® BuscaLegis.ccj.ufsc.br Guardas Municipais como Agentes de Trânsito - Estudo de Caso – Inconstitucionalidade Benevides Fernandes Neto* *Oficial da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Bacharel em Direito, Pós-graduando em Direito Administrativo pelo Centro Universitário do Norte Paulista (UNORP). E-mail: [email protected] O artigo ora apresentado nos reporta ao emprego de guardas municipais para o exercício da fiscalização de trânsito por vários municípios do Estado de São Paulo, mormente após a edição da Deliberação CETRAN/SP nº 01/2005, de 24 de junho de 2005, por meio da qual aquele órgão consultivo estadual firmou entendimento no sentido de que “a Guarda Municipal não tem competência para atuar na fiscalização de trânsito e nem, como decorrência, admissibilidade com vistas a aplicar multas de trânsito sob pena de nulidade das mesmas e, igualmente, não possui legitimidade para firmar convênio com o respectivo órgão de trânsito para tal fim, por força de norma constitucional”.[1] Inobstante tal fato, a Prefeitura Municipal de São José do Rio Preto, por meio do Decreto Municipal nº 13.105, de 16 de março de 2006, regulamentou o inciso II da Lei Complementar nº 177, de 29 de dezembro de 2003, elencando as atribuições inerentes aos ocupantes dos cargos de guardas municipais investidos na função de agentes de trânsito. Conquanto, pela análise de vários comandos normativos atinentes à espécie, elaboramos um estudo sobre a impossibilidade da utilização dos guardas municipais na fiscalização de trânsito, objetivando demonstrar o desvio de finalidade e ilegalidade do seu emprego como agentes de trânsito. Para tanto será efetuada uma pequena digressão sobre os mandamentos legais inerentes à Guarda Municipal de São José do Rio Preto, analisando-se as mudanças ocorridas desde a sua criação nos idos do ano de 1996 até a edição da Lei Complementar nº 177/2003. DA GUARDA MUNICIPAL A Constituição Federal de 1988 permitiu aos municípios a criação de guardas municipais, conforme previsão do § 8º do artigo 144, in verbis: “§ 8º - Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei”. Verifica-se claramente que a sua atribuição circunscreve-se à proteção de bens, serviços e instalações de próprios municipais, conforme a regulamentação que lhe dispuser a lei. A Carta Constitucional do Estado de São Paulo, por sua vez, dispõe em seu artigo 147 que: “Artigo 147 - Os Municípios poderão, por meio de lei municipal, constituir guarda municipal, destinada à proteção de seus bens, serviços e instalações, obedecidos os preceitos da lei federal”. As atribuições definidas nas Constituições Federal e Estadual foram repetidas pelo legislador municipal na Lei Orgânica do município de São José do Rio Preto/SP, conforme se vê pelo seu artigo 93, ipsis literis: “Artigo 93 - O Município poderá constituir Guarda Municipal, força auxiliar destinada à proteção de seus bens, serviços e instalações, nos termos de lei complementar. § 1º - A lei complementar de criação da Guarda Municipal disporá sobre o acesso, direitos, deveres, vantagens e regime de trabalho, com base na hierarquia e disciplina. § 2º - A investidura nos cargos da Guarda Municipal far-se-á mediante concurso público de provas ou provas e títulos. § 3º - Para a seleção e formação dos integrantes da Guarda Municipal, o Executivo poderá solicitar concurso de oficiais e praças da Polícia Militar do Estado ou das Forças Armadas Nacionais. § 4º - O Município aplicará anualmente nunca menos de 5% (cinco por cento) da Receita resultante de impostos na Segurança Pública. (Em. LOM 19/00), que acrescentou este parágrafo”.[2] Face aos permissivos legais acima mencionados, o Poder Executivo municipal encaminhou projeto de lei complementar à Câmara Municipal para criação da Guarda Municipal, resultando na aprovação da Lei Complementar nº 55[3], de 30 de maio de 1996, a qual prescrevia que a guarda municipal era entidade de caráter civil, integrando a Secretaria Municipal de Administração em nível de departamento (§ único do artigo 1º). Tinha por finalidade precípua a proteção e conservação do patrimônio, bens, instalações e serviços públicos municipais e apoio à Administração no exercício de seu poder de polícia administrativa para, respeitada a legislação e ressalvada a competência federal e estadual, e quando formalmente convocada, proteger o patrimônio, zelar pela segurança dos servidores, quando no exercício de suas funções, impedir atividades que violem normas da saúde, defesa civil, sossego público, higiene, segurança e outras mais que sejam do interesse da comunidade e informar e orientar a população (artigo 2º). Com o advento da Lei Complementar nº 177[4], de 29 de dezembro de 2003, estabeleceram-se novas disposições acerca da guarda municipal, conforme se vê em seus artigos 1º a 3º, in verbis: “Art. 1º - Fica criada a Guarda Municipal de São José do Rio Preto, instituição de caráter civil, uniformizada e que poderá ser armada, desde que atendidas as exigências legais, com as atribuições do artigo 2º desta Lei Complementar. Art. 2º - A Guarda Municipal é instituída conforme previsão do Artigo 93 da Lei Orgânica do Município