PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM EDUCAÇÃO:
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
“EDUCAÇÃO ESPECIAL FRENTE A INCLUSÃO DE JOVENS E
ADULTOS: UM ESTUDO DE CASO”
TELMA CRISTINA FERNANDES CRESPO
SÃO PAULO
2005
TELMA CRISTINA FERNANDES CRESPO
“EDUCAÇÃO ESPECIAL FRENTE A INCLUSÃO DE JOVENS E
ADULTOS: UM ESTUDO DE CASO”
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial para a obtenção
do título de MESTRE em Educação: Psicologia
da Educação, sob a orientação da Profa. Dra.
Marli Eliza Dalmazo Afonso de André.
SÃO PAULO
MARÇO DE 2005
“EDUCAÇÃO ESPECIAL FRENTE À INCLUSÃO DE JOVENS E
ADULTOS: UM ESTUDO DE CASO”
TELMA CRISTINA FERNANDES CRESPO
DISSERTAÇÃO APROVADA EM __/ __/ 2005.
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Dedico esse trabalho àqueles que dedicam sua vida a incluir pessoas.
Agradecimentos
Agradeço a professora Dra. Marli Eliza Dalmazo Afonso de André, que me
orientou com muita dedicação e cuidado.
As professoras Maria Eloísa Famá D´Antino e Mitsuko Aparecida Makino
Antunes pela inspiração e pelo acolhimento desse trabalho.
As professoras Abigail Alvarenga Mahoney e Laurinda Ramalho de Almeida
que me incentivaram a abraçar esse projeto com a “companhia” de Carl Rogers.
Agradeço aos meus colegas de trabalho, especialmente Vera e Josiane e
professora Graça Freire. Agradeço a professora Vilma Dardengo e José Bessa, pelo
apoio e incentivo.
Aos participantes da pesquisa, pelo acolhimento e pela oportunidade de
aprendizado que me proporcionaram.
Agradeço muito a todos os colegas da Aracê, que me apoiaram nas horas
difíceis, nos momentos de crise...
A minha família, meus pais Luiz e Luiza, minha irmã Tânia e Buguno, pela
força e pelo apoio.
E quero agradecer o incentivo diário, a companhia constante e o amor do
Alexandre Balthazar.
“Os fatos são sempre amigos.”
Carl Ransom Rogers
Resumo
Esta dissertação apresenta um estudo de caso de uma escola de educação especial
de jovens e adultos, com objetivo de identificar como se dão as relações
interpessoais entre professores, alunos, equipe administrativa e equipe
multidisciplinar no cotidiano da escola; detectar se existem e quais são os elementos
facilitadores das inter-relações no processo de inclusão e ensino-aprendizagem de
alunos jovens e adultos com deficiências e identificar quais são as concepções que
a equipe docente e multidisciplinar possui sobre o aluno, sobre a deficiência e sobre
o trabalho pedagógico nessa instituição. A hipótese é de que as relações
interpessoais fazem parte do sustentáculo da superação das desigualdades de
oportunidade no meio escolar que se pretende “inclusivo”, e que, especificamente na
escola de educação especial, possamos encontrar pistas no cotidiano relacional
entre seus participantes, buscando assim, uma contribuição às discussões sobre o
processo de inclusão de pessoas com deficiência no sistema regular de ensino. Para
isso foi realizada uma revisão bibliográfica sobre a problemática e sobre o histórico
da deficiência, da educação especial e da inclusão de alunos com deficiência no
sistema regular de ensino. Carl R. Rogers e a Abordagem Centrada na Pessoa
contribuem para, por meio das condições facilitadoras das relações interpessoais,
elencarmos algumas das categorias de análise da presente pesquisa: Autenticidade,
Aceitação Positiva Incondicional e Compreensão Empática. Durante coleta de dados
tornou-se relevante o suporte teórico sobre Clima Organizacional Escolar, de Luc
Brunet, que complementa a visão das categorias anteriores, incluindo outros
atributos organizacionais, como por exemplo, o papel da direção da escola na
construção de um clima organizacional positivo ou negativo . A pesquisa foi
realizada através de observações no ambiente escolar, entrevista com quatro
professoras e com a diretora da escola. De acordo com os dados coletados, o clima
organizacional escolar é fator importante na construção e implementação de novas
propostas pedagógicas, e o papel da direção escolar configura-se como um
facilitador das relações entre os atores educacionais. Pode-se concluir que, para que
ocorra a inclusão de alunos com deficiência no sistema de ensino regular, esses
fatores devem ser observados, além da formação em serviço do corpo docente e
valorização da equipe escolar.
Palavras-chave: educação especial, jovens e adultos, inclusão.
Abstract
This essay presents a case study from a special education school for young and
elder, with the objective of identifying inter-personal relationship between teachers,
students, administrative crew and a multidisciplinary team during school daily routine;
detecting and pointing out, if there are, inter-relational leveraging elements in the
inclusion process and teaching-learning process from young and elder students with
handicap, and finally grasp the mind-frame the docent and multidisciplinary team
have of the students and their handicaps as well as the pedagogical work in the
institution. The hypothesis is that interpersonal relationship take significant part in
helping overcome the differences of opportunity in the school environment that one
intends to be “inclusive”, and that, specifically in the school of special education, we
can find traces in the daily relations among its participants, so that, it could be a
contribution to the discussions about the inclusion process of handicapped in the
regular school system. A bibliographic review has been done on the presented
problem, on handicap background, on special education as well as on the inclusion
of handicapped students on the regular school system. Carl R. Rogers and the
Person-Centered Approach has contributed by means of the facilitating conditions of
the interpersonal relationships, to outline some of the categories of analysis of the
current research: Authenticity, Positive Unconditional Acceptance and Empathic
Comprehension. During data collection, it has become relevant the theoretical basis
from the School Organizational Environment, from Luc Brunet, that complements the
approach from the categories above, including other organizational attributes such as
the role of the school principal in the development of a positive or negative
organizational environment. The research has been conducted through observation
of the school environment, interviews with four teachers and the school principal.
According to the data collected, the school environment is an important factor in the
development and implementation of new pedagogical approaches and the school
principal role unfolds as the facilitator of the relationship between educational actors.
It may be concluded that for the inclusion of handicapped students in the regular
school system to actually happen those factors should be taken into account, as well
as the technical background of the docent team and valuing the school team.
Keywords: special education, young and elder, inclusion.
SUMÁRIO
Introdução ...................................................................................................................1
1.
EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSÃO..............................................................15
1.1
Conceituações ............................................................................................15
1.2
Constituição Histórica .................................................................................18
1.3
Panorama Atual ..........................................................................................25
2. ESCOLA E DIFERENÇAS .................................................................................33
2.1
As Diferenças na Sala de Aula ...................................................................33
2.2
A Contribuição da Psicologia Humanista de Carl Rogers ...........................38
2.2.1
Autenticidade ou Congruência .............................................................40
2.2.2
Consideração Positiva Incondicional ...................................................42
2.2.3
Compreensão Empática ......................................................................43
3. METODOLOGIA ................................................................................................46
3.1
Estudo de Caso ..........................................................................................46
3.2
Caracterização da Escola ...........................................................................46
3.3
Sujeitos da Pesquisa...................................................................................50
3.4
Procedimentos de Coleta de Dados............................................................51
4. APRESENTAÇÃO DOS DADOS .......................................................................53
4.1
Relações Interpessoais...............................................................................53
4.1.1
Primeiras impressões ..........................................................................53
4.1.2
Uma nova direção................................................................................58
4.1.3
As relações interpessoais nas cenas do cotidiano...............................62
4.2
Elementos Facilitadores das Relações Interpessoais .................................64
4.2.1
O clima organizacional.........................................................................64
4.2.2
O papel da direção...............................................................................67
4.2.3
A construção de um novo projeto pedagógico .....................................70
4.2.4
A escola em crise.................................................................................72
4.3
Concepções das Educadoras sobre Alunos e Trabalho Pedagógico .........75
4.3.1
O aluno e a deficiência ........................................................................75
4.3.2
O trabalho pedagógico.........................................................................77
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................80
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................82
7. ANEXOS ............................................................................................................86
INTRODUÇÃO
Ao revisitar o caminho percorrido, percebo-me investida desde sempre de
expectativas, sonhos, tentativas de auto-superação, busca por respostas a tantas
indagações.
Nesse caminho, fui e sou aluna. E justamente numa sala de aula, com uma
exposição realizada por uma professora, tomei a decisão de investigar o psiquismo
humano.
Durante a graduação em Psicologia, no último ano do curso, busquei o
estágio optativo em Psicologia Social, que consistia no atendimento materno-infantil
num posto de saúde da periferia de Santo André, em São Paulo.
Essa experiência foi marcante e influenciou-me a entrar na educação, pois
enfrentei situações de encontros e desencontros, do planejado ao imprevisto, nas
palavras de Perrenoud, tive que, por muitas vezes “agir na urgência, decidir na
incerteza”1 dentro do processo de grupo.
O objetivo daquele trabalho era proporcionar o esclarecimento, a cooperação,
a profilaxia. Eram formados grupos operativos com mães que vinham ao posto de
saúde em busca de atendimento para si mesmas ou para seus filhos. Nesses grupos
trabalhávamos temas de interesse dessas mães, proporcionando a troca de
experiências e a reflexão sobre os valores subjacentes às ações cotidianas.
Nesse estágio comecei a perceber que a questão da aprendizagem tem
ligação direta com nossos afetos, com a autenticidade, com a compreensão
empática, com a consideração positiva incondicional, condições expostas por Carl
Rogers em sua teoria das inter-relações. Frente a isso, observei na prática que para
1
Perrenoud, P. Agir na urgência, decidir na incerteza. Porto Alegre: Artmed, 2001.
10
que fosse possível a construção de um processo de troca de experiências
significativas, foi preciso a escuta atenta, o colocar-me na posição do outro, a minha
própria autenticidade frente aos temas expostos e frente às situações inesperadas.
Foi uma experiência muito significativa.
Em 2001 iniciei o trabalho no ensino superior, com disciplinas ligadas à
Psicologia, assumi a coordenação de um serviço de atendimento ao aluno e também
atuei como psicóloga, da educação infantil ao ensino médio. Na escola encontrei
expectativas que reforçam a “clinicalização” ou “psicologização” da educação,
novamente a psicologia com efeito instrumentador técnico, “curador”, descolada da
realidade social mais ampla.
No decorrer desses quatro anos, a prática como psicóloga e a prática de
ensino em sala de aula têm promovido um espaço de reflexão e questionamento
sobre a contribuição da Psicologia para a Educação. Tem sido também um espaço
gerador de dúvidas, de angústias, de busca de novas maneiras de olhar o fenômeno
educacional mais amplo.
Durante a atuação como psicóloga, entre tantas questões surgidas na equipe
educacional, algumas questões começaram a “ganhar corpo”: “Como fazer a
inclusão de jovens e adultos com deficiência na escola regular?”, “Onde buscar a
formação dos professores?”
No início da busca por respostas a essas indagações, procurei saber o
percentual de pessoas com deficiências no Brasil. De acordo com dados do IBGE,
em 2000 havia no Brasil cerca de 24,5 milhões de pessoas portadoras de algum tipo
de deficiência física, sensorial, múltipla ou mental, o que representa 14,5% da
população. Desse percentual, 21,6% nunca foram à escola, e do total, 8,3% são
portadores de deficiência mental.
Porém, torna-se importante ressaltar que neste censo do IBGE, as perguntas
para avaliação sobre os diversos tipos de deficiência apresentaram alternativas de
respostas desde “nenhuma dificuldade”, “pouca dificuldade permanente”, “grande
11
dificuldade permanente” até “incapaz”, no que se refere a deficiências sensoriais e
motoras. Quanto à deficiência mental, a pergunta apontava para um tipo de
deficiência permanente limitante das atividades habituais, tendo como alternativas
de resposta somente o sim e o não.
Levando-se em conta os diversos tipos de deficiência, seus diversos graus e
manifestações, pode-se questionar até que ponto os dados obtidos são fidedignos
quanto a real situação da deficiência no Brasil.
Por outro lado, se levarmos em consideração, de acordo com os mesmos
dados que, 21,6% da população que apresenta algum tipo de deficiência nunca foi à
escola, é relevante questionar: quais as dificuldades encontradas para viabilizar a
implementação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (nº 9.394/96),
que defende que “o ensino seja ministrado a todas as crianças, jovens e adultos com
necessidades educativas especiais preferencialmente no sistema comum de
educação”, especificamente para as pessoas com deficiência?
Muito já foi discutido e já sabemos que não basta o aluno com deficiência
apenas freqüentar uma escola do ensino regular, sem que a mesma passe por
alguma transformação.
“O ideal de ‘escola para todos’, acordado pelos Estados do mundo inteiro na
Conferência de Jomtien (Tailândia, 1990), não pode ser entendido como redutor de
‘todos na escola’” (RODRIGUES in RIBEIRO & BAUMEL, 2003, p. 15). Segundo
Rodrigues (idem, 2003, p. 15) “esse importante documento (...) deveria ser objeto de
outra leitura (...) no sentido de que cada aluno encontre na escola os recursos
necessários e adequados à satisfação de suas necessidades educativas.”
A tendência da literatura sobre inclusão atualmente é propor uma revolução
no ensino, buscando adaptá-lo às necessidades de todos os alunos, e não adaptar o
aluno às necessidades da escola, como pensam alguns especialistas da educação.
12
Se a literatura é clara nas suas proposições, na prática há muitas dúvidas
sobre o que fazer, tanto em relação à inclusão nas escolas regulares, quanto no
contexto atual das escolas de educação especial. Por um lado, a escola regular
aponta o despreparo para receber os alunos com deficiência, despreparo este que
vai desde a formação dos profissionais (formação que não contemplou esse aspecto
educacional) até a estrutura física que não permite a adequada acessibilidade para
portadores de deficiência. Por outro lado, a escola de educação especial, com um
modus operandi adquirido já há vários anos, sente-se ameaçada diante da
possibilidade de tamanha mudança, temendo até o seu desaparecimento futuro,
como se essa construção de conhecimento e de práticas de nada tivessem valido,
pois é vista hoje, por muitos profissionais, como “politicamente incorreta”.
