Produção Social da Fome e do Desemprego. Ou, questão agrária no capitalismo dependente.
PRODUÇÃO SOCIAL DA FOME E DO DESEMPREGO.
OU, QUESTÃO AGRÁRIA NO CAPITALISMO DEPENDENTE.
Cristiano Apolucena Cabral1
“Os pobres vão possuir a terra e deleitar-se com paz abundante.” Salmo 37,11.
RESUMO
A situação agrária brasileira, misturando modelos pré-capitalista e capitalista de organização, produção e divisão do
trabalho e territorial, produz a desestruturação social como a fome, o desemprego e a intensificação no trabalho. Esta
estrutura agrária sob os determinismos geopolítico e econômico da globalização imperialista favorece o
aprofundamento das contradições sócio-político-econômico no Brasil, excluindo milhares de pessoas da possibilidade
de comer e/ou comer bem e de trabalhar garantido pelos direitos.
PALAVRAS-CHAVES: questão agrária, capitalismo, fome, emprego, desumanização.
ABSTRACT
The situation of Brazilian agriculture, mixing models pre-capitalist and capitalist organization, production and division
of labor and land, produces social disruption such as hunger, unemployment and work intensification. The agrarian
structure in the geopolitical and economic determinism of imperialist globalization favors the deepening contradictions
of political and socio-economic development in Brazil, thousands of people excluding the possibility of eating and / or
eating well and working for the rights guaranteed.
KEYWORDS: agrarian question, capitalism, hunger, employment, dehumanization.
______________________
1 Professor especialista. Graduado em Filosofia, com especialização em Sociologia e Educação. [email protected].
INTRODUÇÃO
IMPERIALISMO/NEOCOLONIANISMO.
Ao viver em mundo cujo imperativo é a
produtividade e consequentemente a lucratividade,
esquece-se da condição e existência humana: sua vida
psicológica, fisiológica, social, cultural, política e
econômica. Não somente de uma pequena parcela da
humanidade, mas em sua totalidade. Assim, questionase onde se localiza a importância do homem e da mulher
neste sistema capitalista? Aquele e aquela são o fim de
um projeto ou são meios para outra finalidade (o lucro)?
Porém, pela abrangência de situações possíveis
de ser analisadas, partiremos do locus campo/questão
agrária1 para defender a tese de que o ser humano se
tornou secundário (ou até terciário) no sistema hodierno
e metabólico. Assim, se analisará desde a estrutura
capitalista que serve de ‘respaldo’ à estrutura agrária
brasileira, percorrendo pela produtividade e a situação
do trabalho nesta estrutura e finalizando com a
desestruturação social consequencial produzida.
Portanto, o pretexto é mostrar o quanto a
estrutura agrária brasileira produz desigualdades, fome,
desemprego e situações desumanas/inumanas ao
camponês.
Antes de qualquer coisa, tem-se que pensar que
no sistema capitalista o único imperativo é o lucro. E
todo resto é mediação àquela finalidade. E ainda, tem-se
que observar que em uma estrutura econômica global, o
Brasil é um país semiperiférico. Não faz parte do núcleo
orgânico, do centro de decisões político-econômico
mundiais. Assim, a economia política brasileira ‘sofre’
os ditames das economias ‘fortes’. E como vivemos sob
o Sol do neoliberalismo, é o Mercado - as transnacionais
- o que dita as regras.
Assim sendo, a nossa economia e política do
campo estão presas a esta condição ‘natural’ do
capitalismo contemporâneo. Estas transnacionais são a
ameaça aos países pobres ou ‘emergentes’, como o
Brasil, no sentido econômico, político e social. Então,
“o grande interesse das transnacionais de alimentos em
se instalarem nos países do terceiro mundo não é
somente uma estratégia para controlar a produção, a
comercialização e a monopolização das técnicas
agrícolas e dos insumos (defensivos agrícolas,
fertilizantes e sementes). Três outros fatores abundantes
e baratos as atraem: a mão-de-obra, as matériasprimas e a terra”2 .
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ISSN 1984-431X
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Produção Social da Fome e do Desemprego. Ou, questão agrária no capitalismo dependente.
