UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DA AMAZÔNIA Instituto de Saúde e Produção Animal Cana de açúcar (Saccharum officinarum) e sua importância na produção leiteira Prof. Almir Vieira Silva Setor de Zootecnia Belém-PA 2011 1 – Caracterização da Cana-de-açúcar n gramínea perene, n própria de climas tropicais e subtropicais; n originária da Ásia, n espécies do gênero Saccharum hoje utilizadas são híbridas H H H H O R C C C C C H H H H H 2 – CLASSIFICAÇÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR Alimento volumoso Baixo valor energético e ricos em fibra Alimento Energético Melaço (funciona como um aditivo) Tabela 1 – Composição de nutrientes de alguns alimentos CARACTERÍSTICAS DESEJÁVEIS utilizados na alimentação de bovinos de corte ¶ grande produção de forragem por unidade de área; ¶ bom perfilhamento; ¶ pequena taxa de risco (pequena perdas na cultura); ¶ baixo custo por unidade de MS produzida; ¶ maior disponibilidade da cana coincida com a menor disponibilidade de forragens nas pastagens; ¶ resistência ao florescimento; ¶ resistência a pragas e doenças. ao uso cana-de-açúcar Tabela Restrições 2 – Valor nutritivo deda alguns alimentos regionais Baixo teor de PB e minerais O efeito da cana sobre o consumo não relaciona-se à quantidade de fibra presente na dieta, e sim à baixa digestibilidade desta ou à tx. de digestão e tempo de reciclagem (turnover), que ocorre no rúmen Dieta à base de cana pode apresentar redução da produção do ác. Propiônico (baixa concentração de amido) Rodrigues et al., (1997) variedades mais adequadas para alimentação de bovinos apresentam: FDN abaixo de 52%, FDN:BRIX menor ou igual a 2,7; Colmo > 80%. Pate (1981) variedades CP 59-73 e CP 68-1026: diferenças de 9,8% e 8,1% para FDN e FDA, entre a primeira e a segunda variedade. Tabela 1 – Teor de proteína bruta (PB), digestibilidade in vitro da matéria seca (DIVMS), teor de fibra em detergente neutro e relação FDN/BRIX de variedades de cana-de-açúcar Variedade SP 71-1284 SP 70-1143 SP 71-6163 SP 79-1011 SP 71-1406 CB 47-355 CB 41-76 RB 76-5418 RB 72-454 NA 56-79 Co 413 % PB 1,85cd 1,55e 2,08ab 2,16a 1,86cd 1,77d 1,48e 1,99abc 1,40e 1,92bcd 1,46e Fonte: Rodrigues et al. (s/d) % DIVMS % FDN FDN/Brix 67,57d 70,66bc 69,22cd a 77,23 71,96b 68,81cd 71,86b 70,44bc 70,82bc 72,08b 69,60cd 48,82ef 53,37b 50,29de 50,00de 52,56bc 56,47a 53,81b 45,19f 50,62d 51,45bc 50,18de 2,5ab 2,8abc 2,8abc 2,7ab 3,1bc 3,4c 2,8abc 2,3a 2,8abc 2,7ab 3,1bc Tabela 2 – Composição de nutrientes de alguns alimentos utilizados na alimentação de bovinos Alimento MS (%) NDT (%) PB (%) PDR (%PB) EE (%) FDN (%) DMS (%) P (%) Capim brachiária 29 54 8 47 2,0 70 42,47 0,15 Capim elefante 25 52 7,5 66 2,3 71 49,42 0,20 Cana picada 23 61 4 34 3,4 60 59,74 0,17 Farelo de arroz 91 79 15 74 16,1 34 74,50 1,54 Raspa de mandioca 87 67 3 40 0,4 9 74,41 0,07 Farelo de soja 89 81 51 61 1,0 8 86,02 0,58 Produtividade média da cultura 80 t de colmos/ha + ponta (20 a 30% do peso total da cana) produção total média = 100 a 120 t de cana integral fresca ou 20 - 30 t. de MS/ha. Área de plantio Levar em conta o número de cabeças de bovinos e o consumo. 