PNV 256
Heitor da Silva Glória
Odja Barros Santos (Orgs.)
Como um só povo
Reflexões em torno da unidade da igreja
São Leopoldo/RS
2009
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Série A Palavra na Vida - Nº 256 - 2009
Como um só povo
Reflexões em torno da unidade da igreja
Organização: Heitor da Silva Glória e Odja Barros Santos
Autoria: Jether Pereira Ramalho, Ervino Schmidt, Mario de Mello Souza,
Israel Boniek Gonçalves, Nancy Cardoso Pereira, Manoel Neto, Odja Barros
Santos, Heitor da Silva Glória, Fernando Albano e Adelaide Maria Klein.
Arte-finalização: Ricardo Fiegenbaum
Revisão: Isolde Dreher e Ricardo Fiegenbaum
Capa: Ricardo Fiegenbaum
Impressão: Con-Texto Gráfica
ISBN 978-85-7733-065-2
Sumário
Apresentação ................................................................................................ 5
Introdução ...................................................................................................... 7
Capítulo 1 - Unidos nas mãos de Deus teremos comunhão e paz .......... 9
Capítulo 2 - Quatro passos para tornar-se ecumênico ........................... 13
Capítulo 3 - A inspiração como ponto de partida para a unidade das
igrejas ..................................................................................................... 17
Capítulo 4 - Pedaço de mim: por outra linguagem para a separação
e a unidade ............................................................................................. 19
Capítulo 5 - Um só povo: uma visão e uma ilustração ........................... 24
Capítulo 6 - Na tua mão como um só povo .............................................. 29
Capítulo 7 - A IPIB e o ecumenismo ......................................................... 34
Capítulo 8 - Contribuição da experiência pentecostal à unidade cristã . 38
Capítulo 9 - Unidas para a promoção da vida ......................................... 42
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Apresentação
A busca pela unidade cristã é um compromisso permanente das
igrejas em todo o mundo, porque o próprio Jesus manifestou essa
vontade ao pedir ao Pai “que todos sejam um” (João 17,21). Esse
compromisso se expressa de várias maneiras, mas tem uma de suas
manifestações mais visíveis no movimento ecumênico.
O Centro de Estudos Bíblicos (CEBI), desde o seu início, assumiu a ecumenicidade na Leitura Popular da Bíblia. Seu princípio
fundador, de que a vida e a Bíblia formam um conjunto ecumênico
de mútuas implicações, tem orientado as suas práticas ao longo dos
trinta anos de sua existência, relembrando a cada instante que acima de toda diferença está o fato de que todos somos um quando se
trata de promover a vida, graça das graças que recebemos das mãos
divinas.
É a partir deste princípio que o CEBI se constitui como entidade
ecumênica, promovendo o diálogo e o entendimento entre pessoas
de diferentes confissões de fé, tendo a Bíblia como lugar de mediação destas relações. Também por isso, apoia e engaja-se em campanhas e atividades de igrejas e organizações que promovem o encontro dos diferentes em busca da unidade elementar desejada por
Deus.
Uma destas ações de promoção da unidade cristã, e que envolve cristãos e cristãs de diferentes confissões e em diversos países, é
a Semana de Oração pela Unidade Cristã, que, no Brasil, é promovida pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic) nos dias que
antecedem ao domingo de Pentecostes. Em 2009, a Semana ocorre
de 24 a 31 de maio e tem como tema Unidos na tua mão (Ezequiel
37,17).
Com o objetivo de contribuir para o fortalecimento dos laços de
unidade entre as diferentes confissões e também oferecer um mate-
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rial para a reflexão em torno do tema da Semana de Oração e o
ecumenismo na perspectiva de pessoas membros de várias igrejas,
o CEBI propôs a publicação deste livro – Como um só povo - Reflexões em torno da unidade da igreja – como parte da série A Palavra
na Vida (PNV).
O livro consiste de um conjunto de artigos escritos por pessoas
de diferentes confissões cristãs, enfocando o tema da Semana de
Oração pela Unidade Cristã1. Cada autor faz a sua própria reflexão
sobre o tema da unidade cristã a partir da sua confessionalidade,
levando em conta o texto bíblico de Ezequiel 37,17: “Estarão unidos
na tua mão”.
Unidos, pois, por este projeto editorial, os autores e as autoras,
sob diferentes prismas, afirmam que a unidade da Igreja de Cristo é
um sonho de Deus e uma obra dele. Dizem, cada qual à sua maneira, que a busca pela unidade, ainda que na diferença, é a vitória do
amor e um modo de anunciar que a boa nova do reino de Deus, de
justiça e de paz, alcança a vida das pessoas ali onde elas se encontram e, especialmente, nas situações de sofrimento, de opressão e
de injustiça.
