Ex.ma(o) Colega,
O Teste está organizado por ordem sequencial, mas permitindo uma
abordagem temática autónoma dos III Grupos de questões formuladas
sobre a Hipótese factual, que se vai desenvolvendo em torno da actuação de
II Advogados (João Lima e Carlos Alves). As respostas devem ser
produzidas por forma a traduzirem conhecimento dos valores ou princípios
deontológicos envolvidos, com recurso às normas concretas da lei e
regulamentos que apoiam as soluções adoptadas.
Assim,
Comecemos por considerar a seguinte situação factual:
1. João Lima, funcionário da Câmara Municipal em situação de licença
ilimitada, obteve a sua inscrição como Advogado e montou escritório na
respectiva Comarca.
João Lima possuía de facto muitos amigos no Departamento de Urbanismo,
onde trabalhara dez anos e que deixara para abraçar a advocacia, pelo que
para facilitar o início da sua carreira, ajustou com alguns dos seus antigos
companheiros de trabalho que lhes pagaria uma percentagem de 10% do
valor dos honorários que cobrasse aos clientes que fossem encaminhados
para o seu escritório.
A sua actividade começou, contudo, a gerar reservas aos Advogados da
Comarca e num processo judicial, em que João Lima patrocinava António
Bento, seu habitual cliente, contra o Município numa acção administrativa
comum, Carlos Alves, Advogado da Câmara Municipal, suscitou na
contestação a irregularidade do exercício do mandato por João Lima,
acabando o Juiz, em face desta posição, por ordenar que fosse dado
conhecimento dos articulados à Delegação local da Ordem.
E, analisando, responda às seguintes questões:
1.1. Considera justificadas as reservas dos Colegas de Comarca
quanto à conduta de João Lima, descrita nos dois parágrafos iniciais?
Justifique.
(2 valores)
1.2. Existia alguma razão deontológica que motivasse a iniciativa
processual de Carlos Alves contra a regularidade do mandato?
Justifique.
(2 valores)
1.3. Tinha o Juiz fundamento legal para tomar a decisão que tomou?
(2 valores)
1.4. Se fosse Presidente da Delegação local da Ordem, que decisão
tomaria na sequência da comunicação do Juiz?
(1 valor)
Prossigamos, então.
2. Logo que foi notificado do teor da contestação, João Lima resolveu
deixar de patrocinar António Bento. Nesse sentido, durante o decurso do
prazo de réplica e sem conhecimento do cliente, apresentou no processo um
requerimento de recusa do mandato e considerando extinto de imediato o
poder/dever de representação de António Bento, absteve-se de apresentar o
respectivo articulado, não tendo por isso tomado qualquer atitude em
relação a uma excepção invocada nem quanto aos documentos juntos ao
processo por Carlos Alves
Temos agora que apreciar,
2.1. Foi justificada a decisão de João Lima em renunciar ao
mandato?
(1 valor)
2.2.
E quanto ao procedimento adoptado?
(1 valor)
2.3.
Como qualifica a conduta de João Lima no plano das relações
com o seu cliente?
(3 valores)
Avancemos e focalizemos agora atenção no patrocínio a cargo de Carlos
Alves.
Assim:
3. Com a contestação, Carlos Alves, na defesa dos interesses do Município,
não hesitou em juntar uma carta que lhe foi dirigida por João Lima, em
momento anterior à propositura da acção e sobre o objecto do litígio,
claramente desfavorável à pretensão judicial formulada na acção, em
representação do autor, António Bento, mas que João Lima classificara
como confidencial, razão pela qual requerera dispensa de segredo
profissional.
A acção viria a ser julgada improcedente, logo no despacho saneador e
antes de proferido despacho sobre o supra referido pedido de dispensa de
sigilo, tendo o Juiz na motivação da sua decisão invocado o conteúdo da
carta, não impugnada, como determinante na formação da sua convicção,
sentença que foi notificada a João Lima.
Ora, quanto a este quadro, considere as seguintes questões:
3.1. Existe alguma causa de censurabilidade no tocante à actuação de
Carlos Alves? Justifique.
(2 valores)
3.2. Quem seria a entidade competente para emitir o despacho de
eventual dispensa de sigilo formulado por Carlos Alves?
(2 valores)
3.3. Como, em síntese, decidiria caso estivesse no papel dessa
entidade? Autorizaria o levantamento do sigilo ou negá-lo-ia?
Porquê?
(2 valores)
3.4. Qual o juízo que formula no plano da legalidade, quanto à
sentença proferida pelo Juiz da causa?
