ORÇAMENTO PÚBLICO: UMA VISÃO ACERCA DO PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO ORÇAMENTÁRIA E DOS REFLEXOS DA PRÁTICA DE CONTINGENCIAMENTO DE RECURSOS Alexandre Augusto Pamato Cardoso Anapurús Victor Gonçalves Barbosa Projeto de Graduação apresentado ao Curso de Engenharia de Produção da Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Engenheiro de Produção. Orientadores: Heitor Mansur Caulliraux Thaís Spiegel Rio de Janeiro Abril de 2014 ORÇAMENTO PÚBLICO: UMA VISÃO ACERCA DO PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO ORÇAMENTÁRIA E DOS REFLEXOS DA PRÁTICA DE CONTINGENCIAMENTO DE RECURSOS Alexandre Augusto Pamato Cardoso Anapurús Victor Gonçalves Barbosa PROJETO DE GRADUAÇÃO SUBMETIDO AO CORPO DOCENTE DO CURSO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO DA ESCOLA POLITÉCNICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO. Examinada por: ________________________________________________ Prof. Heitor Mansur Caulliraux, D.Sc. ________________________________________________ Prof. Thaís Spiegel, D.Sc. ________________________________________________ Prof. Adriano Proença, D. Sc. ________________________________________________ Ana Cláudia Neves do Livramento . RIO DE JANEIRO, RJ – BRASIL ABRIL de 2014 Anapurús, Alexandre Augusto Pamato Cardoso Barbosa, Victor Gonçalves Orçamento Público: Uma Visão Acerca do Processo de Negociação Orçamentária e dos Reflexos da Prática de Contingenciamento de Recursos / Alexandre Augusto Pamato Cardoso Anapurús, Victor Gonçalves Barbosa. – Rio de Janeiro: UFRJ/ Escola Politécnica, 2014. XII, 78 p.: il.; 29,7 cm. Orientadores: Heitor Mansur Caulliraux; Thaís Spiegel Projeto de Graduação – UFRJ/ Escola Politécnica/ Curso de Engenharia de Produção, 2014. Referências Bibliográficas: p. 78. 1. Contingenciamento 2. Orçamento Público. 3. Planejamento. I. Caulliraux, Heitor Mansur. II. Spiegel, Thaís. III. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola Politécnica, Curso de Engenharia de Produção. IV. Título. iii Agradecimentos A Deus. Aos nossos familiares por todo apoio, amor e compreensão ao longo dessa jornada de estudo e formação, que iniciou há tantos anos e, com certeza, não vai parar por aqui. A Gerente de Planejamento da fundação pública na qual foi realizada a etapa de verificação, e ao Fábio Barbosa, por todo conhecimento transmitido, suporte fornecido e esforço desempenhado para tirar dúvidas, fornecer dados e orientar o rumo do trabalho. Aos nossos amigos pelos incentivos concedidos e auxílios prestados. Em especial, a Aloá Querido, a Jéssica Mendonça e a Lívia Barbosa, por toda paciência, carinho e boa vontade que tiveram diante dos inúmeros pedidos de revisões, ideias, etc. Ao professor Heitor por toda a liberdade e atenção que nos foi dada desde a concepção deste trabalho, durante a disciplina de Planejamento e Controle da Produção II, até aqui, momento em que ele se torna, oficialmente, um projeto de graduação. A Thaís Spiegel pela boa vontade, generosidade, disponibilidade e conhecimentos passados. Sua incipiente e promissora carreira representa a certeza de que muito em breve poderemos afirmar que fomos orientados por dois dos mais conceituados nomes da Engenharia de Produção de nosso país. Aos professores Adriano Proença, Renato Cameira e Vinícius Cardoso pelas portas que foram abertas, pelos conhecimentos compartilhados e pelas experiências diferenciadas que foram proporcionadas em sala de aula. Por fim, a todos que deram, ainda que de maneira indireta, alguma contribuição para a elaboração deste projeto. iv Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/ UFRJ como parte dos requisitos necessários para a obtenção do grau de Engenheiro de Produção. ORÇAMENTO PÚBLICO: UMA VISÃO ACERCA DO PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO ORÇAMENTÁRIA E DOS REFLEXOS DA PRÁTICA DE CONTINGENCIAMENTO DE RECURSOS Alexandre Augusto Pamato Cardoso Anapurús Victor Gonçalves Barbosa Abril/2014 Orientadores: Heitor Mansur Caulliraux, D.Sc.; Thaís Spiegel, D.Sc. Curso: Engenharia de Produção O processo orçamentário brasileiro, por essência, exige um grande esforço de planejamento por parte das unidades gestoras. Somado a isso, há o mecanismo de contingenciamento e suas implicações na forma com que essas unidades se planejam para utilizar seus recursos. A partir da leitura e síntese de artigos relacionados, o presente estudo verifica como tal processo ocorre em uma fundação pública, sendo observados, além dos impactos, os artifícios adotados para mitigar os problemas gerados. Como resultado, foi possível identificar os principais fatores responsáveis pela escolha do governo em aplicar o contingenciamento e a relação deste com a qualidade do gasto público por parte das unidades. Palavras-chave: Contingenciamento, Orçamento Público, Planejamento v Abstract of Undergraduate Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment of the requirements for the degree of Engineer. PUBLIC BUDGET: A VISION ABOUT THE BUDGETARY PROCESS OF NEGOTIATION AND REFLECTIONS OF THE PRACTICE OF RESOURCES CONTINGENCY Alexandre Augusto Pamato Cardoso Anapurús Victor Gonçalves Barbosa April/2014 Advisors: Heitor Mansur Caulliraux, D.Sc.; Thaís Spiegel, D.Sc. Course: Production Engineering The Brazilian budgetary process, by its nature, requires a great planning effort by the management units. Added to this, there is still the contingency mechanism and its implications in the way these units plan their selves to use their resources. From the reading and synthesis of related articles, this study verifies how this process occurs at a public foundation, observed, besides the effects, the devices adopted to mitigate the problems generated. As a result, it was possible to identify the main factors responsible for the government’s choice to implement the contingency and its relation to the quality of public spending by the units. Keywords: Contingency, Public Budget, Planning vi Sumário 1. Introdução ............................................................................................................................... 1 1.1. Contexto do Tema ........................................................................................................... 1 1.2. Objetivo do Trabalho ....................................................................................................... 3 1.3. Estrutura do Documento.................................................................................................. 3 2. Circunstâncias Orçamentárias Críticas para as Unidades Gestoras ....................................... 5 2.1. Circunstâncias Gerais ..................................................................................................... 5 2.2. Contingenciamento ......................................................................................................... 6 3. Abordagem metodológica e método de pesquisa ................................................................... 8 3.1. Levantamento: Seleção dos Artigos ................................................................................ 8 3.1.1. Método da Pesquisa ................................................................................................. 9 3.1.1.1. Artigos Nacionais - CAPES ............................................................................... 10 3.1.1.2. Artigos Internacionais - ISI Web of Knowledge .................................................. 15 3.2. Análise e Compilação .................................................................................................... 17 3.3. Verificação .................................................................................................................... 17 4. Síntese dos Artigos Selecionados ......................................................................................... 18 4.1. Artigos Nacionais .......................................................................................................... 18 4.1.1. Os Sistemas de Planejamento, Execução e Controle da Gestão Pública - Uma Nova Proposta............................................................................................................................... 18 4.1.1.1. Objetivo ............................................................................................................. 18 4.1.1.2. Referencial ........................................................................................................ 19 4.1.1.3. Sinopse / Visão Geral do Conteúdo / Argumentos do Autor .............................. 21 4.1.1.4. Resultados ........................................................................................................ 22 4.1.1.5. Conclusão ......................................................................................................... 22 vii 4.1.2. Presença Potencial do Contingenciamento da União nos Artifícios Adotados pelos Gestores .............................................................................................................................. 23 4.1.2.1. Objetivo ............................................................................................................. 23 4.1.2.2. Referencial ........................................................................................................ 23 4.1.2.3. Método .............................................................................................................. 26 4.1.2.4. Resultados ........................................................................................................ 27 4.1.2.5. Conclusão ......................................................................................................... 27 4.1.3. Discricionariedade, Contingenciamento e Controle Orçamentário .......................... 28 4.1.3.1. Objetivo ............................................................................................................. 28 4.1.3.2. Referencial ........................................................................................................ 28 4.1.3.3. Conclusão ......................................................................................................... 31 4.1.4. À Espera da Reforma Orçamentária: Um Mecanismo Temporário para Redução de Gastos Públicos ................................................................................................................... 31 4.1.4.1. Objetivo ............................................................................................................. 31 4.1.4.2. Referencial ........................................................................................................ 32 4.1.4.3. Método .............................................................................................................. 34 4.1.4.4. Resultados ........................................................................................................ 36 4.1.4.5. Conclusão ......................................................................................................... 36 4.2. Artigos Internacionais - Resumos .................................................................................. 38 4.2.1. Quantitative Method for Updating Cost Contingency throught Project Execution .... 38 4.2.1.1. Objetivo ............................................................................................................. 38 4.2.1.2. Referencial ........................................................................................................ 38 4.2.1.3. Método .............................................................................................................. 39 viii 4.2.1.4. Resultados ........................................................................................................ 41 4.2.1.5. Conclusão ......................................................................................................... 41 4.2.2. Using an interactive schedule simulation platform to assess and improve contingency management strategies. ................................................................................... 42 4.2.2.1. Objetivo ............................................................................................................. 42 4.2.2.2 Método ............................................................................................................... 43 4.2.2.3. Resultados ........................................................................................................ 45 4.2.2.4. Conclusão ......................................................................................................... 45 5. Síntese Geral - Análise Crítica .............................................................................................. 47 5.1. Método de Análise ......................................................................................................... 47 5.2. Caracterização das Circunstâncias Orçamentárias Brasileiras ...................................... 47 5.3. Caracterização do Contingenciamento .......................................................................... 49 5.3.1 Reflexos do Contingenciamento .................................................................................. 49 5.4. Soluções Propostas ...................................................................................................... 52 5.5. Circunstâncias a Serem Verificadas em Campo ............................................................ 53 6. Verificação em Campo: Fundação Pública Voltada à Realização de Pesquisas ................... 55 6.1. Circunstâncias Verificadas em Campo .......................................................................... 55 6.2. Análise Crítica de um Ciclo Orçamentário - 2013 .......................................................... 63 6.2.1. Etapa de Elaboração .............................................................................................. 64 6.2.2. Etapa de Execução ................................................................................................ 71 7. Conclusão ............................................................................................................................. 74 8. Referências Bibliográficas..................................................................................................... 78 ix Índice de Figuras Figura 1 - A Estrutura do Documento.............................................................................................4 Figura 2 - Estágios da pesquisa.....................................................................................................8 Figura 3 - Palavras chave utilizadas..............................................................................................9 Figura 4 - Resultados da busca na base CAPES........................................................................10 Figura 5 - Filtros de busca e quantidade de resultados...............................................................12 Figura 6 - Resultados da busca na base Web of Knowledge......................................................15 Figura 7 - Gráfico da Execução financeira do Tesouro Nacional com despesas de custeio einvestimento, Jan 1997 – Nov 2007...........................................................................................25 Figura 8 - Execução mensal da despesa em custeio, investimento e inversões financeiras (1996 – 2001).........................................................................................................................................34 Figura 9 - Processo de modelagem VaR.....................................................................................40 Figura 10 - Estabelecimento e coleta de dados para simulação..................................................44 Figura 11 - Resumo do processo de negociação orçamentária 2013..........................................66 Figura 12 - Comparação entre o montante desejado para a ação 1 e o contemplado pelo limite imposto.........................................................................................................................................67 Figura 13 - Comparação entre o montante desejado para a ação 2 e o contemplado pelo limite imposto.........................................................................................................................................68 Figura 14 - Comparação entre o montante desejado para a ação 3 e o contemplado pelo limite imposto.........................................................................................................................................68 Figura 15 - Comparação entre o montante desejado para a ação 4 e o contemplado pelo limite imposto.........................................................................................................................................69 Figura 16 - Comparação entre o montante desejado para a ação 5 e o contemplado pelo limite imposto.........................................................................................................................................69 x Figura 17 - Comparação entre o montante desejado para a ação e o contemplado pelo limite imposto: Administração................................................................................................................70 Figura 18 - Comparação entre o montante desejado para a ação e o contemplado pelo limite imposto: Publicidade de Utilidade Pública...................................................................................70 Figura 19 - Decreto de redução dos limites de movimentação e empenho.................................72 xi Índice de Tabelas Tabela 1 - Resumo da vigência, do encaminhamento e da devolução da LOA ........................... 3 Tabela 2 - Questões investigativas e hipóteses nulas correspondentes as propostas na pesquisa.......................................................................................................................................26 xii 1. Introdução Como introdução do projeto de graduação, este capítulo visa à contextualização do leitor no tema abordado pelo documento, apresentando uma visão geral da proposição do estudo, seus objetivos e motivações. Espera-se, portanto, que sua leitura facilite a compreensão e apreciação dos demais tópicos do presente texto. 