É a partir do poder e interesses que as
transnacionais têm no país que se saberá qual o rumo
que este irá levar, as decisões queira tomar.
Porém, sendo o Brasil um país semi-periférico,
subdesenvolvido e dependente há uma fragilidade
econômica interna que o ‘força’ a priorizar à
exportação. Assim, nossa economia possui uma práxis
prioritariamente ao mercado externo. É assim que
pensam e agem os donos dos capitais estrangeiros que
decidem investir em um país como o Brasil: “O
programa de mecanização deu um novo passo, no
último terço da década de 1950, quando se inseriu no
conjunto de metas do governo federal a criação no país
de uma indústria de tratores e máquinas agrícolas.
Foram oferecidas aos investidores estrangeiros
vantagens tais como a importação sem cobertura
cambial de máquinas-ferramentas, isenções de tarifas
aduaneiras, além de cambio favorecido para as
amortizações e juros de financiamento”3.
Ainda pode-se utilizar outra citação mais
emblemática: “A agroindústria canavieira hoje é parte
dessa constituição sociometabólica do capital. Um
ramo de atividade movido pela lógica do capital
transnacionalizado, onde mega grupos econômicos
dominam o mercado por meio de verdadeiros
oligopólios. Multinacionais, fundos de investimentos e
consórcios de empresários já colocaram bilhões de
dólares no setor canavicultor...” 4
Estas transnacionais determinam o rumo
político e econômico (consequentemente o social) no
Brasil. Exemplo é a posição de neocolônia do país
suprindo as necessidades de Império e sub-impérios
modernos. Desta forma, ao invés de o Brasil priorizar a
produção agrícola de alimentos, busca a produção de
exportação: soja, algodão, gado.
Enquanto isto, a produção de subsistência é
inferiorizada e descartada como um importante setor de
produção, consumo e lucro. Como o Brasil, ou melhor,
a economia agrária brasileira, se tornou propriamente
capitalista (o agronegócio) esta economia tem que estar
submissa a toda estrutura de uma economia capitalista:
deixar de lado a subsistência do humano (nacional) e
valorizar a subsistência do Mercado (nacional e
internacional).
E esta economia, ou mercado, de exportação é
antiga, tal como é antiga a dependência do Brasil aos
países do centro decisório no mundo, como denuncia
Josué de Castro: “Aventura desdobrada, em ciclos
sucessivos de economia destrutiva ou, pelo menos
desequilibrante da saúde econômica da nação: o do
pau-brasil, o da cana de açúcar, o da caça ao índio, o
da mineração, o da ‘lavoura nômade’, o do café, o da
extração de borracha e, o de certo tipo de
industrialização artificial, baseada no ficcionismo das
barreiras alfandegárias e no regime de inflação. É
sempre o mesmo espírito aventureiro se insinuando,
impulsionando, mas logo a seguir, corrompendo os
processos de criação de riqueza no país” 5.
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11
ESTRUTURA AGRÁRIA.
É assim que se analisará aqui a estrutura
agrária do país. A partir de suas condições de
dependência ao centro orgânico e de um país
subdesenvolvido que se apressa a tornar uma potência
econômica. Pois o Brasil, desde sua invasão em 1500,
ou propriamente a partir da década de 1530, se torna um
país latifundiário6 e exportador à Metrópole e à
Inglaterra, prioritariamente. Enquanto a relevância à
produção para as necessidades internas são
marginalizadas. Aqui analisar-se-á três causas da fome e
desemprego, apesar que existem outras causas, dentro
do ‘mundo agrário’.
É na continuidade histórico (nos sentidos
político e econômico) e cultural que o Brasil se mantém
até os dias de hoje como país latifundiário: “Censo
agropecuário, divulgado recentemente pelo IBGE,
abrangendo um ciclo iniciado em 1995 e encerrado em
2006... os pobres do campo – neste conjunto, incluídos
aqueles que possuem propriedades inferiores a 10
hectares – tiveram a propriedade de suas áreas
reduzidas de 9,9 milhões para 7,7 milhões de hectares,
representando apenas 2,7% de todas as propriedades
agrícolas do país. Por outro lado, 31.889 fazendeiros,
possuidores de propriedade com extenções acima de
mil hectares, respondem pela titularidade de 98 milhões
de hectares. Voltados exclusivamente para o
agronegócio, temos ainda 15.012 proprietários (1% do
total dos estabelecimentos), com propriedades acima de
2.500 hectares, representando 46% do total de todas as
terras” 7.
