Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Programa da disciplina de Geomorfologia Litoral I - Introdução 1 - Enquadramento da disciplina Na reestruturação do curso de Geografia aprovada durante o ano lectivo de 2000/2001 apenas as disciplinas do 1º e 2º ano são consideradas obrigatórias. A partir do 3º ano todas elas apresentam um carácter opcional. Significa, portanto, que as disciplinas que correspondam a algum aprofundamento de conhecimentos caem todas, necessariamente, na categoria de disciplinas opcionais. É exactamente nesta categoria que se inscreve a disciplina de Geomorfologia do Litoral. Sendo uma disciplina de opção, a leccionar a estudantes do 3º e 4º anos, pressupõe já alguns conhecimentos de base, apreendidos nas disciplinas de Introdução à Geomorfologia, Geomorfologia e Geografia Física de Portugal. Mesmo sendo de carácter elementar ser-nos-á necessário fazer apelo aos conhecimentos obtidos nessas disciplinas, já que, sendo esta, também, uma disciplina semestral – como são todas as do actual curriculum – não poderemos dispor de mais do que 15 aulas teóricas e 15 aulas práticas de 2 horas cada, o que implica uma economia de tempo que não se compadece com um programa em que se repitam as matérias dadas noutras disciplinas. O apelo aos conhecimentos anteriormente adquiridos terá que estar sempre presente – até para permitir a concatenação com matérias já ensinadas e a comparação dos conceitos apresentados pelos diferentes docentes de modo a que os estudantes possam verificar que, embora com diferentes perspectivas, as ideias de base dos diferentes professores são coerentes entre si. 2 - As lições extraídas de experiência(s) prévia(s) e a selecção das matérias a desenvolver Desde há vários anos que temos leccionado uma cadeira de Seminário a que chamámos primeiro de Seminário em Geografia Física-Geomorfologia e depois de Seminário em Geografia Física Geomorfologia Litoral. Trata-se de uma disciplina anual que vai manter-se até ao ano lectivo de 2003-2004 e se extinguirá em 2004-2005, quando os estudantes entrados em 2001-2002 atingirem o 4º ano. Como é natural, esta disciplina é escolhida sobretudo pelos estudantes com afinidades pela área de Geografia Física, Como é de esperar numa disciplina de Seminário, temo-nos esforçado para que ela tenha uma forte incidência no trabalho de campo e permita uma iniciação às técnicas da sedimentologia e uma utilização intensiva dos computadores (escrita do relatório, cartografia, utilização de folhas de cálculo, pesquisas na Internet), de molde a que esta disciplina, além de corresponder a uma espécie de fecho da abóbada do curso e a uma verdadeira iniciação à investigação, possa dotar os estudantes de diversas ferramentas de trabalho que lhes serão muito úteis na sua vida profissional. 1 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Apesar da nossa experiência docente no Seminário de Geomorfologia litoral, desconhecemos como poderá funcionar uma disciplina semestral em que os estudantes podem ser quer do terceiro quer do quarto ano e que não poderá ter carácter de Seminário. A redução do tempo lectivo implica, necessariamente, algumas limitações na amplitude das matérias a tratar e mesmo no aprofundamento da mesma. Porém, esses condicionalismos, que não ignoramos, só deverão ser perfeitamente equacionados quando a disciplina for efectivamente leccionada no âmbito semestral. Será naturalmente a prática pedagógica a decidir quais os temas a aprofundar e quais aqueles que poderão ser tratados de forma mais ligeira sem consequências negativas para a aprendizagem dos estudantes. Neste momento, em vez de um programa demasiado ambicioso, parece-nos mais correcto focar aqueles temas que reputamos como essenciais. Sabemos que essa escolha é necessariamente pessoal. Porém, como nos interessa, muito mais do que transmitir conhecimentos, transmitir metodologias de análise e atitudes relativamente ao estudo do litoral, parece-nos que as matérias a desenvolver devem ser escolhidas pela sua capacidade de gerar essas atitudes e de estimular a aprendizagem das metodologias de análise acima referidas. A importância das heranças na fisionomia actual dos nossos litorais faz-nos pensar que será útil que os estudantes desenvolvam um pouco mais este tema numa outra disciplina intitulada Geomorfologia do Quaternário. Essas matérias faziam parte integrante do Seminário em Geografia Física-Geomorfologia Litoral, mas o carácter semestral desta nova disciplina não deverá permitir a sua abordagem de forma aprofundada. Quanto muito poderá ser apresentada a problemática da evolução dos litorais durante o Quaternário de molde a que essa apresentação sirva de incentivo a que os estudantes venham a optar por essa disciplina, onde serão tratados temas tais como as variações climáticas e eustáticas durante o Quaternário que condicionam fortemente a fisionomia actual dos nossos litorais. 3 – Motivações e objectivos Nas diversas versões do Seminário que temos leccionado desde1991 temos sempre privilegiado o estudo do litoral. Com efeito, além do know how que fomos adquirindo sobre os temas ligados ao litoral, o que facilita, naturalmente, a criação do gosto pela investigação nas mesmas áreas entre os alunos, o carácter de faixa de contacto que é apanágio do litoral permite uma análise em que as interacções têm uma importância acrescida, e nessa conformidade permite desenvolver nos estudantes a compreensão da complexidade dos fenómenos naturais e da sua articulação com as influências antrópicas. Por isso, além dos aspectos puramente naturais, não esquecemos uma atenção particular aos aspectos relacionados com o ordenamento do litoral. Num país em que o processo de litoralização e uma excessiva pressão turística sobre o litoral está a destruir um dos nossos mais importantes recursos naturais, parece-nos oportuno divulgar a ideia de que a falta de respeito pelos valores naturais do litoral se arrisca a “matar a galinha dos ovos de ouro”, convertendo o nosso litoral numa faixa desinteressantemente betonizada, igual a tantas outras, e só atractiva para um turismo de massas cada vez mais predatório e sem os resultados económicos que se esperavam e que os investidores desejariam. Julgamos que a divulgação desta mensagem entre os futuros quadros e os futuros professores é 2 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral um objectivo estratégico já que a sua futura situação profissional lhes permitirá ter um papel activo na definição das políticas de ordenamento ou na divulgação de ideias no seio das novas gerações. 4 - O grau de aprofundamento das matérias e a organização dos temas Como já foi dito acima, uma das nossa principais dificuldades na elaboração deste texto tem a ver com o facto de a disciplina em questão nunca ter sido dada com o carácter de disciplina semestral e simultaneamente para estudantes do 3º e 4º ano. Temos consciência de que o programa proposto poderá vir a revelar-se demasiado ambicioso. Nesse caso, tentaremos cortar um pouco no aprofundamento das matérias, mas parece-nos fundamental tocar os vários pontos focados que correspondem, como seriação de temas, a uma espécie de programa “mínimo”. Isso parece-nos fundamental porque, dada a complexidade das interacções que se desenvolvem no litoral, se algum destes elementos for completamente esquecido, os estudantes terão uma visão parcial incompleta, e algo falseadora da realidade. Chamamos a cada um dos temas “aula”. Com isto queremos dizer que seria o ideal conseguir fazer a respectiva apresentação numa aula teórica de 2 horas. Todavia, há que contar com a hipótese de certas matérias colocarem um maior número de problemas aos estudantes e, desta forma, o esclarecimento das dúvidas poderá implicar uma extensão do tema para uma outra aula… ou um encurtamento do tempo destinado à aula prática. 5 - O processo de ensino e de aprendizagem e o carácter deste relatório Temos consciência do carácter por vezes muito técnico das matérias a leccionar. Para ultrapassar a dificuldade que a maior parte do estudantes tem na compreensão de conceitos e fórmulas matemáticas, utilizaremos sempre que possível imagens elucidativas. Por isso, este texto se parece, quiçá demasiado, com uma colectânea de imagens. Pretendemos, com efeito, que, além de constituir parte de umas provas académicas, este texto funcione como um apoio para os estudantes e como um embrião - quem sabe? – de um futuro manual. A escolha deste modo de apresentação, decerto pouco usual, em que a um texto sintético se segue um álbum de imagens extraídas de diversas fontes, carece de alguma justificação. Acreditamos que o principal método de investigação na Geomorfologia é, ainda, a observação. Não só uma observação directa da natureza, mas também uma observação feita através de cartas e outros documentos pertinentes. Quanto às paisagens litorais, a observação “in loco” seria o ideal… mas todos sabemos que é improvável conseguir fazer-se mais do que as 3 saídas de campo que nos propomos realizar. Por isso fizemos apelo a toda a documentação de que dispúnhamos, digitalizando tudo o que era pertinente e ainda não estava em formato digital. Utilizámos, também, buscas na Internet, sobretudo no Google (www.google.com). Este site permite fazer pesquisa de imagens e estamos convencidos de que algumas das imagens encontradas representam um real enriquecimento deste texto. Além disso, permitem mostrar aos estudantes que não devem desprezar nenhum meio para obter a informação de que necessitam. A única ressalva é que devem utilizar toda a informação com um sentido crítico, discutindo e citando as fontes. É nossa intenção despertar nos estudantes o desejo de aprofundar as matérias da disciplina ou até 3 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral de avançar por outros temas que lhes interessem e que não tenham sido tratados na nossa abordagem como docente da disciplina. 6 - Formação versus informação: a importância de transmitir atitudes Temos plena consciência de que não interessa apenas ensinar matérias aos alunos. Se o papel dos professores se limitar a tentar transmitir conhecimentos, por muito bem que esse ensino seja feito, arriscamo-nos a que os estudantes não interiorizem a matéria e não a assimilem – isto é não a transformem numa parte deles mesmos. Para que isso aconteça é necessário tranformar a informação em conhecimento. Conhecimento que permita agir, que possa ser aplicado em situações diferentes da situação original. Por isso, o Professor é importante para transmitir uma atitude perante a Vida e perante a Ciência. Os grandes Mestres são efectivamente aqueles que têm o dom de transmitir uma atitude de perpétua curiosidade e de perpétua procura, mas também um método de trabalho que permite que cada um se vá aproximando, não da Verdade absoluta, que é por definição inatingível, mas de uma verdade que seja a sua. Interessa, portanto, que os estudantes tenham uma atitude activa, interrogativa, curiosa em relação às matérias leccionadas. É por isso que lhes propomos o estudo de temas laterais ou o aprofundamento de temas dados durante as aulas – para desenvolver, justamente, essa curiosidade e a capacidade de pesquisa, sem a qual a Universidade não cumpre o seu papel. Naturalmente que se coloca aqui a questão da informação versus conhecimento. Nos tempos correntes, em que todos somos submergidos por quantidades imensas de informação, há que guiar os estudantes e ajudá-los a criar as estruturas mentais que permitam organizar a informação num todo minimamente coerente e que faça sentido, num esquema aberto que se vai enriquecendo à medida que se vão adquirindo novas informações. Justamente, nesta época em que o papel dos professores está posto em causa, já que eles dificilmente podem competir com a atractividade de outros meios de divulgação tais como a Televisão ou a Internet, é preciso que todos os professores estejam conscientes de que só podem vencer essa competição desigual, não fazendo mais do mesmo, mas fazendo diferente, fazendo um acompanhamento personalizado que assegure que o estudante efectivamente está a interiorizar, a assimilar aquilo que se pretende transmitir. 7 - Organização das aulas: a importância do apoio da informática. A disciplina é constituída por aulas teóricas e práticas que, para facilitar a organização de horários pretendemos que, sempre que possível, fiquem reunidas num conjunto de 4 horas lectivas seguidas. A concentração das aulas em 4 horas semanais seguidas permitirá a organização de saídas de estudo frequentes e favorece uma maior maleabilidade na leccionação das matérias, permitindo também estabelecer uma ligação fácil entre as matérias teóricas e a sua exploração pelos alunos nas aulas práticas. No início do ano, será fornecida aos estudantes toda a informação disponível em formato digital. Os Cds a disponibilizar incluirão: • Dados de base a explorar pelos alunos (tabelas de marés, dados do Permanent Service for 4 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Mean Sea Level) e documentos resultantes de pesquisas na Internet; • Artigos do Professor em formato pdf (portable document format) sobre temas pertinentes para a matéria a tratar; • Outros textos/figuras de base no mesmo formato. Os textos que se seguem serão vertidos para o formato pdf e distribuído aos estudantes no início das aulas. Pretendemos que sejam o mais ilustrados possível, de tal forma que possa ser utilizado como fio condutor das aulas teóricas e a sequência das respectivas figuras seja a matéria prima básica da leccionação. Este processo permite acrescentar elementos ao texto e, sobretudo, novas figuras que venham a revelar-se necessárias para a compreensão da matéria; • O texto que se segue será organizado por temas (ou “aulas”) e será incluído no website da disciplina. O formato pdf, além de acautelar um mínimo de segurança contra a cópia indiscriminada dos textos permite “navegar” neles, nomeadamente estabelecendo links internos. A referência a uma figura, por exemplo, poderá, por um simples clique do rato levar-nos à própria figura, o que ajuda a minorar os problemas decorrentes das figuras estarem quase todas postas no fim de cada tema; • A aparente repetição da informação (isto é: o CD distribuído no início/versus publicação dos temas na Internet) permite fazer actualizações no desenvolvimento das aulas e parece-nos uma forma de interessar os alunos nessas modificações, dando-lhes um papel activo na respectiva pesquisa. Temos a experiência de que entregar demasiada informação aos estudantes é o melhor modo de eles desenvolverem uma atitude de um certo comodismo, de esperarem que as coisas venham ter com eles, em vez de fazerem esforços para uma pesquisa e crescimento pessoal. O conhecimento atempado das fontes de informação permitirá que os alunos preparem também a aula que vai ser dada de forma a poderem intervir com as dúvidas que a consulta prévia dos documentos lhes sugira. Este tipo de intervenção permitirá que as aulas não sejam meramente expositivas mas que os estudantes, tendo já algum conhecimento da matéria a tratar, sejam mais sensíveis à respectiva problemática e possam levantar dúvidas e dinamizar a discussão, de forma a tornar a aula mais dinâmica. Outra forma, talvez mais eficaz, de permitir uma certa preparação dos estudantes do tema a tratar é a indicação de exercícios simples a realizar fora dos tempos lectivos e definidos no final da aula anterior. Esses exercícios podem ter um carácter provocatório que induza a discussão entre os alunos e/ou a reflexão de cada estudante em particular. Um exemplo poderá ser a distribuição de curvas como a de Fairbridge (1961), a propósito do escalonamento dos terraços marinhos, pedindo aos alunos para discutirem o significado e extraírem as consequências possíveis desse tipo de situação. Fotografias aéreas convenientemente seleccionadas poderão permitir a análise de fenómenos de refracção, difracção e reflexão das ondas. A construção de gráficos com as variações da altura da maré durante um mês, a partir das tabelas das marés publicadas pela APDL (Administração dos portos do Douro e Leixões), permitirá aos alunos reflectir sobre as respectivas variações e sobre as respectivas causas. Em todos esses casos, estes “trabalhos de casa” deverão funcionar como estímulos no desencadear de um processo de reflexão dos estudantes ou como motivadores de um interesse por matérias que, doutro modo, sem esse investimento prático por parte dos estudantes, poderão 5 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral parecer demasiado áridas (caso das marés, por exemplo). Logo nas primeiras aulas será elaborada uma mailing list com os endereços electrónicos de todos os estudantes inscritos na disciplina. No caso de documentos pouco pesados eles serão distribuídos através dessa mailing list. Pretendemos, com isso, estimular a utilização tão intensa tanto quanto possível de documentos em formato digital. Será incentivada a utilização desta mailing list para trocar informações entre os estudantes e com o docente. Tentaremos que esse contacto não se resuma a eventuais pedidos de ajuda por parte dos alunos e à divulgação de informações por parte do docente. Pensamos que, se as dúvidas levantadas individualmente pelos estudantes forem do conhecimento dos restantes estudantes isso poderá estimular a troca de ideias e suscitar outras dúvidas que acabarão por permitir uma melhor compreensão da matéria. A discussão por meios electrónicos não anula - antes pelo contrário – a importância da discussão dos temas nas aulas. Para organizar melhor as aulas e disciplinar um pouco os estudantes, eles serão incentivados a registar, por escrito, durante a respectiva exposição, as questões que a matéria teórica lhes suscitar, de forma a que, quando a aula teórica terminar, as questões que não tenham ficado esclarecidas sejam discutidas. Outras informações adicionais, bem como os conteúdos definitivos das aulas (Adobe Acrobat) serão distribuídos entre os estudantes através de um CD-ROM que será coligido no final do semestre e entregue a todos os estudantes antes do teste teórico-prático. Além disso, os estudantes serão incentivados a realizar a cartografia constante nos respectivos relatórios no formato digital, de forma a dominarem quer programas como o Adob Photoshop quer o Aldus Freehand ou outros que permitam fazer o tratamento de imagens rasterizadas ou vectorizadas. Tentaremos, ainda, que cada estudante elabore uma web page muito simples (programa Netscape Comunicator) de onde constem links para os elementos mais relevantes dos respectivos relatórios de investigação. Essa página ficará ligada à página já existente da disciplina http://www.letras.up.pt/geograf/seminario/programa.html A informação e o treino necessário para a realização destas tarefas será fornecido na parte prática das aulas. 8 - Métodos de avaliação Dado o número relativamente pequeno de estudantes que normalmente se inscrevem nas cadeiras optativas da área de Geografia Física, pensamos que nunca ultrapassará os 30 estudantes, o que permitirá que a avaliação respectiva seja feita pela modalidade de avaliação contínua. Segundo o regulamento de avaliação em vigor actualmente (já adaptado ao regime de disciplinas semestrais): “A modalidade de avaliação contínua terá um número de provas mínimo a definir pelo docente no início do ano lectivo e em correlação directa com as matérias a leccionar. Estas devem ser distribuídas regularmente, consistindo na realização complementar ou em alternativa de vários tipos de provas: trabalhos escritos e orais, relatórios de leitura ou de trabalho de campo, elaboração de bibliografias críticas, testes escritos ou orais, etc.” 6 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Nesta conformidade, pretendemos que na disciplina de Geomorfologia Litoral os alunos sejam sujeitos às seguintes provas: 1 – Trabalho de grupo (ponderação de 50%). O trabalho de grupo consistirá no estudo de uma pequena área do litoral português. Dados os tipos de tarefas a concretizar é desejável que o trabalho seja feito em grupo. Porém, o número ideal de participantes será de 2 estudantes e só em caos excepcionais se admitirá a formação de grupos maiores. Este trabalho deverá basear-se em trabalho de campo feito especificamente para o efeito e submeter-se-á a um plano do tipo do que se segue: • Problemática da questão a tratar; • Enquadramento geral (geológico e geomorfológico); • Análise geomorfológica de pormenor (análise de mapas de grande escala, fotografias aéreas, rasterização ou vectorização de mapas); • Recolha de dados e observações de terreno (marés, condições meteorológicas, regimes de ondulação, fotos, elaboração de perfis de praia, recolha de amostras); • Análises sedimentológicas (granulometria, morfoscopia) e discussão dos respectivos resultados; • Problemas ambientais existentes na área estudada: o impacto dos Planos de Ordenamento da orla costeira; • Conclusões. Os trabalhos elaborados pelos alunos serão lidos e anotados, sendo discutidos oralmente na presença de toda a turma. A nota final do trabalho será atribuída por igual aos estudantes participantes a não ser que se verifique que um deles não participou activamente, caso em que a nota poderá ser diferenciada. Estes trabalhos constarão de uma pequena memória escrita e convenientemente ilustrada com figuras elaboradas por eles ou digitalizadas e adaptadas. Destes trabalhos resultarão apresentações públicas feitas no âmbito das aulas, recorrendo aos meios informáticos usuais (MS Power Point) e com o recurso ao data show. Esta apresentação terá como objectivo, além do aprofundamento científico, o treino da oralidade e da capacidade de fazer apresentações públicas, bem como o uso das ferramentas informáticas disponíveis para o efeito. Parece-nos importante que neste domínio da atribuição de notas seja feito um apelo à autoavaliação, de tal forma que os estudantes tenham consciência das qualidades e defeitos do seu trabalho e possam discutir e finalmente aceitar o escalonamento final dos trabalhos em termos da sua classificação. 2 - Teste teórico-prático (ponderação de 50%) Embora este tipo de prova seja pouco simpática para os alunos, parece-nos fundamental para conseguir avaliar em que medida eles assimilaram a matéria e são capazes de responder de forma pessoal e criativa às questões postas. Para tentar obviar à tendência que os alunos têm para a 7 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral memorização, as questões postas são essencialmente de tipo prático, ou então pretendem avaliar em que medida eles aplicam os conhecimentos teóricos para responder a questões concretas. 8 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral II - BIBLIOGRAFIA Este item contém tudo aquilo que vai ser em princípio usado nas aulas. Porém, em cada aula serão referidos os textos usados especificamente para essa matéria. ABECASIS, F., (1994) - Geomorphological Characterization of the Portuguese Coast, Littoral 94 Proceedings, EUROCOAST-PORTUGAL, IHRH, Porto, Vol I, p. 25-30. ABECASSIS, F., (2001) - As Restingas de Angola, Livro de Homenagem ao Professor Doutor Gaspar Soares de Carvalho, Ed. M. E. Albergaria Moreira, A. Casal Moura, H. M. Granja, F. Noronha, Braga, p. 213-228. ALMEIDA, A. 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Os temas seleccionados perfazem 14 – um número muito próximo do número máximo de aulas de que disporemos no contexto de uma disciplina semestral. Por isso os temas ficam organizados em “aulas”. Deste modo, este tipo de organização obriga a uma certa contenção na leccionação das matérias e a uma uma disciplina auto-assumida que impeça o extravasar excessivo de uns temas à custa do desaparecimento de outros. Uma vez que às aulas teóricas se deverão seguir as práticas, a matéria a versar nestas últimas deverá decorrer da matéria teórica que foi apresentada, correspondendo a uma discussão dos temas propostos nas aulas teóricas, ou a uma aplicação dos mesmos feita pelos estudantes. As saídas de estudo deverão realizar-se, em princípio, logo a seguir às matérias versadas nas mesmas terem sido tratadas nas aulas teóricas. Para serem produtivas, as saídas de campo devem realizar-se com um tempo (meteorológico…) aceitável. Por outro lado, é preciso assegurar um mínimo de 4 horas de luz solar…. Essa é uma das razões pelas quais tentaremos que a disciplina seja colocada no 2º semestre. Se isso não for possível, em alternativa, as aulas realizar-se-ão durante a manhã, o que permite a realização de saídas de estudo coincidentes com as marés baixas vivas, onde a exploração das formas rochosas e do perfil das praias poderá ser feito nas melhores condições. Devido à impossibilidade de fazer uma programação rígida das saídas de campo, a respectiva temática é apresentada no final. Todavia elas terão lugar na altura mais adequada (isto é, o mais próximo possível da leccionação da respectiva matéria teórica) e de acordo com as condições concretas de funcionamento da disciplina. 24 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Aula 1: Apresentação dos objectivos, programa, métodos de trabalho e de avaliação. Definição de litoral e motivações para o seu estudo Definição do conceito de litoral O termo litoral é utilizado todos os dias na linguagem corrente, sem se cuidar de fazer dele um uso rigoroso e, muito menos, de o definir com precisão. A palavra é utilizada como contraponto à palavra interior e referida, muitas vezes, a propósito do processo de litoralização . Este processo é correlativo da desertificação do interior e pode ser claramente compreendido em mapas de datas diferentes (1970 e 1980) que mostram uma densificação da população nas áreas litorais. Com efeito, o crescimento económico das últimas décadas centrou-se essencialmente em nós servidos por boas acessibilidades. Ora, a verdade é que, quer devido à importância histórica dos portos na estruturação da rede viária, bem como às conhecidas dificuldades de implantação de uma rede rápida e eficaz no interior do país (em parte devidas à distribuição do relevo, cuja rugosidade só pode ser vencida com elevados custos) a parte litoral do país tem sido favorecida face ao interior, sob o ponto de vista económico. Este fenómeno é correlativo do empobrecimento do interior e do seu esvaziamento humano. A concentração das população nos centros urbanos do litoral tem como consequência o congestionamento constante das respectivas infra-estruturas, de que decorre a necessidade de as ampliar e multiplicar permanentemente. Daí decorre uma evidente sobrecarga ambiental. Ora, apesar da capacidade de depuração dos ambientes litorais, que alguns pensam ser inesgotável, eles são, como veremos, ambientes frágeis a vários títulos. Por outro lado, uma parte significativa da actividade económica em Portugal, depende do turismo. E o turismo, em Portugal, apesar das louváveis tentativas que têm sido feitas para o levar para o interior, ainda é muito um turismo de sol mar e praia (D. B. Ferreira, 2001). 25 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Por isso a questão da salvaguarda da qualidade ambiental do litoral é particularmente pertinente. Mas a salvaguarda deste ambiente complexo e frágil só poderá fazer-se com base num conhecimento tão aprofundado quanto possível da dinâmica natural dos ambientes costeiros, de tal forma que esse conhecimento possa ser convenientemente integrado no ordenamento do território que é, como muitos afirmam, uma das necessidades mais urgentes do país. Existe, ainda, uma outra motivação, de cariz mais estritamente científico: sendo uma zona de charneira, de interface, é uma faixa muito rica sob o ponto de vista da complexidade das interacções entre a litosfera, a hidrosfera, a atmosfera e a biosfera. Isso é um estímulo para a curiosidade dos estudantes desafiando o seu desejo de aprender e de investigar. 26 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 3 Densidade da população nos concelhos do litoral O casamento entre uma área estimulante sob o ponto de vista científico e a possibilidade de aplicação dos conhecimentos poderá ser um valor acrescentado num momento em que a saída tradicional do curso de Geografia sofre uma importante redução e os estudantes se preocupam, justificadamente, com as saídas profissionais e com a utilidade social do curso. Não é tão fácil como parece definir litoral. Tratando-se de uma palavra de uso muito corrente, a sua utilização em contextos diversos acaba por lhe conceder uma grande amplitude de significados. No dicionário da Porto Editora, costa é definida como parte das terras emersas em contacto com o mar. Por sua vez, litoral é definido como sendo um adjectivo qualificando aquilo que diz respeito à 27 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral beira-mar ou ainda como um substantivo correspondendo, então, à faixa de terreno junto à costa. Sendo assim, costa é um conceito mais restrito do que litoral. Quando atentamos na definição faixa de terreno junto à costa , apercebemo-nos de que não há qualquer precisão relativamente ao significado da palavra junto. Assim, a faixa de terreno junto à costa poderá ter extensões muito variadas. Em M.E. S. A. Moreira (1984) encontramos uma definição que dá conta desse problema: Litoral: designação dada à faixa do continente que está em contacto com o mar, ou a fenómenos característicos dessa área. Alguns autores restringem o litoral à faixa entremarés, outros estendem-no para o interior, por um espaço cujos limites nem sempre são fáceis de definir, e para o largo, pela linha de rebentação das ondas. Segundo a mesma autora,”costa” seria: A faixa da superfície terrestre que se encontra no contacto entre as terras emersas e o mar ou o oceano. Alguns autores restringem essa faixa apenas ao espaço atingido pelas águas entre os níveis extremos da maré, outros estendem-na 3 milhas para o interior Parece óbvio que a precisão da primeira parte da definição (ao espaço atingido pelas águas entre os níveis extremos da maré) contrasta fortemente com o carácter um tanto artificial da segunda (3 milhas para o interior). Esta definição vem, mais uma vez, provar o carácter um tanto variável destes conceitos. No mesmo sentido vai a definição de zona costeira (coastal zone) que poderá ser definida, de acordo com Carter, (1988), como o espaço em que os ambientes terrestres influenciam os ambientes marinhos (ou lacustres) e vice versa. A zona costeira tem uma largura variável e pode variar com o tempo. A respectiva delimitação não é possível, uma vez que os limites são marcados por gradientes ambientais ou transições. Em cada local, a zona costeira pode ser caracterizada por critérios físicos, biológicos ou culturais. Estes não precisam de ser coincidentes e, na verdade, raramente o são. De todas estas definições parece sobressair a dificuldade de estabelecer limites e o carácter gradativo que as transições geralmente apresentam. Por outro lado, parece poder concluir-se que litoral é um conceito mais amplo que costa ou zona costeira, estendendo-se para o interior por um espaço cujos limites nem sempre são fáceis de definir. Quando, na linguagem corrente se proferem frases do género 76% da população portuguesa está fixada no litoral (Joanaz de Melo, 19931), é óbvio que o conceito de litoral é usado em contraposição com o de interior e segundo critérios essencialmente económicos que têm pouco a ver com a proximidade da linha de costa ou com qualquer influência marinha ainda que remota. 1 http://www.despodata.pt/geota/Htmls/Activs/cstwatch.htm 28 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 4: Penetração dos nevoeiros de advecção no litoral da região do Porto Embora este conceito de litoral possa ter a sua utilidade quando aplicado a realidades essencialmente económicas, preferimos utilizar uma delimitação que se baseie em fundamentos de ordem física. Assim, propomos que o termo litoral, no âmbito desta disciplina, se refira à plataforma litoral. Esta poderá ser definida como: - Uma faixa aplanada, situada a altitudes variadas, na proximidade da linha de costa e limitada, para o interior, por um rebordo, rigidamente alinhado e contrastante com a referida área aplanada. A plataforma litoral suporta, frequentemente, numerosos afloramentos de depósitos genericamente classificados como plio-plistocénicos (M. A. Araújo, 1997) e é limitada, para o interior, por um relevo muitas vezes nitidamente alinhado (relevo marginal, M. A. Araújo, 1991). O nosso conceito de plataforma litoral engloba as áreas onde se encontram as marcas do estacionamento do nível do mar durante o Quaternário, ou depósitos relacionáveis com a proximidade do nível de base durante o Neogénico. Nesse sentido, torna-se, por um lado, mais abrangente do que o conceito de M. E. S. A. Moreira (1984), que define plataforma litoral como antigas plataformas de abrasão que actualmente se encontram a cotas diferentes do nível do mar, submersas ou emersas, correspondendo respectivamente a fases de transgressão e de regressão marinhas. Todavia, os sectores submersos serão apenas objecto de referências pontuais a propósito de correntes (nomeadamente o upwelling) e das variações do nível do mar durante o final do Pleistocénico e no Holocénico. A existência de plataforma litoral é um traço comum a praticamente todo o país (C. Teixeira, 29 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral 19792) . O conceito de plataforma litoral comporta características topográficas (área essencialmente aplanada), geológicas (existência de coberturas sedimentares neogénicas) e mesmo climáticas. A concentração das isolinhas nos mapas de isotérmicas de Julho, com um traçado paralelo à linha de costa, na faixa litoral portuguesa, mostra um aumento rápido das temperaturas, nos meses de verão, à medida que se caminha para o interior. Esse facto tem a ver, não só com a maior humidade do ar junto à linha de costa, mas também com certas características específicas do clima litoral. Embora possa ter um comando sobre a plataforma litoral de pouco mais de 100m, pensamos que o relevo marginal funciona como uma barreira bastante eficaz à penetração das influências oceânicas para o interior, nomeadamente no que diz respeito aos nevoeiros de advecção e à nortada que refrescam consideravelmente a estreita faixa onde actuam. Embora a escala do mapa seja insuficiente para dar conta destes aspectos com pormenor suficiente, o extracto que apresentamos parece demonstrar a influência que o relevo marginal tem na distribuição dos nevoeiros de advecção. Estes, por sua vez, têm um importante papel no abaixamento das temperaturas máximas estivais. A coincidência de diversos fenómenos físicos nesta mesma área comprova a respectiva especificidade e confere ao conceito de plataforma litoral uma operacionalidade que permite que possa, com vantagens, substituir o conceito de litoral da linguagem corrente, dando-lhe uma maior precisão. A zona costeira/litoral como interface. A zona costeira pode ser caracterizada pela interferência entre diferentes tipos de fenómenos que se relacionam ora com a hidrosfera (correntes, ondas, marés, variações do nível do mar), ora com o litosfera (tectónica, estrutura geológica, aportes sedimentares) quer com a atmosfera (clima, agitação marítima). A variedade de fenómenos em acção converte essa faixa numa interface extremamente complexa e dinâmica. Muitas vezes, algumas dessas características devem ser estudadas num âmbito um pouco mais extenso para melhor poderem ser entendidas e contextualizadas. Daí o interesse em alargar a nossa análise à plataforma litoral, cuja compreensão será o objectivo principal da disciplina. A diversidade dos litorais Uma breve análise da figura extraída de Komar (1998) permitirá ilustrar a forma como jogam os diferentes elementos dentro dessa interface, conferindo uma imensa variedade às paisagens litorais. 