Cidadãos do mundo: Se houver alguém que ainda duvide que tudo é possível; que ainda questione o sonho dos nossos fundadores; que ainda se pergunte se o poder de uma micro‐ação tem impacte na macropaisagem da nossa sociedade, hoje tem uma resposta.1 Este é o momento pelo qual todos esperávamos, o momento em que os agressores se juntam às suas vítimas numa ação preventiva para salvar o planeta e a autoestima da Humanidade. Tudo começou num belo dia, a 21 de junho de 2013, quando uma agência de viagens de luxo nos propôs o percurso mais exclusivo à face da Terra: O Ártico seria navegável pela primeira vez e nós, os homens e mulheres mais abastados do mundo, seríamos os pioneiros nessa travessia. Foi ainda durante esse verão que o maior iceberg do mundo, com 7 milhões de toneladas, derreteu, causando a subida do nível das águas em muitos metros e fazendo desaparecer cidades icónicas, como Veneza, ou países sobrepovoados, como o Bangladesh, matando milhares, desalojando milhões e causando fome e desespero. Quando nos preparávamos para regressar desta inesquecível viagem, com as máquinas cheias de fotos, a vida cheia de cocktails, e ignorando as catástrofes que se desenrolavam em terra, fomos aconselhados a permanecer mais uns dias no Ártico. Na nossa ausência, as nossas propriedades tinham sido incendiadas ou vandalizadas, e algumas celebridades, assim como CEO’s que, infelizmente, não partilhavam as suas férias connosco, tinham sido capturados, brutalmente agredidos e abocanhados por uma população enraivecida e esfomeada. 1 RetiradododiscursodevitóriadeObamaem2008 Enquanto as temperaturas desciam e anunciavam mais um inverno num Ártico que voltava a congelar, o capitão do paquete recusava‐se a navegar e o cozinheiro chefe recusava‐se a alimentar‐nos. Pela primeira vez as nossas fortunas não valiam de muito e foi quando nos reconhecemos como homens mortos que se tornou importante sobreviver o maior tempo possível...2 Hoje, pertencemos ao movimento 1% que deseja subsidiar todos os operários industriais do planeta para que deixem de produzir durante 7 anos, reduzindo drasticamente as emissões de carbono, ganhando tempo para a restruturação de todos os setores da sociedade e permitindo a regeneração da Terra. Hoje, o movimento 1% concorda em interromper todas as ações de caridade e filantropia e compromete‐se a utilizar até 80% das respetivas fortunas individuais na mudança radical do estilo de vida global. Hoje, Madeleine Gates e Laurene Powell Jobs garantem, pessoalmente, um computador portátil para todos os que ainda não têm um, assim como acesso gratuito à educação em todos os cantos do mundo. Hoje, a esposa de Mukesh Ambani, em nome do seu marido, inicia o processo de devolução de todos os subsídios estatais à sua indústria do petróleo e deseja que esse dinheiro seja aplicado no desenvolvimento das indústrias de energias renováveis. Hoje, Paris Hilton lança a sua campanha “no more easy‐jet‐set tourism” transformando a cadeia de hotéis de 5 estrelas do pai num projeto artístico e comunitário intitulado Alexandria. Hoje, Carlos Slim Helú, o magnata das telecomunicações, promete providenciar ligações telefónicas e de internet para todos. Hoje, Lakshmi Mittal, magnata do ferro, e Eiki Batista, Governador do Brasil e detentor das maiores minas de ouro do mundo, prometem fechar todas as suas minas enquanto garantem os ordenados de todos os seus mineiros durante 7 anos, oferecendo‐lhes o tempo e o dinheiro necessários para refazerem as suas vidas, as suas casas e por vezes os seus países, após décadas de escravidão e exploração. Hoje, Li Ka Ching, detentor do maior império de construção civil no mundo, de 13% do tráfego de contentores mundial, principal fornecedor de água potável e sistemas de in1984,GeorgeOrwell. 