Não cabe aqui entrarmos na discussão “escola regular x escola especial”,
mas apontar para um horizonte de possibilidades: não podemos desperdiçar o
conhecimento e a experiência de escolas que se constituíram, por muito tempo,
como únicas alternativas de acesso à educação a uma parcela significativa de
crianças, de jovens e de adultos. Critica-se muito a segregação subjacente a essas
instituições, porém a experiência adquirida não teria a contribuir à discussão da
inclusão?
O que o professor da escola de educação especial tem a dizer ao professor
da escola regular? E o que pode fazer para contribuir com essa realidade?
Sabemos que o cotidiano escolar é muito rico em experiências e, por que não
dizer, nos traz vislumbres de mudanças que virão. Portanto, cabe a questão: “Em
que medida conhecer as práticas cotidianas de uma escola de educação especial
pode contribuir para a discussão da inclusão em escolas de ensino regular?”.
Penso que a prática da inclusão está intimamente ligada às relações
humanas, e pergunto: quais seriam as condições facilitadoras dessas relações?
Como se dão as interações dentro da escola de educação especial?
13
Levanto como hipótese que as relações interpessoais constituem um dos
sustentáculos da superação do tratamento desigual no meio escolar que se pretende
“inclusivo”, e que, especificamente na escola de educação especial, possamos
encontrar pistas extraídas do contexto relacional que possam contribuir às
discussões sobre o processo de inclusão de pessoas com deficiência no sistema
regular de ensino.
Frente a esse panorama, apresento os objetivos dessa pesquisa:
a) Identificar como se dão as relações interpessoais entre professores, alunos,
equipe administrativa e equipe multidisciplinar no cotidiano de uma escola de
educação especial de jovens e adultos.
b) Detectar se existem e quais são os elementos facilitadores das inter-relações
no processo de inclusão e ensino-aprendizagem de alunos jovens e adultos
com deficiências.
c) Identificar quais são as concepções que a equipe docente e multidisciplinar
possui sobre o aluno, sobre a deficiência e sobre o trabalho pedagógico
nessa instituição.
Com esses questionamentos agregados às leituras de diversas fontes,
interessei-me pelo estudo do cotidiano de uma escola de educação especial de
jovens e adultos. A escolha por educação especial de jovens e adultos veio da
constatação dos poucos estudos na área, e da prioridade que é dada ao público
infantil.
14
1. EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSÃO
O objetivo desse capítulo é inserir o problema proposto na literatura
acadêmica atual, através do processo histórico, expondo a visão de diversos autores
acerca da educação especial e da inclusão.
Inicialmente, cabe descrever alguns conceitos que nortearão este estudo.
1.1
Conceituações
Educação Especial, segundo o Art. 3° da Resolução CNE/CEB no. 2, de 11
de setembro de 2001, é:
(...) modalidade da educação escolar, entende-se um processo
educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure
recursos
e
serviços
educacionais
especiais,
organizados
institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em
alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a
garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das
potencialidades dos educandos que apresentam necessidades
educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da
educação básica. (BRASIL, 2001, p. 06)
Analisando o que esta lei propõe, a Educação Especial poderia desempenhar
um papel ativo na concretização da inclusão no ensino regular.
Um segundo conceito fundamental para a contextualização é o de deficiência,
conceito este que através de sua própria evolução contribui para avaliarmos as
dificuldades de entender as necessidades da pessoa com deficiência.
O conceito de deficiência, segundo a Organização Mundial da Saúde:
(...) diz respeito a uma anomalia da estrutura ou da aparência do
corpo humano e do funcionamento de um órgão ou sistema, seja qual
for a sua causa; em princípio, a deficiência constitui uma perturbação
do tipo orgânico” (UNESCO, O Correio da Unesco apud MAZZOTTA,
2003, p. 14)
Cabe ressaltar que as deficiências são categorizadas em: deficiência física,
sensorial (auditiva, visual), mental e múltipla.
Ainda encontramos a conceituação da “Convenção Interamericana para a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de
Deficiência”, ocorrida na Guatemala, em 1999:
O termo ‘deficiência’ significa uma restrição física, mental ou sensorial,
de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de
exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou
agravada pelo ambiente econômico e social.
Há muitas divergências quanto ao uso de termos dentro das diversas fontes
consultadas, de acordo com cada época e de acordo com a evolução das
representações que se construíram (e se constroem) sobre a deficiência.
Segundo Januzzi, “o estigma social que envolve os indivíduos diferentes
impregnará as palavras que o designarem. Será vã a troca que se proceder nesse
sentido, enquanto não houver transformações profundas na estrutura social.” (in
FREITAS, 1997, p. 186)
No contexto deste estudo, concordo com Lígia Assumpção Amaral que, em
seu livro “Conhecendo a deficiência (em companhia de Hércules)”, apresenta
algumas vantagens da escolha do termo “pessoas com deficiência”. Segundo ela:
•
•
•
•
•
a formal verbal acentua o aspecto dinâmico da situação;
desloca o eixo de atributo do indivíduo para sua condição e,
simultaneamente, recupera a pessoa como “sujeito da frase”;
coloca a deficiência não como sinônimo da pessoa (como ocorre ao
tornar substantivo aquilo que é qualificativo);
em conseqüência, tem um caráter mais descritivo que valorativo;
sublinha a unicidade do indivíduo... (1995, p. 61)
Interessante pensarmos como esta autora redimensiona o conceito
“deficiente” para “pessoa com deficiência”. Esta forma de concepção tem
16
ressonância com a essência da Abordagem Centrada na Pessoa, de Carl Rogers,
uma vez que “pessoa” identifica o sujeito e “com deficiência” designa apenas o seu
qualificativo.
Como o objetivo dessa pesquisa está ligado a alunos com deficiência mental
e múltipla, cabe analisarmos o conceito de deficiência mental. A American
Association of Mental Retardation apresenta o conceito mais utilizado e aceito
atualmente:
Deficiência mental corresponde a um funcionamento intelectual
significativamente abaixo da média, coexistindo com limitações
relativas a duas ou mais das seguintes áreas de habilidade
adaptativas: comunicação, autocuidado, habilidades sociais,
participação familiar e comunitária, autonomia, saúde e segurança,
funcionalidade acadêmica de lazer e de trabalho, manifestando-se
antes dos dezoito anos de idade. (apud D´ANTINO in MANTOAN,
1997, p.100)
E por último apresento o conceito de inclusão. Segundo Mantoan, a inclusão
prevê a inserção escolar de forma radical, completa e sistemática.
Todos os alunos, sem exceção, devem freqüentar as salas de aula do
ensino regular. A meta é (...) não deixar ninguém de fora do sistema
escolar, que terá de se adaptar às particularidades de todos os alunos
(...) (idem, 1997, p. 08)
Ferreira (2003, p. 128) também conceitua a inclusão como “modalidade de
educação para todos e com um ensino especializado no aluno”.
As questões que se articulam são: como alcançar essa “meta de não deixar
ninguém de fora do sistema escolar”, sem exceção? Como viabilizar a inclusão?