2 Será interessante lembrar, a este respeito, a frase de C. Teixeira: “A esse propósito há que aceitar o critério altitudimétrico, plenamente válido no nosso país, onde os diversos níveis se encontram escalonados desde o Minho ao Algarve, não são conhecidos acidentes tectónicos recentes” (C. Teixeira, 1979). 30 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Seguidamente serão apresentadas fotografias com exemplos de paisagens litorais em diferentes tipos de costas dentro do País, da Península Ibérica, noutras regiões europeias e em contextos climáticos frios e tropicais para ilustrar a variedade que se pode encontrar nos litorais e também o tipo de abordagem e a atitude científica a desenvolver. Estas imagens farão apelo quer à nossa experiência (imagens de diversos países da Europa e também de Moçambique) quer a uma pesquisa feita em Cd-Roms didácticos e na Internet. A referência à origem dessas imagens destina-se a estimular idêntica capacidade de pesquisa dos alunos. Aula prática Discussão dos diversos temas tratados, nomeadamente das questões levantadas sobre ordenamento do território, fazendo-se apelo à experiência dos estudantes sobre esse tema. Bibliografia utilizada ARAÚJO, M. 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As correntes marítimas Origem e características da água do mar Uma brevíssima apresentação da evolução da Terra permitirá aos estudantes enquadrar a origem e evolução da hidrosfera e também da salinidade da água do mar, vista como um produto da lixivização substâncias solúveis dos solos e dos alteritos existentes nos continentes, processo que está em acção desde que as primeiras chuvas começaram a cair sobre a crusta primitiva e que se desenrolou ao longo de muitos milhões de anos. Com efeito, a água do mar atingiu a sua salinidade actual apenas há cerca de 700 milhões de anos (A. N. Strahler, 1987). A água é praticamente um solvente universal – da estrutura molecular da água derivem muitas das suas propriedades, sem as quais a vida não seria possível, na Terra. A molécula de água tem uma estrutura ligeiramente dipolar. Deste modo, a água consegue quebrar as ligações iónicas existentes nas moléculas de variadíssimas substâncias, o que se traduz na respectiva dissolução. O cloreto de sódio poderá ser invocado como exemplo (fig. 6). A figura 7 permitirá uma análise da penetração das radiações luminosas na água, ajudando a explicar a cor azul/verde dos oceanos e o rápido absorção da energia incidente com a profundidade. Com efeito, a 1 m de profundidade, apenas 45% da energia incidente continua disponível. Distribuição da temperatura e salinidade da água do mar à superfície e em profundidade. A análise da figura 8 permite ter uma ideia da variação da temperatura, da salinidade e da densidade da água do mar consoante a latitude e introduzir os conceitos de termoclina, haloclina e picnoclina. O balanço da radiação e a circulação geral da atmosfera. Parece-nos importante lembrar a existência de áreas de excesso de energia e deficit energético (fig. 9) e a forma como essa situação evolui ao longo do ano. Basicamente, é desse balanço energético que decorre a circulação atmosférica. A circulação marinha complementa a circulação atmosférica, mas, dada a maior viscosidade da água, tem um tempo de resposta muito diferente. Deste modo, a circulação marinha pode colaborar no controle de mecanismos de oscilações climáticas de período relativamente longo. A circulação geral da atmosfera e as correntes marítimas Uma breve referência à circulação geral da atmosfera permitirá recordar a disposição dos principais centro de acção e os ventos daí decorrentes. Daí partir-se-á para a análise de um mapa com as principais correntes definindo quais as correntes quentes e frias. O mapa apresentado, extraído do Atlas Hachette de 2002 (figura 10), tem a particularidade de representar os principais climas a nível mundial e também os locais onde se faz sentir o fenómeno de upwelling. As correntes e os ventos: a espiral de Ekman A análise da figura 11 permitirá recordar o efeito de Coriolis e referir que, entre a direcção dos 33 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral ventos e as correntes marítimas por eles induzidas existe um ângulo de cerca de 45° à superfície que vai aumentando em profundidade, à medida que o atrito entre as partículas de água aumenta também. A partir daí é possível introduzir o conceito de espiral de Ekman. Estrutura vertical dos oceanos e circulação termo-halina A figura 8 mostra a variação da temperatura, salinidade e densidade da água do mar com a profundidade. De um modo geral as águas são mais quentes e menos salgadas à superfície do que em profundidade. Exceptua-se o caso das regiões próximas dos pólos onde a temperatura em superfície e em profundidade é quase idêntica (e baixa) e onde as águas de superfície, devido à fusão dos gelos, é menos salgada do que em profundidade. As águas de superfície são geralmente bem misturadas e relativamente homogéneas até 100m de profundidade. Depois, a densidade aumenta rapidamente entre 100 e 500m (picnoclina, fig. 8). Abaixo dessa profundidade, o aumento da densidade torna-se muito lento (J. Riser, 1999). Porém, quando a densidade das águas de superfície aumenta, devido, por exemplo, à mistura das águas quentes e salgadas da corrente do Golfo com as águas frias e pouco salgadas do oceano Árctico, isso acaba por produzir uma massa de água fria e salgada, e por isso bastante densa, que desce para áreas mais profundas e daí se escoa ao longo da vertente ocidental da dorsal do Atlântico, até se juntar à circulação profunda que rodeia a Antárctida (fig. 12). As correntes marítimas e a dissimetria das fachadas oceânicas Na figura 10 é possível observar a oposição existente entre as fachadas ocidentais e orientais dos vários continentes quer nas latitudes temperadas quer nas latitudes tropicais. Relativamente ás latitudes temperadas é de referir, nomeadamente, o contraste entre o clima de Washington e Lisboa (S. Daveau, 1995). É de salientar, também, o contraste existente entre os climas da costa ocidental de África e da costa oriental do mesmo continente. A respectiva análise será ilustrada a partir d o nosso conhecimento pessoal de Angola e de Moçambique, com alguns documentos fotográficos e gráficos termo-pluviométricos pertinentes. Será referida a forma como a circulação atmosférica e as correntes marítimas contribuem para a criação da referida dissimetria das fachadas oceânicas. O papel das correntes marítimas na regulação térmica terrestre. A importância da circulação oceânica nas variações climáticas A dissimetria climática existente entre os desertos periglaciares canadianos e as regiões agrícolas e florestais do sul da Escandinávia, situadas à mesma latitude de 60°N demonstra que a extremidade árctica da corrente do Golfo é a zona de dissipação de calor mais importante do planeta. Por isso, é aí que a interacção entre os fenómenos atmosféricos, glaciares e oceânicos é mais directa (J. Riser, 1999). Deste modo, qualquer alteração na corrente do Golfo terá, obviamente, consequências decisivas ao nível planetário. O mesmo terá acontecido, como é óbvio, durante o Quaternário. O circuito que se observa na figura 12 designa-se, muitas vezes, como conveyor belt (correia 34 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral transportadora) e tem uma importância crucial na regulação climática da Terra. Mecanismo e importância do upwelling. A figura 13 permite verificar o ângulo existente entre os ventos e as correntes por eles provocadas ao mesmo tempo ajuda a compreender a razão do fenómeno de upwelling. Com efeito, a existência de correntes que afastam as águas do continente (caso, por exemplo das correntes das Canárias e de Benguela) tem, forçosamente, que provocar uma alimentação em água profunda. Sendo as águas frias e profundas ricas em nutrientes, os locais onde se verificam fenómenos de upwelling correspondem, geralmente, a faixas litorais muito ricas em peixe. É o caso da costa de Marrocos e da Mauritânia, mas também da costa sul de Angola e, sobretudo, da costa ocidental da América do Sul, banhada pela corrente de Humboldt. Alguns aspectos da circulação marítima na costa portuguesa Embora com menor intensidade, o fenómeno de upwelling também acontece na costa portuguesa, durante o verão. O desvio para a direita, devido ao efeito de Coriolis, da corrente originada pela nortada produz uma corrente de Este para Oeste, obrigando à ascensão de águas frias e profundas para compensar o movimento das águas superficiais para o largo. A figura 14 documenta 3 situações de upwelling na costa ocidental da Península Ibérica e tem o interesse adicional de permitir detectar a influência dos acidentes costeiros neste fenómeno. Também em Portugal a existência do upwelling tem uma grande importância no rendimento das pescas, nomeadamente na da sardinha (C. S. Reis et. al., 2002). Durante o inverno, a existência de ventos de componente sul pode produzir uma corrente que se desloca de sul para norte ao longo da costa (fig. 15). A forte descarga de águas dos rios, nomeadamente do Douro, quando em situação de cheia pode provocar um efeito semelhante ao que se observa na figura 16 (corrente de Davidson): impulsionada pelos ventos de sul e pelo efeito de Coriolis a pluma das águas dos rios pode ser arrastada para norte. Pensamos que este efeito poderá estar na origem do aparecimento de cadáveres do desastre da ponte de Entre-os-Rios tão longe como a enseada de Cariño, a leste do cabo Ortegal. Aula prática: A abundante documentação encontrada em C. S. Reis et. al., no capítulo intitulado Fisheries do volume de F. D. Santos, Forbes, e Moita, (2002), permitirá estudar a importância do upwelling na pesca, nomeadamente na da sardinha. Um outro tema muito interessante e actual poderá ser a análise do fenómeno designado por El Niño. Para essa hipótese existe documentação em Summerhayes e Thorpe (1998) e em diversos sites na Internet, entre os quais sugerimos: http://www.nautigalia.com/elninoylanina/index3.htm 35 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Este assunto permite compreender um pouco melhor as complexas interacções entre a atmosfera e a hidrosfera a nível global, e permite também, lançar uma ponte para a discussão de temas como as oscilações e mudanças climáticas. A análise levada a cabo por B. Lomborg (2002) poderá ser invocada a este respeito. Com efeito, o fenómeno El Niño não terá existido durante o Holoceno médio (8000-5000 anos BP) quando o clima global e regional era 1-2°C mais quente do que na actualidade. Deste modo, parece que o aquecimento não tem uma correlação imediata com o El Niño e a existência de fortes “El Niño” não deverá ser invocada como prova de uma aquecimento global. Bibliografia utilizada ANDERSEN, B. G.; BORNS, H. W. JR., (1994) - The Ice Age World, Scandinavian University Press, Oslo, 208 p. LOMBORG, B., (2002) – The skeptical environmentalist- measuring the real state of the World, Cambridge Univ. Press, 515 p. DAVEAU, S., (1995) - Portugal Geográfico, ed. João Sá da Costa, Lisboa, , 223 p. HACHETTE MULTIMEDIA (2002) – Atlas Mondial. Ed. CD Rom, v. 6.1 OPEN UNIVERSITY, (2001) - Ocean Circulation, The Open University, Butterworth Heineman, Grupo Elsevier, Boston, 286 p. RIBEIRO, O., LAUTENSACH, H., DAVEAU, S., (1987) - Geografia de Portugal. I. A posição geográfica e o território, Lisboa, Ed. Sá da Costa, 1987, 334 p. RISER, JEAN, (1999) - Le Quaternaire; Géologie et Milieux Naturels, Dunod, Paris, 320 p. SANTOS, F. D, FORBES, K , MOITA, R. (editores) (2002) – Climate change in Portugal. Scenarios, impacts and adaptation mesures (Siam project), Gradiva, F. C. Gulbenkian, FCT, Lisboa, 454 p. STRAHLER, A. N., (1987) Geología Física, Ed. Omega, Barcelona, 629, p. SUMMERHAYES, C. P., THORPE, S. A. (1998) – Oceanography. An Illustrated guide, Mason Publishing, Southampton Oceanography Centre, 352 p. THURMAN, H. V., (1997) - Introductory Oceanography, Prentice Hall, New Jersey, 544 p. Web sites http://www.nautigalia.com/elninoylanina/index3.htm 36 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura: 6: Estrutura dipolar da molécula de água. Ligações iónicas e covalentes 37 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 7: A penetração da energia solar na água do mar 38 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 8: Variação da temperatura, salinidade e densidade da água com a latitude e a profundidade 39 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 9: Balanço energético de Janeiro e Julho 40 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 10: Correntes quentes e frias e áreas de upwelling 41 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 11: Direcção dos ventos versus direcção das correntes marítimas. A espiral de Ekman 42 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 12: A circulação em superfície e em profundidade. Conveyor belt 43 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 13: Relação entre a direcção dos alíseos e as correntes por eles geradas. O upwelling. 44 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 14: Exemplos de situações de upwelling na costa ocidental da Península Ibérica. Adaptado de O. Ribeiro, H. Lautensach e S. Daveau, vol. I, 1987 45 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 15: Circulação ao longo da costa portuguesa em Agosto, Novembro e Dezembro Figura 16: Corrente de Davidson ao largo da costa da Califórnia 46 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Aula 3: Ondas3 Como se deslocam as ondas: características gerais dos processos ondulatórios O movimento mais evidente da superfície do Oceano é o das ondas. Os fenómenos ondulatórios transmitem energia através da matéria. As partículas materiais apenas giram ou oscilam para a frente e para trás, ou para cima e para baixo, transmitindo energia de uma partícula a outra. Efectivamente, quando batemos numa mesa, as ondas sonoras viajam através dela, mas a mesa propriamente dita não se movimenta. Existem 3 tipos fundamentais de movimentos ondulatórios (fig. 17): Nas ondas longitudinais, tal como nas ondas sonoras, as partículas movimentam-se para a frente e para trás na mesma direcção da propagação da energia, tal como uma mola, alternadamente distendida e comprimida. A energia pode ser transmitida em todos os estados da matéria (sólido, líquido e gasoso) através deste movimento longitudinal das partículas. Nas ondas transversais a energia viaja na perpendicular da direcção de vibração das partículas. Este tipo de movimento transmite-se apenas nos sólidos. As ondas que transmitem energia ao longo da interface entre 2 fluidos de densidades diferentes têm um movimento que combina o das ondas longitudinais e transversais. O caso mais típico é o da interface atmosfera/oceano. As partículas movem-se em trajectórias circulares. Daí o nome de ondas orbitais. Características das ondas Uma onda ideal (fig. 18) apresenta partes altas (cristas ) e baixas (cavas). A diferença de altitude entre cristas e cavas é a altura da onda (H). A distância horizontal entre 2 pontos homólogos consecutivos é o comprimento de onda (L). A relação entre comprimento e altura chama-se declive da onda (H/L). O tempo que demora a passar uma onda completa é o período (T) da onda. Frequência (f) é o número de cristas que passa num dado ponto num minuto. É igual a 60/T. A figura 19 mostra as relações entre comprimento de onda, período e velocidade das ondas quando em águas profundas. Através do gráfico, sabendo um dos elementos característicos da onda é possível saber os outros. Assim, uma onda com um período de 8 segundos terá um comprimento de onda de 100m e uma frequência de 7,5/minuto. A velocidade será 100X7,5, isto é: 750m por minuto ou 12,5 m por segundo. As órbitas circulares das partículas de água têm um diâmetro igual à altura da onda. Quando uma partícula está na crista da onda, move-se no mesmo sentido da propagação da energia. Quando está na cava, move-se no sentido inverso. Os diâmetros das órbitas das partículas diminuem com a profundidade abaixo do nível da água parada (nível médio entre a crista e cava), até que a 3 Convém recordar que as marés também são um fenómeno ondulatório. Por isso, as ondas deverão aparecer no programa antes das marés, para permitir aos estudantes uma reflexão sobre os movimentos ondulatórios que permita compreender melhor o fenómeno das marés. 47 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral movimentação das partículas numa onda ideal cessa completamente a uma profundidade igual a metade do comprimento de onda (L/2). No caso da onda marcada a vermelho na figura 19, os movimentos cessariam a 50m de profundidade. • Ondas de águas profundas. As ondas que ocorrem quando a profundidade é maior que metade do comprimento de onda chamam-se ondas de águas profundas (fig. 21). Não são afectadas pelos fundos oceânicos. • Ondas de águas baixas (shallow water waves). São ondas cuja profundidade é inferior a 1/20 do comprimento de onda. No caso da onda da figura 19, isso corresponderia a profundidades inferiores a 5m. Incluem-se nesta categoria as ondas geradas pelo vento quando se aproximam da linha de costa (fig. 20), os tsunami e as ondas de maré geradas pela atracção do Sol e da Lua. A sua velocidade aumenta com a profundidade. A movimentação das partículas em águas pouco profundas é uma órbita elíptica muito achatada que se aproxima da oscilação horizontal (fig. 21). Esse movimento oscilatório pode, por isso, afectar o fundo do mar. • Ondas de transição. As ondas de transição acontecem quando a profundidade é inferior a metade do comprimento de onda mas maior que 1/20 do comp. de onda. No caso da onda da figura 19, entre 50 e 5 m de profundidade. A sua velocidade é controlada em parte pelo comprimento de onda e em parte pela profundidade. Ondas geradas pelos ventos Quando o vento sopra, as tensões por ele criadas (fig. 22) deformam a superfície do oceano sob a forma de pequenas ondas com cristas arredondadas e cavas em forma de "V" e com comprimentos de onda muito curtos, inferiores a 1,74 cm. Chamam-se rídulas (ripples) e a tensão superficial da água tem tendência a destruí-las, restaurando a superfície lisa da água (fig. 23, parte esquerda). À medida que estas ondas se desenvolvem, a superfície do mar ganha um aspecto irregular, o que permite uma maior exposição ao vento e uma maior transferência da energia do vento para as águas. Quando essa energia aumenta desenvolvem-se ondas de gravidade. Estas têm comprimentos de onda superiores a 1,74 cm e uma forma sinusoidal (fig. 23, parte média).Uma vez que atingem uma maior altura, a gravidade torna-se a principal força de restauração da superfície, daí o nome de ondas de gravidade. Se a energia que lhes é fornecida aumentar, a altura da onda aumenta mais do que o comprimento. Assim, as cristas tornam-se ponteagudas e as cavas arredondadas (fig. 23, direita). A energia do vento faz aumentar a altura, comprimento de onda e velocidade das ondas. Mas quando a velocidade das ondas iguala a dos ventos, já não é adicionada mais energia à onda, que atinge então a sua maior dimensão. A zona de origem das ondas (em inglês designa-se como "sea") é caracterizada por uma superfície eriçada por ondas de pequeno comprimento de onda, com ondas movendo-se em várias direcções e com diferentes períodos e comprimentos de onda (fig. 24). Este facto deve-se à acentuada variação da direcção e velocidade do vento. Outros factores que condicionam a energia das ondas são a duração do impulso do vento numa dada direcção e fetch (distância em que o vento sopra na mesma direcção). Swell 48 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Quando as ondas se aproximam das margens oceânicas, onde a velocidade do vento diminui, elas podem viajar mais depressa que o vento. Nessa altura o declive da onda diminui e elas transformam-se em ondas com longas cristas designadas como “swell”. O swell pode deslocar-se ao longo de grandes distâncias sem perda significativa de energia. Sistemas de ondulação originados na Antártida foram encontrados a quebrar no Alaska, depois de viajar mais de 10.000 km. As ondas com maior comprimento de onda serão aquelas que viajam mais depressa, porque, em águas profundas, a velocidade é função do comprimento de onda (fig. 19). Padrões de Interferência Porque o swell de diversas tempestades coexiste no oceano, é inevitável que venham a colidir e interferir uns com os outros. Isso cria padrões de interferência. Trata-se da soma algébrica da movimentação que cada uma delas produziria de per si. Quando os sistemas de ondas de 2 áreas de origem colidem, o resultado pode ser construtivo, destrutivo, e mais frequentemente, misto. A interferência construtiva acontece quando ondulações com o mesmo comprimento de onda se encontram em fase, o que significa que as cristas e as cavas coincidem. A onda resultante terá o mesmo comprimento de onda e uma altura que será a soma das alturas individuais (fig. 25, esquerda). A interferência destrutiva acontece quando as cristas de um sistema coincidem com as cavas de outro. Se os sistemas de ondulação têm características semelhantes, a soma algébrica será zero, e a energia de um será cancelada pela do outro. Porém, é mais provável que haja ondas de diversos comprimentos e alturas em cada sistema e por isso, que se desenvolva uma interferência mista. É por isso que, os sistemas de ondulação que chegam à costa geralmente têm padrões irregulares com sequências de ondas altas e baixas (fig. 25, direita). Ondas livres e forçadas As ondas forçadas são mantidas pelo vento, de tal forma que as suas características estão adaptadas a ele. Nas ondas livres a movimentação dá-se de acordo com os ventos na área de origem mas não existe uma força que as mantenha em movimento. Mesmo na área de origem, existe uma mistura entre ondas livres e forçadas. Além disso, dado que o vento é variável, há sempre vários sistemas de ondas criados em cada área de origem. Ondas traiçoeiras (Rogue Waves) Um dos mistérios dos oceanos são as causas das ondas traiçoeiras, ondas maciças que podem atingir o equivalente a 10 andares de altura (cerca de 30m!). Resultam de raras coincidências num comportamento normal das ondas. No oceano aberto, uma onda em cada 23 terá mais do dobro da altura média. Uma em 1175 terá uma altura 3 vezes maior e uma em 300,000, quatro vezes maior. As hipóteses de ondas realmente monstruosas são raras (uma em biliões) mas acontecem! O total de barcos de vários tamanhos perdidos durante um ano é de cerca de 1000! Muitos deles 49 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral são vítimas destas ondas. Provavelmente elas são devidas a uma interferência construtiva extraordinária. São mais frequentes a sotamar de ilhas ou baixios e onde ondas de tempestade chocam contra fortes correntes marítimas tal como a corrente das Agulhas na costa SE de África onde as ondas de tempestade deslocando-se para NE chocam com a corrente das Agulhas, vinda de NE. Este é provavelmente o sítio da terra onde se regista o maior número de naufrágios. Rebentação (Surf) Quando a profundidade é inferior a 1/20 do comprimento de onda as ondas começam a comportar-se como ondas de pequena profundidade. A movimentação das partículas é muito retardada pela acção do fundo e existe um significativo transporte de água em direcção à linha de costa (fig. 20). O fundo marinho, a baixa profundidade, interfere com o movimento das partículas na base da onda, atrasando-a. Por isso, há uma espécie de compressão d as cristas das ondas, o que reduz o respectivo comprimento de onda. Esse facto é compensado por um aumento da altura. As cristas tornam-se estreitas e ponteagudas e as cavas tornam-se curvas largas, tal como nas ondas de alta energia do mar aberto. O aumento da altura acompanhado de diminuição do comprimento de onda aumenta o declive da onda (H/L). Quando este atinge 1/7, a onda quebra (fig. 20). A vaga mais vulgar é a vaga por derramamento (spilling breaker, fig. 26). Esta resulta de um declive relativamente suave do fundo, que extrai energia mais gradualmente da onda, produzindo uma massa turbulenta de ar e água que escorre na frente da onda em vez de encaracolar no topo. Nas vagas em voluta a crista da onda adianta-se muito em relação à sua base e desaba por falta de apoio. Estas vagas em voluta formam-se em praias com um declive moderado (fig. 26). Se o declive da praia e a altura da onda foram muito acentuados, a onda quebra sobre a forma de grandes rolos ou vagalhões (surging breakers, fig. 26). É o que acontece com as vagas de tempestade (Moreira, M.ES.A, 1984). Refracção das ondas As ondas começam a arquear-se e os comprimentos de onda a tornarem-se mais curtos quando os sistemas de ondulação "sentem o fundo" ao aproximar-se da linha de costa. É raro que o ângulo de aproximação à praia seja exactamente 90°. Por isso, alguns sectores começarão a "sentir o fundo" mais cedo e atrasar-se-ão em relação ao resto da onda. Disso resulta uma curvatura da frente da onda que se designa como refracção da onda (fig. 27-A). Na figura 27-B, vemos como uma topografia de fundo irregular atrasa certas partes da onda que se aproxima da costa. A refracção distribui energia de uma forma desigual na praia. Se construirmos linhas perpendiculares à frente das ondas, e as espaçarmos de modo que a energia nesses sectores seja sempre igual, obtemos linhas ortogonais (fig. 27-B) que nos ajudam a compreender como a energia das vagas se distribui. As ortogonais convergem nos promontórios e divergem nas baías. Por isso a energia e a erosão será maior nos promontórios e mais dispersa nas baías, onde pode ocorrer acumulação de areias. A maior energia nos promontórios é demonstrada pela existência 50 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral de ondas mais altas. Difracção das ondas A difracção pode definir-se como um encurvar das ondas à volta de objectos. Permite que a ondulação penetre nos portos e por detrás de barreiras (fig. 28). A difracção acontece porque qualquer ponto de uma onda pode ser uma fonte a partir da qual a energia se propaga em todas as direcções. Reflexão das ondas Nem toda a energia das ondas é consumida quando elas esbarram contra a linha de costa. Uma parede vertical, tal como um molhe, pode reflectir a ondulação de volta para o oceano, com pouca perda de energia (fig. 29). A reflexão das ondas nas barreiras costeiras ocorre segundo um ângulo igual ao ângulo de incidência. Nas condições de ondas perpendiculares ao obstáculo, a reflexão produz ondas estacionárias (fig. 30). Estas resultam de duas ondas do mesmo comprimento que se movimentam em direcções opostas. As partículas continuam a mover-se na horizontal e na vertical, mas não existe o movimento circular que se vê numa onda progressiva. Estas ondas são caracterizadas pela existência de linhas ao longo das quais não existe movimento vertical (linhas nodais). Nos antinodos há uma alternância entre subidas e descidas e a movimentação é inteiramente vertical. A altura da onda estacionária teoricamente pode atingir o dobro da altura da onda incidente, o que pode traduzir-se em problemas na estabilidade dos navios junto aos cais de acostagem. Storm Surge Os centros de baixa pressão são acompanhados por um empolamento da superfície da água, que acompanha o movimento da depressão. Quando a tempestade se aproxima da costa a parte desse empolamento onde os ventos se dirigem para o lado da terra (fig. 31) produz uma subida do nível do mar afectando a linha de costa. As storm surges podem ser altamente destrutivas nas costas baixas sobretudo se coincidirem com uma maré alta. Tsunami Os japoneses chamam às grandes ondas destrutivas que ocasionalmente penetram nos seus portos, tsunami, ou "ondas de porto". Trata-se de ondas que têm origem nos sismos, por vezes impropriamente chamadas "tidal waves," o que, a ser uma designação correcta, implicaria uma falsa relação com as marés. Os tsunami são criados pela movimentação de falhas. Isto origina sismos e também mudanças bruscas no nível da água à superfície do mar. Eventos secundários tais como avalanches submarinas produzidas pelo jogo das falhas, ou destacamento de icebergs dos inlandsis e sua queda no mar também podem originar tsunami (fig. 32). Uma vez que o comprimento de onda dos tsunami excede 200 km trata-se, necessariamente, de ondas que se comportam como sendo de águas pouco profundas. Por isso, a sua velocidade é sempre determinada pela profundidade da água. No mar aberto movem-se a velocidades superiores a 700 k/h, com alturas de 0,5m. Por isso, 51 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral passam facilmente desapercebidos. Porém, em águas pouco profundas, tornam-se mais lentos e a água começa a acumular-se contra a linha de costa, podendo ultrapassar 30m de altura e entrando nos portos com efeitos destruidores. Um tsunami pode ter uma onda única, mas a libertação da energia sísmica geralmente origina várias ondas. O Oceano Pacífico é aquele que é mais sujeito a tsunami, porque se situa numa área particularmente instável (anel de fogo do Pacífico), com sismos violentos frequentes. Em 27 de Agosto de 1883, a ilha volcânica de Krakatoa (hoje Indonésia) explodiu e quase desapareceu. Originou-se um tsunami com mais de 30m que matou mais de 36000 pessoas. A energia desta onda chegou até às Ilhas Britânicas. Nestas circunstâncias os barcos devem fugir dos portos e sair para ao mar alto, ao contrário do que deve fazer aquando dos ciclones. Será referida, também, a importância do tsunami que se seguiu ao sismo de Lisboa de 1755 (fig. 33). Aula Prática Observação da fotos aéreas seleccionadas para identificar padrões de reflexão refracção e difracção das ondas. Pesquisa no site: • http://www.hidrografico.pt/wwwbd/ Instituto hidrográfico: Rumos e períodos de ondulação. Casos de storm surges e suas consequências no nível atingido pelo mar. Bibliografia KOMAR, P. D., (1998) - Beach Processes and Sedimentation, Prentice Hall, New Jersey, 543 p. MOREIRA, M. E. S. A., (1984) - Glossário de termos usados em Geomorfologia litoral, Centro de Estudos Geográficos, Linha de acção de Geografia das Regiões Tropicais, relat. nº 15, Lisboa, 167 p. THURMAN, H. V., (1997) - Introductory Oceanography, Prentice Hall, New Jersey, 544 p. Figura 17: Tipos de ondas 52 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 18: Características essenciais das ondas orbitais Figura 19: Relações entre o comprimento de onda, o período e a velocidade das ondas 53 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 20: Modificações sofridas pelas ondas quando se aproximam da linha de costa Figura 21: Ondas de águas profundas, intermédias e pouco profundas 54 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 22: A transmissão da energia do vento para as ondas Figura 23: Ondas de capilaridade e de gravidade 55 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 24: Área de origem da ondulação e Swell 56 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 25: Interferência de ondas 57 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 26: Vagas por derramamento, em voluta e em rolo (surging) Figura 27-A: A refracção das ondas quando se aproximam da costa 58 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 27-B: Refracção das ondas Figura 28: Reflexão das ondas 59 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 29: Difracção das ondas Figura 30: Ondas estacionárias 60 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 31: Storm surge Figura 32: Processo de criação dos tsunami 61 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 33: O tsunami que se seguiu ao sismo de Lisboa de 1755 62 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Aula 4: Marés Mecanismos das marés, maré directa e reflexa No fundo, as marés funcionam como ondas de baixa profundidade, já que apresentam comprimentos de onda de milhares de kms e alturas que atingem os 15m. As marés terrestres são produzidas pela atracção gravitacional do Sol e da Lua. Como é sabido, segundo a lei de Newton, essa atracção é directamente proporcional às massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância. Porém, no processo gerador de marés, a proporcionalidade refere-se ao cubo da distância (Thurman, 1997). Devido a esse facto e uma vez que a Lua está estar muito mais próxima da terra que o Sol, a força geradora das marés por parte do Sol é igual a 46% da força da Lua (fig. 34). A Terra e a Lua formam um conjunto que gira em torno do Sol. Nesse movimento de translação o conjunto Terra-Lua é representado pelo centro comum de gravidade, ou baricentro. Este situase dentro do manto terrestre, a 4700 km de distância do centro da terra (fig. 35). É este baricentro que descreve uma órbita elíptica em relação ao Sol (fig. 36). Quer a Terra quer a lua descrevem órbitas mais complexas e relativamente sinuosas. Todos as partículas pertencentes à Terra descrevem círculos de raios iguais, à volta do baricentro (fig. 37). A força centrípeta requerida por todas as partículas da Terra para as manter em rotação é igual em todos os pontos da Terra. Porém, a força da gravidade exercida pela Lua varia consoante a posição de cada ponto terrestre em relação à Lua (fig. 38). Da subtracção dos vectores da força centrípeta e da força gravitacional resulta um outro vector, em azul na fig. 38, que corresponde à força das marés. Deste modo, as forças de maré tendem a empurrar a água para 2 bojos em lados opostos da Terra, sendo que um deles se posiciona directamente sob a Lua (maré alta directa, fig. 39) e o outro fica directamente oposto (maré alta reflexa). Porém, de cada vez que a Lua passa pelo meridiano do lugar a preia-mar, só se faz sentir um pouco mais tarde devido ao atrito das massas (água e fundo) e à necessidade de vencer a inércia. Pelo mesmo motivo, numa lua nova ou lua cheia a maré de maior amplitude só ocorre algum tempo depois, período que pode ir até 36 horas e tem o nome de idade da maré. Além disso, o intervalo de tempo entre duas passagens da Lua pelo mesmo meridiano (dia lunar) não coincide com o dia solar de 24 horas. Isto acontece porque, ao longo de um dia solar a Lua gira 12° e 12’no seu movimento de translação, em sentido directo. Por isso, para o observador voltar à posição inicial relativamente à Lua, é necessário que a Terra gire mais 12° e 12’, o que corresponde aproximadamente a 50min (fig. 40). Marés vivas e mortas Embora a força das marés provocadas pelo Sol corresponda apenas a 46% da das marés lunares, é evidente que a posição dos bojos solares, que teoricamente, circulam pela hidrosfera independentemente dos bojos lunares, acabam por interferir com as marés lunares, acentuando-as (marés vivas) ou contrariando-as e diminuindo a respectiva amplitude (marés mortas (fig. 42). 