2 esgotos, e que emprega mais de 270 000 pessoas em 53 países, promete converter o seu império num negócio sustentável, começando já na próxima segunda‐feira com a ação simbólica de parar toda a sua produção de brinquedos e de flores de plástico. Por último, hoje, às 23h59, foi pedido o congelamento de todas as transações na Bolsa. Desejamos oferecer à sociedade 7 anos sabáticos para pesquisa tecnológica, cultural, artística e social, com o objetivo de reequilibrar a relação entre o Homem e tudo o que o rodeia, recuperar a confiança no futuro e sobretudo exercitar a utopia em tempo real. E como? Reconvertendo todos os exércitos nacionais e transnacionais em brigadas de descarbonização e de combate à desflorestação; Exigindo uma paragem imediata da produção de carne industrial, responsável por 40% das emissões de carbono do mundo; Defendendo que os pequenos agricultores podem alimentar o mundo; Defendendo que é necessário colocar um fim às patentes de organismos vivos; Convidando todos os políticos a fazer umas férias prolongadas, a abandonarem o seu “mar de cristal silencioso” e a vaguearem pelas ruas comendo sandes pré‐aquecidas em quiosques ou estações de serviço, a lerem literatura, a descobrirem os circuitos de arte alternativa, assim como a conhecerem aqueles que neles votaram. Abandonemos de uma vez por todas, em 2020, o conceito de trabalho do século XIX, e procuremos o verdadeiro valor que um Homem tem para e neste planeta. No final, a resposta poderá até ser demasiado evidente: Para mudar o mundo basta viver melhor. É por isso que gritamos: Ricos do mundo: Uni‐vos! De pé, ó vítimas do excesso e prisioneiros da ganância! Temos 7 anos para redistribuir toda a terra, toda a energia, toda a cadeia alimentar, todo o conhecimento. Temos 7 anos para podermos dizer: Se o século XX foi o século em que as mulheres desejaram ser como os homens, que o século XXI seja o século em que os homens desejam ser como as mulheres. É por tudo isto que vos dizemos, a todos vós que não têm um milhão: Não questionem o nosso passado nem as nossas intenções e juntem‐se a nós nesta desmesurada tarefa de refazer o mundo da única forma possível: bloco a bloco, tijolo a tijolo, semente a semente, mão a mão.3 Nunca nos devemos esquecer: Nós somos o 1% que pode dizer: Yes we can! E para terminar evocamos as proféticas palavras de Mao Zedong, um colega empresáriodoséculopassado: “Reinaadesordemdebaixodoscéus,asituaçãoéexcelente”. O movimento G1% IndiscursodevitóriadeBarakObama. 3 Cidadãos do mundo: Se houver alguém que ainda duvide que a Nova Babilónia é o lugar onde tudo é possível; que ainda questione o sonho dos nossos fundadores; que ainda se pergunte sobre o poder da nossa nova ordem global, hoje tem uma resposta.4 Uma resposta dada em números e não em palavras. Ninguém acreditou em nós quando afirmámos que os produtos agrícolas geneticamente modificados alimentariam o mundo, que os pesticidas eram os melhores amigos dos homens e das plantas, e que a resposta a todas as nossas orações estava na tecnologia e no mercado livre. Fomos os únicos que acreditámos sem medo no “business as usual”, quando todos os outros se ocupavam em construir cenários apocalípticos e visões catastróficas do planeta. Nós vimos sempre uma oportunidade em cada dificuldade onde os nossos opositores viram sempre uma dificuldade em cada oportunidade*5. Nos primórdios desta nossa luta, obrigámos cada viajante a plantar uma árvore geneticamente modificada por cada viagem de longa distância, árvores que podiam ser compradas em aeroportos ou estações de serviço, ou ainda ser plantadas por outrem por pouco mais do que o preço de um semanário. Mantivemo‐nos fiéis aos nossos princípios neoliberais enquanto, simultaneamente, descarbonizámos o planeta de acordo com planos assinados pelos antigos Estados em 2020. O mundo não é perfeito e nunca existirá igualdade entre os povos, e é na compreensão de que o Homem é um predador (ou uma presa) natural, e na aceitação de que a sociedade não é mais do que uma coleção de indivíduos que partilha mais diferenças do que semelhanças, que reside o nosso contínuo sucesso. 