(2 valores)
Porto, 10 de Setembro de 2008
GRELHA DE CORRECÇÃO ENTENDIDA COMO MERO GUIÃO
ORIENTADOR DA CORRECÇÃO E ATRIBUIÇÃO DAS
CLASSIFICAÇÕES
1. João Lima, funcionário da Câmara Municipal em situação de licença
ilimitada, obteve a sua inscrição como Advogado e montou escritório na
respectiva Comarca.
João Lima possuía de facto muitos amigos no Departamento de Urbanismo,
onde trabalhara dez anos e que deixara para abraçar a advocacia, pelo que
para facilitar o início da sua carreira, ajustou com alguns dos seus antigos
companheiros de trabalho que lhes pagaria uma percentagem de 10% do
valor dos honorários que cobrasse aos clientes que fossem encaminhados
para o seu escritório.
A sua actividade começou, contudo, a gerar reservas aos Advogados da
Comarca e num processo judicial, em que João Lima patrocinava António
Bento, seu habitual cliente, contra o Município numa acção administrativa
comum, Carlos Alves, Advogado da Câmara Municipal, suscitou na
contestação a irregularidade do exercício do mandato por João Lima,
acabando o Juiz, em face desta posição, por ordenar que fosse dado
conhecimento dos articulados à Delegação local da Ordem.
E, analisando, responda às seguintes questões:
1.1. Considera justificadas as reservas dos Colegas de Comarca
quanto à conduta de João Lima, descrita nos dois parágrafos iniciais?
Justifique.
Grelha:
- Sim. João Lima podia exercer a advocacia porque não se
encontrava numa situação de incompatibilidade (77º 1. j) e 2. b) do
EOA) – 0,3 valores – mas teria de o fazer no cumprimento dos seus
deveres deontológico decorrentes do Estatuto, seu regulamentos e
usos profissionais (art. 83º do EOA) – 0,2 valores, os quais lhe
impunham a a aceitação de mandato por escolha livre dos seus
constituintes (art. 93º nº1 do EOA) – 0,5 valores - e a proibição de
formas de angariação de clientela (arts. 85º 2. h) – 0,5 valores -,
assim como a proibição de partilha de honorários com quem não
tivesse colaborado efectivamente no patrocínio (art. 102º do EOA e
3.6. do C.D.A.E.) – 0,5 valores.
1.2. Existia alguma razão deontológica que motivasse a iniciativa
processual de Carlos Alves contra a regularidade do mandato?
Justifique.
Grelha:
- Sim. João Lima estava a patrocinar contra o Município em situação
de impedimento, já que se encontrava vinculado à respectiva Câmara
Municipal contra quem propusera a acção, com preterição dos
valores da independência e dignidade da profissão (art. 76º nºs 1 e 2)
– 0,5 valores - e (78º nº 2 do EOA) – 1,5 valores.
1.3. Tinha o Juiz fundamento legal para tomar a decisão que tomou?
Grelha:
- Sim. A situação de impedimento poderia constituir forma de
exercício irregular do mandato por quebra de regras deontológicas –
0,5 valores – impondo os artigos 82º e 116º do EOA que, nesses
casos, deve o Juiz comunicar os factos à Ordem dos Advogados – 1,5
valores.
1.4. Se fosse Presidente da Delegação local da Ordem, que decisão
tomaria na sequência da comunicação do Juiz?
Grelha:
- Por se tratar de matéria referente a eventual infracção disciplinar
(art.110º do EOA) remeteria o expediente para um dos órgãos
territorialmente competentes para a instauração do procedimento
disciplinar ( artigo 118º nº 1 do EOA) – 1 valor.
2. Logo que foi notificado do teor da contestação, João Lima resolveu
deixar de patrocinar António Bento. Nesse sentido, durante o decurso do
prazo de réplica e sem conhecimento do cliente, apresentou no processo um
requerimento de recusa do mandato e considerando extinto de imediato o
poder/dever de representação de António Bento, absteve-se de apresentar o
respectivo articulado, não tendo por isso tomado qualquer atitude em
relação a uma excepção invocada nem quanto aos documentos juntos ao
processo por Carlos Alves
Temos agora que apreciar,
2.1. Foi justificada a decisão de João Lima em renunciar ao
mandato?
Grelha:
- Foi. Apercebendo-se que estava em situação de impedimento, teria
de se afastar do patrocínio, tendo por isso causa ou fundamento legal
para renunciar ao mandato (art. 95º nº1 e) do EOA) – 1 valor.
2.2.
E quanto ao procedimento adoptado?
Grelha:
- Já quanto ao procedimento adoptado, embora legítimo (art. 39º nº1
do C.P.Civil) – 0,5 valores – não foi o mais adequado à situação.
João Lima deveria ter posto o seu cliente ao corrente do problema e
com ele acordar uma substituição no patrocínio por outro Colega, a
quem poderia substabelecer sem reserva os poderes confiados por
António Bento – 0,5 valores -.
