III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
TRILHAS URBANAS: ROTEIRO CULTURAL E
paisagem e no ambiente construído desse
ITACOLOMI E A QUALIDADE PERCEPTIVA
Paulo.
ARQUITETÔNICO MACKENZIE – TRILHA
DO LUGAR
Eunice Helena Sguizzardi Abascal Θ
fragmento do bairro de Higienópolis, São
A análise deverá ser rebatida no objeto, a
trilha Itacolomi, cujo registro foi realizado
durante a pesquisa, através de
levantamento fotográfico realizado pelos
Resumo:
Análise e fundamentação crítica
(histórico-analítica) dos conceitos de
espaço, lugar, paisagem e qualidade
arquitetônica e valor do antigo. Aplicação
desta fundamentação ao objeto recortado,
a Trilha Urbana denominada Percurso
Itacolomi, levantada e registrada
oportunamente no decorrer da Pesquisa.
Palavras-chave: Trilha Urbanas – Percurso
Itacolomi – Espaço- Lugar- Paisagem –
Qualidade arquitetural – Valor de
Antigüidade.
Professores Eunice Abascal e Célio
Pimenta em 24 de abril de 2006.
Partindo de fundamentação históricocrítica sobre os conceitos de espaço,
lugar, paisagem e valor e qualidade da
arquitetura de um tecido urbano revelador
da passagem do tempo e de seu acúmulo,
revela-se a metodologia que faz da
análise perceptiva e do percurso as bases
da formação de juízos estéticos e
qualitativos, os quais devem ser
fundamentados pela análise crítica de um
fundamento teórico selecionado.
O trabalho se divide em dois momentos, o
primeiro abordando histórica e
teoricamente os conceitos-chave e o
Introdução
Este trabalho é parte da pesquisa “Trilhas
Urbanas: roteiro cultural e arquitetônico
segundo, de aplicação, e fundamentação
de uma série de juízos de valor capazes
de enunciado a partir do compromisso do
observador com o objeto percebido.
Mackenzie”, e desenvolve uma reflexão
crítica a respeito dos conceitos de espaço,
lugar paisagem e qualidade arquitetural
do que é ‘antigo’, isto é, dotado de uma
história. O objeto de estudo a que se
relaciona esta análise é um recorte das
assim denominadas “Trilhas Urbanas”, o
percurso Itacolomi, descortinado pelo
olhar de um caminhante imerso na
Espaço, lugar, paisagem e a qualidade do
que é antigo
Em que se fundamenta uma possível
análise histórico-crítica dos lugares?
Lugares concretamente definidos e
dotados de qualidades arquitetônicas e
urbanísticas peculiares, reveladoras da
Θ
Professora de História e Teoria da Arquitetura da
FAU Mackenzie. Professora colaboradora do
programa de Pós-graduação em Arquitetura e
Urbanismo da UPM
pátina da passagem do tempo e revestidas
de atualidade?
1
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
O que caracteriza cada fragmento urbano
como um lugar específico e não somente
espaço genérico e abstração possível?
O que deve fundamentar a ação
arquitetônica de intervenção e
transformação de um lugar, entendido
como paisagem e ambiente construído
característico?
A fim de emendar resposta a tais
indagações, se faz necessário
fundamentar os conceitos empregados,
determinar-lhes uma consistência que os
torne passíveis de aplicação e
desvendamento do objeto do percurso
Itacolomi.
fragmentações ou das continuidades e
permanências urbanas.
É interessante frisar que para o arquiteto e
crítico de arquitetura mencionado, a
percepção de que a obra se encontra
imersa numa estrutura superior (a
paisagem ou o ambiente construído)
informa que a arquitetura não se permite
auto-suficiência, produzindo-se “(...) en el
texto inacabado que es la ciudad” (2). O
problema que se coloca é o do
reconhecimento dessa estrutura superior,
o que implica que o arquiteto se
conscientize dos valores estruturais que
determinam como se produz a
arquitetura, e como esta se desenvolve no
tempo.
