show que existe no laboratório de Geografia Física e
recorrendo a programas como o MS Power Point ou Adobe Acrobat. A essa apresentação seguirse-á uma discussão orientada pelo Professor mas em que todos os estudantes da disciplina podem
participar.
243
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Aula 15: Sumário: Apresentação dos trabalhos dos alunos (conclusão).
Auto e hetero-avaliação. Aprendizagem de construção de páginas Web para a colocação de uma
síntese (supervisionada pelo Professor) dos respectivos relatórios na página Web da disciplina.
Saídas de campo
Como foi dito no início, as saídas de campo serão parte integrante da disciplina. Tratando-se de
uma disciplina de opção em que o número de estudantes não deverá ser muito elevado, as saídas
serão programadas com alguma flexibilidade, recorrendo a meios de transporte próprios.
Isso dá-nos a possibilidade de marcar as saídas com uma pequena antecedência, escolhendo a
altura mais adequada de acordo com:
•
as matérias tratadas nas aulas teóricas e práticas;
•
as marés;
•
o tipo de tempo previsível.
Como se pretende que haja uma adaptação o mais estreita possível entre as reacções e os
interesses do alunos e o trabalho de campo é evidente que aquilo que vai ser dito não passa de
um guião muito elementar, que será desenvolvido de forma diferenciada e tanto quanto possível
adaptada às circunstâncias.
Também estes tópicos resultam do desenvolvimento das nossas ideias sobre a prática de
leccionação dos Seminários em Geografia Física que já vem do ano lectivo de 1990-1991.
Saída de campo 1.
Esta saída de campo deverá ser marcada numa manhã de maré baixa viva.
Percurso: Porto, Gião, Vila Chã, S. Paio, Labruge, Boa Nova, Foz do Douro, Lavadores.
Objectivos:
•
Trabalho com cartas topográficas e geológicas;
•
Aprendizagem da orientação de mapas e identificação da localização no terreno recorrendo à
carta e à bússola;
•
Aprendizagem do trabalho com a bússola. Identificação de direcção e pendor de estruturas
geológicas (filões, fracturas, falhas);
•
Influência da litologia (granitos alcalinos e calco-alcalinos, gneisses e migmatitos da praia de
Vila Chã);
•
Reconhecimento de formas litorais (marmitas, plataformas de erosão marinha, entalhes
basais, arribas);
•
Influência da tectónica (a falha do Gião, fig. A);
244
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
•
Escalonamento de formas e depósitos litorais. O entalhe basal fóssil do S. Paio e seu
significado (fig. B);
•
Processos actuantes na plataforma de erosão marinha de Lavadores (fig. C);
•
Recolha de algumas amostras de sedimentos litorais (areias de praia, de duna, de estuário)
para posterior tratamento.
Saída de campo 2:
Dado que as praias de Cortegaça e Maceda se situam a uma distância que ronda os 30kms,
justifica-se que esta saída de campo ocupe um dia inteiro de trabalho. Além disso, a duração de
uma manhã e uma tarde permitirá ver como se faz a evolução da maré e fazer alguns cálculos
simples sobre a cota atingida pelo mar nos diferentes momentos. Se possível, também desta vez
seria interessante que a visita se realizasse durante um dia de maré viva.
Objectivos gerais:
•
Identificação das partes constituintes de um perfil de praia;
•
Perfis reflexivos e dissipativos (fig. G);
•
Construção de um perfil de praia (fig. H);
•
Estruturas sedimentares (crescentes de praia, ripples de ondulação e de corrente,
imbricação de calhaus, estratificação entrecruzada planar);
•
Análise macroscópica de areias de praia e duna ao longo da linha de costa;
•
O papel da erosão e o enriquecimento em minerais pesados (figs 132 e 133).
O percurso corresponderá ao caminho pelo litoral a Sul de Lavadores até à Praia de S. Pedro de
Maceda. Serão feitas paragens em diversos locais com os seguintes objectivos específicos:
•
Lavadores: o estuário do Douro. O Cabedelo e as suas variações de forma e posição (figs.
152 e 153).
•
Salgueiros (formas de erosão no granito de Lavadores, fig. 102);
•
Madalena (o exutor submarino e a perturbação que ele provocou no traçado da linha de
costa, mapa da fig. D);
•
Praia Atlântico (a erosão das areias devida à construção do exutor submarino faz aparecer
depósitos solifluxivos e lagunares (figura E);
•
Praia de Francelos: esta praia foi o local onde a erosão produzida pela construção do
exutor submarino da Madalena foi mais intensa (fig. F);
•
Praia de Miramar: visita ao rochedo do Sr. da Pedra: o entalhe basal (fig. 101) e as
formas do tipo alvéolo (fig. 113);
•
Praia da Aguda: visita ao parque das Dunas. Morfologia e vegetação das dunas. A
importância da preservação das dunas e da educação ambiental;
•
Praia da Aguda-Granja: a construção do quebra mar destacado e os fenómenos de erosão
associados (fig. 172);
245
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
•
Espinho: os esporões e a alimentação artificial na praia Azul. Histórias de erosão (fig. I);
•
Paramos: Fenómenos de erosão. Os problemas humanos decorrentes do desaparecimento
da pesca (arte xávega). Entrevista com a população local sobre o tema. Relação entre os
problemas de erosão e a construção dos esporões de Espinho;
•
Lagoa de Esmoriz: mudanças de traçado, sedimentos lagunares, slikke e schorre. Dunas
embrionárias. O excesso de ocupação do litoral;
•
Cortegaça: o enrocamento e o (quase) desaparecimento da praia. O corte na duna fóssil
de Cortegaça (fig. 141). O significado dos níveis lagunares e do solo podzólico.