Ou ainda, “26 mil latifundiários detêm
fazendas... num total de 200 milhões de hectares...
tamanho equivalente ao que a china dispõe para
alimentar sua população de 1,3 bilhões de bocas... 7
vezes mais bocas do que as nossas...”8.
Esta estrutura de concentração de terras em
mãos de uma ínfima minoria de proprietários é apenas
uma das causas de fome e desemprego no país (como se
verá adiante); outra causa é a existência do agronegócio.
O Brasil ainda mantém em sua estrutura agrária um
aspecto (virtualmente) feudal e um aspecto
(concretamente) capitalista. O primeiro vive de renda
e/ou ociosidade enquanto o segundo vive de intensa 9 e
extensa produtividade, além de alto nível de
concentração e centralização de capitais 10. “Se o
capitalismo vive de formas econômicas nãocapitalistas, vive, a bem dizer, e mais exatamente, da
ruína dessas formas. Necessitando obrigatoriamente do
meio não-capitalista para a acumulação, dele carece
como meio nutriente, à custa do qual a acumulação se
realiza por absorção”11.
A condição de implementação do capitalismo
em qualquer área de produção (campo ou cidade) é metabólica: está presente em todas as categorias da vida
humana: religiosa, cultural, social, política e econômica.
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Produção Social da Fome e do Desemprego. Ou, questão agrária no capitalismo dependente.
E neste imperativo de sobrevivência está o objetivo final: o lucro (e mais lucro). Assim, a concentração de
terras, água e meios de produção (máquinas, agroindústrias, comércio, armazéns, insumos industriais) se faz
por necessário, ou mediação, para tal objetivo.
A
assim
chamada
modernização/
industrialização no campo, iniciada por Juscelino
Kubitschek, fizeram que as políticas públicas olhassem
fixamente ao campo, juntamente com uma
reorganização do trabalho. É pelo investimento no
campo que o setor agropecuário, por exemplo, teve um
aumento no PIB de 26,2%, no inicio do século XXI,
sendo mais elevados que as décadas de 1900 à 197012.
Por ano, o agronegócio recebe em média R$ 70
bilhões. E no campo, dos “5,2 milhões de proprietários
existentes, somente 920 mil obtiveram financiamentos
para a produção. Dos que não foram beneficiados
foram 3,63 milhões (85, 42%) são pequenas
propriedades. As grandes captaram 43,6% dos
recursos”13. Demonstrando, assim, a concentração de
capital/investimento, denunciando a sua desigualdade.
Apesar, do alto investimento e do ‘alto’ lucro
obtido pelo agronegócio, a dívida deste é cada vez mais
volumosa, eis um exemplo emblemático de uma das
regiões com maiores índices de produtividade: “No
intuito de se livrar do peso do financiamento, o governo
propôs a securitização da dívida até o limite de 200 mil
reais. Não obstante, os agricultores alegam que 80%
dos produtores de Mato Grosso, que respondem por
80% da produção possuem dívidas acima deste limite”
9
.
Além, de dívida criada, somente aumentando a
dívida pública14, a diferença do lucro bruto (R$ 84
bilhões em 2009) do lucro líquido (R$ 64 bilhões) do
agronegócio é mínimo (R$ 20 bilhões) em relação à
agricultura familiar7 e aos desastres sociais e naturais.
E terceira e última causa da fome e desemprego
é a ausência de uma reforma agrária, mesmo já prevista
pela Constituição da República Federativa do Brasil 15.
Como já foi acima exposto, a situação de concentração
de terras e meios de produção esta encarnada na história
deste país tanto pelo período colonial quanto o
neocolonial. Assim, os detentores dos poderes
midiáticos, econômico, financeiro e político não
deixarão (em bom grado) que as terras previstas pela
Constituição sejam repassadas aos pobres e excluídos
criados pelo mesmo sistema.
