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A GAZETA - 1B
CUIABÁ, 21 DE OUTUBRO DE 2013
Arcanjo enfrenta 1º júri
popular esta semana
Em uma série de reportagens, A Gazeta vai lembrar como o ‘Comendador’ iniciou seu
‘império’, os principais crimes pelos quais ele responde e como será o julgamento
LISÂNIA GHISI
DA REDAÇÃO
E
sta semana João Arcanjo Ribeiro, 62,
conhecido como “Comendador”, senta pela
primeira vez no banco dos réus. O
julgamento, que terá início na quinta-feira,
(24) a partir das 8 horas, será realizado no Fórum
Desembargador José Vidal, em Cuiabá. O júri popular é
referente à morte do empresário Domingos Sávio
Brandão de Lima Junior, que foi assassinado no dia 30
de setembro de 2002, no bairro Consil. Preso pela
primeira e única vez em 2003, quando foi localizado
em Montevidéu (Uruguai), o acusado atualmente se
encontra recluso na Penitenciária de Segurança
Máxima de Porto Velho (RO).
Nestes dias que antecedem o júri, o jornal A Gazeta
traz uma série de reportagens para lembrar quem é
João Arcanjo Ribeiro, por quais crimes ele é acusado e
falar sobre como será o julgamento e qual é a
expectativa da acusação e defesa.
Arcanjo nasceu em 30 de março de 1951, no
Distrito de Jeroaquara, na cidade de Faina (GO), a 211
km de Goiânia. Filho de José Chocair e Josefa Arcanjo
Ribeiro, não se sabe ao certo quando chegou em Mato
Grosso. Relatos de amigos da juventude destacam que
enquanto os pais continuavam residindo em Goiás,
Arcanjo chegava na capital mato-grossense na década
de 1970. “Ele não era mais criança quando chegou em
Cuiabá. Logo quando chegou aqui, residiu na região
conhecida como “Cabeça de Boi”, que ficava próximo
ao bairro Lixeira. Quando se instalou na cidade estava
disposto a trabalhar. Desde que o conheci, sempre foi
uma pessoa muito boa, muito humilde”, afirma um
amigo da juventude, que prefere não se identificar.
Os relatos ainda detalham que João Arcanjo foi um
homem que chegou a realizar trabalhos voluntários,
época que antecedeu a abertura da empresa Colibri e
do conhecido Cassino “Estância 21”. “Conhecia todos
da família dele e sempre visitava os pais, que
continuaram morando em Goiás. Sei do tempo em que
ele chegou a atuar como voluntário na inspetoria de
menores de órgãos do Judiciário de Mato Grosso. Na
época, o trabalho voluntário era bastante frequente,
pois pouco se existia mão de obra na Capital”, diz o
amigo.
Quando ainda não tinha os empreendimentos
financeiros, Arcanjo atuou como segurança para várias
pessoas em Cuiabá. Mesmo sem bens materiais, o
amigo conta que Ribeiro buscava a pé a primeira noiva
no serviço. A jovem, que era conhecida pela apelido de
“Pequena”, trabalhava na antiga sede da Secretaria de
Educação e Cultura, que ficava localizada na rua
Voluntários da Pátria. “Todos os dias, no fim de tarde,
ele buscava ela e juntos, abraçados, iam embora. Vi
esta cena por várias vezes”, conta.
Levantamento histórico junto ao Diário Oficial de
Mato Grosso (Iomat) revela que Ribeiro foi admitido,
Levantamento
histórico junto ao
Iomat revela que
Ribeiro foi policial
civil por quase 6 anos,
sendo admitido em 20
de agosto de 1973 e
exonerado em 23 de
abril de 1979
Reprodução/Arquivo
‘Ordem do Mérito’ e ‘Cidadão Cuiabano’ foram títulos concedidos pela Câmara de Vereadores e depois
cassados em 2004; título de ‘Comendador’ foi recebido da Assembleia Legislativa e continua válido
por meio de contrato temporário, como investigador da
Polícia Civil. A admissão tem data de 20 de agosto de
1973. Na época, José Manuel Fontanillas Fragelli
governava Mato Grosso e assinou a contratação de
Ribeiro. Sobre sua atuação junto ao órgão de
segurança, não há informações, nem sequer se
desenvolveu alguma atividade em unidades policiais
de Cuiabá. A admissão teve duração de quase 6 anos.
No dia 23 de abril de 1979, o governador Frederico
Carlos Soares Campos assinou a exoneração do
homem que seria, pelos próximo 20 anos, o
“comandante” de Mato Grosso.