4 5 SicBarakObama. CorrupteladaafirmaçãodeWinstonChurchill. Hoje, todo o ar, toda a água e toda a terra estão privatizadas com o único propósito de servir, nas quantidades necessárias, toda e cada família deste planeta que cumpra, naturalmente, os seus deveres para com a Nova Babilónia. Não é sem orgulho que anunciamos que as nossas refinarias de oxigénio milenar estão prontas, garantindo que o oxigénio não faltará a ninguém. Hoje, a chegada da primavera pode ser provocada, 2, 3, 4 vezes por ano, garantindo uma produção agrícola constante e a procriação apropriada dos animais, enquanto o inverno pode agora ser concentrado em poucos dias e apenas em algumas regiões através de intervenções geológicas e calculados desvios do curso dos rios. Hoje, todas as formas de vida na Terra são patenteadas (e, em breve, também o sol e os recém‐nascidos o serão) e todas têm uma função. Nada é desperdiçado: Nem coisas, nem tempo nem pessoas, mesmo quando mortas. Hoje, somos uma sociedade rica que vive sobretudo na Nova Babilónia, nas margens do Ártico. Somos o admirável mundo novo, o sonho dos nossos antecessores, o paraíso mais sofisticado alguma vez construído na Terra, protegido por muros de 50m de altura. Hoje temos connosco os melhores especialistas em todas as áreas da economia e da ciência enquanto somos alimentados pela zona rural do mundo, a Eurábia, que nos fornece alimento e matéria‐prima, e fornecidos pela zona industrial do mundo, a Eurásia. Hoje, em 2084 (ou melhor dizendo, 2030, se não contarmos com todas as primaveras), podemos afirmar com orgulho que atingimos um nível de produção superior a 35 planetas, o mais elevado de toda História e um objetivo inimaginável para os nossos avós, excessivamente preocupados com os limites da Terra. O mundo é hoje, sem sombra de dúvida, um lugar fantástico, mas ainda nos restam alguns desafios: Por exemplo, os trabalhadores dos serviços menos agradáveis são ainda um mal necessário. As máquinas ainda consomem mais do que simples operários e ainda é mais barato contratar pessoas em vez de robôs. Mas tal não será assim por muito tempo: A fundação Craig Venter encontra‐se a desenvolver novas e radicais bactérias que conseguem reproduzir variadíssimas atividades químicas necessárias à indústria sem que seja necessária qualquer intervenção humana, como por exemplo: fixar carbono, de forma particularmente eficiente, reproduzir hidrogénio, sem termos de recorrer a grandes perdas de energia, ou transformar nitrogénio em amoníaco: Espera‐nos uma verdadeira revolução microbiológica e cedo teremos todos os micróbios do planeta ao nosso serviço; o maior sucesso é já o Pigeon d’or: Alimentando os pombos com bactérias inofensivas (tal como fazemos aos homens quando lhes damos iogurtes para comer), poderemos transformar a sua merda em detergente da mais alta qualidade e em produtos cosméticos dos mais variados. É por todas estas boas novas que hoje não só celebramos todas as reformas anteriores como apresentamos novas e mais radicais medidas, garantindo assim um futuro sempre melhor. Aqui anunciamos algumas das mais importantes: ‐ Triplicaremos os subsídios dos exércitos privados e de todas as empresas de segurança que protegem as nossas florestas, as nossas minas de lixo e as nossas centrais financeiras, evitando, assim, qualquer disrupção no Mercado. ‐ Uma nova e milionária indústria de alcoviteiras profissionais será criada para que nenhum