1.1. Contexto do Tema Visando à manutenção de um equilíbrio em suas finanças, o Brasil adotou uma série de preceitos legais para receitas e despesas. Fundamentadas na Constituição de 1988, na Lei 4.320 de 1964, e na Lei de Responsabilidade Fiscal, essas regras buscam, em geral, estabelecer mecanismos que evitem um descontrole do erário. Para um claro entendimento de muitas dessas regras, é importante que se tenha uma ideia acerca do processo orçamentário brasileiro, pois conhecê-lo traz a compreensão da lógica inerente e da razão para a existência de cada uma das normas adotadas. Nesse modelo, atribuem-se ao Executivo as competências de elaboração e de execução do orçamento, restando ao Legislativo o dever de discutilo/aprová-lo e, ao final, fiscalizá-lo. O processo engloba, portanto, quatro etapas que, de maneira resumida, podem ser entendidas conforme as descrições a seguir: i. Elaboração: Essa etapa consiste, basicamente, na fixação de objetivos concretos, e no cálculo dos recursos financeiros, humanos e materiais necessários à materialização e concretização dessas metas. Para elaborar o orçamento, o Poder Executivo busca, por meio de uma previsão de receitas a serem arrecadadas no exercício seguinte, estipular o quanto se poderá gastar. Desse modo, cada unidade gestora recebe um limite para ser tomado como referência durante a elaboração de seus orçamentos que, juntos, formarão um projeto de lei a ser aprovado na etapa de discussão/aprovação. ii. Discussão/Aprovação: Cabendo ao Poder Legislativo, a ideia básica dessa etapa é a de que o povo, por meio de seus representantes, possa intervir tanto nas decisões tomadas pela Administração Pública, bem como na maneira escolhida para alcançar os objetivos traçados. 1 iii. Execução: Consiste na concretização anual dos objetivos, diretrizes e metas traçadas para o setor público. De competência do Poder Executivo, essa etapa requer a mobilização de recursos materiais, financeiros e humanos. iv. Avaliação/Controle: Compreende o julgamento, por parte do Poder Legislativo, dos níveis dos objetivos fixados no orçamento frente às modificações ocorridas durante sua execução, e a avaliação da eficiência com a qual foram realizadas as ações que visaram ao atingimento de tais metas. O processo orçamentário dispõe ainda de três instrumentos legais: o Plano Plurianual (PPA), de médio prazo que busca orientar as ações governamentais de modo a atingir os objetivos e metas fixados para o período de sua vigência (4 anos); a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que funciona como norteadora para a elaboração dos orçamentos anuais (Orçamento Fiscal, de Investimento nas Empresas e de Seguridade Social), de maneira a adequá-los às diretrizes, objetivos e metas da administração pública; e a Lei Orçamentária Anual (LOA). De maneira a não perder o foco do trabalho, optamos por elaborar uma explicação mais detalhada apenas para a LOA, instrumento que obedece de maneira rígida às quatro etapas anteriormente apresentadas e que é o mais envolvido nas situações que pretendemos analisar. Sendo elaborada para um exercício, a Lei Orçamentária Anual (LOA), que deve estar de acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias, serve para viabilizar a concretização do que foi planejado no PPA, definindo as prioridades e metas que devem ser alcançadas naquele ano. Desse modo, a LOA trata basicamente da programação das ações a serem executadas e visa ao exercício seguinte: i. por meio de uma previsão de receitas a serem arrecadadas pelos cofres públicos durante o exercício subsequente, estipular o quanto de recurso financeiro se terá disponível; ii. e, com base nos objetivos traçados, definir quanto de recurso será necessário para cada uma das ações contempladas pela programação. Cabe ainda à LOA, assim como aos outros instrumentos supracitados, respeitar, durante seu desenvolvimento, um calendário oficial que compreende as etapas e datas descritas na tabela 1. De acordo com o artigo 168 da Constituição Federal, o desrespeito a essas datas implica: 2 i. caso o Legislativo não receba a proposta orçamentária no prazo, fica automaticamente considerada a proposta (Lei) anterior; ii. caso o Legislativo não aprove a proposta antes do início do exercício, o Poder Executivo realizará suas despesas com base nos duodécimos do valor estimado; iii. o Congresso deverá ser convocado extraordinariamente por se tratar de matéria cuja votação deve ser efetuada antes do início do exercício financeiro. Tabela 1 - Resumo da vigência, do encaminhamento e da devolução da LOA. Fonte: Adaptado de Felgueiras (2013) Instrumento Vigência Proposta do Executivo Devolução ao ao Legislativo Executivo para Sanção Anual (no exercício 4 meses antes do término Até o encerramento da LOA financeiro ao qual do exercício financeiro (31 sessão legislativa (22 de se refere) de agosto) dezembro) 1.2. Objetivo do Trabalho O presente trabalho busca fazer uma análise crítica sobre as circunstâncias que criam dificuldades para as unidades gestoras ao longo do processo orçamentário, em especial o contingenciamento. Desse modo, uma vez que a proposta não é estudar o modelo de orçamento como um todo, não cabe, aqui, muito discutir sobre isto. No entanto, optamos por apresentar no tópico anterior, ainda que de maneira sintética, uma breve noção sobre o modelo orçamentário misto, previsto na Constituição de 1988 e utilizado atualmente no Brasil para, em seguida, aprofundar no que nos é de interesse. 1.3. Estrutura do Documento Para a elaboração do trabalho, optamos por iniciar com uma contextualização do tema e visão geral do documento. Após essa parte introdutória, que compreende os capítulos um e 3 dois, será apresentado o critério utilizado para a seleção dos artigos, suas sínteses individuais, um resumo geral com uma análise crítica e, por fim, uma verificação, em campo, do que foi observado da bibliografia utilizada. Por meio da figura a seguir, pode-se observar, de maneira resumida, a sequência de assuntos abordados no texto. Figura 1 - A Estrutura do Documento. Fonte: os autores 4 2. Circunstâncias Orçamentárias Críticas para as Unidades Gestoras 2.1. Circunstâncias Gerais Apesar da existência de um calendário oficial, o não cumprimento dos prazos, principalmente o que compreende a etapa de aprovação, é bastante comum na rotina orçamentária do nosso país. No presente ano, por exemplo, estamos em março e até então, as unidades gestoras estão trabalhando com duodécimos devido ao atraso da aprovação da LOA. Fatos como esse mostram a amplitude da incerteza envolvida no dia a dia dos gestores (PEREIRA, 2013). Nesse sentido, mesmo após o longo e desgastante processo até sua aprovação, a LOA não oferece segurança para os gestores públicos, pois a certeza de que o recurso estará disponível para que as ações sejam executadas só vem com a liberação do montante, fato que é consumado durante a etapa de execução. A não liberação de parte do recurso financeiro aprovado pela LOA pode ocorrer em função de diversos motivos. Os mais comuns, no entanto, são referentes a erros de previsão de receita e ao aumento das despesas obrigatórias (PINTO, 2006). Por mais confiável que uma estimativa possa ser, sempre existirá uma possibilidade de erro atrelada a ela, uma vez que este é inerente ao processo de previsão. Dessa maneira, no contexto do orçamento público, muitas vezes acaba ocorrendo uma arrecadação abaixo da estimada ou até mesmo fora do período esperado. Em outras ocasiões, surgem novas despesas que possuem prioridade em relação às previstas, ou dificuldades como um aumento de valor das despesas já estimadas, por exemplo. De um modo ou de outro, não importando a razão, o equilíbrio entre receitas e despesas deve ser mantido e, portanto, medidas devem ser tomadas. Para essas situações, gastos podem ser cortados ou a receita contingenciada, o que certamente frustra os gestores das unidades que, no momento em questão, já haviam se planejado em função do montante esperado (PINTO, 2006). Representando a circunstância que talvez seja a maior responsável por gerar descontentamento aos gestores ao longo de um exercício, o contingenciamento foi escolhido como foco do presente trabalho e, por isso, receberá um tópico exclusivo apresentado a seguir. 5 2.2. Contingenciamento Em seu sentido estrito, contingenciamento representa o ato de impor limites e regras ao orçamento ou ao uso de recursos. Na prática, o contingenciamento afeta a programação financeira de maneira próxima a sua definição. Serve, de fato, como um instrumento para o governo se prevenir de um descontrole gerado pela execução das despesas previstas frente a uma arrecadação abaixo da esperada. Em outras palavras, o contingenciamento auxilia na manutenção do equilíbrio entre receitas e despesas em um contexto no qual algumas situações não esperadas ocorrem. De acordo com o Manual Técnico de Orçamento – MTO 2014 (2013, p.82): “Em decorrência da necessidade de garantir o cumprimento dos resultados fiscais estabelecidos na LDO e de obter maior controle sobre os gastos, a Administração Pública, em atendimento aos arts. 8º, 9º e 13 da LRF, faz a programação orçamentária e financeira da execução das despesas públicas, bem como o monitoramento do cumprimento das metas de superávit primário”. A preocupação de manter o equilíbrio entre receitas e despesas no momento da execução orçamentária já constava na Lei nº 4.320, de 1964, prevendo a necessidade de estipular cotas trimestrais das despesas que cada UO ficava autorizada a utilizar. Esse mecanismo foi aperfeiçoado na LRF, que determina a elaboração da programação financeira e do cronograma mensal de desembolso, bem como a fixação das metas bimestrais de arrecadação, no prazo de 30 dias após a publicação dos orçamentos. Verificada a frustração na arrecadação da receita prevista ou o aumento das despesas obrigatórias, que venham a comprometer o alcance das metas fiscais, torna-se necessária a adoção de mecanismos de ajuste entre receita e despesa. A limitação dos gastos públicos é feita por decreto do Poder Executivo e por ato próprio dos demais Poderes, de acordo com as regras fixadas nos arts. 50 e 51, para o exercício de 2014. No âmbito do Poder Executivo, esse decreto ficou conhecido como Decreto de Contingenciamento, que normalmente é detalhado por portaria interministerial (MP e MF), evidenciados os valores autorizados para movimentação e empenho e para pagamentos no decorrer do exercício. Em resumo, os objetivos desse mecanismo são: a) estabelecer normas específicas de execução orçamentária e financeira para o exercício; 6 b) estabelecer um cronograma de compromissos (empenhos) e de liberação (pagamento) dos recursos financeiros para o Governo; c) cumprir a legislação orçamentária (LRF, LDO etc.); e d) assegurar o equilíbrio entre receitas e despesas ao longo do exercício financeiro e proporcionar o cumprimento da meta de resultado primário. [...]” O MTO 2014 (2013) aponta, ainda, de forma bastante detalhada, todos os preceitos legais que são utilizados como fundamentos para a realização do contingenciamento. Isso inclui a Lei nº 4.320, de 1964, a Lei Complementar nº101, de 2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), e o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) do ano em questão, no caso, 2014. Apesar de lidos, optamos por não colocá-los no presente trabalho, pois daria um viés demasiadamente jurídico ao texto. Além disso, registrá-los faria com que fugíssemos um pouco do objetivo do trabalho que, como anteriormente citado, é discutir acerca das circunstâncias que frustram as expectativas das unidades gestoras e das possibilidades para reduzir o impacto do contingenciamento, a principal dessas. 7 3. Abordagem metodológica e método de pesquisa O presente trabalho foi planejado e desenvolvido a fim de possibilitar um entendimento mais profundo acerca do tema não só para os autores, mas também para aqueles que se dispuserem a apreciá-lo. De maneira sintética, pode-se afirmar que a pesquisa foi elaborada com base em quatro estágios de evolução, como mostra a figura 2. Figura 2 - Estágios da pesquisa. Fonte: os autores 3.1. Levantamento: Seleção dos Artigos Inicialmente foram realizadas buscas em duas bases diferentes: no Portal de Periódicos CAPES e na ISI Web of Knowledge. Na primeira buscamos artigos nacionais que contemplassem os assuntos de interesse: orçamento público e contingenciamento de recursos. Nesta etapa, foram encontrados bastantes resultados. Já na segunda, ao procurarmos por artigos internacionais que tratassem o tema, nossa busca não obteve o mesmo sucesso. Enfrentamos grande dificuldade para encontrar artigos internacionais com o foco que gostaríamos, o que nos obrigou a procurá-los em uma terceira base: a Science Direct. Para nossa surpresa, nesta terceira busca nos deparamos com o mesmo problema, e acabamos chegando à conclusão de que a dificuldade é inerente ao tema, uma vez que não se discute tanto sobre um modelo de orçamento semelhante ao brasileiro nem sobre contingenciamento do orçamento público em outros países. 8 3.1.1. Método da Pesquisa Para as duas pesquisas iniciais, no Portal de Periódicos CAPES e na ISI Web of Knowledge, foram utilizadas as seguintes palavras-chave: Figura 3 - Palavras-chave utilizadas. Fonte: os autores Tanto os resultados de cada uma das palavras-chave e suas interações, quanto o método adotado para fazer o refino da busca e, com isso, obter um resultado mais associado ao foco de interesse, podem ser observados a seguir. 9 3.1.1.1. Artigos Nacionais - CAPES Figura 4 - Resultados da busca na base CAPES. Fonte: os autores Foi verificada a necessidade de um refino ainda maior na pesquisa. Assim, para as interações que apresentaram grande quantidade de resultados, foram adicionadas algumas restrições visando à obtenção de um número tratável. 10 Execução do Orçamento x Orçamento Público (129 resultados) Execução Financeira x Orçamento Público (53 resultados) Gastos Públicos x Orçamento Público (96 resultados) 11 Execução Financeira x Execução do Orçamento (82 resultados) Gastos Públicos x Execução Financeira (47 resultados) Gastos Públicos x Execução do Orçamento (58 resultados) Figura 5 - Filtros de busca e quantidade de resultados. Fonte: Adaptado de Periódicos CAPES A partir de uma quantidade tratável de artigos para cada uma das combinações de palavras-chave, foram observados os resultados e constatou-se que ainda restavam alguns que destoavam do foco desejado para o trabalho. Estes foram desconsiderados para fins de leitura. 12 Observou-se, ainda, grande reincidência de artigos nos resultados das diferentes combinações, que receberam uma atenção especial. Após breve filtro pela leitura superficial de títulos e resumos, foram selecionados nove artigos a serem avaliados detalhadamente. i. O Sistema de Gestão de Despesa Pública em Portugal; ii. Eficácia da Previsão de Receitas no Orçamento dos Municípios Gaúchos: Uma Investigação Empírica dos Exercícios de 2005 a 2009 Utilizando a Análise de Clusters; iii. Presença Potencial do Contingenciamento da União nos Artifícios Adotados pelos Gestores das UGs; iv. Discricionariedade, Contingenciamento e Controle Orçamentário; v. Contribuição à Construção de Indicador de Desempenho no Setor Público: Estudo de Caso no Colégio Militar do Rio de Janeiro; vi. À Espera da Reforma Orçamentária: Um Mecanismo Temporário para Redução de Gastos Públicos; vii. A Orçamentação por Programas e a Boa Gestão; viii. Sistemas de Alocação de Recursos a Prestadores de Serviços de Saúde - A Experiência Internacional; ix. Os Sistemas de Planejamento, Execução e Controle da Gestão Pública - Uma Nova Proposta. Com uma leitura mais atenta, foram escolhidos quatro artigos a serem utilizados como base teórica (oriunda da CAPES) para o trabalho. A seguir, podem ser observados os artigos escolhidos e a sequência de palavras e filtros que foram executados para encontrá-los (rastreamento). Os Sistemas de Planejamento, Execução e Controle da Gestão Pública - Uma Nova Proposta Rastreamento: filtros utilizados para a interação: ‘Orçamento Público’ x ‘Execução do Orçamento’ 13 Discricionariedade, Contingenciamento e Controle Orçamentário Rastreamento: Palavra-chave "Contingenciamento". Observação: por entendermos que contingenciamento é a palavra-chave que mais se aproxima do foco do trabalho, seu resultado direto, disposto em ordem de relevância pelo critério "mais acessados", teve os 30 primeiros artigos observados. Presença Potencial do Contingenciamento da União nos Artifícios Adotados pelos Gestores das UGs Rastreamento: este artigo aparece em 10 diferentes tipos de interações entre as palavras chave. Para fins de rastreamento, apenas será citada: "Orçamento Público" x "Contingenciamento". À Espera da Reforma Orçamentária: Um Mecanismo Temporário para Redução de Gastos Públicos Rastreamento: este artigo aparece em 7 diferentes tipos de interações entre as palavras chave. Para fins de rastreamento, apenas será citada: "Orçamento Público" x "Contingenciamento". 14 3.1.1.2. Artigos Internacionais - ISI Web of Knowledge Figura 6 - Resultados da busca na base Web of Knowledge. Fonte: os autores Ao observarmos uma grande quantidade de artigos não pertinentes ao foco desejado, fizemos uma pré-seleção. Dessa maneira, para os artigos internacionais, o filtro por meio dos títulos foi fundamental, pois evitou que um novo refinamento fosse realizado nos cruzamentos que geraram resultados complicados de serem tratados devido ao elevado número de artigos. Com isso, foram selecionados: i. Budget Crunch: Implications for European Defence; ii. Cost Contingency Management; iii. Debt relief and public health spending in heavily indebted poor countries; iv. Quantitative Method for Updating Cost Contingency throughout Project Execution; v. The Reform of Financial Management in the European Commission: A Public Management Policy Cycle Case Study. 15 Após cuidadosa leitura dos resumos dos artigos, constatamos que apenas um título é pertinente ao trabalho. Quantitative Method for Updating Cost Contingency throught Project Execution Rastreamento: interação: "Contingency" x Budget Execution (6 resultados) Objetivo: Paralelo do direcionamento de recursos em função da necessidade de priorização com a realidade enfrentada diante do contingenciamento Diante da dificuldade enfrentada para encontrar artigos internacionais que fossem adequados ao tema, realizamos uma terceira pesquisa. A base escolhida foi a Science Direct, que, para a interação "budget execution" x "budget contingency", com restrição para publicações a partir de 2010, apenas Journal (e refino para o "Automation in Construction") apresentou cinco artigos como resultado. O primeiro por ordem de relevância foi o escolhido por permitir a elaboração de um segundo paralelo para o trabalho. A esse artigo, será relacionada a importância da tomada de decisão para uma boa gestão de projetos frente ao contingenciamento. Using an interactive schedule simulation platform to assess and improve contingency management strategies Rastreamento: interação "budget execution" x "budget contingency", com restrição para publicações a partir de 2010, apenas Journal, e refino para o "Automation in Construction" (5 resultados). Objetivo:paralelo com a importância da tomada de decisão para uma boa gestão de projetos frente ao contingenciamento. 16 3.2. Análise e Compilação Para a análise e compilação dos artigos que foram selecionados na etapa de levantamento, a estruturação dos textos foi dividida em cinco tópicos: objetivo, referencial, método, resultados e conclusão. A razão para a escolha desse modelo de divisão, a função de cada um desses tópicos, a justificativa quanto a ordem de leitura, bem como a análise e compilação dos artigos, serão apresentadas nos capítulos 4 e 5 deste documento. 