e Artigo 144, parágrafo 8º da Constituição Federal e, ressalvadas as competências da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, terá como atribuições especificas: I. Prevenir e inibir atos delituosos que atentem contra os bens, serviços e instalações municipais e a segurança escolar; II. Disciplinar o trânsito, nas vias e logradouros municipais; III. Proteger o patrimônio ecológico, cultural, arquitetônico e ambiental do Município, inclusive adotando medidas educativas e preventivas; IV. Apoiar a Administração Municipal no exercício de seu poder de policia administrativa; V. Colaborar com as atividades de Defesa Civil Municipal; VI. Estabelecer mecanismos de interação com a sociedade civil para discussões de soluções de problemas e projetos locais voltados à melhoria das condições de segurança nas comunidades; VII. Estabelecer parcerias com os órgãos estaduais e da União, por meio da celebração de convênios com vistas à implementação de ações integradas; VIII. Estabelecer articulação com os órgãos municipais de políticas sociais, visando ações interdisciplinares de segurança no Município. Art. 3º - A Guarda Municipal integra a estrutura administrativa da Prefeitura em nível de coordenadoria e fica vinculada e subordinada ao Gabinete do Prefeito”. DA INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI COMPLEMENTAR Nº 177 A simples leitura da Lei Complementar nº 177/2003 demonstra, sem a necessidade de maiores esclarecimentos, a inconstitucionalidade do seu artigo 2º, uma vez que suas disposições estão em claro confronto com a Carta Magna, a Constituição Estadual e a Lei Orgânica do município. Assim é porque as guardas municipais têm destinação constitucional específica - a proteção dos bens, serviços e instalações municipais (art. 144, § 8º da CF/88, art. 147 da CE/89 e art. 93 da LOM/90), sendo este também o entendimento pacificado no egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e nos mais diversos tribunais pátrios, razão pela qual toda e qualquer legislação, estadual ou municipal, que busque ampliar seu campo de atribuição padecerá de vício de inconstitucionalidade. DA INCONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO Nº 13.105 Dispõe o Decreto Municipal nº 13.105[5], de 16 de março de 2006, que: “Artigo 1º - Para o fim de regulamentar o inciso II do art. 2º da Lei Complementar nº 177, de 29 de dezembro de 2003, bem como as regras editalícias a ela referentes no que tange à sua disciplina, é de competência dos ocupantes do cargo de Guarda Municipal investidos na função de Agentes de Trânsito o exercício, nas vias e logradouros públicos municipais, das seguintes atribuições, dentre outras: I – conferir documentos; II – consultar bancos de dados; III – entrevistar pessoas; IV – efetuar prisões em flagrante, em casos extremos, desde que relacionados ao trânsito local, encaminhando o autor do fato ao Órgão Policial competente; V – atender acidentes de trânsito no geral e preservar o estado de fato da ocorrência solicitando ao órgão competente, quando possível, o atendimento de emergência às vítimas; VI – interditar via pública em condições adversas; VII – auxiliar usuário na via pública; VIII – realizar operações de combate aos delitos de trânsito em geral; IX – trabalhar em parceria com outros órgãos para o exercício de fiscalização do trânsito; X – retirar animais da faixa de domínio da via; XI – inspecionar cargas; XII – escoltar veículos e cargas especiais; XIII – amparar e escoltar comboios de veículos; XIV – acionar meios e recursos para a extinção de focos de incêndio às margens da via; XV – escoltar autoridades; XVI – monitorar o trânsito em unidades móveis; XVII – interagir em situações emergenciais; XVIII – remover ou sinalizar obstáculos da via; XIX – criar rotas alternativas para o tráfego; XX – solicitar auxílio para a desobstrução total da via; XXI – orientar condutores por meio de gestos, sinais físicos ou sonoros e outros atos administrativos; XXII – atuar em intersecções de vias; XXIII – monitorar o trânsito em postos de observação fixos; XXIV – sinalizar a existência de obras nas vias públicas; XXV – prestar informações sobre trânsito; XXVI – solicitar manutenção de vias públicas; XXVII – sincronizar semáforo às condições de trânsito; XXVIII – intervir no tráfego quando da realização de eventos; XXIX – sugerir medidas para a melhoria do trânsito; XXX – abordar veículos para sua fiscalização; XXXI – analisar a documentação do condutor e do veículo; XXXII – fiscalizar o transporte de produtos perigosos ou controlados; XXXIII – autuar infratores; XXXIV – vistoriar e fiscalizar veículos em geral; XXXV – para fins de remoção e competente procedimento, vistoriar e lacrar veículos, documentando tais ações; XXXVI – participar de bloqueios na via pública para fiscalização; XXXVII – operar equipamentos de controle de velocidade de veículos; XXXVIII – fiscalizar sistema de transporte público rodoviário; XXXIX – fiscalizar serviço de escolta; XL – apreender veículos;XLI – fiscalizar dimensões e peso das cargas e veículos; XLII – promover a segurança nas escolas e intermediações; XLIII – fazer rondas ostensivas em áreas