25 vacas ingerem 10 kg de cana picada/dia, irão necessitar de 250 kg/cana/dia. 5 meses 37,5 t. produção de 0,5 ha de um canavial. Tabela 7 – Ganho de peso de novilhos de acordo com os tratamentos experimentais Tabela 1 - Composição química e digestibilidade in vitro da matéria seca de forragens cortadas verdes (nutrientes em % da MS) Nutrientes Milho Matéria seca Proteína bruta Cinzas Fibra bruta Ext. etéreo ENN DIVMS Silagem 6 33,4 22,3 5,3 6,4 6,9 7,4 24,6 35,3 2,2 3,2 61,0 47,7 70,4 52,6 Fonte: Adaptado de Kung Jr. e Stanley (1982) Cana-de-açúcar Meses 9 12 21,4 29,0 4,4 3,2 7,8 7,2 32,8 29,2 2,6 1,6 52,4 58,9 53,5 55,0 15 30,4 3,4 8,0 30,0 1,4 57,2 58,1 24 31,5 1,8 3,9 27,7 1,1 65,5 60,3 Pate (1981) utilizou 20, 39, 58 e 77% de MS como CA na dieta de bovinos e observou: alta correlação entre % MS e consumo de MS (r = - 0,93) O efeito da cana sobre o consumo não relaciona-se à quantidade de fibra presente na dieta, e sim à baixa digestibilidade desta ou à tx. de digestão e tempo de reciclagem (turnover), que ocorre no rúmen Utilização da uréia na alimentação de vacas leiteiras OBTENÇÃO DA URÉIA Obtenção industrial da amônia em campos de gás natural Reação da amônia com gás carbônico (em alta temperatura e pressão) síntese de uréia purificação. Uréia NH2-CO-NH2 H O que é a uréia? H N H # produto sintético # nitrogênio (mínimo de 45%), carbono, oxigênio e hidrogênio fabricado nos pólos petroquímicos Como a uréia é apresentada? # granulada # bastante higroscópica # provoca corrosão # sabor amargo Tabela 1 – Composição da uréia comercializada no Brasil Compostos Proporção (%) Nitrogênio 46,4 Biureto 0,55 Água Amônio livre 0,25 0,008 Cinza 0,003 Ferro + Chumbo 0,003 URÉIA: RAZÕES PARA O USO Baixo custo por unidade de proteína; Facilidade no fornecimento ao gado; Possibilidade de se aproveitar subprodutos, como sabugo de milho, rolão de milho, palhadas de arroz, feijão, soja, amendoim e outras culturas, pontas e bagaço de cana e sobras de capim passado nas pastagens. Objetivos de uso da uréia - Síntese de proteína microbiana; - Substituição parcial das proteínas naturais por fontes mais baratas; -Melhor aproveitamento de forrageiras de baixa qualidade; - Ação tamponante no rúmen: digestão da celulose; - Altera hábito alimentar: aumento da freq. de refeições (incremento na eficiência energética da dieta) Outras vantagens: Tecnologia simples; Fonte de N de baixo custo; Baixo custo de implantação; Redução de perda de peso no período seco; Mantém e/ou estimula a produção de leite. URÉIA ENDÓGENA Epitélio ruminal (4,9 moles/hora) Saliva (0,3 moles/hora) URÉA EXÓGENA Fonte de NNP Urease microbiana Uréia NH3 + CO2 Carboidratos cetoácidos + AGV (NO RÚMEN) NH3 + Cetoácido aminoácido microbiano Aminoácido microbiano Proteína microbiana (NO ABOMASO) Prot. Microbiana amino-ácidos livres (NO INTESTINO) Amino-ácidos livres Proteína animal FATORES QUE AFETAM A UTILIZAÇÃO DA URÉIA ENERGIA Fontes: Carboidratos de elevada solubilidade PROTEÍNA Prot. Verdadeira + NNP = Indispensável Observar: degradabilidade ruminal p/ evitar excesso de amônia ENXOFRE Deficiência de enxofre: síntese de a. a. sulfurados pelos microgs. Indispensável – síntese de aas essenciais (metionina, cistina e cisteina). Fontes de “S” recomendadas: sulfato de Ca (17% de S) e sulfato de amônio (24% de S). Uréia em diferentes sistemas de alimentação: Sal mineral; Misturas múltiplas; Cana-de-açúcar; Capim picado; Silagem; Concentrados; Etc... •Adição de uréia no alimento: 1% da MS da dieta ou 1/3 da proteína total da dieta. Melaço + Uréia – na proporção de 9:1, somente para bovídeos. Os cochos devem possuir uma grade flutuante para evitar o consumo excessivo. · Silagem + Uréia – 5 kg de uréia/ton. de silagem. Deve ser adicionada no instante da ensilagem ou durante o fornecimento aos bovinos. Não é aconselhável o uso de uréia na silagem de capim elefante, pois é necessário desidratá-la até 45% de matéria seca. · Concentrados + Uréia – 3 kg uréia/100 kg da mistura de concentrados à base de milho, sorgo, soja ou resíduos protéicos. Sal + Uréia – recomenda-se o seguinte esquema: SEMANAS Componentes 1a 2a 3a Sal comum 6 kg 5 kg 4kg Sal mineral 2 kg 2 kg 2 kg Farinha de ossos ou fosfato bicálcico 