Espaço e lugar, o valor e a qualidade do
que define o ambiente construído
Na atualidade, arquitetos contextualistas
como Moneo (1) definem a Arquitetura
como uma resposta capaz de esclarecer
uma determinada situação, conferir
sentido a um lugar ao satisfazer um
programa estabelecido.
Mais do que enfatizar arquitetos é
necessário ter presente a obra, trabalhar
para que esta permaneça, garantir sua
solidez e durabilidade, cuidando de sua
inserção no contexto arquitetônico,
considerado fator decisivo. Embora o
projeto não tenha o único objetivo de
completar ou dar continuidade ao que está
presente, segue necessário decidir sobre o
tipo de relação vai manter com o exterior.
A relação dialética que se estabelece entre
a estrutura formal da cidade e a mesma
estrutura arquitetônica se converte em
baliza de interesse, sendo preciso
conhecer e revelar a trama na qual se
produz determinada obra. A vontade dos
arquitetos se vê então premida pela força
condicionadora dos alinhamentos, das
formas de uso do solo. A estrutura urbana
antecipa a iconografia da arquitetura, e
essa estrutura define uma densidade e
apropriação específica das condições
determinantes. A arquitetura é capaz de
preparar o usuário para o entendimento
do meio, e esta condição define o
desempenho do arquiteto hoje, muito
mais como alguém apto a discernir a
partir da observação do meio físico e
histórico, compreendendo como se
construiu e como se deve construir.
Tais relações podem se estabelecer a
partir da compreensão do movimento na
paisagem, da condição morfológica do
tecido urbano presente, das
Lugar e percepção, um olhar históricocrítico: o bairro de Higienópolis
2
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
A transformação de um espaço genérico e
abstrato pela via da arquitetura se dá com
a intervenção arquitetônica. A modificação
de um padrão estrutural e morfológico da
cidade se condiciona pela contingente
formação de novos centros e lugares de
interesse para o desenvolvimento urbano,
em que os arquitetos passam a intervir.
Em São Paulo, a partir dos anos 30, o
bairro de Higienópolis funciona então
como novo centro, permitindo a expansão
verticalizada da cidade que se iniciou na
década de 20, na região do Centro
Histórico.
Essa nova morfologia e estrutura urbana
constituem a partir de então o material
histórico a partir do qual os arquitetos
realizam intervenções arquitetônicas,
intervenções que de um ponto de vista
geral podem atuar em contraste ou
analogia ao contexto. Ambas as formas
de intervenções guardam uma fonte
comum, a de optar por uma estratégia
relativa às pré-condições em que operam.
Em Higienópolis, as pré-condições
projetivas se modificam, passando,
conforme Silvio Soares de Macedo (3) de
uma estrutura colonial a outra, alimentada
pela forma de ocupação preconizada pela
arquitetura e urbanismo modernos. A
ilustração seguinte revela esta nova
distribuição das massas e respectiva
relação com os espaços criados e
ocupação de solo: Início do século XX:
arborização das vias públicas
•
Irradia-se este padrão, iniciado
com a Av. Paulista, aos bairros de elite de
São Paulo, como Higienópolis
•
Altera-se a morfologia dos
espaços urbanos: lote-rua-lote passa a
Edifício-jardim-calçada-leito carroçável
Como assinala Macedo (4) “O loteamento
de Higienópolis segue, preferencialmente,
as curvas de nível; Santa Cecília aproveita
e continua os traçados das ruas de Vila
Buarque, ligando-as a Higienópolis.”
Podem ser identificados três momentos na
história do bairro, a saber, o primeiro
revelador das chácaras (antes de1898), os
loteamentos e os palacetes (entre 1898 e
1933) e, a partir de então, a verticalização.