determinadas; XLV – prestar assistência aos transeuntes; XLVI – prestar segurança na realização de eventos públicos; XLVII – prestar assistência à população em caso de calamidades públicas; XLVIII – prestar assistência ao cumprimento da legislação municipal; XLVIX – realizar outras atividades correlatas. Artigo 2º - Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário”. A leitura da Lei Complementar nº 177/2003 demonstra que em nenhum momento o texto normativo faz expressa menção à necessidade de regulamentação de qualquer artigo seu pelo poder executivo municipal, portanto, o decreto municipal carece de fundamento legal a lhe dar supedâneo fático. Inobstante tal fato, prescreve o inciso II da referida Lei que é atribuição específica do guarda municipal disciplinar o trânsito nas vias e logradouros municipais, ou seja, não se circunscreve entre as suas atribuições a fiscalização do trânsito, a qual, segundo dicção do próprio Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é “ato de controlar o cumprimento das normas estabelecidas na legislação de trânsito, por meio do poder de polícia administrativa de trânsito, no âmbito de circunscrição dos órgãos e entidades executivos de trânsito e de acordo com as competências definidas neste Código (Anexo I do CTB)”, portanto, trata-se de atividade que jamais irá se confundir com a fiscalização, um dos modos de exteriorização do poder de polícia. A par disso, uma análise sistemática do conteúdo do referido decreto demonstra que muitas “competências” atribuídas aos guardas municipais investidos nas funções de agentes de trânsito, senão a sua totalidade, são atribuições destinadas à Polícia Militar, com previsão na Constituição Federal, na Constituição Estadual e em diversos outros textos normativos federais e estaduais. A Constituição Federal delimita como sendo de competência exclusiva da Polícia Militar a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública, com igual previsão na Constituição Estadual, além daquelas elencadas no Decreto-Lei nº 667, de 02 de julho de 1969, do Decreto Federal n° 88.777, de 30 de setembro de 1983, a Lei Estadual Lei nº 616, de 17 de dezembro de 1974, e a Lei Complementar nº 207, de 05 de janeiro de 1979.[6] O poder de polícia exterioriza-se através da ordem, consentimento, fiscalização e sanção de polícia. É sabido que a Guarda Municipal não possui poder de polícia, além do que o decreto municipal elenca atribuições que incumbem à Polícia Militar, razão pela qual não podem: a) conferir documentos; b) entrevistar pessoas; c) efetuar prisões em flagrantes, em casos extremos... (não se insere no princípio de auto-proteção da sociedade e pode dar ensejo a atos de arbitrariedade); d) atender acidentes de trânsito no geral e preservar o estado de fato de ocorrência; e) interditar via pública em condições adversas; f) realizar operações de combate aos delitos de trânsito em geral; g) inspecionar cargas (não incumbe ao município, no Sistema Nacional de Trânsito (SNT), a fiscalização da carga dos veículos, apenas o seu peso e dimensões); h) abordar veículos para sua fiscalização; i) analisar a documentação do condutor e do veículo (as infrações relativas ao condutor e ao veículo são de competência estadual); j) autuar infratores (conforme entendimento do CETRAN/SP e do DENATRAN); k) vistoriar e fiscalizar veículos em geral; l) participar de bloqueios na via pública para fiscalização; m) fiscalizar sistema de transporte público rodoviário; n) apreender veículos (não existe infração municipal onde seja prevista a aplicação da penalidade de apreensão de veículo, ao município cabe apenas a remoção); o) promover a segurança nas escolas e intermediações; p) fazer rondas ostensivas em áreas determinadas; q) prestar segurança na realização de eventos públicos. Todas as atribuições acima indicadas são de competência de outros órgãos estaduais, não podendo o poder executivo municipal, por meio de um simples decreto, alterar as atribuições constitucionalmente designadas a estes. Através da edição do Decreto nº 13.105 a edilidade busca a todo custo demonstrar a aparente legalidade do desvio de função da guarda municipal, demonstrando que na verdade estes atuarão como agentes de trânsito. Porém, o que não se olvida é que a lei complementar, o edital do concurso e o decreto municipal fazem referência ao cargo de guarda municipal, sendo que este último regulamenta a competência do guarda municipal investido na função de agente de trânsito, demonstrando o verdadeiro desvio de função que está sendo implementado pela Prefeitura Municipal. Conforme se observa pelo Roteiro de Municipalização de Trânsito - 2003, disponibilizado pelo Departamento Nacional de Trânsito (www.denatran.gov.br) a entidade ou órgão municipal de trânsito pode optar por ter sua fiscalização feita pela Polícia Militar, com base no artigo 23 do CTB, ou ter seu próprio quadro de fiscais, observando-se a necessidade de concurso público para seleção de pessoal com perfil adequado à função, treinamento e capacitação do pessoal selecionado por meio de cursos e estágios, designação e credenciamento dos agentes de operação por portaria