1 kg 1 kg 1kg Uréia 1 kg 2 kg 3 kg Concentração ruminal de amônia é de aproximadamente 10 mg/100 mL quando o animal está sendo alimentado normalmente Nível tóxico de amônia no líquido ruminal = 100 mg/100 ml de líquido ruminal Nível tóxico depende do abaixamento do pH do rúmen Em pH alto: a amônia está na forma de NH3, que é rapidamente absorvida Em pH ácido: amônia está na forma de NH4+ (demora para ser absorvida) Se a concentração ruminal de NH3 for alta haverá intoxicação, pois esta irá passar para a circulação periférica: ataxia, tremores, colapso, nervosismo, dispnéia, espasmos musculares, tetania, colapso e morte Mecanismos para explicar a toxidez por amônia 1) A NH3 provoca queda da disponibilidade de K+, que transmite os impulsos nervosos 2) Formação de sais de fosfato de Mg e amônio (NH3MgPO4) que tornariam o fósforo menos disponível 3) Formação do carbamato (composto tóxico no sangue) 4) Desequilíbrio do metabolismo energético (retirada do cetoglutarato para forma glutamina) que ocorre em todos os tecidos, sendo o tecido nervoso o mais sensível O Ciclo de Krebs forma ATP e Oxaloacetato para o ciclo da uréia, donde o Ciclo da Uréia é dependente do Ciclo de Krebs Para cada molécula de uréia formada são gastos 4 ATP no ciclo da uréia, que são fornecidos pelo ciclo de Krebs Amônia em excesso interrompe o Ciclo de Krebs, porque vai retirar cetoglutarato para formar glutamato. Isto temporariamente, o que prejudica a formação do ATP e inviabiliza o Ciclo da Uréia, levando ao acúmulo do excesso de NH3, que inibirá as enzimas do próprio ciclo Enzimas inibilidas: carbamil fosfato sintetase, ornitina transcarbamilase, argininosuccinato sintetase, arginon succinase e arginase TOXIDEZ O consumo de grandes quantidades de uréia em períodos curtos pode ser letal, principalmente quando o animal não recebeu adaptação. Dosagens de 40 a 50 g/100 kg de peso vivo podem ser fatais para animais não acostumados ao consumo da uréia, o que representa 0,4 a 0,5 g/kg de peso vivo. SINTOMAS DE INTOXICAÇÃO Quando os níveis de uréia são fornecidos superiores aos indicados, os sintomas de intoxicação podem aparecer até 60 minutos após a ingestão. Os sintomas se caracterizam por apatia, convulsões, respiração ofegante, tremores musculares, secreção salivar excessiva, ranger de dentes, dores abdominais, mucosas congestas, batimentos cardíacos acelerados, meteorismo, tetania e morte (30 minutos a 2 horas) após a ingestão. TRATAMENTO · Solução a 5% de ácido acético ou vinagre, por via oral (até 6 litros/animal); após um período de 3 a 6 horas repetir o tratamento se necessário, utilizando-se uma dosagem correspondente à metade da primeira; · Aplicar injeções endovenosas de glicose e cloreto de cálcio, na proporção de 250 ml de cada um dos produtos; · Utilizar antitóxicos, via oral; · Animais já prostrados e com tetania e convulsão dificilmente respondem ao tratamento. B – Cana de açúcar + Uréia Tabela 2 – Consumo de cana de açúcar e conversão alimentar de animais mestiços holandês-Zebu, em função de três níveis de adição de sulfato de cálcio a dietas à base de cana + Uréia Item Tratamento 1% U + 0% SC 0,9% U + 0,1% SC 0,8%U+0,2%SC Relação N:S Ano 1 Ano 2 Índice médio Ano 1 Ano 2 Índice médio 33:1 16:1 Consumo (kg MS/Animal/dia) 5,1 5,6 4,1 4,5 (100) (117) Conv. Alimentar 12,7 10,8 8,3 7,1 (100) (117) 9:1 5,8 4,8 (121) 10,4 6,9 (121) Fonte: Adaptado de Torres et al. (2001) 8 animais H x Z/trat/119 dias. Cada animal recebeu 1 kg de FA e sal mineral à vontade Período de Adaptação (2 semanas) 1a semana 2a semana Tabela 3 - Desempenho de vacas em lactação alimentadas com diferentes volumosos recebendo suplementação concentrada Volumosos S.Milho