•
Percurso Cortegaça-Maceda: Diferentes sistemas de dunas (fig. 140) orientação e grau de
pedogénese;
•
Praia de S. Pedro de Maceda: os níveis lagunares: comparação com a sua situação em
Cortegaça;
Saída de campo 3:
Percurso: Carregal-Arrábida Shopping-Picão-Lavadores.
Trata-se de um percurso destinado a mostrar os depósitos de fácies fluvial e marinho existentes
na plataforma litoral na área a sul do Douro (mapa da fig. J):
1. Depósitos de carácter fluvial que se situam sempre acima dos 50m.
a. Estes depósitos podem ainda ser subdivididos em 2 conjuntos: Um conjunto mais
antigo de depósitos fluviais relativamente bem calibrados, formados num
ambiente de planície aluvial (fase I, corte do Carregal, fig. K).
b. Um outro conjunto, mais recente, englobando blocos de sedimentos do tipo
anterior e com um carácter nitidamente torrencial (fase II, corte do Arrábida
Shopping-fig.L, corte do Picão).
2. Depósitos marinhos (que poderiam também designar-se como terraços marinhos ou
praias levantadas, de acordo com a designação clássica que lhes foi, muitas vezes,
atribuída) que se encontram a cotas que nunca ultrapassam os 40m.
A separação existente entre os depósitos de fácies marinho e fluvial é acentuada pela existência
de um degrau topográfico geralmente bem sensível (por exemplo à latitude da Madalena, ver fig.
D).
Quanto aos depósitos marinhos, as suas características sedimentares e situação topográfica
permitiram definir um escalonamento de 3 níveis.
•
Os depósitos que se apresentam em manchas mais extensas são, normalmente, aqueles
que se situam na proximidade dos depósitos fluviais, a altitudes compreendidas entre 30 e
37m. Trata-se de depósitos geralmente espessos, que assentam sobre um substrato
rubefacto, bastante alterado, e que designaremos como “nível 1” (Lavadores, fig. M).
246
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
•
Os depósitos do “nível 2” apresentam uma certa ferruginização (cor acastanhada),
assentam sobre um substrato cuja alteração, menos intensa que a do nível precedente, lhe
confere uma cor esbranquiçada, e situam-se a altitudes de 18-15m (Lavadores, fig. N).
•
Os depósitos do “nível 3” aparecem a cotas geralmente inferiores a 10m, e em certos
locais chegam a atingir o nível actual das marés baixas (praias de Francelos, da Aguda e
da Granja). Apresentam uma cor castanha, que corresponde a uma ferruginização bastante
intensa, que os transforma, por vezes, em verdadeiros conglomerados. O seu bed-rock
apresenta apenas uma alteração incipiente e uma pâtine castanha ou alaranjada,
obviamente relacionada com a migração de ferro que condicionou a cimentação do
depósito suprajacente (fig. P).
Ainda junto à praia de Lavadores encontramos deformações de origem aparentemente tectónica
em depósitos dos níveis II e III (fig. O).
Figura A: A falha do Gião afecta um depósito presumivelmente fini-terciário/quaternário.
É um exemplo pedagógico para comprovar a actividade tectónica recente
247
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura B: Entalhe basal fóssil a uma cota de 9m acima do nível médio daságuas do mar (S.
Paio, Labruge, Vila do Conde)
Figura C: Plataforma de erosão marinha de Lavadores. A maré deveria estar praticamente
no seu ponto médio, o que significa que o mar estava à cota 0.
248
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura D: Reprodução parcial do mapa 1:25.000, folha 122 (Porto). Edição de 1999
249
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura E: Afloramento de depósitos de tipo lagunar na praia Atlântico (entre Valadares e
Francelos). Aspecto de pormenor das fendas de retracção encontradas nesse depósito
Figura F: Erosão da praia de Francelos e destruição de parte do bar “Titanic”. 31 de
Dezembro 1999.
250
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura G: Praias dissipativas, intermédias e reflexivas.
Figura H: Processo de elaboração de perfis de praia.
251
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura I: O recuo da linha de costa em Espinho. Figura extraída do Guia de Portugal
(Entre Douro e Minho) da Fundação Calouste Gulbenkian.
252
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura J: Esboço geomorfológico de um sector da plataforma litoral compreendido entre a
Foz do Douro e a Praia da Madalena. Com base na carta topográfica 1/25.000.