com relação nominal, ou seja, caso opte por ter seu próprio quadro de funcionário, deverá proceder a concurso público visando o preenchimento da função específica de agente de trânsito. A esse respeito, o eminente jurista Ricardo Alves da Silva preleciona que: “Além do mais os guardas municipais, embora municipalizado o trânsito, não podem ser designados agentes de trânsito. Quem pode ser designado agente de trânsito, nos termos do disposto no § 4º, do art. 280, do CTB (que dispõe que: 'o agente da autoridade de trânsito competente para lavrar o auto de infração poderá ser servidor civil, estatutário ou celetista ou, ainda, policial militar designado pela autoridade de trânsito com jurisdição sobre a via no âmbito de sua competência.'), é o policial militar e não o servidor civil. É o que dispõe a norma do CTB supra. O servidor civil não é designado, mas, sim, nomeado, ou seja, só poderá exercer o cargo de agente de trânsito, se for concursado para desempenhar dita atividade, quando então será nomeado e não designado, pois só o policial militar poderá ser designado agente de trânsito. Tanto é verdade que a norma do § 4º, do art. 280, do CTB, fala em designado e não em designados. Quem é designado, pela autoridade de trânsito (que só poderá ser estadual) com jurisdição sobre a via no âmbito de sua competência, é o policial militar e não o servidor civil. Mesmo porque a autoridade de trânsito municipal não tem competência para designar agente de trânsito ou policial militar, o que vem confirmar que o termo “designado”, no singular, antecedido da conjunção 'ou' e do advérbio 'ainda', refere-se ao policial militar e não ao servidor civil; bem como, porque só poderá ser designado quem exerce atividade afim, sob pena de burla ao princípio constitucional de que a investidura em cargo ou emprego público se dá mediante concurso (inc. II, art. 37, CF). Desse modo, a Administração Pública Municipal só poderá ter agente de trânsito mediante criação dos cargos e preenchimento por concurso e não por simples designação de servidor municipal; sendo ilegal, por contrariar o CTB, a lei municipal que designar guarda ou autorizar a designação de guarda municipal para exercer o cargo de agente de trânsito. Além do mais, o legislador ordinário, ao estabelecer a norma do § 4º, do art. 280, do CTB, foi (dada a interpretação equivocada do termo regime jurídico único, que, apesar de só poder ser o estatutário, muitos entendiam poder ser também o celetista) levado a inserir na referida norma o termo 'celetista', mas que, atualmente, por força da Emenda Constitucional nº 19/98, só poderá ser o servidor público titular de cargo efetivo (estatutário), vez que o servidor celetista não é titular de cargo público, mas, sim, de emprego, pelo que não pode, ainda que concursado, exercer a função de agente de trânsito. Estando, desse modo, revogada, em parte, no nosso entender, a referida norma do § 4º, do art. 280, do CTB. É o que se dessume de uma interpretação sistemática da referida norma, em confronto com os arts. 37, 39 e 40 da Constituição Federal”.[7] DA IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO FUNDO MUNICIPAL DE TRÂNSITO (FUMTRAN) PARA CUSTEIO DE DESPESAS DE PESSOAL Dispõe o artigo 320 do CTB, ipsis literis: “Art. 320. A receita arrecadada com a cobrança das multas de trânsito será aplicada, exclusivamente, em sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito. Parágrafo único. O percentual de cinco por cento do valor das multas de trânsito arrecadadas será depositado, mensalmente, na conta de fundo de âmbito nacional destinado à segurança e educação de trânsito”.[8] Sabe-se que a imposição de multas pelos municípios e Estados vem crescendo a cada dia, tratando-se de valiosa fonte de arrecadação, sendo que no município de São José do Rio Preto/SP calcula-se que este somatório alcance a quantia de 7 milhões de reais anuais. Visando disciplinar o uso dessa receita, previu o legislador que esta fosse aplicada, exclusivamente, para a implementação de sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito, cabendo a cada órgão de trânsito integrante do Sistema Nacional de Trânsito (SNT) a propositura de projeto de lei destinado a criar um fundo para arrecadação de multas, tratando-se de quesito obrigatório para a filiação do município ao SNT. Face às dúvidas suscitadas para a sua implementação e em virtude da indevida utilização das referidas receitas, o Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), na condição de órgão máximo normativo do SNT, editou a Resolução nº 191, de 16 de fevereiro de 2006, que previa a aplicação das receitas da seguinte forma: “Art.1º Referendar a Deliberação nº 33, de 03 de abril de 2002, que dispõe sobre aplicação da receita arrecadada com a cobrança das multas de trânsito, conforme art. 320 do Código de Trânsito Brasileiro. Art. 2º Explicitar as formas de aplicação da receita arrecadada com a cobrança das multas de trânsito, prevista no caput do art. 320 do Código de Trânsito Brasileiro: I -A sinalização é o conjunto de sinais de trânsito e dispositivos de segurança colocados na via pública com o objetivo de garantir sua utilização