“O IMPÉRIO” - Atualmente coordenador do
Núcleo de Defesa do Patrimônio Público e da
Probidade Administrativa, o promotor Mauro Zaque,
que teve participação direta na operação Arca de Noé,
que terminou com a prisão de Arcanjo, explica que as
atividades financeiras do “Comendador” tiveram
início na Capital. “Não temos notícia dele em outras
cidades antes de Cuiabá, assim como seu nome
também não era conhecido por todos antes que
iniciasse os negócios com a empresa Colibri, que
realiza o jogo do bicho”.
Zaque conta que o “império” de Arcanjo começou a
ser estruturado na década de 1980, com a instalação da
Colibri e logo depois do Cassino “Estância 21”. Na
sequência, o mesmo passou a ter ligação com os
Poderes Estaduais. “Posterior a isso, ele (Arcanjo)
iniciou os contatos com as factorings, época esta em
que chegou a sonegar impostos e aumentar cada vez
mais seu poder financeiro em Mato Grosso. Em
seguida, os empreendimentos
ampliaram e Arcanjo também
passou a atuar no ramo dos caçaníqueis. Nesse período, suas
atividades já se encontravam em
outros estados brasileiros e até
mesmo no exterior, quando chegou
a instalar
empresas nos
Estados Unidos,
por exemplo”.
Otmar de Oliveira
Preso em 2003,
atualmente está
na Penitenciária
de Segurança
Máxima de
Porto Velho
Prisão ocorreu em 10/04/2003 no Uruguai;
Em 11/03/2006 ele é extraditado para o Brasil;
Em 16/10/2007 foi transferido da Penitenciária Central do
Estado para a Penitenciária de Segurança Máxima de Campo Grande;
Em 04/2013 foi para a Penitenciária de Segurança Máxima de Porto Velho (RO).
Historicamente, as atividades de Arcanjo
perduraram por mais de 20 anos. “Além do poder
financeiro, ele chefiava o crime organizado e também
tinha o controle em relação às decisões que eram
realizadas em Mato Grosso. Durante este período,
Ribeiro foi a pessoa mais poderosa do Estado. As
vontades de Arcanjo eram leis e todos viviam sobre as
ordens dele”, destaca o promotor.
Exemplo do respeito que os representantes
públicos tinham em relação a Ribeiro foram os títulos
concedidos pela Assembleia Legislativa e Câmara de
Vereadores de Cuiabá. A primeira homenagem oficial
foi feita por indicação do ex-vereador Marcelo Ribeiro,
em 1987. Na época, o Legislativo Municipal concedeu
a Arcanjo o título da Ordem do Mérito, por meio da
resolução nº 029. Anos depois, ele foi homenageado
novamente na Capital recebendo, por indicação do exvereador Wilson Coutinho, o título de Cidadão
Cuiabano. Oficialmente, ambas as homenagens foram
cassadas em março de 2004, durante sessão.
A última homenagem foi dada pela Assembleia
Legislativa, no final da década de 1990. Conforme
registros nas atas da Casa de Leis de Mato Grosso, o exdeputado Paulo Moura foi a pessoa responsável por
apresentar o documento para a concessão do título de
“Comendador” a Ribeiro. E no dia 5 de dezembro de
1997, conforme Resolução 115, a titulação de João
Arcanjo foi publicada em Diário Oficial. Devido ao
recesso de final de ano, a homenagem e entrega da
honraria aconteceu apenas no ano seguinte, quando o
ex-deputado estadual e conselheiro afastado do
Tribunal de Contas do Estado, Humberto Bosaipo,
entregou nas mãos de Arcanjo o mérito, que até hoje é
totalmente válido. Historicamente, o título de
Comendador é dado àquelas pessoas que se destacam
em suas áreas de atuação, sejam elas quais forem.
Durante 20 anos, Ribeiro conseguiu aglomerar
fortuna incalculável. Somente em 2002, com a
deflagração da operação “Arca de Noé”, realizada por
entidades federais e
Chico Ferreira/Arquivo
estaduais, que seu império
começou a ruir. Devido aos
crimes de ordem financeira
e as investigações que o
apontavam como mandante
de homicídios em Cuiabá e
Várzea Grande, a sua prisão
foi decretada em 5 de
dezembro de 2002. A
detenção aconteceu só no
ano seguinte, em 10 de abril
de 2003, quando foi
localizado em Montevidéu
(Uruguai). A prisão foi
realizada por agentes do
Serviço de Inteligência da
Polícia do Uruguai. Durante
este período, ele chegou a
ser procurado em mais de
180 países.
Na edição desta terçafeira (29), confira
reportagem sobre os crimes
contra a vida que Arcanjo
responde.
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