A IMPORTÂNCIA DA DISCIPLINA ÁLGEBRA LINEAR NOS CURSOS DE ENGENHARIA Solange dos Santos Nieto1, Célia Mendes Carvalho Lopes 2 Abstract Linear Algebra plays an important role in the mathematics and its applications. Teaching the elements of linear algebra is an excellent chance to initiate the student in the precision of the mathematical argument, as well as in the construction of demonstrations. Its teaching goes from the simplest and direct presentation, aiming at, particularly, the users not mathematicians, to the deepened theories more as, for example, the concept of Vectorial Spaces in more advanced algebraic theories. In this work, it is discussed the main causes of failure in the teaching of this discipline, having as guide in our analysis the previous knowledge of Mathematics of the freshman students in the course of Engineering. Key words - Linear Algebra, Construction of Knowledge, Quality in Teaching. A Álgebra Linear ocupa papel importante nas diversas áreas da Matemática – da Análise à Estatística, onde se utilizam, constantemente, os Cálculos Matricial e Vetorial. A importância da Álgebra Linear tem crescido nas últimas décadas, os modelos matemáticos lineares assumiram um importante papel juntamente com o desenvolvimento da informática e como seria de se esperar, esse desenvolvimento estimulou um notável crescimento de interesse em Álgebra Linear. Sua importância vai desde as ciências sociais às ciências exatas, permitindo seu uso diário em áreas como economia, aviação, exploração petrolífera e circuitos eletrônicos. A disciplina Álgebra Linear surge no terceiro grau, na grade curricular de diversas áreas, como na Matemática, Física, Engenharia, Economia e, geralmente, no primeiro ano contendo quatro ou duas horas aulas. Em cada uma dessas áreas, a ênfase dada a essa disciplina é diferente, podendo-se dizer que existem diversos cursos de Álgebra linear. Os livros didáticos apresentam esse conteúdo matemático de formas bem diferenciadas. Alguns autores, preocupados com o julgamento dos alunos, colocam no prefácio de seus livros, esclarecimentos que o conteúdo desenvolvido é tangível e concreto. Sabemos que ensinar Álgebra Linear para os cursos, dos quais ela faz parte, não é uma tarefa fácil, constituindo-se um desafio e requerendo um grande esforço. Os livros mais antigos de Álgebra Linear apresentavam uma abordagem expositiva tradicional, o que para os alunos atuais é incompatível. O desenvolvimento axiomático, apesar de importante, não parece apropriado, dependendo a que curso se destina. Mas, é surpreendente que poucos livros sobre Álgebra Linear acompanharam as necessidades diversificadas das pessoas que utilizam seus conteúdos dependendo de cada campo de atuação. Porém, resta outro problema, também importante, que consiste na Álgebra Linear necessária para cada curso no qual a Álgebra Linear não é um fim, mas um meio para seu melhor exercício. Barufi [1], em sua tese de doutorado, nos revela dados alarmantes sobre o “fracasso no ensino de Cálculo” disciplina que é tema de vários trabalhos em eventos nacionais e internacionais. Nosso trabalho irá abordar, com alguns exemplos, as dificuldades que esta disciplina, a Álgebra Linear, apresenta para o seu aprendizado, alertando que o nível de reprovação já está alcançando o de Cálculo Diferencial e Integral. Nesse sentido, cabe destacar e apresentar alguns elementos fundamentais que influenciam e determinam as transformações do saber ensinado na escola. A transição da matemática desenvolvida no ensino médio para a do ensino universitário apresenta uma série de dificuldades para os alunos. A introdução de idéias abstratas implica numa mudança profunda de como o aluno deve mudar sua forma de raciocinar. Para Guzman et.al. [2] ao se ingressar na universidade os alunos passam por “uma transição difícil, [...] as demonstrações adquirem novo e importante valor. Eles têm que completar e estabelecer através de deduções lógicas propriedades e definições formais”. A definição de espaço vetorial é apresentada no livro [3] é: “Seja V um conjunto de elementos chamados vetores, no qual as operações de adição de vetores e multiplicação de vetores por escalares. Isto é, dados os vetores u e v de V e um escalar k, os vetores u + v e ku também pertencem a V (isto é, V é fechado para a adição de vetores e a multiplicação de vetores por escalares). Então V é chamado espaço vetorial se, dados três vetores quaisquer u, v e w de V e dois escalares k e m, as propriedades a seguir são válidas” (não apresentaremos as 8 propriedades, pois a definição já esclarece nossa preocupação). 