adequada, compreendendo especificamente as sinalizações vertical e horizontal e os dispositivos e sinalizações auxiliares, tais como: a) dispositivos delimitadores; b) dispositivos de canalização; c) dispositivos e sinalização de alerta; d) alterações nas características do pavimento; e) dispositivos de uso temporário, e f) painéis eletrônicos. II -As engenharias de tráfego e de campo são o conjunto de atividades de engenharia voltado a ampliar as condições de fluidez e de segurança no trânsito, tais como: a) a elaboração e atualização do mapa viário do município; b) o cadastramento e implantação da sinalização; c) o desenvolvimento e implantação de corredores especiais de trânsito nas vias já existentes; d) a identificação de novos pólos geradores de trânsito, e e) os estudos e estatísticas de acidentes de trânsito. III -O policiamento e a fiscalização são os atos de prevenção e repressão que visem a controlar o cumprimento da legislação de trânsito, por meio do poder de polícia administrativa. IV -A educação de trânsito é a atividade direcionada à formação do cidadão como usuário da via pública, por meio do aprendizado de normas de respeito à vida e ao meio ambiente, visando sempre o trânsito seguro, tais como: a) publicidade institucional; b) campanhas educativas; c) eventos; d) atividades escolares; e) elaboração de material didático-pedagógico; f) formação e reciclagem dos agentes de trânsito, e g) formação de agentes multiplicadores. Art. 3º As ações relacionadas nesta Resolução têm caráter exemplificativo. Art. 4º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação”.[9] A Lei nº 7.026[10], de 07 de janeiro de 1998, criou o Fundo Municipal de Trânsito (FUMTRAN), o qual tem por objetivo criar condições financeiras e gerenciar os recursos destinados ao desenvolvimento das ações de controle, fiscalização e policiamento do trânsito e tráfego nas vias, estradas e logradouros do município, nos termos de convênio celebrado com o Governo Estadual. A Lei nº 8.652[11], de 25 de junho de 2002, permitiu ao município celebrar convênio com o Estado de São Paulo para assuntos relacionados às ações de policiamento e fiscalização de trânsito, delegando a este as atribuições do município, destinando ao 17º Batalhão da Polícia Militar local o percentual de 15% (quinze por cento) da arrecadação das multas geradas nos Autos de Infração de Trânsito elaborados pelos respectivos Agentes de Trânsito. Portanto, a rigor da legislação acima indicada, não pode a Prefeitura Municipal estabelecer o custeio de despesa de pessoal da Guarda Municipal com a receita do FUMTRAN, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade e da moralidade, haja vista que estará havendo desvio de finalidade no tocante à aplicação da receita arrecadada. Saliente-se que a Lei de Diretrizes Orçamentárias do município não prevê a utilização do referido fundo de receita para custeio de despesa de pessoal da Guarda Municipal, sendo que não há permissão para criação de despesa sem a conseqüente estipulação de receita, o que pode comprometer drasticamente a efetivação das medidas necessárias à melhoria do trânsito no município. DA IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DA GUARDA MUINICIPAL NOS QUADROS DA SECRETARIA MUNICIPAL DE TRÂNSITO Dispõe o artigo 3º da Lei Complementar nº 177/2003 que a Guarda Municipal integra a estrutura administrativa em nível de coordenadoria, ficando vinculada e subordinada ao Gabinete do Prefeito. A previsão de custeio de despesas da Guarda Municipal não figura na Lei de Diretrizes Orçamentárias para o Gabinete do Prefeito e nem alocado em nenhuma outra secretaria ou entidade. Não pode a Prefeitura Municipal, em havendo previsão de vinculação e subordinação da Guarda ao Gabinete do Prefeito, pretender realizar a lotação dos servidores na Secretaria Municipal de Trânsito. Mais ainda, tentando demonstrar que serão contratados como agentes de trânsito, uma vez que o Decreto nº 13.105 deixa claro que existe o cargo de guarda municipal e este será investido como agente de trânsito, demonstrando a manobra jurídica utilizada para dar aparência de legalidade à atuação da Guarda Municipal. DO ENTENDIMENTO ESPOSADO PELO CETRAN E DENATRAN O CETRAN/SP, instado a se manifestar sobre a atuação da Guarda Municipal, já teve a oportunidade de decidir que: Deliberação 1, de 24-6-2005 “O Conselho Estadual de Trânsito, na reunião do dia 24-6-2005, considerando o parecer nº 256/04, proferido pela Assessoria Jurídica do Denatran, no Processo Administrativo nº 80001.100094/2004-04, acolhido pelo Coordenador Geral Jurídico Dr. Fábio Antinori: Considerando a jurisprudência e doutrina citadas; Considerando que não obstante entendimentos anteriores, não discutidos pelo Colegiado sobre o aspecto da incompetência dos agentes, deve ser firmada sua convicção jurídica sobre o assunto; Considerando que é necessário solucionar a tormentosa divergência sobre a competência dos agentes das guardas municipais; delibera: Não têm competência os integrantes da Guarda Municipal para o exercício da função de agente de trânsito, por força do princípio específico do art. 144, § 8º da Constituição