253
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura K: O depósito da fase I do Carregal (128m)
254
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura L: O depósito do Carrefour (hoje inexistente; muito semelhante ao do Arrábida
Shopping). Na foto de baixo, pormenor do corte anterior.
255
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura M: O depósito do nível marinho I de Lavadores (35m)
Figura N: O depósito do nível II de Lavadores (18m)
256
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura O: O depósito marinho do nível II de Lavadores e a sua afectação provável por
uma falha inversa
Figura P: Entalhe basal nos granitos de Lavadores, fossilizado por um depósito
(Eemiense?). Praia de Lavadores, cerca de 5-6m.
257
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Índice das Figuras
Figura 3 Densidade da população nos concelhos do litoral
27
Figura 4: Penetração dos nevoeiros de advecção no litoral da região do Porto
29
Figura 5: Classificação dos litorais essencialmente baseada na situação estrutural
32
http://www.nautigalia.com/elninoylanina/index3.htm
35
Figura: 6: Estrutura dipolar da molécula de água. Ligações iónicas e covalentes
37
Figura 7: A penetração da energia solar na água do mar
38
Figura 8: Variação da temperatura, salinidade e densidade da água com a latitude e a profundidade
39
Figura 9: Balanço energético de Janeiro e Julho
40
Figura 10: Correntes quentes e frias e áreas de upwelling
41
Figura 11: Direcção dos ventos versus direcção das correntes marítimas. A espiral de Ekman
42
Figura 12: A circulação em superfície e em profundidade. Conveyor belt
43
Figura 13: Relação entre a direcção dos alíseos e as correntes por eles geradas. O upwelling.
44
Figura 14: Exemplos de situações de upwelling na costa ocidental da Península Ibérica. Adaptado de O. Ribeiro, H.
Lautensach e S. Daveau, vol. I, 1987
45
Figura 15: Circulação ao longo da costa portuguesa em Agosto, Novembro e Dezembro
46
Figura 16: Corrente de Davidson ao largo da costa da Califórnia
46
Figura 17: Tipos de ondas
52
Figura 18: Características essenciais das ondas orbitais
53
Figura 19: Relações entre o comprimento de onda, o período e a velocidade das ondas
53
Figura 20: Modificações sofridas pelas ondas quando se aproximam da linha de costa
54
Figura 21: Ondas de águas profundas, intermédias e pouco profundas
54
Figura 22: A transmissão da energia do vento para as ondas
55
Figura 23: Ondas de capilaridade e de gravidade
55
Figura 24: Área de origem da ondulação e Swell
56
Figura 25: Interferência de ondas
57
Figura 26: Vagas por derramamento, em voluta e em rolo (surging)
58
Figura 27-A: A refracção das ondas quando se aproximam da costa
58
Figura 27-B: Refracção das ondas
59
Figura 28: Reflexão das ondas
59
Figura 29: Difracção das ondas
60
Figura 30: Ondas estacionárias
60
Figura 31: Storm surge
61
Figura 32: Processo de criação dos tsunami
61
Figura 33: O tsunami que se seguiu ao sismo de Lisboa de 1755
62
Figura 34: Importância relativa das marés geradas pela Lua e pelo Sol
68
Figura 35: O sistema de rotação Terra-Lua. O baricentro
69
Figura 36. Trajectórias seguidas pela Terra e pela Lua ao longo do ano
70
Figura 37: Rotação Terra-Lua: todos os pontos da Terra descrevem trajectórias idênticas em torno do baricentro. A
força centrípeta que mantém o sistema em rotação conjunta é igual em todos os pontos da Terra.
71
Figura 38: A existência de forças gravitacionais diferentes consoanter a posição de cada ponto em relação à Lua
implica a existência da força de maré
72
Figura 39: Maré alta directa e reflexa
73
Figura 40: Dia Lunar: ao longo de um dia solar a Lua gira 12° e 12’. Por isso, para o observador voltar à posição
inicial relativamente à Lua, é necessário que a Terra gire mais 12° e 12’. Desta forma, o dia lunar tem 24h e 50min.
73
Figura 42: Marés vivas e mortas
74
Figura 43: Interferência entre as marés lunares e solares
75
Figura 44: Variação da distância da Terra ao Sol e da Terra à Lua
76
258
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 45: Fases da Lua e variação da distância da Lua à Terra e da declinação lunar (Março de 1981)
76
Figura 46: Variação da declinação da Lua: ciclo de 18,6 anos.
77
Figura 47: Variação na amplitude das marés durante o dia: as marés tropicais
77
Figura 48: Variação da declinação solar ao longo do ano: as marés equinociais
78
Figura 49: tipos de marés. Semidiurnas, mistas e diurnas
79
Figura 50: variações na altura da maré devidas a causas meteorológicas: storm surge de 14-16 de Outubro de 1987
na costa portuguesa
80
Figura 51: Permanência do nível do mar a diversas alturas. Caso de marés semidiurnas e diurnas.