homem fique sem mulher, com vista a uma procriação humana sustentável, dependendo da região em que habitam, ou seja: será promovido o aumento dos apoios a quem queira ter mais de 2 filhos na Eurábia ou na Eurásia (onde é necessária mão‐de‐obra em maior quantidade) e será mantida a política de filho único para quem vive no Centro da Nova Babilónia, para além de oferecermos autorizações especiais a quem deseje ter um maior número de rebentos e por isso se veja forçado a emigrar para as zonas onde tal é permitido. ‐ O direito de voto apenas abrangerá cidadãos maiores de 35 anos ou que tenham mais de 20 anos de trabalho consecutivo (desempregados e reformados não poderão votar). ‐ O tratamento de doenças crónicas é proibido, mas, em contrapartida, a eutanásia será legal e estará acessível a todos os doentes que se sintam um fardo para a sociedade. ‐ O Comité de Saneamento, criado em 2020 com o objetivo de selecionar os setores da sociedade, da vida animal e da vida vegetal que devem ser exterminados, será inteiramente automático, impossibilitando qualquer intervenção moral na escolha daquilo ou daqueles que devem desaparecer de forma permanente da face da Terra. Como resultado de decisões anteriores deste comité, todos os estudos artísticos e culturais serão cancelados este ano. ‐ Arte e cultura serão praticadas apenas em lares para idosos, escolas, estabelecimentos prisionais ou hospitais psiquiátricos; ‐ No próximo ano, a Lua poderá contar com a primeira estância de férias de luxo, e o nosso projeto de colonização planetária será lançado em Marte para que possamos redesenhar o planeta vermelho e torná‐lo mais azul e adequado à vida humana. ‐ Em breve o Centro de Pesquisa para a Fotossíntese Humana permitirá que cada um de nós possa produzir o oxigénio de que necessita a partir do dióxido de carbono lançado pelas próprias máquinas que utiliza no seu dia‐a‐dia. ‐ Em breve a escolaridade deixará de ser obrigatória e as aulas passarão a ser lecionadas por psiquiatras em vez de professores. O único objetivo da educação será formar futuros trabalhadores para a indústria, trabalhadores que terão a oportunidade de reembolsar todo o investimento feito na sua formação trabalhando para a empresa que patrocinou os seus estudos. ‐ Em breve o mundo será dividido em duas novas regiões: a região onde a moeda real e os títulos de tesouraria podem circular sem restrições e as regiões que passarão a utilizar cupões para produtos de necessidade imediata. Sabemos que o caminho a percorrer ainda é longo e que a caminhada será íngreme6. Mas onde uma plantação de bananas for destruída, vitaminas e minerais serão distribuídos gratuitamente, onde a água for racionada, uma indústria de perfumes florescerá, onde alguém fizer greve, companhias privadas de segurança serão convocadas para terminar o protesto de imediato e garantir que a indústria continue a produzir para que vocês, consumidores, possam continuar com a vossa vida enquanto nós, governantes, tomamos conta de todas as vossas necessidades. É por tudo o que vos dizemos hoje que vos pedimos para não perderem muito tempo a questionar todas as medidas que vos propomos nem as nossas intenções mas que se juntem a nós neste desmesurada tarefa de refazer o mundo da única forma possível: bloco a bloco, tijolo a tijolo, semente a semente, mão a mão.7. Nunca nos podemos esquecer: Nós somos o 1% que manda no mundo, a minoria que pode comer carne e peixe, os únicos que chegaram ao topo e podem dizer: YES WE CAN! RetiradodeumdosdiscursosdeBarakObama. RetiradodeumdosdiscursosdeBarakObama. 6 7 E para terminar evocamos estas palavras de Mao Zedong, um colega empresário do século passado: “Reina a desordem debaixo dos céus, a situação é excelente”. O G8 das principais corporações da Nova Babilónia