Federal de 1988, devendo cessar sua atividade nesse mister, sem prejuízo dos atos praticados anteriormente, em virtude do entendimento então tolerado pelo Denatran”. “Vistos e analisados os autos, verifica-se a nulidade do ato administrativo que gerou a penalidade aplicada, pois o requisito da competência apresenta vício insanável, de vez que não é competente quem quer, mas quem a lei estabelece. com relação à atuação da Guarda Municipal como agente de trânsito, destaco as conclusões finais, constantes do Parecer nº 256/2004/CGIJF/DENATRAN, de 12/03/2004, emitido em razão de consulta da Polícia Militar do Estado de São Paulo (Processo Administrativo nº 80001.000904/2004-04): 'a constituição Federal, em seu artigo 144, § 8º, ao conferir permissibilidade com vistas à constituição das Guardas Municipais pelos respectivos Municípios não excepcionalizou nenhuma outra forma de atividade além das previstas no dispositivo em tela. A Administração Pública embasada no Princípio da Eficiência e, bem assim, objetivando a excelência das suas atividades, tem legitimidade para dispor do seu quadro funcional e remanejá-lo consoante as suas necessidades administrativas, não sendo factível, entretanto, o desvio de função. O Código de Trânsito Brasileiro, por outro lado, estabelece em seu artigo 280, § 4º, que o Agente da Autoridade de Trânsito, para que possa efetivamente exercer uma função de natureza fiscalizadora no tocante às atividades inseridas na área operacional do trânsito, deverá ser designado pela autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via no âmbito de sua competência e, assim sendo, independe da condição de ser o mesmo Agente um servidor civil, estatutário ou celetista ou policial militar. Nessas condições, com fulcro nas considerações acima elencadas, concluímos que a Guarda Municipal não tem competência para atuar na fiscalização de trânsito e nem, como decorrência, admissibilidade com vistas a aplicar multas de trânsito sob pena de nulidade das mesmas e, igualmente, não possui legitimidade para firmar convênio com o respectivo órgão de trânsito para tal fim, por força de norma constitucional. 'Diante do exposto, opino pelo DEFERIMENTO do presente recurso. Os órgãos executivos municipais de trânsito, respaldados em antigos Pareceres da Consultoria Jurídica do DENATRAN, adotaram guardas municipais como agentes de trânsito os quais, paralelamente, exercem as atividades específicas no artigo 144, § 8º, da Constituição Federal, a Assessora Jurídica do DENATRAN, Dra. Bárbara Heliodora Ribeiro de Machado e Silva, no seu parecer nº 256/2004, de 12 de março de 2.004, reformulou seu parecer anterior, para afirmar que a Guarda Municipal 'tem por finalidade, apenas, assegurar a incolumidade do patrimônio municipal que envolve bens de uso comum do povo, bens de uso especial e bens patrimoniais ', e respaldada na jurisprudência conclui ' que as Guardas Municipais não tem competência para atuar na fiscalização de trânsito e nem, como decorrência, admissibilidade com vistas a aplicar multas de trânsito sob pena de nulidade das mesmas e, igualmente, não possui legitimidade e para firmar convênio com o respectivo órgão de trânsito para tal fim, por força de norma constitucional'.O Conselho Estadual, modificando entendimento anterior, deve deliberar que os membros das Guardas Municipais não podem exercer a fiscalização de trânsito, por força da restrição constitucional para suas atividades. Segundo este entendimento, o mérito das razões dos recorrentes será examinado tendo em vista que as penalidades foram decorrentes de autuação aplicada por agentes agora declarados como incompetentes, em virtude das afirmações acima. Convém ressalvar que julgamentos anteriores foram proferidos com fundamento no antigo entendimento do DENATRAN, e que não foram contestados pelos Conselheiros relatores e nem discutidos pelo Colegiado. Desta forma, não há que se questionar sobre os votos então proferidos no regime do entendimento anterior e que por isso, naquela época, representava outro ponto de vista jurídico. Em virtude do exposto meu voto é pelo deferimento do recurso, ficando desconstituída a penalidade sem necessidade de qualquer outro exame de mérito”.[12] Restando pacificado o entendimento por aquele órgão colegiado no tocante a Guarda Municipal, o qual não discorda da jurisprudência dominante (decisões judiciais juntadas aos autos), de nada adiantará a utilização da Guarda Municipal na fiscalização de trânsito, uma vez que todos os recursos encaminhados em 2ª instância serão conhecidos e providos, havendo a possibilidade de grave prejuízo aos cofres públicos com a restituição dos valores pagos e repetição de indébito. Inobstante as argumentações acima delineadas, restou assentado no Parecer nº 247/2005/CGIJF/DENATRAN, que versa sobre consulta formulada pela Prefeitura Municipal de Sorocaba solicitando interferência daquele órgão junto ao CETRAN/SP, em virtude da edição da Deliberação nº 01 de 2005 (posteriormente ratificada em 2006), que “a Guarda Municipal não tem competência para atuar na fiscalização de trânsito incluindo o procedimento relativo à aplicação de multas de