2.4. Como qualifica a conduta de João Lima no plano das relações
com o seu cliente?
Grelha:
- Ao agir como agiu, quebrou com a relação de confiança que deveria
pautar a sua relação com o Cliente violando o inerente dever de
lealdade ( art. 92º nº1 do EOA) – 0,5 valores – e, acrescidamente, o
dever de informação imposto pela alínea a) do art. 95º do EOA – 0,5
valores - e o dever previsto no nº2 do mesmo artigo, já que não
acautelou a sua necessária substituição em tempo útil por outro
Colega – 1 valor -.
João Lima agiu assim de forma inconsiderada e negligente, já que
deveria saber que no processo em causa era obrigatória a constituição
de Advogado ( art. 11º nº1 do CPTA) e que, consequentemente, os
efeitos da recusa ao mandato não eram de produção imediata, mas
sim nos termos consagrados nos nºs 2 a 6 do citado art. 39º do
C.P.Civil, que não respeitou, lesando o seu Cliente e incorrendo em
violação do dever previsto no art. 95º nº1 b) do EOA, com eventual
responsabilidade civil e disciplinar. – 1 valor.
Avancemos e focalizemos agora atenção no patrocínio a cargo de Carlos
Alves.
Assim:
3. Com a contestação, Carlos Alves, na defesa dos interesses do Município,
não hesitou em juntar uma carta que lhe foi dirigida por João Lima, em
momento anterior à propositura da acção e sobre o objecto do litígio,
claramente desfavorável à pretensão judicial formulada na acção, em
representação do autor, António Bento, mas que João Lima classificara
como confidencial, razão pela qual requerera dispensa de segredo
profissional.
A acção viria a ser julgada improcedente, logo no despacho saneador e
antes de proferido despacho sobre o supra referido pedidos de dispensa de
sigilo, tendo o Juiz na motivação da sua decisão invocada o conteúdo da
carta, não impugnada, como determinante na formação da sua convicção,
sentença que foi notificada a João Lima.
Ora, quanto a este quadro, considere as seguintes questões:
3.1. Existe alguma causa de censurabilidade no tocante à actuação de
Carlos Alves? Justifique.
Grelha:
- Sim. Carlos Alves não poderia sobrepor os interesses do Município
ao interesse de ordem pública inerente à protecção legal do sigilo
profissional e, como tal, estava-lhe vedado juntar a carta em causa
por esta estar abrangida pelo dever de sigilo (arts. 87º nºs 1 e) e 2 e
108º do EOA) – 1 valor. E não lhe serviria de justificação alegar que
havia requerida a dispensa do sigilo, já que a revelação de factos
sigilosos só poderá ser efectua mediante prévio despacho de
autorização nos termos do artigo 87º nº 4 do EOA, o que neste caso
não existia. – 1 valor.
3.2. Quem seria a entidade competente para emitir o despacho de
eventual dispensa de sigilo formulado por Carlos Alves?
Grelha:
- Tal como resulta do art. 87º nº4 do EOA, a competência originária
é do Presidente do Conselho Distrital em 1ª Instância e o Bastonário
em sede de recurso – 1,5 valores – podendo embora tanto um como o
outro delegar essa competência em algum ou alguns dos membros do
Conselho Distrital ou do Conselho Geral (arts. 2º nº3 e 8º nº1 do
Regulamento de Dispensa de Segredo Profissional) – 0,5 valores .
3.3. Como, em síntese, decidiria caso estivesse no papel dessa
entidade? Autorizaria o levantamento do sigilo ou negá-lo-ia?
Porquê?
Gelha:
- Negaria liminarmente o pedido de dispensa – 0,5 valores - porque
tendo a carta sido qualificada pelo seu emissor como confidencial e
tendo a mesma sido recebida sem qualquer reserva por Carlos Alves,
não poderia este Advogado pretender levantar o sigilo, assim
qualificado, através do mecanismo previsto no artigo 87º nº4 do
EOA, porquanto a lei o não consente pelo carácter de especial
confidencialidade a proteger ( art. 108º nº2 do EOA) – 1,5 valores.
3.4. Qual o juízo que formula no plano da legalidade, quanto à
sentença proferida pelo Juiz da causa?
Grelha:
A sentença em causa violou a lei ao reconhecer a carta junta por
Carlos Alves como meio de prova válido e relevante, tendo até nela
assente a motivação da decisão tomada, ou seja, em clara preterição
do disposto nos arts. 87º nº5 e 108º nº2 – 1 valor – porquanto tal
prova deveria ser considera nula, não podendo produzir qualquer
efeito em Juízo – 1 valor
Porto, 10 de Setembro de 2008
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Ex.ma(o) Colega, O Teste está organizado por ordem sequencial