3.3. Verificação Como sugere o próprio título, esta etapa consiste basicamente na verificação do que foi sintetizado a partir da leitura dos artigos. Para isso, no capítulo 6, será apresentado uma verificação em campo feita em uma fundação pública voltada à realização de pesquisas, que contempla dois pontos de vista: o primeiro, englobando a opinião da Gerente de Planejamento, pessoa responsável pela elaboração do orçamento da instituição e, portanto, considerada ideal para contribuir com o trabalho, e o segundo correspondendo a uma análise de um ciclo orçamentário, elaborada com base em dados reais do ano de 2013. 17 4. Síntese dos Artigos Selecionados Para a síntese dos artigos, a estruturação do texto foi dividida em tópicos a fim de facilitar a identificação da natureza da seção a que se referem. Todos os resumos têm a mesma ordenação dos fatos presentes nos textos originais. Basicamente, cinco tipos de tópicos foram identificados: Objetivo – refere-se à finalidade do artigo bem como sua abordagem; Referencial - apresenta a o embasamento teórico do estudo; Método – eventuais ferramentas, mecanismos ou análises desenvolvidas na pesquisa; Resultados – saídas da aplicação feita no método Conclusão - refere-se ao desfecho dos artigos. É importante atentarmos para o fato de que nem todos os artigos possuem necessariamente cada um dos tópicos acima, isto é, alguns deles não possuem o “Referencial” enquanto outros não possuem o “Método” e “Resultados” devido à abordagem escolhida pelos autores. Assim, exceções quanto a estrutura também serão apresentadas, como é possível observar no tópico 4.1.1, por exemplo. 4.1. Artigos Nacionais 4.1.1. Os Sistemas de Planejamento, Execução e Controle da Gestão Pública Uma Nova Proposta 4.1.1.1. Objetivo O artigo aborda a evolução histórica dos mecanismos criados para a gestão e execução dos recursos públicos, focando na questão do controle e execução do orçamento público. O aprimoramento dos atuais instrumentos de controle da gestão pública é proposto pela inclusão de indicadores sociais para servirem de parâmetro para a definição da destinação dos recursos públicos. 18 4.1.1.2. Referencial Pellini (2003) começa com um breve panorama da época na qual o primeiro mecanismo de controle de gastos foi criado. A Carta Magna, de 1215, foi estabelecida como o embrião da orçamentação, pois determinava que nenhum tributo poderia ser levantado sem o consentimento do Conselho do Reino, uma espécie de parlamento nacional da época (PELLINI, 2003). Já no século XVII, o Bill of Rights instituiu a votação exclusiva dos impostos pelo Parlamento que também passou a se interessar pela destinação dos recursos públicos, porém sem distinguir gastos pessoais da realeza dos relativos à defesa e a outros interesses públicos (PELLINI, 2003). Nos Estados Unidos, a “Declaração de Direitos”, do século XVIII, estabeleceu o princípio de exclusão de todo imposto interno ou externo que tivesse por finalidade levantar uma contribuição dos súditos da América sem o consentimento do povo. Durante o mesmo século na França, a Constituição consagrou o princípio de que nenhum imposto poderia ser cobrado sem o consentimento da nação. Esse preceito foi reforçado poucas décadas depois, em 1817, com a exigência feita pela Assembleia Nacional a respeito do controle sobre os recursos públicos, ficando estabelecido de que a despesa de cada Ministério não deveria ser superior ao total dos recursos a ele destinados no orçamento (PELLINI, 2003). Com a evolução para o Estado Moderno, o orçamento deixou de ser apenas uma lei de impostos, passando a ser também um plano de ação governamental e de intervenção na economia nacional através da interferência inclusive no setor privado (PELLINI, 2003). No Brasil, a primeira Constituição Imperial, de 1824, estabelecia que o Ministério da Fazenda devia receber dos demais Ministérios os orçamentos relativos às despesas de suas repartições para à Câmara dos Deputados juntamente com todas as contribuições e rendas públicas. Além disso, a receita e a despesa da Fazenda Nacional ficavam a cargo de um tribunal denominado Tesouro Nacional e o Ministério da Fazenda devia apresentar anualmente à Câmara dos Deputados o Balanço Geral da receita e despesa do ano anterior (PELLINI, 2003). A primeira Constituição da República, de 1891, conferiu ao Poder Legislativo a elaboração do orçamento. Ele tinha a responsabilidade da tomada de contas de receita e despesa de cada exercício financeiro. Além disso, houve o surgimento de um órgão de controle 19 externo para auxiliar o Legislativo na fiscalização, foi intuição do Tribunal de Contas para liquidar contas e verificar a legalidade destas antes de serem apresentadas ao Congresso. Ainda nesta constituição, o crime de responsabilidade com o descumprimento das leis orçamentarias foi estabelecido (PELLINI, 2003). A Carta de 1934, promulgada por Assembleia Constituinte, passou a demonstrar preocupação com a qualidade do orçamento atribuindo ao Poder Executivo a iniciativa de preparação do orçamento que deveria seguir várias regras e critérios de classificação de despesas. Adicionalmente, a prestação de contas deveria ser feita pelo Ministro da Fazenda, com parecer do Tribunal de Contas, ao Presidente anualmente (PELLINI, 2003). Em 1964, a Lei Federal nº 4.320 que encontra-se em vigor até hoje, inovou na inserção da elaboração do orçamento plurianual, relativo ao período de 3 anos, e do orçamentoprograma. Nessa época a ênfase do planejamento governamental começava a ser feita, buscando evitar a descontinuidade de políticas e obras públicas (PELLINI, 2003). Segundo Pellini (2003 apud ASSMANN et al., 1976, p.105), orçamento plurianual de investimento é “um instrumento técnico de planejamento, que corresponde à etapa da programação, em nível setorial e de prazo médio, abrangendo a concepção, identificação e implementação da generalidade dos projetos governamentais.” Pellini (2003 apud Nascimento, 1986, p.25) dá a seguinte definição para orçamentoprograma, advindo da Lei nº 4.320/64: É o documento em que se revelam os objetivos que o Governo pretende alcançar, definidos com base em levantamento e seleção das necessidades coletivas públicas, mediante o emprego de técnicas encadeadas adequadamente (planejamento e programação), os fatores imprescindíveis para concretizá-los (elementos humanos, materiais, etc.) e os meios financeiros, próprios e de terceiros, indispensáveis para ocorrer os gastos, de tal modo que seja possível o acompanhamento regular da execução dos projetos e atividades e o exercício efetivo do controle, referentes a um período administrativo. Nos anos seguintes, não houve modificações significativas no funcionamento do mecanismo. Já em 1988, a Constituição manteve a essência do modelo adotado até então, acrescentando ao orçamento a obrigatoriedade de serem votadas três leis de iniciativa do Legislativo: o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual (PELLINI, 2003). 20 Na intenção de combate ao déficit público, sob a pressão do FMI e outros organismos internacionais, a Lei Complementar nº 101/2000 estabeleceu princípios e normas gerais de finanças públicas para os três níveis de governo. A Lei de Responsabilidade Fiscal busca o equilíbrio das contas públicas tratando de: 1. Planejamento: definição de objetivos e metas fiscais; 2. Limites para despesas com pessoal e dívida, inclusive para novas operações de crédito, e para despesas de caráter continuado; 3. Mecanismos de compensação e correção de desvios; 4. Transparência e controle social; 5. Sanções institucionais e responsabilização pessoal em caso de descumprimento das normas. (PELLINI, 2003, p.14) 4.1.1.3. Sinopse / Visão Geral do Conteúdo / Argumentos do Autor Pellini (2003) apresenta uma discussão sobre a adoção da democracia direta na alocação dos recursos públicos em vez da corrente democracia representativa. No contexto legal, são apresentados trechos em que são citados modestamente indícios da inserção da população na decisão de onde e como aplicar os recursos. Nesse sentido, a Constituição de 88 somente fala sobre a possibilidade de qualquer cidadão poder denunciar irregularidades ou ilegalidades perante ao Tribunal de Contas da União. Enquanto na LRF, são explicitados a transparência da gestão fiscal, sendo disponibilizados inclusive por meios eletrônicos, além de abordar sobre a participação popular e realização de audiências públicas durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos (PELLINI, 2003). Experiências concretas do orçamento participativo são relatadas, dando o destaque para Porto Alegre, onde o orçamento participativo funcionava sem ser regulado em lei ou decreto. Houve tentativa de expansão para todo o Estado do Rio Grande do Sul porém, por conta da falta de recursos, as demandas da comunidade eram alocadas mas nunca executadas, fato que tirou a força e a crença no sistema (PELLINI, 2003). A prestação de contas e outras informações pelos governos feitas para o povo nem sempre são de fato acessíveis à população. Seja por conta de informações não verídicas divulgadas pelas Assessorias de Imprensa ou pela dificuldade de entendimento da linguagem 21 técnica utilizada nos informes de contabilidade, Pellini (2003) crê que existem modos de se apresentar de maneira mais confiável e compreensível a atuação do governo nos assuntos de interesse da população (PELLINI, 2003). Para isso, é proposta a introdução de indicadores sociais, nos moldes do IDH, ao lado dos números financeiros, fornecendo um diagnóstico da situação social da população. É dado o exemplo feito no Estado de São Paulo, no qual foi criado o Índice Paulista de Responsabilidade Social que age em nível municipal mostrando um conjunto de indicadores como: mortalidade infantil, mortalidade por AIDS, gravidez na adolescência, acidentes de trânsito, homicídios, etc. Com formulação matemática, cada município tem um escore que serve para comparação e estímulo a uma concorrência positiva visando à melhoria do mesmo (PELLINI, 2003). 4.1.1.4. Resultados As vantagens que podem ser adquiridas com a adoção de tal mecanismo de controle são o melhor foco para os gastos públicos e ações sociais e, a definição de metas sociais desde a elaboração do PPA, LDO e LOA. Tais metas seriam definidas juntamente à população, sendo a parte de cálculo e apresentação dos indicadores coordenada pela central do Sistema de Controle Interno que atualmente é responsável pela prestação de contas tradicional podendo-se garantir a uniformidade de critérios e confiabilidade dos dados (PELLINI, 2003). 4.1.1.5. Conclusão É concluído na pesquisa que este aprimoramento nos instrumentos de planejamento da aplicação dos recursos públicos e de prestação de contas contribuirá para a melhoria da qualidade de vida da sociedade e diminuição da desigualdade. Além disso, a cobrança da população quanto à percentuais de tributos destinados a setores como educação e saúde não seriam mais tão questionados, mas sim os resultados previstos que foram elaborados pelo povo (PELLINI, 2003). 22 4.1.2. Presença Potencial do Contingenciamento da União nos Artifícios Adotados pelos Gestores 4.1.2.1. Objetivo O artigo aborda a Lei de Responsabilidade Fiscal ou, mais especificamente, o mecanismo do contingenciamento que teve sua utilização intensificada após seu surgimento. Inspirado no mecanismo americano de sequestration, ele é entendido como uma forma de limitação de empenho e movimentação financeira na execução do orçamento (PARISI et al., 2011). A pesquisa analisa as distorções na utilização do contingenciamento referentes à transparência e à qualidade dos gastos públicos, observando os reflexos do contingenciamento da União sobre a gestão das unidades gestoras (UGs) a partir dos artifícios adotados por seus gestores na busca pela eficiência do gasto público. 4.1.2.2. Referencial Primeiramente, Parisi et al. (2011) dão destaque para a semelhança/inspiração do contingenciamento brasileiro com outros mecanismos e modelos adotados em outros países anteriormente, mostrando a visão de alguns autores sobre o assunto. Por seguinte, é relatada a previsão feita na LRF sobre o contingenciamento orçamentário. Nela, a execução orçamentária é submetida ao cumprimento de metas e o objetivo do contingenciamento é limitar a realização de despesas de forma a não permitir que a execução de gastos supere os valores arrecadados pelo governo, garantindo o cumprimento das metas fiscais estabelecidas na LDO (PARISI et al., 2011). No tópico seguinte, o funcionamento da execução é tratado, explicando-se desde o estabelecimento dos limites de empenho aos limites de pagamentos praticados. Nesse contexto, a programação orçamentária é feita ao longo da execução, sendo sua versão inicial estabelecida logo após a aprovação da LOA. Ajustes bimestrais ou quadrimestrais podem ser feitos dependendo do ritmo da execução frente às metas fiscais estabelecidas. Já a execução tem seu início quando da aprovação da LOA e o lançamento no SIAFI dos créditos orçamentários consignados aos órgãos bem como os limites de empenho destes. A partir daí, as UGs são responsáveis pela execução dos planos de trabalho podendo, por exemplo, iniciar 23 um procedimento licitatório. E, conforme os limites de empenhos sofram ajustes, as informações vão sendo atualizadas no SIAFI (PARISI et al., 2011). A política de administração dos Restos a pagar é referida como habilitadora do alcance das metas fiscais anuais estabelecidas na LDO. Esta política varia em função dos limites de empenho e de pagamentos estabelecidos no Decreto de Contingenciamento, sendo que a limitação de pagamento, além de se restringir às despesas empenhadas no próprio exercício, inclui as despesas em Restos a pagar de exercícios anteriores, processados ou não, que venham a ser quitadas no exercício corrente. Dessa forma, Parisi et al. (2011) afirmam que “a ‘política de restos a pagar’, citada por Albuquerque; Medeiros; Silva (2006, p.278), pode assumir 3 condições dependendo da variação entre limite de empenho e limite de pagamento:” Manutenção: quando os limites forem iguais para o exercício; Expansão: quando o limite de pagamento for inferior ao limite de empenho gerando aumento de restos a pagar; e Redução: quando o limite de pagamento for superior ao limite de empenho gerando redução do montante de restos a pagar. (PARISI et al., 2011, p.8) Por conta disso, visto que a metodologia do Banco Central para apurar o resultado fiscal apenas considera as despesas que foram efetivamente pagas até o final do exercício, a escolha de liquidar ou não os Restos a pagar em um determinado exercício influencia diretamente no atingimento das metas fiscais (PARISI et al., 2011). Tratando agora do contingenciamento em si, Parisi et al. (2011) acreditam que a definição operacional deste possui diversas possibilidades. Passando por aspectos orçamentários, relacionados à limitação do empenho, e aspectos financeiros, relacionados a limitação de pagamento, são dadas definições segundo a Secretaria do Tesouro Nacional, Órgãos Setoriais de Programação Financeira e, Executores das Unidades Gestoras. Deste último, a definição operacional consiste basicamente nos registros no SIAFI de limites de empenho, despesas empenhadas, créditos descentralizados, lançamentos e execuções de despesas pagas pela UG no exercício (PARISI et al., 2011). O contingenciamento foi criado para ser um mecanismo temporário para auxiliar no acompanhamento periódico do atingimento das metas fiscais durante o exercício. Porém, os recursos contingenciados não vem sido devolvidos proporcionalmente, tornando o caráter temporário, formalizado pela Portaria Interministerial do Ministério da Fazenda e pelo Ministério 24 do Planejamento, Orçamento e Gestão; em permanente (PARISI et al., 2011). Além disso, a pesquisa cita o trabalho de Protásio; Bugarin; Bugarin (2004) a respeito das distorções causadas por conta da utilização do mecanismo: 1. Ineficácia econômica, em cenários monetários estáveis, do contingenciamento ao longo do exercício, com liberação dos recursos apenas no fim do ano; 2. Baixa qualidade dos gastos públicos por conta do comportamento incremental causado pelos órgãos na tentativa de manter constante a quantia de orçamento disponível em anos futuros (PARISI et al., 2011, p.10). Ambas as questões são assuntos de Protásio; Bugarin; Bugarin (2004), adotado como uma das referências para o presente trabalho. No segundo ponto, é colocado pelos autores um estudo adicional do comportamento incremental que mostra o aumento dos gastos no último mês do exercício. Enquanto o estudo de Protásio et al. (2004) só analisava com dados de 1997 até 2001, o apresentado acrescenta dados para os anos até 2007 (PARISI et al., 2011). Figura 7 - Gráfico da Execução financeira do Tesouro Nacional com despesas de custeio e investimento, Jan 1997 – Nov 2007. Fonte: Parisi; Galhardo; Pereira; Silva (2011) apud BRASIL ([2007a]). Nota: Valores atualizados com base no IGP-DI – dez. 2007. 25 Ainda são destacados a utilização de artifícios contábeis na orçamentação e o consequente círculo vicioso de endividamento do Estado. Tais artifícios são utilizados pelos governos para contornar limites estabelecidos legalmente. Outros autores, como Ferretti (2000) e Hangen e Wolff (2006), são citados por terem realizado uma pesquisa empírica sobre o uso de artifícios sobre gestores das UGs comprometendo a transparência, princípios contábeis e financeiros que as regras legais tentam assegurar (PARISI et al., 2011). 4.1.2.3. Método O método utilizado começou com uma pesquisa por registros públicos com a técnica de análise categorial. A escolha do material para fonte de estudo selecionou documentos utilizando uma série de critérios e procedimentos elaborados pelos autores. A coleta de dados ocorreu entre 13/02 e 23/03 de 2008 e passou por 705 registros de processos de contas submetidos ao Tribunal de Contas da União (TCU) pelos administradores das UGs localizadas no estado de São Paulo, relativos à gestão dos exercícios de 2001 a 2006 (PARISI et al., 2011). Os dados levantados indicaram a existência de 2359 Unidades Gestoras que prestam contas ao TCU, sendo 70% unidades da Administração Direta e 92% pertencentes ao Poder Executivo. A partir disso, os autores elaboraram questões investigativas, atribuindo hipóteses nulas sobre a utilização de artifícios pelos gestores com o objetivo de viabilizar a execução orçamentária integral dos créditos autorizados como se tem a seguir (PARISI et al., 2011). Tabela 2 - Questões investigativas e hipóteses nulas correspondentes as propostas na pesquisa. Fonte: Parisi; Galhardo; Pereira; Silva, 2011 Com essas hipóteses formuladas, Parisi et al. (2011) estabeleceram três variáveis para serem testadas. Os artifícios adotados pelos gestores (ArtifGest) referente às diferentes categorias de artifícios que o processo de análise do referencial teórico permitiu serem identificados. A Área de Gestão (AreaGest) que pode assumir os valores: 1 – Operacional; 2 26 Orçamentária; 3 – Financeira; 4 – Patrimonial; 5 – Recursos Humanos; 6 – Suprimento de Bens e Serviços; 7 – Controle; 9 – Impossível Avaliar. A Presença potencial do contingenciamento (PresPotCont) com as classificações: 1 – Inexiste possibilidade de relação com o contingenciamento; 2 – Possibilidade de relação com o contingenciamento; 3 – Poss. relação com o cont. razoável; 4 – Poss. Relação com o cont. forte; 5 – Relação expressa com o contingenciamento; 9 – Impossível Avaliar (PARISI et al., 2011). Para análise das variáveis criadas, eles utilizaram testes sobre medidas de associação não-paramétricas do tipo Qui-quadrado. A partir desses, foram identificadas frequências de categorias de artifícios por áreas de gestão nas determinações sobre os processos de contas submetidos ao TCU pelas UG’s (PARISI et al., 2011). 