Anais do XX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do V Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 22 e 23 de setembro de 2015 SOLIDARIEDADE NA FORMA ATIVA Debora Cavalcante Santos Manoel Lemes da Silva Neto Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Centro de Ciências Exatas, Ambientais e de Tecnologia [email protected] Grupo de pesquisa: Requalificação Urbana Centro de Ciências Exatas, Ambientais e de Tecnologia [email protected] Resumo: O urbanismo moderno, assim como a arquitetura moderna, no contexto do período pósgrandes guerras mundiais e do acelerado desenvolvimento da industrialização, foram buscar soluções para a vida nas cidades alavancadas nas necessidades humanas desde que correspondessem a modelos econômicos e políticos pré-estabelecidos, hegemônicos; gerando assim, planos racionalistas e generalistas para a concepção das cidades. Partindo da análise da crítica a esse modernismo, tendo como base as formulações teóricas do grupo chamado Team X e a concepção de forma coletiva de Fumihiko Maki, buscou-se conceituar a forma ativa; termo inicialmente proposto pelo arquiteto José Cláudio Gomês. Palavras-chave: Team X, forma-coletiva, forma-ativa Área do Conhecimento: Arquitetura e Urbanismo – Planejamento Urbano – CNPq. 1. INTRODUÇÃO O fim do século XVIII e inicio do XIX foram marcados pela Primeira Revolução Industrial, que teve como consequência uma mudança drástica na configuração das cidades. Estas deixaram de ser a morada de poucos, para abrigar um contingente de pessoas vindas do campo. As cidades medievais não estavam preparadas estruturalmente para atender a essas novas demandas, não só de população, mas as geradas pelo novo modo de produção. Por consequência gerou-se um espaço urbano caótico que virou alvo de críticas, e iniciou a ciência que posteriormente seria conhecida como urbanismo. Uma das vertentes de análise deste urbanismo era um modelo calcado no racionalismo, e que via a era industrial como um momento de ruptura com o passado. A essa corrente Choay [1], deu a denominação de urbanismo progressista, que posteriormente ficou conhecido como modernismo. 2. Urbanismo progressista, a cidade moderna O urbanismo progressista teve como primeira expressão “La cité industrielle”, de Tony Garnier, uma obra que além de uma introdução, apresentava uma série de desenhos que ilustrariam a ideia dessa nova cidade industrial. Tal obra teve grande repercussão, e a primeira geração de arquitetos racionalistas foi diretamente influenciada por ela. Todavia, foi apenas com o fim da Primeira Guerra Mundial, em 1914, que esses arquitetos puderam dar demonstração finalizada do modelo. Os principais pesquisadores e formuladores dessa nova imagem de cidade, nesse primeiro momento, foram, segundo Choay [1], J.P. Oud, G. Rietveld e C. Van Eesteren, nos Países Baixos, Bauhaus e Gropius, na Alemanha, os construtivistas na Rússia, e Le Corbusier na França. É possível notar que esse novo modelo teve expressão em diversos países, que mesmo com divergentes cenários políticos e econômicos, produziram imagens semelhantes da nova cidade. Sendo assim, em 1928, foram fundados os Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna, ou CIAM, que passaram a ser o órgão internacional de discussão e difusão da arquitetura e urbanismo modernos. Foi no Congresso de 1933, após a análise de trinta e três cidades, que foi elaborada a Carta de Atenas, que se propunha apresentar as doutrinas desse grupo para a formulação das cidades. A Carta de Atenas, redigida por Le Corbusier, pressupunha a formulação de um modelo que poderia ser aplicado universalmente, e que era baseado na divisão da cidade pelas funções tipo: habitar, circular, trabalhar e recrear-se; essas funções correspondiam às necessidades essenciais do homem-tipo. Para atingir e garantir que tais necessidades fossem atendidas os modernistas irão se valer na Carta de Atenas de dois principais instrumentos: uma legislação de ocupação do solo, por eles denominada “Estatuto do Solo”, que registraria a localização e tamanho de cada função na urbe; e os recursos da técnica moderna, que permitiriam melhor aproveitamento do espaço e níveis adequados de higiene. Anais do XX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do V Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 22 e 23 de setembro de 2015 3. O fim dos CIAM e a crítica à cidade moderna Os CIAM foram inicialmente propostos por Le Corbusier, que é considerado um dos maiores defensores do modernismo como um modelo universal a ser aplicado em toda a Europa. Essa proposição