O momento de verticalização que se
intensifica a partir da década de 40
coincide com a disseminação dos ideais
modernos e a prática de padrões
arquitetônicos que se não abertamente
modernos, antecipam e abrem caminho à
modernidade via o processo de
modernização da cidade em curso.
É inegável que a doutrina modernista
enfatizou as operações de contraste, quer
entre a cidade tradicional e a novidade
representada pela revolução modernista,
ou ainda entre volumes e formas que
construiriam uma espacialidade urbana
renovada, através da verticalização.
Entretanto, a diferença mais sutil a
enfatizar não recai no contraste entre
formas, figura e fundo ou texturas, mas
na percepção da diferença flagrante entre
espaços vazios e espaço construído, o que
3
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
no bairro de Higienópolis se depreende
pela implantação distintiva anteriormente
apresentada. Tal disposição dos volumes
soltos com generosos recuos determina a
espacialidade que marca a percepção da
arquitetura. Contrastes cedem lugar a
graus de operação, indo do apagamento
da intervenção à sua valorização,
determinando o lugar.
totalidade para quem caminha pelas ruas,
Se a arquitetura é capaz de esclarecer o
um espaço que se insinua como público,
apreendido na percepção, e a arquitetura
contradigam esse juízo.
ambiente construído. Eis então porque a
Essa qualidade perceptiva dos lugares não
pode não coincidir com a exemplaridade
marcando para o observador e pedestre
significado de um lugar, este pode ser
embora hoje grades e fechamentos
é propriamente o objeto desta no
foi ignorada durante os anos de formação
do ideário moderno. Desta forma, o
modernismo definiu uma forma de ação
para o relacionamento da cidade e da
história, e o fez através do contraste.
No entanto, já em 1903 Alois Riegl (5)
definiu uma diferença conceitual entre o
valor do monumental e a qualidade do
antigo: questionou o valor da arquitetura
baseado unicamente no critério de
exemplaridade, mas incluiu o valor
derivado da situação factual documentada
(ou percebida). Riegl empreende uma
interpretação da percepção urbana pelo
cidadão moderno, assinalando uma nova
sensibilidade deste para a relação entre o
valor de novidade e a antiguidade como
qualidade do que é vivido e percebido
arquitetônica. A recíproca é falsa, pois um
edifício exemplar de valor reconhecido e
arquiteto consagrado pode não se
encontrar historicamente valorizado e
exposto à condição de significativo para o
lugar. Edifícios não exemplares podem ter
qualidades para a ambiência e outros
exemplares podem não tê-lo por razões
assinaláveis.
Da mesma forma, edifícios não
comunicam mensagens cifradas e que não
se deixam dialetizar com o tempo, e
mensagens desaparecem e dão lugar à
presença do edifício e sua percepção: o
edifício a paisagem começa a ser ele
mesmo.
valor. Em outras palavras, o ambiente
Embora toda obra esteja condicionada por
movimento no espaço e do que se
marcada pelo tempo, o que constitui uma
figura do flaneur que vaga livre por uma
significado na relação específica com a
imagem poética do início do século XX
edifício que constitui as Trilhas Urbanas
construído e percebido depende do
uma estrutura maior e a uma expressão
depreende a partir deste, lembrando a
similaridade, cada obra adquire seu pleno
cidade aberta e moderna, resgatando a
paisagem e a percepção. Assim, cada
expressa por Baudelaire.
só pode ter seu valor de história
Para uma perspectiva contemporânea de
análise crítica, um modo dialético de
exprimir a sincronia entre similaridade e
diferença se encaixa nesta sutil
sensibilidade de trabalhar o lugar, sua
interpretação e a novidade e irrupção da
reconhecido a partir do percurso.
Para aplica a conceituação desenvolvida,
analisa-se o percurso denominado “Trilha
Itacolomi”.
4
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
Trilha Itacolomi
Edifícios reconhecidamente de valor
histórico:
Victor Reif (1963) Edifício Itacolomi R.