4.1.2.4. Resultados A análise descritiva dos resultados foi suficiente para negar a hipótese nula da primeira questão investigativa porque há uma concentração dos artifícios sobre as áreas de “Pessoal” e de “Suprimento de Bens e Serviços” que representaram 60% dos artifícios classificados. Isso pode ser explicado pelo fato de que existe margem de manobra dos gestores para a adoção de artifícios sobre a área de “Suprimento de Bens e Serviços” determinada pelo governo (PARISI et al., 2011). Com o teste de aderência do Qui-quadrado, eles conseguiram um resultado que afasta a segunda hipótese de que não há variação na incidência dos artifícios entre as áreas de gestão. As variações existem e apontam para a concentração dos reflexos associados ao esforço fiscal por meio de contingenciamento sobre a área de “Suprimento de Bens e Serviços” e a não incidência sobre a área de “Pessoal” (PARISI et al., 2011). 4.1.2.5. Conclusão Os resultados encontrados atenderam ao objetivo estabelecido de verificar os reflexos do contingenciamento da União sobre a gestão das UGs, a partir dos artifícios adotados pelos gestores com base na análise de conteúdo das deliberações do TCU relativas aos processos de Tomadas e Prestações de Contas das UGs (PARISI et al., 2011). 27 Com isso, o contingenciamento se mostra efetivo para o cumprimento das metas de superávit primário, mas sua aplicação tem efeito negativo na administração das UG’s, comprometendo a qualidade do gasto público, impondo um fluxo de caixa irregular e inseguro que prejudica o planejamento operacional. Além disso, tal mecanismo confere uma maior probabilidade de ocorrerem desvios, fraudes e corrupção, já que o controle interno da gestão não é satisfatório (PARISI et al., 2011). Como uma alternativa de pesquisa adicional, Parisi et al. (2011) sugerem o estudo dos reflexos do contingenciamento na parcela do orçamento destinado a Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista. Neste caso, a linha de pesquisa poderia abordar a questão do atraso observado no julgamento dos processos de contas pelo TCU, verificando a defasagem entre o julgamento de contas dos administradores e o diagnóstico contido nos Relatórios e Pareceres sobre as contas do governo (PARISI et al., 2011). 4.1.3. Discricionariedade, Contingenciamento e Controle Orçamentário 4.1.3.1. Objetivo O artigo busca primeiramente mostrar como a orçamentação pública ocorre correntemente no Brasil para depois alertar para problemas relacionados a sua elaboração e execução, argumentando sobre o mecanismo do contingenciamento como ferramenta impositiva do governo monitorar a execução dos órgãos públicos. Tendo como base dados da execução orçamentária da União do exercício de 2005, Pinto (2006) busca mostrar como o contingenciamento se trata de um redesenho inconstitucional da Lei Orçamentária Anual (LOA). 4.1.3.2. Referencial Inicialmente, o fato de que o orçamento é um instrumento de contabilização dos recursos adquiridos pelos impostos é relatado, ou seja, ele serve à política fiscal. Constitucionalmente, nenhuma despesa pode ser realizada se anteriormente não existir um orçamento aprovado que limite as quantidades e prioridades das diversas despesas existentes (PINTO, 2006). 28 As prioridades de investimento do Estado são definidas anteriormente durante a elaboração e levam em consideração as necessidades do povo. Pinto (2006) atenta para o fato do problema da equação envolvendo receitas e despesas, no qual as prioridades definidas legalmente requerem recursos a mais dos que foram estabelecidos. Dessa forma, o orçamento nem sempre consegue atender de forma absoluta às demandas da população por meios legais. Logo, a discricionariedade presente na execução orçamentária vem a permitir o melhor gerenciamento do dito “[...] orçamento [...] dinâmico”, segundo Pinto (2006, p.4). Isto é feito por meio de anulação de rubricas, suplementação de outras, não realização de determinadas despesas e contingenciamento de empenhos (PINTO, 2006). Pinto (2006) exemplifica a questão da execução incompleta de recursos autorizados na LOA a partir da exposição de uma tabela elaborada por ela, retirando dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFI) sobre programas governamentais inscritos no ano de 2005. Em todos os 36 programas citados, a relação percentual entre o montante pago até 28/12/2005 e a dotação autorizada na LOA não ultrapassava 10%, evidenciando o fenômeno dito pelo artigo de “frustação reiterada de agendas orçamentárias discutidas, aprovadas em lei, mas apenas minimamente executadas” (PINTO, 2006, p.7). O estudo cita que dos R$ 5.365.168.892,00 programados na LOA de 2005, apenas R$ 194.375.410,00 foi efetivamente gasto. Ou seja, mais de 5 bilhões de reais deixaram de ser alocados em outras prioridades governamentais. Essas inexecuções parciais ou mesmo integrais dos programas de trabalho inscritos na LOA têm como causa falhas de planejamento e nos atos administrativos de execução do gasto (como solicitação de compra, serviços, obras, licitações, etc.), e o contingenciamento preventivo de despesas visando o atingimento de metas de superávit primário. Ao pretexto de lidar com a crise governamental econômica, decisões são tomadas ignorando-se qualquer discussão democrática das prioridades do povo sem qualquer outra justificativa (PINTO, 2006). Na segunda seção do artigo, Pinto (2006) foca na questão da necessidade de se alterar o caráter autorizativo dos orçamentos anuais, tratando também do contingenciamento de empenho. Este é definido como um “procedimento formal de limitação tanto das despesas autorizadas na lei orçamentária anual, quanto da movimentação financeira a elas atinente” (PINTO, 2006, p.11). 29 A restrição de despesa é normatizada no texto da Lei Complementar n.º 101/2000 no art.9º., onde também é descrita a obrigatoriedade de restrição da geração de despesas quando há risco de não cumprimento de metas de resultado primário ou nominal previstas na LDO. A Lei de Responsabilidade Fiscal esclarece que, se as receitas previstas forem reestabelecidas, a recomposição proporcional das dotações contingenciadas deve ser feita conforme for ocorrendo a retomada da arrecadação (PINTO, 2006). O gestor público responsável pelo controle de metas do superávit primário acaba por adotar medidas preventivas de contingenciamento para superar tais metas além da previsão legal na LDO e na LOA. Isso porque, caso tais metas sejam menores do que a previsão da LDO, ele será responsabilizado. Já se ele superar tais metas, nenhuma previsão legal é prevista, porém ocasiona má gestão dos recursos pelo governo, atrapalhando a continuidade de políticas públicas (PINTO, 2006). A Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO) do Congresso Nacional, em 2005, apresentou em “Levantamento de Problemas e Sugestões para a Melhoria do Processo Orçamentário” a visão de que o contingenciamento faz o funcionamento ideal da orçamentação se distanciar muito da autorização legal expressa na LOA. As sugestões de melhoria que foram apresentadas pela CMO incluíram conferir maior capacidade de análise ao Poder Legislativo no sentido das realocações de receitas em discordância com a previsão feita na LOA. Ou seja, tentar evitar que o Executivo decida sozinho o redesenho das prioridades governamentais sem consultar o Legislativo ou sem possuir justificativas consistentes para tal (PINTO, 2006). Logo, para haver um maior controle da execução, o Legislativo necessita de critérios e metodologias de cálculo para estimativa de receitas e despesas obrigatórias. Além disso os gestores envolvidos na elaboração da proposta da LOA devem ser acompanhados no controle das receitas de excesso de arrecadação e fixação dos programas estabelecidos (PINTO, 2006). É destacada no artigo a prática da subestimação das receitas no projeto da LOA. Ela ocorre para permitir a alocação de receitas na formação de um superávit primário maior do que o previsto na LDO já que o excesso de arrecadação fica mais fácil de ser atingindo partindo de uma estimativa de receitas que será, muito provavelmente, abaixo da real. O Executivo alega que tal elaboração subestimada de receitas é uma “margem de segurança fiscal” (PINTO, 2006, p.18). Pinto (2006) faz questão de ressaltar que esta argumentação é arbitrária e inconstitucional. 30 O Poder Legislativo não pode se quer agir sobre tal fato, pois, pela lei, ele só pode reestimar receitas se for detectado erro ou omissão de ordem técnica ou legal. Dessa forma, o Executivo não tem problemas durante a execução do orçamento, pois se as receitas forem subestimadas, provavelmente haverá um excesso de arrecadação sem alocação prevista (PINTO, 2006). 4.1.3.3. Conclusão Logo, se a lei orçamentária passasse a ser impositiva, como propõe a CMO, instrumentos de avaliação da execução das despesas e realização de receitas poderiam ser analisados pelo Legislativo, evitando manobras do Executivo para justificar contingências e excesso de arrecadação proveniente de elaborações incorretas. Dessa forma, seria obrigatória a execução da programação aprovada na LOA e modificações necessitariam passar pelo Legislativo para aprovação e, com isso, as ações tomadas seriam mais previsíveis, ajudando a evitar desvios indevidos de verba pública (PINTO, 2006). Por fim, Pinto (2006) destaca que os processos de aprovação de execução orçamentários são obscuros e inconsistentes já que somente o Executivo controla toda a etapa de cálculo das receitas e das despesas obrigatórias e, sem uma aprovação do Legislativo, toda a programação prevista é prejudicada. 4.1.4. À Espera da Reforma Orçamentária: Um Mecanismo Temporário para Redução de Gastos Públicos 4.1.4.1. Objetivo O artigo apresenta, em sete seções, como o modelo de orçamentação é executado atualmente no Brasil, focando na questão do contingenciamento e demonstrando sua ineficiência e efeitos negativos para o Estado. É também proposto um modelo temporário de incentivos que visa à melhoria da orçamentação até que a legislação seja alterada. 31 4.1.4.2. Referencial Primeiramente, Protásio; Bugarin; Bugarin (2004) tratam do histórico por trás da crise fiscal presente desde a década de 80. Dentre as causas originárias de tal crise, são destacadas: Ajustamentos externos aos choques do petróleo e crises dos juros no fim da década de 70; Queda da receita tributária bruta; Baixo crescimento econômico; Aumento das despesas com pessoal na primeira metade da década de 80; Mecanismos de financiamento da dívida pública que causaram aumento da inflação e das despesas com juros e; Constituição Federal de 1988: Aumento da transferência de impostos para Estados e Municípios sem uma redistribuição proporcional das despesas. Para reverter o cenário de alta inflação, o governo tomou medidas para a redução da inflação por meio do aumento de receita, privatização, controle de endividamento dos Estados e programa de combate às fraudes da Previdência Social. Juntamente ao Plano Real, elas reduziram drasticamente a inflação, porém gerou uma situação de déficit no PIB em 97 (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Por conta das crises na Ásia e Rússia no período entre 97 e 98, os juros foram elevados para evitar fuga de capital e piorar mais a situação. Em 98, o Programa de Estabilidade Fiscal (PEF) foi criado, fixando-se metas junto ao FMI para estabilizar a economia. Os autores apresentam um quadro mostrando a confirmação do cumprimento das metas ao longo dos anos. Contudo, eles dizem que, apesar do PEF ter dado resultado no superávit primário, o programa teve como base medidas temporárias de tributação (CPMF; concessões de serviços de telefonia) e portanto, não sendo compatível com objetivos de crescimento da economia (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Com isso, objetivos de redução de gastos vieram a ser necessários para sustentar a política fiscal. Nesse intuito, o mecanismo do contingenciamento de orçamento e controle das liberações financeiras vem sendo utilizado (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Para 32 Protásio; Bugarin; Bugarin (2004, p.10) “O corte das dotações orçamentárias dos diversos órgãos” é a definição para contingenciamento. É destacado que geralmente parte do contingenciamento efetuado logo após a aprovação do orçamento é mantida até o fim do exercício, representando um corte de orçamento para o órgão. Conforme a pressão dos órgãos para a liberação de gastos e a conformidade em frente ao atingimento de metas de superávit primário, parte da quantia contingenciada pode ser descontingenciada ao longo do exercício. Esta parcela é o objeto de estudo dos autores juntamente às liberações financeiras postergadas (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Dentre os problemas advindos do contingenciamento estão a inversão de prioridades na qual os órgãos gastam em ações menos prioritárias para forçar a liberação de recursos para ações inadiáveis; endividamento por meio de atrasados que faz com que fornecedores cobrem do governo preços acima daqueles vigentes no mercado; perda de eficácia do mecanismo durante períodos com baixa inflação devido à redução de valor das dotações orçamentárias (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Além disso, por causa da definição do orçamento dos órgãos ser feita com base na execução da despesa dos últimos três anos, estes adotam o “comportamento incremental” (Protásio; Bugarin; Bugarin, 2004, p.12), executando o orçamento em sua totalidade mesmo não havendo gastos necessários, de forma a evitar a redução de orçamentos futuros. Isto proporciona a existência de ações não prioritárias, projetos e atividades com valores acima do necessário. É apresentado um gráfico da execução mensal da despesa que mostra a tendência do comportamento incremental no qual a maior parte das despesas é executada no mês de dezembro (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). 33 Figura 8 - Execução mensal da despesa em custeio, investimento e inversões financeiras (1996 – 2001). Fonte: Protásio; Bugarin; Bugarin (2004) apud SIAFI, Secretaria do Tesouro Nacional, STN/ME. 4.1.4.3. Método Na segunda seção, os autores buscaram confirmar tal tendência a partir da utilização de um modelo econométrico. Por meio da definição de uma função que relaciona a execução orçamentária de um determinado mês do exercício e a executada 12 meses antes, Protásio; Bugarin; Bugarin (2004) confirmam o comportamento incremental mostrando que o aumento de 1% na execução 12 meses antes corresponde a um aumento de 10% no orçamento executado corrente. Além disso, tal correlação é aumentada no mês de dezembro. A partir desta confirmação estatística das evidências empíricas que eles tinham, Protásio; Bugarin; Bugarin (2004) buscaram propor um mecanismo temporário para induzir uma redução voluntária de gastos por parte dos órgãos públicos. Na terceira seção, utilizam um modelo do tipo Principal-Agente para evidenciar a proposta. O modelo caracteriza o Principal como sendo os órgãos responsáveis pelo acompanhamento do superávit primário (Ministério da Fazenda e do Planejamento) e o Agente como sendo os órgãos que recebem recursos para a execução orçamentária. Neste relacionamento entre governo e seus órgãos, o objetivo do Principal é manter o ajuste fiscal 34 enquanto do Agente, decidir como gastar os recursos de forma eficiente (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). São estabelecidos quatro modelos. Os dois primeiros analisam a situação de um ano através de um modelo básico, que quantifica a utilidade do órgão, e um modelo que inclui a inflação nesta quantificação. A partir destes dois modelos iniciais, o estudo mostrou que, para os objetivos do governo, contingenciar o máximo possível é a melhor ação. Isto se deve ao fato de que na elaboração e execução orçamentária não existem incentivos aos órgãos que motivem estes a parar de gastar todo o orçamento. Ou seja, mesmo se não houvesse contingenciamento, os órgãos continuariam a gastar os recursos em sua totalidade (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). O principal fator indicado como causador desse comportamento é relacionado à legislação vigente que elabora o orçamento a partir da execução dos três anos anteriores. O artigo indica que para a criação de incentivos seria necessária a alteração da legislação e normas dos órgãos envolvidos na elaboração e execução do orçamento (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Na quarta seção, apresentam-se os dois outros modelos que são extensões dos modelos anteriores para o período de 2 anos. A conclusão que se chega é a mesma, os órgãos não têm incentivos para reduzir gastos e o governo, para reduzir o contingenciamento (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Por seguinte, o mecanismo de incentivos proposto apresenta aos órgãos a possibilidade de receber no exercício seguinte uma proporção do valor do orçamento que foi economizado no exercício atual. Protásio; Bugarin; Bugarin (2004) acreditam que, considerando-se a redução de recursos disponíveis no início do ano provocada pelo contingenciamento e a opção da proporção por poupar no exercício anterior, os órgãos poderão decidir gastar ou não todo o orçamento disponível e ter uma distribuição mais equilibrada de gastos ao longo do ano consequentemente. O governo acaba também tendo vantagens pois poderá utilizar parte da quantia não gasta pelos órgãos naquele exercício para o abatimento de dívida pública (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Uma observação feita é a de que os limites orçamentários dos órgãos devem ser alterados na legislação de forma a não serem diminuídos caso a execução orçamentária dos 35 três anos anteriores diminuir. A alteração da legislação é uma barreira à implantação do mecanismo sugerido segundo a pesquisa (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Na sexta seção, foi efetuada a busca pelos incentivos ideais. Chega-se à uma expressão que representa a escolha ótima de compartilhamento da economia de gastos efetuada no ano anterior, do ponto de vista do governo. Tal expressão também demonstra que para ambientes de alta instabilidade macroeconômica o mecanismo dificilmente seria viável pois, em regime de alta inflação, os órgãos somente aceitariam reduzir seus gastos caso recebessem uma quantia maior que a poupada como incentivo (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). 