CMYK Editora: Ana Paula Macedo [email protected] 3214-1195 • 3214-1172 / fax: 3214-1155 16 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, segunda-feira, 23 de julho de 2012 Alô, alô, marcianos Nunca o planeta vermelho esteve tão próximo da Terra. Para que tudo dê certo no pouso do laboratório Curiosity, a Agência Espacial Americana desenvolveu uma tecnologia de dar inveja aos roteiristas de filmes de ficção científica m duas semanas, o Laboratório de Ciências Marciano (MSL, na sigla em inglês) Curiosity descerá no solo do planeta vermelho, realizando o pouso mais elaborado já planejado pela Agência Espacial Norteamericana (Nasa) em uma missão não tripulada. O equipamento contará com um complexo sistema de explosões, foguetes e até mesmo um paraquedas para chegar a Marte em segurança. A manobra inédita deve-se às dimensões do equipamento de quase 1t, mais elaborado e cinco vezes maior que as outras duas máquinas já enviadas ao planeta. O veículo, tão grande quanto um carro de passeio, leva 10 equipamentos que somam 75kg, um verdadeiro arsenal de câmeras, lasers e sensores que vão construir um relatório completo sobre Marte — e, se a missão for bem-sucedida, talvez encontre algum vestígio de vida no planeta. Essa jornada ambiciosa de US$ 2,5 bilhões começou há sete anos e teve seu ponto mais alto em 26 de novembro, quando o MSL foi enviado em direção ao espaço. A viagem de 570 milhões de quilômetros termina em 5 de agosto, quando a espaçonave terá de fazer uma manobra arriscada para entrar na atmosfera mar- E ciana em segurança. Os outros veículos da Nasa que já pousaram em Marte entraram no planeta envolvidos em um grande air bag, que os protegeu da queda. Mas, como o Curiosity é muito grande, a equipe da agência teve de inventar um método completamente novo para o pouso. Quando a nave estiver entrando na atmosfera a mais de 20 mil km/h, uma série de foguetes guiados por radares vão desacelerar e começar a manobrar o veículo. Então, explosivos vão liberar o estágio de cruzeiro, que o guiou e o manteve conectado com a Terra durante a maior parte da viagem. Depois, molas vão liberar pesos de tungstênio, que controlarão o centro gravitacional da nave. Assim que o Curiosity estiver na posição correta, um paraquedas supersônico vai se abrir, enquanto o escudo de calor, que fica sob o veículo, se separará, revelando uma câmera que vai filmar toda a descida. A aeronave vai, então, diminuir a velocidade para 320km/h, e seis motores de pouso levarão o equipamento, enquanto o veículo libera suas seis rodas. Por último, um conjunto de propulsores vai deixar o MSL em segurança no chão e o liberar por uma série de pequenas explosões, até que ele voe sozinho para longe. “Pousar em Marte é sempre arriscado, tudo pode causar problemas. É um am- biente muito único e desafiador”, resume Doug McCuistion, diretor do programa de exploração em Marte da Nasa. “É como uma fileira de dominós: com a soltura do estágio de cruzeiro, começa uma longa linha de peças que vão caindo automaticamente. Se uma está fora do lugar, é provável que a última não caia. É provável que o veículo atinja o chão com mais força do que queríamos”, especula. Bem no alvo Todo esse planejamento procura garantir que o laboratório espacial desça na área escolhida para o pouso, uma enorme depressão chamada cratera Gale. “Achamos que a água correu por aquela superfície há bilhões de anos. A cratera seria como uma tigela, que pode ter capturado alguma coisa que passou por ali. Temos de ir no meio dessa tigela para buscar por água”, explica John P. Grotzinger, do Instituto de Tecnologia da Califórnia. Como o veículo precisa evitar viagens longas para economizar energia, ele deve descer o mais próximo possível do Monte Sharp, montanha localizada bem no centro do ponto geográfico que atrai a curiosidade de cientistas há 40 anos. Se o veículo resistir ao pouso, ele vai trabalhar por ao menos dois anos, vasculhando o planeta à procura de carbono ou de água, os dois componentes CMYK » ROBERTA MACHADO essenciais para a existência da vida. “Achamos coisas que sugerem que Marte passou por uma transição de um grande planeta que perdeu sua atmosfera e virou o planeta frio e seco que conhecemos hoje. Uma das grandes razões para ir a Marte é saber se a vida começou lá. Essa linha nos daria a conclusão de que criar vida é fácil, e que o universos está cheio de lugares com vida. Isso seria espetacular”, diz Michael Meyer, principal cientista do programa marciano. Entre os equipamentos criados para encontrar as provas de existência orgânica em Marte, estão uma série de câmeras que vão fotografar panorâmicas, registrar as proximidades e até mesmo o chão do planeta, conforme a nave estiver pousando. “O veículo passa por mudanças de configuração no pouso, e vai levar algum tempo para os engenheiros configurarem. Por isso, o sinal vai desaparecer logo depois do pouso, mas logo poderemos receber transmissões Em detalhes Para seguir a missão marciana da Nasa pelo Facebook, acesse o endereço www.facebook.com/marscuriosi ty. Também é possível acompanhá-la pelo Twitter: www.twitter.com/marscuriosity dele. Com o tempo, as imagens devem chegar à Terra com duas ou três horas de atraso. Vai levar algumas semanas para recebermos as imagens em alta resolução”, explica Peter Theisinger, chefe da missão. Algumas das imagens serão em preto e branco, mas outras câmeras poderão até mesmo formar vídeos coloridos em três dimensões e alta resolução. Tecnologia de ponta Alguns dos instrumentos, no entanto, mais lembram um filme de ficção científica. Sob o veículo há uma arma de nêutrons, que vai atirar feixes a até meio metro abaixo da superfície para procurar água. Outro equipamento que impressiona é uma câmera batizada de ChemCam. Ela fica acoplada a um laser, que pode atirar em qualquer amostra de solo ou rocha que pareça interessante. Baseada apenas na poeira do material pulverizado, esse telescópio é capaz de identificar os elementos químicos da amostra, para que a equipe avalie se vale a pena recolher um pouco para uma pesquisa mais detalhada. Os cientistas ainda poderão usar um sensor que fica na ponta do braço robótico para bombardear o elemento com partículas alfa e saber ainda mais sobre ele. Somente então, a garra poderá escavar o chão com uma broca e inserir a amostra no interior do laboratório, onde ele vai passar por mais uma série de exames em níveis atômicos. Cada uma dessas análises pode levar até 10 horas. “O problema da quebra de compostos é que podemos achar algo que não era aquilo na verdade. A parte difícil seria decidir se o composto é biológico ou de um processo químico. Com certeza haverá debates sobre isso”, ressalta Michael Meyer Além de água e carbono, a missão vai procurar outros elementos importantes para a vida, como nitrogênio, fósforo, enxofre e oxigênio. Duas das ferramentas do veículo vão se dedicar, ainda, a produzir um relatório sobre os gases e sobre o nível de radiação da superfície planetária. Esses dados podem não dizer muito sobre a existência de formas de vida no passado do planeta, mas darão uma noção bastante exata do que esperar no futuro, em uma possível missão tripulada. www.correiobraziliense.com.br Assista a uma simulação computadorizada de como será o pouso do Curiosity em Marte.