O acesso à educação é um direito adquirido, portanto, essa meta precisa ser
atingida. Mas de que forma? Penso que na prática fica difícil fazermos afirmações do
tipo “sem exceção”, pois cada aluno tem suas necessidades e existem deficiências
que exigem um acompanhamento especializado, sim. Negar isso seria, no mínimo,
negar as diferenças. Ao negar as diferenças, negamos as possibilidades de avanços
educacionais, transformações nas estruturas escolares que permitam a inclusão de
17
maneira efetiva. Será que assim estaremos respeitando as necessidades de todo e
qualquer aluno? O que vemos hoje são muitas escolas que ‘incluem’ o aluno dentro
de seu espaço físico, sem lhe dar condições concretas de aprendizagem, de
desenvolvimento e de relações afetivas positivas.
A inclusão de fato só se torna possível quando ocorrem transformações na
escola, desde a formação profissional, a estrutura física, a concepção da educação
em si, que se torna mais abrangente envolvendo a formação da pessoa, e
principalmente os aspectos da relação educador-educando. Nesse aspecto, a
educação especial tem a contribuir não só com a sua experiência e formação
técnica, mas também com seu cotidiano relacional. É no âmbito pessoal que as
relações se estabelecem gerando um clima organizacional propício ou não para a
inclusão. Portanto, vemos dois fatores importantes, que serão aprofundados nessa
pesquisa: as relações interpessoais e o clima organizacional de uma escola de
educação especial.
A inclusão das pessoas com deficiência no ensino regular é um processo, um
caminho, que exige muitas mudanças na educação. E como todo caminho só é
possível de ser percorrido através do “passo-a-passo”, sugiro olharmos para passos
que já aconteceram na nossa história para, quem sabe, vislumbrarmos os passos
que virão.
1.2
Constituição Histórica
Para a compreensão dos conceitos apresentados, faz-se necessário a visão
de sua constituição histórica. Apesar desses temas emergirem recentemente na
história, alguns fatos e algumas iniciativas nos remetem a alguns séculos atrás.
Podemos dizer que até meados do século XVIII, a deficiência era vista pelas
lentes do ocultismo, do temor e do misticismo.
18
Em sociedades como a espartana, as crianças nascidas com algum tipo de
deficiência eram sacrificadas. Com os povos nômades não era diferente: as crianças
eram abandonadas por não terem condições de acompanhar seu grupo. Naquele
tempo as pessoas organizavam-se na estrutura social principalmente pela sua
capacidade física na produção da sobrevivência grupal.
Já na Idade Média, com a influência do catolicismo, a deficiência começou a
ser vista de outro modo:
O dilema caridade-castigo é estabelecido; as crianças com deficiência,
como cristãos, possuem alma, portanto não podem ser sumariamente
sacrificadas. Por outro lado, são passíveis de pecado e merecem
castigo divino. Livram-se do abandono explícito e ganham cuidado em
instituições. (MAGALHÃES, 2002, p. 30)
Fica evidenciada a dicotomia bem-mal: ora a pessoa com deficiência era vista
com piedade, pois possuidora de alma e, por conseguinte, “filha de Deus”, ora como
possuída por demônios, pois “imperfeita” física ou mentalmente. Surgem dessa visão
o caráter assistencialista e a institucionalização da deficiência.
Amaral afirma que no século XVI
Paracelso e Cardano, [...] são os primeiros a trazer a questão da
deficiência para o âmbito da Ciência, mais especificamente da
Medicina (pois eram médicos e alquimistas), demarcando uma
fronteira entre a visão teológica ou moral e a científica. Esses
estudiosos, embora mantivessem uma estreita ligação com as teorias
que enfatizavam as forças cósmicas, afirmavam a legitimidade de
tratamento para as pessoas com deficiência. (1995, p. 49)
Em 1770, surge a primeira instituição para educação de “surdos-mudos”,
fundada pelo abade Charles M. Eppée, em Paris. Ele inventou o método de sinais
para a comunicação.
Ainda no século XVIII houve a criação do Instituto Nacional dos Jovens Cegos
em Paris, por Valentim Haüy, em 1784.
19
Em princípios do século XIX iniciou-se, na Europa, atendimento aos
deficientes mentais. Dois nomes têm destaque nesses primeiros estudos: Jean Marc
Itard (1744-1838) e Edward Seguin (1812-1880).
Itard mostrou a possibilidade da educação de um menino encontrado na
floresta de Aveyron: o “Selvagem de Aveyron”, como ficou conhecido. Itard obteve
êxito no controle de suas ações e na leitura de algumas palavras, através do método
de “repetir a experiência com sucesso”.
Seguin prosseguiu os estudos criando o primeiro internato público da França
para o atendimento a crianças deficientes mentais. Foi o primeiro a idealizar um
currículo para elas. Ele desenvolveu materiais didáticos, e treinou professores para a
reeducação neurofisiológica (motor e sensorial) das crianças.
Em 1819, um oficial do exército francês, Charles Barbier, levou ao Instituto
Nacional dos Jovens Cegos, em Paris, a sugestão de utilização de um processo de
escrita que havia idealizado para a transmissão de mensagens no campo de batalha
à noite. Esse código era expresso em seis pontos salientes que representavam trinta
e seis sons básicos da língua francesa. Mas foi em 1829 que esse código foi
adaptado para as necessidades dos cegos por Louis Braille (1809-1852), jovem
estudante daquele Instituto. Até hoje é considerado o método mais eficiente de
leitura para os deficientes visuais.
Foi nesse Instituto que José Álvares de Azevedo estudou e, posteriormente
inspirou a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos no Brasil (atual Instituto
Benjamin Constant - IBC), fundado por D. Pedro II, no Rio de Janeiro. Ao obter
sucesso na educação de Adélia Sigaud, filha do Dr. José F. Xavier Sigaud, médico
da família imperial, José Álvares de Azevedo despertou o interesse das autoridades
da época, culminando na fundação do Instituto através do Decreto Imperial nº 1428,
de 12 de setembro de 1854.
Nos estudos sobre a deficiência mental, outro nome se destaca: Maria
Montessori (1870-1956), médica italiana. Montessori aprimorou os métodos de Itard
20
e Seguin, desenvolvendo posteriormente, um programa de educação de crianças
deficientes mentais em Roma. A ênfase do seu programa está na “auto-educação”
pelo uso de materiais didáticos adequados às necessidades infantis. Montessori
exerce grande influência na educação ainda hoje em diversos países, inclusive no
Brasil.
Em 1837 foi fundada a primeira escola para cegos, subsidiada pelo Estado
norte-americano, a Ohio School for Blind. Esse fato torna-se relevante na medida em
que despertou a sociedade para a obrigação do Estado para com os portadores de
deficiência.
No período de 1817 a 1850, várias instituições foram criadas para o
atendimento de deficientes auditivos, visuais e mentais; posteriormente surgiram as
dedicadas aos deficientes físicos.
No Brasil, o início da institucionalização de pessoas deficientes foi marcado
pela fundação do Instituto Nacional para Cegos, por D. Pedro II, como já foi exposto.
Em 1857, D. Pedro II fundou o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos, atual Instituto
Nacional de Educação de Surdos (INES), também no Rio de Janeiro.