trânsito, sob pena de nulidade das mesmas e, igualmente, não possui legitimidade para firmar Convênio com órgãos de trânsito para tal fim” (grifo meu), demonstrando irremediavelmente que, independentemente da visão que se queira imprimir à Guarda Municipal, não tem esta legitimidade para atuar como agente designado pela autoridade de trânsito e nem como agente conveniado. Após a edição da Deliberação nº 01 do CETRAN muitas prefeituras paulistas insurgiram-se contra a orientação proclamada por aquele órgão colegiado, socorrendo-se ao Poder Judiciário através da impetração de Mandado de Segurança, sendo que muitos já tiveram as questões de mérito julgadas, oportunidade em que se decidiu que: “Vistos. Trata-se de mandado de segurança impetrado pelo Município de Santa Gertrudes contra ato do Presidente do Conselho Estadual de Trânsito – CETRAN-SP que, através da Deliberação nº 01/2005 do CETRAN, excluiu a competência da Guarda Municipal para o exercício das funções de agente de trânsito proibindo que lavrem autos de infração. Deferida a liminar, a autoridade impetrada prestou informações pugnando pela legalidade do ato atacado. O parecer do Ministério Público é pela denegação da ordem. Relatados, DECIDO. De rigor a denegação da ordem. As Guardas Municipais possuem atribuições restritas à proteção dos bens, serviços e instalações do Município, conforme disposição expressão do art. 144, § 8º da Constituição Federal. Não possuem competência para executar a fiscalização do trânsito, tampouco atuar e aplicar as medidas cabíveis em razão de infrações previstas no Código de Trânsito, ou seja, não podem exercer os poderes de Polícia de Trânsito. Constatada a incompetência da Guarda Municipal para o exercício do poder de polícia de trânsito, conforme o elenco taxativo do art. 144 da Constituição Federal, não se reveste de ilegalidade ou abusividade o ato da autoridade impetrada. Ante o exposto, DENEGO A SEGURANÇA, casso a liminar anteriormente concedida e julgo extinto o processo com fundamento no inciso I do art. 269 do Código de Processo Civil. Custas na forma da lei. Honorários advocatícios indevidos na espécie. P.R.I. Certifico e dou fé que o valor atualizado das custas de preparo é de R$ 66,50, e que para a remessa do processo à segunda instância, o apelante deverá recolher a taxa de R$ 17,78 por volume (código 110-4), conforme Provimento 833/2004. Nada mais”.[13] E mais: “Vistos. Trata-se de mandado de segurança impetrado pelo Município de Atibaia contra ato do Presidente do Conselho Estadual de Trânsito – CETRAN-SP que, através da Deliberação nº 01/2005 do CETRAN, excluiu a competência da Guarda Municipal para o exercício das funções de agente de trânsito proibindo que lavrem autos de infração. Indeferida a liminar, a autoridade impetrada prestou informações pugnando pela legalidade do ato atacado. O parecer do Ministério Público é pela denegação da ordem. Relatados, DECIDO. De rigor a denegação da ordem. As Guardas Municipais possuem atribuições restritas à proteção dos bens, serviços e instalações do Município, conforme disposição expressão do art. 144, § 8º da Constituição Federal. Não possuem competência para executar a fiscalização do trânsito, tampouco atuar e aplicar as medidas cabíveis em razão de infrações previstas no Código de Trânsito, ou seja, não podem exercer os poderes de Polícia de Trânsito. Constatada a incompetência da Guarda Municipal para o exercício do poder de polícia de trânsito, conforme o elenco taxativo do art. 144 da Constituição Federal, não se reveste de ilegalidade ou abusividade o ato da autoridade impetrada. Ante o exposto, DENEGO A SEGURANÇA e julgo extinto o processo com fundamento no inciso I do art. 269 do Código de Processo Civil. Custas na forma da lei. Honorários advocatícios indevidos na espécie. P.R.I. Certifico e dou fé que o valor atualizado das custas de preparo é de R$ 66,50 e que, para a remessa do processo à segunda Instância, o apelante deverá recolher a taxa de R$ 17,78 por volume (código 110-4), conforme Provimento 833/2004. Nada mais. S.P., 27/12/05”.[14] E ainda: “Municipalidade de São Bernardo do Campo impetrou este mandado de segurança contra ato do Presidente do Conselho Estadual de Trânsito, alegando que a Deliberação n. 01, de 24/06/05, no sentido de que os Guardas Municipais não têm competência para exercer a função de agentes de trânsito, deve ser suspensa, por inconstitucional e ilegal. Deferida a liminar, vieram aos autos as informações da autoridade impetrada, que argüiu preliminar e no mérito sustenta a legalidade da Deliberação. O parecer do Ministério Público é pela concessão da segurança. Sobreveio decisão determinando a remessa dos autos a esta Comarca, acolhendo a alegação de incompetência feita nas informações. O Ministério Público reiterou o parecer anterior. É o relatório. Passo a fundamentar. Como descreve José Afonso da Silva, “Os constituintes recusaram várias propostas de instituir alguma forma de polícia municipal. Com isso, os Municípios não ficaram com nenhuma específica responsabilidade pela segurança pública. Ficaram com a responsabilidade por ela na medida em que sendo entidade estatal