Isto, mesmo sendo um modelo agrário de
produção relevante para a nação e o próprio
desenvolvimento capitalista (porém mais abrangente e
não há uma pequena elite).
“Para a agricultura familiar, responsável pela
produção de mais de 80% dos alimentos que chegam à
nossa mesa diariamente, foram destinados apenas R$ 6
bilhões de crédito, que ainda assim produziram R$ 50
dos 141 bilhões do Valor Bruto da Produção agrícola
de 2006, ocupando uma reduzida área de 7 milhões de
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12
hectares com o plantio de arroz, feijão, mandioca, trigo
etc7.
As contradições sociais emanadas das
contradições deste sistema capitalista são visíveis aos
olhos minimamente humanizados. Pois16 75,7% do total
das áreas de produção pertencem ao agronegócio
enquanto os outros 24,3% pertencem à agricultura
familiar. Neste mesmo espaço existem 15,6% de
proprietários para o agronegócio e 84, 4% para a
agricultura familiar. A desigualdade na divisão e
apropriação de terras e investimentos torna-se
vergonhosa a partir da situação calamitosa em que está
o Brasil.
É neste pequeno espaço de terra que se produz
38% do Valor Bruto de Produção sendo 62% de VBP
para 75, 7% da área. Relativamente, os 15, 6%
produzem mais como demonstra outro dado do MDS: a
agricultura familiar produz R$ 677 ha/ano, enquanto o
agronegócio produz R$ 358 ha/ano, denunciando,
assim, a ociosidade de boa parte das terras do
agronegócio.
E para terminar esta exposição comparativa, a
agricultura familiar produz boa percentagem de
produtos do campo: 87% da mandioca, 70% do feijão,
46% do milho, 38% do café, 34% do arroz, 21% do
trigo, 16% da soja, 58% do leite, 50% de aves, 59% dos
suínos, 30% dos bovinos.
Esta contradição – o que mais produz e
sustenta o país é desvalorizado – faz parte da própria
estrutura do capital, pois o problema não é
contingencial, é estrutural, pois faz parte da própria
essência deste modelo marginalizar grande quantidade
da população aos benefícios humanos maximizando o
aproveitamento da burguesia. E por esta deficiência
estrutural se cria estas três causas para a produção da
fome e desemprego.
DESESTRUTURAÇÃO SOCIAL: DESEMPREGO
E FOME.
Como foi anunciada acima, a estruturação
capitalista industrial e financeira no campo –
agronegócio – trouxe consigo alguns imperativos que
determinam nocividade à estrutura social (em seu todo)
e natural17.
A produção de commodities, as quais se
utilizam de espaço extenso e trabalho intenso – leva o
país a desfigurar o seu locus agrário. Por ser,
prioritariamente, uma mercadoria de exportação, preso a
valores internacionais e que precisa de alta
produtividade este modelo de produção elevam os
preços de produtos para consumo interno, como
alimentos. Como se observou acima, o tamanho da área
de produção da agricultura familiar – a qual produz
grande parte de nossos alimentos – é ¼ do total,
enquanto a de produção de commodities e de terras
ociosas são os outros ¾ da área. E como a produtividade
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Produção Social da Fome e do Desemprego. Ou, questão agrária no capitalismo dependente.
é pequena em relação à massa demográfica do país, os
preços se mantêm altos. É a lei da oferta e procura.
Outro fator de aumento de preços é a presença
de transnacionais no campo brasileiro: “O preço do
feijão subiu nada menos do que 125% de janeiro de
2006 a abril de 2008... Já a alta do arroz ficou em 20%
e a do leite, em 28%. Um dos fatores que tem
contribuído para esse aumento é o domínio das
transnacionais no setor agrícola brasileiro e mundial...
Embora o agronegócio não produza a maior parte dos
alimentos possui a maior parte das terras agricultáveis,
usando-as principalmente para a produção de soja,
eucalipto e cana-de-açúcar. Esses produtos visam...
atender às necessidades dos países ricos, seja para
fornecer ração para agropecuária (soja) ou para o
abastecimento de celulose (eucalipto) e etanol (cana) –
não são destinados à alimentação” 18.