63 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral É dessa interferência que resulta a existência de marés desiguais ao longo de um mês lunar (fig. 43), sendo que as marés vivas acontecem a cada Lua nova e a cada Lua cheia e as marés mortas acontecem nos quartos crescente e minguante. Outras variações na amplitude das marés. Marés equinociais Uma vez que as amplitudes da maré são maiores quando a Terra está mais próximo do Sol ou da Lua, as variações na distância da Terra a cada um deles acabam por interferir na amplitude das marés. A figura 44 mostra como essas distâncias podem variar. Mas existem ainda outros factores a ter em conta. O plano da órbita da Lua faz um ângulo de 5° com o plano da eclíptica. Significa isto que a Lua pode atingir uma declinação máxima de 28,5° para Norte ou Sul do Equador (23,5+5°). Como o plano da órbita da Lua sofre um movimento de precessão com a duração de 18,6 anos, o resultado acaba por produzir variações complexas, em que, por exemplo, a declinação máxima da Lua pode atingir apenas 18,5° 9,3 anos depois do início do ciclo (fig. 46). Este ciclo deve ser tido em conta para a avaliação das variações do nível do mar. À passagem pelo Sol no plano do Equador corresponde uma maior aproximação entre os bojos de maré solares e lunares, o que reforça a amplitude das marés. Assim, as marés vivas equinociais são marés particularmente fortes e este conceito tem consequências práticas, por exemplo na definição de domínio público marítimo, que, segundo a legislação, compreende: “Faixa ao longo de toda a costa marítima cuja largura é limitada pela linha da máxima preia-mar de águas vivas equinociais e a batimétrica dos 30m” (Dec-Lei 93/90, de 19 de Março). Considerando o grande número de variáveis a ter em conta, é interessante considerar quais as condições que produziriam a maior força de maré: a amplitude máxima da maré deverá corresponder a uma situação da Terra em perihélio, com a Lua em perigeu e em sizígia e quando o Sol e a Lua tiverem declinação zero. Esta situação ocorre apenas de 1600 em 1600 anos e a próxima acontecerá no ano 3300. Marés diurnas, semi-diurnas e mistas Se a Terra fosse uma esfera coberta por um mar de profundidade uniforme, haveria 2 marés altas de amplitudes diferentes em cada dia lunar, o que significa que teriam um período de 12:25 minutos (metade do dia lunar). A maré mais próxima da “ideal” pode, por isso, designar-se como maré semidiurna. A maré diurna tem apenas uma maré alta e uma maré baixa cada dia. O período é de 24h e 50min. As marés mistas correspondem a situações com algumas características de marés semidiurnas e outras de marés diurnas. Muitas vezes há duas marés altas e duas marés baixas em cada dia lunar, mas as duas marés sucessivas têm alturas significativamente diferentes. Estas desigualdades são maiores quando a Lua está sobre os trópicos (marés tropicais, fig. 47), do que quando a lua está sobre o equador (marés equatoriais). Também pode haver alguns dias ao longo de mês em que as marés têm um período de 24h50min, 64 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral tipicamente diurno (fig. 49). A existência destes dois últimos tipos de marés (diurnas e mistas) explica-se pelo facto de a Terra ter uma superfície muito irregular, com continentes separando oceanos de formas irregulares. A existência de marés diurnas ou semidiurnas tem uma grande importância na definição do tempo de estacionamento do nível do mar nas diferentes altitudes compreendidas entre os níveis das marés mais baixas e mais altas. Com efeito, no caso das marés semi-diurnas é ao nível das marés altas e baixas médias que o tempo de estacionamento é maior (fig. 50). Nas marés de tipo diurno, o mar estaciona mais tempo perto do nível médio. A existência de certos fenómenos meteorológicos (ciclones tropicais, depressões subpolares muito cavadas) pode provocar, como vimos no capítulo anterior, fenómenos do tipo storm surge. De uma maneira geral, as variações da pressão atmosférica traduzem-se sempre por variações no nível do mar. Essas variações constam das tabelas das marés e destinam-se a corrigir o nível calculado para as marés por processos astronómicos. Assim, uma pressão 20cm de mercúrio inferior ou superior à pressão normal de 760mm traduzir-se-á num empolamento ou numa depressão da superfície das águas de 27cm (tabelas das marés, APDL). Estas alterações, amplificadas pelo efeito de subida do nível do mar quando existe um vento que se dirige do mar para a Terra (fig. 31) acabam por interferir com o desenvolvimento das marés (fig. 51). Conhecida a amplitude esperada das mesmas, calculada por processos astronómicos, é possível saber qual a variação que fica a dever-se aos fenómenos meteorológicos. Dinâmica das marés: linhas cotidais e pontos anfidrómicos Os bojos formados pela atracção da Lua situam-se na respectiva vertical (maré alta directa) e do lado oposto da Terra (maré alta reflexa). À medida que a Terra roda, o referido bojo, correspondente à onda de maré desloca-se também no sentido directo (fig. 52). O facto de os oceanos estarem compartimentados em bacias faz com que a circulação das marés se feche dentro de cada uma dessas bacias e se faça à volta de um ponto central (o ponto anfidrómico), situado aproximadamente no centro de cada bacia oceânica e em cada hemisfério. A maré pode ser vista, assim, como uma onda em que as duas cristas estão separadas por 20.000 km (metade do diâmetro do Equador). Trata-se de ondas muito longas. Como vimos no tema anterior, com uma profundidade abaixo de 1/20 do comprimento de onda as ondas comportam-se como ondas de baixa profundidade, cuja velocidade é determinada pela profundidade4. Como todas as ondas que se aproximam de terra, a onda de maré sofre um aumento de altura à medida que a profundidade diminui. Pelo contrário, em direcção ao centro da bacia oceânica, a altura da onda de maré diminui até se anular no ponto central, o chamado ponto anfidrómico, 4 Neste caso, a profundidade limite é de 1000 km, muitíssimo superior à profundidade das bacias oceânicas que se situa entre 4-5km. 65 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral onde todas as linhas cotidais (linhas que unem os pontos onde a maré alta é simultânea) se cruzam (fig. 53). Podem criar-se diversos pontos anfidrómicos, sempre que as bacias oceânicas sofrem uma certa compartimentação, como é o caso do mar do Norte, que funciona como uma bacia independente do resto do Atlântico Norte (fig. 54). As correntes de maré seguem este padrão rotativo nas bacias oceânicas (fig. 55), mas são convertidas em correntes alternantes nas margens dos continentes. A velocidade máxima destas correntes acontece aquando da enchente e da vazante, quando o nível da água está entre o nível da maré alta e da maré baixa. A diminuição de profundidade e o carácter reentrante de algumas baías pode provocar uma amplificação da maré, como no caso da Baía de Fundy, onde a amplitude da maré atinge 17m. Macaréu O macaréu (fig. 56) é uma onda de maré que força o seu caminho ao longo dos rios. É comum em rios com o Amazonas, onde o fenómeno se designa de Pororoca (que significa grande estrondo em língua tupi). Ocorre na mudança das fases da Lua (2 dias antes, no dia e 3 após a Lua), principalmente nos equinócios, mais intensamente nos períodos de maré viva. O fenómeno começa quando as águas das marés vindas do oceano chegam à desembocadura de um rio, formando elevações que podem ter até dezenas de metros de comprimento e que se movem rio acima com velocidade de 30 a 50 Km/h. O encontro entre as águas provoca ondas que podem alcançar até 5m de altura avançando rio adentro. Este choque das águas tem uma força tão grande que é capaz de derrubar árvores e modificar o leito do rio. Amplitude das marés A esse respeito os litorais podem classificar-se como micromareais (amplitude máxima inferior a 2m); mesomareais (entre 2 e 4m) e macromareais (mais de 4m). As marés na costa portuguesa são do tipo mesomareal, com amplitudes máximas próximas dos 4 m (Agenda das marés, APDL). A figura 57 mostra a relação existente entre a amplitude das marés e os diferentes tipos de paisagens litorais. É curioso verificar que os deltas e as ilhas barreira predominam em ambientes micromareais, enquanto que os estuários em forma de funil e as planícies vasosas (mud flats) predominam nos ambientes macromareais. Aula Prática • Análise das tabelas de marés (APDL; Associação Nacional de Cruzeiros). • Construção de gráficos (fig. 58) e sua interpretação. Bibliografia utilizada 66 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral APDL - Administração dos Portos do Douro e Leixões, (2002) – Agenda 2002 PETHICK, J. - (1984) - An Introduction To Coastal Geomorphology, London, Edward Arnold, 260 p. PUGH, D. T. - (1987) - Tides, Surges And Mean Sea Level, John Wiley and Sons, Chichester, 472 p. SANTOS, F. D, FORBES, K , MOITA, R. (editores) (2002) – Climate change in Portugal. Scenarios, impacts and adaptation mesures (Siam project), Gradiva, F. C. Gulbenkian, FCT, Lisboa, 454 p. THURMAN, H. V., (1997) - Introductory Oceanography, Prentice Hall, New Jersey, 544 p. 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A força centrípeta que mantém o sistema em rotação conjunta é igual em todos os pontos da Terra. 71 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 38: A existência de forças gravitacionais diferentes consoanter a posição de cada ponto em relação à Lua implica a existência da força de maré 72 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 39: Maré alta directa e reflexa Figura 40: Dia Lunar: ao longo de um dia solar a Lua gira 12° e 12’. Por isso, para o observador voltar à posição inicial relativamente à Lua, é necessário que a Terra gire mais 12° e 12’. Desta forma, o dia lunar tem 24h e 50min. 73 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 42: Marés vivas e mortas 74 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 43: Interferência entre as marés lunares e solares 75 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 44: Variação da distância da Terra ao Sol e da Terra à Lua Figura 45: Fases da Lua e variação da distância da Lua à Terra e da declinação lunar (Março de 1981) 76 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 46: Variação da declinação da Lua: ciclo de 18,6 anos. Figura 47: Variação na amplitude das marés durante o dia: as marés tropicais 77 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 48: Variação da declinação solar ao longo do ano: as marés equinociais 78 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 49: tipos de marés. Semidiurnas, mistas e diurnas 79 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 50: variações na altura da maré devidas a causas meteorológicas: storm surge de 14-16 de Outubro de 1987 na costa portuguesa 80 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 51: Permanência do nível do mar a diversas alturas. Caso de marés semidiurnas e diurnas. 81 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 52: Propagação da onda de maré 82 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 53: Linhas cotidais e pontos anfidrómicos a nível do globo 83 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 54: Linhas cotidais no Atlântico 84 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 55: A propagação da maré ao longo da costa ocidental da Península Ibérica 85 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 56: A penetração da maré ao longo de um estuário (macaréu) 86 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 57: Relação entre a o tipo e a frequência de diversos tipos de paisagens costeira e a amplitude das marés Altura (m) Amplitude das marés para Lisboa (Tejo) Outubro 2000 4,5 4,0 3,5 3,0 2,5 2,0 1,5 1,0 0,5 0,0 1 2 3 4 5 6 7 8 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 dias Fonte: Associação Nacional de Cruzeiros, 1999 (http://www.edinfor.pt/anc/ancmar-200010.html) Marés Figura 58: Gráfico das marés para Lisboa. Outubro de 2000 87 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Aula 5: Variações do nível do mar Os temas anteriores visaram demonstrar a dinâmica marinha, como um dos elementos da interface Litosfera-Hidrosfera-Atmosfera, bem como as relações que ela estabelece com os outros membros desta trilogia (exemplo: as ondas e as correntes e a sua relação com os fenómenos atmosféricos, os tsunami e a sua relação com a litosfera). O estudo rápido da hidrosfera não ficaria completo sem uma focalização nas variações do nível do mar. Com efeito, o nível do mar é um conceito da maior importância para a evolução geomorfológica dos continentes. Além disso, o nível do mar juntamente com os processos de erosão e/ou fornecimento de sedimentos ao litoral controlam a evolução dos litorais, nomeadamente a situação de avanço ou de recuo da linha de costa (fig. 59). Nível do mar como um conceito relativo O conceito de nível do mar é (quase) sempre um conceito relativo. A figura 60 representa, no sector da esquerda, os diferentes processos que contribuem para as variações eustáticas, globais, do nível do mar. Do lado direito apresentam-se os processos que jogam do lado dos continentes e que interferem com as variações eustáticas. As variações eustáticas têm um carácter global, enquanto que os movimentos que se verificam no continente são claramente localizados no espaço. Do que fica dito, deduz-se facilmente que a variação do nível do mar é a resultante das tendências eustáticas e das tendências que se verificam do lado do continente. Significa isso que as variações eustáticas podem ser ampliadas ou reduzidas, na sua amplitude, pelos movimentos do continente. Até há pouco tempo medíamos o nível do mar relativamente a um ponto que supúnhamos fixo. O problema é que a pretensa estabilidade dos continentes está cada vez mais posta em causa. Só a partir do momento em que se conseguiu fazer observações a partir do espaço, via satélite (fig. 61) foi possível identificar as deformações na superfície do geóide (fig.62). O geóide pode ser definido como a superfície equipotencial que seria assumida pela superfície do mar na ausência de marés, variações de densidade da água, correntes e efeitos atmosféricos. Sabe-se hoje que existe um afastamento do geóide relativamente à superfície ideal do elipsóide que pode atingir cerca de 100m para cima ou para baixo, acabando por conduzir à existência de deformações na superfície do geóide de cerca de 180m (fig. 62)! De facto, as subidas e descidas da superfície do geóide dependem de fenómenos de convecção verificados ao nível do manto terrestre (Encyclopaedia Universalis, 1998, p. 263). Este facto é um obstáculo de peso à construção de curvas da variação absoluta do nível do mar, válidas para toda a Terra. Com efeito, embora o eustatismo geoidal possa ser um fenómeno relativamente lento, os seus efeitos, acabam por poder ser relevantes em prazos relativamente longos, por exemplo à escala dos 2,5 milhões de anos admitidos como duração do Quaternário… (J. Riser, 1999). A variação do nível do mar ao longo do Fanerozóico e as lições a extrair dessa variação Dada a complexidade do tema, em que jogam elementos cuja escala crono-espacial é muito variável, parece-nos que um enquadramento cronológico, será útil e permitirá aos estudantes 88 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral estruturarem devidamente a sua compreensão do mesmo. A emergência da teoria da tectónica de placas permitiu re-elaborar a hipótese do tectonoeustatismo. Com efeito, os continentes passam por fases alternadas de agregação e de rifting (exemplo: formação da Pangea no final do Paleozóico e sua fragmentação no início do Mesozóico). A agregação de continentes diminui, naturalmente, a área de plataforma continental envolvente e acaba por aumentar, deste modo, por aumento da profundidade média, a capacidade das bacias oceânicas. Daqui decorre uma descida do nível do mar. Pelo contrário, a existência de processos de rifting com intumescência térmica e elevação dos fundos oceânicos na área das dorsais acaba por produzir uma diminuição da capacidade das bacias oceânicas e transgressões generalizadas (A. Hallam, 1992). Trata-se de processos muito lentos. A taxa de variação do nível do mar por causas tectono-eustáticas anda à volta de 1cm por cada 1000 anos. As variações eustáticas devidas a estes fenómenos podem atingir valores entre 100 e 300m. As variações glácio-eustáticas são muito mais rápidas (da ordem de 1cm por ano) e atingem valores da mesma ordem de grandeza. A fusão total dos glaciares da Antárctida e Gronelândia provocaria uma subida do nível do mar da ordem dos 65-80m (A. Hallam, 1992). Juntando a esses valores os 120-140 m de variação do nível do mar deste o máximo do Würm até à actualidade (J. M. A. Dias et. al., 1997), obtém-se um valor entre 185 e 220m. Porém, não são os glaciares de montanha que podem provocar grandes variações eustáticas, mas as grandes acumulações de gelo do tipo inlandsis. Esses inlandsis demoram muito tempo a formar-se, o que faz com que apenas durante períodos limitados do Fanerozóico essa causalidade possa ser invocada (fig. 63). Nesta figura verificamos que existem processos de acumulação de gelo no interior dos continentes, conduzindo à existência de níveis eustáticos baixos (assinalados com I, na figura), nos seguintes períodos: 1. Final do Precâmbrico; 2. Transição do Ordovícico para o Silúrico; 3. Carbónico e Pérmico; 4. Quaternário. Durante o resto do tempo um estado em que o efeito de estufa predominaria (assinalado com G na figura), os níveis do mar seriam geralmente altos. Para chegar à curva geral da variação eustática durante o Fanerozóico (fig. 64), é preciso contar com os efeitos, já referidos, do tectono-eustatismo. É possível, nomeadamente, ligar a fase de descida eustática do final do Paleozóico-início do Mesozóico com a construção da Pangea. A contínua subida do nível do mar durante o Mesozóico poderá ser explicada, pelo contrário, pela abertura e expansão dos oceanos que teve lugar durante o Mesozóico. As colisões continentais da tectónica alpina poderão explicar a tendência geral para a descida do nível do mar que se verifica durante o Cenozóico. 89 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Como é evidente, até pela análise das 2 curvas constantes da figura 64, existem ainda muitas dúvidas a este respeito, mas há, apesar de tudo, uma certa concordância de conjunto. Também nos parece útil salientar que se trata de fenómenos muito complexos dos quais escolhemos as causalidades mais óbvias para ilustrar a interferência entre diferentes tipos de fenómenos, a uma escala temporal da ordem das centenas de milhões de anos. Esta abordagem permite, ainda, recordar elementos aprendidos durante disciplinas anteriores (Geografia Física de Portugal), estruturando-os numa visão mais vasta e abrangente e facilitando a respectiva assimilação. Variações do nível do mar durante o final do Cenozóico: a influência do diastrofismo Durante o Neogénico verificou-se uma tendência geral para um progressivo arrefecimento (fig. 65). Essa tendência acentua-se durante o Quaternário, com fortes variações climáticas (glaciações e períodos interglaciares, fig. 66) que se traduzem em importantes variações do nível do mar5. Devido à retenção de gelo no interior dos continentes, durante a última glaciação, o nível do mar terá descido entre 120-140 m relativamente ao nível actual, o que se traduziu numa modificação importante da linha de costa, sobretudo em locais onde a plataforma litoral é extensa e com pouco declive na parte próxima dos continentes (mar do Norte, fig. 67) e num recuo da linha de costa de 30-40km ao largo do Porto (J. M. A. Dias, 1997, fig. 68). A fig. 69 representa uma proposta sobre a variação do nível do mar a partir de 20.000 BP. Um dos aspectos mais interessantes diz respeito à inversão da tendência para uma subida rápida do nível do mar que se verifica de 11.000 a 10.000 BP: durante esse período, que corresponde a uma importante fase de arrefecimento (Dryas recente) verifica-se uma descida do nível do mar que atinge perto de 20m. A subida é retomada por volta de 10.000 BP e prolonga-se até cerca de 5.000BP, quando o mar atinge, aproximadamente, o nível actual. A transgressão flandriana tem uma importância muito grande na configuração actual dos nossos litorais. Devido a esta transgressão, quase todos os litorais do globo correspondem a costas de submersão. Exceptuam-se aquelas que foram directamente submetidas às glaciações e que, sujeitas à sobrecarga dos grandes inlandsis sofreram um processo de afundamento durante a glaciação (glacio-isostasia), do qual ainda estão a recuperar actualmente. A recuperação isostática permite-lhes subir na crusta a uma velocidade que pode atingir 1m por século em certos locais da Escandinávia. A situação das áreas envolventes dos inlandsis corresponde a uma situação oposta: aquando da glaciação, o afundamento da crusta sob o peso dos inlandis vai deslocar material infracrustal que se desloca para a periferia dos inlandsis onde vai ascender provocando, nessas áreas, a existência de um rebordo soerguido (forebulge, fig. 70). A recuperação isostática das áreas anteriormente glaciadas vai fazer-se à custa da migração desse material infracrustal. Por isso, na área do forebulge vai haver uma tendência à subsidência que 5 Os terraços resultantes dessas variações do nível do mar e da sua interferência com fenómenos diastróficos serão objecto de um maior desenvolvimento quando nos referirmos à evolução da plataforma litoral da região do Porto durante o final do Cenozóico. 90 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral vai acentuar a submersão provocada pela subida eustática. Essa tendência é responsável por uma parte da subida relativa do nível do mar que se verifica nas áreas em questão (fig. 71), o que poderá exagerar os dados relativos à variação do nível do mar acrescentando aos valores puramente eustáticos, uma componente de subsidência (Pirazzoli, citado por R. Paskoff 2001, p. 25). A uma escala maior, à volta da ilhas Britânicas, as taxas de variação relativa do nível do mar, (fig. 72) mostram mudanças importantes entre locais bastante próximos, o que significa que existem, decerto, circunstâncias locais (possivelmente sediadas no continente) que interferem com a variação puramente eustática. A representação (fig. 73) das tendências da variação do nível do mar nas estações maregráficas da Península Ibérica incluídas na base de dados do PSMSL (Permanent Service for Mean Sea Level) , ilustra: 1. Uma grande variação no comprimento das séries (os quadradinhos cor de rosa mostram o número de anos que foram considerados para definir essa tendência). É evidente que os dados só podem ser comparados, em rigor, se disserem respeito exactamente ao mesmo período. Infelizmente, não é esse o caso. 2. Uma grande variabilidade de tendências, que se acentua na fachada norte (proximidade dos Pirinéus e dos Cantábricos) e na fachada SE (proximidade da Cordilheira Bética). A coincidência entre as maiores irregularidades e a situação junto de faixas tectonicamente activas não deixa lugar para grandes dúvidas: as principais diferenças na variação do nível do mar ficam a dever-se aos diferentes comportamentos tectónicos dos sectores em causa. Um fenómeno que ainda não foi referido é a hidro-isostasia. Para o ilustrar podemos recorrer à fig. 74. Nesta figura verificamos que existe uma tendência para um fenómeno de subsidência que afecta sobretudo as áreas submersas e que vai diminuindo à medida que nos aproximamos do continente. O traçado das curvas e o seu paralelismo relativamente ao litoral sugere que se trata de um fenómeno relacionado com o aumento da coluna de água que exerce pressão sobre os fundos oceânicos que se verificou devido à transgressão flandriana. Esse aumento de pressão contribuiu para um afundamento das ditas bacias, levando a uma deslocação de matéria infracrustal para a área situada sob os continentes, que sofrem, assim, uma subida relativa (R. Paskoff, 2001, p. 15). A tendência para a erosão dos continentes e para a sedimentação nos fundos oceânicos tem consequências análogas: um afundamento das bacias oceânicas e um levantamento nos continentes (isostasia devida à erosão, fig. 60). As áreas claramente subsidentes a nível do globo, onde a subida do nível do mar ultrapassa os 2mm/ano correspondem a sectores tectonicamente deprimidos (fig. 75) que muitas vezes “atraem” cursos de água importantes que aí desaguam, construindo deltas. Ora, a acumulação de sedimentos que ocorre nestas áreas produz fenómenos de subsidência por isostasia que tendem a perpetuar a acumulação deltaica, que pode, assim, atingir vários milhares de metros. Porém, se por qualquer motivo a sedimentação deixar de compensar a subsidência (o que pode acontecer devido à construção de barragens, por exemplo), a subida do nível do mar pode provocar invasões marinha importantes. É o caso, por exemplo do delta do Nilo depois da construção da 91 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral barragem de Assuão (R. Paskoff, 2001). A fig. 76 representa as curvas da variação relativa do nível do mar em diversas estações maregráficas. Com excepção de Estocolmo, onde joga o processo de recuperação isostática acima referido, todas as outras apresentam em maior ou menor grau, uma tendência para a subida. Esse fenómeno também é visível no mapa da Figura 77. Trata-se de um mapa obtido por altimetria espacial (fig. 61) e pretende mostrar a taxa de variação do nível do mar em mm/ano. Uma vez que a maior parte das áreas estão representadas a cores quentes, isso significa que há um predomínio de sectores onde se verifica uma subida do nível do mar. Como explicar essa subida do nível do mar, que é independente das movimentações do continente de que falámos atrás? A influência das variações climáticas: a pequena idade do gelo e o aquecimento que se lhe seguiu Com vimos, um período de arrefecimento (exemplo: Dryas recente) pode traduzir-se em variações importantes do nível do mar. Porém, mesmo variações climáticas muito mais atenuadas têm reflexos nas curvas eustáticas (fig. 78). Esta figura representa a variação eustática de 1700 a 1970. O período anterior a 1825 corresponde à pequena idade do gelo que terá produzido uma certa descida do nível do mar. O período posterior a 1825 apresenta uma subida do nível do mar de cerca de 12 cm em cerca de 150 anos. A variação eustática representada na figura acontece essencialmente por duas ordens de razões: 1. Um aquecimento global do clima traduz-se quase sempre numa diminuição da quantidade de água retida nos continentes sob a forma de gelo, fazendo aumentar a quantidade existente nos oceanos. 2. Além disso, um aquecimento produzirá uma expansão da água dos oceanos por puro efeito térmico (termo-eustatismo, cf. fig. 60). Segundo R. Paskoff (2001) a expansão térmica da água do mar será responsável de 0,3 a 0,7mm de subida do nível eustático. O quadro da figura 79 representa, na coluna B, as tendências de variação do nível relativo do mar a partir do registo de marégrafos com séries de mais de 70 anos. A esses valores devemos acrescentar o valor da subsidência ligada à isostasia pós-glaciar, para obter os valores da subida eustática. Fazendo um agrupamento das estações próximas (por exemplo, Lagos e Cascais), a média dá valores da ordem de 1,92mm/ano. Esta subida, só por si, embora possa produzir um recuo na linha de costa em média 100 vezes superior, portanto da ordem de 19cm /ano (R. Paskoff, 1984), não é o fenómeno mais importante para a erosão costeira, pensando-se que a variação do nível do mar contribuiu apenas com 10% para a produção desse recuo (J.M. A. Dias et al. 1997). Porém, quando a esta subida se associa uma subsidência do continente (deltas, periferia das áreas glaciadas e sectores onde a exploração de lençóis freáticos ou de petróleo provoca um 92 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral abatimento dos terrenos) podem desencadear-se invasões marinhas importantes. A recente subida do nível do mar e as projecções para o futuro Nos últimos tempos tem-se instalado, primeiro na comunidade científica e depois na opinião pública, um certo alarmismo relativamente às previsões de subida do nível do mar. Esse alarmismo foi despoletado, a nosso ver, pelas previsões contidas no relatório do IPCC (Intergovernmental Panel for Climate Change) de 1991 (fig. 80). O relatório de 2001 (fig. 81), embora acabe por ter uma configuração semelhante, apresenta uma maior complexidade, o que demonstra que muitas mais variáveis foram tomadas em linha de conta. Verifica-se que as estimativas médias, onde se encontram a maior parte dos cenários traçados apresentam uma proposta de subida do nível do mar, no ano de 2100 relativamente ao ano 2000, de cerca de 35cm. Ora, esse valor é idêntico à estimativa mais baixa apresentada 10 anos antes. É no mesmo sentido que vão as afirmações do “Summary for police makers” (http://www.ipcc.ch/pub/spm22-01.pdf): “Furthermore, it is very likely that the 20th century warming has contributed significantly to the observed sea level rise, through thermal expansion of sea water and widespread loss of land ice. Within present uncertainties, observations and models are both consistent with a lack of significant acceleration of sea level rise during the 20th century”. É no mesmo sentido que vão as previsões da maior parte dos especialistas. Com efeito, na figura 82 verifica-se que as primeiras projecções sobre a variação do nível do mar, em 1983, admitiam valores máximos de 3,5m de subida no final do século XXI. Em 2001, a previsão máxima do IPCC é de cerca de 75 cm (fig. 81). E quanto à previsão mínima admite-se que ela possa ser de apenas 10cm (o que, curiosamente, se assemelha à variação da curva de Mörner de 1973 – fig. 75). Prática Variações do nível do mar segundo o PSMSL – obtenção e manuseamento das bases de dados e sua transformação em folhas de cálculo (Excel). Construção de curvas da variação do nível do mar para diversos locais do mundo em diferentes contextos tectónicos (fig. 83). Definição das respectivas tendências e comparação das diferentes curvas. Bibliografia ANDERSEN, B. G.; BORNS, H. W. JR., (1994) - The Ice Age World, Scandinavian University Press, Oslo, 208 p. BIRD, E. C. F., (1993) - Submerging Coasts. 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É de notar a existência de variações importantes na taxa de variação mesmo em locais bastante próximos. 105 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 73: Tendências da variação relativa do nível do mar verificadas nas estações maregráficas da Península Ibérica 106 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 74: Subsidência versus levantamento devidos a fenómenos de hidro-isostasia 107 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 75: Localização dos litorais subsidentes a nível do Globo 108 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 76: Variações recentes do nível médio relativo do mar em 6 estações maregráficas 109 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 77: Taxa de variação do nível do mar no período de Janeiro de 1993 a Dezembro de 2000 110 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 78: Variação do nível do mar de 1700 até 1970 111 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 79: Tendências no comportamento do nível relativo do mar em diferentes locais do mundo, com base em séries maregráficas com mais de 70 anos. 112 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 80: As projecções do IPCC: relatório de 1991 (extraído de E. Bird, 1993) Figura 81: As projecções do IPCC (relatório de 2001: Extraído de: http://www.ipcc.ch/pub/spm22-01.pdf 113 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Fig. 82: As taxas de variação do nível do mar, respectivos intervalos e sua variação no tempo 114 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral 7300 Cascais 7200 7100 7000 6900 6800 6700 Fonte: Permanent Service for Mean Sea Level (PSMSL) 6600 1882 1902 1922 1942 1962 Figura 83: A curva do marégrafo de Cascais 115 1982 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Aula 6: Costas rochosas Introdução: definição de costas rochosas Ao contrário da vasta bibliografia existente para os litorais arenosos, a bibliografia para os litorais rochosos é relativamente escassa e baseia-se muito nos textos de Sunamura e também nos de Trenhaile. Isto acontece, a nosso ver, porque, num meio tão dinâmico como é a interface entre o mar e o continente, uma evolução rápida e espectacular parece ser mais atractiva do que uma evolução relativamente lenta, e onde os métodos de investigação têm que ser obrigatoriamente adequados a essa relativa lentidão de processos. Antes do mais é importante definir o que se entende por costa rochosa e apresentar alguns dos respectivos elementos morfológicos (fig. 84). Segundo Sunamura (1992), costa rochosa é uma costa em arriba, composta por material consolidado, independentemente da sua resistência. No mesmo texto, Sunamura propõe-se estudar costas compostas por materiais que vão desde o granito ou basalto até materiais pouco coerentes como os depósitos glaciares. Factores a considerar na evolução das costas rochosas Os factores a considerar na evolução das costas rochosas são, basicamente, a energia das ondas e o tipo de rocha. Porém, a energia da ondulação depende da quantidade de sedimentos que se sobrepõem ao substrato rochoso. Essa quantidade depende do balanço sedimentar de cada troço costeiro que depende, por sua vez (fig. 85): • do fornecimento de sedimentos de e para a plataforma continental; • da deriva litoral; • dos sedimentos trazidos pelos rios; • dos materiais resultantes da erosão das arribas. Os sedimentos existentes sobre o substrato rochoso, por um lado contribuem para o seu desgaste, funcionando como abrasivos, mas, por outro, podem protegê-lo da acção das ondas. Porém quando a cobertura sedimentar é suficientemente espessa para impedir que a acção das ondas actue sobre o bedrock, estamos já na presença de uma praia. Tipos de ondas na base das arribas e sua dinâmica Há 3 tipos de ondas que podem ocorrer na base de uma arriba quando a onda incide paralelamente à linha de costa (fig. 86): ondas estacionárias, ondas a quebrar e ondas já quebradas. A respectiva ocorrência depende da relação entre a profundidade na base da arriba e a profundidade a que as ondas quebram. Se a profundidade na base da arriba for superior à profundidade a que um tipo específico de onda pode quebrar6, formam-se ondas estacionárias. Se a profundidade for idêntica a esse valor, a onda rebenta sobre a arriba. Se a profundidade for 6 O que acontece quando o declive da onda, que corresponde à altura/comprimento de onda, é superior a 1/7 (Thurman, 1997). 