Itacolomi, 465
Edifício Diana (1958) Rua Itacolomi, 95
Fábio Penteado (1951) Edifício Residencial
Rua Itacolomi “O primeiro prédio de
concreto aparente é aquele da rua Piauí,
esquina com a Itacolomi.” (Marc Rubin, em
entrevista em
http:www.arcoweb.com.br/entrevista/entr
evista85.asp).
David Libeskind (1958) Centro Médico
Itacolomi Rua Itacolomi, 601
(1962) Edifício Alomy Rua Itacolomi, 334
Miguel Badra Jr. Edifício Marcia Monica Rua
Itacolomi, 573
Victor Reif (1958-61) Edifício Diana Rua Itacolomi,
Edifício Marcia Monica Rua Itacolomi, 573
http://www.iabsp.org.br/boletim-52.pdf
Fábio Penteado (1951) Edifício Residencial Rua
Itacolomi, esquina Rua Piauí
5
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
de reconhecer, por observação direta, a
relevância e o significado na paisagem do
patrimônio construído, bem como a
qualidade de sua inserção na ambiência
urbana. Trata-se de constatar a qualidade
do que está consolidado na paisagem
(edifícios, mobiliário urbano e elementos
paisagísticos característicos de vegetação),
que marquem presença, quer tenham ou
não um valor acadêmico, devido à autoria
consagrada ou tombamento, ou ainda
despertem interesse acadêmico por
qualquer outro motivo.
O objetivo específico fundamental é o de
dar continuidade à elaboração de recortes
ou percursos, denominados trilhas, com a
finalidade de realizar a leitura da
paisagem urbana, entendendo-a como o
conjunto formado pelo ambiente natural e
construído.
A denominação relativa ao Campus
Mackenzie é resultado de o mesmo se
constituir no referencial e no ponto de
partida desses percursos. O perímetroMiguel Badra Jr. (1960) Edifício Marcia Monica Rua
Itacolomi, 573
limite vem sendo reajustado no decorrer
da pesquisa, em função do trabalho de
campo, em que são observadas
importantes ambiências e visuais que
passam a nortear seu recorte, o que
Trilha Percurso Itacolomi
Roteiro realizado a partir de percurso em
24 de abril de 2006.
O objetivo do Projeto Trilhas Urbanas:
roteiro cultural e arquitetônico Mackenzie
é organizar um conjunto de informações
capaz de divulgar o interesse histórico,
arquitetônico e cultural do ambiente
construído estudado, com o intuito de
divulgar o conhecimento da cidade como
um bem comum. A elaboração de
percursos cumpre o papel metodológico
significa que toda e qualquer definição de
gabinete e apriorística vem sendo
afastada.
O Projeto de pesquisa que assinala as
diversas trilhas identificadas delimitou de
forma genérica um contexto significativo
de ruas fundamentais à investigação,
entre elas, a Rua Maria Antonia, a Rua da
Consolação, Rua Piauí, Rua Itambé, Rua
Maranhão, Rua Dr. Vila Nova, a Praça
Rotary e a Rua Major Sertório e a Rua
Itacolomi. Este conjunto não representa
uma ou mais trilhas em si mesmo, mas
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III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
tão somente um universo de interesse,
elaborado a posteriori, uma vez que os
percursos são definidos. O conceito de
trilha urbana vem se expandindo e
evidenciarem jogos de recortes, volumes,
materiais de revestimentos e cores
seletamente escolhidas.
refinando, embora permaneça nos limites
Iniciando a trilha a partir da referência
Pesquisa.
esquina das Ruas Maranhão e Itacolomi,
A Rua Itacolomi está situada no interior
entrar na Rua Itacolomi nos deparamos
das definições propostas pelo Projeto de
desse limite geral, e foi assinalada como
relevante a partir da observação empírica
e de sua pertinência, uma vez que
apresenta relações de interesse entre o
ambiente urbano e o patrimônio ambiental
e edificado.