O maior pensador brasileiro sobre a fome,
Josué de Castro, em um de seus livros denunciadores,
afirmava: “a fome no Brasil, que perdura, apesar dos
enormes progressos alcançados em vários setores de
nossas atividades, é consequência, antes de tudo, de seu
passado histórico”5. E não como alguns ‘intelectuais’
que expõem como um problema de tal ou tal governo
(sem descartar sua relevância relativa) ou defendendo o
pensamento liberal individualista afirmando ser ‘culpa’
do incapaz que não tem vontade própria para superar
sua fome.
O número de miseráveis, hoje, no Brasil,
segundo dados do IBGE 19, são de 16, 2 milhões de
brasileiros (8,5% da população do país). Destes 46,7%
estão na zona rural enquanto 53,3% estão na zona
urbana. Isto sem contar a população que vive com até
metade de um salário mínimo ou até um salário mínimo:
se este valor seria o suficiente para escapar da fome 2
com preços altos motivados pela inflação e pela lei de
oferta e procura?
Hoje, o modelo econômico do país prioriza a
produção de rações para gado, combustíveis para
automóveis, e alimentação de outras nações enquanto a
própria população vive na miséria ou pobreza financeira
e de alimentos.
Outra consequência desta estrutura agrária é o
desemprego, intensificação da exploração no trabalho e
o trabalho escravo. Em efeito de comparação, o
agronegócio emprega16, em 75,7% da área do país, 4,2
milhões (25,6% do total empregado no campo) do
pessoal empregado, enquanto a agricultura familiar
emprega, em 24,3% da área de produção no país, 12,3
milhões (74,4% do total empregado no campo). Ou
ainda, são 15,3 pessoas a cada 100 hectares na
agricultura familiar, enquanto no agronegócio são 1,7
pessoas a cada 100 hectares.
Como foi anunciado acima, quando um
organismo ou estrutura social se torna capitalista logo se
transubstancia toda a sua ‘natureza’. Assim, quando a
estrutura de produção no campo se torna um
agronegócio, esta natureza se faz presente: pelo
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13
aumento de mecanização, o qual troca o homem pela
máquina,
desempregando-o
em
quantidades
assustadoras, pelo modelo organizacional toyotista, que
flexibiliza, intensifica e ‘enxuga’ a quantidade de
funcionários fazendo com que um trabalhador faça antes
o que cinco faziam p. ex.: antes para cada mil cabeças
de gado precisava-se de um funcionário, hoje são para
cada cinco mil cabeças, juntamente com as metas
estabelecidas por qualquer empresa capitalista
neoliberal, por exemplo: “O ritmo de trabalho tem sido
dado pelas metas de produtividade que as usinas
exigem dos trabalhadores. Na década de 1990, a
exigência era de cinco a oito toneladas de cana cortada
por dia; depois de 1990 passa a ser oito a nove,
chegando em 2004 com 12 a 15 toneladas/dia” 4.
E, ainda, em relação ao desemprego: “Entre
novembro de 2008 de fevereiro deste ano [2009], o
setor foi responsável pela demissão de mais de 270 mil
trabalhadores. O volume supera em 8 mil o número de
dispensados pelo segundo lugar da lista, a indústria de
transformação. Comercio e serviços demitiram 145
mil” 20.
E para ficar mais expositiva todo o complexo
desumano desta realidade de exploração intensificada,
nem a renda do trabalhador o liberta: “um cortador de
cana recebe R$ 3,00 por tonelada de cana cortada – no
Estado de São Paulo a média é ainda menor: R$ 2,50...
– e que o preço do feijão está a R$ 6,00...”21.