116 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral inferior, a onda rebenta mais para o largo e já chega rebentada à base da arriba (fig. 86). Uma vez que o declive da onda é muito condicionado pelo atrito com o fundo, a ocorrência de cada uma destas hipóteses depende basicamente do declive deste e das características da ondulação. Isto significa que, num sector costeiro determinado, quando as ondas são de pequena altura podem originar ondas estacionárias. A variação da pressão que estas exercem com o tempo é relativamente pequena (fig. 87, a), mas pode ir-se acentuando à medida que a onda se torna mais alta, tornando-se cada vez mais dissimétrica até que o rebentar da onda origina um grande pico de pressão, praticamente instantâneo (fig. 87, b). Se tiverem mais do que essa altura crítica, as ondas chegam à base da arriba já quebradas e, embora a sua passagem corresponda a um aumento grande de pressão estamos muito longe do pico que acontece no caso anterior (fig. 87, c). O problema da pressão dinâmica sobre as arribas produzida pelo quebrar das ondas é analisado na figura 88: verifica-se que não há acordo entre os diferentes investigadores e que, provavelmente, o máximo de pressão deverá situar-se ao nível da água parada (still water level, swl), ou um pouco acima desse nível. A resistência das rochas: alguns apontamentos sobre a meteorização em ambiente litoral Para além da resistência mecânica dos minerais componentes e da susceptibilidade à alteração química (dependentes, essencialmente da composição das rochas), a existência de fracturas e descontinuidades de diversos tipos tem um papel primordial na definição da capacidade que uma determinada rocha tem de resistir às pressões mecânicas do tipo daquelas a que estão sujeitas as rochas batidas pelas ondas. Um outro factor é a “fadiga” que as rochas adquirem justamente devido a compressões cíclicas do tipo das que ocorrem com o quebrar das ondas. Essa fadiga induz uma microfracturação que diminui a resistência da rocha, cujas depressões e reentrâncias poderão vir a ser alargadas e depois exploradas por acção das ondas, de molde a facultar o arranque de pedaços de rocha. Como pode ver-se na figura 89, o aumento do número de ciclos de pressão diminui a resistência à fadiga das rochas. O mesmo acontece com a saturação da rocha: a existência de água diminui fortemente o limite de fadiga das rochas. Na figura 90 pode ver-se que o aumento de profundidade produz uma significativa diminuição da porosidade numa rocha granítica e um correlativo aumento da resistência. A porosidade da rocha próximo da superfície deve-se, essencialmente, à meteorização química a que as rochas ricas em feldspato estão especialmente sujeitas. A água do mar próxima da superfície está geralmente saturada de carbonatos. Porém, durante a noite, alguns organismos produzem CO2 e, por isso, a água torna-se, de novo, capaz de dissolver o carbonato de cálcio. A crioclastia, a haloclastia e a hidroclastia podem ser particularmente activas em meio litoral. Por outro lado, os fenómenos de descompressão são responsáveis pela abertura de fracturas paralelas à superfície topográfica, que são muito importantes em rochas graníticas. Também os seres vivos são responsáveis por fenómenos de bio-corrosão e têm um papel muito activo no alargamento das fracturas nas faixas litorais. 117 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Processos de erosão nas arribas Quando as ondas escavam a base da arriba esta torna-se instável devido ao aumento de declive e à instabilidade provocada pelo sub-escavamento (fig. 91). Essa instabilidade induz movimentos de massa de diversos tipos (queda de blocos, deslizamentos e fluxos de detritos). A forma e a intensidade desses movimentos depende muito do tipo de rocha e da respectiva estrutura, bem como do clima que pode facilitar ou não certos tipos de meteorização (química nos climas tropicais, mecânica nos climas frios e áridos). Os movimentos de massa espalham detritos na base da arriba, o que significa que a erosão não pode continuar enquanto eles não tiverem sido transformados em materiais transportáveis pelas ondas e correntes litorais. Quando as ondas batem na face da arriba, há uma força compressiva que actua perpendicularmente à arriba. Se a arriba tem fracturas, o ar situado nos interstícios é violentamente comprimido. Quando a onda recua, dá-se um processo de descompressão. Desta forma os interstícios da rocha são alargados e a rocha vai-se fragmentando por um processo de arranque (“quarrying”, Sunamura, 1992). A descompressão que ocorre no refluxo da onda ajuda ainda a transportar os materiais desagregados. As ondas, armadas com os detritos arrancados à arriba vêem a sua força aumentada. Deste modo, os choques destes materiais com as rochas vão contribuir para o arranque de partículas de diversos tamanhos. Este processo acaba por produzir um polimento característico na superfície das rochas. A força de ataque da onda ocorre quase instantaneamente , mas, ao contrário de forças actuantes noutros ambientes, sofre mudanças cíclicas de acordo com a amplitude das marés. É difícil quantificar os resultados da acção das ondas sobre rochas com descontinuidades (devidas à estratificação, xistosidade ou tectónica) e ainda menos determinar de forma quantitativa a importância do tipo e grau de meteorização das rochas na definição da velocidade de recuo das arribas. É de esperar, todavia, que um ataque cíclico, como aquele a que são submetidas as rochas no ambiente costeiro, intensifique a fadiga das rochas e diminua a sua resistência. O uso de modelos de laboratório esbarra com algumas dificuldades. Não é fácil criar um produto que, em ambiente de laboratório, tenha um comportamento semelhante ao das rochas num ambiente natural. Todavia, o uso de areia cimentada tem dado bons resultados. Mais difícil ainda é modelizar as descontinuidades existentes nas rochas. Na figura 92 é possível ver o resultado duma modelização feita com ondas já quebradas: quando se atinge um certo limiar (20 horas de experiência), as areias resultantes da desagregação do cimento na área do entalhe produzido pelas ondas (no nível da água parada: still water level) aumentam a velocidade de escavamento. Porém, a partir das 30 horas essa velocidade estabilizase porque a referida acumulação de areias dissipa a energia das ondas (fig. 93). Com efeito, em arribas compostas por sedimentos terciários na Califórnia verificou-se que o recuo das arribas se tornou mais lento à medida que a praia se ia alargando. Com 20m de largura de praia, o recuo das arribas era já muito lento e cessava completamente quando a praia atingia 60 m de largura (Sunamura, 1992). 118 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Mesmo em plataformas de erosão marinha cobertas normalmente por praias, se uma tempestade arrastar as areias, as ondas podem atingir a arriba que se torna temporariamente activa e pode sofrer um recuo apreciável, desde que seja constituída por rocha pouco resistente. De um modo geral, é nas grandes tempestades, quando as ondas têm uma maior energia e o nível do mar está sobrelevado devido a storm surges, que se verificam maiores recuos das arribas. Ora, justamente nessa altura, é difícil fazer observações directas. Por isso, muitas vezes, a velocidade de recuo das arribas estuda-se através de fotografias aéreas ou até, com base em grafitti datados. Os movimentos de nas arribas podem ser de diversos tipos, como pode ver-se na figura 94. Podem ir desde a simples queda de blocos (94-a), ao seu basculamento com queda posterior (94b). Os deslizamentos (94-c) podem ser de tipo planar ou rotacional. Em rochas apropriadas podemos encontrar fluxos de detritos (94-d). Erosão submarina do bedrock A erosão nas costas rochosas não se processa só na base das arribas, mas também ao longo do fundo marinho que se desenvolve a partir da base da arriba. Neste domínio a informação existente é muito menos abundante do que a que respeita à erosão na base das arribas. Esse facto fica a dever-se à dificuldade de avaliação devida à lentidão do processo e ao facto destas plataformas estarem total ou parcialmente submersas. A força de ataque das ondas aumenta quando existem sedimentos mobilizáveis em contacto com a plataforma. Quando a cobertura se torna demasiado espessa essa força deixa, como é óbvio, de exercer-se. A resistência da rocha é um factor da maior importância, que depende tanto da respectiva composição como das descontinuidades que a afectam. A erosão vertical das plataformas é muito mais lenta que o processo de escavamento dos entalhes7 da base das arribas. A respectiva relação varia entre 2-5% (Sunamura, 1992). Além disso, o escavamento das plataformas, fazendo aumentar a sua profundidade acaba por reduzir a intensidade das forças que actuam sobre os fundos. Trata-se, por isso, de um processo que se auto-limita e que se torna mais lento com o tempo, desde que o nível do mar não sofra oscilações. É pertinente, por isso, definir qual o nível de base da rebentação (=surf base, Sunamura 1992) que corresponde à profundidade a que as ondas quebram em situação de tempestade. Essa profundidade anda à volta de 10m em costas abertas. Plataformas de erosão marinha Os nomes atribuídos a estas plataformas são muito variados, sobretudo em língua inglesa (Sunamura, 1992, p. 139). Todavia, uma das designações que é mais utilizada é a de plataforma de abrasão marinha que dá conta de um dos processos actuantes na sua elaboração. Porém, dado que o afeiçoamento destas plataformas não se deve só a este processo, parece-nos melhor a designação de “plataforma de erosão marinha” (Tricart, 1977). 7 Temos vindo a utilizar a expressão “entalhe basal” que preferimos à palavra “sapa” (Moreira, 1984) como tradução para encoche e notch. 119 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral A cota destas plataformas pode ser muito interessante para a identificação de movimentos tectónicos… mas antes de nos lançarmos nessa via é necessário compreender o mecanismos da sua formação. Na figura 95 podemos ver os resultados de experiências com modelos reduzidos levadas a cabo por Sunamura, das quais se podem extrair algumas conclusões: • A cota das plataformas talhadas em rochas resistentes é superior à das plataformas talhadas em rocha branda. • As plataformas criadas por ondas quebradas evoluem mais lentamente do que as criadas por ondas a quebrar. As ondas a quebrar são capazes de rebaixar mais facilmente a superfície em que actuam e produzem, por isso, plataformas mais baixas. Como é evidente, se a profundidade existente for inferior à profundidade a que as ondas de tempestade quebram, dentro das referidas ondas, só as já quebradas poderão embater na arriba. • Dado o ponto anterior, torna-se evidente que a amplitude das marés vai, também, interferir no resultado final. Na figura 96 é possível observar os três tipos fundamentais de morfologia nas costas rochosas: plataforma descendo para o mar, plataforma horizontal e arriba mergulhante. Dado que é usada correntemente, utilizaremos também a designação de plataformas do tipo A para as plataformas com declive em direcção ao mar e do tipo B para aquelas que são aproximadamente horizontais (Sunamura, 1992). Dentro de cada um destes grandes tipos pode haver muitas variedades (Sunamura, 1992) dependentes de: • tipo de rocha e respectiva estrutura, • condições de meteorização o e clima, • marés, • exposição à ondulação, • herança de pequenas variações do nível do mar. As arribas mergulhantes podem corresponder a antigas arribas submersas por movimentos tectónicos ou por subida do nível do mar. Também pode tratar-se de escarpas de falha ou corresponderem a uma actividade vulcânica recente. As margens dos fiordes também funcionam como arribas mergulhantes. De um modo geral estas arribas mergulhantes recuam muito pouco, porque os fundos marinhos, nas suas proximidades, se situam abaixo do nível de base da rebentação (fig. 99). Com efeito, as ondas só afectam o fundo se este estiver acima deste nível e se puderem arrancar alguns sedimentos do mesmo fundo. Doutra forma, a reflexão das ondas provocada pelas arribas mergulhantes pode produzir ondas estacionárias com pouco efeito erosivo (fig. 86). Parece haver também a tendência para estas arribas mergulhantes ocorrerem em rochas bastante resistentes. A principal diferença entre as plataformas de tipo A e B é a existência de um degrau abrupto separando a área aplanada das zonas mais profundas (fig. 96). Quanto à cota de início das plataformas de tipo A, Sunamura parece inclinar-se para a ocorrência a uma cota próxima do nível médio das marés altas, mas insiste na existência uma certa variabilidade espacial. 120 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral C. Andrade (2002), num estudo sobre as plataformas de erosão marinha na costa portuguesa apresenta perfis (fig. 97) com 2 sectores: um sector de declive mais baixo situado abaixo do nível médio do mar (1). Acima do nível médio desenvolve-se uma rampa (2), com um declive mais elevado que termina no nível das marés mais altas. Este modelo parece-nos adequado ao que temos observado na linha de costa entre Vila do Conde e Espinho (fig. 98), onde as plataformas encontradas parecem corresponder ao tipo A. Segundo Sunamura (1992) a existência de um degrau nas plataformas de tipo B significa, basicamente, que a força das ondas não é suficiente para vencer a resistência da rocha, embora se deva dizer que as opiniões dos investigadores variam bastante quanto às causas de ocorrência de um ou outro tipo de plataformas e que as plataformas do tipo B parecem ser particularmente enigmáticas. Segundo Sunamura, estas plataformas acontecem porque, durante a transgressão flandriana, o degrau que limita as plataformas sofreu uma submersão rápida que o transformou numa arriba mergulhante. Porém, a complexidade da evolução do nível do mar durante o Holocénico e a possível interferência com movimentos tectónicos e com ajustamentos isostáticos introduz muitas incertezas nesta explicação. Nas áreas relativamente estáveis, as plataformas formadas pelo estacionamento do mar no máximo holocénico foram sofrendo algumas modificações devido às acções posteriores que sofreram. As medidas por MEM (micro elevation meter, fig. 100) dão valores aparentemente baixos, mas ainda assim, significativos (0,2-0,7mm/ano em grauvaques, na costa SE da Austrália). Dado que estes processos podem ter funcionado durante cerca de 6000 anos, podemos ter como valor mínimo 1,2 metros e como máximo 4,2, o que está longe de ser negligenciável! Algumas formas de erosão características Embora sejam formas muito interessantes e às vezes espectaculares, os entalhes basais em rocha não calcária têm sido pouco estudados. A figura 95 representa entalhes associados a plataformas do tipo A [a), b), c) e a arribas mergulhantes, d)]. O papel da abrasão é óbvio até pelo facto de as rochas aparecerem polidas (fig. 101). A figura 99 mostra claramente que a cota a que eles são mais profundos varia mesmo em condições experimentais, aparecendo quer ligeiramente acima do nível da água parada, quer ligeiramente abaixo. A existência de marés introduz novas complicações na definição da altura a que os entalhes se desenvolvem. Há um certo predomínio de entalhes ao nível médio, mas podem aparecer até cerca de 1m acima e até, nas áreas abrigadas, o máximo escavamento acontece perto do nível das marés baixas. Na área que estudámos, os entalhes aparecem frequentemente ligados à existência de fracturas que são aproveitadas pela erosão marinha. Muitas vezes essas fracturas são oblíquas em relação à linha de costa e forma-se uma espécie de corredor de erosão, ao longo do qual se desenvolve um entalhe contínuo cuja cota vai subindo desde o limite exterior, do lado do mar, até ao limite interior, acompanhando a cota da plataforma de erosão marinha que se desenvolve na sua base (figs. 103 e 104) Sempre que a rocha é passível de dissolução, o desenvolvimento dos entalhes torna-se mais evidente e encontram-se, em ambientes tropicais, formas espectaculares (fig. 105). Nessas 121 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral condições também se podem encontrar interessantes formas de pormenor (vasques, tafoni), diversificadas consoante o tipo de rocha em presença. As grutas correspondem a aberturas nas arribas em que em que a profundidade é maior que a abertura. Aparecem em rochas relativamente resistentes explorando as descontinuidades nelas existentes (fig. 106). Devido à existência da própria cavidade, os fenómenos de compressão e descompressão actuam nas grutas de forma particularmente forte, o que contribui para a sua evolução e manutenção. Quando as ondas, atacando ambos os lados de um promontório, conseguem perfurá-lo, pode formar-se um arco (fig. 107). Os arcos são formas relativamente efémeras. Quando a parte superior colapsa o arco desaparece e passamos a ter um”sea stack” (pináculo, penhasco). Porém, nem todos os pináculos resultam da destruição de arcos: diques de rochas resistentes intruídos em materiais mais brandos podem resultar em formas deste tipo (fig. 110). A submersão de áreas previamente carsificadas pode originar formas como os arcos da Ponta da Piedade (Lagos, fig. 109). As marmitas têm uma forma cilíndrica e são escavadas por acção de materiais abrasivos de diversos tamanhos. Têm uma secção predominantemente circular . Geralmente são mais largas do que fundas. A existência de depressões prévias, por vezes ligadas à passagem ou cruzamento de diaclases (fig. 111) poderá permitir uma acumulação de materiais e o seu turbilhonar desenvolverá o efeito abrasivo típico das marmitas. As bacias de dissolução aparecem em rochas calcárias. Apresentam um fundo plano e desenvolvem-se a partir de pequenas depressões, por dissolução de calcite durante a noite, quando se dá uma diminuição do PH devida à respiração dos seres vivos que vivem nessas depressões. Depois há uma remoção dos produtos residuais por acção das águas do mar. Estas depressões estendem-se lateralmente, conservando paredes verticais e podendo originar depressões mais amplas e com um contorno irregular por coalescência de várias bacias pequenas (fig. 112). Estas bacias designam-se, por vezes, pelo termo francês (vasques). Tafoni e alveólos: caracterizam-se pela existência de depressões na superfície das rochas. Aparecem em rochas ígneas (granitos, basaltos) mas também em diversos tipos de grés. As suas dimensões podem ir de alguns cms a vários metros. Encontram-se em vários ambientes e não só no meio litoral, mas também em áreas com uma certa secura. São devidos, essencialmente, a fenómenos de desagregação mecânica (halo e hidroclastia). No caso de ocorrerem na zona costeira aparecem na zona da salsugem, acima do nível das marés mais altas (fig. 113). Bibliografia utilizada: ANDRADE, C. ET AL., (2002) – Shore platform downwearing and cliff retreat in portuguese West coast, Littoral 2002 Proceedings, Vol. 2, Porto, Eurocoast-Portugal, FEUP, p. 423432. MOREIRA, M. E. S. A., (1984) - Glossário de termos usados em Geomorfologia litoral, Centro de Estudos Geográficos, Linha de acção de Geografia das Regiões Tropicais, relat. nº 15, Lisboa, 167 p., MOREIRA, M. E. S. A, (2001) - Síntese da Evolução Geomorfológica da Ilha da Inhaca 122 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral (Moçambique), Livro de Homenagem ao Professor Doutor Gaspar Soares de Carvalho, Ed. M. E. Albergaria Moreira, A. Casal Moura, H. M. Granja, F. Noronha, Braga, p. 137158 SUNAMURA T., (1992) - Geomorphology of Rocky Coasts, John Wiley & Sons, Chichester, 302 p. TRENHAILE, A. - (1997) - Coastal Dynamics and Landforms, Clarendon Press, Oxford, 366 P. TRICART, J., ( 1977) - Géomorphologie dynamique générale, Précis de Géomorphologie, T. II, Paris, SEDES, 345 p., Web site: http://www.trekdiary.com/99mad5.html Prática: Depois de enunciados os principais processos geomorfológicos que actuam nas costas rochosos, a aula prática será construída a partir da identificação dos referidos processos em actuação em diversas situações quanto à litologia e ao clima. Esse trabalho será feito a partir de fotografias selecionadas, algumas das quais estão incluídas neste texto. Figura 84: Paisagens e terminologia nos litorais rochosos 123 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 85: O balanço sedimentar num determinado sector costeiro Figura 86: Tipos de rebentação na base das arribas 124 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 87: Distribuição das pressões actuando na base das arribas com ondas estacionárias, a quebrar ou já quebradas Figura 88: Distribuição vertical da energia produzida pelo quebrar das ondas 125 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 89: Relação entre a fadiga dos materiais, o número de ciclos de pressão e a existência ou não de água Figura 90: O papel da profundidade e da decorrente diminuição da porosidade na 126 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral resistência de uma rocha granítica Figura 91: o sistema de recuo das arribas: a erosão basal é essencial para um recuo contínuo da arriba. Figura 92: Velocidade de recuo de uma arriba artificial e formação de uma praia na sua frente. O entalhe desenvolve-se obliquamente, originando uma rampa. 127 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 93: Velocidade de escavamento de uma arriba composta de areia aglutinada por um cimento. 128 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 94: Movimentos de massa nas arribas 129 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 95: Formas de entalhes basais em rocha não calcária 130 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 96: Os três tipos fundamentais de morfologia nas costas rochosas: plataforma descendo para o mar, plataforma horizontal e arriba mergulhante 131 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 97: Perfis de algumas plataformas de erosão marinha situadas na costa portuguesa 132 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 98: Antiga plataforma de erosão marinha; é de notar a existência de um sector inferior, com baixo declive (1) e uma rampa (2) que, neste caso tem um declive de cerca de 13° (Praia de Vila Chã, Vila do Conde). Nesse momento o nível do mar estava praticamente no nível médio. A seta corresponderia ao nível médio do mar contemporâneo da plataforma. Este situar-se-ia claramente acima do nível actual Figura 99: Tipos e desenvolvimento de entalhes basais em ambiente de laboratório 133 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 100: Costa da Galiza: colocação de instrumentos de medida da degradação da superfície em plataformas de erosão marinha (Micro Elevation Meter, MEM), feita sob a supervisão de A. Trenhaile. 134 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 101: Entalhe basal em gneisses muito resistentes. Rochedo do Srª da Pedra, Miramar, V. Nova de Gaia 135 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 102: Entalhe basal e rochas pedunculadas na praia de Salgueiros, V. Nova de Gaia Figura 103: Entalhe basal desenvolvendo-se em rampa a partir do nível da maré baixa. Praia de Vila Chã, Vila do Conde 136 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 104: Entalhe basal desenvolvendo-se em rampa e plataforma de erosão marinha adjacente (parcialmente coberta de areias). A sul da Praia de S. Paio, Labruge, Vila do Conde 137 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 105: Formas litorais (plataformas do tipo B) em diversos tipo de rocha, nas regiões tropicais 138 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 106: O aproveitamento das superfícies de descontinuidade no desenvolvimento de uma pequena gruta no granito calco-alcalino de Lavadores. Esta reentrância desenvolve-se acima do nível das marés mais altas, numa área muito exposta e deverá corresponder a uma herança de um nível relativo do mar ligeiramente mais alto 139 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 107: Arcos de erosão: Praia de As Catedrais, Litoral Norte da Galiza, entre Foz e Ribadeo (Concelho de Barreiros, Província de Lugo). 140 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 108: Fotografia aérea da praia das Catedrais, com indicação de algumas das direcções estruturais mais relevantes Figura 109: Aspecto do carso exumado da Ponta da Piedade (Lagos, Algarve). Frente ao arco podem ver-se 2 pináculos (sea stacks) 141 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 110: Pináculo resultante de um dique intruído nas rochas basálticas (Madeira. Extraído do site http://www.trekdiary.com/99mad5.html 142 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 111: Conjunto de marmitas orientadas pela acção de fracturas: Praia de Lavadores (V. Nova de Gaia) 143 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 112: Bacia de dissolução no beach rock da Praia do Xai-Xai (Moçambique) Figura 113: Alvéolos nos gneisses biotíticos muito resistentes do rochedo do Sr. da Pedra (Praia de Miramar, V. Nova de Gaia). Altitude: cerca de 9m acima do nível médio das águas do mar. 144 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Aula 7: Litorais móveis: praias e dunas litorais Introdução: costas rochosas versus litorais móveis Ao contrário do que o senso comum poderia levar a pensar, o mar é um consumidor e não um criador de areias. É fácil compreender isso, já que o mar, mesmo se actua com muita energia, fálo numa estreita faixa. Os rios, pelo contrário actuam sobre quase toda a superfície terrestre, e levam os produtos da meteorização das imensas superfícies continentais e da erosão que efectuam até ao mar, onde são depois mobilizados e distribuídos pelos litorais. Uma análise mais aprofundada sobre a origem dos sedimentos litorais é visível na figura 114. Na aula anterior quando falávamos das plataformas de erosão marinha dissemos que, se a cobertura sedimentar for suficientemente espessa para impedir que as ondas ataquem a plataforma de erosão, já teremos uma praia e não uma costa rochosa. Com efeito, o recuo de uma arriba fará com que, a pouco e pouco, as ondas deixem de atacar a parte interior da plataforma de erosão marinha. Nesse caso, desde que haja sedimentos disponíveis, esta será coberta de materiais, de tal forma que praticamente deixa de funcionar e a arriba será transformada em arriba estabilizada. A continuação do processo, com manutenção ou ligeira descida do nível do mar transformará a arriba numa arriba morta (fig. 115). Por outro lado, a erosão das areias das praias, muitas vezes faz aparecer as plataformas que lhes servem de suporte. Uma boa parte das praias do norte de Portugal, entre Caminha e Espinho, está ou pode vir a sofrer esse fenómeno. Uma breve análise das cartas geológicas de escala 1:50.000 permitiu-nos avaliar a extensão das áreas onde, segundo a referida cartografia, o bed-rock entra em contacto directo com o mar. Verifica-se que corresponde a 23% do perímetro total estudado (figura nº 116). Os sectores arenosos correspondem a mais de metade da área em apreço. Foi necessário introduzir uma categoria que abrangesse as áreas onde areias de praia e afloramentos do bed-rock coexistem. Este aflora pontualmente, constituindo arribas baixas (praias de Lavadores, da Foz do Douro, de Labruge), ou "rochedos" que emergem das areias da praia e se elevam acima do nível médio das águas do mar. Essas áreas têm uma representatividade (25% do total) semelhante à do litoral rochoso. Existe uma relação genética evidente entre esses três tipos de litoral. Como as praias arenosas estão assentes sobre afloramentos rochosos, a erosão das areias pode fazer aflorar as formações graníticas ou metamórficas do Maciço Hespérico. Desse modo, o troço em questão passa a entrar na categoria de "praia com rochedos". Este processo pode ser ocasional ou estacional, sucedendo durante as tempestades de inverno. Noutros locais, quando os afloramentos rochosos se desenvolvem a cota mais elevada, constituem pontões rochosos circundados por pequenas arribas mergulhantes. Estes troços rochosos, geralmente pouco elevados (as arribas não ultrapassam os 20 metros) e de pequena dimensão, raramente são contínuos. Geralmente, nas suas reentrâncias, instalam-se praias arenosas mais ou menos extensas (praias de bolso). 145 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Neste capítulo estudaremos os litorais móveis. Isto significa que, além das praias arenosas trataremos também, na medida do possível, as praias constituídas por elementos grosseiros (calhaus, blocos). Uma vez que as praias e as dunas constituem um sistema em que há uma constante troca de sedimentos faz sentido estudá-las no mesmo capítulo. Perfil de praia. Terminologia básica Trata-se de um tema algo difícil. Com efeito, a existência de terminologia em inglês e em francês, bem como variações importantes dentro destas duas línguas, faz com que exista uma certa confusão que não convém que seja transmitida aos estudantes. Um dos esquemas mais simples é o que reproduzimos na fig. 117, da autoria de R. Paskoff. O modelo de Guilcher (fig. 118) é um pouco mais complexo, juntando ao esquema de base alguns elementos adicionais que podem ajudar os estudantes a situar algumas das estruturas típicas de cada um dos sectores. O esquema de Moreira (1984, fig. 119) tem a vantagem de nos apresentar designações em português com os equivalentes em francês e inglês que são sempre úteis, dado que muita da bibliografia disponível se encontra em inglês. As praias têm nomes específicos em certos tipos de ocorrência. Serão, por isso, definidas as noções de praia de bolso, tombolo (fig. 121), flecha litoral ou restinga, praia em ponta e ilha barreira (fig. 120). Rebentação e construção dos cordões litorais Quando as vagas quebram, a onda que estava num processo de translação, uma vez que as baixas profundidades atrasavam a sua progressão pela base, vai formar o jacto de rebentação que sobe pela face da praia. Nessa subida ele vai arrastar sedimentos que deposita quando a sua força se esgota. Segue-se o refluxo, em que a água transportada pela onda desce pala face da praia. Como é evidente, a capacidade de transporte do refluxo depende da quantidade de água que desce a face da praia. Por isso, a porosidade dos materiais da praia é muito importante. Se a porosidade for baixa, uma boa parte dos materiais transportados pelo jacto de rebentação vai ser arrastada até à linha de inflexão, de onde podem ser mobilizados na próxima onda. Mas se a praia for constituída por materiais grosseiros, a maior parte da água infiltra-se e o refluxo tem muito pouca capacidade. As acções construtivas predominam e o declive da praia torna-se maior. É isso mesmo que se pode verificar na figura 123. Do mesmo modo, o jogo entre o jacto de rebentação e a ressaca ajuda a explicar a formação das cúspides de praia (fig. 124) Estas são formas rítmicas que podemos encontrar em muitas praias, onde também é possível identificar bermas devidas à existência de marés vivas e de ondas de tempestade, que constróem cordões litorais a cotas mais elevadas (fig. 125). Regra de Brunn. Perfil de verão e de inverno. Na figura 126 é possível analisar as consequências de uma variação do nível do mar no perfil de uma praia. Segundo a regra de Brunn, a profundidade a que cobertura de sedimentos se situa mantém-se constante. Logo, uma subida do nível do mar vai implicar uma sedimentação sobre o fundo até se atingir a mesma profundidade. Ao mesmo tempo, existe uma migração da linha de 146 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral costa para o interior. Uma subida do nível do mar implica por isso uma erosão na face da praia e acumulação destes sedimentos na área imersa. Este fenómeno pode funcionar a diferentes escalas temporais. Assim, durante o inverno, devido à existência de ondas de tempestade e a possível sobre-elevação de origem meteorológica (storm surge) tudo se passa como se houvesse uma subida do nível do mar. O perfil torna-se mais tenso junto à antepraia (no sentido que lhe é atribuído por S. Carvalho, ver fig. 119), podendo escavarse uma arriba nas dunas. A praia emersa vê o seu perfil rebaixado por erosão e os sedimentos resultantes desse processo são depositados nas áreas imersas (fig. 127). A regra de Brunn permite, de uma forma empírica, ter uma ideia do recuo da linha de costa correspondente a uma determinada subida do nível do mar. Esse recuo na horizontal está estimado num valor maior em cerca de 100 vezes do que a subida do nível do mar. Significa isso que a subida calculada para as diversas estações maregráficas com séries longas (aula 5, cerca de 1,9mm/ano) acabaria por produzir, só por si, um recuo anual da linha de costa de 1,9cm. São justamente estas subidas e descidas temporárias que produzem situações de embutimento de perfis de praia mais baixos em perfis mais altos que originam as bermas (fig. 128). A distribuição dos calhaus nos depósitos de praia: imbricação e estruturas sedimentares. Já na figura 118 era possível comparar a forma de imbricação dos calhaus típica dos depósitos marinhos com o tipo de imbricação existente em formações fluviais. Na figura 129 é possível ver que, nas praias de calhau, o tipo de imbricação pode variar consoante a posição dentro da praia. Pensamos ser interessante referir as estruturas sedimentares típicas de ambientes de praia (estratificação entrecruzada de tipo planar, fig. 130), bem como as marcas de corrente (assimétricas, fig. 131) e de ondulação (simétricas), bem como o papel que as estruturas sedimentares podem ter na identificação de depósitos fósseis. Através da figura 132 é possível compreender a razão pela qual quando se inicia um processo de erosão numa praia, os grãos de minerais pesados têm tendência a ser deixados, enquanto que os grãos de quartzo são arrastados. Desse facto resulta um enriquecimento muito visível das praias em erosão nos ditos minerais pesados (fig. 133). A deriva litoral: corrente em zig-zag Como já vimos na aula 3, quando as ondas se aproximam obliquamente da linha de costa elas começam por sofrer um fenómeno de refracção. Mesmo assim, quando a onda rebenta, o jacto de rebentação tem um traçado oblíquo em relação à linha de costa. Já o refluxo vai fazer-se segundo a força da gravidade, isto e: perpendicularmente à linha de costa e segundo a linha de maior declive. Deste modo, também os sedimentos arrastados pelas ondas sofrem uma movimentação em zig-zag. De tudo isto resulta um processo de deriva ao longo do litoral (deriva litoral), cuja orientação pode variar no tempo, consoante a direcção dos ventos dominantes e da ondulação deles resultante. Este processo define, no essencial, o sentido do transporte das areias ao longo da linha de costa e vai ser fundamental na construção de formas litorais dependentes dessa deriva (flechas litorais ou restingas, fig. 120). 