4.1.4.4. Resultados Por seguinte, foi feita uma simulação com dados obtidos pelo sistema SIAFI/STN de execução das despesas totais de todos os órgãos no ano de 2001. O ganho adicional relatado para o governo utilizando o mecanismo equivale a 50% do total poupado com o contingenciamento (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). 4.1.4.5. Conclusão Dada as condições da atual forma como os limites orçamentários são definidos, o comportamento incremental adotado pelos órgãos somente causa problemas para o governo (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). O modelo explicitado pelos autores pode estimular a redução de gastos através de incentivos proporcionais às quantias economizadas pelos órgãos. Com isso, os órgãos podem passar a controlar melhor seus gastos e deixar de depender de cortes do governo para que tal controle seja feito. Dessa forma, como os órgãos acompanham as despesas mais de perto que o governo, a redução de gastos pode ser feita com melhor desempenho, avaliando corretamente onde os gastos podem ser diminuídos ou não (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Da mesma forma, o governo fica mais aliviado por não ter mais a pressão de ter que recorrer a medidas de corte de despesas. Por fim, Protásio; Bugarin; Bugarin (2004) afirmam 36 que, ao se aplicar o mecanismo por períodos maiores que dois anos, o governo pode diminuir o contingenciamento aos poucos devido à crescente preocupação dos órgãos em poupar para receber o prêmio. É ressaltado que o modelo é relativamente simples do ponto de vista técnico, pois a prática de usar recursos que sobram ao final do ano já é feita pelos órgãos em casos de execução de despesas do orçamento do ano seguinte ou pagando os restos a pagar. Contudo duas dificuldades são explicitadas: 1) Mudanças na legislação: Autorização e regulamentação de uso de recursos poupados na LDO ou na LOA; Estabelecimento da quantia e forma dos gastos desses recursos extras; Determinação de que os recursos poupados só podem estar disponíveis a partir de Janeiro do ano seguinte (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). 2) Confiança dos órgãos no governo: Os órgãos precisam ter certeza de que o governo não irá transformar os recursos poupados em cortes orçamentários no futuro. Dúvidas quanto ao comportamento do governo no futuro podem acarretar em receio de se reduzir os gastos (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Neste segundo ponto, Protásio; Bugarin; Bugarin (2004) acreditam que esta é a principal razão do modelo ser dito temporário já que o compromisso a longo prazo dos governos é pouco crível. Outro motivo para classificação do modelo como temporário está no fato de que conforme o processo de orçamentação for sendo melhorado, com redução do contingenciamento e correta redução de gastos por parte dos órgãos, o modelo poderá deixar de ser necessário já que o sistema se equilibrará naturalmente (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). 37 4.2. Artigos Internacionais - Resumos 4.2.1. Quantitative Method for Updating Cost Contingency throught Project Execution 4.2.1.1. Objetivo O artigo apresenta em cinco seções a utilização do método quantitativo Value at Risk aplicado a um estudo de caso relacionado ao projeto de construção de um túnel com o fim de prever o contingenciamento de custos de tal projeto. Sua primeira seção discute como os custos excedentes em projetos são corriqueiros no ramo da construção. A definição de contingenciamento apresentada, retirada de Project Management Institute (2004), refere-se à quantidade de fundos, orçamentos ou tempo necessários, acima do estimado, para reduzir o risco de excessos dos objetivos do projeto para um nível aceitável para a organização (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). Para realização de estimativas, Xie; AbouRizk; Zou (2012) citam as várias ferramentas existentes para medição de riscos e estimativa de contingenciamento. O artigo tem o foco para análise quantitativa do contingenciamento de custo. O custo de contingenciamento é tradicionalmente estimado como uma porcentagem do custo de projeto estimado, sendo tal porcentagem determinada com a utilização de modelos probabilísticos. Porém, métodos como esses, segundo os autores, são dependentes da precisão da análise de custo original e riscos assim como de opiniões tendenciosas de especialistas. Por conta disso, a validade de tais métodos pode ser prejudicada, sendo as entradas necessárias à aplicação do método difíceis de serem coletadas e podem ser prejudicadas por mudanças do ambiente corporativo (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). 4.2.1.2. Referencial Na seção seguinte, é explicado o método Value at Risk (VaR) que foi utilizado no artigo para previsão do contingenciamento de custo do estudo de caso em questão. O VaR é definido como uma medida estatística da máxima perda que pode ser esperada ocorrer com uma dada probabilidade durante um período específico de tempo dentro de condições com distribuição 38 normal. A probabilidade é especificada em termos de nível de confiança (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). É dado o exemplo: “Um VaR bissemanal de $7000 ao nível de confiança de 90% significa que em qualquer período de duas semanas existe uma chance de 10% (100% - 90%) de que as perdas serão iguais ou maiores de que $7000” (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012, p.2). Logo, a função do VaR no artigo é prever potenciais perdas no projeto para atualizar os contingenciamentos. Três fatores são utilizados para seu cálculo: o período de previsão, o nível de confiança, e o tempo de observação ou o tamanho da amostra. O período de previsão é o tempo necessário para a projeção de performance e período de controle desejado pelos gerentes de projeto. O nível de confiança representa o nível de tolerância de risco da organização pois mede a probabilidade de tal valor alcançar ou exceder a máxima perda prevista. Na pesquisa do artigo, foi utilizada a grandeza tamanho da amostra que deveria ser grande o suficiente para satisfazer o pressuposto da normalidade (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). 4.2.1.3. Método Como entrada do modelo VaR em questão foram utilizados os ganhos e perdas diários do projeto. Para a pesquisa, esses ganhos e perdas diários são definidos como os potenciais ganhos do trabalho desempenhado diariamente, excluindo o lucro estimado, menos o custo diário do trabalho desempenhado (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). A modelagem do VaR e a atualização do contingenciamento seguem o processo apresentado na figura a seguir, mostrada pelos autores: 39 Figura 9 - Processo de modelagem VaR. Fonte: Adaptado de Xie; Simaan; Zou (2012) Os retângulos cinzas fazem parte da modelagem VaR enquanto as demais são atividades de suporte. A área retangular tracejada apresenta o conjunto de atividades para serem repetidas ao final de cada período de observação a fim de prever o contingenciamento (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). Na terceira seção, Xie; AbouRizk; Zou (2012) tratam do estudo de caso desde a escolha do projeto de estudo, passando pela coleta de dados e cálculo do VaR e realizando a análise de resultados e validação do modelo. O estudo foi baseado no projeto de construção de uma seção do túnel de utilidades North Edmonton Sanitary Tunnel a ser localizado em Edmonton, Alberta, Canadá. O projeto envolvia a escavação de 3675 km de esgotos sanitários, começando em dezembro de 2007. As informações para aplicação do modelo foram coletadas diariamente desde o primeiro dia até janeiro de 2010, contabilizando 547 dias de trabalho. Dados de custos foram retirados do sistema SAP utilizado pela cidade de Edmonton. Todos os itens utilizados na construção são detalhados no SAP, mostrando data, nome da atividade, duração da atividade, custo etc. A empreiteira registrou uma média de 70 itens a cada dia de trabalho. Outras informações como estimativa do projeto e produção estimada também foram coletadas. Com isso, o custo total por metro de perfuração foi estimado como $3104, sendo já incluso no valor, equipe, equipamento, material, subempreiteira, dentre outros custos (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). Para descobrir as entradas do modelo VaR, no caso, o potencial de ganho ou perda diário do projeto, o ganho estimado por dia de trabalho (excluindo lucro estimado) foi calculado a partir do custo diário de progresso do túnel (medido em dólar x metros por dia) (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). 40 A partir disso, o VaR pode ser estimado para o período em que ele for necessitado para o cálculo do contingenciamento. Ou seja, de acordo com o número de entradas (dias de trabalho transcorridos) o VaR é modificado, acompanhando o andamento do projeto (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). Posteriormente, Xie; AbouRizk; Zou (2012) fazem a análise e concluem que os resultados permitem a atualização do contingenciamento de custo, utilizando diferentes tamanhos de amostra de dados históricos estabelecendo diferentes níveis de confiança. Logo, sempre quando necessário o contingenciamento é alterado para que corresponda ao período que precisa de previsão (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). 4.2.1.4. Resultados As duas últimas seções do artigo consistem na discussão e aplicação do modelo VaR utilizado. É colocada em xeque a utilização de modelos de análise de risco, sendo o modelo que analisa custos e ganhos diários do projeto mais eficientes (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). Nessa discussão, riscos são tratados como os responsáveis pela geração de custos excedentes que são a razão pela qual projetos precisam de contingenciamento de custo. Apesar de a análise de riscos permitir o entendimento dos potenciais riscos e seus impactos, ela não mensura quantitativamente tais impactos. Por conta disso, o modelo VaR acaba sendo mais oportuno pois por meio da análise do custo diário, a mensuração de impactos pode ser feita com a observação desta variável ao longo do tempo (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). Outro ponto destacado novamente por Xie; AbouRizk; Zou (2012) é a possível subjetividade do embasamento de custos originais estimados e da opinião de experts. Essas características, como mencionadas anteriormente, não ocorrem no modelo VaR. 4.2.1.5. Conclusão Quanto às possíveis aplicações do modelo, é afirmado que o método possui aplicabilidade nos diferentes níveis de planejamento de projetos. Além disso, deve-se ressaltar a possibilidade de sua expansão para tarefas em diversos níveis de organizações (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). 41 Com isso, reforça-se o pensamento de que o modelo é aplicável em todos os tipos de projetos por conta da utilização dos dados de custo diário e não dados de fluxo de caixa, os quais são alterados em projetos de contratos variáveis (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). Dentre outras oportunidades de aplicação, Xie; AbouRizk; Zou (2012) recomendam a aplicação do método em projetos de engenharia de autoestradas por conta de tal setor possuir envolvimento direto em custos excedentes e contingenciamento. Por fim, sugerem possíveis melhorias ao modelo, como a inclusão de um controle de software ERP, facilitando o processo de coleta de dados. Além disso, modelos de simulação podem ser adaptados para incluir a previsão de duração de projetos e para auxiliar no cálculo do contingenciamento (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). 4.2.2. Using an interactive schedule simulation platform to assess and improve contingency management strategies. 4.2.2.1. Objetivo O artigo aborda o campo da gerência de recursos envolvendo a tomada de decisões de forma sequenciada para controlar contingências durante a fase de execução de um projeto. Para isso, utiliza-se um modelo de simulação com o fim de desenvolver uma base de tomada de decisão em um projeto de construção. Inicialmente, Tang; Mukherjee; Onder (2013) alertam para as dificuldades que surgem com as incertezas durante a execução de um projeto e como elas podem afetar o resultado final do projeto. Para gerenciar a tomada de decisão em situações inesperadas, eles apresentam duas possíveis estratégias: estabelecer tendências de decisões baseadas num número significativo de dados históricos e estudos de caso ou utilizar modelos de simulação que permitam criar diversas situações hipotéticas de incertezas durante o cronograma do projeto (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). Apesar de mais complicados de serem validados, Tang; Mukherjee; Onder (2013) julgam que os modelos de simulação dão uma maior base de suporte à tomada de decisão. Eles acreditam que no embasamento em dados históricos apresenta um número limitado de cenários possíveis para o resultado do projeto, além de ter problemas na coleta de dados. Por outro lado, 42 os modelos de simulação podem prever muito mais situações futuras passíveis de análises que suportem à tomada de decisão (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). 4.2.2.2 Método Para realização da pesquisa apresentada, foi desenvolvida a plataforma de simulação chamada de Interactive Construction Decision Making Aid (ICDMA), baseada em duas simulações: a Virtual Coach e a Temporal Network with Activities and Events (TONAE). Esta representa o raciocínio por trás das informações de gerenciamento de atividades, eventos e restrições na construção enquanto aquela, as simulações situacionais (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). Na plataforma, a simulação desenvolvida consiste em um cenário no qual o tomador de decisões é surpreendido por situações inesperadas sob a pressão da necessidade de realizar escolhas. A simulação prossegue conforme o cronograma planejado no projeto real seguindo exatamente o que foi definido. De tempos em tempos, o modelo gera eventos aleatórios que desviam o projeto do planejado e diversas ações do tomador de decisão são geradas, sendo as consequências das decisões novos cenários criados em que o tomador de decisões deve responder. O processo continua até que a execução do projeto simulado seja completa (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). A metodologia aplicada consiste inicialmente na elaboração de um projeto de simulação a partir dos documentos de projeto da empreiteira para criar e testar algumas estratégias iniciais na plataforma ICDMA. Dado que cada estratégia apresenta vários trade-offs envolvidos, novas estratégias híbridas são criadas. Após feitas análises de acordo com as prioridades do projeto, estratégias individuais são unidas. Dessa forma, novos planos vão sendo criados até que sejam geradas um número satisfatório de possibilidades para os mais diferentes cenários possíveis (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). Para elaboração dos recursos necessários a servirem como base para completar o projeto, o ICDMA necessita das seguintes entradas para ser preparado de acordo com Tang; Mukherjee; Onder (2013, p.3): 1) Lista de atividades e suas durações estimadas para completar o projeto; 2) Usos para cada atividade em termos de material, trabalho realizado e equipamentos; 43 3) Preço unitário do material, trabalho realizado e equipamento; 4) Relações lógicas e restrições entre atividades para estabelecer o cronograma planejado. Como saídas do sistema, estão: 1) Resultados do projeto com descrição de custos e condição da programação do projeto; 2) Informação sobre decisão registrando o material, trabalho realizado, alocação e realocação de equipamento; 3) Registro de eventos indesejados; 4) Resultados questionáveis, comparando sendo custos totais e datas simulados com as previsões feitas antes do começo da simulação. Figura 10 - Estabelecimento e coleta de dados para simulação. Fonte: Adaptado de Tang; Mukherjee; Onder (2013) A figura 10 mostra a estrutura do processo da plataforma ICDMA de coleta, entrada e saída de dados. Por meio de sua observação, podemos entender como o ICDMA acaba por representar toda a informação e restrições que influenciam no gerenciamento da construção (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). 44 O estudo de caso escolhido foi parte de um projeto de reconstrução de uma estrada de aproximadamente 16km no sudoeste de Michigan, EUA, em 2009. Documentos que já existiam sobre o projeto foram utilizados para montar estabelecer o cronograma esperado para o projeto. Além disso, registros históricos da construção original foram investigados para identificar o ambiente do projeto de estudo (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). Para esse fim de coleta e dados, eles analisaram registros diários do software FieldManager, utilizado pelo Departamento de Transporte de Michigan (MDOT) nos projetos de autoestradas para registrar informações como pessoal e equipamentos envolvidos, quantidade de materiais usadas em cada atividade, produtividade da equipe, etc. Nessa análise eles buscaram identificar evento inesperados e indesejados, verificando suas probabilidades e impactos no projeto (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). 4.2.2.3. Resultados Após testar e analisar sete estratégias para agir sobre incertezas, novos planos de gerenciamento foram gerados, validando-se a hipótese de que aqueles que foram bem apropriados podem auxiliar de uma melhor forma o gerenciamento de projeto (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). Até mesmo quando um projeto possui grande complexidade ou dificuldade de se adquirir informações históricas úteis, o método de simulação apresentado pode ser aplicado. Para isso, o modelo se restringe à utilização de informações provenientes do projeto em estudo (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). 4.2.2.4. Conclusão Tang; Mukherjee; Onder (2013) alegam que, apesar de os resultados serem específicos e restritos ao projeto apresentado, o método consegue gerar, testar e melhorar estratégias alternativas para a tomada de decisão em situações inesperadas e indesejadas. Assim, ressaltam que existem limitações como na base de conhecimento restrita apenas ao projeto estudado, falta de critérios para a seleção de estratégias satisfatórias, e a geração pouco padronizada de estratégias feita pela plataforma (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). 45 A plataforma desenvolvida por Tang; Mukherjee; Onder (2013) consegue associar como o projeto e um determinado problema refletem no fim de um plano de construção. Tal estudo poderia ser expandido para outros tipos de projetos mais amplos ou de diferentes ramos, que lidam com uma maior complexidade de atividades (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). Dessa forma, o método auxilia no gerenciamento de contingenciamento do orçamento de projetos, pois ele busca melhorar as estratégias de forma contínua conforme o andamento da execução, permitindo a melhores escolhas quando da alocação de recursos (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). 