Um adeus português de Alexandre O’Neill: passos de um percurso possível Maria Antónia Coutinho FCSH--UNL, CLUNL FCSH [email protected] I Jornadas de Ensino do Português FCSH— FCSH —UNL UNL,, 9 9--10 de Maio de 2008 A escolha do texto Ponto de partida, no âmbito da organização das Jornadas: análise de um mesmo texto literário numa perspectiva literária numa perspectiva linguística Desafio da parte linguística: aceitar qualquer texto para análise Pressuposto teórico e empírico não há texto literário para o qual a análise linguística não tenha alguma coisa a dizer (porque qualquer texto literário mobiliza material linguístico) Um adeus português, de Alexandre O’Neill Um percurso possível uma leitura ao résrés-dodo-texto susceptível de ser posteriormente confirmada (ou infirmada) por dados extraextra-textuais Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal Não tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada Não tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal Interpelação de um tu, marcado pelas formas de 2ª pessoa em ocorrência – pronomes, determinantes possessivos, marcas de pessoa nas formas verbais. Não tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada Não tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Um tu que coincide com Não podias ficar nesta cadeira uma figura de onde passo o dia burocrático mulher (marcas o dia-a-dia da miséria de género) que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal Não tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal Não tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Um nós – marcados também pelas formas de 1ª pessoa plural em ocorrência. Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado Mas…será à alegria sonâmbula à vírgula maníaca sempre o do modo funcionário de viver mesmo nós?... Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Nós = eu+tu Nós = eu + ??? Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada Não tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal Uma relação amorosa – que perdura (a ocorrência do advérbio temporal marca a localização de uma acontecimento que vem de trás até ao presente da enunciação Um “jogo” de luz e sombra Não tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada NÃO tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal NÃO tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada NÃO tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel Organização de uma velha dor macroNão podias ficar nesta cadeira estrutural do poema em 3 onde passo o dia burocrático secções o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos /momentos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal NÃO tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada Não tu não podias ficar presa COMIGO [eu fico] à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Valor negativo de roda (equivalente a círculo fechado) por associação sintagmática com (o valor inequivocamente negativo ou disfórico de) apodrecer (cf. valor hipoteticamente positivo de roda em cantiga de roda, por ex.) Traços descritivos de animal ferido Evocação de tourada (animal ferido que avança pelo túnel) Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada NÃO tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos [que] vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Sugestão de vómito criada -pela representação do movimento ascendente (sobe aos olhos /vem às mãos) - pela enumeração descritiva que configuram os sintagmas preposicionais - pela gradação enumerativa, que vai de aspectos neutros ou positivos (às mãos/aos sorrisos) a outros fortemente negativos Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada NÃO tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual - acumulação de de adjectivos -Inversão de valores simbólicos de dia-aberturanascimento vs noite-fechomorte Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal NÃO tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Valor apreciativo - depreciativo! – associado aos adjectivos em posição prénominal Valor irónico-caricatural (trazer a dor docemente pela mão, dor à portuguesa) Reiteração-síntese dos tópicos evocados – em crescendo de explicitação: roda de náusea, pequena morte, razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal Temas surrealistas – o encontro, o acaso, o amor (louco!) -Negação polémica (onde morres ou vives não de asfixia) - cidade (quese) ideal – por oposição a [esta cidade] onde se morre ou vive de asfixia Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada NÃO tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal NÃO tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada NÃO tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal NÃO tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada NÃO tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel Tourada de uma velha dor Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesaBrandos tão mansa quase vegetal costumes NÃO tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado Miséria, à estupidez ao desespero sem boca burocracia ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino Polícia, policial até ao dia que não vem darepetição, promessa puríssima da madrugada prisão mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz de ombros puros e a sombra de uma angústia já purificada NÃO tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal NÃO tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal Não podias ficar nesta cama comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual * Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti. …e depois deste percurso… …talvez faça sentido saber que, na origem do poema, há um episódio autobiográfico: a história de amor entre o poeta A. O’Neill e Nora Mitrani, francesa ligada ao movimento surrealista conhecem--se em Lisboa, ela regressa a Paris, onde conhecem deveriam rere-encontrar encontrar--se; isso nunca chega a acontecer porque a PIDE confisca o passaporte a O’Neill que, impossibilitado de sair do país, nunca mais volta a ver Nora Mitrani. …e depois deste percurso… …talvez faça sentido o tema do amor (impossível ou impossibilitado) o tema da separação e do adeus o tema (da imagem) de Portugal (de um adeus português) o tema da revolta e da denúncia o tema de um país outro (um mundo outro?!) En disant que le sens du texte est immanent non au texte, mais à la pratique d’interprétation, nous reconnaissons que chaque lecture, “savante” ou non, trace un parcours interprétatif qui correspond à l’horizon du lecteur. La sémantique des textes propose une description des parcours interprétatifs: le sens actuel du texte n’est qu’une de ses actualisations possibles; le sens “complet” serait constitué de l’ensemble des actualisations, en d’autres termes l’ensemble des horizons possibles. Le sens d’un texte n’est clôturable que par l’arrêt de ses lectures, qui appartiennent alors au passé; il quitte alors ainsi la tradition et la vie, et cette clôture témoigne plutôt d’une fermeture que d’une plénitude, car un livre fermé n’a plus de sens. En revanche, les textes qui sont relus gardent un sens ouvert. Leur sens a une histoire vivante, celle de leur tradition interprétative, série non close de réécritures, qui sont autant de nouvelles lectures: elles dépendent de la pratique où elles prennent place, obéissant à des objectifs éthiques, esthétiques ou cognitifs. Cependant, le plaisir, le devoir, et la volonté de savoir restent inassouvis. Sur ce point crucial, une sémantique des textes peut distinguer entre les structures closes, qui épuisent la lecture, et les structures ouvertes, qui permettent au lecteur de transformer l’équivoque en infini. 277-278 Rastier, F. 2001. Arts et sciences du texte. Paris: P.U.F., pp. 277-