147 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Dunas litorais A movimentação das areias pelo vento, necessária à criação de dunas, depende de diversos factores: • disponibilidade em areias finas e secas, • ausência de vegetação, • ventos eficazes (só os ventos que têm uma velocidade superior a 16km/h conseguem mobilizar as areias). Como estas condições são frequentes nas regiões litorais, os litorais são locais favoráveis à constituição de dunas. Entre as praias e as dunas que se situam na sua retaguarda estabelece-se uma relação de complementaridade (fig. 135). Com efeito, durante o verão (fig. 127), a deflação pode exercer-se numa área relativamente extensa de areia seca. Durante o inverno, todavia, uma parte das areias já acumulada sob a forma de dunas pode ser arrastada para o mar indo constituir uma reserva de areias que poderá ser lançada, de novo, na costa, na situação de bom tempo. A travagem do vento quando surgem as primeiras irregularidades no terreno (fig. 136) é a principal causa que vai levar a um depósito de areias. Este pode fazer-se a favor de tufos de vegetação halófita que vão colonizando a antepraia. Para isso é necessário que esta fique fora da acção das ondas durante algum tempo, o que implica, pelo menos, uma situação de equilíbrio na praia. Uma descida do nível do mar, ou processos de acumulação muito intensos, originando uma progradação do litoral e o abandono de antigos cordões litorais podem favorecer, como é evidente, a acumulação de campos dunares mais ou menos extensos As dunas embrionárias originadas pela acumulação de areias nos tufos de vegetação da antepraia são designada por nebkas. A coalescência de diversas nebkas origina uma duna frontal, grosseiramente paralela à linha de costa e com um perfil mais ou menos simétrico. A circulação do ar a sotavento da duna frontal cria turbilhões que acabam por originar a formação de depressões interdúnicas (fig. 137). Em situações em a vegetação é escassa ou inexistente ou em que o fornecimento de areias é muito abundante, podem formar-se dunas livres, ou barkhans. Estas dunas, em forma de crescente com a convexidade face ao vento, apresentam um perfil dissimétrico em que a face exposta ao vento tem um declive entre 5° e 10° e a face a sotavento tem um declive elevado, da ordem dos 30-33° (Paskoff, 1985, fig. 138). Desenvolvimento sequencial de dunas litorais Muitas vezes, atrás da duna frontal existem outras cristas dunares, formadas em períodos anteriores. A figura 139 mostra como pode fazer-se o desenvolvimento sequencial de um sistema de dunas. Num litoral em que haja uma certa progradação podem existir várias cristas dunares mais ou menos paralelas, correspondendo a sucessivas dunas frontais progressivamente mais antigas à medida que nos afastamos do mar. À medida que uma crista de dunas perde a sua ligação à praia, ela deixa de receber areias e cria148 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral se uma tendência à erosão. Esta pode ser materializada pelos “blow outs”, depressões de forma semi-circular existentes na face da duna (fig. 139). Estes blow outs têm tendência a acentuar-se e a migrar para o interior. Como se vê na crista dunar mais antiga (fig. 139), essa migração acaba por deixar na sua frente braços afilados que têm uma direcção aproximadamente paralela à dos ventos dominantes e que se podem designar como dunas longitudinais. Na sua retaguarda encontram-se dunas de forma parabólica. Estas dunas têm um desenvolvimento contrário ao das dunas do tipo barkhan. Com efeito, embora a forma seja também em crescente, no caso das dunas parabólicas a concavidade situa-se do lado onde sopra o vento, ao contrário do que se passava com as barkhans. A análise desta figura parece-nos particularmente interessante porque nos parece haver muitas analogias entre o processo que ela descreve e a situação que se encontra na costa portuguesa, entre Espinho e Aveiro (fig. 140). Dunas actuais e dunas fósseis Muitas vezes coexistem, no mesmo espaço, diversos sistemas de dunas. Elas reconhecem-se quer através da orientação das suas cristas, que podem representar ventos dominantes contrastantes com os actuais, quer, sobretudo, através do tipo de pedogénese que sofreram. Assim, na figura 140 foi possível identificar um conjunto de dunas antigas, que aparecem na parte mais a leste do mapa e que apresentam um horizonte ferro-húmico bastante consolidado. Este horizonte, designado geralmente por surraipa, aparece, também cortado em arriba, nas praias de Cortegaça e de Maceda, sob as areias de dunas mais recentes. O corte de Cortegaça é particularmente interessante (fig. 141). A sobreposição de diversos conjuntos dunares ocorre noutros locais (fig. 142). Embora as propostas existentes para as idades das dunas das Landes e das dunas da região de Cortegaça sejam diversas, o conjunto tem analogias notórias, nomeadamente pelo facto de existir um sistema de dunas antigas com uma crosta aliótica em ambos os casos. Essas analogias não passaram despercebidas a R. Paskoff que escreveu um artigo justamente sobre as semelhanças entre as dunas das Landes e as dunas da região da Gândara (que, por sua vez, têm analogias evidentes (Araújo, 1991) com as dunas de Cortegaça. Se as dunas consolidadas do Norte do país se apresentam geralmente com um fácies semelhante ao descrito para as dunas de Cortegaça, na região de Lisboa (Magoito, Oitavos), a sua consolidação fica a dever-se ao carbonato de cálcio. O mesmo acontece na região de Porto Côvo e Vila Nova de Milfontes, onde o grés calcário que constitui a duna consolidada sofreu um processo de carsificação, mantendo, no conjunto a forma típica de uma duna (fig. 143). Aula Prática: Apesar do carácter relativamente elementar que a disciplina tem que ter, para se adaptar ao tempo disponível, parece-nos que é fundamental fazer o tratamento granulométrico e morfoscópico de areias de praias e de duas amostras de areias de dunas (dunas actuais e dunas fósseis da região de Cortegaça). Como se trata de análises algo demoradas, cuja técnica os alunos deverão dominar para poderem incluí-las nos seus trabalhos, poderemos utilizar mais 6 horas, (ao todo 8 horas) correspondentes às aula práticas dos próximos temas, para levar esse trabalho a 149 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral efeito. Além dos procedimentos básicos da granulometria, os alunos deverão aprender: • A identificar o grau de rolamento dos grãos de acordo com os índices e os critérios propostos por G. S. Carvalho (1966, fig. 144), • A distinguir entre a forma e o aspecto de superfície dos grãos de areia (fig. 145), • A identificar os principais tipos de aspectos de superfície dos grãos (Esquiroloso, Picotado, Picotado-Brilhante, Brilhante e Fosco, isto é: E, P, PB, B, F, ver fig. 146), • Como introduzir os dados da granulometria e da morfoscopia em folhas de cálculo já preparadas para o efeito, • Como construir curvas cumulativas e espectros morfoscópico das amostras tratadas. • Como construir gráficos comparativos dos diferentes tipos de amostras (a título de exemplo, ver fig. 146). Bibliografia utilizada: BIRD, E. C. F., (2001) – Coastal Geomorphology. An introduction, J. Wiley & Sons, 322 p. BOGGS, S. Jr., (1992) - Petrology of Sedimentary Rocks, Macmillan Publishing Company, New York, 707 p. CARTER, R.W.G. - (1989) - Coastal Environments - An Introduction to the Physical, Ecological and Cultural Systems of Coastlines, Academic Press Limited. London, 5ª Impressão, 617 p. CARVALHO, G. S., (1966) - Índices de forma dos grãos de areia e a morfoscopia das areias das praias do litoral de Angola, Garcia de Orta , Vol. 14, nº 2, Lisboa, p. 229-268. GRANJA, H. M. (1993) - As datações pelo Radiocarbono e o Pleistocénico-Holocénico da zona costeira do NO de Portugal (síntese de conhecimentos), Actas da 3ª Reunião do Quaternário Ibérico, GTPEQ, AEQUA, Coimbra, p. 383-393. GUILCHER, A. - (1954) - Morphologie littorale et sous-marine, Col. Orbis, Paris, PUF, 216 p. KOMAR , P. D., (1998) - Beach Processes and Sedimentation, Prentice Hall, New Jersey, 543 p. LE RIBAULT, L . , (1977) - L'exoscopie des quartz, Col. Techniques et Méthodes Sédimentologiques, Paris, Masson, 160 p. MOREIRA, M.E.S.A., (1984) - Glossário de Termos Usados em Geomorfologia Litoral, Estudos de Geografia das Regiões Tropicais, Nº 15) - C. E. G., Lisboa, 167 p. PASKOFF, R. - (1981) - L'érosion des côtes , Col. Que sais-je? , nº (1902, Paris, PUF, 127 p. PASKOFF, R. - (1985) - Les littoraux - impact des aménagements sur leur évolution, Col. Géographie, Paris, Masson, 185 p. PASKOFF, R., (2001-a) - Analogies entre les Dunes Littorales du Nord-Ouest du Portugal et celles du Sud-Ouest de la France, livro de Homenagem ao Professor Doutor Gaspar Soares de Carvalho, Ed. M. E. Albergaria Moreira, A. Casal Moura, H. M. Granja, F. Noronha, Braga, p. 301-306. 150 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral PETHICK, J. - (1984) - An Introduction To Coastal Geomorphology, London, Edward Arnold, 260 p. PEREIRA, A. R. (1990) - A Plataforma Litoral do Alentejo e Algarve Ocidental - Lisboa, Fac. Letras, ed. autora, 450 p. Websites http://www.pol.ac.uk/india/IND_updatefw.html http://www-geology.ucdavis.edu/~GEL109/SedStructures/SedStructures.html 151 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 114: Ganhos e perdas de areias numa praia. As praias de calhaus têm ganhos e perdas semelhantes, exceptuando no que diz respeito à acção do vento. 152 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 115: Arribas vivas, estabilizadas e mortas. Tipologia da orla costeira entre Caminha e Espinho Rochosa 23% Arenosa 52% C/rochedos 25% Figura 116: Tipologia da faixa costeira entre Caminha e Espinho. Figura 117: Perfil de praia: o esquema simples de R. Paskoff. 153 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 118: Perfil de praia. Terminologia francesa de A. Guilcher. 154 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 119: Morfologia das praias: comparação de diferentes terminologias. Figura 120: Tipos de praias consoante a respectiva configuração. 155 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 121: Tombolo formado pela ponta da Gafa na praia do Mindelo (Vila do Conde). 156 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 123: Relação entre o declive da praia e o calibre dos materiais que a formam. 157 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 124: Modo de formação dos crescentes de praia. Figura 125: Crescentes de praia na Praia do Norte (a Norte do promontório da Nazaré). 158 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 126: Ilustração do princípio de Bruun. Figura 127: Variação do perfil de uma praia entre a situação de verão e a situação de inverno. 159 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 128: Bermas de praia. Foto extraída de http://www.pol.ac.uk/india/IND_updatefw.html Figura 129: Variações de declive e tipo de sedimentação numa praia de calhaus. 160 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 130: As variações no pendor das lâminas numa praia reflectem diferenças no declive da face da praia. Figura extraída de: http://www-geology.ucdavis.edu/~GEL109/SedStructures/SedStructures.html Figura131: Marcas de corrente em depósitos litorais. Foto extraída do site http://www.pol.ac.uk/india/IND_updatefw.html 161 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 132: Processo que explica a erosão predominante nos grãos de quartzo ou feldspato relativamente aos grãos de minerais pesados. Figura 133: Enriquecimento em minerais pesados de uma praia em erosão. Praia de Francelos (Vila Nova de Gaia). 162 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 134: Corrente em zig-zag e deriva litoral Figura 135: Complementaridade no sistema praia-duna. Figura 136: O papel dos obstáculos na formação das dunas embrionárias. 163 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 137: O vento vindo do mar, ao soprar sobre a duna frontal, desenvolve turbilhões que explicam a formação de depressões interdúnicas. Figura 138: Dunas do tipo barkhan formadas por vento que sopra da terra para o mar. Julho de 2002, Narbonne Plage, costa do Languedoc, França. 164 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 139: Desenvolvimento sequencial de um sistema de dunas litorais. 165 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 140: Sistemas de dunas ao Norte da laguna de Aveiro. 166 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 141: Praia de Cortegaça: as setas separam os 3 conjuntos dunares existentes. 1: Duna mais antiga, finipleistocénica. Os níveis argilosos representam charcos ou lagoas interdúnicas. Idade do nível intermédio: 13810±380 BP. 2: Duna do início do Holocénico: consolidada por uma pedogénese do tipo podzol. Podem distinguir-se o horizonte A, acinzentado, de lexivização e o horizonte Bhs (horizonte espódico). Idade dos carvões do horizonte A: 5885±75, BP. 3: Duna sub-actual. Já sofreu alguma pedogénese. Possivelmente corresponderá à pequena idade do gelo 167 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 142: Corte esquemático e interpretação do sistema dunar das Landes. Figura 143: Duna consolidada por cimento carbonatado: a sul de Porto Côvo. 168 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 144: Definição dos graus de rolamento dos grãos de quartzo (muito angulosos, angulosos, sub-angulosos, arredondados, redondos e muito redondos). Extraído de G. S. Carvalho, 1966. 169 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 145: Relação hierárquica entre forma, grau de rolamento e aspecto de superfície dos grãos. 170 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral 100% Figura 146: Aspectos de superfície dos diferentes tipos de depósitos estudados0,6 90% 0,5 80% 70% 0,4 %F 60% %B 0,3 50% %PB %P 40% 0,2 30% %E RM 20% 0,1 10% 0% 0 Fluvial fóssil Fluvial actual Form. cob. Mar. fóssil 171 Mar. actual Eólico actual Eólico fóssil Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Aula 8: Estuários, deltas e lagunas Nesta aula abordaremos os locais onde os rios encontram o mar - estuários e deltas e também as lagunas. Todos estes ambientes têm em comum a existência de pântanos e o facto de conterem água doce ou salobra na proximidade do litoral. Estuários Trata-se do sector terminal dos rios, até onde o canal fluvial é percorrido pelas correntes de maré. Muitas vezes os estuários correspondem a sectores alargados dos cursos de água, o que faz sentido se pensarmos que grande parte dos litorais nossos contemporâneos são litorais de submersão (fig. 59), que resultaram da invasão marinha de vales fluviais que, durante as glaciações, sofreram um escavamento importante, a favor de uma descida do nível do mar estimada entre 120 e 140m (aula 5). É o caso também do Rio Douro, em que o fundo do respectivo paleovale, junto à foz, está a 50 m de profundidade (A. Carvalho, 1988). Como é óbvio, a amplitude das marés (aula 4) é determinante na caracterização dos estuários. No caso dos estuários micromareais a penetração da maré faz-se até pouca distância da costa. No caso dos estuários macromareais acontecerá o contrário. Se a acção das marés enfraquece, outras acções (ondulação, deposição de sedimentos continentais) podem tornar-se dominantes. Segundo R. Paskoff (1985) a definição de estuário implica uma ampla abertura sobre o mar. Ora, esta abertura só poderá manter-se se houver um equilíbrio entre os sedimentos transportados pelo rio e a respectiva capacidade de escoamento. Além da amplitude das marés, as variações relativas do nível do mar, o clima reinante na bacia vertente e o respectivo grau de florestação, controlando o tipo e quantidade de sedimentos, acabam por ter um papel importante na caracterização dos estuários. Pode dizer-se que estes têm sofrido, de um modo geral desde que se atingiu o máximo da transgressão flandriana, há 5-6000 anos, um processo de colmatação que é extensivo, como veremos, a muitas lagoas litorais. Dinâmica e hidrologia dos estuários As duas forças essenciais em acção nos estuários são a força da corrente fluvial e a força das marés. A importância da corrente fluvial depende, como é evidente, do seu caudal e da velocidade com que as águas vêm animadas. Em período de cheia, por exemplo, as plumas túrbidas produzidas pelos rios podem seguir-se até distâncias importantes, no seio do oceano (ver figs. 16 e 146). A corrente fluvial é contrariada pela força da maré enchente. Pelo contrário, ela vai sofrer um reforço assinalável pela corrente da vazante. Ao chegar ao estuário a força da corrente fluvial amortece-se, por diminuição do declive e pela resistência oferecida pela água do mar e acaba por anular-se. A maré enchente penetra ao longo do canal fluvial até distâncias variáveis consoante o caudal do rio e a amplitude das marés. Por vezes, a subida da maré ao longo de um estuário origina o fenómeno do macaréu (fig. 56). 172 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral À medida que a maré enchente vai avançando ao longo do rio, a sua amplitude vai-se reduzindo, até desaparecer completamente. No máximo da maré alta, o nível do mar é mais elevado que o nível da água no rio. Daí a penetração da água do mar ao longo do rio, ou enchente. Pelo contrário, no máximo de maré baixa, o nível da água é bastante mais alto no rio que no mar, porque à água do rio se juntou a água a água marinha que nele penetrou durante a enchente. Por isso, a favor desse desnível, se faz uma descarga, durante a vazante, que pode atingir velocidades elevadas. Na figura 148 pode ver-se como varia a velocidade no estuário consoante o nível da maré. Quer durante a maré baixa quer durante a maré alta não há corrente alguma e a água está praticamente parada. É nos momentos em que a maré está no seu ponto médio que se atingem as velocidades mais elevadas. Este facto tem, como é óbvio, importantes consequências em termos de sedimentação, já que a ausência de corrente durante a maré alta vai produzir a deposição de sedimentos transportados em suspensão ou resultantes da floculação das argilas com origem fluvial em contacto com as águas marinhas ricas em iões. Se, numa situação de cheia coincidirem marés altas vivas e uma sobre-elevação meteorológica do tipo storm surge (fig. 31), o rio não consegue escoar água que transporta. Esta vai-se acumulando, e fazendo subir o respectivo nível junto à foz e originando cheias importantes. Esse fenómeno pode ser particularmente intenso em rios que se mantenham encaixados até perto da foz, porque num vale estreito a cheia tem tendência a subir mais rapidamente. É justamente isso que acontece com o Douro e daí o temor, para as populações ribeirinhas do Porto e Gaia, de que os períodos de cheias coincidam com marés vivas. A cunha salina A penetração da maré num estuário faz-se através de uma maré de salinidade (Paskoff, 1985) que normalmente fica muito aquém da maré puramente dinâmica. Com a água do mar é mais densa, existe a tendência para que a água doce fique a sobrenadar a água salgada. Porém há sempre alguma mistura. Mas a intensidade dessa mistura depende das velocidades relativas e volumes das duas correntes. Designam-se por correntes residuais as correntes de mistura entre as águas do rio e do mar (J. Pethick, 1984). A forma como se organizam as correntes residuais nos estuários depende da relação entre as quantidade de água marinha e fluvial. Há 3 tipos de situações (J, Pethick, 1984): 1. Estuários de cunha salina, em que predomina a corrente de água doce, 2. Estuários com uma mistura parcial, em que predomina a corrente de maré, 3. Estuários com uma mistura total, que são estuários muito largos em que as marés predominam. Nos estuários de cunha salina uma pequena amplitude de maré coexiste com um grande caudal 173 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral fluvial. Uma vez que as águas do mar são mais densas que as águas do rio, elas insinuam-se sob as águas fluviais constituindo uma cunha salina (fig. 149). A mistura entre a água do rio e do mar é pouco intensa. Como as correntes residuais são fracas a carga de fundo do rio dificilmente é transportada até ao mar, parando junto do vértice da cunha. A pequena amplitude da maré ainda dificulta mais a mistura das águas. A corrente fluvial domina os processos deste tipo de estuário. A carga sólida que é trazida até ao vértice da cunha acumula-se aí e pode formar barras de material relativamente grosseiro. A maior parte da carga em suspensão vai ser arrastada até ao mar, onde se deposita rapidamente e dada a pequena amplitude da maré pode originar deltas. O caso mais conhecido é o do Mississipi (fig. 147). Nos estuários com uma mistura parcial, o caudal do rio é relativamente fraco e a mistura entre água doce e salgada é muito mais intensa (fig. 150). Por isso, para restabelecer o equilíbrio, há uma substituição por nova água salgada. Isso, juntamente com correntes de maré fortes provoca uma entrada de sedimentos marinhos dentro do estuário. Os mais grosseiros serão depositados rapidamente, mas os mais finos poderão subir até ao limite da penetração da maré salina. Um exemplo deste caso é o Tamisa. Os estuários em que há uma mistura total de águas, apresentam aberturas maiores do que 500m e podem não ter variações de salinidade na vertical, mas apresentam variações intensas na horizontal. A influência da força de Coriolis tende a empurrar a água doce para a margem direita e a água salgada para a margem esquerda (fig. 151). Paskoff (1985) introduz uma ideia interessante: uma diminuição de caudal devida a uma estiagem, juntamente com a existência de marés vivas, pode transformar um estuário do 1º tipo, temporariamente, num estuário do tipo 2. Algumas reflexões sobre o estuário do Douro No caso do rio Douro, o estuário tem 22 km de comprimento, sendo a propagação da maré limitada a montante pela barragem de Crestuma. A penetração salina depende do caudal do rio e da amplitude da maré e só pode atingir a barragem em condições de caudal excepcionalmente baixo. Quanto à respectiva abertura, na figura pode ver-se que ela tem cerca de 1110m, o que permitiria, em princípio, classificá-lo como um estuário de mistura total. Porém, o Cabedelo reduz em muito a sua largura. Na foto da figura 152 ela pouco ultrapassa os 100m, mas a largura da barra varia consoante a configuração e a posição do Cabedelo, a qual tem variado bastante nos últimos 150 anos (fig. 153). Nesta figura é possível ver que as áreas de maior profundidade do canal fluvial se situam encostadas à margem direita, o que sugere o efeito de Coriolis. Pensámos que o encostar da corrente fluvial à direita será o motivo pelo qual o Cabedelo se desenvolveu na margem esquerda. O provável jogo do efeito do Coriolis parece, assim, confirmar a hipótese de inclusão do estuário do Douro dentro deste último tipo de estuários. 174 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Movimentação dos sedimentos nos estuários Os materiais mais grosseiros que são transportados pelos rios por rolamento ficam na parte interior do estuário porque a perda de velocidade devida à diminuição de do declive diminui a competência do rio. As areias conseguem caminhar mais para jusante, mas o avanço da cunha salina dificulta a sua progressão. Na maior parte dos estuários existe uma zona onde os sedimentos finos em suspensão estão muito concentrados - o corpo lodoso (bouchon vaseux, Paskoff, 1985, fig. 154). Este núcleo de sedimentos vasosos em suspensão resulta da floculação das argilas trazidas pelo rio em contacto com as águas salinas que circulam para montante ou para jusante de acordo com as marés. Situase próximo do ponto nodal que é o ponto de convergência onde se anulam as correntes de fundo que sobem o estuário e a corrente fluvial que desce ao longo dele. Actualmente, com a urbanização e industrialização das margens do rios, uma parte do corpo lodoso é constituída por poluentes, pelo que o seu estudo tem um grande interesse prático. Nas épocas de cheia pode ser lançado no mar (Moreira, 1984), fazendo então parte da constituição da pluma túrbida (fig. 147). A decantação da água turva acontece sobretudo durante os períodos em que se dá a sua imobilização, que coincidem sobretudo com as marés altas. A capacidade de aderência de que gozam as partículas de dimensão inferior à das areias (<62µ) faz com que, uma vez depositadas seja difícil remobilizá-las. Esse facto permite que as acumulações vasosas se vão repetindo em cada ciclo de maré e, por isso, elas acabam por ser um traço dominante da sedimentação estuarina. Os deltas Os deltas correspondem à foz de um curso de água em que os aluviões fluviais se acumulam em vez de serem redistribuídos pelas vagas e correntes litorais. Deste modo, os deltas caracterizam-se por um avanço da terra em relação ao mar. É justamente esse traço que identifica os deltas. Muitas vezes o rio divide-se em vários braços, mas essa não é uma condição absolutamente necessária. No fundo, um delta representa o oposto de um estuário, porque no caso do delta as acções fluviais, de origem continental, dominam sobre as acções marinhas (Paskoff, 1985). Os deltas actuais são holocénicos mas sobrepõem-se muitas vezes a deltas mais antigos em locais subsidentes, o que explica a existência de espessuras de mais de 10.000m de sedimentos deltaicos, por exemplo no delta do Níger. As dimensões são muito variáveis, mas em todos os casos há uma certa indecisão nos limites entre o mar e a terra. Existem frequentemente, dentro dos deltas, condições para a formação e acumulação de hidrocarbonetos, o que faz com que a sua génese e estrutura tenham sido muito estudadas ultimamente. O delta do Mississipi (fig. 147) é, sem dúvida, o mais estudado de todos. Condições de formação dos deltas É preciso que o rio tenha uma grande capacidade de transporte e que transporte efectivamente uma grande quantidade de sedimentos. Assim os rios das altas latitudes, que transportam muitos detritos resultantes da crioclastia, bem com os das regiões de clima continental, mediterrâneo e 175 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral tropical com estação seca, têm condições favoráveis à existência de deltas. Quanto mais fracas forem a ondulação e as correntes marítimas, mais difícil será a dispersão dos sedimentos trazidos pelo rio e portanto mais provável será a sua acumulação pontual formando um delta. Assim, é mais provável formar-se um delta no fundo duma baía do que no mar aberto. O mesmo pode dizer-se das marés, já que uma forte amplitude induz fortes correntes de descarga nos estuários, propiciando a evacuação dos sedimentos. Assim, com marés muito fracas, da ordem dos 0,5m, o Mediterrâneo é um mar favorável à formação de deltas, até porque está rodeado por uma série de cadeias montanhosas recentes que fornecem cargas sólidas importantes aos cursos de água que nele nascem. A estabilidade do nível do mar, ou mesmo uma ligeira descida, é uma condições importante. Porém, muitos dos deltas situam-se em áreas subsidentes por motivos tectónicos, a que se junta uma subsidência por carga sedimentar e uma outra componente devida à compactação dos sedimentos (fig. 155). Desta forma, a subsidência no delta do Mississipi varia entre 0,3 e 1m por século. Deste modo, os sucessivos deltas abandonados pelo rio aquando de mudanças de curso vão ficando submersos. O delta do Nilo, depois da construção da barragem de Assuão tem vindo a sofrer de problemas decorrentes da erosão costeira e da submersão e salinização de terras agrícolas, situadas sobretudo no local de braços abandonados do rio (fig. 156). Lagunas As lagunas típicas encontram-se nas costas baixas de acumulação. São extensões aquáticas alongadas, desenvolvendo-se paralelamente ao litoral e isoladas deste por cordões litorais ou por restingas (fig. 157). A comunicação com o mar faz-se através de passagens mais ou menos numerosas existentes nesse cordão. Mesmo quando não têm comunicação directa com o mar sofrem a influência das marés. As costas com lagunas correspondem a 13% dos litorais ao nível do globo (Paskoff, 1985). São ambientes muito produtivos sob o ponto de vista biológico. As lagunas podem aparecer em muitas circunstâncias. Mais do que enunciá-las e tentar fazer a sua sistematização parece-nos que interessará aos estudantes compreender algumas das lagunas mais emblemáticas a nível do país e dar, também, alguns exemplos estrangeiros (Veneza, Bilene) relativamente aos quais dispomos de alguma documentação que reputamos de particularmente interessante. O caso da laguna de Veneza Sem dúvida que a laguna mais conhecida a nível do globo é a laguna de Veneza8. A figura 158 8 Veneza é um lugar que retira a sua magia da água, das gôndolas e dos palácios. A decadência da cidade é dada de forma magistral no livro de Thomas Mann e no filme de Luchino Visconti. Mas uma parte da melancolia que a 176 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral mostra a sua localização relativamente ao delta do Pó, no fundo do mar Adriático. A forma como se desenvolve a pluma de turbidez do rio Pó mostra claramente que a deriva litoral se desenvolve de NE para SW. A cidade dos Doges foi construída sobre ilhas pantanosas localizadas entre o continente e o Lido, que é a língua de areia que fecha a laguna (fig. 159). Aparentemente, a área da cidade terá sofrido uma descida de 30 cm desde 1890 (Dawson, 1992) em parte devida à extracção de águas subterrâneas. Com efeito, a subsidência na área de Veneza é de 3-5mm por ano, mais do dobro das áreas envolventes. Tornou-se mais lenta a partir de 1975, quando essa extracção parou. Mas a tendência geral para a subsidência não se deve só às actividades antrópicas. Há uma tendência regional comprovada pelo facto de a praia do último interglaciar, que geralmente aparece entre 2 e 8m, aparecer a uma profundidade de –70m na região de Veneza (Dawson, 1992). Porém, a carga turística que envolve a cidade pode contribuir para o problema. Assim, a erosão provocada pela trepidação dos barcos a motor (vaporetti) nos canais também tem a sua quota parte no afundamento desta cidade cujo encanto provém da sua própria fragilidade. A subsidência da área de Veneza explica uma subida do nível do mar, que é mais intensa do que aquela que aconteceria por causas puramente eustáticas. Daí resulta que as invasões marinhas (acqua alta, fig. 160) sejam cada vez mais frequentes, ao sabor de marés vivas e de ventos (scirocco) que empurrem as águas do Adriático para Norte. O ano pior terá sido 1996, com 101 episódios superiores a 80 centímetros. Em 1966 atingiu-se um nível da água 1,94 m acima do nível médio (fig. 161). Com uma altura de 100 cm apenas 4% da superfície do centro histórico é invadida pela água. Com 110 cm a percentagem sobe para 12%. As passerelles entram em acção a partir de 120 cm, quando 35% do centro histórico fica inundado. A 130 cm (70% da superfície invadida) os efeitos começam a ser graves e com uma altura de140 cm (90% da superfície invadida) a situação é dramática9, como aconteceu já no mês de Novembro de 2002. Com efeito, no dia 16 atingiu-se a altura de 1,47m e os efeitos na cidade foram confrangedores (fig. 159). Neste caso, o scirocco soprando 36 horas seguidas, fez subir 20cm o nível da maré astronómica, já de si relativamente elevado (+1,27). O desvio de canais fluviais que depositavam os seus sedimentos na laguna foi feito para impedir um processo de colmatação que seria inelutável. A verdade, porém, é que sem os aportes sedimentares vindos do continente, e com o alargamento das passagens na restinga para permitir a entrada de grandes navios, a penetração da água salgada na laguna intensificou-se e isso contribuiu para a compactação das vasas (Paskoff, 1985). O aumento da profundidade e o alargamento das passagens na restinga produziu uma aumento da amplitude da maré de13 cm num século, o que poderá relacionar-se com o aumento do número e da intensidade dos casos de envolve, vem do carácter inexorável do seu afundamento, da luta incessante para manter vivo um milagre que dura há séculos… 9 http://www.venicebanana.com/acqua.htm 177 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral acqua alta. Mais uma vez se prova que as intervenções humanas no litoral, ao mexer nos delicados equilíbrios existentes têm consequências muitas vezes inesperadas e frequentemente desagradáveis. No caso da laguna de Veneza, a colmatação que seria o seu destino natural foi substituída pela ameaça de uma anexação pelo mar. A tendência evolutiva foi completamente invertida por acção do homem (Paskoff, 1985). A Ria de Aveiro A Ria de Aveiro corresponde a uma extensa área lagunar, com cerca de 50km de extensão em latitude situada entre as praias do Furadouro, a Norte e de Mira, a Sul (fig. 162). Durante o máximo flandriano, o mar invadiu uma extensa área, criando uma reentrância da linha de costa que poderia, efectivamente, ser descrita com o uma “ria”, no sentido de “vale fluvial invadido pelas águas do mar”. Sabe-se que, em 922 Ovar ainda era um porto de mar. No fim do século XV a restinga estaria à latitude da Costa Nova. Durante a “Pequena Idade do Gelo” a descida do nível do mar, e um possível acréscimo no fornecimento de sedimentos devido a uma situação de tipo mais resistático provocada pelo abaixamento da temperatura poderá ser responsável pelo avanço muito rápido da restinga. Efectivamente , no “Resumo histórico da barra de Aveiro” publicado juntamente com a reimpressão (1947) da Memória Descritiva de Luís Gomes de Carvalho, datada de 1808, afirmase que em 1575 terá começado a ruína do porto de Aveiro, a partir de um inverno muito rigoroso que fez entupir a barra com areias. De 1736 a 1750 apenas entraram 15 navios da barra de Aveiro. A profundidade da água na laguna não deveria ser muito grande. Por isso, os cursos de água que nela desaguavam começaram a fazer um trabalho de assoreamento bastante rápido, criando uma série de ilhotas que começam a notar-se na figura 162 B. À medida que se foi desenvolvendo uma restinga que crescia de Norte para Sul, a capacidade de escoamento dos sedimentos vai ficando cada vez mais reduzida e a colmatação da laguna vai-se intensificando. Em 1756 a restinga estava no areal de Mira e tinha fechado completamente a laguna. Essa situação estava a matar o porto e a cidade de Aveiro, que no século 16 tinha tido uma época de ouro e, além disso, provocava uma grave insalubridade nestas áreas pantanosas que deixaram de ser invadidas pelo mar e de sofrer a acção directa das marés. Depois de vários estudos e tentativas falhadas, a barra de Aveiro foi finalmente aberta, no local onde hoje se situa, em 1808. A necessidade de construir diques para proteger a entrada do porto da invasão de areias da deriva litoral tem produzido um assoreamento assinalável na parte da restinga situada a norte dos diques e a inevitável erosão a sul (fig. 163). Outras lagoas existentes na costa portuguesa A Ria Formosa (fig. 164) é outro grande acidente lagunar, fechado por um sistema de ilhas barreiras. Segundo Thomas e Goudie (2000) ilhas barreiras são formas geralmente arenosas, alongadas, paralelas à costa e separadas dela por uma laguna. Não estão ligadas ao continente nas extremidades e estão fraccionadas por aberturas por onde passam as correntes de maré (ver também a fig. 120). 