Campus Mackenzie, o percurso iniciou na
no sentido das Ruas Piauí e Alagoas. Ao
com o Edifício Icaraí, em que o desenho
do acesso que conduz ao portal apresenta
degraus cuja proporção entre espelho e
passo favorece o último, valorizando o
caminho e estabelecendo relação dinâmica
entre o espaço público e o privado.
A espacialidade que convida é afirmada
A trilha Itacolomi
De forma geral, a arquitetura presente
nessa trilha pode se denominar moderna,
em sua maioria edificada no período entre
os anos 50 e 80. Observa-se uma
quantidade inferior de edificações das
duas décadas finais do recorte
mencionado. A data de projeto e obra é
determinante para compreender as formas
específicas de implantação e relação dos
edifícios com a paisagem urbana.
Trata-se de concepções que privilegiam
os térreos, de maneira a expressá-los
como espaços generosos, utilizando como
instrumentais a escolha refinada de
materiais, o desenho cuidado de pisos e o
trabalho paisagístico indissociável da
qualidade da ambiência alcançada.
Quanto aos edifícios, evidenciam cuidados
de elaboração funcional, que em muitos
casos são visíveis do exterior (diferenças
de ocupação dos andares, expressos em
distintas formas nas elevações), e
expressão arquitetônica refinada, ao
pelo tratamento paisagístico que
estabelece uma continuidade visual entre
o edifício e a rua (ao utilizar espécies de
pequeno porte a arbustivas), permitindo
que visuais livres se estabeleçam. Note-se
ainda que a amplitude proporcionada pelo
recuo frontal marcante, assim como a
não-ocupação da totalidade do lote
favorece as visuais francas assinaladas,
estabelecendo um parâmetro comparativo
com os resultados observados na trilha
Percurso Maranhão, ao sugerir um padrão
de ambiência para o bairro de
Higienópolis marcado por sua específica
feição, o que constituiria um de seus
diferenciais.
O percurso realizado no sentido que
encontra as Ruas Piauí e Alagoas como
transversais se caracteriza pela existência
de um agradável micro-clima
proporcionado pela massa arbórea
presente e pelo tratamento paisagístico
que os edifícios conferem às calçadas.
Esse tratamento cumpre duas funções
antagônicas, a primeira delas a de
demarcar os espaços privativos dos
edifícios conferindo-lhes distinção, e
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III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
estabelecendo barreiras sutis entre os
espaços público e privado. Diga-se
barreiras sutis, pois se observa o uso de
espécies vegetais de porte médio, com
discreta projeção sobre os passeios
públicos, no entanto conferindo à
extensão murada um tratamento
homogêneo capaz de demarcar o
perímetro de lote e distinguir no conjunto
da rua a presença de um edifício.
Edifício Icaraí
Fonte: Foto da autora
Do lado direito de quem segue a trilha, na
esquina das Ruas Itacolomi e Maranhão,
encontra-se uma residência de natureza
arquitetônica eclética, ocupada pela
Instituição da TFP (Tradição, Família e
Propriedade). Trata-se de um lote amplo,
estando essa casa implantada em um
Fonte: foto da autora
Os pisos utilizados nos calçamentos são
também uma forma de homogeneizar e
distinguir propriedades. Observe-se que o
percurso foi realizado em dia e horário de
platô elevado em relação às mencionadas
ruas. Este recurso, otimizado pela
distribuição harmoniosa de massa
construída e de vazios, que recebem
tratamento paisagístico cuidadoso, fazem
a residência distinguir-se na paisagem.
intensa insolação (11.04.06, às 13 hs), e é
possível perceber o agradável
sombreamento existente nos passeios
públicos à esquerda de quem caminha.