1 Solange dos Santos Nieto, Universidade Presbiteriana Mackenzie, Rua Itambé, 45, 01239-902, São Paulo, SP, Brazil, [email protected] 2 Célia Mendes Carvalho Lopes, Universidade Presbiteriana Mackenzie, Rua Itambé, 45, 01239-902, São Paulo, SP, Brazil, [email protected] ©2006 WCCSETE March 19 - 22, 2006, São Paulo, BRAZIL World Congress on Computer Science, Engineering and Technology Education 611 Exemplificando, ao utilizarmos o espaço vetorial das matrizes quadradas de ordem 2 (geralmente notado por M2), teríamos condição de recordar as operações envolvendo as matrizes, que a soma de matrizes só é possível se elas tiverem mesma ordem e que a multiplicação de um escalar por uma matriz, não altera a ordem da matriz. Usando como referência o exemplo das matrizes, podemos observar como são as relações estabelecidas pelos alunos entre o conteúdo desenvolvido no ensino médio e na universidade. Que tipo de ligação o aluno vai fazer? Como os novos significados são construídos? Primeiramente, devemos mencionar que a idéia de significado liga-se diretamente com a idéia de conhecimento. Segundo Machado [4] conhecer é, cada vez mais, conhecer o significado. A cultura das escolas de ensino médio é complexa, imprevisível e erroneamente inclinada para uma série muito específica de valores acadêmicos. Não é que as escolas de ensino médio não se importem com seus alunos, mas as estruturas existentes e as culturas sagradas do ensino médio estão arraigadas em uma orientação acadêmica tradicional, isto é, a estrutura é feita para um cumprimento da matéria e não para uma maior atenção ao aluno. Os currículos fixam as matérias, a carga horária e os alunos devem aprendê-las para que ao final do ensino médio, sejam aprovados no vestibular e possam dar seqüência a mais disciplinas no ensino superior. Para Grécia [5] (2001, p. 27), A maneira como os sistemas educativos organizam o ensino dos temas incluídos nos currículos envolve uma determinada concepção dos processos de aquisição dos conhecimentos. Até agora, tem predominado uma concepção segundo a qual basta decompor um saber, em sua modalidade cultural, em pequenos pedacinhos isolados, e então organizar sua ingestão por parte dos alunos, em períodos breves e bem delimitados, segundo seqüências determinadas sobre a base da análise do próprio saber. Esta maneira de organizar o ensino não atribui importância ao contexto específico em que os conhecimentos são adquiridos, nem à sua significação e valor funcional, durante sua aquisição. O funcionamento das nossas escolas, e dos próprios processos educativos de hoje, nasceu no início do século XIX, em plena sociedade industrial, onde os valores reinantes eram do glorioso mundo mecanizado. Mas é nesse ambiente que ainda estamos, o aluno é como uma peça de máquina. O conhecimento que é confundido com conteúdo, passa das cabeças dos professores, para as cabeças vazias dos alunos. No Brasil, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) evidenciou os problemas, que muitos já sabiam, mas poucos se preocupam em tentar solucionar. A transição que o aluno sofre do ensino médio para o ensino superior é uma mudança de status importante na vida de um jovem, mais independência, experiência, oportunidades mais interessantes e expectativas desconhecidas. ©2006 WCCSETE Com um olhar mais didático, podemos sugerir mudanças metodológicas que influenciassem e interessassem o estudante. Se nosso objetivo é ensinar ao aluno o conceito de Espaços Vetoriais, uma sugestão é começar com exemplo do ensino médio. Wenger [6] define quatro componentes fundamentais para uma teoria social de aprendizagem: significado, prática, comunidade e identidade, que estão intimamente interligadas como mostra a figura a seguir: comunidade prática aprendizagem identidade significado FIGURA 1 • • • • Significado: capacidade que temos de encontrar um sentido ao que aprendemos. Prática: aprendemos fazendo. Comunidade: aprendizagem como presença. Identidade: aprendemos através do processo de construção da nossa própria identidade. Se quisermos oferecer mais aos alunos de hoje e um futuro melhor para o mundo que herdarão amanhã, não há dúvidas que é necessário buscar mudanças para o nosso ensino, sejam eles, fundamental, médio ou superiores. Mudanças também já estão ocorrendo de uma cultura escrita para uma visual, as novas tecnologias apresentam questões significativas para as relações entre professores e alunos, escola e casa, sala de aula e o mundo fora da escola. Precisamos valorizar as oportunidades da procura de significado, da prática, da comunidade, da procura de identidade. Cabe a nós educadores nos empenharmos em criar perspectivas para além da tradicional preocupação com os conteúdos abrindo espaço à imaginação. Apesar de muitos conceitos de Álgebra Linear serem muito abstratos, conseguimos aplicar técnicas que envolvem uma matemática simples para resolver alguns