81
Figura 52: Propagação da onda de maré
82
Figura 53: Linhas cotidais e pontos anfidrómicos a nível do globo
83
Figura 54: Linhas cotidais no Atlântico
84
Figura 55: A propagação da maré ao longo da costa ocidental da Península Ibérica
85
Figura 56: A penetração da maré ao longo de um estuário (macaréu)
86
Figura 57: Relação entre a o tipo e a frequência de diversos tipos de paisagens costeira e a amplitude das marés
87
Figura 59: O papel das variações relativas do nível do mar no avanço ou recuo da linha de costa
95
Figura 60: Os factores em jogo nas variações relativas do nível do mar
95
Figura 61: Processo de determinação do nível do mar a partir da altimetria espacial
96
Figura 62: Deformações da superfície do geóide
97
Figura 63: As grandes fases na evolução do nível do mar durante o Fanerozóico e a sua relação com o efeito de
estufa (G. de Greenhouse) e com as fases de glaciação (I de Ice)
97
Figura 64: Duas curvas eustáticas para o Fanerozóico
98
Figura 65: Variação climática no final do Cenozóico (extraído de Andersen e Borns, 1994)
99
Figura 66: Variação climática e do nível do mar durante o Quaternário (fig. extraída do site
http://www.soest.hawaii.edu/coasts/csrg1.html)
100
Figura 67: Configuração da linha de costa e rede de drenagem na área das Ilhas Britânicas e do mar do Norte
101
Figura 68: Variações da linha de costa de Portugal a partir de 18.000BP
102
Figura 69: Proposta de variação do nível médio do mar na margem continental portuguesa desde o último máximo
glaciário
103
Figura 70: O rebordo do inlandsis e o seu colapso no período pós-glaciar
103
Figura 71: Taxa das variações relativas do nível do mar nas áreas glaciadas e na sua periferia
104
Figura 72: Recentes variações do nível do mar à volta da ilhas Britânicas. É de notar a existência de variações
importantes na taxa de variação mesmo em locais bastante próximos.
105
Figura 73: Tendências da variação relativa do nível do mar verificadas nas estações maregráficas da Península
Ibérica
106
Figura 74: Subsidência versus levantamento devidos a fenómenos de hidro-isostasia
107
Figura 75: Localização dos litorais subsidentes a nível do Globo
108
Figura 76: Variações recentes do nível médio relativo do mar em 6 estações
109
maregráficas
109
Figura 77: Taxa de variação do nível do mar no período de Janeiro de 1993 a Dezembro de 2000
110
Figura 78: Variação do nível do mar de 1700 até 1970
111
Figura 79: Tendências no comportamento do nível relativo do mar em diferentes locais do mundo, com base em
séries maregráficas com mais de 70 anos.
112
Figura 80: As projecções do IPCC: relatório de 1991 (extraído de E. Bird, 1993)
113
Figura 81: As projecções do IPCC (relatório de 2001:
113
Extraído de: http://www.ipcc.ch/pub/spm22-01.pdf
113
Fig. 82: As taxas de variação do nível do mar, respectivos intervalos e sua variação no tempo
114
Figura 83: A curva do marégrafo de Cascais
115
Figura 84: Paisagens e terminologia nos litorais rochosos
123
Figura 85: O balanço sedimentar num determinado sector costeiro
124
Figura 86: Tipos de rebentação na base das arribas
124
Figura 87: Distribuição das pressões actuando na base das arribas com ondas estacionárias, a quebrar ou já
quebradas
125
Figura 88: Distribuição vertical da energia produzida pelo quebrar das ondas
125
Figura 89: Relação entre a fadiga dos materiais, o número de ciclos de pressão e a existência ou não de água
126
259
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 90: O papel da profundidade e da decorrente diminuição da porosidade na
126
resistência de uma rocha granítica
127
Figura 91: o sistema de recuo das arribas: a erosão basal é essencial para um recuo contínuo da arriba.
127
Figura 92: Velocidade de recuo de uma arriba artificial e formação de uma praia na sua frente. O entalhe
desenvolve-se obliquamente, originando uma rampa.
127
Figura 93: Velocidade de escavamento de uma arriba composta de areia aglutinada por um cimento.
128
Figura 94: Movimentos de massa nas arribas
129
Figura 95: Formas de entalhes basais em rocha não calcária
130
Figura 96: Os três tipos fundamentais de morfologia nas costas rochosas: plataforma descendo para o mar,
plataforma horizontal e arriba mergulhante
131
Figura 97: Perfis de algumas plataformas de erosão marinha situadas na costa portuguesa
132
Figura 98: Antiga plataforma de erosão marinha; é de notar a existência de um sector inferior, com baixo declive (1)
e uma rampa (2) que, neste caso tem um declive de cerca de 13° (Praia de Vila Chã, Vila do Conde). Nesse
momento o nível do mar estava praticamente no nível médio. A seta corresponderia ao nível médio do mar
contemporâneo da plataforma. Este situar-se-ia claramente acima do nível actual
133
Figura 99: Tipos e desenvolvimento de entalhes basais em ambiente de laboratório
133
Figura 100: Costa da Galiza: colocação de instrumentos de medida da degradação da superfície em plataformas de
erosão marinha (Micro Elevation Meter, MEM), feita sob a supervisão de A. Trenhaile.