Em 1872, para uma população de 15.848 cegos e 11.595 surdos, havia
atendimento para 35 cegos e 17 surdos nesses Institutos. Apesar disso, abriu-se a
possibilidade de discussão da educação para os portadores de deficiência através
do 1o. Congresso de Instrução Pública, em 1883, cujos temas giraram em torno da
formação de professores e sugestão de currículo para cegos e surdos.
Cabe aqui citar alguns trabalhos científicos e técnicos realizados no início do
século XX: “Da educação e tratamento médico-pedagógico dos idiotas”, do médico
Dr. Carlos Eiras, publicado em 1900, e “A educação da infância anormal da
inteligência no Brasil”, do prof. Clementino Quaglio, de São Paulo, “Tratamento e
educação de crianças anormais da inteligência” e “A educação da infância anormal e
das crianças mentalmente atrasadas na América Latina”, de Basílio Magalhães, do
Rio de Janeiro, publicados por volta de 1915.
21
No início do século XX, a perspectiva clínico-médica começava a superar
concepções místicas acerca da deficiência, porém todo o atendimento era realizado
fora das escolas regulares.
Importante salientar que, mesmo com o acesso às instituições de educação
especial, a pessoa com deficiência nem sempre teve garantido o acesso à educação
e profissionalização, pois mesmo dentro dessas instituições construiu-se a visão
pura e simplesmente assistencialista, sem o devido valor à profissionalização do
corpo de funcionários, com ênfase no voluntariado leigo.
De 1850 a 1920 surgiram nos Estados Unidos, várias escolas residenciais, ou
internatos, seguindo o modelo europeu.
Na última década do século XIX, entretanto, as escolas residenciais
não eram mais consideradas instituições apropriadas para a educação
do deficiente mental. Passaram a ser vistas como instituições de tutela
de crianças e adultos sem esperança de vida independente e,
portanto, sem possibilidade de educação. (MAZZOTTA, 2002, p. 24)
Em razão dessa constatação, programas de externato começaram a ser
criados, proporcionando o surgimento das classes especiais diárias nos Estados
Unidos, por volta de 1900.
Nessa mesma época também surgiam estudos psicológicos, como o de Binet,
no estudo psicométrico da inteligência, que contribuiu para os estudos posteriores
em Educação Especial.
A institucionalização das pessoas com deficiência foi predominante na
primeira metade do século XX. Neste mesmo período começaram a avançar as
críticas da psicologia e da educação quanto ao tipo de atendimento oferecido às
pessoas com deficiência.
No Brasil, dois pesquisadores tiveram destaque pelas suas contribuições à
Educação Especial a partir da década de 1920: Ulisses Pernambucano e Helena
Antipoff. Ulisses Pernambucano (1892-1943) defendeu a primeira tese no campo da
22
deficiência mental, no Brasil: “Classificação das crianças anormais: a parada do
desenvolvimento intelectual e suas formas; a instabilidade e a astenia mental”.
Criou o Instituto de Psicologia de Pernambuco em 1925 e foi pioneiro ao criar
a “Escola para Anormais”, anexa ao curso de Aplicação da Escola Normal de
Pernambuco, onde desenvolveu as primeiras pesquisas com testes de aptidão,
pedagógicos e mentais. Promoveu também a criação de outras instituições e a
formação de pessoal especializado para atuar em instituições de ensino a crianças
com deficiência mental. Seus trabalhos no campo de produção e adaptação de
testes psicológicos e pedagógicos contribuíram para a disseminação da pesquisa
em Psicologia e Educação no Brasil.
Helena Antipoff (1872-1974), nasceu na Rússia, estagiou no Laboratório
Binet-Simon entre 1910 e 1911 e formou-se em Psicologia em 1916. Trabalhou
como assistente de Édouard Claparède, no Laboratório de Psicologia de Genebra.
Em 1926, veio ao Brasil a convite do estado de Minas Gerais para lecionar na
Escola de Aperfeiçoamento Pedagógico de Belo Horizonte, onde fundou
posteriormente o Laboratório de Psicologia, centro gerador de pesquisas em
diversas áreas da psicologia e da educação. Suas pesquisas de campo eram
contextualizadas com a realidade social das crianças observadas em sala de aula.
Criou uma classe especial2 para crianças com deficiência mental anexa à
Escola de Aperfeiçoamento, considerada germe de várias instituições que ajudou a
fundar posteriormente, como a Sociedade Pestallozzi de Belo Horizonte, criada em
1932 e a Escola da Fazenda do Rosário, em Ibirité, Minas Gerais, com a finalidade
de educar crianças abandonadas ou excepcionais. Aliás, o termo “indivíduo
excepcional” foi cunhado por Helena Antipoff, por considerá-lo mais adequado do
que “deficiente mental”.
2
Classe Especial, segundo a Resolução SE no. 247 de 30/09/86 “(...) são classes com objetivo de
atendimento educacional especializado para portadores de deficiência auditiva, física, visual, mental
(grau leve) e superdotados(...)” (apud MACHADO, 1994, p.12).
23
Sua extensa obra abarca as áreas da educação especial, educação rural,
educação para a criatividade e de bem dotados, concluindo em diversas pesquisas
que a inteligência é multideterminada, inclusive pelas condições sócio-econômicoculturais do indivíduo.
Assim como Ulisses Pernambucano, Helena Antipoff lutava por melhores
condições de assistência às pessoas com deficiência mental. Segundo Antunes
(2003, p. 75), “é possível até dizer que Antipoff avançou a partir do ponto em que
Pernambucano parou, dando continuidade a suas preocupações”.
Nessa mesma época, a partir da década de 1940, os pais de crianças com
deficiências iniciaram um movimento de criação de associações para investimento
em tratamentos e pesquisa, nos Estados Unidos da América. Esse movimento
culminou com a criação da NARC – National Association for Retarded Children,
associação que inspirou posteriormente a criação da Associação de Pais e Amigos
do Excepcional – a APAE brasileira.
Até 1950 havia cinqüenta e quatro estabelecimentos de ensino e onze
instituições especializadas no atendimento às pessoas com deficiência no Brasil, a
maior parte em funcionamento até hoje, como a Sociedade Pestalozzi do Brasil
(também fundada por Helena Antipoff) e da APAE, para o atendimento da deficiência
mental.
Já em 1948 foi estabelecida a Declaração dos Direitos Humanos que, pela
primeira vez na história, estabelecia premissas visando os direitos universais de
todas as pessoas, independente da nacionalidade, sexo, crenças etc. A partir de
então, várias “minorias” tiveram vez e voz na participação pela garantia de seus
direitos. Monteiro (2003) salienta a importância desse documento, afirmando que
“educação e direito à educação não são a mesma coisa”
(...) Educação houve sempre, direito à educação, como direito
universal do ser humano, só há depois da Declaração universal dos
direitos do homem. A educação tradicional é um "direito de educação",
isto é, um direito do homem sobre o homem. O "direito à educação" é
24
um direito do homem, isto é, tem uma significação ética. A ética do
direito à educação é uma ética do interesse superior do educando, que
não pode ser tratado e instrumentalizado como "objecto" de educação,
mas deve ser considerado e respeitado sempre como "sujeito" do seu
direito à educação.
A partir de 1957, o governo federal brasileiro assume o atendimento
educacional aos excepcionais.