S. Sorgo S. Elefante Cana Consumo de matéria seca kg/vaca/dia Volumoso 7,10 8,40 6,17 4,97 Concentrado 1,27 1,30 1,16 1,07 Total 8,37 9,70 7,33 6,04 %PB da ração 9,00 8,90 9,00 6,00 Kg de 7,00 7,40 5,50 3,70 leite/vaca/dia GPV, kg/vaca/dia -0,25 -0,14 -0,22 -0,96 Fonte: Naufel et al. (1969) Concentrado: 40% de far. de algodão + 57% milho + 2% far. de osso + 1% sal comum; 22% PB (base seca), fornecido na base de 1 kg para cada 3 kg de leite Tabela 4 - Produção de leite em fazendas, antes e após a adoção do sistema de alimentação cana-de-açúcar + uréia Produtor Braúlio Jr. Marcos Kemp J. B. Santana José Inácio Wangler Duarte Geraldo Avelino Leovigildo Mato Delza Sampaio Luiz M. Simôes Vitor Brito Município Itaperuna, RJ Itaperuna, RJ Itaperuna, RJ Gov. Valadares, MG Gov. Valadares, MG Cov. Valadares, MG Itapetinga, Ba Itapetinga, BA Itapetinga, BA Itapetinga, BA Fonte: Torres et al. (2001) Produção (kg/dia) Inicial/ano Abr/1997 Abr/1998 1.100 (95) 2.060 3.000 1.050 (95) 1.400 2.500 200 (96) 500 1.000 30 (94) 290 350 470 (93) 1.050 1.800 1.630 (94) 3.200 4.500 100 (95) 450 1.000 150 (95) 400 1.000 130 (95) 450 1.000 180 (92) 900 1.000 Castro et al. (1967) substituiram silagem de milho por CA para vacas em lactação não encontraram diferenças entre os tratamentos. Entretanto, a quantidade de concentrado usada foi alta em relação à produção de leite (1 kg de concentrado para cada 1,5 kg de leite produzido). CNPGL Vacas até 12 kg de leite cana + concentrado (1 a 4 kg) Novilhas e vacas secas cana + 1 kg de suplemento (FA ou FS/animal) AMONIZAÇÃO DO BAGAÇO DE CANA Adição de amônia anidra, com 82% de N; hidróxido de amônio, com 40% de N; e uréia, com 46,5% de N. Ação da amônia sobre a forragem promove desestruturação, e rompimento, do complexo formado pelos componentes da fibra (celulose, hemicelulose e lignina) maior área de exposição aos microrganismos aumento do grau de utilização das diferentes frações da fibra. Ortega et al. (1991) Bagaço de cana tratado com níveis entre 2 e 5% de uréia, por 30 dias apresentou os seguintes resultados em comparação ao bagaço não tratado: Bagaço não tratado 2,05% de PB e 35,25% de DIVMS Bagaço com 3% de uréia 5,43% de PB e 47,22 % de DIVMS Bagaço com 5% de uréia 8,97% de PB e 49,03% de DIVMS. MELAÇO LÍQUIDO É o liquido xaroposo, obtido como resíduo da extração e ou refinação de açúcar de cana. Deve ser isento de matériais estranhas a sua composição. Umidade máxima: 27%; Grau brix minímo: 79,5%; Açúcares totais, minímo: 46%; Acidez, expressa em ácido acético (máximo): 1,5%. É rico em açúcares, Ca, Mg, K, niacina e ácido pantotênico; É pobre em tiamina, riboflavina, vitaminas A, D, E e K Forma de uso: Diluído aspergido sobre a forragem. Vantagem do uso: Maior consumo de volumosos de baixa qualidade; Nível de inclusão até 5% Prob lem as atribuídos a utilização do m elaço: N efrites e diarréias oco rrem , devido ao s teores elevado s de K e nitratos. Efeito lax ativo é atribuído ao seu eleva do conteúdo de cinzas (8%), D eprim e a digestão de proteínas e de outros nutrientes, bem com o red uz a atividade m icrobia na no rúm en. ADITIVO DE SILAGENS Diluído em água, na proporção de 1:3, é adicionado à base de 2 a 3% em peso para capins e 5% para as leguminosas. Aspecto negativo em silagens “lavagem” de grande parte dos nutrientes solúveis para o fundo do silo. MELAÇO EM PÓ Obtido da desidratação do melaço líquido, enriquecido em P, Ca e sais minerais pela indústria. Pode ser utilizado puro (adicionado com 30% de água) ou juntamente com forragens, palhas, farelos, sabugos, etc.. Umidade máxima: 5%; Açúcares totais (mÍnimo): 60%; Matéria mineral (máximo): 15%. Cuidados Adaptação animal e mistura