Mesmo nos casos de edifícios que estão
resguardados por muros, o tratamento
diferenciado de sua extensão por espécies
selecionadas não impede que a edificação
seja vista e ao mesmo tempo, a
amenização da extensão murada pelo
tratamento paisagístico sugere ao
caminhante que os edifícios são
Residência TFP Fonte: fotos da autora
espaço público.
Os interstícios que separam as massas
acolhedores e estão relacionados ao
edificadas permitem visuais capazes de
amplificar os espaços de percepção do
ambiente construído. Embora bastante
verticalizada, a Rua Itacolomi se apresenta
8
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
como conjunto harmonioso formado pela
massa edificada e por vazios, o que
proporciona sensação de espacialidade
franca. A presença dessa mencionada
residência é um dos elementos de
permeabilidade visual desse local,
possibilitando que edifícios da própria
Itacolomi assim como da Rua Maranhão
possam ser percebidos pelo caminhante.
O trecho analisado constitui um ambiente
de destacada beleza e amplitude,
marcando a sensação de generosidade
espacial para a rua.
O edifício que se encontram ao lado da
residência TFP, à direita de quem caminha
no sentido assinalado (Edifício Amaralina)
se destaca, pela implantação que
proporcionou recuos laterais e um amplo
recuo frontal. Outro ponto a assinalar é a
presença de escadaria, que o eleva em
relação à cota da rua. Encontra-se elevado
sobre colunas, o que vaza o térreo de
forma significativa, permitindo visuais que
invadem o espaço privado e o trazem ao
nível da percepção coletiva e pública. As
cores branco e azul intenso conferem
destaque, salientando a alternância de
volumes e massas que compõe as
elevações. A presença dessa edificação é
marcante, definindo a esquina com a Rua
Piauí à direita de quem dela se aproxima,
assinalando a verticalidade e a presença
de aberturas dadas pelos recuos e térreos,
contribuindo para com a percepção do
conjunto da Rua Itacolomi.
Edifício Amaralina
Fonte: fotos da autora
Em frente, à esquerda de quem caminha,
muros e grades são ao mesmo tempo
amenizados e demarcados por espécies
que são barreira e marcos, pois
determinam, junto com os elementos
arquitetônicos (pilares, aberturas,
revestimentos e esquadrias) os ritmos de
percepção. Essa demarcação rítmica traz a
massa edificada ao nível da percepção,
funcionando também como
instrumentação para a ambiência.
Espécies vegetais que primam pela
natureza longilínea e porte médio
demarcam os ritmos verticais, assinalam
a presença de gradis e colunas.
9
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
Fonte: fotos da autora
Essa sensação de receptividade é
Olhando na direção do eixo visual da Rua
interrompida pela presença da banca de
mesma permeabilidade visual e
funcionando como barreira física e
público e privado pode ser sentida. Ainda
é muito acentuada, ocultando as fachadas
quem caminha, a ausência de gradis e o
natural e de percepção do micro-clima. Ao
sobre o térreo, fazendo-o destacar-se,
Itacolomi se encontra residência ocupada
ao espaço público.
interesse histórico), oculta pela massa
Piauí, da esquina com Rua Itacolomi, a
jornal que pode ser observada,
generosidade de espaços que imbricam o
perceptiva. Nesse ponto, a massa arbórea
na esquina Itacolomi e Piauí, à direita de
e acentuando os elementos da paisagem
trabalho que projeta a massa edificada
atravessar a Rua Piauí, na esquina da Rua
constrói uma vez mais o voltar do edifício
atualmente pela Polícia Federal (edifício de
arbórea presente nos limites do lote em
que se encontra essa edificação, que se
projeta em direção do passeio público. A
ambiência então se modifica, com outro
padrão de passeio público que exibe um
cimentado bastante descuidado e
danificado. Ao continuar o passeio pela
Itacolomi, acompanhando os limites da
mencionada residência, evidencia-se uma
permeabilidade visual possibilitada pelo
gradil, permanecendo este lado da rua
bastante sombreado pela presença da
massa arbórea que se projeta na calçada.