Em 1959, surgem na Dinamarca estudos que propõem os fundamentos da
Normalização, que estabelecem como objetivo da Educação Especial “a criação de
condições de vida para a pessoa retardada mental semelhantes, tanto quanto
possível, às condições normais da sociedade em que vive”. (MIKKELSEN apud
RIBEIRO, 2003, p. 43)
Em 1975, a ONU elaborou a Declaração do Direito das Pessoas Deficientes,
aprovada por sua Assembléia Geral. No final dessa década, na Europa, em
continuidade aos estudos da Normalização, surge o movimento da chamada
Filosofia da Integração em Educação Especial, que postula a inserção do portador
de deficiência no ensino regular, enfatizando o direito de todas as pessoas à
participação nas atividades sociais, recreativas e educacionais oferecidas aos
grupos da mesma idade.
1.3
Panorama Atual
A Constituição Federal Brasileira, de 1988, no seu artigo 206 “afirma
igualdade de condições de acesso e permanência na escola”; e no artigo 208
ressalta
o dever do Estado com a educação, efetivado perante a garantia de:
ensino fundamental obrigatório e gratuito para todos, inclusive aos que
a ele não tiveram acesso na idade própria, e, ainda, atendimento
educacional
especializado
aos
portadores
de
deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino.
25
Em 1990, durante a Conferência Mundial da Educação para Todos, em
Jomtien, na Tailândia, firmou-se a Declaração Mundial de Educação para Todos,
destacando as necessidades básicas de aprendizagem das pessoas portadoras de
deficiência, e que, para atendê-las, medidas precisariam ser tomadas para a
garantia de acesso ao sistema educativo.
Em 14 de dezembro de 1990, através da Resolução 45/91, a Organização
das Nações Unidades (ONU) propõe na Assembléia Geral das Nações Unidas, o
conceito de Sociedade Inclusiva.
Segundo Werneck (1999, p. 188)
implementá-la significa exercitar os princípios descritos nas Normas
sobre a Equiparação de Oportunidades para Pessoas com Deficiência,
um documento adotado pelas Nações Unidas em 20 de dezembro de
1993, através da Resolução 48/96. O conteúdo da norma transcende à
proposta de equiparação de oportunidades para pessoas com
deficiência. É uma contribuição essencial para o movimento mundial
de mobilização diversificada de recursos humanos.
Werneck complementa que “a Sociedade Inclusiva baseia-se em um princípio
elementar: Todas as pessoas têm o mesmo valor.”
A Declaração de Salamanca (1994) enfatiza a inclusão de pessoas com
deficiência, tendo como princípio de sua linha de ação o acolhimento de todas as
crianças pela escola,
(...) independente de suas condições físicas, intelectuais, sociais,
emocionais, lingüísticas e outras (...) As escolas têm que encontrar a
maneira de educar com êxito todas as crianças, inclusive as com
deficiências graves. O desafio que enfrentam as escolas integradoras
é o de desenvolver uma pedagogia centrada na criança, capaz de
educar com sucesso todos os meninos e meninas, inclusive os que
sofrem de deficiências graves (...) (apud RIBEIRO & BAUMEL, 2003,
p. 46)
Essa Declaração surgiu simultaneamente às discussões brasileiras sobre as
leis educacionais, quando era preparada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – a Lei 9.394, promulgada em 1996, na qual há a defesa da educação para
26
todos, adotando o princípio da Inclusão. Esse princípio, como já citado no início do
trabalho, defende que “o ensino seja ministrado a todas as crianças, jovens e
adultos com necessidades educativas especiais preferencialmente no sistema
comum de educação.” (grifo meu)
Note-se que a palavra “preferencialmente” possibilita interpretação dúbia. Por
isso, até hoje, há discussões acerca da possibilidade da concretização da Inclusão,
e inúmeras interpretações da lei, que geram diferentes atitudes frente a ela. Além
disso, como afirma Ribeiro (2003, p. 47):
(...) por outro lado, os sistemas de ensino, não estando preparados
para acolher todos, acabam realmente excluindo os casos que, por
sua complexidade, não têm no momento condições de atender,
eximindo-se, a escola e os professores, do trabalho de pesquisa e de
soluções mais apropriadas.
Para incluir uma pessoa com deficiência, a escola precisa rever suas posturas
– seu pensar, agir e sentir, seu projeto político-pedagógico, sua estrutura física de
acessibilidade, seu currículo. E no meio disso tudo está o professor... suas
angústias, dúvidas, receios... desejos e vontades.
Surgem vários estudos sobre a representação dos educadores sobre a
inclusão escolar.
Nos resultados de sua pesquisa sobre a visão de professores (do ensino
fundamental e da educação especial da Rede Estadual de Ensino de São Paulo) e
de psicólogos sobre a educação especial, Damião (2000) conclui que esta é vista
como educação que ocorre em espaços segregados, tendo a maioria dos
profissionais, dificuldade em compreender o conceito de inclusão. Os educadores
que foram alvo dessa pesquisa apontam para diversos fatores complicadores do
exercício de sua função: a necessidade de ter o apoio familiar e técnico e a falta de
capacitação profissional e de envolvimento nas decisões governamentais.
27
Nos resultados de sua pesquisa da representação de professores e técnicos
de educação3 sobre a inclusão de crianças e jovens com necessidades especiais em
classes comuns, Carmo Neto (2000) mostra que há “(...) dificuldade na construção
de novas representações quanto às possibilidades dos alunos com necessidades
especiais, mas levanta percepções que sinalizam aberturas e receptividade para a
questão.” Complementa que:
(...) os sentimentos que se evidenciam, trazem ambigüidades, medos,
receios, alicerçando-se em imagens já bem constituídas quanto ao
portador de necessidades especiais e quanto a sua educação. (...) O
pessoal administrativo ainda coloca o problema em termos
burocráticos e poucas iniciativas tomaram. (p. 83)
Notamos que, juntamente com a dificuldade, há também a abertura a novas
possibilidades, mais como vontade do que como alternativas concretas.
Menezes (2003) também chama a atenção para os problemas envolvidos na
falta de preparo das escolas e dos professores para lidar com a inclusão:
(...) é importante lembrar que o discurso da inclusão educacional
chegou aos educadores sem nenhum preparo profissional. E como os
alunos já chegaram às escolas, os educadores têm de buscar
formação, mudança de atitude, exigindo aceitação e aprimoramento
de como fazer. No entanto, sabe-se da escassez de oportunidades
para trabalhar seus próprios receios, medos, ansiedades e
habilidades. (p.163).
No seu trabalho “A inclusão do professor na educação inclusiva”, Fontana
(2001) mostra suas dificuldades ao se deparar com uma aluna adulta, com
deficiência visual:
(...) nessas condições, o medo nos impulsiona, como trabalhadores, a
reorganizar o encaminhamento do trabalho numa direção que nos
pareça mais controlável ou de menor exposição, fazendo-nos, por
vezes, voltar a práticas e modos de fazer supostamente já superados,
mas também supostamente melhor conhecidos nos riscos que
comportam.
3
Aqui vistos como diretores, coordenadores pedagógicos, dirigentes regionais e assistentes técnicopedagógicos.