178 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Na costa portuguesa abundam corpos lagunares mais pequenos e com origens diferenciadas em que predominam processos de barragem que os cordões litorais (Esmoriz) ou os sistemas de dunas costeiras (Ervideira) fazem relativamente a pequenos eixos de drenagem. Estes são impedidos de desaguar no mar e acabam por formar planos de água cujos fundos, devido a condições geológicas favoráveis ou por acumulação de argilas de decantação, acabam por se tornar impermeáveis, garantindo a manutenção da lagoa. Designam-se correntemente como lagoas. Pensamos, à semelhança do que é dito em Daveau, (1988) a propósito da Ria (haff-delta?) de Aveiro que nem sempre há interesse em substituir a linguagem popular por termos pretensamente eruditos que se arriscam a ser mal entendidos e mal utilizados pelo público. A evolução das lagunas litorais As lagunas e lagoas litorais têm uma tendência geral à colmatação. Com efeito, a existência de uma barra arenosa (ilha barreira, restinga) que fecha a laguna vai dificultar a exportação dos sedimentos que para ela seja arrastados pelos cursos de água, pelo mar, ou pelo vento. A existência de marés fortes pode ajudar à limpeza desses sedimentos. Porém, para que isso aconteça, é necessário que as passagens existentes nas lagunas e que fazem a comunicação com o mar estejam desimpedidas. Muitas vezes é necessário o homem intervir. Na costa portuguesa esse trabalho é realizado na altura das marés vivas equinociais, aproveitando-se assim, a grande amplitude da maré e a força da vazante para arrastar alguns dos sedimentos que atapetavam o fundo da laguna. Porém, a existência de algas nos fundos funciona como uma armadilha para os sedimentos. Daí que a apanha das algas tivesse uma importância vital na preservação do ecossistema lagunar da Ria de Aveiro. A substituição do moliço por adubos químicos levou a uma diminuição desta actividade e ao desaparecimento de muitos dos barcos moliceiros. Trata-se de um caso exemplar em que uma modernização apressada tem consequências nefastas que se fazem sentir tanto a nível do património natural como do património cultural. No caso de uma subida do nível do mar (fig. 165) podem acontecer duas situações. Se a subida for suficientemente lenta para poder ser acompanhada por uma deslocação do cordão litoral, ele vai-se deslocando na plataforma continental e acaba por reconstituir-se a um nível mais alto, preservando-se, assim, quer a laguna quer o cordão litoral que a separa do mar. Neste caso, poderemos encontrar antigos sedimentos lagunares sobrepostos por praias ou dunas. Este fenómeno pode, aliás, acontecer mesmo que as variações do nível do mar sejam muito pequenas, desde que uma modificação na dinâmica litoral ou seu balanço sedimentar produza um recuo do sistema praia-duna que o obrigue a invadir uma laguna situada na sua retaguarda. Porém, se a transgressão for muito rápida, o cordão litoral fica submerso e a laguna desaparece (fig. 165, B). Circulação dentro das lagunas A circulação dentro das lagunas efectua-se através das correntes induzidas pelos ventos. Estas correntes induzem um processo de deriva que acabam por criar pequenas flechas litorais. Se estas forem oblíquas em relação ao desenvolvimento geral da laguna, acabarão por a segmentar num rosário de bacias arredondadas, orientadas, no seu conjunto, de acordo com a orientação 179 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral geral da laguna original. A situação representada na figura 166 merece ser ilustrada com o caso da lagoa do Bilene (fig. 167, Moçambique). Pântanos marítimos Encontram-se nas diversas situações descritas ao longo desta aula. Com efeito, podem aparecer nos estuários, nos deltas e nas lagunas e lagoas litorais. Parece-nos, por isso, que deverão ser estudados neste momento, quando concluímos este tema. Os pântanos da zona temperada compreendem duas partes. Uma inferior, de vasa nua, denominada slikke e uma superior, em que a vasa está colonizada por vegetação geralmente designada schorre. Os termos em questão são de origem holandesa e parecem-nos preferíveis a outras designações de origem anglo-saxónica quiçá menos expressivas e menos esclarecedoras. O slikke é a parte mais baixa de um espraiado pelítico inundada em todas as preiamares mortas e descoberta nas baixa-mares (Moreira, 1984). Trata-se de uma plataforma com muito pouco declive constituída, na parte inferior por vasa mole e na parte superior por uma vasa mais consistente que estabelece a passagem, através de um degrau nítido, para o schorre (fig. 168). O schorre (Moreira, 1984) corresponde a uma plataforma de vasa consolidada, revestida por um solo halo-hidromorfo e colonizada, nas zonas extratropicais, por vegetação herbácea (sapal). Nos climas tropicais a colonização é feita por vegetação arbustiva/arbórea e designa-se como mangal (fig. 169). O schorre só é coberto nas preiamares vivas e nas tempestades. É recortado por canais de maré (fig. 170), onde apenas aflora a vasa nua. Na figura 171 é possível comprovar a distribuição destes tipos de ambientes a nível mundial. É importante salientar que se trata de ambientes muito produtivos sob o ponto de vista biológico, onde muitas espécies de animais marinhos nascem e passam pelas primeiras fases de desenvolvimento. Por isso, a sua destruição devida a processos erosivos ou a sua contaminação por poluentes terá reflexos negativos na actividade piscatória das áreas para onde esses organismos vão viver no estado adulto. Aula Prática: Continuação do tratamento de sedimentos de praia e de duna. Granulometria e morfoscopia das areias de depósitos de tipo lagunar. O significado dos depósitos lagunares na caracterização da evolução geomorfológica do litoral da região do Porto. O caso dos depósitos da praia da Aguda (fig. 172) Bibliografia utilizada CARTER, R.W.G. - (1989) - Coastal Environments - An Introduction to the Physical, Ecological and Cultural Systems of Coastlines, Academic Press Limited, London, 5ª Impressão, 617 p. CARVALHO, A., R. M., (1988) – Localização do paleovale do rio Douro, Anais do Instituto Hidrográfico, nº 9, p. 77 – 82. CARVALHO, L. G., (1908) – Memória descritiva (Notícia circunstanciada do plano e processo dos efectivos trabalhos hidráulicos empregados na abertura da barra de Aveiro, segundo as ordens do Príncipe regente, Nosso Senhor), com um “Resumo histórico da barra de Aveiro”, Col. de Reimpressões do “Arquivo do Distrito de Aveiro”, sep. do vol. XIII do 180 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Arquivo do Distrito de Aveiro. DAVEAU, S., (1988) - A história do Haff-delta de Aveiro ou...as fraquezas do nosso ensino da Geografia», Finisterra, XXIII (46), Lisboa, p. 327-335. DAWSON, A. 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Imagem extraída de: http://earthobservatory.nasa.gov/Newsroom/NewImages/Images/modis_mississippi_sed_lrg .jpg 182 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 148: Variação da velocidade da corrente consoante a fase da maré 183 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 149: Correntes residuais e transporte de sedimentos nos estuários de cunha salina 184 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 150: Correntes residuais num estuário de mistura parcial Figura 151: Correntes salina e fluvial num estuário de mistura total 185 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 152: Estuário do rio Douro em 1995 186 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 153: Evolução do Cabedelo nos útimos 150 anos (fonte: Administração dos portos do Douro e Leixões, APDL) 187 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 154: O corpo lodoso e a sua movimentação num estuário com cunha salina Figura 155: Factores em jogo na evolução de um delta 188 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 156: Problemas de erosão no delta do Nilo devidos à retenção de sedimentos na barragem de Assuão. Figura 157: Elementos constitutivos de uma laguna 189 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 158: O delta do Pó e a laguna de Veneza Figura 159: Imagem de satélite da laguna de Veneza 190 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 160: Veneza durante a ”acqua alta” de 16 de Novembro de 2002 Altura máxima atingida pela Acqua Alta (cm acima do nível médio) 200 180 160 140 120 100 1927 1932 1937 1942 1947 1952 1957 1962 1967 1972 1977 1982 1987 1992 1997 2002 Dados extraídos de http://www.pegacity.it/justice/viagiustizia/4250/acqualta.htm Figura 161: Valores máximos da altura da água atingidos em cada ano, de 1927 até 16 de Novembro de 2002 em Veneza 191 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 162: A evolução da Ria de Aveiro 192 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 162: O corte artificial na restinga de Aveiro Figura 164: Imagem de conjunto da Ria Formosa 193 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 165: Evolução de uma laguna afectada por uma transgressão marinha Figura 166: Evolução por segmentação das lagunas litorais 194 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 167: Processo de segmentação na lagoa do Bilene (Moçambique) Fonte: reunião de das folhas 1180 (parte) e 1181 da carta de Mocambique de escala 1:50.000 Figura 168: Schorre e Slikke nos estuários do rio Maputo (Moçambique) e do rio Sado (Portugal). 195 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 169: Aspecto do mangal junto à restinga da Praia dos Pescadores (Maputo, Moçambique) Figura 170: Canal de maré: região de Maputo (Moçambique) 196 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 171: Distribuição das áreas de mangal e de sapal a nível do globo. 197 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 172: Depósitos lagunares encontrados na praia da Aguda (Vila Nova de Gaia) em Outubro de 2002. O seu aparecimento fica a dever-se à erosão produzida pela implantação do quebra mar destacado da Praia da Aguda. 198 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Aula 9. O final do Cenozóico. Evolução dos litorais durante o final do Cenozóico. Introdução O texto que se segue funciona como a primeira parte deste tema. Este texto corresponde, essencialmente, a uma introdução à “lição de síntese” sobre a evolução dos litorais durante o Cenozóico, em que é apresentado como exemplo o caso da plataforma litoral da região do Porto. A variação climática no final do Cenozóico: o porquê da sua inclusão neste programa. A nosso ver, os litorais nossos contemporâneos não podem ser vistos desligadamente da sua evolução ao longo do Quaternário. Isso acontece não só porque existem diversas marcas ou relíquias dessa evolução que ainda são patentes aos nossos olhos, mas também porque o passado é, frequentemente, a chave do presente e contém as explicações que clarificam muitos dos acontecimentos e da evolução do presente. Desde há muito tempo que estes temas nos apaixonam. Todavia, actualmente, parece-nos que a sua relevância é ainda maior. Com efeito, as discussões existentes acerca do aquecimento global e do efeito de estufa têm tido um grande destaque nos media e entre a opinião pública. Parecenos que, como geógrafos físicos, através do “recuo” que caracteriza aqueles que lidam com escalas cronológicas longas, poderemos ter um papel no esclarecimento da opinião pública e no equacionamento dos problemas que afectam a Terra enquanto sustentáculo da nossa existência individual e colectiva. A visão que perpassa em alguns textos recentes, dos quais destacámos Riser (1999) e Williams (1998), tem, a nosso ver, um grande interesse pedagógico, na medida em que faz interagir a ciclicidade da hipótese de Milankovitch com a distribuição de continentes e oceanos, comandada pela tectónica de placas. Daí decorrem, como veremos, consequências importantes para a circulação oceânica. Também a tectónica alpina, criando novos relevos, vai estimular o processo de acumulação de neves que se auto-alimenta, pelo menos até um certo ponto. O próprio aumento da produtividade biológica dos oceanos e, até, a meteorização das rochas (acrescida devido à formação das cadeias de montanhas) vai consumir CO2 atmosférico diminuindo o papel do efeito de estufa e criando, assim, condições para o desenvolvimento das glaciações. Sabemos que existem, ainda, muitas dúvidas, a este respeito. Não sabemos se alguma vez se saberá explicar todo este processo. Mas parece-nos que a discussão do mesmo pode ter um papel formativo importante e levar os estudantes a interessar-se por estes temas e, desta forma, a realizarem a aprendizagem da complexidade dos fenómenos e das interacções em jogo, bem assim como do carácter provisório que têm todas as explicações científicas . É evidente que aquilo que lhes será dito é apenas uma introdução feita em linhas muito gerais, que poderá funcionar como “aperitivo” para uma disciplina de Geomorfologia do Quaternário que também existe no curriculum, mas cuja abertura em termos efectivos, uma vez que também é uma disciplina de opção, não parece provável a curto prazo, devido à sobrecarga de trabalho dos docentes da área de Geografia Física. 199 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral O complexo jogo das interacções na criação de condições de arrefecimento ao longo do Cenozóico A propósito da variação do nível do mar vimos como o clima começou a sofrer uma tendência geral para o arrefecimento a partir de meados do Oligocénico (fig. 65). Esse aspecto tem uma grande importância no registo sedimentar e pode ajudar a distinguir entre as formações terciárias e as quaternárias porque, de um modo geral, se passa de climas que permitem grandes alterações (com caulinite e gibsite) a formações aluviais de tipo torrencial, em que os conteúdos em caulinite e gibsite diminuem drasticamente. Juntamente com esse arrefecimento aparecem oscilações que se vão tornando cada vez mais intensas durante a segunda parte do Pliocénico (curva da direita, respeitante ao registo encontrado em terra). Essa tendência acentua-se durante o Quaternário, com fortes variações climáticas (glaciações e períodos interglaciares, fig. 66) que se traduzem em importantes variações do nível do mar. Aparentemente (M. Williams et al., 1998), a modificação da distribuição dos continentes e oceanos, decorrente da movimentação das placas litosféricas pode ter tido um papel muito importante no condicionamento da circulação marinha em volta da Antárctida. No início do Cenozóico não havia gelo na Antárctida. As temperaturas deveriam estar à volta de 18°C nos mares envolventes. Porém, a subida da Austrália, em latitude, há 50 MA (fig. 173), bem como a abertura do estreito de Drake abriram uma passagem que permitiu a formação da corrente circumpolar. Esta passou a rodear completamente a Antárctida e a funcionar como uma barreira, impedindo as correntes quentes das latitudes baixas de atingirem estas latitudes. À medida que se vai dando o arrefecimento, a criação de mantos de neve vai propiciar o aumento do albedo e o processo vai intensificar-se por uma retroacção positiva. Em meados do Miocénico havia já um inlandsis na Antárctida (comprovado pelos blocos transportados pelo gelo que se encontram no registo geológico). O reforço dos contrastes térmicos, por sua vez, aumenta a velocidade dos ventos. Esse facto pode intensificar o upwelling e a produtividade biológica e, por essa via, aumentar a captação do CO2 pelos oceanos e reduzir a quantidade do CO2 existente na atmosfera. No final do Miocénico há um arrefecimento que vai corresponder a uma regressão de 40-50m. Este processo é concomitante com a secagem do Mediterrâneo, com formação de enormes quantidades de evaporitos10. Este evento foi designado como “a crise de salinidade do Messiniano” e provocou uma diminuição geral da salinidade do mar em 6%. Esse facto permite que o congelamento da água do mar se pode dar a temperaturas mais altas. E este é mais um fenómeno que reforça o arrefecimento global, ao permitir a criação de mares gelados com um albedo importante. O aparecimento das condições para as glaciações do Quaternário 10 Aparentemente, a quantidade de sais precipitados corresponde a cerca de 40 vezes a quantidade total de sal que o Mediterrâneo normalmente contém, o que significa que o processo foi um processo continuado, que se desenrolou durante muito tempo (M. Williams et al., 1998). 200 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Depois de um certo aquecimento no início do Pliocénico as condições climáticas deterioraram-se (fig. 174). No final do Pliocénico começam a encontrar-se blocos transportados pelo gelo incluídos no registo sedimentar do hemisfério Norte, o que significa que as glaciações até aí confinadas ao hemisfério sul e à Gronelândia11 começam a estender-se para as grandes áreas continentais do hemisfério Norte. Esse facto marca o início do Quaternário. É possível que o fecho do estreito do Panamá tenha contribuído para o desencadeamento da corrente do Golfo. Ora, o aporte de águas aquecidas para latitudes elevadas tem como consequência uma intensificação da queda de neve, o que tem consequências para o aumento do albedo e para a criação de retroacções positivas para a glaciação. Há cerca de 2,4 MA (fig. 65, repetição) já havia mantos de gelo nos continentes do hemisfério Norte. A partir daí observam-se alternâncias rítmicas com um período próximo de 41.000 anos. Essa situação de oscilações frequentes e relativamente pouco intensas vai até cerca de 0,9 MA. A partir daí as oscilações frias tornam-se muito mais intensas e o respectivo período passa a rondar os 100.000 anos. Essas variações, que são deduzidas da análise do conteúdo em isótopos de oxigénio dos sedimentos dos fundos marinhos12, vêm comprovar a influência que as variações na órbita da Terra, e as consequentes variações da quantidade de calor que é recebida nos diferentes locais, devem ter na determinação das variações climáticas do passado. Na figura 175 é possível analisar os diferentes ciclos que podem influir neste processo: a excentricidade da órbita, com um período de 100.000 anos, a obliquidade da eclíptica, com um período de 41.000, e a precessão dos equinócios, cuja periodicidade pode variar entre 23.000 e 19.000. A conjugação dos diferentes ciclos produz uma curva da variação da insolação, em Julho, entre 60 e 70° de latitude Norte, que se adequa muito bem às variações de temperatura efectivamente verificadas. Parece evidente, todavia, que as influências exteriores não podem explicar tudo. Doutro modo, os ciclos glaciação/interglaciar teriam existido ao longo de toda a história da Terra, o que não aconteceu (cf. fig. 63). Por outro lado, as variações na insolação são muito pouco intensas e é bastante discutido qual o mecanismo pelo qual são amplificadas de molde a originar as variações climáticas com que nos deparamos durante o Quaternário. Uma das hipóteses mais recentes a esse respeito explora uma ideia já relativamente “antiga” segundo a qual há uma correlação entre as manchas solares e períodos de arrefecimento climático. A explicação para essa correlação poderá estar no facto de que os raios cósmicos produzem iões que, juntamente com as pequenas partículas da baixa atmosfera podem criar as 11 A criação dos glaciares na Gronelândia parece ter tido início no final do Miocénico, há cerca de 7 MA (M Williams et al., 1998). 12 A água é constituída por 2 isótopos de oxigéno: O16 e O18. o O16 é mais leve e, por isso, evapora-se mais facilmente. Durante os períodos glaciares há uma grande quantidade de água retida sob a forma de gelo nos continentes. Significa, por isso, que os oceanos vêm a sua água enriquecida no isótopo mais pesado. A variação da relação entre o O16 e o O18 incluídos nos organismos marinhos, dá indicações sobre a temperatura e sobre a quantidade de água retida nos glaciares, e portanto, sobre o nível do mar. Uma mudança de 0,11‰ no carbonato dos foraminíferos plantónicos representa uma variação de 10m no nível do mar. 201 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral bases para o desenvolvimento de nuvens baixas. Estas têm como resultado final arrefecer a Terra. Por isso, um factor que aumente a intensidade dos raios cósmicos provocará um arrefecimento. Ora, as manchas solares relacionam-se com tempestades magnéticas e reforçam a magnetosfera que, por sua vez protege a terra dos raios cósmicos. Este processo complexo poderá explicar por que motivo um menor número de manchas solares (por exemplo, o mínimo de Maunder que coincidiu com a Pequena Idade do Gelo) acaba por desencadear um processo de arrefecimento (Lomborg, 2002). Além disso, o arrefecimento da Terra não se prolonga indefinidamente. As temperaturas nunca desceram mais do que 5-9° abaixo do actual. Isto significa que há um feed-back negativo a partir de certos limiares. Com efeito, se a temperatura descer muito, a evaporação reduz-se e a queda de neve também, o que pode contribuir para um balanço negativo de acumulação para os glaciares envolvidos, diminuir a intensidade do albedo e provocar uma diminuição da área glaciada ou mesmo o seu desaparecimento. Com efeito, há uma notória dissimetria no estabelecimento de uma glaciação: a entrada numa época fria é muito lenta, mas a saída da glaciação é muito rápida (fig. 66, repetição), o que mostra a existência de um mecanismo de feed-back negativo que controla a deglaciação. No processo de arrefecimento funciona um feed-back positivo. Esta circunstância desenha uma evolução em forma de “dente de serra” que é típica da evolução climática durante o Quaternário (fig. 66, repetição). É muito interessante pensar nas relações existentes entre a evolução climática durante o fim do Würm e a situação da terra relativamente ao ponto da sua órbita em que se verifica o perihélio. Com efeito, actualmente o perihélio situa-se no início de Janeiro. Significa isso que a grande obliquidade dos raios solares para o hemisfério Norte é compensada por uma maior proximidade do Sol. Por isso, os invernos do hemisfério Norte não são muito frios. Porém quanto ao hemisfério Sul, é preciso pensar que o verão austral acontece quando a Terra está no perihélio e o inverno austral quando ela está no afélio. Ora isso vai representar verões tendencialmente mais quentes e invernos mais frios do que os do hemisfério Norte. Justamente, a partir de 11.000 BP a situação estava invertida. Deste modo, o verão do hemisfério norte acontecia com a Terra no perihélio: esse facto acelera a fusão dos glaciares do nosso hemisfério. A discussão detalhada desta evolução pode ser seguida em Riser (1999, p. 202 e seguintes) e é muito interessante porque explica, entre outras coisas, as variações climáticas que se sucederam no Sahara no final do Würm e no início do Holocénico. Limites e métodos de estudo do Quaternário Os limites cronoestratigráficos utilizados para o Quaternário variam bastante consoante os autores. Tem sido muito referido o limite de 2,4 MA (Riser, 1999). Porém, já em Williams et al., (1998) o limite proposto é de 1,8 MA. Como se vê na figura 65, ambas as hipóteses são defensáveis, embora Riser defenda que o limite de 2,4-2,5 MA é mais utilizável para o estabelecimento de correlações inter-regionais porque corresponde a um importante episódio frio e seco que está amplamente documentado. 202 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral E dado o avanço dos conhecimentos neste domínio, é provável que, no futuro, nos possamos inclinar por uma ou por outra com base em novos dados que hoje ainda não se encontram ao nosso alcance…. Na figura 176 podemos observar a proposta de Riser (1999) para cronologia do Quaternário. Já na figura 179 encontramos uma cronologia pormenorizada sobre o Tardiglaciário e o Holocénico. Parece-nos muito importante que sejam fornecidas aos estudantes tabelas deste tipo que lhes permitam orientar-se no meio das datações e tentativas de correlação que se encontram na literatura especializada. É importante referir alguns dos métodos que podem ser utilizados no estudo do Quaternário (datações por potássio-árgon, C14, termoluminescência e luminescência estimulada opticamente13, paleomagnetismo, dendrocronologia, estudo das varvas, etc.). É sobretudo importante dizer que eles se aplicam a horizontes cronoestratigráficos diferenciados e que alguns deles ainda apresentam um grau de insegurança apreciável, para além dos custos elevados. Porém, dada a complexidade do estudo do Quaternário e a possibilidade de haver recorrência de fácies é evidente que toda a investigação acaba por se confrontar com a necessidade de obter datações. Evolução do clima durante o Pleistocénico médio Existe um grande contraste entre a vegetação e a fauna fini-terciária e a do final do Quaternário. Essa alteração fez-se ao longo do tempo, à custa de numerosas oscilações. Porém, uma fase fria e seca cerca de 2,4-2,5MA, bem documentada em todo o mundo (Riser, 1999) estabelece definitivamente os regimes climáticos típicos do Pleistocénico e por isso é usado como limite em muitos locais. Um importante episódio frio e seco foi assinalado na China, através de um loess excepcionalmente espesso e grosseiro. Na mesma altura, o planalto do Tibete parece ter sido soerguido algumas centenas de metros, o que mais uma vez mostra a interferência entre fenómenos climáticos e tectónicos na produção de eventos geomorfológicos documentados no registo sedimentar. As fases interglaciares do Pleistocénico inferior e médio correspondem a climas quentes com uma vegetação densa. Uma vez que as condições eram essencialmente biostáticas havia uma redução acentuada dos fenómenos erosivos em comparação com os períodos frios, em que, quer 13 Termoluminescência e luminescência estimulada opticamente: os minerais naturais têm quantidades vestigiais de radionucleídos que libertam radiações alfa, beta ou gama que ionizam os átomos do mineral, libertando electrões que ficam presos nas imperfeicões da rede cristalina. O aquecimento do mineral liberta esses electrões e origina uma emissão luminosa que é proporcional à quantidade de energia recebida pelo mineral. Em 1985 descobriu-se que em vez do aquecimento poderia submeter-se o mineral a uma radiação electromagnética. Esse processo designou-se como luminescência estimulada opticamente. Neste processo mede-se a dose de radiação acumulada depois da última exposição aos raios solares. Conhecendo a dose anual a que o sedimento estaria sujeito, é possível saber a respectiva idade (Riser, 1999). 203 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral a ablação produzida pelos glaciares quer as condições periglaciares existentes na sua periferia originavam quantidades muito apreciáveis de sedimentos detríticos transportados pelos rios até ao litoral. Esse facto terá produzido mudanças importantes na tipologia dos litorais que disporiam de uma maior quantidade de elementos grosseiros durante os períodos frios e de materiais mais finos e em menor quantidade durante os períodos interglaciares. No interglaciar Mindel-Riss (estádio 11 ou Holstein, fig. 176) teria havido um clima bastante mais quente do que o actual, o que se traduziria em praias fósseis situadas a altitudes que atingiriam os 20m nas regiões estáveis. Pensa-se que essas temperaturas anormalmente altas para um interglaciar poderiam explicar-se, tal como no caso do interglaciar actual (Holocénico) por uma fraca obliquidade do eixo da Terra, um perihélio no Outono e uma fraca excentricidade da eclíptica. Estas condições teriam permitido uma fusão parcial da calote da Gronelândia e da parte ocidental da Antárctida. O Pleistocénico recente: o Eemiense No interglaciar Riss-Würm (estádio 5, Emiense), o nível do mar seria 4-5m mais alto que o actual, nas zonas estáveis. A curva isotópica da figura 178 mostra que terá havido 2 máximos de temperatura (e portanto do nível do mar, ver nota supra) à volta dos 125.000 BP, separados por uma ligeira regressão. A mesma figura permite dizer que o nível do mar, nessa altura, terá atingido cotas ligeiramente superiores à actuais. O Pleistocénico recente: a última glaciação O crescimento das calotes de gelo ter-se-á iniciado por volta de 115.000 BP. Na figura 178 é possível identificar diversas fases, sempre com o desenho típico de “dente de serra”, mas com uma tendência geral para um aumento do conteúdo em O18, o mesmo é dizer, para o estabelecimento de uma glaciação. É possível identificar diferentes fases (fig. 177) a partir das quais foram definidos os estádios isotópicos que correspondem, actualmente, a termos correntes no domínio do Quaternário, cujo sentido é necessário que os estudantes apreendam para poderem descodificar a literatura recente sobre este assunto. Dentro das glaciações o clima não foi uniforme. Assim, é possível identificar os chamados “estadiais”, que correspondem a fases de frio intenso e os interestadiais, que são períodos frescos, em quer o clima sofre uma notória suavização. Também durante o Tardiglaciar foi possível identificar ciclos sob a forma de “dentes de serra” (fig. 180). Este ciclos têm colocado muitos problemas aos investigadores porque dado o período de duração relativamente curto, não podem ser associados às variações orbitais. Os eventos de Dansgaard-Oeschger (Williams et al., 1998) duram entre 1.000-3.000 anos. Podem corresponder a mudanças de 8° na temperatura média. Os eventos de Heinrich correspondem a uma escala de 5.000-12.000 anos. Correspondem a conjuntos de interestadiais progressivamente mais frios que terminam numa imensa descarga de icebergs. 