A renda do trabalhador do campo é minimizada
ao necessário à sua sobrevivência. O trabalhadormáquina e/ou trabalhador-mercadoria sofre uma
diferenciação produzindo uma ‘aristocracia de
trabalhadores’ entre cidade e campo, a partir da renda
do trabalho e sua possibilidade de consumo: “Quanto
aos ganhos reais de salário, verificou-se que no período
de 1992-2005, eles foram de 34,5% para os
empregados permanentes com residência urbana, de
17,6% para permanentes rurais, de 47, 6% para os
temporários urbanos e de 37,2% para os temporários
rurais. Ainda de acordo com a PNAD, em 2005, o
salário médio mensal de um empregado permanente
com residência urbana e ocupado na cana-de-açúcar
era de R$% 537,24. Para o permanente rural, era de
R$ 346,95%, ao passo que para os temporários, era de
R$ 436,60 e R$ 309,76, respectivamente, para os
urbanos e os rurais” 4.
A mais-valia é supervalorizada nesta unidade
no campo, tanto na mais-valia relativa quanto na maisvalia absoluta, juntamente de uma organização précapitalista – o que é natural neste modelo de exploração.
Em que, no primeiro existe uma intensificação da
exploração dentro da mesma jornada de trabalho, no
segundo a intensificação depende do aumento da
jornada de trabalho e o último é o trabalho escravo
contemporâneo (que é mais rentável que no Brasil
colonial e imperial).
Todos os três modelos de extração de lucro
deterioram o trabalhador, físico e psicologicamente, eis
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Produção Social da Fome e do Desemprego. Ou, questão agrária no capitalismo dependente.
alguns exemplos: “Os cortadores de cana têm
expectativa de vida menor que a dos escravos do final
do século 19... estima-se que a vida útil dos cortadores
de cana seja de 12 a 15 anos”22. Ou ainda, outro
exemplo em São Paulo onde “em 2007, foram
registradas cinco mortes de migrantes pro excesso de
trabalho nos canaviais do Estado”23. Além deste há as
mortes em acidentes de trabalho: “Em 2005, a
delegacia regional do trabalho registrou 416 mortes
nas usinas do Estado [São Paulo], maioria por
acidentes de trabalho ou em conseqüência de doenças
como parada cardíaca, câncer, além de casos de
trabalhadores carbonizados durante as queimadas” 23.
Estas situações criadas pelo modelo
industrial/capitalista no campo trazem além da fome ou
mau alimentação, situações de exploração intensificada
de emprego, desemprego e o próprio trabalho escravo,
este – a priori, um paradoxo ao sistema capitalista – é
diferenciado do escravismo antigo pelo motivo que este
último é bem mais caro a mercadoria (humano-escravo)
e sua manutenção, enquanto o contemporâneo que é
gratuito. Esta forma de trabalho pré-capitalista
aglutinado a aspectos capitalistas (organização no
trabalho, tecnologia, investimentos, comercialização,
especulação etc) supervaloriza o lucro do neoescravista. Pois a diferenciação entre o trabalho
excedente e o necessário é a nulificação deste, estando o
excedente (trabalho não-pago e criador de mais-valia)
maximizado.
Esta forma de cooptação de trabalho ‘emprega’
milhares de pessoas na zona urbana e rural. E a situação
destes trabalhadores é pior que dos antigos escravos,
pois estes são mercadorias descartáveis, por serem
baratas no mercado de trabalho do exercito de reserva
(lei da oferta e procura). Assim, no ano de 2010 24 foram
denunciados no campo do Brasil 4.578 escravos nesta
situação, dos quais somente 2.914 foram libertados. De
2003 a 2010, tinham 55.386 pessoas envolvidas em
escravidão no campo brasileiro, dos quais foram
resgatados 35.188 trabalhadores escravos.
14
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A questão agrária é um tema de suma
importância pelas consequências desastrosas nos
diversos setores sociais: desemprego rural, êxodo rural
em busca de empregos na cidade, inchaço demográfico
e mais desempregados nas cidades e ainda a ausência de
uma reforma agrária aprofunda esta situação e ainda
produz uma guerra no campo e a criminalização de
movimentos sociais que apenas tentam fazer valer a
Constituição negada pela elite ‘secular’ brasileira. Pois,
há a necessidade, imediata, de uma reforma agrária
completa e efetiva no país, para sanar as condições
criadas pela sua ausência.
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Produção Social da Fome e do Desemprego