46 5. Síntese Geral - Análise Crítica 5.1. Método de Análise Após a leitura e subsequente elaboração de síntese para todos os artigos selecionados, acreditamos ter alcançado o objetivo da realização de nossa pesquisa. Conseguimos, por meio da seleção de artigos complementares, estruturar um roteiro que incluiu fundamentação teórica, discussão e análise do ponto crítico, e apresentação de possíveis melhorias. Para isso, além de uma pesquisa consciente, chamamos atenção especial para o debate que tivemos sobre a ordem pela qual deveríamos ler os artigos. Acreditávamos que a sequência da leitura deveria ser determinada de maneira a não comprometer nossa isenção de opinião em torno da problemática. Com base nos resumos observados na etapa de seleção, definimos que o início da leitura se daria pelo artigo Os Sistemas de Planejamento, Execução e Controle da Gestão Pública - Uma Nova Proposta (PELLINI, 2003). Apesar do título, o texto aborda, predominantemente, a orçamentação pública como um todo, transmitindo uma boa ideia acerca do processo. Em seguida, foi observado o documento referente ao texto Presença Potencial do Contingenciamento da União nos Artifícios Adotados pelos Gestores das UGs (PARISI et al., 2011), que apresenta os artifícios utilizados pelas unidades gestoras para garantir o cumprimento das metas fiscais. A partir de então, com uma base teórica um pouco mais estruturada, a leitura seguiu na direção dos artigos mais críticos. Demos continuidade com Discricionariedade, Contingenciamento e Controle Orçamentário (PINTO, 2006), À Espera da Reforma Orçamentária: Um Mecanismo Temporário para Redução de Gastos Públicos (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004), Quantitative Method for Updating Cost Contingency throught Project Execution (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012), e Using an interactive schedule simulation platform to assess and improve contingency management strategies (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013), nessa ordem. 5.2. Caracterização das Circunstâncias Orçamentárias Brasileiras A descrição do orçamento público por parte dos artigos tem uma abordagem bastante semelhante. Em geral, todos apresentam características do processo orçamentário brasileiro e, em seguida, analisam as etapas de elaboração, aprovação, execução e controle, sendo, as duas de competência do Poder Executivo, as mais exploradas. As críticas, quando não 47 remetem diretamente as etapas mais abordadas, referem-se ao tipo de orçamento adotado, mais especificamente ao modo como é pensada a destinação dos recursos públicos e a escolha pelos modelos misto e autorizativo. O primeiro título analisado, Os Sistemas de Planejamento, Execução e Controle da Gestão Pública: Uma Nova Proposta (PELLINI, 2003), após uma breve apresentação da dinâmica orçamentária, faz uma crítica ao método por meio do qual o recurso público recebe sua destinação. O artigo tem seu conteúdo voltado para a etapa de elaboração dos instrumentos de planejamento e orçamento, em especial da LOA e, com isso, aponta a ineficiência dos instrumentos da gestão pública como um ponto crítico para o país. O artigo Discricionariedade, Contingenciamento e Controle Orçamentário (PINTO, 2006), de maneira semelhante, também critica a etapa de elaboração. O ponto levantado, no entanto, refere-se à inconsciência com a qual a etapa de cálculo das receitas e despesas é realizada. De acordo com a autora, deveria haver um acompanhamento prévio do Legislativo de modo a evitar surpresas que prejudiquem a programação prevista na etapa de aprovação. Em Presença Potencial do Contingenciamento da União nos Artifícios Adotados pelos Gestores (PARISI et al., 2011), os autores chamam a atenção para a irregularidade e insegurança do fluxo de caixa, que são inerentes ao modelo autorizativo de orçamento. Suas teses se baseiam na ideia de que a imposição da lei orçamentária traria uma série de mudanças positivas para as unidades gestoras. Ainda de acordo com os autores, as UG’s passariam a ter garantia de recebimento dos recursos e, com isso, deixariam de sofrer com o constante esforço de replanejamento em função de cortes e limites impostos ao longo do exercício, o que, de fato, é um ponto bastante crítico do modelo orçamentário brasileiro. Por fim, À Espera da Reforma Orçamentária: Um Mecanismo Temporário para Redução de Gastos Públicos (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004) faz uma pesada crítica ao modo incremental pelo qual o orçamento é feito. Os autores apontam que a opção pelo orçamento incremental traz diversos problemas para o governo, dentre os quais se destaca o gasto excessivo de recursos. São ainda levadas em conta, outras características do orçamento que contribuem para isso. A preocupação em executar a receita liberada recebe atenção especial e também é apontada como uma das razões para o descontrole nos gastos. 48 5.3. Caracterização do Contingenciamento Em linhas gerais, todos os artigos iniciam procurando definir o que é contingenciamento e explicar brevemente o porquê de sua existência, passando por tópicos como, por exemplo, a lógica fiscal brasileira e a constante ineficiência na previsão de receitas. Mesmo os internacionais, aqueles que, apesar de estarem fora do contexto de orçamentação pública, trabalham com ideias completamente aplicáveis ao foco do trabalho, têm início semelhante e um ponto de vista análogo. Essas definições, embora não sejam idênticas, caminham para um mesmo sentido. Todos os artigos trabalham com a ideia de que o contingenciamento é uma medida de corte ou retenção de gastos que visa ao atingimento de metas fiscais, o que nos parece uma definição bastante razoável. No entanto, alguns vão mais longe. Pellini (2003) e Parisi; Galhardo; Pereira; Silva (2011) buscaram frisar o impacto que teve a criação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que reforçou a necessidade de medidas para cumprir as metas fiscais, o que inclui o contingenciamento. Protásio; Bugarin; Bugarin, (2004), muito preocupados em criticar o processo orçamentário brasileiro, em especial a etapa de execução, vão em 1980 para reiterar o contexto da crise fiscal e apontá-la como uma das principais razões para a existência de artifícios como o contingenciamento hoje. É atribuída ainda uma parcela de responsabilidade à Constituição Federal de 1988, que estabeleceu um aumento da transferência de impostos para Estados e Municípios sem que houvesse redistribuição proporcional das despesas. 5.3.1 Reflexos do Contingenciamento Após uma introdução marcada por uma discussão sobre o contingenciamento, os artigos continuam convergindo quanto a abordagem e partem para uma reflexão sobre as consequências desse mecanismo de controle de gastos. Neste ponto, eles se complementam de maneira bastante interessante, na medida em que cada um deles chama atenção para um aspecto diferente sem descartar os demais. O título Presença Potencial do Contingenciamento da União nos Artifícios Adotados pelos Gestores das UGs (PARISI et al., 2011), por exemplo, ressalta o prejuízo a programação financeira das unidades gestoras decorrente do estabelecimento dos limites de empenho e de pagamentos praticados. O artigo destaca também a influência que as metas fiscais têm sobre a administração dos Restos a Pagar que, 49 segundo os autores, passou a servir como habilitador para o atingimento das metas estabelecidas (PARISI et al., 2011). Nesse sentido, eles ressaltam o método utilizado pelo Banco Central (BC) para apurar o resultado fiscal, que considera apenas as despesas que foram efetivamente pagas até o final do exercício, deixando de fora tanto as despesas processadas quanto as não processadas, que foram inscritas em restos a pagar. Para eles, este método do BC acabou criando uma política para a administração de Restos a Pagar que, variando em função dos limites de empenho e de pagamentos estabelecidos no Decreto de Contingenciamento, pode ser de Redução, Manutenção, ou Expansão. Seja ela qual for, acaba representando uma lógica que não deveria existir, uma vez que a inscrição em Restos a Pagar não deveria ter como objetivo mascarar a ineficiência fiscal (PARISI et al., 2011). O segundo importante ponto levantado pelo artigo abordado no parágrafo anterior é quanto à distorção do objetivo da criação do contingenciamento. O que deveria ser um mecanismo temporário para auxiliar no atingimento das metas fiscais acabou se tornando uma prática corriqueira que, em muitas das vezes que ocorre, não devolve os recursos contingenciados na medida em que a arrecadação da receita vai atingindo as expectativas criadas durante elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA) (PARISI et al., 2011). Esta devolução deveria ser feita uma vez que esta regra consta na LRF, conforme esclarece outro artigo que também toca nesse ponto, cujo título é Discricionariedade, Contingenciamento e Controle Orçamentário (PINTO, 2006). O terceiro e último tópico que chama atenção no artigo em questão é quanto ao gasto excessivo que se tem no final dos exercícios financeiros, especialmente no último mês. Esse gasto é oriundo da demora que ocorre até que a liberação dos recursos seja feita. Tal atraso, por sua vez, acarreta uma ineficiência econômica que se reflete numa baixa qualidade dos gastos públicos por parte dos gestores. Pressionados em função do pouco tempo para executar o recurso liberado, eles acabam gastando, sem o comprometimento esperado, com o intuito de manter um patamar orçamentário razoável, uma vez que, apesar de o limite orçamentário inicial para elaboração da proposta orçamentária levar em conta apenas a LOA anterior, o processo de negociação orçamentária sempre se baseia na execução do exercício prévio (PARISI et al., 2011). Como pode ser observado em seu resumo, o artigo apresenta um gráfico interessante que mostra uma grande concentração da liberação de recurso no último mês do calendário civil. 50 Retornando ao título Discricionariedade, Contingenciamento e Controle Orçamentário (PINTO, 2006), ressaltamos outras observações relevantes feitas pelo artigo. Além da polêmica não devolução de recursos contingenciados, o texto aponta a grande responsabilidade que foi depositada nos gestores públicos que controlam as metas de superávit primário após a LRF entrar em vigor, como uma das responsáveis pelo excesso de medidas de contingenciamento. É abordado ainda, um trabalho feito pela Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO), chamado “Levantamento de Problemas e Sugestões para a Melhoria do Processo Orçamentário”, cujo objetivo já está explícito no título. De acordo com a autora, a CMO apresentou a visão de que o contingenciamento faz com que o funcionamento ideal da orçamentação se distancie da autorização legal expressa na LOA. Dessa maneira, a Comissão sugeriu que fosse conferida maior capacidade de análise ao Poder Legislativo no sentido das realocações de receitas em discordância com a previsão feita na LOA (PINTO, 2006). Por fim, o artigo ainda destaca a prática de subestimação das receitas durante a elaboração da proposta da LOA. Ela ocorre para permitir a alocação de receitas na formação de um superávit primário maior do que o previsto na LDO já que o excesso de arrecadação fica mais fácil de ser atingindo partindo de uma estimativa de receitas que será, muito provavelmente, abaixo da real. O Executivo alega que tal elaboração subestimada de receitas representa uma margem de segurança fiscal. A autora faz questão de ressaltar que essa argumentação é arbitrária e inconstitucional (PINTO, 2006). Nesse momento, o artigo trouxe à tona uma importante discussão que tem sido travada na Câmara dos Deputados. Muito se tem discutido sobre o Orçamento Impositivo justamente para que efeitos como os apresentados neste artigo sejam evitados. A ideia básica é a de que, não sendo mais autorizativo, as dotações expressas na LOA deixariam de representar autorizações de gastos e passariam a ser vistas como obrigações. O título À Espera da Reforma Orçamentária: Um Mecanismo Temporário para Redução de Gastos Públicos (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004) contribuiu de maneira significativa ao abordar um assunto que não foi tratado pelos outros artigos. Os autores alertam para diversos reflexos prejudiciais ao processo orçamentário dentre os quais se destaca inversão de prioridades. Essa troca corresponde a uma solução dada pelos gestores para pressionar a liberação de recursos para ações que, apesar de importantes, não são prioritárias para o governo e, portanto, acabariam sofrendo com cortes de recursos ao longo da execução frente a uma situação de contingenciamento (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). 51 5.4. Soluções Propostas Outra contribuição do artigo citado no parágrafo anterior corresponde à proposição de um mecanismo para frear os gastos desnecessários dos órgãos. Como foi esclarecido ao longo deste tópico, existe uma forte tendência de execução de recursos nos últimos meses do exercício financeiro para que o orçamento seguinte, que é baseado nos anteriores, não sofra com um baixo limite de dotação. Desse modo, os autores propõem um artifício para induzir uma redução voluntária de gastos por parte dos órgãos (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). O modelo, do tipo Principal-Agente, é caracterizado pela presença dos órgãos (Agente) e do Principal (órgãos responsáveis pelo acompanhamento do superávit primário), e evidencia o confronto de interesse entre as partes. Enquanto o Agente decide como gastar os recursos, o Principal busca a manutenção do ajuste fiscal. Dessa maneira, segundo os autores, deveriam existir incentivos para que o Agente poupasse recursos, uma vez que a dinâmica orçamentária de hoje o estimula a executar tudo que foi liberado (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Assim, sugere-se que sejam feitas alterações na legislação e nas normas aplicadas a elaboração e execução do orçamento, de maneira a se criar um mecanismo que induza os órgãos a não gastarem apenas visando à manutenção de um patamar de execução favorável aos orçamentos seguintes. De maneira sintética, a ideia seria dar aos órgãos a possibilidade de receber no exercício seguinte uma proporção do valor do orçamento que foi economizado no exercício atual (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). De acordo com os autores, considerando-se a redução de recursos disponíveis no início do ano provocada pelo contingenciamento e a opção da proporção por ter poupado no exercício anterior, os órgãos poderão decidir gastar ou não todo o orçamento disponível e, consequentemente, ter uma distribuição mais equilibrada de gastos ao longo do ano. Os autores citam ainda que governo acabaria também tendo vantagens, pois poderia utilizar parte da quantia não gasta pelos órgãos naquele exercício para o abatimento de dívida pública, por exemplo (PROTÁSIO; BUGARIN; BUGARIN, 2004). Para demonstrar as vantagens apresentadas, o texto aponta uma simulação realizada que gerou um ganho adicional de 50% do total poupado com o contingenciamento, em 2001, para o governo. O artigo Quantitative Method for Updating Cost Contingency throught Project Execution (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012) apresenta um método quantitativo Value at Risk (VaR) aplicado a um estudo de caso relacionado ao projeto de construção de um túnel com o fim de prever o 52 contingenciamento de custos de tal projeto. Quanto às possíveis aplicações do modelo, é afirmado que é possível utilizá-lo nos diferentes níveis de planejamento de projetos, podendo ser expandido para tarefas em diversos níveis de organizações. Por fim, sugerem possíveis melhorias ao modelo, como a inclusão de um controle de software ERP, facilitando o processo de coleta de dados. Além disso, modelos de simulação podem ser adaptados para incluir a previsão de duração de projetos, também podendo ser utilizados para auxiliar no cálculo do contingenciamento (XIE; ABOURIZK; ZOU, 2012). Por último, apresentamos uma breve análise do Using an interactive schedule simulation platform to assess and improve contingency management strategies (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). A principal contribuição do artigo para o trabalho consiste na apresentação de um modelo de simulação que pode ser utilizado para auxiliar a tomada de decisão quanto a alocação de recursos em situações que envolvam o contingenciamento. De acordo com os autores, o modelo, que busca apresentar situações inesperadas sob a pressão de realizar escolhas, pode ser aplicado para as mais diversas finalidades. Ajustado conforme as situações a serem analisadas, circunstâncias aleatórias são geradas, de maneira que as consequências das decisões correspondam aos novos cenários criados. O processo de simulação só finaliza quando o projeto simulado tenha sua execução completa. Assim, o método auxilia no gerenciamento de contingenciamento do orçamento, na medida em que melhora a capacidade de tomada de decisão de forma contínua, conforme o andamento da execução, permitindo a melhores escolhas quando da alocação de recursos (TANG; MUKHERJEE; ONDER, 2013). 5.5. Circunstâncias a Serem Verificadas em Campo Com base na análise apresentada, decidimos verificar, em campo, as diversas situações que se mostraram interessantes para nós. Definimos que tentaríamos avaliar tanto as questões que chamamos de “Circunstâncias Orçamentárias”, o que inclui os reflexos do contingenciamento, como também as propostas de melhoria para as circunstâncias criadas. Para isso, contamos com a colaboração de uma fundação pública voltada à realização de pesquisas, que foi bastante solicita e colaborou de maneira fundamental para o desenvolvimento desta etapa do trabalho. 53 A seguir, apresentamos os pontos que serão verificados na fundação no próximo capítulo: 1. Prejuízo à programação financeira das unidades gestoras decorrente do estabelecimento dos limites de empenho e de pagamentos praticados; 2. Influência que as metas fiscais têm sobre a administração dos Restos a Pagar; 3. Em muitas ocasiões, os recursos contingenciados não são devolvidos na medida em que a arrecadação da receita vai atingindo as expectativas criadas durante elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA); 4. Ineficiência econômica oriunda dos gastos excessivos que se têm no final dos exercícios financeiros, especialmente no último mês, devido à demora na liberação de recursos; 5. Preocupação excessiva em executar os recursos liberados; 6. A grande responsabilidade que foi depositada nos gestores públicos que controlam as metas de superávit primário após a LRF entrar em vigor é uma das responsáveis pelo excesso de medidas de contingenciamento; 7. O contingenciamento faz com que o funcionamento ideal da orçamentação se distancie da autorização legal expressa na LOA; 8. Orçamento Autorizativo x Orçamento Impositivo - Ponto de vista de um gestor público; 9. Inversões de prioridades no orçamento; 10. Artifício para induzir uma redução voluntária de gastos por parte dos gestores: dar aos órgãos a possibilidade de receber no exercício seguinte uma proporção do valor do orçamento que foi economizado no exercício atual; 11. Sistemas de apoio ao orçamento; 12. Existência ou necessidade de modelos de simulação que emulem situações de contingenciamento para dar ao gestor, a possibilidade de vivenciar este contexto e poder analisar as consequências de suas decisões quanto a alocação de recursos. 