134
Figura 101: Entalhe basal em gneisses muito resistentes. Rochedo do Srª da Pedra, Miramar, V. Nova de Gaia
135
Figura 102: Entalhe basal e rochas pedunculadas na praia de Salgueiros, V. Nova de Gaia
136
Figura 103: Entalhe basal desenvolvendo-se em rampa a partir do nível da maré baixa. Praia de Vila Chã, Vila do
Conde
136
Figura 104: Entalhe basal desenvolvendo-se em rampa e plataforma de erosão marinha adjacente (parcialmente
coberta de areias). A sul da Praia de S. Paio, Labruge, Vila do Conde
137
Figura 105: Formas litorais (plataformas do tipo B) em diversso tipo de rocha, nas regiões tropicais
138
Figura 106: O aproveitamento das superfícies de descontinuidade no desenvolvimento de uma pequena gruta no
granito calco-alcalino de Lavadores. Esta reentrância desenvolve-se acima do nível das marés mais altas, numa área
muito exposta e deverá corresponder a uma herança de um nível relativo do mar ligeiramente mais alto
139
Figura 107: Arcos de erosão: Praia de As Catedrais, Litoral Norte da Galiza, entre Foz e Ribadeo (Concelho de
Barreiros, Província de Lugo).
140
Figura 108: Fotografia aérea da praia das Catedrais, com indicação de algumas das direcções estruturais mais
relevantes
141
Figura 109: Aspecto do carso exumado da Ponta da Piedade (Lagos, Algarve). Frente ao arco podem ver-se 2
pináculos (sea stacks)
141
Figura 110: Pináculo resultante de um dique intruído nas rochas basálticas (Madeira. Extraído do site
http://www.trekdiary.com/99mad5.html
142
Figura 111: Conjunto de marmitas orientadas pela acção de fracturas: Praia de Lavadores (V. Nova de Gaia)
143
Figura 112: Bacia de dissolução no beach rock da Praia do Xai-Xai (Moçambique)
144
Figura 113: Alvéolos nos gneisses biotíticos muito resistentes do rochedo do Sr. da Pedra (Praia de Miramar, V.
Nova de Gaia). Altitude: cerca de 9m acima do nível médio das águas do mar.
144
Figura 114: Ganhos e perdas de areias numa praia. As praias de calhaus têm ganhos e perdas semelhantes,
exceptuando no que diz respeito à acção do vento.
152
Figura 115: Arribas vivas, estabilizadas e mortas.
153
Figura 116: Tipologia da faixa costeira entre Caminha e Espinho.
153
Figura 117: Perfil de praia: o esquema simples de R. Paskoff.
153
Figura 118: Perfil de praia. Terminologia francesa de A. Guilcher.
154
Figura 119: Morfologia das praias: comparação de diferentes terminologias.
155
Figura 120: Tipos de praias consoante a respectiva configuração.
155
Figura 121: Tombolo formado pela ponta da Gafa na praia do Mindelo (Vila do Conde).
156
Figura 123: Relação entre o declive da praia e o calibre dos materiais que a formam.
157
Figura 124: Modo de formação dos crescentes de praia.
158
Figura 125: Crescentes de praia na Praia do Norte (a Norte do promontório da Nazaré).
158
Figura 126: Ilustração do princípio de Bruun.
159
Figura 127: Variação do perfil de uma praia entre a situação de verão e a situação de inverno.
159
260
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura 128: Bermas de praia. Foto extraída de http://www.pol.ac.uk/india/IND_updatefw.html
160
Figura 129: Variações de declive e tipo de sedimentação numa praia de calhaus.
160
Figura 130: As variações no pendor das lâminas numa praia reflectem diferenças no declive da face da praia. Figura
extraída de:
161
http://www-geology.ucdavis.edu/~GEL109/SedStructures/SedStructures.html
161
Figura131: Marcas de corrente em depósitos litorais. Foto extraída do site
161
Figura 132: Processo que explica a erosão predominante nos grãos de quartzo ou feldspato relativamente aos grãos
de minerais pesados.
162
Figura 133: Enriquecimento em minerais pesados de uma praia em erosão. Praia de Francelos (Vila Nova de Gaia).
162
Figura 134: Corrente em zig-zag e deriva litoral
163
Figura 135: Complementaridade no sistema praia-duna.
163
Figura 136: O papel dos obstáculos na formação das dunas embrionárias.
163
Figura 137: O vento vindo do mar, ao soprar sobre a duna frontal, desenvolve turbilhões que explicam a formação
de depressões interdúnicas.
164
Figura 138: Dunas do tipo barkhan formadas por vento que sopra da terra para o mar. Julho de 2002, Narbonne
Plage, costa do Languedoc, França.
164
Figura 139: Desenvolvimento sequencial de um sistema de dunas litorais.
165
Figura 140: Sistemas de dunas ao Norte da laguna de Aveiro.
166
Figura 141: Praia de Cortegaça: as setas separam os 3 conjuntos dunares existentes.
167
Figura 142: Corte esquemático e interpretação do sistema dunar das Landes.