de uma organização de arquitetos internacional cujo objetivo era discutir a arquitetura moderna tinha, segundo Barone [2], um caráter de colocar o movimento como hegemônico. Com temas centralizados na habitação social e na cidade funcional, os CIAM, através de seus documentos oficiais, pareciam apresentar uma visão hegemônica e unificada do que deveria ser a imagem da nova cidade. Todavia, Barone [2] nos mostra, através de uma analise mais aprofundada, que o desenvolvimento deles ocorreu de forma diferente da divulgação oficial. Marcados por disputas entre grupos de liderança interna os primeiros congressos basearam-se na discussão do tema Habitat. Porém, a saída do grupo alemão em 1933, possibilitou a ascensão da oposição, e o próximo encontro foi caracterizado pela discussão da cidade sobre preceitos abstratos. O produto deste encontro foi a Carta de Atenas, que se tornou foco da crítica ao movimento moderno, fazendo oposição aos preceitos nela colocados. Assim, os próximos CIAM, que se caracterizam pela participação de uma nova geração desenvolveu a discussão da cidade funcionalista, que esse novo grupo de arquitetos, posteriormente conhecidos como Team X, passaram a questionar. Em 1956 os congressos tiveram sua ultima edição, porém a critica que deles se originaria e da qual eles eram alvos iria persistir. Essa critica é classificada por Choay [1] em três principais vertentes: • • “a localização humana como enraizamento espaço temporal: um urbanismo de continuidade”, que teve como promotor o biólogo Patrick Geddes, cujo discípulo foi L. Mumford. “o ponto de vista da higiene mental: defesa e ilustração do asfalto”. Foram representantes dela L. Duhl, D. Resman e Jane Jacobs, essa ultima considerada polemista, e cuja obra “Morte e vida de grades cidades” obteve grande impacto ao, como ela coloca, “atacar os fundamentos do planejamento moderno”. • “por uma analise estrutural da percepção urbana”. Que teve como expoente Kevin Lynch. Todavia outros teóricos fizeram importantes contribuições e não foram citados por Choay, estando entre eles Aldo Rossi, que contribuiu com nova carga teórica para a área de planejamento urbano. 4. TEAM X Composto por jovens arquitetos de diferentes países, a origem do grupo decorreu da percepção por parte destes da necessidade de se discutir a humanização dos espaços modernistas. Esse conceito de humanização era por eles entendido, de acordo com Barone [2], como a possibilidade de incorporar a “questão das inter-relações sociais no espaço construído”. As necessidade humanas deixariam de ser reduzidas a necessidades tipo universais, mas decorriam das características locais e culturais. A atuação do grupo é periodizada entre 1954 e 1984, período em que foram realizadas importantes discussões e contribuições acerca do espaço urbano e sua relação com o ser humano. Barone distingue este período em três momentos diferentes: • 1954 a 1959, marcado pela influência dos CIAM • 1959 a 1962, em que se afirmou como grupo • 1962 a 1984, período em que se dividiu em três vertentes. É importante colocar que os arquitetos do Team X, influenciados pelo Estado do bem estar social, puderam atuar no âmbito social. E em alguns casos produziram projetos de ordem participativa. 5. A forma coletiva de Fumihiko Maki Após a análise dos espaços urbanos de sua época, Maki [3] percebeu o caráter complexo destes, resultantes de múltiplas formas de relação entre os indivíduos e o espaço e a capacidade cada vez mais rápida de transformação deste. Por conseguinte, ele também não considera a adoção de um “plano mestre”, no caso o plano universal proposto por Corbusier, mas propõe a aplicação de um “programa mestre”. Este apresentaria várias alternativas para se alcançar metas pré-estabelecidas. Essas conclusões levaram Maki a pesquisar a natureza da “forma coletiva”, que era por ele definida Anais do XX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do V Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 22 e 23 de setembro de 2015 como a representação de “um grupo de edifícios, ou quase-edifícios – os segmentos das nossas cidades”. Existe, de acordo com ele, uma rica coleção de formas coletivas na arquitetura vernácula, como por exemplo, as cidades em ilhas gregas. Para título de sua pesquisa, ele classifica a abordagem da forma coletiva em três vertentes: forma de composição, as megaestruturas e a forma de grupo. Outro conceito, o importante para entender a forma coletiva, é o chamado de linkage, que consiste basicamente no ato de fazer ligação. Contudo esta pode ser realizada de muitas formas (por mediação, repetição, definição etc), e apesar de poder ter um caráter sutil, esse ato não é simples. Maki nós dá exemplos em que as ligações estão implícitas e outros em que são ligações físicas. As vilas agrárias japonesas, por exemplo, se ligam visualmente pela morfologia das habitações e por se estruturar a partir de um eixo central. Por fim, o ato de ligar é inerente à forma coletiva, e os modos de faze-los podem se apresentar a nós, arquitetos e urbanistas, por meio de uma observação mais assídua das relações que ocorrem nas cidades, e mesmo fora delas. 