54 6. Verificação em Campo: Fundação Pública Voltada à Realização de Pesquisas A fundação pública em questão tem quase um século de existência, e sua sede está localizada no Rio de Janeiro. Composta por centenas de agências, espalhadas por todo país, a fundação tem amplas atribuições. Isso engloba, por exemplo, a realização de pesquisas e a organização de suas informações, para servir de insumo ao trabalho de órgãos das esferas governamentais federal, estadual e municipal, e para outras instituições e o público em geral. Contato: Gerente de Planejamento da fundação 6.1. Circunstâncias Verificadas em Campo 1. Prejuízo à programação financeira das unidades gestoras decorrente do estabelecimento dos limites de empenho e de pagamentos praticados; Você faz um planejamento e depois precisa se replanejar para se adequar às mudanças impostas, o que gera um grande retrabalho. Em situações extremas, pode acontecer a descontinuidade de uma atividade ocasionando prejuízo à programação e, consequentemente, aos recursos que já foram investidos. Esse seria um caso mais grave. Outro problema é o acúmulo de atividades no final do exercício, quando ocorre a liberação da maior parcela de recursos. No caso específico da fundação, existem pesquisas mensais, trimestrais, semestrais e anuais. Essa periodicidade característica das pesquisas da fundação cria a necessidade de um fluxo contínuo de recursos para que a pesquisa não sofra nenhuma descontinuidade em sua série histórica. Dessa maneira, em situações que envolvam a falta de recurso, os gestores são obrigados a priorizar algumas atividades em detrimento de outras que podem ser postergadas para que não se perca a continuidade do trabalho. Um exemplo a ser mencionado é a pesquisa demográfica que, em função de um acordo com vários países que visa à comparabilidade dos resultados, deve ser realizado em anos de final zero. Dessa maneira, a proximidade com esses anos faz com que ações englobadas por esse trabalho se tornem prioridades para o instituto. 2. Influência que as metas fiscais têm sobre a administração dos Restos a Pagar; 55 Como essa política é trabalhada dentro do ministério que é responsável pela liberação de recursos, essa influência apenas repercute dentro dos órgãos. O recurso simplesmente demora a ser liberado e não existe tempo hábil para que a despesa passe por todos os seus estágios culminando no seu pagamento. Para a fundação, não existe qualquer interesse que o induza a inscrever despesas em restos a pagar. Foi ressaltado ainda o grande prejuízo que essa prática cria para os cofres públicos, uma vez que, apesar dos bons resultados financeiros oriundos dessa e de outras práticas, os preços são inflacionados devido à demora até que as despesas sejam pagas. Um outro ponto também levantado foi que o excesso de inscrição em restos a pagar acaba comprometendo a execução financeira do orçamento do ano seguinte. 3. Em muitas ocasiões, os recursos contingenciados não são devolvidos na medida em que a arrecadação da receita vai atingindo as expectativas criadas durante a elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA); Afirmando que isso não é comum à fundação, ressaltou-se que isso varia conforme a política de governo. Foi citado, por exemplo, o momento em que o governo estava canalizando seus recursos para o Programa de Aceleração do Crescimento. Nessa época, os órgãos sofreram bastante com restrições orçamentárias e, em muitas ocasiões, não obtiveram a liberação dos recursos contingenciados. 4. Ineficiência econômica oriunda dos gastos excessivos que se têm no final dos exercícios financeiros, especialmente no último mês, devido à demora na liberação de recursos; Para o gestor, ter o dinheiro e não conseguir executá-lo soa como sinônimo de trabalho não realizado. Outra preocupação é quanto à necessidade de execução para garantir um patamar orçamentário razoável para o ano seguinte. Desse modo, a ânsia por executar o trabalho em um curto espaço de tempo acaba induzindo o gestor a agilizar os processos de execução de recursos. Em muitos casos, não existe tempo hábil para que possibilidades sejam analisadas até que uma opção seja feita. 56 5. Preocupação excessiva em executar o recurso liberado; Como abordado na resposta anterior, existe, de fato, uma grande preocupação com relação à execução do recurso liberado. Isso se justifica na medida em que a não execução da dotação em sua totalidade pode comprometer o limite orçamentário inicial para a elaboração da Lei Orçamentária Anual seguinte. Nesse sentido, a gerente nos deu um exemplo bastante esclarecedor dessa situação. Segundo a gestora, é comum que outros órgãos solicitem à fundação a realização de pesquisas. Apesar de não se opor, a fundação solicita o repasse de recursos, uma vez que essas situações não são previstas em seu orçamento. Ilustrando esse contexto, portanto, foi citado um pedido de pesquisa do Ministério da Saúde para o qual houve um repasse de recursos oriundo do próprio ministério. Mesmo em posse da verba, a orientação dos gestores era para que primeiro se utilizasse o recurso liberado por meio do orçamento convencional, fruto de dotação expressa na LOA. O fundamento era de que o dinheiro liberado pelo governo deveria ser esgotado para que não houvesse o comprometimento do orçamento seguinte. Assim, o recurso proveniente do Ministério da Saúde não foi utilizado em sua totalidade, o que permitiu, inclusive, a devolução de grande parte da quantia repassada. 6. A grande responsabilidade que foi depositada nos gestores públicos que controlam as metas de superávit primário após a LRF entrar em vigor é uma das responsáveis pelo excesso de medidas de contingenciamento; A gerente afirmou não ter consciência sobre isso. Em tese, ela acredita que isso realmente deve ter acontecido, no entanto, com base em sua memória, não se sente capaz de afirmar que medidas de contingenciamento aumentaram após a LRF entrar em vigor. 7. O contingenciamento faz com que o funcionamento ideal da orçamentação se distancie da autorização legal expressa na LOA; De um modo geral, sim. Devido à presença do contingenciamento, os gestores podem acabar sofrendo com a falta de recursos e, portanto, postergando suas atividades. Esse atraso gerado cria uma série de problemas que, por vezes, torna o planejamento feito anteriormente 57 algo inviável de ser realizado. Assim, em alguns casos, não se consegue executar tudo aquilo que estava autorizado na LOA. 8. Orçamento Autorizativo x Orçamento Impositivo - Ponto de vista de um gestor público; Como gestora, possuo uma forte tendência a dizer que o Orçamento Impositivo seria muito melhor. Ele evitaria uma série de problemas que enfrentamos hoje na fundação. O retrabalho devido às constantes necessidades de replanejamento consome muito tempo e, consequentemente, recurso. No entanto, acredito que minha opinião represente apenas um ponto de vista. Existe outro que deve ser tão considerado quanto o meu, que corresponde aos daqueles que estão preocupados com as metas fiscais. Os processos de previsão não são 100% confiáveis. Dessa maneira, não é possível afirmar que as receitas previstas serão arrecadadas naquele intervalo de tempo esperado, por melhor que seja o processo. Não posso ser ingênua a ponto de dizer que não me importo com o endividamento do país, desde que minha dotação seja liberada. Enfim, a obrigação com o orçamento, apesar de facilitar a vida dos gestores dos órgãos, poderia se tornar uma verdadeira bola de neve e causar um enorme transtorno financeiro com o passar dos anos. 9. Inversões de prioridades no orçamento; Dos até agora citados, este é um dos artifícios mais presentes na nossa rotina. A inversão de prioridades já faz parte do nosso cotidiano. Todos os processos de negociação orçamentária envolvem a inversão de prioridades. Sem esse mecanismo, certamente, sofreríamos muito mais com a falta de recursos. Nesse ponto, faz-se necessário um entendimento sobre atividades meio e atividades finalísticas. É muito mais difícil conseguir a liberação de recursos para atividades meio. Infraestrutura e Informática, por exemplo, sofrem bastante com isso, apesar de serem fundamentais para a execução das atividades do órgão que, por ser representado por centenas de agências, é descentralizado. A ideia consiste basicamente em mostrar para o ministério que as atividades, por ele consideradas como menos prioritárias, são importantes, deixando de fora, devido à falta de recursos, atividades que o governo reconheça como fundamentais. Um dos índices que mede a 58 inflação, por exemplo, é essencial. Quem não liberaria mais recurso caso fosse informado que essa pesquisa não seria realizada por falta de verba? Isso não corresponderia aos interesses do governo. Portanto, posso afirmar que é uma tática bastante eficiente que sempre nos traz bons resultados. 10. Artifício para induzir uma redução voluntária de gastos por parte dos gestores: dar aos órgãos a possibilidade de receber no exercício seguinte uma proporção do valor do orçamento que foi economizado no exercício atual; De acordo com a gestora, existe um projeto de governo que é muito similar a esse artifício. Já foi apresentado um programa de redução de gastos que inclui o estabelecimento de metas que visem ao aumento da qualidade da gestão. A ideia era de que as reduções alcançadas seriam revertidas para a própria instituição em itens de despesas que, normalmente, possuem dificuldades para conseguir dotação (como investimento, por exemplo). 11. Sistemas de apoio ao orçamento; Questionada sobre a existência de sistemas que apoiam o orçamento, a gestora comentou, basicamente, sobre três: o sistema de apoio à gestão, que já está em funcionamento há muitos anos, o que visa a flexibilidade da rede e o que auxilia na gestão dos créditos orçamentários que, na verdade, representam um projeto ainda em fase de implementação. Como muito em breve os dois últimos estarão funcionando, nos limitaremos a explicar a forma como a qual o processo ocorrerá de agora em diante. A ideia básica é de que a elaboração do orçamento da fundação se dá com total apoio do sistema de apoio à gestão. Depois de elaborada, a proposta nele montada, é migrada para o SIDOR, um sistema do Governo Federal que unifica todos os orçamentos individuais que são elaborados. Com base nessa unificação e nos limites estipulados pelo Ministério do Planejamento, os recursos são repassados à Diretoria Executiva da fundação, que faz o repasse para as demais diretorias da Instituição que, por sua vez, ainda transmitem esses recursos para as unidades estaduais e agências espalhadas pelo país. Uma das dificuldades que sempre foi enfrentada pela instituição consiste em mensurar quanto deve ser repassado para cada diretoria em situações que envolvam a liberação de um 59 valor menor do que o esperado. O contingenciamento sempre causou um enorme transtorno nesse sentido, pois é difícil compreender num órgão tão grande e descentralizado, o que deve ser visto como prioridade e o que pode ser postergado em um determinado momento. Pensando em contextos como os supracitados, surgiu a ideia do sistema de gestão dos créditos orçamentários (1) e do sistema que visa flexibilidade para a rede (2). O primeiro consiste em apresentar de forma pormenorizada o orçamento de cada uma das diretorias. Desse modo, a tomada de decisão da Diretoria Executiva quanto à alocação de recurso frente a situações de contingenciamento pode se basear nos cronogramas de ações que ali são expostos. O segundo, por sua vez, apesar de funcionar em conjunto com o primeiro, engloba outro conjunto de atividades. Suponha, por exemplo, que uma pesquisa a ser realizada pela Diretoria de Pesquisa necessite de uma coleta de dados no Maranhão. Nessa situação, a agência local seria acionada para realizar tal tarefa. No entanto, esta agência não sabia, até então, que realizaria essa pesquisa e, portanto, não incluiu a necessidade de recursos para isso em sua proposta orçamentária. Assim, caberá aos responsáveis por essa agência, incluir a necessidade de recursos para efetuar a tarefa solicitada em (1), um sistema que alimenta o (2) com informações adicionais, dando flexibilidade ao sistema como um todo. De modo mais formal, com base em documentos fornecidos pela gestora entrevistada, podemos resumir estes novos sistemas da seguinte maneira: Sistema de Gestão dos Créditos Orçamentários: Objetivo: Gestão dos créditos orçamentários para as diretorias e centros, de acordo com o planejamento mensal dos valores previsto em LOA e adequação aos Limites estabelecidos pelo referido ministério. Resultados Esperados: Direção - gestão dos créditos visando prever situações, encontrar alternativas de adequação aos limites estabelecidos; Gerencia de Planejamento de cada Diretoria – acompanhamento do atendimento dos valores previsto em LOA e respectivas adequações. 60 Sistema de Flexibilidade para a Rede: Objetivo: Gestão dos créditos orçamentários para as Unidades Estaduais visando à execução do Cronograma Anual de Coleta das Pesquisas. Resultados Esperados: Gerência Orçamentária - gestão dos créditos dos planos internos visando a execução das despesas nas UEs e SEDE; Gestor da Unidade (UEs e Sede) – visão de gestão da unidade permitindo o planejamento contínuo. Por fim, voltando à discussão inicial deste capítulo, vamos apresentar um pouco mais do sistema de apoio à gestão, o sistema que serve de base para a elaboração da proposta orçamentária da fundação. Sistema de Apoio à Gestão: Formado por vários módulos, o sistema permite uma série de ações dentre as quais apresentaremos as principais. Planejamento Orçamentário: Apresenta as orientações para elaboração do orçamento, além das Lei Orçamentárias anuais de anos anteriores para serem usadas como referência. Para elaborar a proposta orçamentária, o gestor pode acessar pelo "Menu Principal", a opção "Proposta Orçamentária". Nessa tela será possível observar os valores de referência (que tem por base a LOA do ano atual) para cada unidade, as despesas que já foram orçadas para o ano seguinte, e o saldo. Expandindo a área de uma das diretorias, por exemplo, podemos observar um detalhamento das Ações do governo, mostrando os planos orçamentários, que também podem ser explorados. Ao expandir um plano orçamentário, pode-se acessar uma tela na qual é possível editar o objetivo do projeto, verificar qual é seu produto, unidade de medida e meta prevista para o exercício. 61 Detalhamento do Plano Orçamentário: Inserindo uma nova despesa: Para inserir a necessidade de uma passagem Rio de JaneiroBrasília em um plano orçamentário, por exemplo, deve-se agir da seguinte maneira: Na tela adequada para tal inserção, deve-se especificar o Projeto/Atividade, Tipo de Gasto, Fonte de Recursos, Elemento de Despesa, Subitem do Elemento de Despesa, uma Descrição do Gasto (o objetivo da viagem, nesse caso) e o mês. Para cada um dos meses do calendário, existe uma tabela de apoio, fornecendo todos os itinerários possíveis a partir do Rio de Janeiro para as 27 unidades da Federação (pois o tipo de passagem escolhido é nacional). Como o exemplo apresentado é uma passagem Rio - Brasília, deve-se escolher esta opção e indicar o número de passagens desejadas. O resultado deste processo gera um valor estimado que é acrescentado ao orçamento. Por meio do Detalhamento do Plano Orçamentário, também é possível gerar um relatório conhecido como QDD, Quadro de Detalhamento de Despesa. Nesse quadro, é possível observar os gastos por elemento de despesa e a fonte de recursos por cada um dos planos orçamentários. Tal quadro é adequado ao limite do Ministério do Planejamento e, posteriormente, migrado para o Sistema Integrado de Orçamento e Planejamento, SIOP, da Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, SOFMP, onde esse orçamento irá compor o Projeto de Lei Orçamentária Anual, PLOA, a ser enviado ao Congresso Nacional para aprovação. Identificação de Pontos Críticos/Sugestão de Melhoria: Apresentado o modo como é elaborada a Proposta Orçamentária da fundação, foi questionado sobre como o acompanhamento da execução do orçamento é feito. A princípio, esperávamos que também houvesse um sistema para isso, mas, para nossa surpresa, fomos informados que não existe. Por se tratar de um Instituto de abrangência nacional, uma vez que a fundação se faz presente em todos os estados do Brasil, existe uma enorme dificuldade para se fazer o acompanhamento da execução físico financeira de suas ações. Desse modo, seria interessante que houvesse um sistema que permitisse que esse acompanhamento fosse realizado de forma automatizada. Existiria ainda a possibilidade de esse sistema estar vinculado aos sistemas que estão em fase de implantação, de maneira a 62 flexibilizar ainda mais a etapa de execução orçamentária. Em outras palavras, esse sistema deveria ser capaz de enxergar cada gasto executado e associá-lo à sua ação de origem. Com isso, seria possível, além de realizar o acompanhamento em tempo real, exercer um controle muito maior sobre as atividades que estão sendo desenvolvidas, já que existe uma meta a ser atingida para cada fatia do orçamento que é executada. 12. Existência ou necessidade de modelos de simulação que emulem situações de contingenciamento para dar ao gestor a possibilidade de vivenciar esse contexto e poder analisar as consequências de suas decisões quanto à alocação de recursos. Ao citarmos a proposta sugerida por um dos artigos, de utilização de modelos de simulação para situações que envolvam o contingenciamento, a gestora afirmou que seria de grande proveito. Segundo a mesma, hoje, não existe nada parecido com isso na fundação. No entanto, informalmente, existem critérios a serem seguidos que foram definidos com base no histórico de situações enfrentadas pelo instituto. Trata-se de uma experiência que é passada de gestor para gestor. Despesas essenciais como pagamento de água, luz e condomínio, por exemplo, são sugeridas como prioritárias. 6.2. Análise Crítica de um Ciclo Orçamentário - 2013 Ao longo do processo de elaboração do presente trabalho, principalmente da parte que contempla a verificação em campo, entendemos que seria interessante realizar a análise de um ciclo orçamentário. Estimulados pela gerente da fundação, que tanto nos apoiou ao longo desta jornada, decidimos analisar o ciclo referente ao ano de 2013, último ano para o qual existem dados suficientes para a análise. É importante que seja frisado, no entanto, que a análise é focada nas etapas de elaboração e execução, havendo poucos comentários a serem feitos a respeito da fase de aprovação e nenhuma intenção de observar o estágio de controle. Aproveitamos para ressaltar ainda que a etapa de Elaboração receberá uma atenção maior em função da riqueza de dados disponíveis. Por sua vez, a Execução terá uma abordagem mais superficial, já que além de difíceis de serem extraídos e explorados, os dados são por vezes complexos para aqueles que não são especialistas ou possuem experiência profissional no assunto. 