168
Figura 143: Duna consolidada por cimento carbonatado: a sul de Porto Côvo.
168
Figura 144: Definição dos graus de rolamento dos grãos de quartzo (muito angulosos, angulosos, sub-angulosos,
arredondados, redondos e muito redondos). Extraído de G. S. Carvalho, 1966.
169
Figura 145: Relação hierárquica entre forma, grau de rolamento e aspecto de superfície dos grãos.
170
Figura 147: A pluma do Mississipi. Imagem extraída de:
http://earthobservatory.nasa.gov/Newsroom/NewImages/Images/modis_mississippi_sed_lrg.jpg
182
Figura 148: Variação da velocidade da corrente consoante a fase da maré
183
Figura 149: Correntes residuais e transporte de sedimentos nos estuários de cunha salina
184
Figura 150: Correntes residuais num estuário de mistura parcial
185
Figura 151: Correntes salina e fluvial num estuário de mistura total
185
Figura 152: Estuário do rio Douro em 1995
186
Figura 153: Evolução do Cabedelo nos útimos 150 anos (fonte: Administração dos portos do Douro e Leixões,
APDL)
187
Figura 154: O corpo lodoso e a sua movimentação num estuário com cunha salina
188
Figura 155: Factores em jogo na evolução de um delta
188
Figura 156: Problemas de erosão no delta do Nilo devidos à retenção de sedimentos na barragem de Assuão.
189
Figura 157: Elementos constitutivos de uma laguna
189
Figura 158: O delta do Pó e a laguna de Veneza
190
Figura 159: Imagem de satélite da laguna de Veneza
190
Figura 160: Veneza durante a ”acqua alta” de 16 de Novembro de 2002
191
Figura 161: Valores máximos da altura da água atingidos em cada ano, de 1927 até 16 de Novembro de 2002 em
Veneza
191
Figura 162: A evolução da Ria de Aveiro
192
Figura 163: O corte artificial na restinga de Aveiro
193
Figura 164: Imagem de conjunto da Ria Formosa
193
Figura 165: Evolução de uma laguna afectada por uma transgressão marinha
194
Figura 166: Evolução por segmentação das lagunas litorais
194
Figura 167: Processo de segmentação na lagoa do Bilene (Moçambique)
195
Figura 168: Schorre e Slikke nos estuários do rio Maputo (Moçambique) e do rio Sado (Portugal).
195
Figura 169: Aspecto do mangal junto à restinga da Praia dos Pescadores (Maputo, Moçambique)
196
Figura 170: Canal de maré: região de Maputo (Moçambique)
196
Figura 171: Distribuição das áreas de mangal e de sapal a nível do globo.
197
Figura 172: Depósitos lagunares encontrados na praia da Aguda (Vila Nova de Gaia) em Outubro de 2002. O seu
261
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
aparecimento fica a dever-se à erosão produzida pela implantação do quebra mar destacado da Praia da Aguda.
198
Figura 173: Reconstrução do padrão das principais correntes marítimas durante o mais recente ciclo de
desintegração continental.
210
Figura 65 (repetição): Variação climática no final do Cenozóico (extraído de Andersen e Borns, 1994)
212
Figura 66 (repetição): Variação climática e do nível do mar durante o Quaternário (fig. extraída do site
http://www.soest.hawaii.edu/coasts/csrg1.html)
213
Figura 175: Os ciclos de Milankovitch
214
Figura 176: Proposta de Riser (1999) para uma cronologia do Quaternário
215
Figura 177: Os estádios isotópicos: os últimos 140.000 anos
216
Figura 178: Curva isotópica para a Gronelândia. Dados extraídos de
ftp://ftp.ngdc.noaa.gov/paleo/icecore/greenland/summit/grip/isotopes/gripd18o.txt
217
Figura 179: Cronologia do Tardiglaciar e do Holocénico
218
Figura 180: Curvas isotópicas do Tardiglaciar e do Holocénico
219
Figura 181: Evidência de variações do nível do mar: terraços marinhos emersos e submersos
220
Figura 182: A interacção entre o eustatismo e a isostasia podem produzir praias levantadas que se estendem para
além da amplitude dos níveis eustáticos
220
Figura 183: A curva de Fairbridge sobre as variações do nível do mar durante o Quaternário e a sua disposição em
escadaria Figura 6
220
Figura 184: Os terraços de coral na Península de Huon (Nova Guiné)
221
Figura 185: A separação entre a curva eustática e a subida tectónica na península de Huon (Nova Guiné)
222
Figura 186: Processo de desenvolvimento de um terraço marinho
223
Figura 187: Fotografia da situação descrita na figura 186.
224
Figura 188: Comparação entre a carga sólida transportada pelos rios do Norte de Portugal numa situação natural e
após a construção das barragens
230
Figura 189: Redução da área das bacias de drenagem portuguesas devido à construção das barragens
231
Figura 190: Recuo das arribas a leste de Quarteira (Vale de Lobo, Algarve).