6. Forma Ativa O objetivo deste artigo era chegar ao conceito de “forma ativa”, proposto pioneiramente por José Cláudio Gomes [4], a partir da analise da historiografia da crítica ao modernismo com ênfase na atuação do Team X e a forma coletiva de Maki. Em decorrência dessas análises entendemos forma ativa como formas que são decorrentes de um empirismo coletivo, abrigam e promovem relações humanas, possuindo um caráter coletivo, unificado, mas ao mesmo tempo complexo. Tomamos como exemplo as favelas, estas são resultado de apropriação do espaço por parte da população, os ambientes abrigam diversas inter-relações, e tipologias de espaço, pois são produto do próprio usuário. Entra aqui a questão de como o urbanista pode conceber um projeto tendo como objetivo a forma ativa. Isso, se puder ocorrer, só será possível através de projetos que priorizem a participação da população interessada, criando espaços de diferentes níveis de classificação, como espaços de transição. Se definirmos por solidariedade o reconhecimento da dificuldade do outro e a ação de modificar sua realidade, vemos na forma ativa uma oportunidade de transformar espaços urbanos e realidades mais delicadas. Se definirmos também forma ativa como formas carregadas de dinamismo, relação com a cidade e vivência por parte dos cidadãos do espaço urbano, essa se tornará uma ferramenta importante no cenário do planejamento urbano. Muitos dos projetos urbanos realizados atualmente não levam em consideração a realidade da intervenção, ou decorrem de um processo que vai de cima para baixo, em que o que o planejador considera ser prioridade para uma comunidade pode não ser. Algumas experiências de projetos de ordem participativa foram realizados no Brasil, e obtiveram bons resultados. Ressaltamos aqui o trabalho dos mutirões auto-gestionários para a construção de habitações de interesse social, com assessoria técnica de escritórios como o Usina; ou também o trabalho realizado por Eleusina Freitas [5], para recuperar conjuntos habitacionais realizados pelos Planos de Habitação imediata, buscando reforçar neles o caráter de comunidade. Diante do cenário atual do planejamento urbano, ainda tão marcado por interesses políticos e econômicos, pela especulação e alienação do habitante, é necessário repensar os modos de se fazer o planejamento, tendo como referências as formas coletivas espontâneas ricas em ligações, relações e formas de apropriação, deixando de produzir formas estáticas nas cidades, mas formas ativas, que propiciem as vivências urbanas, e estas só podem ser alcançadas se levarmos em conta quem tornará ativos estes espaços. AGRADECIMENTOS Deixo aqui meus agradecimentos a meu orientador, Manoel, pela paciência e pela oportunidade de trabalhar com esta temática; e a professora Nelly, pela vivacidade, apoio e animação mostrados e que são contagiantes. Agradeço também a reitoria, pela bolsa que me auxiliou muito durante a pesquisa. E por fim agradeço ao meu amigo para que eu pudesse dar continuidade aos meus trabalhos. Á todos eles, meus mais sinceros agradecimentos. REFERÊNCIAS [1] CHOAY, Françoise. O urbanismo: utopias e realidades, uma antologia. 7ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2013. Anais do XX Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do V Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 22 e 23 de setembro de 2015 [2] BARONE, Ana Cláudia Castilho. Team 10: arquitetura como critica. 1ª ed. São Paulo: Annablume: Fapesp, 2002. [3] MAKI, Fumihiko. Investigations in collective form. St. Louis. School of architecture – Washington University. Junho de 1964. Disponível em: http://library.wustl.edu/units/spec/archives/fotos/ maki/ Acesso em: 14 fev. 2014. [4] GOMES, J. C. Aproximações à forma urbana. Bauru: DAUP-FAAC/UNESP-Bauru, dez. 1996 Mimeo. (Relatório de pesquisa). [5] FREITAS, Eleusina Lavôr Holanda de. Como qualificar conjuntos habitacionais populares. Dissertação de mestrado. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, 2002.