não podem eximir-se de ajudar os Estados no cumprimento dessa função. Contudo, não se lhes autorizou a instituição de órgão policial de segurança e menos ainda de polícia judiciária. A Constituição apenas lhes reconheceu a faculdade de constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei. Aí certamente está uma área que é de segurança: assegurar a incolumidade do patrimônio municipal, que envolve bens de uso comum do povo, bens de uso especial e bens patrimoniais, mas que não é de polícia ostensiva, que é função exclusiva da Polícia Militar” (Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo, Malheiros, 2001, pp. 759/760). Essa resistência do constituinte está bem estabelecida no artigo 144,l § 8º, da CF, que atribui aos Municípios a faculdade de criar Guardas Municipais “destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações”. Trata-se de limitação constitucional à atribuição – por lei municipal – de competência à respectiva guarda; só pode ela ser destinada à proteção dos bens, serviços e instalações municipais. Essa incontornável limitação constitucional impede a concessão, por lei local, de competência para fiscalização do trânsito. Esta afirmativa, entretanto, deve ser melhor examinada. De fato, não se exige, para exercer fiscalização de trânsito, poder de polícia ostensiva ou judiciária, que é indubitavelmente vedada à Guarda Municipal, como assevera Alexandre de Moraes (Direito Constitucional, Atlas, São Paulo, 2001, p. 644). Para tanto, basta o exercício da chamada polícia administrativa. Portanto, a questão é saber se a limitação constitucional apenas se refere à polícia administrativa ou também à judiciária. Em primeiro lugar, diga-se desde logo que não é uma divisão absolutamente certa ou estanque essa entre polícia administrativa e judiciária, e não pode, por isso, ser levada a extremos. A questão, na verdade, é saber se a vedação constitucional à atividade da Guarda Municipal importa em vedar a ela o exercício da polícia administrativa, tida como aquela destinada a “impor à livre ação dos particulares a disciplina exigida pela vida em sociedade” (cf. Alexandre de Moraes, op. cit, p. 643), em que indubitavelmente se insere a polícia de trânsito. Ademais, interessa notar que a polícia de trânsito pode ser atividade exercida por qualquer servidor civil, estatutário ou celetista, ou ainda policial militar designado para tanto pela autoridade de trânsito, como permite o artigo 280, § 4º, do CTB. A conclusão, entretanto, é a de que a atribuição de competências à guarda municipal é mais restrita do que a possibilidade de atribuir competência a servidor para fiscalização de trânsito. A restrição, de fato, é constitucional, e hierarquicamente prevalece sobre o permissivo infraconstitucional. Assim, patenteia-se que a competência da guarda municipal é efetivamente restrita à vigilância sobre bens municipais. E vigilância sobre bens municipais não inclui a fiscalização de trânsito, sendo coisa bem diversa, pese a tentativa de asseverar o contrário feita na inicial. Assim, a ordem deve ser denegada, pois não se entrevê ilegalidade na restrição da autoridade impetrada. Pelo exposto, denego a segurança, cassada a liminar. Custas pela impetrante”.[15] CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante do acima exposto, com base na análise dos comandos normativos vigentes, decorrentes sobremaneira da vontade esposada pelo legislador constituinte quando da elaboração de nossa Carta Magna, dos mais abalizados entendimentos ofertados pelos nossos doutrinadores pátrios e da jurisprudência remansosa, resta pacificada a inviabilidade de utilização de guardas municipais na fiscalização de trânsito efetuada com supedâneo no Código de Trânsito Brasileiro. Urge, portanto, aos municípios que possuam guardas municipais atuando na fiscalização de trânsito, a regularização de sua situação, direcionando-os para as atividades constitucionalmente previstas, de forma a se evitar futuros questionamentos judiciais acerca de sua inconstitucional utilização como agentes de trânsito. NOTAS 1. DOE nº 120, 29 de junho de 2005, Poder Executivo, Seção I, Segurança Pública, Conselho Estadual de Trânsito. 2. Lei Orgânica de São José do Rio Preto/SP, disponível em: . 3. Disponível em: . 4. Disponível em: . 5. Disponível em: . 6. Disponíveis em: . 7. DA SILVA, Ricardo Alves. Polícia Militar e as Guardas Municipais. Associação de Oficiais Militares de Santa Catarina. Disponível em: . Acesso em 21JUL06. 8. Disponível em: . 9. Disponível em: . 10. Disponível em: . 11. Disponível em: . 12. DOE nº 120, 29 de junho de 2005, Poder Executivo, Seção I, Segurança Pública, Conselho Estadual de Trânsito. 13. 9ª Vara da Fazenda Pública/SP, Processo nº 583.53.2005.022171-4, disponível em: . 14. 9ª Vara da Fazenda Pública/SP, Processo nº 583.53.2005.016978-5, disponível em: . 15. 1ª Vara da Fazenda Pública/SP, Processo nº 583.53.2006.107381-7, disponível em: . FERNANDES NETO, Benevides. Guardas Municipais como Agentes de Trânsito - Estudo de Caso – Inconstitucionalidade. Disponível em http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=843. Acesso em 11 de agosto de 2006.