Retiro espiritual O QUE É E PARA QUE SERVE Os retiros espirituais, nas suas diversas modalidades, têm sido utilizados durante séculos pelos cristãos para melhorar a sua vida espiritual. Hoje especialmente, são particularmente necessários, porque estamos imersos numa cultura caracterizada pelo materialismo e pela ausência do sentido da transcendência, na vida e nos acontecimentos. Nestas páginas procura-se apresentar uma rápida explicação sobre o que são e para que servem os retiros, com o fim de que muitas pessoas possam beneficiar deste extraordinário meio, tão prático e tão oportuno nos nossos dias. Contexto social: “A cultura da pressa e do bem-estar” 1. A CULTURA DO BEM-ESTAR Em toda a sua história, jamais o homem sonhou com um grau de conforto como aquele de que desfruta hoje nos países do primeiro mundo. Ninguém duvida de que isto é uma grande conquista do homem. Mas, por outro lado, nos dias de hoje quem é que pode ficar indiferente, ao verificar que esta conquista também pode ter efeitos devastadores para o espírito humano? Num ambiente de consumismo e de hedonismo produz-se a asfixia do espírito, cujos anseios e impulsos espontâneos ficam adormecidos e se vão apagando pouco a pouco até quase desaparecerem, como as brasas entre a cinza. “Todos nós experimentamos, quase palpavelmente, os tristes efeitos desta sujeição cega ao mero "consumo ": antes de tudo, uma forma de materialismo crasso; e, ao mesmo tempo, uma insatisfação radical, (...) porque quanto mais se tem mais se deseja, enquanto que as aspirações mais profundas restam insatisfeitas, e talvez fiquem mesmo sufocadas.” João Paulo II - A Solicitude Social da Igreja, n. 28 2. A PRESSA Nunca vivemos melhor; mas nunca vivemos tão agitados. O horário de trabalho, que por vezes acaba demasiado tarde; a família, à qual dedicamos menos tempo do que gostaríamos; compromissos inultrapassáveis; relações sociais; reuniões e imprevistos de todo o tipo... Enredados num emaranhado de compromissos e obrigações, por vezes perguntamo-nos se somos realmente os protagonistas da nossa vida, ou simplesmente empurrados pelas circunstâncias que nos arrastam como uma correnteza forte e imbatível. “O homem, esmagado pelas suas ocupações, com tudo se ocupa menos com viver”. Sêneca - Sobre a brevidade da vida 3. DENTRO DE UMA ESPIRAL Muitos são conscientes de que estão metidos numa dinâmica humanamente empobrecedora. Sentem vagamente que nas suas vidas, tão cheias de muita coisa, falta algo. Mas não sabem como mudar o curso das coisas. A correria do dia-a-dia, do qual não sobra muito tempo, anestesia rapidamente esses vagos desejos de mudança. E tudo continua na mesma. É a dialética do urgente e do importante. Há sempre qualquer coisa urgente que nos impede de encontrar tempo para o importante. “E passam os anos sem que nos demos conta, como se fossem estações em que o comboio não pára.” R. Knox 4. UMA PAUSA NECESSÁRIA “O que estou fazendo com a minha vida? Para quem trabalho desta maneira? O mundo pode parar uns dias! Preciso pensar!” - Pois bem, em certo sentido o retiro torna realidade este “milagre". A paz de uns dias de retiro serve para pensar com calma no que é importante, longe do ruído urbano, e para pôr um pouco de ordem nas idéias. Família, trabalho, vida cristã, amizades... Está cada coisa no seu lugar? Tenho que redimensionar algum aspecto da minha vida? “Procurai fazer um pouco de silêncio, também cada um de vós na vossa vida, para pensar; refletir e rezar com maior fervor e fazer propósitos com mais decisão. Hoje é difícil fazer "zonas de deserto e de silêncio" porque estamos continuamente envoltos numa engrenagem de ocupações, no barulho dos acontecimentos e nos anúncios dos meios de comunicação, de modo que a paz interior corre perigo e encontram obstáculos os pensamentos mais sérios que devem qualificar a existência do homem.” - João Paulo II 5. FUGIR DO MUNDO? Afastar-se das ocupações e procurar um silêncio para pensar... Não seria isto fugir do mundo? Será que o mundo é mau? Não. Um cristão corrente deve amar apaixonadamente o mundo em que vive e os compromissos que dele decorrem. A agitação da sociedade moderna é para ele o seu meio natural, no qual vive, como “peixe na água”. Mas o cristão sabe também que a cidade dos homens, que