231
Figura 191: O impacto das obras transversais na dinâmica da linha de costa
233
Figura 192: Comparação entre o mapa topográfico 1:25.000 (folha 143-Espinho, 1978) e
233
as fotografias áéreas do site http://ortos.igeo.pt/ortofotos/
233
Figura 193: O impacto de um quebra-mar destacado na evolução da linha de costa
234
Figura 194: A construção de um paredão na frente de uma duna em processo de erosão
234
acaba por produzir uma reflexão das ondas que tende a aumentar a energia disponível para o transporte das areias.
235
Figura 195: Quebra-mares destacados na costa mediterrânica de Espanha
235
Figura 196: Análise da destruição do molhe de Sines (Fevereiro de 1978).
236
Figura 197: O papel da vegetação na resistência das dunas à erosão. Praia de Cortegaça.
237
Figura 198: Corredores de deflacção cortados em arriba pelo avanço do mar. A Sul da praia da Torreira.
237
Figura 199: O passadiço de Francemar permitiu minorar a degradação das dunas. Ano de 2000.
237
Figura 200: Paliçadas na praia de Labruge: Novembro de 2002. É perfeitamente visível o processo ondulatório que
produz a deposição das areias a sotavento das paliçadas.
238
Figura 201: Ocupação clandestina das margens da ribª de S. Pedro, na Praia Velha (S. Pedro de Muel), nos anos 80.
238
Figura 202: Dois casos de construção na praia ou na duna frontal: barra de Aveiro e as tristemente célebres Torres
de Ofir.
239
Fig 203: Esquema sobre as tácticas que podem ser usadas para minorar o processo de degradação das dunas.
239
Figura 204: Ponte pedonal de Labruge, sobre o Rio Donda. Agosto de 2002.
240
Figura 205 : Depósito de lixos domésticos e da construção civil sobre a arriba da praia de Labruge (2001).
240
Figura 206: Os POOCs e as grandes regiões estruturais de Portugal
241
Figura 207: Carta de condicionantes do POOC Caminha-Espinho.
242
Figura 208: As respostas da sociedade à elevação do nível do mar
243
Figura A: A falha do Gião afecta um depósito presumivelmente fini-terciário/quaternário. É um exemplo pedagógico
para comprovar a actividade tectónica recente
247
Figura B: Entalhe basal fóssil a uma cota de 9m acima do nível médio daságuas do mar (S. Paio, Labruge, Vila do
Conde)
248
262
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Figura C: Plataforma de erosão marinha de Lavadores. A maré deveria estar praticamente no seu ponto médio, o que
significa que o mar estava à cota 0.
248
Figura D: Reprodução parcial do mapa 1:25.000, folha 122 (Porto). Edição de 1999
249
Figura E: Afloramento de depósitos de tipo lagunar na praia Atlântico (entre Valadares e Francelos). Aspecto de
pormenor das fendas de retracção encontradas nesse depósito
250
Figura F: Erosão da praia de Francelos e destruição de parte do bar “Titanic”. 31 de
250
Dezembro 1999.
250
Figura G: Praias dissipativas, intermédias e reflexivas.
251
Figura H: Processo de elaboração de perfis de praia.
251
Figura I: O recuo da linha de costa em Espinho. Figura extraída do Guia de Portugal (Entre Douro e Minho) da
Fundação Calouste Gulbenkian.
252
Figura J: Esboço geomorfológico de um sector da plataforma litoral compreendido entre a Foz do Douro e a Praia da
Madalena. Com base na carta topográfica 1/25.000.
253
Figura K: O depósito da fase I do Carregal (128m)
254
Figura L: O depósito do Carrefour (hoje inexistente; muito semelhante ao do Arrábida Shopping). Na foto de baixo,
pormenor do corte anterior.
255
Figura M: O depósito do nível marinho I de Lavadores (35m)
256
Figura N: O depósito do nível II de Lavadores (18m)
256
Figura O: O depósito marinho do nível II de Lavadores e a sua afectação provável por uma falha inversa
257
Figura P: Entalhe basal nos granitos de Lavadores, fossilizado por um depósito (Eemiense?). Praia de Lavadores,
cerca de 5-6m.
257
Índice Geral
Programa da disciplina de Geomorfologia Litoral
1
I - Introdução
1 - Enquadramento da disciplina
2 - As lições extraídas de experiência(s) prévia(s) e a selecção das matérias a desenvolver
3 – Motivações e objectivos
4 - O grau de aprofundamento das matérias e a organização dos temas
5 - O processo de ensino e de aprendizagem e o carácter deste relatório
6 - Formação versus informação: a importância de transmitir atitudes
7 - Organização das aulas: a importância do apoio da informática.
8 - Métodos de avaliação
1
1
1
2
3
3
4
4
6
II - Bibliografia
9
III- Tópicos das aulas
24
1 – Introdução
24
Aula 1: Apresentação dos objectivos, programa, métodos de trabalho e de avaliação. Definição de litoral e
motivações para o seu estudo
Definição do conceito de litoral
A zona costeira/litoral como interface.
A diversidade dos litorais
Aula prática
Bibliografia utilizada
25
25
30
30
31
31
Aula 2: Origem e características da água do mar. As correntes marítimas
Origem e características da água do mar
O balanço da radiação e a circulação geral da atmosfera.