204 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Com efeito, a possibilidade de obter uma melhor resolução no estudo e na datação destes fenómenos, permitiu perceber que cada ciclo pode decompor-se numa fase de arrefecimento progressivo em que o tamanho da calote aumenta. No estádio final desse crescimento acontece uma libertação maciça de icebergs que induz um arrefecimento à superfície da água do mar e diminui a precipitação no continente próximo. Assim, esta fase fria é seguida por um rápido aquecimento que inicia um novo ciclo. O máximo de extensão dos glaciares teve lugar entre 21.000-17000 BP. O Tardiglaciar e o Holocénico No período compreendido entre 13.000 e 12.000 BP verifica-se um aquecimento em que as temperaturas atingem valores quase semelhantes às do Holocénico (Bølling-Allerød, fig. 180) com um curto período frio de permeio (Dryas antigo). Nessa altura, no hemisfério norte a insolação, durante o verão era superior à actual e continuou a aumentar até a um máximo em 11.000 BP. O nível do mar seria cerca de 40 m inferior ao nível actual (fig. 69). O Dryas recente interrompe este período de aquecimento. O Dryas recente durou 1000 anos e implicou avanços dos glaciares escandinavos da ordem de 30-40km. O nível do mar tornou a descer para cotas de -60m (fig. 69). Foi este o último período frio. Depois dele inicia-se o Holocénico. Aos 10000 BP, o Atlântico já não tinha gelo à superfície, durante o inverno. As últimas moreias escandinavas têm datações de 9.200 BP. Durante o Holocénico as oscilações climáticas são mais frequentes e muito menos intensas do que nos períodos anteriores (fig. 180). Algumas fases de arrefecimento coincidem com fases de libertação de icebergs no Atlântico Norte, segundo uma frequência de 1430 anos. O último evento teria sido a Pequena Idade do Gelo (1450-1890). Os litorais durante o final do Cenozóico: enquadramento geral e problemas metodológicos Como acabámos de ver, à complexidade da evolução dos litorais, anteriormente tratada, dada a sua situação de interface, há que juntar o diastrofismo, que geralmente tem lugar em faixas de transição entre o continente e o oceano (fig. 74), as variações climáticas que aconteceram nos últimos tempos do Cenozóico e as variações eustáticas delas decorrentes. Na figura 181 podemos ver um modelo dos diferentes tipos de terraços a que as variações cenozóicas do nível do mar podem conduzir. Já vimos que o processo de arrefecimento climático e de constituição dos inlandsis levou a que no final do Miocénico tenha havido um arrefecimento que vai corresponder a uma regressão de 40-50m. A fusão total dos glaciares da Antárctida e Gronelândia provocaria uma subida do nível do mar da ordem dos 65-80m (A. Hallam, 1992). Juntando a esses valores os 120-140 m de variação do nível do mar deste o máximo do Würm até à actualidade, obtém-se um valor entre 185 e 220m de diferença entre o nível mais alto e o nível mais baixo do mar dentro do Cenozóico. Quer isto dizer que, contando apenas com as variações eustáticas, podemos encontrar restos de litorais cenozóicos separados por essa diferença de cotas. Como estamos, actualmente, num período interglaciar, portanto caracterizado por um nível 205 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral relativamente alto do mar admite-se que, de acordo com os valores acima referidos, poderemos ter antigas linhas de costa submersas até uma profundidade de 120-140m. As linhas de costa acima do nível actual do mar corresponderiam a altitudes de 65-85m, isto é à altura de água que foi subtraída aos oceanos devido à formação dos inlandsis da Antárctida e da Gronelândia. Por isso, admitindo que houve, durante o Terciário, um processo de crescimento dos inlandsis, mesmo nas áreas ditas “estáveis”, a tendência é para que os depósitos mais antigos se situem a cotas mais elevadas. Como é óbvio, se aceitarmos como correctos os valores de 65-85m para a espessura da camada de água subtraída ao mar desde o Miocénico o critério para essa estabilidade será que os depósitos do Miocénico inferior não devem ultrapassar os 65-85m. Significa isto que, quando se ultrapassa um valor dessa ordem de grandeza, começa a haver uma grande probabilidade de a área em questão ter sofrido um levantamento tectónico (fig. 182). A esse respeito, a análise da curva da Fairbridge (fig. 183) torna-se bastante esclarecedora: os pontos mais altos da curva apresentam uma tendência persistente para a descida, o que poderá relacionar-se com o efeito combinado do eustatismo e do diastrofismo. Por exemplo, na Calábria existem oito linhas de costa quaternárias que se desenvolvem até 177m de altitude (Riser, 1999), o que significa que se trata de áreas que estão a sofrer uma subida. Como seria de esperar isso sucede em muitas outras áreas. Se analisarmos a distribuição dos depósitos quaternários nas colunas estratigráficas de algumas cartas geológicas portuguesas, ou mesmo no trabalho de síntese de Ribeiro et al. (1979) apercebemo-nos que as formações quaternárias mais antigas (Siciliano I) se encontram a altitudes de 100-110. Esse facto de per si já nos indica que elas estão muito provavelmente soerguidas. Mas se isso é assim, então como utilizar as altitudes para caracterizar e fazer a cronologia dos depósitos? É óbvio que a ideia das praias levantadas que se podem seguir do Minho até ao Algarve, que foi referida logo no início deste programa cai pela base. Com efeito, se os depósitos estão soerguidos, então é improvável que o seu soerguimento seja perfeitamente homogéneo ao nível de todo o país. Poderá haver algumas homogeneidades, sim, mas apenas a nível local, quanto muito regional e nunca a nível do país. Na plataforma litoral da região do Porto, os depósitos presumivelmente pliocénicos situam-se a altitudes de 124m. Como, em princípio, de trata de depósitos formado no Pliocénico, quando o nível eustático já tinha descido algo em relação à situação pré-glaciar (o inlandsis da Antárctida existiria desde meados do Miocénico, cf. Williams et al., 1998) o seu soerguimento poderá ser avaliado da seguinte forma: Admitindo que a fusão dos inlandsis corresponderia a uma coluna de água de 82 m (Williams et al., 1998) e que, no Pliocénico uma espessura entre 60 e 40m já tinha sido subtraída aos oceanos. Abstraindo dos efeitos tectono-eustáticos, teríamos: 124 - (82-40)=82 ou 124 – (82-60)=102m Isto significa uma subida no mínimo de 82m e no máximo de 102m para os depósitos de fácies planície aluvial litoral (portanto próxima do nível de base) da região do Porto. Essa subida terá que ser explicada essencialmente pelo diastrofismo. Porém, também há sectores litorais a sofrer subsidência (fig. 75). Como vimos atrás, a região de 206 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Veneza está a sofrer subsidência, de tal forma que o Eemiense, que geralmente aparece entre 2 e 8m, se encontra aqui a uma profundidade de –70m (Dawson, 1992). Como é evidente, os depósitos emersos das áreas “estáveis” ou aqueles que se encontram soerguidos eram os únicos que eram facilmente observáveis. Os depósitos cenozóicos em vias de afundimento deverão estar embutidos uns nos outros, sendo os mais antigos os que se situam a maior profundidade. Por isso, só por sondagens podem ser observados. É perfeitamente natural, por isso, que a cronologia do final do Cenozóico das faixas litorais tenha sido estabelecida com base em depósitos essencialmente soerguidos… Com efeito, as designações “clássicas” para o final do Cenozóico (Calabriano, Siciliano, Milaziano, Tirreniano) foram definidas no Mediterrâneo, área muito activa tectonicamente, e onde os depósitos do Cenozóico estão deformados. No fundo, a atribuição “crono-estratigráfica” baseada nos critérios do eustatismo foi um grande equívoco, de que sofreram, durante décadas, os estudos geológicos e geomorfológicos sobre o Cenozóico do litoral. Daí a reflexão de Ferreira (1983) a propósito da hipótese de C. Teixeira sobre a submersão das rias galegas: “Nesse artigo (1944: Tectónica plio-pleistocénica do noroeste peninsular) o autor debate-se com uma evidente contradição que consiste em tentar provar a existência de movimentos tectónicos recentes com base na presença ou ausência de praias e terraços, datados pela sua altitude “. Todavia, o eustatismo existe, como vimos na altura própria e também no início desta aula. Se reflectirmos sobre a tendência geral de subida dos continentes relativamente aos oceanos devida a razões de ordem isostática (fig. 74) é possível que, em alguns casos, as taxas de subida se assemelhem (Barbosa e Barra, 2000) e que, por isso, depósitos aproximadamente da mesma idade possam estar a altitudes semelhantes. Porém, não podemos esquecer a existência de uma tectónica diferencial. Como veremos no final desta aula, dedicada ao exemplo do estudo da plataforma litoral da região do Porto, os fenómenos de neotectónica não podem ser esquecidos e a área em questão teve, aparentemente, um comportamento diferencial ao longo do Cenozóico. Quando se está em situação de levantamento tectónico, como é evidente, a erosão predomina sobre a acumulação. Por isso, alguns dos depósitos podem ter sido destruídos. A sequência dificilmente estará completa (vide Ferreira, 1983). Além disso, os depósitos geralmente são muito pouco espessos. Trata-se, geralmente, de pequenos afloramentos, muitas vezes remexidos, com uma interpretação que tem que ser muito fina e cautelosa, por causa das recorrências de fácies e da incidência da neotectónica. Naturalmente que a melhor forma de compreender este puzzle passa pela datação absoluta dos depósitos. Mas as técnicas disponíveis não se podem aplicar a muitos deles. Por exemplo, no litoral do Noroeste da Península, a acidez dos solos fez desaparecer qualquer vestígio de carbonatos. Apenas métodos do tipo da termo-luminescência podem ser empregues… e muitas vezes não existem nestes depósitos, frequentemente cascalhentos, areias com os requisitos necessários para esse tipo de datação. Todavia, em certos locais privilegiados, uma subida tectónica intensa criou uma espectacular escadaria de terraços de coral. Um caso muito conhecido é o da península de Huon na Nova 207 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Guiné (figuras 184 e 185, Pethick 1984). Esses terraços podem ser datados através do método do Urânio-Tório (que permite datações até a um limite de 500.000 anos). Adicionalmente, existem dados de O18 (http://www.ngdc.noaa.gov/paleo/coral/newguinea.html) que permitem representar as variações de O16/O18 nos recifes de coral fóssil e também no coral vivo. A datação dos diversos níveis de terraços, juntamente com o conhecimento de alguns pontos chave de uma curva bem estabelecida de variação do nível do mar permitiu calcular uma curva do levantamento tectónico (fig. 185, C) e deduzir, a partir daí, uma curva derivada da variação do nível do mar durante os últimos 400.000 anos. Isto é: foi possível separar a movimentação tectónica e o eustatismo, e isso corresponde à resolução de um problema que afectou os estudiosos destes temas durante décadas, desde que se teve consciência do interesse do estudo dos terraços marinhos e das interferências quase inextrincáveis entre tectónica e eustatismo na sua formação. Noção de terraço. Formação dos terraços do litoral Segundo Moreira (1984), “terraço marinho é um depósito de sedimentos litorais (de praia ou de plataforma) que aparece a um nível diferente do que foi construído, devido a variações do nível do mar”. Nesse sentido, os terraços submersos da figura 181 também são terraços marinhos. A figura 186 mostra, de forma esquemática, as fases de formação de um terraço marinho: 1. Período interglaciar: aumento do declive da vertente devido ao escavamento feito pelo mar na sua base. Formação de uma plataforma de erosão com uma cobertura sedimentar de origem marinha; 2. Fase de glaciação: Regressão marinha. O depósito marinho é coberto por uma formação solifluxiva de origem continental; 3. Novo período interglaciar: a transgressão marinha faz recuar a vertente criando uma nova arriba. O antigo depósito marinho foi transformado num terraço coberto por um depósito solifluxivo. A figura 187 mostra uma fotografia de uma situação idêntica à descrita no esquema. Este tipo de ilustração parece-nos muito interessante porque permite uma apreensão visual imediata de um fenómeno relativamente complexo. Além disso, este esquema é particularmente útil para a compreensão do que se passa na plataforma litoral da região do Porto, de que nos ocuparemos noutro local. 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FRANCO, H., (1998) - Millennial scale climate variability: A low-order model relating Heinrich and Dansgaard-Oeschger events, http://es.epa.gov/ncer_abstracts/fellow/98/franco.html (arquivo encontrado em Novembro de 2002). LOMBORG, B., (2002) – The skeptical environmentalist - measuring the real state of the World, Cambridge Univ. Press, 515 p. MOREIRA, M.E.S.A., (1984) - Glossário de Termos Usados em Geomorfologia Litoral, Estudos de Geografia das Regiões Tropicais, Nº 15) - C. E. G., Lisboa, 167 p. PETHICK, J. - (1984) - An Introduction To Coastal Geomorphology, London, Edward Arnold, 260 p. RIBEIRO, A. et al., (1979) - Introduction à la Géologie Générale du Portugal, Serviços Geol. Portugal, Lisboa, 114 p. RISER, J., (1999) - Le Quaternaire; Géologie et Milieux Naturels, Dunod, Paris, 320 p. WILLIAMS, M. A.J., DUNKERLEY, DE DECKKER, D. L. P., KERSHAW, A. P., STOKES T. J., (1998) - Quaternary Environments, 2ª ed. 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As temperaturas elevadas do início do Cenozóico deram, gradualmente, origem a condições frias durante o Quaternário. 211 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 65 (repetição): Variação climática no final do Cenozóico (extraído de Andersen e Borns, 1994) 212 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 66 (repetição): Variação climática e do nível do mar durante o Quaternário (fig. extraída do site http://www.soest.hawaii.edu/coasts/csrg1.html) 213 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 175: Os ciclos de Milankovitch 214 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 176: Proposta de Riser (1999) para uma cronologia do Quaternário 215 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 177: Os estádios isotópicos: os últimos 140.000 anos 216 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral ‰ O18 0 Age 25000 50000 75000 100000 125000 150000 175000 200000 225000 250000 -31 -33 -35 -37 -39 -41 -43 -45 ftp://ftp.ngdc.noaa.gov/paleo/icecore/greenland/summit/grip/isotopes/gripd18o.txt Figura 178: Curva isotópica para a Gronelândia. Dados extraídos de ftp://ftp.ngdc.noaa.gov/paleo/icecore/greenland/summit/grip/isotopes/gripd18o.txt 217 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 179: Cronologia do Tardiglaciar e do Holocénico 218 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 180: Curvas isotópicas do Tardiglaciar e do Holocénico 219 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 181: Evidência de variações do nível do mar: terraços marinhos emersos e submersos Figura 182: A interacção entre o eustatismo e a isostasia podem produzir praias levantadas que se estendem para além da amplitude dos níveis eustáticos Figura 183: A curva de Fairbridge sobre as variações do nível do mar durante o Quaternário e a sua disposição em escadaria Figura 3 220 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 184: Os terraços de coral na Península de Huon (Nova Guiné) 221 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 185: A separação entre a curva eustática e a subida tectónica na península de Huon (Nova Guiné) 222 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 186: Processo de desenvolvimento de um terraço marinho 223 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 187: Fotografia da situação descrita na figura 186. Aula 10: Fragilidades versus ordenamento do litoral Esta tema será conduzido de uma forma ligeiramente diferente do habitual. Partindo do princípio que os estudantes foram reflectindo sobre as matérias tratadas, é de supor que, no final do Semestre, eles estejam habilitados a pensar sobre a questão da fragilidade dos litorais. Assim, o papel do Professor deverá ser o de suscitar, através de imagens e documentos previamente escolhidos, a discussão dos temas, sugerindo pistas para a sua exploração e depois, no final, tentar fazer uma sistematização dos temas discutidos, eventualmente através de um organigrama, necessariamente provisório e incompleto mas que traduza a consciência que os alunos tenham adquirido acerca da dinâmica que perpassa nos litorais. A erosão costeira Segundo Bird (1993), cerca de 90% dos litorais a nível do globo estão num processo de erosão. Se uma parte desse problema resulta da subida do nível do mar posterior ao fim da Pequena Idade do Gelo, pensa-se que a variação do nível do mar contribuiu apenas com 10% para a produção desse recuo (J.M. A. Dias et al. 1997). Sabemos, pela regra de Brunn, que uma subida do nível do mar tem um impacto no recuo da linha de costa 100 vezes maior. Isso é suficiente para pôr os litorais numa situação de um certo stress, mas só por si não pode explicar um fenómeno com a amplitude que a erosão costeira apresenta. A retenção de sedimentos nas barragens é uma explicação que tem sido muito utilizada. Efectivamente, se atentarmos nos dados de Mota Oliveira (1990, fig.188) apercebemo-nos de que o rio Douro perdeu cerca de 86% da sua capacidade de alimentação do litoral devido à 224 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral construção das barragens. Efectivamente, esse processo levou a uma diminuição muito significativa da bacia que efectivamente drena para o mar através do Douro (fig. 189). Dada a proximidade entre a barragem de Crestuma e a Foz do Douro, o Douro foi mesmo o rio que mais capacidade de transporte de sedimentos terá perdido. A subida do nível do mar também obriga os rios a entulharem os seus estuários de forma a atingirem um novo perfil de equilíbrio de acordo com o novo nível do mar. Essa camada de sedimentos, em estuários largos, pode representar uma parte não negligenciável do problema. Uma outra explicação que tem sido avançada levanta a hipótese de que se tenha esgotado o stock de sedimentos que o mar, durante a transgressão flandriana, arrastou para a costa (Paskoff, 1985, Granja e Carvalho, 1995). Muitos deles foram retrabalhados, originando sistemas dunares fixados por vegetação que já não são capazes de reabastecer em areias a faixa costeira, a não ser quando o avanço do mar entalha arribas nesses cordões dunares, como é o caso da praia de Cortegaça (fig. 141). É evidente que a vulnerabilidade das regiões costeiras à erosão depende de muitos outros factores. Um dos mais decisivos tem a ver com o substrato geológico. O processo de erosão é potencialmente muito mais rápido em arribas constituídas por material pouco consolidado do que em arribas graníticas ou de calcários maciços. O exemplo das arribas algarvias a leste dos Olhos de Água é bem conhecido (figura 190) e foi consideravelmente acelerado pela construção dos molhes que protegem a entrada da Marina de Vilamoura (ver também a fig. 206). Um dos problemas da área de Espinho e das praias que desde Espinho se estendem para sul é que as areias de praia assentam sobre depósitos do final do Pleistocénico ou mesmo do Holocénico, muito pouco consolidados, que não oferecem uma resistência significativa ao avanço do mar. Outro factor a ter em conta tem a ver com a situação tectónica. Por muito lentos que sejam os movimentos tectónicos, o facto de actuarem em intervalos de tempo muito longos faz com que a sua influência não deva ser negligenciada. É possível que a rápida erosão que se verificou em Espinho, a partir de meados do século 19, se relacione com a hipótese de um basculamento para Sul, de origem tectónica, da faixa litoral a sul do Douro em direcção à Orla Ocidental mesocenozóica (Araújo, 2002). Como vimos na aula sobre as variações do nível do mar, as regiões na periferia de áreas que sofreram glaciação estão submetidas, actualmente, a um processo de subsidência que contribui para que os problemas de erosão possam ser aí particularmente graves (figs 71 e 72). O papel das obras de defesa e protecção costeira Face aos problemas de erosão que as populações costeiras enfrentam, normalmente reivindica-se a construção de obras de protecção e defesa. Estas podem ser de diversos tipos: • Obras longitudinais aderentes (enrocamentos, paredões); • Obras longitudinais não aderentes (quebra-mares destacados); • Obras transversais (molhes, esporões). Porém, ao perturbar o desenvolvimento normal da deriva litoral todas as obras transversais 225 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral acabam por reter sedimentos a barlamar. Essa retenção de sedimentos vai provocar um deficit a sotamar, que resulta, normalmente, num recuo da linha de costa (fig. 191). Se houver valores patrimoniais importantes a defender é evidente que se vão construir novos esporões que vão exportar o problema para sotamar. O caso de Espinho é paradigmático: as obras de defesa de Espinho provocaram uma erosão tão forte em todas as praias a sul desta cidade que em menos de 15 anos a linha de costa se modificou como pode ver-se na figura 192 (o mapa é de 1978 e as fotografias aéreas de 1995). Mesmo os quebra-mares destacados (fig. 193) podem ter um papel importante na evolução da linha de costa. É o caso do quebra-mar da praia da Aguda, acabado de construir na Primavera de 2002 e que já tinha provocado uma importante erosão na praia da Granja em meados de Outubro deste ano (fig. 172). As obras de protecção aderente (paredões, enrocamentos) têm consequências muito mais negativas que os quebra-mares destacados. Na figura 194 é possível ver como, para evitar o recuo de uma duna em processo de erosão se constrói um paredão. Este, não produz uma absorção da energia da ondulação e origina, pelo contrário, um processo de reflexão que aumenta a energia disponível para fazer ablação. A praia acaba por desaparecer completamente. Porém, as obras de protecção costeira funcionam em certos casos. A figura 195 mostra como a construção de quebra-mares destacados na costa mediterrânica de Espanha criou pequenos tombolos, contribuindo para uma considerável acumulação de sedimentos. Porém é preciso não esquecer que a energia da ondulação no Mediterrâneo não tem nada a ver com aquela que se pode encontrar no Atlântico. O mesmo se pode dizer das marés que, no Mediterrâneo apresentam amplitudes da ordem do 0,5m, contra os valores de cerca de 4m de amplitude máxima em marés vivas que ocorrem na costa portuguesa. A título de exemplo vale a pena reproduzir o texto e a figura de Carter (1988, figura 196) acerca da destruição parcial do molhe de Sines, ocorrida em 26 de Fevereiro de 1978, em que blocos de 42 toneladas foram destruídos ou deslocados por ondas de 10m de altura, devido essencialmente a fenómenos de convergência da ondulação que reforçaram o seu poder de ataque. A alimentação artificial das praias tem sido utilizada em diversos locais, conhecidos dos estudantes (Copacabana, praia da Rocha, no Algarve e também na praia Azul, a Norte de Espinho). Este processo pode servir de complemento aos outros métodos de defesa costeira. Porém, não está isento de dificuldades: o seu custo é muito elevado e não é fácil encontrar areias que permitam um bom uso balnear (as areias de dragagens muitas vezes estão poluídas). Em litorais muito energéticos, como é a costa ocidental portuguesa, é um processo que tem que se repetir periodicamente, com as consequências que se calculam em termos económicos. Mais económico e igualmente interessante sob o ponto de vista de reposição do equilíbrio natural da linha de costa é o processo de by-passing, através do qual as areias retidas a barlamar, por exemplo, de uma estrutura portuária, são aspiradas e recolocadas a sotamar dessa estrutura. Porém, nem sempre os interesses económicos permitem que essa solução seja adoptada… Na figura 163 é possível ver o crescimento da praia e da duna situada a norte do esporão que se situa na saída da barra de Aveiro, protegendo-a do entulhamento que a deriva litoral provocaria naturalmente. A acumulação de areias nesse troço é muito intensa… mas intensa era também a 226 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral circulação de camiões de areia que retiravam as areias de S. Jacinto para as levar daí para a construção civil. Falava-se de uma camião de areia por minuto (Prof. Veloso Gomes, comunicação oral, Outubro de 1996). Entretanto, à míngua de areias, a Costa Nova e a Vagueira iam sendo protegidas à custa do erário público… As dunas e a protecção das praias Na perspectiva de um intercâmbio dentro do sistema praia-duna, a existência de dunas funciona como um dos melhores elementos de defesa costeira. Porém, o uso balnear intensivo das praias acaba por destruir, devido ao pisoteio das dunas, a sua vegetação. A figura 197 mostra o papel da vegetação na resistência das dunas à erosão. As sendas formadas pelo pisoteio podem ser aproveitadas pelo vento para criar corredores de deflação, que podem transformar-se em blowouts. Em período de tempestades, estes blow outs (fig. 198) são muitas vezes sede preferencial de galgamentos (washover) por onde o mar penetra, destruindo parte do cordão dunar e produzindo um processo de salinização nas áreas baixas existentes no reverso das dunas (fig. 137). Daí que o planos de ordenamento da orla costeira (POOCs) tenham empreendido a construção de passadiços que permitem o acesso às praias (fig. 199), preservando a vegetação que protege as dunas. A consciência deste facto, que começa a ser criada entre os organismos responsáveis pela preservação do ambiente, tem contribuído para a implantação de paliçadas nas dunas frontais das nossas praias (fig. 200). (Des)ordenamento versus educação ambiental Esta nova consciência ambiental levou algum tempo a ser implementada. Durante décadas, as pessoas foram construindo habitações de férias clandestinas nas dunas e noutros locais afectos ao domínio público marítimo (fig. 201). A destruição que tem vindo a ser empreendida (Portinho da Arrábida, Costa da Caparica) é uma medida dolorosa, mas de grande significado na educação cívica e ambiental do público. É pena que o processo da Ilha de Faro, onde ao problema da ocupação muitas vezes ilegal se junta uma erosão preocupante, não tenha sido implementado com a mesma coragem política… Porém, no caso de prédios legais como as torres de Ofir (fig. 202), a intervenção pública torna-se mais difícil e fica dependente da vontade política que, como já se viu, pode mudar com os governos. A utilização intensiva das áreas litorais para fins turísticos deve obrigar a um processo de ordenamento que obedece a alguns princípios elementares. A figura 203 enuncia esses princípios de uma forma gráfica: • As estradas litorais devem ser perpendiculares e não paralelas à linha de costa. • Os parques de estacionamento devem ficar situados atrás do cordão dunar e ter uma forma que conduza os utentes para a utilização de passadiços. • Os passadiços devem ser a única forma de transposição do cordão dunar. Este deve ser protegido através de sebes que dificultem o mais possível a passagem para as dunas. 227 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Sabemos, porém que todas essas boas intenções esbarram contra a ignorância e a falta de civismo. Assim, a bonita ponte pedonal construída na praia de Labruge, que ficou pronta na primavera de 2002, no verão deste ano já apresentava sinais de vandalismo (figura 204). Quer isto dizer que, além das boas intenções e das boas políticas ambientais por parte das entidades interessadas, é preciso que o público compreenda a utilidade dessas medidas e esteja empenhado em defender o seu património ambiental e cultural. Infelizmente, o triste espectáculo das praias e dunas transformadas em lixeiras (fig. 205) não foi ainda erradicado, e coexiste com obras apreciáveis e estimáveis como a da ponte pedonal da figura 204… A poluição das praias A poluição da faixa costeira resulta, em boa parte, do facto de o litoral ser uma área onde se acumulam muitas das pessoas e das actividades económicas que existem no nosso país (ver figs 1 e 2). As principais cidades de Lisboa e Porto situam-se em estuários que recebem os efluentes domésticos e muitos efluentes industriais não tratados. Os rios são usados como um meio de nos desembaraçarmos do lixo. Ora, esse lixo levado até ao mar acaba sempre por ser redistribuído nas praias, mas não sem antes os plásticos terem contribuído, para a morte (por sufocação ou por ingestão), de um número apreciável de animais marinhos. Pior ainda do que a poluição de que falámos, dada a capacidade de sobrevivência e de contaminação dos hidrocarbonetos, é aquela que resulta das marés negras, como aquela que acaba de se produzir na Galiza e que está prestes a atingir a costa portuguesa. Aí, os conhecimentos de ondas e marés, mas também da geomorfologia do litoral podem ter um papel decisivo na prevenção e na definição das áreas de maior risco e da melhor maneira de protegêlas. A posição de Portugal, na rota de um intenso tráfego marítimo, acaba por levar à invasão periódica de sectores mais limitados da costa por uma série de marés negras de menores dimensões, que são o resultado da lavagem dos tanques dos petroleiros, feita quer no alto mar quer junto à linha de costa. Os POOCs (Planos de Ordenamento da Orla Costeira) À falta da consciência ambiental por parte do público, a atitude das entidades públicas terá que ser o ponto de partida nesse processo e devem ser encarecidos os esforços feitos nos últimos anos no sentido de produzir, aprovar e implementar os POOCs (Planos de Ordenamento da Orla Costeira, figura 206). Os POOCs nem sempre contaram com um conhecimento suficiente do terreno. Algumas vezes esse desconhecimento permitiu, pelo menos, que os mapas de condicionantes contenham erros de identificação (fig. 207) e propostas desajustadas à realidade geomorfológica do terreno (construção de passadiços em áreas de arriba, por exemplo). Porém, num país onde imagens como a da figura 205 ainda são comuns, os POOCs foram um razoável começo. 228 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Ainda não sabemos se, no confronto entre os POOCs e os PDMs (a definição das áreas de protecção entra frequentemente em conflito com as áreas destinadas à construção previstas nos ditos PDMs), a lei mais forte (isto é, os POOCs) vai levar a melhor sobre os mais fortes (isto é, os promotores imobiliários e as autarquias que querem aumentar a receita da contribuição autárquica…). Talvez, por isso mesmo, nunca se viram tantas construções a serem iniciadas no litoral (concretamente na praia de Labruge) como nas vésperas dos momento em que o POOC Caminha-Espinho começou a ser implementado… Aula Prática Com base nos documentos apresentados na aula teórica, e ainda: • textos encontrados na Web; • recortes de jornais (nomeadamente as crónicas de Luísa Schmidt no Expresso); • mapas incluídos no POOC Caminha Espinho; • legislação aplicável; será feita uma discussão deste tema, da qual resultará a construção de um organigrama do tipo do apresentado na figura 208. Bibliografia utilizada ARAÚJO, M. A., (2002) - Relative sea level, diastrophism and coastal erosion: the case of Espinho (Portuguese NW coast), publicado nas Actas do Congresso Internacional Littoral 2002, organizado pela Associação Eurocoast-Portugal, Vol. 2, p. 125-132. BIRD, E. C. F., (1993) - Submerging Coasts. The Efects of a Rising Sea Level on Coastal Environments, John Wiley & Sons, Chichester, 184 p. BIRD, E. C. F., (2001) - Coastal Geomorphology. An introduction, J. Wiley & Sons, 322 p. CARTER, R.W.G. - (1989) - Coastal Environments - An Introduction to the Physical, Ecological and Cultural Systems of Coastlines, Academic Press Limited. London, 5ª Impressão, 617 p. DIAS, J. M. A. et. al. (1997) - Evolução da linha de costa, em Portugal, desde o último máximo glaciário até à actualidade: síntese dos conhecimentos, Estudos do Quaternário, APEQ, Lisboa, p. 53-66. Aula 10: riscos e ordenamento DEPARTMENT of the ENVIRONMENT - (1995) - Coastal Planning and Management: A review of Earth Science information needs, HMSO, London, 186 p. GRANJA, H. M, SOARES DE CARVALHO, G. - (1995) - Sea-Level Changes During the Pleistocene-Holocene In the NW Coastal Zone of Portugal. In Terra Research, Blackwell Science, p. 60-67. 229 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral KOMAR, p. D., (1998) - Beach Processes and Sedimentation, Prentice Hall, New Jersey, 543 p. MOTA-OLIVEIRA, I. B., (1990) - Erosão costeira no litoral Norte: considerações sobre a sua génese e controlo, Actas do 1º Simpósio sobre a protecção e revalorização da faixa costeira do Minho ao Liz, Inst. Hidráulica e Recursos Hídricos, Porto, p. 201-221. PASKOFF, R. - (1985) - Les littoraux - impact des aménagements sur leur évolution, Col. Géographie, Paris, Masson, 185 p. PASKOFF, R., (2001) - L’élevation du Niveau de la Mer et les Espaces Côtiers, Institut Océanographique, Col. Propos, 190 p. SANTOS, F. D, FORBES, K , MOITA, R. (editores) (2002) – Climate change in Portugal. Scenarios, impacts and adaptation mesures (Siam project), Gradiva, F. C. Gulbenkian, FCT, Lisboa, 454 p. THURMAN, H. V., (1997) - Introductory Oceanography, Prentice Hall, New Jersey, 544 p. VILES, H., SPENCER, T. - (1995) - Coastal Problems - Geomorphology, Ecology and Society at the Coast, Edward Arnold, London, 350 p. MINISTÉRIO DO AMBIENTE E RECURSOS NATURAIS-FBO, (1999) - POOC Caminha-Espinho, Cartas de condicionantes, Plantas de Síntese e Planos de Praia, Lisboa Figura 188: Comparação entre a carga sólida transportada pelos rios do Norte de Portugal numa situação natural e após a construção das barragens Minho Âncora Lima Neiva Cávado Ave Douro Actual sediments Natural situation 0 400000 800000 1200000 1600000 230 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 189: Redução da área das bacias de drenagem portuguesas devido à construção das barragens Figura 190: Recuo das arribas a leste de Quarteira (Vale de Lobo, Algarve). 231 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral 232 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 191: O impacto das obras transversais na dinâmica da linha de costa Figura 192: Comparação entre o mapa topográfico 1:25.000 (folha 143-Espinho, 1978) e as fotografias áéreas do site http://ortos.igeo.pt/ortofotos/ 233 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 193: O impacto de um quebra-mar destacado na evolução da linha de costa Figura 194: A construção de um paredão na frente de uma duna em processo de erosão 234 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral acaba por produzir uma reflexão das ondas que tende a aumentar a energia disponível para o transporte das areias. Figura 195: Quebra-mares destacados na costa mediterrânica de Espanha 235 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 196: Análise da destruição do molhe de Sines (Fevereiro de 1978). 236 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 197: O papel da vegetação na resistência das dunas à erosão. Praia de Cortegaça. Figura 198: Corredores de deflacção cortados em arriba pelo avanço do mar. A Sul da praia da Torreira. Figura 199: O passadiço de Francemar permitiu minorar a degradação das dunas. Ano de 2000. 237 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 200: Paliçadas na praia de Labruge: Novembro de 2002. É perfeitamente visível o processo ondulatório que produz a deposição das areias a sotavento das paliçadas. Figura 201: Ocupação clandestina das margens da ribª de S. Pedro, na Praia Velha (S. Pedro de Muel), nos anos 80. 238 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 202: Dois casos de construção na praia ou na duna frontal: barra de Aveiro e as tristemente célebres Torres de Ofir. Fig 203: Esquema sobre as tácticas que podem ser usadas para minorar o processo de degradação das dunas. 239 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 204: Ponte pedonal de Labruge, sobre o Rio Donda. Agosto de 2002. Figura 205 : Depósito de lixos domésticos e da construção civil sobre a arriba da praia de Labruge (2001). 240 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 206: Os POOCs e as grandes regiões estruturais de Portugal 241 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 207: Carta de condicionantes do POOC Caminha-Espinho. 242 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 208: As respostas da sociedade à elevação do nível do mar Aula 14: Sumário: Apresentação dos trabalhos dos alunos Os trabalhos serão entregues algum tempo antes, de modo a poderem ser lidos e anotados pelo Professor. Cada grupo de alunos fará uma curta apresentação dos seus trabalhos. Essa apresentação será feita de preferência através do data show que existe no laboratório de Geografia Física e recorrendo a programas como o MS Power Point ou Adobe Acrobat. A essa apresentação seguirse-á uma discussão orientada pelo Professor mas em que todos os estudantes da disciplina podem participar. 