10
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
separação, proporcionando um ambiente
de integração reforçado pela rampa de
acesso ao portal principal, pelo uso de cor
ocre nos elementos que acompanham e
definem a base do edifício e seu acesso,
pelo recuo do térreo em relação ao corpo
da edificação.
O Edifício Itagoas marca e induz à
existência de total permeabilidade entre
as dimensões pública e privada, uma vez
que ocupa duas frentes de rua. Essa
demarcação prepara o caminhante para
perceber a Rua Alagoas dessa forma,
embora os demais edifícios não
apresentem as mesmas características. A
mesma ambiência é evocada, mas não se
cumpre.
Fotos da autora
Quem caminha por essa calçada que
margeia a residência da Polícia Federal
percebe com nitidez os edifícios que estão
do outro lado da rua, graças à reiterada
preocupação que demonstram com recuos
e jogos de cheios e de vazios nos térreos,
permitindo assim a impressão de
Fonte: fotos da autora
generosa espacialidade.
A atenção se fixa nessa permeabilidade
visual do outro lado da rua até mesmo
porque a presença de um muro fechando
parte da residência analisada induz a
procurar o vazio.
Fazendo o percurso de volta, ao
encontrarmos a Rua Alagoas deparamonos com interessante situação
desencadeada pela presença do Edifício
Itagoas (esquina Ruas Itacolomi e Alagoas,
n. 212). Este não apresenta gradis de
Fonte: foto da autora
11
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
Observando-se o outro lado da Alagoas, a
demonstrar que marcam presença
exploração de passarelas e passeios no
pertencem ao rol daqueles outros de valor
partir da referência do Itagoas, a
espaço privado dos edifícios conversa com
o espaço público.
significativa no ambiente construído e não
consagrado. O objetivo foi o de ressaltar
que na análise percetiva do espaço
urbano, o conjunto das características que
formam a ambiência é crucial e
necessário.
REFERÊNCIAS
1
MONEO, Rafael. Rafael Moneo 1967 2004.
Fonte: foto da autora
Imperative anthology. Madrid, El Croquis
Editorial, 2005.
2
Conclusões
MONEO, Rafael. Id. ibid., pp.: 23.
A paisagem urbana percebida se forma a
3
características são proporcionadas pela
MACEDO, Silvio Soares de. São Paulo.
partir de um conjunto, característico. Estas
estrutura morfológica urbana, a vialidade,
a forma específica acumulada
historicamente de implantação das
Paisagem e habitação (Tese de doutorado).
São Paulo, FAUUSP, 1988.
edificações, o mobiliário e equipamentos
4
muitos revelam densidade histórica
MACEDO, Silvio Soares de. ibid., pp.: 60.
acadêmico que despertam, uma vez
5
Este trabalho tratou de identificar, na
Riegl e sua posição relativa à qualidade do
edifícios reconhecidamente de interesse.
Ignasi, apud NESBITT, Kate (org.). Uma
fotograficamente estes edifícios de
antologia teórica (1965-1995). São Paulo,
urbanos e os edifícios. Dentre os últimos,
agregada pela autoria, pelo interesse
identificados e devidamente registrados.
trilha Itacolomi, alguns destes elementos e
antigo é mencionada em Solà-Morales,
Tratou também de analisar
nova agenda para a Arquitetura -
interesse e sua presença na paisagem.
Cosac Naify, 2006.
Entretanto, o trabalho enfocou também a
análise de outros edifícios, que não detêm
este reconhecimento ou valor intrínseco.
Caso dos edifícios Icaraí e Amaralina,
destacados pela análise, a fim de
BERMAN, MArshal. Tudo o que é sólido
desmancha no ar. A aventura da
12
III FÓRUM DE PESQUISA FAU.MACKENZIE I 2007
modernidade. São Paulo, Cia. das Letras,
1997.
13
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