A circulação geral da atmosfera e as correntes marítimas
As correntes e os ventos: a espiral de Ekman
33
33
33
33
33
263
Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Estrutura vertical dos oceanos e circulação termo-halina
As correntes marítimas e a dissimetria das fachadas oceânicas
O papel das correntes marítimas na regulação térmica terrestre. A importância da circulação oceânica nas
variações climáticas
Mecanismo e importância do upwelling.
Alguns aspectos da circulação marítima na costa portuguesa
Aula prática:
Bibliografia utilizada
Web sites
34
34
34
35
35
35
36
36
Aula 3: Ondas
Como se deslocam as ondas: características gerais dos processos ondulatórios
Características das ondas
Ondas geradas pelos ventos
Swell
Padrões de Interferência
Ondas livres e forçadas
Ondas traiçoeiras (Rogue Waves)
Rebentação (Surf)
Refracção das ondas
Difracção das ondas
Reflexão das ondas
Storm Surge
Tsunami
Aula Prática
Bibliografia
47
47
47
48
48
49
49
49
50
50
51
51
51
51
52
52
Aula 4: Marés
Mecanismos das marés, maré directa e reflexa
Marés vivas e mortas
Outras variações na amplitude das marés. Marés equinociais
Marés diurnas, semi-diurnas e mistas
Dinâmica das marés: linhas cotidais e pontos anfidrómicos
Macaréu
Amplitude das marés
Aula Prática
Bibliografia utilizada
Websites
63
63
63
64
64
65
66
66
66
66
67
Aula 5: Variações do nível do mar
Nível do mar como um conceito relativo
A variação do nível do mar ao longo do Fanerozóico e as lições a extrair dessa variação
Variações do nível do mar durante o final do Cenozóico: a influência do diastrofismo
A influência das variações climáticas: a pequena idade do gelo e o aquecimento que se lhe seguiu
A recente subida do nível do mar e as projecções para o futuro
Prática
Bibliografia
Websites
88
88
88
90
92
93
93
93
94
Aula 6: Costas rochosas
Introdução: definição de costas rochosas
Factores a considerar na evolução das costas rochosas
Tipos de ondas na base das arribas e sua dinâmica
A resistência das rochas: alguns apontamentos sobre a meteorização em ambiente litoral
Processos de erosão nas arribas
Erosão submarina do bedrock
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
Plataformas de erosão marinha
Algumas formas de erosão características
Bibliografia utilizada:
Web site:
Prática:
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Aula 7: Litorais móveis: praias e dunas litorais
Introdução: costas rochosas versus litorais móveis
Perfil de praia. Terminologia básica
Rebentação e construção dos cordões litorais
Regra de Brunn. Perfil de verão e de inverno.
A distribuição dos calhaus nos depósitos de praia: imbricação e estruturas sedimentares.
A deriva litoral: corrente em zig-zag
Dunas litorais
Desenvolvimento sequencial de dunas litorais
Dunas actuais e dunas fósseis
Aula Prática:
Bibliografia utilizada:
Websites
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Aula 8: Estuários, deltas e lagunas
Estuários
Dinâmica e hidrologia dos estuários
A cunha salina
Algumas reflexões sobre o estuário do Douro
Movimentação dos sedimentos nos estuários
Os deltas
Condições de formação dos deltas
Lagunas
O caso da laguna de Veneza
A Ria de Aveiro
Outras lagoas existentes na costa portuguesa
A evolução das lagunas litorais
Circulação dentro das lagunas
Pântanos marítimos
Bibliografia utilizada
Websites:
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Aula 9. O final do Cenozóico. Evolução dos litorais durante o final do Cenozóico.
Introdução
A variação climática no final do Cenozóico: o porquê da sua inclusão neste programa.
O complexo jogo das interacções na criação de condições de arrefecimento ao longo do Cenozóico
O aparecimento das condições para as glaciações do Quaternário
Limites e métodos de estudo do Quaternário
Evolução do clima durante o Pleistocénico médio
O Pleistocénico recente: o Eemiense
O Pleistocénico recente: a última glaciação
O Tardiglaciar e o Holocénico
Os litorais durante o final do Cenozóico: enquadramento geral e problemas metodológicos
Noção de terraço. Formação dos terraços do litoral
Bibliografia utilizada
Aula Prática:
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Aula 10: Fragilidades versus ordenamento do litoral
A erosão costeira
O papel das obras de defesa e protecção costeira
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Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral
As dunas e a protecção das praias
(Des)ordenamento versus educação ambiental
A poluição das praias
Os POOCs (Planos de Ordenamento da Orla Costeira)
Aula Prática
Bibliografia utilizada
Aula 14: Sumário: Apresentação dos trabalhos dos alunos
Aula 15: Sumário: Apresentação dos trabalhos dos alunos (conclusão).
Saídas de campo
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Saída de campo 1.
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Saída de campo 2:
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Saída de campo 3:
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Índice das Figuras
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Programa da disciplina de Geomorfologia Litoral