28
Parece ser um consenso entre os autores que abordam esse tema, a
necessidade de investimento na formação do professor do ensino regular, como prérequisito para enfrentar essa nova realidade no cotidiano de sua sala de aula. Com
relação aos professores especializados, Carmo Neto (2000) ainda afirma que
“mostraram menos flexibilidade na interpretação da questão do que os professores
de classes comuns”. A que se deve essa resistência?
Segundo Ribeiro (in RIBEIRO & BAUMEL, 2003, p. 48), dentro dos serviços
de Educação Especial “(...) com uma tradição já consolidada, também há um
acometimento pela insegurança de que tudo que já foi edificado se transforme em
inutilidade, como num passe de mágica.”
Para Mantoan (2003), o movimento da inclusão não pode ser ignorado, nem
tampouco paralisado pelo medo do encontro com o novo. É um sinal de crise de
paradigmas que a educação encontra hoje. Segundo ela, “as escolas inclusivas
propõem um modo de organização do sistema educacional que considera as
necessidades de todos os alunos e que é estruturado em função dessas
necessidades.” (p. 24).
Outros autores, como Rosana Glat, observam o discurso dominante na
Educação Especial sobre inclusão com ressalvas, alegando que muito do que se diz,
teoricamente, não passa de uma abstração, ou utopia. Glat vai mais além e adverte
que não bastam as políticas públicas e novos projetos pedagógicos e curriculares.
Destaca o fator humano, as inter-relações, como determinante fundamental na
prática inclusiva, afirmando que a integração “é um processo subjetivo, interrelacional (...) não se pode fazer uma lei obrigando que as pessoas aceitem e sejam
amigas dos deficientes”.(in MANTOAN e col., 1997, p. 199)
Essa discussão nos remete a diversas esferas da Inclusão:
•
A esfera política (desde a internacional, federal, estadual, municipal até
o projeto político pedagógico da escola)
•
A esfera social (comunidade, empresas, família etc )
29
•
A esfera educacional (formação dos educadores, currículo etc)
•
A esfera das inter-relações (indivíduo-indivíduo)
E essa última esfera é ressaltada por Glat, quando afirma que “a educação
especial que podemos oferecer a essa clientela é a conscientização de sua condição
psicossocial e a instrumentalização para lutar por condições de vida as mais amplas
possíveis.” (idem, p. 200). Afirma ainda que,
(...) fica cada vez mais claro que a problemática da integraçãosegregação dos deficientes só pode ser compreendida e “atacada” a
partir do estudo das dinâmicas das relações sociais entre esses
indivíduos e as outras pessoas ditas “normais”, relações essas que
vêm sendo estabelecidas e sedimentadas por toda a historia da
humanidade. (p. 199)
A inclusão requer uma mudança subjetiva, não só educacional, mas também
social, cultural. Exige mudança de mentalidade, de valores e crenças de todas as
pessoas envolvidas. E isso demanda tempo.
Uma ressalva quanto à prática da integração/inclusão feita por Salomão
Schwartzman (in MANTOAN e col., 1997, p. 62) quando afirma que, “quando o grupo
a ser pretensamente integrado é aquele em que os prejuízos (intelectuais, motores,
sensoriais etc) são mais severos, nos parece que a idéia de integrá-los passa a ser
discutível.” Ressalta ainda que “colocar em uma mesma classe do ensino regular
crianças com diferenças muito acentuadas quanto às possibilidades de aprendizado
pode colocar em risco o aprendizado de todos.” E finaliza seu argumento com a
seguinte questão: “Você é a favor da integração? Não é SIM nem NÃO, mas
DEPENDE.” (idem, 1997)
Observamos assim, que, como toda mudança, há movimentos de avanço em
direção ao novo, há movimentos de resistência para a manutenção do conhecido...
há o incômodo. E a escola é palco dessas contradições no seu cotidiano.
Magalhães (2003) aponta a Inclusão como uma possibilidade
30
(...) de autoconhecimento e descoberta de novas formas de organizar
a vida social e o processo de ensino-aprendizagem desenvolvido nas
escolas. Assim, é fundamental não somente saber como as pessoas
com deficiência se comportam e quais os rótulos utilizados para
designá-las, mas refletir sobre nossas concepções, crenças, ações, ou
seja, pensar sobre as formas através das quais traduzimos a
“diferença” no cotidiano. Encontrar a tradução (ou traduções?) para a
“diferença”, parte constitutiva da vida social, pode ser, também, uma
forma de, como diria Ferreira Gullar, TRADUZIR-SE neste encontro
com o outro. (p. 32-33)
Em pesquisa realizada com crianças de primeira série do Ensino
Fundamental da rede regular sobre a interação com companheiros de sala de aula
com deficiência mental, Batista (2001) afirma que nos resultados obtidos, esses
alunos são aceitos com menos freqüência e são mais rejeitados do que seus
companheiros “normais”. Ressalta como necessidade de superação dessa situação,
a efetiva participação dos pais no processo de inclusão, instrumentalização das
escolas e capacitação e apoio aos profissionais, principalmente professores.
A reação dessas crianças é apenas um dos sintomas da discriminaçãopreconceito-estereótipo às diferenças que permeia nosso cotidiano dentro e fora da
escola. Esses dados nos remetem ao que afirma Amaral (2002): as barreiras
atitudinais às diferenças/deficiências são concretizadas em ações discriminatórias e
estigmatizantes.
De acordo com Santos “é preciso, também, não jogar fora o conhecimento
que a educação especial vem acumulando ao longo de sua história, dos acertos e
erros cometidos.” Prossegue afirmando que “há uma tendência, me parece, tanto
dos educadores como dos teóricos da educação especial, em lançar olhares
somente às falhas, ao que faltou, ao que não deu certo, generalizando estas
conclusões” (2002, p. 104)
No resultado de sua pesquisa sobre a trajetória escolar de alunos com
deficiência mental atendidos em classes especiais da rede pública estadual paulista,
Santos conclui que:
31
no meio de tantos alunos que fracassam, ao passarem pelas classes
especiais, existem aqueles que apresentaram trajetória de sucesso,
atingindo níveis de ensino que nem mesmo os alunos não deficientes
conseguem alcançar (...) o que, muitas vezes, pode passar
desapercebido, dependendo do olhar do pesquisador. (idem, p. 104)
Quais seriam então, as iniciativas, os projetos que, dentro da educação
especial já teriam alcançado um resultado positivo e possível de apresentar-se como
base para a inclusão de alunos com deficiência no ensino regular?
Em estudo sobre a inclusão de jovens com deficiência no ensino regular,
Cacalano (2003) enfatiza a necessidade de mudar as relações que se estabelecem
na escola:
É preciso que se tome consciência da importância de operar
mudanças nas relações sociais da escola, se realmente se desejar
obter sucesso no processo de inclusão. Pode-se dizer que não há um
livro de regras com informações prontas sobre as atitudes a serem
tomadas. Estas precisam ser construídas pelo grupo responsável
pelas ações escolares (...) Novas concepções requerem que a
comunicação se estabeleça de forma diferenciada: contempla tanto
atitudes quanto sentimentos. Enfim, as relações seriam tão
valorizadas quanto as possibilidades em trabalhar com os conceitos
científicos, no processo de aprendizagem. Nelas, as pessoas se
enobreceriam pelo respeito pessoal, pela cooperação e parcerias (...)