problemas práticos, como a aplicação na teoria de grafos, uma área recente da matemática tendo como pré-requisito propriedades das operações com matrizes. Grafos podem ser aplicados em estudos de logística, planejamentos de auto-estradas, localizações de distribuidoras, tabelas de placares dos jogos de um campeonato, redes de comunicação etc. De acordo com Moore [7], um “grafo orientado é uma coleção não vazia de um número finito de vértices Pi juntamente com um número finto de arestas direcionadas PiPj que ligam alguns ou todos desses. Um grafo orientado é chamado um dígrafo se ele não contém nenhum “loop” March 19 - 22, 2006, São Paulo, BRAZIL World Congress on Computer Science, Engineering and Technology Education 612 (laço) e possui no máximo uma aresta de Pi a Pj, para cada i e j”. A figura 2 ilustra um dígrafo. 4 3 2 [bij ] = M = 1 1 1 1 3 4 1 1 1 1 1 1 2 2 2 0 1 1 2 2 2 0 1 1 2 2 3 0 1 1 0 0 0 1 Note que o elemento b35=2 indica que existem dois modos de ir de Belo Horizonte para Brasília com exatamente uma escala intermediária. No caso, as possibilidades são Belo Horizonte – Rio de Janeiro – Brasília ou Belo Horizonte – São Paulo – Brasília. O elemento b16=1 indica que há somente uma forma de sair de São Paulo com destino a Goiânia com exatamente uma escala, no caso o trecho correspondente é São Paulo – Brasília – Goiânia. Se calcularmos o cubo da matriz, então se tem o número de modos que o vértice Pi é levado ao vértice Pj, em exatamente três passos, e assim sucessivamente. FIGURA 2 Grafos orientados podem ser representados matricialmente de modo que cada elemento aij da matriz possuirá o número de arestas direcionadas do vértice Pi para o Pj. No caso dos dígrafos, o elemento um representa uma aresta orientada ligando Pi a Pj e zero caso contrário. SP RJ BH PA BR GO SP 0 1 1 1 1 0 RJ 1 0 1 1 1 0 BH 1 1 0 0 0 0 PA 1 1 0 0 0 0 BR 1 1 0 0 0 1 GO 0 0 0 0 1 0 O que corresponde à matriz 0 1 M = 1 1 1 0 1 0 1 1 1 0 1 1 0 0 0 0 1 1 0 0 0 0 1 1 0 0 0 1 0 0 0 0 1 0 Se elevarmos tal matriz ao quadrado então os elementos bij da nova matriz indicam o número de formas que podemos ir do vértice Pi para o vértice Pj em exatamente dois passos. ©2006 WCCSETE 6 7 3 [c i j ] = M = 7 7 8 1 7 6 7 7 8 1 7 7 2 2 2 2 7 7 2 2 2 2 1 1 2 2 3 0 8 8 2 2 2 3 A matriz soma M + M2, isto é, a matriz do dígrafo somada à sua matriz quadrada indica o número de forma que o vértice Pi é levado em Pj em até dois passos. De modo que é possível se saber se é possível ir de um ponto a outro com no máximo uma escala. 4 4 2 [d ij ] = M + M = 2 2 2 1 4 4 2 2 2 1 2 2 2 2 2 0 2 2 2 2 2 0 2 2 2 2 3 1 1 1 0 0 1 1 O elemento d36=0 indica que não é possível ir de Belo Horizonte para Goiânia diretamente e nem com uma só escala. Mas, pela matriz M3, segue que tal percurso pode ser feito com exatamente duas escalas e de dois modos possíveis, já que elemento c36=2. Com base nesses dados, se uma outra companhia aérea que desejasse realizar vôos nessa rota pode, através da informação da figura 2, implantar novos trechos de vôos e analisando as matrizes poderia fazer uma verificação se é uma boa estratégia enfrentar concorrência com as rotas existentes, ou se mudaria a quantidade de escalas para se chegar de um lugar ao outro. É claro que a teoria dos grafos é um dos muitos fatores que deverão ser analisados, mas com o exemplo exibido poder-se-ia tirar boas conclusões. Essa teoria pode ser utilizada em um grande número de situações. March 19 - 22, 2006, São Paulo, BRAZIL World Congress on Computer Science, Engineering and Technology Education 613 REFERÊNCIAS [1] Barufi, M.C.B., A Construção/negociação de significados no curso universitário de Cálculo Diferencial e Integral. Tese de doutorado. São Paulo: FE-USP, 1999. [2] Guzman, M., Hodgson, B.R., Robert, A., Villani, V., Difficulties in the passage from secondary to tertiary education. Documenta mathematica, extra volume ICM 1998, pp. 747-762. [3] Edwards, C.H.Jr., Penney, E.D., Introdução à Álgebra Linear. Trad. João P C. dos Santos e outros. Prentice-Hall do Brasil, Rio de Janeiro, 1987. [4] Machado, N.J., Epistemologia e didática: as concepções de conhecimentos e inteligência e a prática docente. 5ª edição. São Paulo: Cortez, 2002. [5] Grecia, G., A didática da matemática, in Parra, C.; Saiz, J., Didática da Matemática: reflexes psicopedagógicas. Trad. Juan Acuña Llorens. Porto Alegre, Artes Médicas, 2001. [6] Wenger, E., Communities of Practice. Learning, Meaning and Identity. Cambridge University Press, 1998. [7] Moore, H.G., Yaquad, A. A First Course in Linear Algebra with Applications. 3ed. San Diego: Academic Press, 1998. ©2006 WCCSETE March 19 - 22, 2006, São Paulo, BRAZIL World Congress on Computer Science, Engineering and Technology Education 614