243 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Aula 15: Sumário: Apresentação dos trabalhos dos alunos (conclusão). Auto e hetero-avaliação. Aprendizagem de construção de páginas Web para a colocação de uma síntese (supervisionada pelo Professor) dos respectivos relatórios na página Web da disciplina. Saídas de campo Como foi dito no início, as saídas de campo serão parte integrante da disciplina. Tratando-se de uma disciplina de opção em que o número de estudantes não deverá ser muito elevado, as saídas serão programadas com alguma flexibilidade, recorrendo a meios de transporte próprios. Isso dá-nos a possibilidade de marcar as saídas com uma pequena antecedência, escolhendo a altura mais adequada de acordo com: • as matérias tratadas nas aulas teóricas e práticas; • as marés; • o tipo de tempo previsível. Como se pretende que haja uma adaptação o mais estreita possível entre as reacções e os interesses do alunos e o trabalho de campo é evidente que aquilo que vai ser dito não passa de um guião muito elementar, que será desenvolvido de forma diferenciada e tanto quanto possível adaptada às circunstâncias. Também estes tópicos resultam do desenvolvimento das nossas ideias sobre a prática de leccionação dos Seminários em Geografia Física que já vem do ano lectivo de 1990-1991. Saída de campo 1. Esta saída de campo deverá ser marcada numa manhã de maré baixa viva. Percurso: Porto, Gião, Vila Chã, S. Paio, Labruge, Boa Nova, Foz do Douro, Lavadores. Objectivos: • Trabalho com cartas topográficas e geológicas; • Aprendizagem da orientação de mapas e identificação da localização no terreno recorrendo à carta e à bússola; • Aprendizagem do trabalho com a bússola. Identificação de direcção e pendor de estruturas geológicas (filões, fracturas, falhas); • Influência da litologia (granitos alcalinos e calco-alcalinos, gneisses e migmatitos da praia de Vila Chã); • Reconhecimento de formas litorais (marmitas, plataformas de erosão marinha, entalhes basais, arribas); • Influência da tectónica (a falha do Gião, fig. A); 244 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral • Escalonamento de formas e depósitos litorais. O entalhe basal fóssil do S. Paio e seu significado (fig. B); • Processos actuantes na plataforma de erosão marinha de Lavadores (fig. C); • Recolha de algumas amostras de sedimentos litorais (areias de praia, de duna, de estuário) para posterior tratamento. Saída de campo 2: Dado que as praias de Cortegaça e Maceda se situam a uma distância que ronda os 30kms, justifica-se que esta saída de campo ocupe um dia inteiro de trabalho. Além disso, a duração de uma manhã e uma tarde permitirá ver como se faz a evolução da maré e fazer alguns cálculos simples sobre a cota atingida pelo mar nos diferentes momentos. Se possível, também desta vez seria interessante que a visita se realizasse durante um dia de maré viva. Objectivos gerais: • Identificação das partes constituintes de um perfil de praia; • Perfis reflexivos e dissipativos (fig. G); • Construção de um perfil de praia (fig. H); • Estruturas sedimentares (crescentes de praia, ripples de ondulação e de corrente, imbricação de calhaus, estratificação entrecruzada planar); • Análise macroscópica de areias de praia e duna ao longo da linha de costa; • O papel da erosão e o enriquecimento em minerais pesados (figs 132 e 133). O percurso corresponderá ao caminho pelo litoral a Sul de Lavadores até à Praia de S. Pedro de Maceda. Serão feitas paragens em diversos locais com os seguintes objectivos específicos: • Lavadores: o estuário do Douro. O Cabedelo e as suas variações de forma e posição (figs. 152 e 153). • Salgueiros (formas de erosão no granito de Lavadores, fig. 102); • Madalena (o exutor submarino e a perturbação que ele provocou no traçado da linha de costa, mapa da fig. D); • Praia Atlântico (a erosão das areias devida à construção do exutor submarino faz aparecer depósitos solifluxivos e lagunares (figura E); • Praia de Francelos: esta praia foi o local onde a erosão produzida pela construção do exutor submarino da Madalena foi mais intensa (fig. F); • Praia de Miramar: visita ao rochedo do Sr. da Pedra: o entalhe basal (fig. 101) e as formas do tipo alvéolo (fig. 113); • Praia da Aguda: visita ao parque das Dunas. Morfologia e vegetação das dunas. A importância da preservação das dunas e da educação ambiental; • Praia da Aguda-Granja: a construção do quebra mar destacado e os fenómenos de erosão associados (fig. 172); 245 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral • Espinho: os esporões e a alimentação artificial na praia Azul. Histórias de erosão (fig. I); • Paramos: Fenómenos de erosão. Os problemas humanos decorrentes do desaparecimento da pesca (arte xávega). Entrevista com a população local sobre o tema. Relação entre os problemas de erosão e a construção dos esporões de Espinho; • Lagoa de Esmoriz: mudanças de traçado, sedimentos lagunares, slikke e schorre. Dunas embrionárias. O excesso de ocupação do litoral; • Cortegaça: o enrocamento e o (quase) desaparecimento da praia. O corte na duna fóssil de Cortegaça (fig. 141). O significado dos níveis lagunares e do solo podzólico. • Percurso Cortegaça-Maceda: Diferentes sistemas de dunas (fig. 140) orientação e grau de pedogénese; • Praia de S. Pedro de Maceda: os níveis lagunares: comparação com a sua situação em Cortegaça; Saída de campo 3: Percurso: Carregal-Arrábida Shopping-Picão-Lavadores. Trata-se de um percurso destinado a mostrar os depósitos de fácies fluvial e marinho existentes na plataforma litoral na área a sul do Douro (mapa da fig. J): 1. Depósitos de carácter fluvial que se situam sempre acima dos 50m. a. Estes depósitos podem ainda ser subdivididos em 2 conjuntos: Um conjunto mais antigo de depósitos fluviais relativamente bem calibrados, formados num ambiente de planície aluvial (fase I, corte do Carregal, fig. K). b. Um outro conjunto, mais recente, englobando blocos de sedimentos do tipo anterior e com um carácter nitidamente torrencial (fase II, corte do Arrábida Shopping-fig.L, corte do Picão). 2. Depósitos marinhos (que poderiam também designar-se como terraços marinhos ou praias levantadas, de acordo com a designação clássica que lhes foi, muitas vezes, atribuída) que se encontram a cotas que nunca ultrapassam os 40m. A separação existente entre os depósitos de fácies marinho e fluvial é acentuada pela existência de um degrau topográfico geralmente bem sensível (por exemplo à latitude da Madalena, ver fig. D). Quanto aos depósitos marinhos, as suas características sedimentares e situação topográfica permitiram definir um escalonamento de 3 níveis. • Os depósitos que se apresentam em manchas mais extensas são, normalmente, aqueles que se situam na proximidade dos depósitos fluviais, a altitudes compreendidas entre 30 e 37m. Trata-se de depósitos geralmente espessos, que assentam sobre um substrato rubefacto, bastante alterado, e que designaremos como “nível 1” (Lavadores, fig. M). 246 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral • Os depósitos do “nível 2” apresentam uma certa ferruginização (cor acastanhada), assentam sobre um substrato cuja alteração, menos intensa que a do nível precedente, lhe confere uma cor esbranquiçada, e situam-se a altitudes de 18-15m (Lavadores, fig. N). • Os depósitos do “nível 3” aparecem a cotas geralmente inferiores a 10m, e em certos locais chegam a atingir o nível actual das marés baixas (praias de Francelos, da Aguda e da Granja). Apresentam uma cor castanha, que corresponde a uma ferruginização bastante intensa, que os transforma, por vezes, em verdadeiros conglomerados. O seu bed-rock apresenta apenas uma alteração incipiente e uma pâtine castanha ou alaranjada, obviamente relacionada com a migração de ferro que condicionou a cimentação do depósito suprajacente (fig. P). Ainda junto à praia de Lavadores encontramos deformações de origem aparentemente tectónica em depósitos dos níveis II e III (fig. O). Figura A: A falha do Gião afecta um depósito presumivelmente fini-terciário/quaternário. É um exemplo pedagógico para comprovar a actividade tectónica recente 247 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura B: Entalhe basal fóssil a uma cota de 9m acima do nível médio daságuas do mar (S. Paio, Labruge, Vila do Conde) Figura C: Plataforma de erosão marinha de Lavadores. A maré deveria estar praticamente no seu ponto médio, o que significa que o mar estava à cota 0. 248 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura D: Reprodução parcial do mapa 1:25.000, folha 122 (Porto). Edição de 1999 249 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura E: Afloramento de depósitos de tipo lagunar na praia Atlântico (entre Valadares e Francelos). Aspecto de pormenor das fendas de retracção encontradas nesse depósito Figura F: Erosão da praia de Francelos e destruição de parte do bar “Titanic”. 31 de Dezembro 1999. 250 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura G: Praias dissipativas, intermédias e reflexivas. Figura H: Processo de elaboração de perfis de praia. 251 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura I: O recuo da linha de costa em Espinho. Figura extraída do Guia de Portugal (Entre Douro e Minho) da Fundação Calouste Gulbenkian. 252 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura J: Esboço geomorfológico de um sector da plataforma litoral compreendido entre a Foz do Douro e a Praia da Madalena. Com base na carta topográfica 1/25.000. 253 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura K: O depósito da fase I do Carregal (128m) 254 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura L: O depósito do Carrefour (hoje inexistente; muito semelhante ao do Arrábida Shopping). Na foto de baixo, pormenor do corte anterior. 255 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura M: O depósito do nível marinho I de Lavadores (35m) Figura N: O depósito do nível II de Lavadores (18m) 256 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura O: O depósito marinho do nível II de Lavadores e a sua afectação provável por uma falha inversa Figura P: Entalhe basal nos granitos de Lavadores, fossilizado por um depósito (Eemiense?). Praia de Lavadores, cerca de 5-6m. 257 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Índice das Figuras Figura 3 Densidade da população nos concelhos do litoral 27 Figura 4: Penetração dos nevoeiros de advecção no litoral da região do Porto 29 Figura 5: Classificação dos litorais essencialmente baseada na situação estrutural 32 http://www.nautigalia.com/elninoylanina/index3.htm 35 Figura: 6: Estrutura dipolar da molécula de água. Ligações iónicas e covalentes 37 Figura 7: A penetração da energia solar na água do mar 38 Figura 8: Variação da temperatura, salinidade e densidade da água com a latitude e a profundidade 39 Figura 9: Balanço energético de Janeiro e Julho 40 Figura 10: Correntes quentes e frias e áreas de upwelling 41 Figura 11: Direcção dos ventos versus direcção das correntes marítimas. A espiral de Ekman 42 Figura 12: A circulação em superfície e em profundidade. Conveyor belt 43 Figura 13: Relação entre a direcção dos alíseos e as correntes por eles geradas. O upwelling. 44 Figura 14: Exemplos de situações de upwelling na costa ocidental da Península Ibérica. Adaptado de O. Ribeiro, H. Lautensach e S. Daveau, vol. I, 1987 45 Figura 15: Circulação ao longo da costa portuguesa em Agosto, Novembro e Dezembro 46 Figura 16: Corrente de Davidson ao largo da costa da Califórnia 46 Figura 17: Tipos de ondas 52 Figura 18: Características essenciais das ondas orbitais 53 Figura 19: Relações entre o comprimento de onda, o período e a velocidade das ondas 53 Figura 20: Modificações sofridas pelas ondas quando se aproximam da linha de costa 54 Figura 21: Ondas de águas profundas, intermédias e pouco profundas 54 Figura 22: A transmissão da energia do vento para as ondas 55 Figura 23: Ondas de capilaridade e de gravidade 55 Figura 24: Área de origem da ondulação e Swell 56 Figura 25: Interferência de ondas 57 Figura 26: Vagas por derramamento, em voluta e em rolo (surging) 58 Figura 27-A: A refracção das ondas quando se aproximam da costa 58 Figura 27-B: Refracção das ondas 59 Figura 28: Reflexão das ondas 59 Figura 29: Difracção das ondas 60 Figura 30: Ondas estacionárias 60 Figura 31: Storm surge 61 Figura 32: Processo de criação dos tsunami 61 Figura 33: O tsunami que se seguiu ao sismo de Lisboa de 1755 62 Figura 34: Importância relativa das marés geradas pela Lua e pelo Sol 68 Figura 35: O sistema de rotação Terra-Lua. O baricentro 69 Figura 36. Trajectórias seguidas pela Terra e pela Lua ao longo do ano 70 Figura 37: Rotação Terra-Lua: todos os pontos da Terra descrevem trajectórias idênticas em torno do baricentro. A força centrípeta que mantém o sistema em rotação conjunta é igual em todos os pontos da Terra. 71 Figura 38: A existência de forças gravitacionais diferentes consoanter a posição de cada ponto em relação à Lua implica a existência da força de maré 72 Figura 39: Maré alta directa e reflexa 73 Figura 40: Dia Lunar: ao longo de um dia solar a Lua gira 12° e 12’. Por isso, para o observador voltar à posição inicial relativamente à Lua, é necessário que a Terra gire mais 12° e 12’. Desta forma, o dia lunar tem 24h e 50min. 73 Figura 42: Marés vivas e mortas 74 Figura 43: Interferência entre as marés lunares e solares 75 Figura 44: Variação da distância da Terra ao Sol e da Terra à Lua 76 258 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 45: Fases da Lua e variação da distância da Lua à Terra e da declinação lunar (Março de 1981) 76 Figura 46: Variação da declinação da Lua: ciclo de 18,6 anos. 77 Figura 47: Variação na amplitude das marés durante o dia: as marés tropicais 77 Figura 48: Variação da declinação solar ao longo do ano: as marés equinociais 78 Figura 49: tipos de marés. Semidiurnas, mistas e diurnas 79 Figura 50: variações na altura da maré devidas a causas meteorológicas: storm surge de 14-16 de Outubro de 1987 na costa portuguesa 80 Figura 51: Permanência do nível do mar a diversas alturas. Caso de marés semidiurnas e diurnas. 81 Figura 52: Propagação da onda de maré 82 Figura 53: Linhas cotidais e pontos anfidrómicos a nível do globo 83 Figura 54: Linhas cotidais no Atlântico 84 Figura 55: A propagação da maré ao longo da costa ocidental da Península Ibérica 85 Figura 56: A penetração da maré ao longo de um estuário (macaréu) 86 Figura 57: Relação entre a o tipo e a frequência de diversos tipos de paisagens costeira e a amplitude das marés 87 Figura 59: O papel das variações relativas do nível do mar no avanço ou recuo da linha de costa 95 Figura 60: Os factores em jogo nas variações relativas do nível do mar 95 Figura 61: Processo de determinação do nível do mar a partir da altimetria espacial 96 Figura 62: Deformações da superfície do geóide 97 Figura 63: As grandes fases na evolução do nível do mar durante o Fanerozóico e a sua relação com o efeito de estufa (G. de Greenhouse) e com as fases de glaciação (I de Ice) 97 Figura 64: Duas curvas eustáticas para o Fanerozóico 98 Figura 65: Variação climática no final do Cenozóico (extraído de Andersen e Borns, 1994) 99 Figura 66: Variação climática e do nível do mar durante o Quaternário (fig. extraída do site http://www.soest.hawaii.edu/coasts/csrg1.html) 100 Figura 67: Configuração da linha de costa e rede de drenagem na área das Ilhas Britânicas e do mar do Norte 101 Figura 68: Variações da linha de costa de Portugal a partir de 18.000BP 102 Figura 69: Proposta de variação do nível médio do mar na margem continental portuguesa desde o último máximo glaciário 103 Figura 70: O rebordo do inlandsis e o seu colapso no período pós-glaciar 103 Figura 71: Taxa das variações relativas do nível do mar nas áreas glaciadas e na sua periferia 104 Figura 72: Recentes variações do nível do mar à volta da ilhas Britânicas. É de notar a existência de variações importantes na taxa de variação mesmo em locais bastante próximos. 105 Figura 73: Tendências da variação relativa do nível do mar verificadas nas estações maregráficas da Península Ibérica 106 Figura 74: Subsidência versus levantamento devidos a fenómenos de hidro-isostasia 107 Figura 75: Localização dos litorais subsidentes a nível do Globo 108 Figura 76: Variações recentes do nível médio relativo do mar em 6 estações 109 maregráficas 109 Figura 77: Taxa de variação do nível do mar no período de Janeiro de 1993 a Dezembro de 2000 110 Figura 78: Variação do nível do mar de 1700 até 1970 111 Figura 79: Tendências no comportamento do nível relativo do mar em diferentes locais do mundo, com base em séries maregráficas com mais de 70 anos. 112 Figura 80: As projecções do IPCC: relatório de 1991 (extraído de E. Bird, 1993) 113 Figura 81: As projecções do IPCC (relatório de 2001: 113 Extraído de: http://www.ipcc.ch/pub/spm22-01.pdf 113 Fig. 82: As taxas de variação do nível do mar, respectivos intervalos e sua variação no tempo 114 Figura 83: A curva do marégrafo de Cascais 115 Figura 84: Paisagens e terminologia nos litorais rochosos 123 Figura 85: O balanço sedimentar num determinado sector costeiro 124 Figura 86: Tipos de rebentação na base das arribas 124 Figura 87: Distribuição das pressões actuando na base das arribas com ondas estacionárias, a quebrar ou já quebradas 125 Figura 88: Distribuição vertical da energia produzida pelo quebrar das ondas 125 Figura 89: Relação entre a fadiga dos materiais, o número de ciclos de pressão e a existência ou não de água 126 259 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 90: O papel da profundidade e da decorrente diminuição da porosidade na 126 resistência de uma rocha granítica 127 Figura 91: o sistema de recuo das arribas: a erosão basal é essencial para um recuo contínuo da arriba. 127 Figura 92: Velocidade de recuo de uma arriba artificial e formação de uma praia na sua frente. O entalhe desenvolve-se obliquamente, originando uma rampa. 127 Figura 93: Velocidade de escavamento de uma arriba composta de areia aglutinada por um cimento. 128 Figura 94: Movimentos de massa nas arribas 129 Figura 95: Formas de entalhes basais em rocha não calcária 130 Figura 96: Os três tipos fundamentais de morfologia nas costas rochosas: plataforma descendo para o mar, plataforma horizontal e arriba mergulhante 131 Figura 97: Perfis de algumas plataformas de erosão marinha situadas na costa portuguesa 132 Figura 98: Antiga plataforma de erosão marinha; é de notar a existência de um sector inferior, com baixo declive (1) e uma rampa (2) que, neste caso tem um declive de cerca de 13° (Praia de Vila Chã, Vila do Conde). Nesse momento o nível do mar estava praticamente no nível médio. A seta corresponderia ao nível médio do mar contemporâneo da plataforma. Este situar-se-ia claramente acima do nível actual 133 Figura 99: Tipos e desenvolvimento de entalhes basais em ambiente de laboratório 133 Figura 100: Costa da Galiza: colocação de instrumentos de medida da degradação da superfície em plataformas de erosão marinha (Micro Elevation Meter, MEM), feita sob a supervisão de A. Trenhaile. 134 Figura 101: Entalhe basal em gneisses muito resistentes. Rochedo do Srª da Pedra, Miramar, V. Nova de Gaia 135 Figura 102: Entalhe basal e rochas pedunculadas na praia de Salgueiros, V. Nova de Gaia 136 Figura 103: Entalhe basal desenvolvendo-se em rampa a partir do nível da maré baixa. Praia de Vila Chã, Vila do Conde 136 Figura 104: Entalhe basal desenvolvendo-se em rampa e plataforma de erosão marinha adjacente (parcialmente coberta de areias). A sul da Praia de S. Paio, Labruge, Vila do Conde 137 Figura 105: Formas litorais (plataformas do tipo B) em diversso tipo de rocha, nas regiões tropicais 138 Figura 106: O aproveitamento das superfícies de descontinuidade no desenvolvimento de uma pequena gruta no granito calco-alcalino de Lavadores. Esta reentrância desenvolve-se acima do nível das marés mais altas, numa área muito exposta e deverá corresponder a uma herança de um nível relativo do mar ligeiramente mais alto 139 Figura 107: Arcos de erosão: Praia de As Catedrais, Litoral Norte da Galiza, entre Foz e Ribadeo (Concelho de Barreiros, Província de Lugo). 140 Figura 108: Fotografia aérea da praia das Catedrais, com indicação de algumas das direcções estruturais mais relevantes 141 Figura 109: Aspecto do carso exumado da Ponta da Piedade (Lagos, Algarve). Frente ao arco podem ver-se 2 pináculos (sea stacks) 141 Figura 110: Pináculo resultante de um dique intruído nas rochas basálticas (Madeira. Extraído do site http://www.trekdiary.com/99mad5.html 142 Figura 111: Conjunto de marmitas orientadas pela acção de fracturas: Praia de Lavadores (V. Nova de Gaia) 143 Figura 112: Bacia de dissolução no beach rock da Praia do Xai-Xai (Moçambique) 144 Figura 113: Alvéolos nos gneisses biotíticos muito resistentes do rochedo do Sr. da Pedra (Praia de Miramar, V. Nova de Gaia). Altitude: cerca de 9m acima do nível médio das águas do mar. 144 Figura 114: Ganhos e perdas de areias numa praia. As praias de calhaus têm ganhos e perdas semelhantes, exceptuando no que diz respeito à acção do vento. 152 Figura 115: Arribas vivas, estabilizadas e mortas. 153 Figura 116: Tipologia da faixa costeira entre Caminha e Espinho. 153 Figura 117: Perfil de praia: o esquema simples de R. Paskoff. 153 Figura 118: Perfil de praia. Terminologia francesa de A. Guilcher. 154 Figura 119: Morfologia das praias: comparação de diferentes terminologias. 155 Figura 120: Tipos de praias consoante a respectiva configuração. 155 Figura 121: Tombolo formado pela ponta da Gafa na praia do Mindelo (Vila do Conde). 156 Figura 123: Relação entre o declive da praia e o calibre dos materiais que a formam. 157 Figura 124: Modo de formação dos crescentes de praia. 158 Figura 125: Crescentes de praia na Praia do Norte (a Norte do promontório da Nazaré). 158 Figura 126: Ilustração do princípio de Bruun. 159 Figura 127: Variação do perfil de uma praia entre a situação de verão e a situação de inverno. 159 260 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura 128: Bermas de praia. Foto extraída de http://www.pol.ac.uk/india/IND_updatefw.html 160 Figura 129: Variações de declive e tipo de sedimentação numa praia de calhaus. 160 Figura 130: As variações no pendor das lâminas numa praia reflectem diferenças no declive da face da praia. Figura extraída de: 161 http://www-geology.ucdavis.edu/~GEL109/SedStructures/SedStructures.html 161 Figura131: Marcas de corrente em depósitos litorais. Foto extraída do site 161 Figura 132: Processo que explica a erosão predominante nos grãos de quartzo ou feldspato relativamente aos grãos de minerais pesados. 162 Figura 133: Enriquecimento em minerais pesados de uma praia em erosão. Praia de Francelos (Vila Nova de Gaia). 162 Figura 134: Corrente em zig-zag e deriva litoral 163 Figura 135: Complementaridade no sistema praia-duna. 163 Figura 136: O papel dos obstáculos na formação das dunas embrionárias. 163 Figura 137: O vento vindo do mar, ao soprar sobre a duna frontal, desenvolve turbilhões que explicam a formação de depressões interdúnicas. 164 Figura 138: Dunas do tipo barkhan formadas por vento que sopra da terra para o mar. Julho de 2002, Narbonne Plage, costa do Languedoc, França. 164 Figura 139: Desenvolvimento sequencial de um sistema de dunas litorais. 165 Figura 140: Sistemas de dunas ao Norte da laguna de Aveiro. 166 Figura 141: Praia de Cortegaça: as setas separam os 3 conjuntos dunares existentes. 167 Figura 142: Corte esquemático e interpretação do sistema dunar das Landes. 168 Figura 143: Duna consolidada por cimento carbonatado: a sul de Porto Côvo. 168 Figura 144: Definição dos graus de rolamento dos grãos de quartzo (muito angulosos, angulosos, sub-angulosos, arredondados, redondos e muito redondos). Extraído de G. S. Carvalho, 1966. 169 Figura 145: Relação hierárquica entre forma, grau de rolamento e aspecto de superfície dos grãos. 170 Figura 147: A pluma do Mississipi. Imagem extraída de: http://earthobservatory.nasa.gov/Newsroom/NewImages/Images/modis_mississippi_sed_lrg.jpg 182 Figura 148: Variação da velocidade da corrente consoante a fase da maré 183 Figura 149: Correntes residuais e transporte de sedimentos nos estuários de cunha salina 184 Figura 150: Correntes residuais num estuário de mistura parcial 185 Figura 151: Correntes salina e fluvial num estuário de mistura total 185 Figura 152: Estuário do rio Douro em 1995 186 Figura 153: Evolução do Cabedelo nos útimos 150 anos (fonte: Administração dos portos do Douro e Leixões, APDL) 187 Figura 154: O corpo lodoso e a sua movimentação num estuário com cunha salina 188 Figura 155: Factores em jogo na evolução de um delta 188 Figura 156: Problemas de erosão no delta do Nilo devidos à retenção de sedimentos na barragem de Assuão. 189 Figura 157: Elementos constitutivos de uma laguna 189 Figura 158: O delta do Pó e a laguna de Veneza 190 Figura 159: Imagem de satélite da laguna de Veneza 190 Figura 160: Veneza durante a ”acqua alta” de 16 de Novembro de 2002 191 Figura 161: Valores máximos da altura da água atingidos em cada ano, de 1927 até 16 de Novembro de 2002 em Veneza 191 Figura 162: A evolução da Ria de Aveiro 192 Figura 163: O corte artificial na restinga de Aveiro 193 Figura 164: Imagem de conjunto da Ria Formosa 193 Figura 165: Evolução de uma laguna afectada por uma transgressão marinha 194 Figura 166: Evolução por segmentação das lagunas litorais 194 Figura 167: Processo de segmentação na lagoa do Bilene (Moçambique) 195 Figura 168: Schorre e Slikke nos estuários do rio Maputo (Moçambique) e do rio Sado (Portugal). 195 Figura 169: Aspecto do mangal junto à restinga da Praia dos Pescadores (Maputo, Moçambique) 196 Figura 170: Canal de maré: região de Maputo (Moçambique) 196 Figura 171: Distribuição das áreas de mangal e de sapal a nível do globo. 197 Figura 172: Depósitos lagunares encontrados na praia da Aguda (Vila Nova de Gaia) em Outubro de 2002. O seu 261 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral aparecimento fica a dever-se à erosão produzida pela implantação do quebra mar destacado da Praia da Aguda. 198 Figura 173: Reconstrução do padrão das principais correntes marítimas durante o mais recente ciclo de desintegração continental. 210 Figura 65 (repetição): Variação climática no final do Cenozóico (extraído de Andersen e Borns, 1994) 212 Figura 66 (repetição): Variação climática e do nível do mar durante o Quaternário (fig. extraída do site http://www.soest.hawaii.edu/coasts/csrg1.html) 213 Figura 175: Os ciclos de Milankovitch 214 Figura 176: Proposta de Riser (1999) para uma cronologia do Quaternário 215 Figura 177: Os estádios isotópicos: os últimos 140.000 anos 216 Figura 178: Curva isotópica para a Gronelândia. Dados extraídos de ftp://ftp.ngdc.noaa.gov/paleo/icecore/greenland/summit/grip/isotopes/gripd18o.txt 217 Figura 179: Cronologia do Tardiglaciar e do Holocénico 218 Figura 180: Curvas isotópicas do Tardiglaciar e do Holocénico 219 Figura 181: Evidência de variações do nível do mar: terraços marinhos emersos e submersos 220 Figura 182: A interacção entre o eustatismo e a isostasia podem produzir praias levantadas que se estendem para além da amplitude dos níveis eustáticos 220 Figura 183: A curva de Fairbridge sobre as variações do nível do mar durante o Quaternário e a sua disposição em escadaria Figura 6 220 Figura 184: Os terraços de coral na Península de Huon (Nova Guiné) 221 Figura 185: A separação entre a curva eustática e a subida tectónica na península de Huon (Nova Guiné) 222 Figura 186: Processo de desenvolvimento de um terraço marinho 223 Figura 187: Fotografia da situação descrita na figura 186. 224 Figura 188: Comparação entre a carga sólida transportada pelos rios do Norte de Portugal numa situação natural e após a construção das barragens 230 Figura 189: Redução da área das bacias de drenagem portuguesas devido à construção das barragens 231 Figura 190: Recuo das arribas a leste de Quarteira (Vale de Lobo, Algarve). 231 Figura 191: O impacto das obras transversais na dinâmica da linha de costa 233 Figura 192: Comparação entre o mapa topográfico 1:25.000 (folha 143-Espinho, 1978) e 233 as fotografias áéreas do site http://ortos.igeo.pt/ortofotos/ 233 Figura 193: O impacto de um quebra-mar destacado na evolução da linha de costa 234 Figura 194: A construção de um paredão na frente de uma duna em processo de erosão 234 acaba por produzir uma reflexão das ondas que tende a aumentar a energia disponível para o transporte das areias. 235 Figura 195: Quebra-mares destacados na costa mediterrânica de Espanha 235 Figura 196: Análise da destruição do molhe de Sines (Fevereiro de 1978). 236 Figura 197: O papel da vegetação na resistência das dunas à erosão. Praia de Cortegaça. 237 Figura 198: Corredores de deflacção cortados em arriba pelo avanço do mar. A Sul da praia da Torreira. 237 Figura 199: O passadiço de Francemar permitiu minorar a degradação das dunas. Ano de 2000. 237 Figura 200: Paliçadas na praia de Labruge: Novembro de 2002. É perfeitamente visível o processo ondulatório que produz a deposição das areias a sotavento das paliçadas. 238 Figura 201: Ocupação clandestina das margens da ribª de S. Pedro, na Praia Velha (S. Pedro de Muel), nos anos 80. 238 Figura 202: Dois casos de construção na praia ou na duna frontal: barra de Aveiro e as tristemente célebres Torres de Ofir. 239 Fig 203: Esquema sobre as tácticas que podem ser usadas para minorar o processo de degradação das dunas. 239 Figura 204: Ponte pedonal de Labruge, sobre o Rio Donda. Agosto de 2002. 240 Figura 205 : Depósito de lixos domésticos e da construção civil sobre a arriba da praia de Labruge (2001). 240 Figura 206: Os POOCs e as grandes regiões estruturais de Portugal 241 Figura 207: Carta de condicionantes do POOC Caminha-Espinho. 242 Figura 208: As respostas da sociedade à elevação do nível do mar 243 Figura A: A falha do Gião afecta um depósito presumivelmente fini-terciário/quaternário. É um exemplo pedagógico para comprovar a actividade tectónica recente 247 Figura B: Entalhe basal fóssil a uma cota de 9m acima do nível médio daságuas do mar (S. Paio, Labruge, Vila do Conde) 248 262 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Figura C: Plataforma de erosão marinha de Lavadores. A maré deveria estar praticamente no seu ponto médio, o que significa que o mar estava à cota 0. 248 Figura D: Reprodução parcial do mapa 1:25.000, folha 122 (Porto). Edição de 1999 249 Figura E: Afloramento de depósitos de tipo lagunar na praia Atlântico (entre Valadares e Francelos). Aspecto de pormenor das fendas de retracção encontradas nesse depósito 250 Figura F: Erosão da praia de Francelos e destruição de parte do bar “Titanic”. 31 de 250 Dezembro 1999. 250 Figura G: Praias dissipativas, intermédias e reflexivas. 251 Figura H: Processo de elaboração de perfis de praia. 251 Figura I: O recuo da linha de costa em Espinho. Figura extraída do Guia de Portugal (Entre Douro e Minho) da Fundação Calouste Gulbenkian. 252 Figura J: Esboço geomorfológico de um sector da plataforma litoral compreendido entre a Foz do Douro e a Praia da Madalena. Com base na carta topográfica 1/25.000. 253 Figura K: O depósito da fase I do Carregal (128m) 254 Figura L: O depósito do Carrefour (hoje inexistente; muito semelhante ao do Arrábida Shopping). Na foto de baixo, pormenor do corte anterior. 255 Figura M: O depósito do nível marinho I de Lavadores (35m) 256 Figura N: O depósito do nível II de Lavadores (18m) 256 Figura O: O depósito marinho do nível II de Lavadores e a sua afectação provável por uma falha inversa 257 Figura P: Entalhe basal nos granitos de Lavadores, fossilizado por um depósito (Eemiense?). Praia de Lavadores, cerca de 5-6m. 257 Índice Geral Programa da disciplina de Geomorfologia Litoral 1 I - Introdução 1 - Enquadramento da disciplina 2 - As lições extraídas de experiência(s) prévia(s) e a selecção das matérias a desenvolver 3 – Motivações e objectivos 4 - O grau de aprofundamento das matérias e a organização dos temas 5 - O processo de ensino e de aprendizagem e o carácter deste relatório 6 - Formação versus informação: a importância de transmitir atitudes 7 - Organização das aulas: a importância do apoio da informática. 8 - Métodos de avaliação 1 1 1 2 3 3 4 4 6 II - Bibliografia 9 III- Tópicos das aulas 24 1 – Introdução 24 Aula 1: Apresentação dos objectivos, programa, métodos de trabalho e de avaliação. Definição de litoral e motivações para o seu estudo Definição do conceito de litoral A zona costeira/litoral como interface. A diversidade dos litorais Aula prática Bibliografia utilizada 25 25 30 30 31 31 Aula 2: Origem e características da água do mar. As correntes marítimas Origem e características da água do mar O balanço da radiação e a circulação geral da atmosfera. A circulação geral da atmosfera e as correntes marítimas As correntes e os ventos: a espiral de Ekman 33 33 33 33 33 263 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Estrutura vertical dos oceanos e circulação termo-halina As correntes marítimas e a dissimetria das fachadas oceânicas O papel das correntes marítimas na regulação térmica terrestre. A importância da circulação oceânica nas variações climáticas Mecanismo e importância do upwelling. Alguns aspectos da circulação marítima na costa portuguesa Aula prática: Bibliografia utilizada Web sites 34 34 34 35 35 35 36 36 Aula 3: Ondas Como se deslocam as ondas: características gerais dos processos ondulatórios Características das ondas Ondas geradas pelos ventos Swell Padrões de Interferência Ondas livres e forçadas Ondas traiçoeiras (Rogue Waves) Rebentação (Surf) Refracção das ondas Difracção das ondas Reflexão das ondas Storm Surge Tsunami Aula Prática Bibliografia 47 47 47 48 48 49 49 49 50 50 51 51 51 51 52 52 Aula 4: Marés Mecanismos das marés, maré directa e reflexa Marés vivas e mortas Outras variações na amplitude das marés. Marés equinociais Marés diurnas, semi-diurnas e mistas Dinâmica das marés: linhas cotidais e pontos anfidrómicos Macaréu Amplitude das marés Aula Prática Bibliografia utilizada Websites 63 63 63 64 64 65 66 66 66 66 67 Aula 5: Variações do nível do mar Nível do mar como um conceito relativo A variação do nível do mar ao longo do Fanerozóico e as lições a extrair dessa variação Variações do nível do mar durante o final do Cenozóico: a influência do diastrofismo A influência das variações climáticas: a pequena idade do gelo e o aquecimento que se lhe seguiu A recente subida do nível do mar e as projecções para o futuro Prática Bibliografia Websites 88 88 88 90 92 93 93 93 94 Aula 6: Costas rochosas Introdução: definição de costas rochosas Factores a considerar na evolução das costas rochosas Tipos de ondas na base das arribas e sua dinâmica A resistência das rochas: alguns apontamentos sobre a meteorização em ambiente litoral Processos de erosão nas arribas Erosão submarina do bedrock 264 116 116 116 116 117 118 119 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral Plataformas de erosão marinha Algumas formas de erosão características Bibliografia utilizada: Web site: Prática: 119 121 122 123 123 Aula 7: Litorais móveis: praias e dunas litorais Introdução: costas rochosas versus litorais móveis Perfil de praia. Terminologia básica Rebentação e construção dos cordões litorais Regra de Brunn. Perfil de verão e de inverno. A distribuição dos calhaus nos depósitos de praia: imbricação e estruturas sedimentares. A deriva litoral: corrente em zig-zag Dunas litorais Desenvolvimento sequencial de dunas litorais Dunas actuais e dunas fósseis Aula Prática: Bibliografia utilizada: Websites 145 145 146 146 146 147 147 148 148 149 149 150 151 Aula 8: Estuários, deltas e lagunas Estuários Dinâmica e hidrologia dos estuários A cunha salina Algumas reflexões sobre o estuário do Douro Movimentação dos sedimentos nos estuários Os deltas Condições de formação dos deltas Lagunas O caso da laguna de Veneza A Ria de Aveiro Outras lagoas existentes na costa portuguesa A evolução das lagunas litorais Circulação dentro das lagunas Pântanos marítimos Bibliografia utilizada Websites: 172 172 172 173 174 175 175 175 176 176 178 178 179 179 180 180 181 Aula 9. O final do Cenozóico. Evolução dos litorais durante o final do Cenozóico. Introdução A variação climática no final do Cenozóico: o porquê da sua inclusão neste programa. O complexo jogo das interacções na criação de condições de arrefecimento ao longo do Cenozóico O aparecimento das condições para as glaciações do Quaternário Limites e métodos de estudo do Quaternário Evolução do clima durante o Pleistocénico médio O Pleistocénico recente: o Eemiense O Pleistocénico recente: a última glaciação O Tardiglaciar e o Holocénico Os litorais durante o final do Cenozóico: enquadramento geral e problemas metodológicos Noção de terraço. Formação dos terraços do litoral Bibliografia utilizada Aula Prática: 199 199 199 200 200 202 203 1 204 205 205 208 208 209 Aula 10: Fragilidades versus ordenamento do litoral A erosão costeira O papel das obras de defesa e protecção costeira 224 224 225 265 Maria da Assunção Araújo: Programa de Geomorfologia Litoral As dunas e a protecção das praias (Des)ordenamento versus educação ambiental A poluição das praias Os POOCs (Planos de Ordenamento da Orla Costeira) Aula Prática Bibliografia utilizada Aula 14: Sumário: Apresentação dos trabalhos dos alunos Aula 15: Sumário: Apresentação dos trabalhos dos alunos (conclusão). Saídas de campo 227 227 228 228 229 229 243 244 244 Saída de campo 1. 244 Saída de campo 2: 245 Saída de campo 3: 246 Índice das Figuras 258 266