O sociólogo da Igreja Congregacional, Jether Pereira Ramalho,
que assina a Introdução, explica de forma muito simples e comovente
o que é oikoumene. Para ele “a oikoumene é o lugar natural da missão cristã”. Por isso, “o propósito de Deus é que a humanidade seja
integrada pelo amor, governada pela justiça e estabelecida pela paz”,
e é isso o que o movimento ecumênico deve buscar, seja no âmbito
do mundo da vida, seja no âmbito institucional. Suas palavras são
1
O Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic) é uma associação fraterna de igrejas
que confessam o Senhor Jesus Cristo como Deus e Salvador, segundo as Escrituras e, por
isso, procuram cumprir sua vocação comum para a glória de Deus Uno e Trino, Pai, Filho e
Espírito Santo, em cujo nome administram o Santo Batismo. O amor de Deus, a confissão de
fé comum e o compromisso com a missão impulsionam as igrejas membros a uma comunhão
cristã mais profunda e a um testemunho comum do evangelho no Brasil, no exercício do amor
e serviço ao povo. Respeitadas as diferentes concepções eclesiológicas, as igrejas-membro se
reconhecem convocadas por Cristo à unidade de sua Igreja, na certeza da atuação do mesmo
Cristo e do seu Espírito nelas e através delas. Sua missão é “servir às igrejas cristãs no Brasil
no fortalecimento do ecumenismo e do diálogo, na vivência da comunhão em Cristo, na defesa
da integridade da criação, promovendo a justiça e a paz para a glória de Deus. (Fonte:
www.conic.org.br)
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as palavras de quem soube viver por este ideal toda a sua vida,
como “pastor de esperanças”. Não é por acaso, portanto, que o seu
artigo tem o título de Ecumenismo, fonte de esperança.
No capítulo 1 – Unidos nas mãos de Deus teremos comunhão e
paz – o pastor da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil
(IECLB), Ervino Schmidt, afirma que “vida, reconciliação, superação de divisões e de preconceitos são realidade. Graças a Deus!” e
que “um mundo mais fraterno é possível”. Já para o pastor da União
das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil, Mario de Mello
Souza, tornar-se ecumênico implica dar quatro passos, conforme
escreve no capítulo 2 – Quatro passos para tornar-se ecumênico:
aprender a enxergar as realidades sem disfarces; localizar e diagnosticar o problema; dar respostas urgentes para necessidades urgentes e proclamar que Deus vai agir na história através de seus
parceiros e que, por isso, nunca faltará em cada geração um movimento profético integralizador.
O professor da FAEST e membro da Igreja Assembleia de Deus,
Israel Bonieck Gonçalves, no capítulo 3 – A inspiração como ponto
de partida para a unidade das igrejas – sugere que “paremos, olhemos em nossa volta e, depois de um breve silêncio, gritemos bem
alto para que todos escutem que ‘eu preciso de você, que você me
faz falta, que eu perco cada vez que seu passo é dado na direção
contrária ao trilho tortuoso da minha vida’ e, por fim, soltar um ‘ufa!’,
mesmo que acompanhado da frase: ‘Como foi difícil dizer isto!’”.
A pastora da Igreja Metodista, Nancy Cardoso Pereira, no capítulo 4 – Pedaço de mim: por outra linguagem para a separação e a
unidade –, destaca que “a unidade da Igreja de Jesus acontece e
perpassa a busca pela unidade da totalidade social (...) organicamente a serviço da vida, disposta a reinventar novas formas de poder e novas formas de ser igreja”. Manuel Neto, membro de uma
Igreja Batista da Convenção Batista Brasileira, escreve, no capítulo
5 – Um só povo: uma visão e uma ilustração – que “o desejo de Deus
é que ‘se tornem um’ e o nosso esforço deve ser o de obedecer a voz
que diz: ‘(...) e ajunta um ao outro, para que se unam e se tornem
um só’”.
A também batista, pastora Odja Barros Santos, da Igreja Batista
do Pinheiro, em Maceió (AL) fala da unidade na diversidade, desta7
cando que, “como um só povo, construímos uma realidade melhor
para todas as pessoas”. Ela assina o capítulo 6 – Na tua mão como
um só povo.
O capítulo 7 – A IPIB e o ecumenismo – foi elaborado pelo coordenador da dimensão de Ecumenismo do CEBI e pastor da Igreja
Presbiteriana Independente do Brasil (IPIB), Heitor da Silva Glória.
Ali ele afirma que “ser ecumênico é ter uma angústia profunda por
saber que a mensagem de união, fraternidade e paz anunciada por
Jesus não está sendo vivida na íntegra pelos cristãos; é buscar no
outro uma espiritualidade contrária a qualquer radicalismo e fanatismo”.
A contribuição da experiência pentecostal à unidade cristã – capítulo 8 deste livro – traz a palavra do presbítero da Igreja Evangélica Assembleia de Deus, Fernando Albano. Para ele, “a perspectiva
pentecostal marcada pela subjetividade e ênfase na ação do Espírito Santo que resulta em ‘dança, canção’ pode cooperar para a unidade das comunidades cristãs, especialmente na América Latina,
marcada pela oralidade e espontaneidade”.
Finalmente, no capítulo 9 – As lutas sociais e a questão ecumênica
no catolicismo –, está a contribuição de Adelaide Maria Klein,
coodenadora do CEBI Polo Sul e secretária de Administração do
município de Gravataí (RS). No texto, Adelaide enfatiza que, “como
igreja, ainda temos grandes dificuldades de sair de dentro de nossos muros para ir ter com o povo, ecumenicamente”.