63 6.2.1. Etapa de Elaboração Tendo partida com a etapa de elaboração, o ciclo orçamentário já inicia trazendo problemas para as UGs. Com solicitações complexas e prazos extremamente curtos, elas precisam de uma boa gestão de tempo para atender a todas exigências do ministério ao qual são submetidas. Para ilustrar esse processo, denominado Negociação Orçamentária, que engloba toda a negociação feita entre unidade gestora e ministério até a elaboração do projeto de lei orçamentária, o PLOA, preparamos um esquema que mostra seus principais marcos para o ano de 2013. 64 65 Figura 11 - Resumo do processo de negociação orçamentária 2013. Fonte: os autores Com base na figura exposta, podemos observar que o marco inicial do processo já se mostra problemático. Uma solicitação como essa deveria ser feita com meses de antecedência, e não com sete dias úteis. Porém, tendo ciência da maneira pela qual o processo sempre é realizado, a fundação busca estar continuamente à frente do pedido. Assim, como em todos os anos, no princípio de abril teve início um enorme trabalho de levantamento de dados para identificar as demandas por recurso das suas centenas de agências. Após a realização de um grande esforço para enviar uma pré-proposta, orçada em R$248.034.178,00, a fundação recebeu um limite de R$122.000.000,00. Além de estar bem abaixo do desejado para o ano seguinte, esse valor ficou muito aquém da LOA anterior e comprometeria a atividade da fundação. Dessa maneira, visando pressionar o Ministério do Planejamento para conseguir uma ampliação do limite proposto, a fundação elaborou uma planilha na qual foi aplicada a ideia da priorização invertida. A ‘Mr. M’, como é conhecida internamente, serve apenas para embasar as justificativas para ampliação de recurso. Assim, nesse arquivo, as atividades de infraestrutura e gestão foram colocadas como prioridade absoluta. Já aquelas que são de interesse do governo, em geral pesquisas que suportam a tomada de decisões quanto a importantes ações governamentais, ficaram de fora do planejado em função da pouca disponibilidade de recursos. 66 A partir da manutenção de uma boa relação com o ministério, também foi realizado, em paralelo, um pedido pelo aumento de limite. Essa negociação, não oficial, trouxe mais confiança aos gestores da unidade, uma vez que, apesar de não haver garantias até então, foi criada uma expectativa com relação a um novo limite, dessa vez de R$179.000.000,00. Com isso, em 19 de julho de 2012, a fundação encaminhou um ofício solicitando a expansão do limite que, até então era de 122 milhões, e alertou para a dificuldade que seria enfrentada mesmo que o limite fosse estendido para um valor próximo ao da LOA anterior (expectativa que havia sido criada). Ainda no documento, sob influência da priorização invertida, foi apontada cada uma das ações que não seriam executadas e as respectivas justificativas. Visando ilustrar, de maneira simplificada, o quanto cada uma das ações da fundação foram penalizadas em função dos ajustes aos limites impostos, elaboramos alguns gráficos que podem ser observados a seguir. Deve ser frisado, no entanto, que os percentuais expostos em cada ação têm como base o montante que foi orçado na pré-proposta enviada pela fundação, ou seja, a referida parte dos 248 milhões. - Ação 1 Pré- proposta: R$ 60.296.000,00 Figura 12 - Comparação entre o montante desejado para a ação 1 e o contemplado pelo limite imposto Fonte: os autores 67 - Ação 2 Pré- proposta: R$ 11.211.533,00 Figura 13 - Comparação entre o montante desejado para a ação 2 e o contemplado pelo limite imposto Fonte: os autores - Ação 3 Pré- proposta: R$ 32.503.257,00 Figura 14 - Comparação entre o montante desejado para a ação 3 e o contemplado pelo limite imposto Fonte: os autores 68 - Ação 4 Pré- proposta: R$ 7.589.020,00 Figura 15 - Comparação entre o montante desejado para a ação 4 e o contemplado pelo limite imposto Fonte: os autores - Ação 5 Pré- proposta: R$ 1.553.000,00 Figura 16 - Comparação entre o montante desejado para a ação 5 e o contemplado pelo limite imposto Fonte: os autores 69 - Ação: Administração Pré- proposta: R$ 134.861.368,00 Figura 17 - Comparação entre o montante desejado para a ação e o contemplado pelo limite imposto: Administração. Fonte: os autores - Ação: Publicidade de Utilidade Pública Pré- proposta: R$ 20.000,00 Figura 18 - Comparação entre o montante desejado para a ação e o contemplado pelo limite imposto: Publicidade de Utilidade Pública. Fonte: os autores Consciente da grande possibilidade de não receber um limite superior ao montante especulado, o que veio a se concretizar com um PLOA de 180 milhões de reais, a fundação deu início a um trabalho de adequação a realidade imposta. Buscaram, nessa fase, alternativas para a obtenção de mais recursos. Nesse sentido, deve ser destacada a realização de convênios. Trata-se de uma espécie de parceria na qual um outro ministério que tenha interesse numa pesquisa a ser realizada, por exemplo, faz um repasse de verba para a fundação, caracterizando a descentralização de créditos, a fim de garantir a execução do trabalho. Esse 70 esforço de adequação foi fundamental para que a fundação conseguisse cumprir grande parte do que havia sido inicialmente planejado, apesar do baixo limite imposto e das medidas de contingenciamento que ocorreram ao longo do ano. 6.2.2. Etapa de Execução Bastante comum na rotina orçamentária brasileira, o atraso na aprovação da LOA foi, mais uma vez, responsável por um grande prejuízo ao planejamento das UGs no início do ano. Tendo sido aprovada e publicada no Diário oficial apenas nos dias 4 e 5 de abril, respectivamente, a prática dos duodécimos se fez presente em mais um exercício. Assim, durante os três primeiros meses do ano, só receberam recursos as despesas consideradas como correntes obrigatórias e inadiáveis, ou seja, aquelas fundamentais para manter o funcionamento da máquina pública. Nesse sentido, uma pesquisa prevista para ser realizada em janeiro, por exemplo, teria seu planejamento comprometido. Podemos considerar, ainda, a informação dada pela gestora de que, em média, 70% do custo de uma pesquisa a ser implantada é oriundo da etapa de coleta de dados, atividade primordial para o trabalho. A incerteza quanto à disponibilidade do recurso representaria, nesse caso, a chance de investir no planejamento da pesquisa e depois não ter verba para coletar os dados necessários, ou seja, replanejamento. Com isso, podemos concluir que a pesquisa poderia ter sido, inclusive, cancelada, dependendo dos prazos limites para o cumprimento de seus objetivos. Aliado ao atraso na aprovação da LOA, esteve o contingenciamento. Para o ano em questão, o Decreto nº 8.062, de 29 de julho de 2013 foi muito marcante. Nele, dentre outras mudanças impostas, a Presidenta da República reduziu os limites de movimentação e empenho, exceto os relativos a despesas obrigatórias e os de pagamento, de diversos ministérios. Desse modo, o Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão se viu na necessidade de reajustar a alocação de recursos entre as unidades gestoras a ele dependentes, prejudicando, portanto, o planejamento de todas elas, incluindo a fundação na qual a presente verificação foi realizada. 71 Figura 19 - Decreto de redução dos limites de movimentação e empenho. Fonte: Diário Oficial da União 72 Ainda referente à etapa de Execução, algo relevante deve ser frisado. Como citado anteriormente, mostrando comprometimento e responsabilidade com sua função, a fundação buscou parcerias, na forma de convênio, para evitar que atividades planejadas deixassem de ser realizadas. Para exemplificar essa prática, bastante comum em situações que envolvam escassez de recursos, podemos citar um Plano Orçamentário (P.O.) referente a uma pesquisa relacionada à saúde, que havia recebido recursos financeiros apenas simbólicos durante a elaboração, para que se mantivesse em aberto. Além de conhecer a saúde e o estilo de vida da população, essa pesquisa tem por objetivo produzir dados sobre o acesso e uso dos serviços de saúde, ações preventivas, continuidade dos cuidados e financiamento da assistência saúde. Devido à grande importância dessa pesquisa para o Ministério da Saúde, este concordou em repassar parte de sua verba à fundação para viabilizar a realização do trabalho. Uma importante pesquisa quanto à população, que é realizada nos anos de final cinco, no entanto, teve seu planejamento prejudicado. Fundamental para as decisões quanto ao Fundo de Participação dos Municípios, ela é realizada entre os censos que ocorrem a cada dez anos para possibilitar uma atualização dos números de habitantes por município, critério para o repasse de recursos. Com o corte de grande parte do montante previsto para dar início à etapa de planejamento da pesquisa, o cronograma da atividade foi postergado. Considerando que se trata de uma tarefa que deve ser concluída até 2015, sua realização não ficou comprometida devido ao corte. Porém, como em diversas outras situações ao longo do exercício, a indisponibilidade de recursos atrapalhou a atividade, comprometeu o cronograma e gerou esforço de retrabalho para as UGs. 73 7. Conclusão Por meio da elaboração do trabalho, o que inclui a leitura de artigos, reportagens, leis e as diversas reuniões com a gestora, conseguimos obter uma visão ampla acerca do orçamento público, das circunstâncias que fazem parte da rotina orçamentária e do contingenciamento. Ao passo que a leitura dos artigos nos trouxe uma visão externa, daqueles que se preocupam em analisar, discutir e propor melhorias, a ida a campo nos forneceu um bom entendimento sobre a prática e os efeitos que as situações e medidas abordadas geram para as unidades gestoras. Em linhas gerais, nossas constatações foram similares às apresentadas pelos artigos. No entanto, o contato com a realidade trouxe um ar um pouco menos otimista, ou talvez mais realista, para a conclusão do presente trabalho. Inicialmente, devemos chamar a atenção para algo que, segundo a gestora, com o passar dos anos, tornou-se um grande problema para as UGs, inclusive, para a fundação na qual a presente verificação foi realizada. Devido às constantes imposições de baixos limites na elaboração da proposta orçamentária e das diversas medidas de contingenciamento ao longo dos exercícios, os gestores responsáveis pela elaboração da proposta têm enfrentado uma grande dificuldade para motivar os funcionários e mantê-los comprometidos com o trabalho. Acostumados a terem seus planos frustrados pela falta de recursos, os funcionários se mostram desestimulados a repassar seus anseios à equipe de orçamento. A justificativa é plausível: “Qual é o objetivo de vasculharmos as agências, pensarmos em pesquisas que poderiam ser realizadas e em modernizações importantes se o ministério não vai liberar o montante necessário?!”. No entanto, apesar de compreensível, a gestora ressaltou a importância de evitar esse pensamento, pois é imprescindível que o levantamento das necessidades da fundação seja feito da maneira correta, pois em algum momento os recursos podem surgir e, para que se possa aproveitá-los da maneira adequada, é imprescindível que haja seriedade no trabalho. Ainda que as consequências possam ser diferentes para cada uma das unidades que vivenciam o contingenciamento de recursos, percebemos que essa prática apresenta duas características muito fortes que praticamente independem da situação: se mostra efetiva para o cumprimento das metas de superávit primário, necessidade reforçada pela LRF, mas, por outro lado, sua aplicação tem efeito negativo na administração das unidades gestoras. Essa ideia já havia sido ressaltada por alguns dos títulos analisados e foi reforçada durante a entrevista, quando a gerente nos apresentou os reflexos negativos que essas medidas geram para a fundação analisada e afirmou que isso se repete em outras unidades. 74 Foi constatado que os decretos de contingenciamento acabam sempre comprometendo a qualidade do gasto público e impondo um fluxo de caixa irregular e inseguro que prejudica o planejamento operacional. Instituições que dependem de recursos públicos como a fundação em questão sofrem com esses cortes e procuram defender seus interesses por meio dos mais variados artifícios criados, que vão desde a identificação de ações prioritárias para a realocação de recursos, até aqueles que servem para pressionar o governo como, por exemplo, a inversão de prioridades. Incluímos, ainda, nessa lista, a constante busca por convênios e os acordos de cooperação técnica, que servem, por meio da descentralização de créditos ou oferecimento de outros benefícios, para a obtenção de receita extra orçamentária e vantagens de outros tipos para instituição. A necessidade de replanejamento é algo bastante comum para a fundação. Grandes esforços são exigidos nesse contexto. Soa contraditório, mas observamos que perde-se muito tempo e, consequentemente, recurso, ao longo da etapa de elaboração, que inclui o processo de negociação orçamentária, e com as constantes medidas de contingenciamento. Para a fundação em questão, o mais recente esforço engloba a implementação de dois sistemas que vão servir para suportar a tomada de decisão da Diretoria Executiva, no que tange a alocação de recursos em situações que envolvam medidas de contingenciamento. Os sistemas em fase de implantação, que já foram apresentados, representam uma grande esperança para a instituição. Quanto aos artifícios, cabe ressaltar o valor que a simulação pode ter nesse sentido. Considerada como demanda em diversos setores de nossa economia, como em Cadeia de Suprimentos, por exemplo, a simulação também deixa a desejar no campo do Orçamento Público. A gerente entrevistada afirmou desconhecer o uso de simulação para planejar estratégias em função de possíveis cortes orçamentários, mas disse acreditar que poderia auxiliar bastante a tomada de decisão quanto à alocação de recurso por parte dos gestores da Diretoria Executiva da fundação. Desse modo, entendemos que o modelo proposto, apesar de não ter sido elaborado especificamente para o orçamento público, poderia ser utilizado como ponto de partida para o surgimento de uma tendência de aplicação da simulação em situações que envolvam contingenciamento, até que a frequência dessa prática seja radicalmente diminuída, ou alterações nas leis sejam feitas. Apesar de termos observado que algumas unidades já aprenderam a lidar com essa questão que tanto dificulta o planejamento, essa prática necessita ser urgentemente revista. Começando pelo fato de seu objetivo já ter sido distorcido, uma vez que a ideia inicial seria de 75 sua utilização como uma medida temporária, a prática do contingenciamento se mostra mais eficiente para mascarar os resultados fiscais do país do que para mantê-lo com uma saúde financeira estável, em um contexto repleto de bons investimentos. Essas medidas geram uma série de consequências que não resolvem os problemas e sim os "empurram para frente". Como citado diversas vezes ao longo do trabalho, a inaceitável política criada para Restos a Pagar é um bom exemplo disso. Dentre as diversas possibilidades que se têm, muito se discute sobre a mudança do tipo de orçamento. Defendido por muitos como uma necessidade, o Orçamento Impositivo poderia acabar com o contingenciamento. No entanto, conforme foi observado mediante a leitura realizada, e constatado com base nas reuniões, ao passo que o Orçamento Impositivo garante às unidades a dotação orçamentária aprovada, ele cria um enorme risco de endividamento para o governo. Ressaltamos ainda que esse risco poderia criar uma tendência similar a que já existe hoje para a previsão de receitas. Em um paralelo com a subestimação de receitas para facilitar o atingimento de superávit, podemos imaginar que os orçamentos sejam subdimensionados para garantir o cumprimento e liberação das dotações orçamentárias previstas na LOA. Outro aspecto negativo da imposição do orçamento seria a perda da flexibilidade do processo orçamentário. Se por um lado a presença dessa característica traz consigo medidas como o contingenciamento, por outro dá ao governo a chance de priorizar novas demandas que surjam após a elaboração da LOA. A flexibilidade dá ainda uma última chance para o governo proteger suas finanças por meio dos limites de empenho e corte de gastos. Em síntese, a adoção do Orçamento Impositivo acabaria com essa maleabilidade, não mitigaria a ineficiência da previsão de receita (já que erros são inerentes à previsão, por mais confiável que o processo possa ser), e não impediria que demandas urgentes aparecessem após a aprovação do orçamento. Em outras palavras, para o governo, os problemas seriam mantidos, só que sem as "soluções" já conhecidas. Para as unidades, as dificuldades seriam eliminadas a curto prazo, mas existira o risco do estabelecimento de uma crise fiscal no governo que poderia comprometer os próximos orçamentos. Nesse sentido, o que nos parece mais razoável contempla alterações na legislação. Acreditamos que, assim como sugere um dos artigos, incentivar os gestores a economizar pode ser uma estratégia excelente para a contenção das despesas. É preciso, no entanto, que os gerentes tenham garantias de que a economia feita em um exercício financeiro será, no exercício seguinte, revertida a favor da unidade que ele representa. Diante de um cenário 76 político no qual os interesses partidários e individuais geralmente estão à frente dos anseios e necessidades da sociedade, resta-nos acreditar que essas garantias só poderiam ser estabelecidas por meio de leis. Ainda que o governo construísse uma relação de confiança, o resultado de uma eleição poderia jogar todo o trabalho desenvolvido fora, na medida em que uma nova "política de governo" acabaria fazendo com que a incerteza novamente pairasse sobre a reversão dos recursos economizados. 77 8. Referências Bibliográficas 2011, Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público - MCASP. 3 ed., Brasília: Ministério da Fazenda - Secretaria do Tesouro Nacional. 2013, Manual Técnico de Orçamento – MTO 2014. v. 1, ed. 2014, Brasília: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – Secretaria de Orçamento Federal. Portal do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/. Acesso durante o período compreendido entre 11 e 18 de novembro de 2013. CARVALHO, D., 2010, Orçamento e Contabilidade Pública. 5 ed., Rio de Janeiro: Elsevier. FELGUEIRAS, J. A., 2013, Contabilidade Pública, 1 ed., Rio de Janeiro: Elsevier. PARISI, C.; GALHARDO, J. A. G.; PEREIRA, A. 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