com o seu esforço ajuda a construir, não é para ele a verdadeira pátria. A sua viagem leva-o mais longe. Uns dias de retiro, como outros meios ascéticos que podemos praticar, ajudam-nos não a renegar o mundo, mas a distanciar-nos o estritamente necessário para nos podermos mover nele com visão sobrenatural. “escondido nas situações mais comuns, há algo de santo, divino, que cabe a cada um de vós descobrir.” - São Josemaria Escrivá - Temas Atuais do Cristianismo, n° 114 6. UM DEUS LONGÍNQUO? Numa cultura materialista, Deus passou a ser para muitos um ser profundamente estranho. "Mas... Deus ainda existe?" O homem contemporâneo é avesso à religião. Deus costuma ficar demasiado longe dos seus interesses diários e, em outros casos, é um empecilho que estorva ou incomoda o projeto vital, de modo que é posto num canto. Uns dias de retiro servem para descobrir um Deus mais próximo, presente na teia da vida diária, que dá profundidade sobrenatural à nossa existência de cristãos. “As pessoas, geralmente, têm uma visão plana, pegada à terra, de duas dimensões. -Quando a tua vida for sobrenatural, obterás de Deus a terceira dimensão: a altura. E, com ela, o relevo, o peso e o volume.” - São Josemaria Escrivá - Caminho, 279 7. RECOLHIMENTO Os dias de retiro são dias de silêncio e de recolhimento interior. Fechamos por umas horas a porta dos sentidos e esquecemo-nos das preocupações, para dar prioridade à atividade interior, ao exame de consciência, à reflexão pausada feita na Presença de Deus sobre a nossa vida. O silêncio é talvez uma das mais graves carências da nossa sociedade, até o ponto de alguns terem medo dele. Necessitam de estar acompanhados do ruído exterior para não se encontrarem, encontro terrível, consigo próprios. Diz a famosa frase de Cícero: "Nunca estou menos só do que quando estou só". Traduzido com uma visão cristã poderia dizer-se: Nunca estou menos só do que quando estou a sós com Deus. 8. APRENDER A FALAR COM DEUS Procurar o recolhimento é uma constante na história da espiritualidade, porque no recolhimento dá-se mais facilmente o encontro da alma com Deus. Sem outras preocupações que distraiam a nossa atenção, é mais fácil dirigirmo-nos a Deus. Aprendemos assim a movimentar-nos nesta atividade essencial à vida cristã: fazer oração, ganhar intimidade com Deus, dirigir-se a Ele e escutá-Lo. Os dias de retiro convertem-se deste modo numa escola de oração cristã, que se prolongará depois na vida diária. “Começo sempre a rezar em silêncio, porque Deus fala no silêncio do coração. Deus é amigo do silêncio: necessitamos escutar a Deus, porque o que importa não é o que cada um de nós diz, mas o que Ele nos diz e nos transmite.” Madre Teresa de Calcutá - Caminho de simplicidade 9. PROPÓSITOS DE CONVERSÃO Como resultado de uns dias de retiro bem aproveitados, os frutos virão espontaneamente, quase sem os procurarmos: propósitos de conversão, grandes ou pequenos, em algum aspecto da nossa vida. Porque, em última análise, um retiro consiste nisso: em situarmo-nos na Presença de Deus, que nos convida sempre a uma nova conversão, a uma renovação da nossa vida cristã, e enfrentarmo-nos com a verdade sobre a nossa vida. E, com a graça de Deus, e se queremos também com a ajuda do sacerdote, decidirmo-nos a mudar o que seja necessário mudar, a melhorar o que seja necessário melhorar. “Os homens estão sempre dispostos à curiosidade e a averiguar as vidas alheias, mas têm preguiça em conhecer-se a si próprios e a corrigir a sua própria vida.” Santo Agostinho - As Confissões OS RETIROS ORGANIZADOS PELOS CENTROS DO OPUS DEI (www.opusdei.org.br) O Opus Dei proporciona a quem desejar meios de formação que os ajudem a ter uma relação assídua com Deus no seu trabalho e nas atividades do dia-a-dia. Entre esses meios encontram-se os retiros. Geralmente preenchem sexta-feira, sábado e domingo, para que não afetem demasiado o horário de trabalho, embora também se organizem por vezes durante a semana para quem dispõe desse tempo. O horário de um dia de retiro está preenchido com várias práticas dirigidas pelo sacerdote, palestras de formação, a Santa Missa, o terço e outros atos de piedade, e também amplos espaços entre estes atos para que cada um medite por conta própria ou leia algum livro apropriado.