Oftalmologia - Vol. 34: pp. 417 - 419 A Situação Assistencial Oftalmológica Moçambicana Yolanda Zambujo Prefácio: A língua constitui um meio privilegiado e abrangente de comunicação. Povo que desperdiça as suas raízes linguísticas dissolve-se seguramente na anátema universal, perdendo a cultura e a identidade. A Sociedade Portuguesa de Oftalmologia ao procurar apoiar o desenvolvimento da Oftalmologia nos Países Africanos de Expressão Portuguesa traça um marco de humanismo com aqueles que sofrem e tanto precisam. Esse apoio só é possível, conhecendo a realidade e as necessidades. Moçambique, um país com cerca de 20 milhões de habitantes, tem uma esperança média de vida de 43 anos, sendo que quase 50% dessa população tem menos de 14 anos e só 4% tem mais de 65 anos. A Dr.ª Yolanda Zambujo do Hospital Central de Maputo deixa aqui aos Oftalmologistas Portugueses alguns traços da realidade Moçambicana. A Assistência Oftalmológica em Moçambique A assistência oftalmológica em Moçambique baseia-se em Serviços Públicos e na cooperação internacional de Missões Humanitárias. Moçambique possui onze províncias e em algumas não existem oftalmologistas nos Hospitais Públicos. No País existem nestes Serviços apenas 13 médicos, 5 dos quais no Hospital Central de Maputo, que constitui o centro de referenciação para todo o território. Muitos dos cuidados primários oftalmológicos são assegurados por técnicos de oftalmologia – enfermeiros com formação nesta área, em número de 34, distribuídos por todos os Hospitais provinciais. Papel de relevo têm tido as Missões Humanitárias de que se destacam: Ojos del Mundo, que VOL. 34, JULHO - SETEMBRO, 2010 actua por missões, a Helen Keller Internacional (EUA) que só actua na província de Manica, Ligth for the World (Austria) que actua em Sofala e esporadicamente dá apoio a mais 3 províncias, NAPB (Noruega) e a Sight Savers (UK) só em Nampula. Estas Missões não estão normalmente sempre no terreno, mas realizam intervenções temporárias com objectivos específicos. Em Moçambique a esperança média de vida aumentou 10 anos na última década. Mas com mais de 45% da população com menos de 14 anos, uma aposta forte tem que ser conseguida na saúde visual das novas gerações, especificamente no tratamento da ambliopia refractiva. Estima-se que em Moçambique existam 720.000 deficientes visuais, dos quais 190.000 invisuais profundos. As principais causas de cegueira são: a catarata, o glaucoma, as opacificações da córnea, nomeadamente por tracoma, a ambliopia refractiva, os traumatismos e as retinites associadas com o HIV. 417 Yolanda Zambujo O Hospital Central de Maputo Constituindo o único Hospital Central do País, além da vertente assistencial dá apoio à Faculdade de Medicina, aos cursos de enfermagem e é Centro de Formação para a especialidade médica de Oftalmologia, de técnicos de oftalmologia e de ortóptica.Tem no seu quadro 5 Oftalmologistas, 3 técnicos de oftalmologia, 2 técnicos de ortóptica e 2 oculistas, responsáveis pela realização das próteses. O baixo nível económico leva a que o Governo subsidie os óculos ou os forneça gratuitamente. É o único do país que dispõe de sala de operações própria de Oftalmologia. A unidade assistencial está dividida segundo o quadro anexo: 2 – Plano Nacional de Oftalmologia Consulta externa Urgência Unidade de atendimento externo Exames e tratamentos especiais - campos visuais - angiografia - ecografia e biometria - Ortóptica - Laser Argon e Yag Banco de óculos Internamento Bloco operatório Dos dados existentes e que incluem as diversas missões, em 2008 terão sido realizadas em Moçambique 4270 cirurgias de catarata e apenas 255 de glaucoma. Se os recursos humanos escassos e aos quais há que manifestar gratidão pelo elevado desempenho e dedicação, são factor de limitação assistencial, o maior de todos é seguramente a capacidade tecnológica que esbarra nas condições técnicas de que são exemplo a falta de manutenção dos equipamentos, a falta de peças de substituição, a diversidade de marcas, etc. O equipamento de laser para tratamento da retinopatia diabética, único no país, está avariado. Não exclusivo grande e pequena cirurgia Moçambique aderiu à Estratégia 2020 da OMS, e estabeleceu um Plano Nacional de Oftalmologia 2007-2010, tendo em vista a eliminação da cegueira curável em 2020. Com a Missão de dar a cada moçambicano o direito à Visão e a Meta da Estratégia 2020, iniciou-se a implementação de serviços de saúde ocular de boa qualidade, sustentáveis e acessíveis a toda a população. Para alcançar esta meta, foram definidos objectivos gerais e específicos. 2.1 – Objectivos Gerais Movimento do Serviço: Consulta Externa Internamentos Intervenções cirúrgicas 418 2006 43992 2007 35811 2008 42211 2006 1589 2007 1163 2008 1943 2006 2255 2007 2529 2008 2409 – Apetrechamento tecnológico dos hospitais provinciais. – Aposta no aumento da formação de médicos oftalmologistas e de técnicos de Oftalmologia. – Colocação de condições assistenciais em todos os Hospitais Distritais. – Estudos de prevalência das diversas patologias. – Aumento do fornecimento de óculos à população. OFTALMOLOGIA A situação assistencial oftalmológica Moçambicana – Garantia de aprovisionamento de consumíveis e manutenção dos equipamentos. – Reduzir a cegueira por ambliopia em 50% das crianças. – Aumento das campanhas de informação e das condições sanitárias das populações. – Alargar o tratamento da conjuntivite do recém-nascido. Diagnosticar e tratar a catarata congénita, em colaboração com os Serviços de Pediatria. – Criação dos comités Nacional e Provinciais de Prevenção da Cegueira. – Desenvolvimento da formação contínua dos profissionais. – Realização de testes de visão em todas as escolas primárias do País. – Reduzir a cegueira por retinopatia diabética, em colaboração com os médicos generalistas e de Medicina Interna. – Elaborar protocolos de tratamento para as diversas patologias. 2.2 – Objectivos específicos – Duplicar anualmente, entre 2008 e 2010 o número de cirurgias de catarata. – Aumentar para 80% o número de cirurgias com lente intra-ocular. – Reduzir a cegueira por glaucoma no país, com criação de condições para cirurgia em 100% dos Hospitais Provinciais. VOL. 34, JULHO - SETEMBRO, 2010 3 – O Futuro As Estruturas de Saúde estão a desenvolver planos correctos para colmatar os atrasos. A saúde visual infantil constitui um desafio imediato, mas o aumento da esperança média de vida irá colocar outros. A ajuda a Moçambique é necessária! 419