Eis o livro na sua síntese, nas suas promessas de unidade e na
sua pluralidade de visões. Eis o livro na sua coletiva e ecumênica
unidade. É um livro que fala de saudades e de esperanças, ambas –
saudade e esperança – como uma só nas mãos de Deus. Saudade
dos pedaços de nós que um dia foram um corpo único com muitos
membros. Esperança de estarmos unidos como um só povo na mão
do Criador.
Que este livro nos ajude a sonhar. Que alimente o nosso desejo
de comunhão e de diálogo. Que ele motive a ler a Bíblia na sua relação ecumênica com a vida. Que ele nos leve para a oração pela
unidade cristã, e a oração nos leve à ação conduzidos e amparados
pelas mãos de Deus.
São Leopoldo, Quaresma de 2009.
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Introdução
Ecumenismo, fonte de esperança1
Jether Pereira Ramalho*
Para uma grande parte do povo, o sentido do ecumenismo é altamente positivo: sinônimo de paz, solidariedade, respeito às diferenças, fraternidade, quebra de barreiras. Quase desconhecido há
poucas décadas atrás, o termo passou a ser usual em nossos dias.
Não foi uma aceitação baseada só em argumentos, em racionalidade.
É uma adesão também afetiva, do coração, do sentimento, da ânsia
do espírito.
O termo incorpora, desde a sua origem, dimensão secular, sociológica, cultural e geográfica, além do sentido religioso, teológico e
eclesiástico. A raiz da palavra é grega. Vem de oikoumene – o mun1
Este texto foi originalmente publicado sob este título no Jornal Mundo Jovem, n. 300, de
setembro de 1990, p. 19 e gentilmente cedido ao CEBI. Ao reproduzi-lo como introdução
deste livro, o CEBI no ano de seu trigésimo aniversário, homenageia um de seus fundadores,
Jether Pereria Ramalho, chamado por teólogos como Rubem Alves e Leonardo Boff como
“Pastor de Esperanças” e “Um Sábio”.
* Sociólogo, membros da Igreja Evangélica Congregacional do Brasil. Fiundador do Centro de
Estudos Bíblicos (CEBI) e fundador e ex-presidente do Centro Ecumênico de Serviços à
Evangelização e Educação Popular – CESEP (RJ) e do Centro Ecumênico de Documentação e
Informação.
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do habitado. Tendo como origem primeira, a palavra oikos (casa,
lar) vai se enriquecendo com o parentesco tão significativo de economia e eco-logia.
1. Cenário da ação de Deus
A oikoumene é o lugar natural da missão cristã. O propósito de
Deus é que a humanidade seja integrada pelo amor, governada pela
justiça e estabelecida pela paz.
A dinâmica dos acontecimentos históricos está presente e sensibiliza o movimento ecumênico. Isto se torna muito evidente na
história do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), um dos marcos do
ecumenismo deste século. O CMI, fundado oficialmente em 1948, é
uma comunidade que congrega 349 igrejas cristãs de cerca de 110
países. São igrejas protestantes, evangélicas, anglicanas, ortodoxas, pentecostais, etc.2 Nas mais diversas conferências e nos esforços que antecederam à institucionalização oficial do Conselho, além
das questões relacionadas com a fé, a doutrina e a vida das igrejas,
a problemática sociopolítica e econômica exerceu influência decisiva na caminhada ecumênica. A questão da paz, da justiça, da liberdade, a luta contra todas as formas de discriminação, a completa
observância dos direitos humanos, o respeito e a integridade da
natureza, o significado perverso da globalização, enfim, todas as
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O Conselho Mundial de Igrejas (CMI) é a maior e mais representativa das muitas expressões
organizadas do moderno Movimento Ecumênico, cujo objetivo é a unidade dos cristãos. As
igrejas representam mais de 560 milhões de cristãos, incluídas a maioria das igrejas ortodoxas,
grande quantidade de igrejas anglicanas, batistas, luteranas, metodistas e reformadas, assim
como muitas igrejas unidas e independentes. Quando da fundação do CMI, a maioria das igrejas
fundadoras era europeia e norteamericana, hoje a maior parte está na África, na Asia, e Caribe,
na América Latina, Oriente Médio e no Pacífico. Para suas igrejas membro, o CMI é um espaço
insubstituível no qual podem refletir, falar, atuar, orar e trabalhar juntas, interpelar-se e apoiarse mutuamente, compartilhar e debater entre si. Como membros desta comunidade, as igrejas
que aderem ao CMI são chamadas a alcançar o objetivo da unidade visível em uma só fé e uma
só comunnhão eucarística, promovem o testimunho comum no trabalho de missão e evangelização,
realizam um serviço cristão atendendo as necessidades humanas, eliminando as barreiras que
separam os seres humanos, buscando a justiça e a paz e salvaguardando a integridade da criação,
e promovem a renovação na unidade, o culto, a missão e o serviço. (Fonte: www.oikoumene.org)
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