(p.125)
É nessa esfera das relações que pretendemos aprofundar a discussão, por
meio do estudo de caso. Ao trazer esse tema, entrando em contato com a literatura
existente, ficam evidentes posturas e opiniões contraditórias, divergentes. Ou seja, é
um tema que traz consigo ainda muito mais dúvidas do que certezas.
32
2. ESCOLA E DIFERENÇAS
Nesse capítulo será abordada a questão das diferenças em sala de aula e
alguns pressupostos da Psicologia Humanista de Carl Rogers.
2.1
As Diferenças na Sala de Aula
A sala de aula é um espaço de encontro entre pessoas com um objetivo
comum: o aprendizado.
Por muito tempo esse espaço presenciou encontros que não proporcionaram
o alcance desse objetivo, pois as diferenças individuais não foram consideradas no
momento do ato pedagógico.
Quantas vezes ouvimos dos professores as comparações entre “os mais
atrasados” e os “mais adiantados”. Quantas vezes, nós mesmos enquanto alunos,
nos classificamos perante o desempenho geral da sala. E o quanto carregamos
conosco as marcas da discriminação ao nosso próprio desempenho...
A sala considerada “homogênea” costuma ser a mais cobiçada pelos
professores, pois têm a ilusão de que os alunos aprendem da mesma maneira, ao
mesmo tempo, facilitando assim o uso de uma metodologia única para todos. No
caso de fracasso, a responsabilidade é transferida para o aluno, seu contexto
familiar, seu patrimônio genético.
Com a discussão sobre diversidade, sobre as desigualdades sociais que se
transformam em desigualdades escolares, surgem alguns estudos nas áreas de
currículo e formação de professores e aquela visão tende a mudar.
Um dos autores que ajuda a entender as diferenças na sala de aula é Philippe
Perrenoud, sociólogo suíço. Em seu livro Pedagogia diferenciada: das intenções à
ação, Perrenoud explica que as pedagogias diferenciadas:
(...) não voltam as costas para o objetivo primordial da escola que é o
de tentar garantir que todos os alunos tenham acesso a uma cultura
de base comum. Ao contrário, diz ele, considerar as diferenças é
encontrar situações de aprendizagem ótimas para cada aluno (...)
(apud ANDRÉ, 2002, p.12)
Sendo assim, ao considerar as diferenças na sala de aula, o professor
transforma-se em orientador desses alunos que são o verdadeiro centro do processo
educativo. Perrenoud afirma que diferenciar o ensino não significa individualizar o
ensino, o que acontece é que o “acompanhamento e os percursos são
individualizados”. (idem, p. 20)
Numa situação de ensino em que são usadas avaliações classificatórias, em
que o erro é considerado única e exclusivamente algo que deve ser evitado, a idéia
de pedagogia diferenciada vem para “desconstruir” essa pedagogia vigente. O erro
passa a ser encarado como parte do processo de aprendizagem, e a avaliação
passa a ser utilizada como instrumento formativo da aprendizagem do aluno.
Aprender a ver o erro como normal, aprender a interpretá-lo,
libertando-o de todo caráter negativo e punitivo, passando a utilizá-lo
de forma mais construtiva e produtiva, como um indicador privilegiado
para dar uma ajuda personalizada ao percurso escolar do aluno, seria
uma via real para o tratamento das diferenças existentes no grupoclasse. (PINTO In ANDRÉ, 2002, p. 48)
Quando ampliamos as diferenças visíveis entre os alunos ou quando são
diferenças significativas, no dizer de Amaral (2002), como no caso dos alunos com
deficiências na rede regular de ensino, ampliamos também os desafios na educação
como um todo. Porém, como afirma Rodrigues,
(...) a diversidade e a heterogeneidade da escola não advêm de se
estar implementando a escolarização de crianças e jovens com
necessidades educativas especiais em classes regulares, mas
simplesmente do facto de que a própria sociedade é heterogênea e
multifacetada. Os alunos ditos com necessidades educativas especiais
34
são apenas um caso no seio da diversidade da população escolar,
embora sejam aqueles que carecem de maior atenção e
acompanhamento. (apud RIBEIRO & BAUMEL, 2003 p. 15)
No cotidiano da sala de aula essas diferenças podem servir como ponto de
partida para o professor criar situações que atendam as necessidades de cada um,
mas podem também ativar no professor as defesas, como por exemplo, a negação
das diferenças e, nesse caso, das deficiências. Segundo Amaral (1995, p. 116), a
negação pode se concretizar de três modos:
o
A atenuação – que se expressa por comportamentos
específicos ou falas do tipo “Não é tão grave assim...”
o
A compensação – na qual “mas” é a palavra essencial, por
exemplo: “Deficiente, mas tão inteligente”.
o
A simulação – na qual o “como se”
é utilizado para
instrumentalizar a negação, sendo ilustrada por falas como: “É
cega, mas é como se não fosse”.
Voltando a Perrenoud, ele procura mostrar que “em vez de uma ‘indiferença
às diferenças’, deve-se falar em diferenciação intencional e diferenciação
involuntária.” (apud ANDRÉ, 2002, p. 17). Segue explicando que a diferenciação
intencional é aquela dirigida às potencialidades do aluno, seja qual for sua condição
de aprendizagem. É voltada para beneficiar os alunos por meio de discriminações
positivas, principalmente àqueles que se encontram em algum tipo de desvantagem
quanto à aprendizagem.
Quanto à diferenciação involuntária, apontada por Perrenoud, configura-se
como uma diferenciação selvagem, em que pouco, ou quase nada se faz pelo
benefício do aluno, pois se trata de um processo com efeitos bastante negativos, no
qual só há o reforço das desigualdades, produzindo o fracasso escolar. André (2002,
p. 17) explica esse tipo de diferenciação na sala de aula:
às vezes movido pelas contingências da situação, pela urgência em
resolver um problema ou mesmo por questões de insegurança ou de
afirmação pessoal, o professor pode vir a tratar diferentemente seus
alunos: dando mais ou menos atenção a alguns do que a outros,
sendo mais paciente ou mais agressivo com alguns do que com
35
outros, respondendo com maior interesse e dedicação às perguntas de
alguns do que às de outros.
Os efeitos dessa forma de tratamento atingem a relação professor-aluno e
conseqüentemente a qualidade de ensino e de aprendizagem.
Lígia Amaral (1995) afirma que a deficiência “jamais passa em brancas
nuvens”. Por mais que haja a intenção da inclusão de todos na escola, independente
do tipo ou grau de deficiência, ela mesma “ameaça, desorganiza, mobiliza”. E na
escola de educação especial não é diferente. Cada um que chega com suas
necessidades gera reações das mais diversas no grupo: professores, alunos e
funcionários.
O que Amaral argumenta é que nesses momentos ocorre a “hegemonia do
emocional”, pois o diferente “foge ao esperado, ao belo, ao eficiente, ao perfeito.”
Esta autora faz uma ressalva quanto a sua própria experiência de vida, relatos e
observações: “essa hegemonia desorganizadora do emocional (...) cede o passo a
uma convivência não atípica (...) depois de superadas as fases iniciais de impacto e
descompensação psíquica.” (p. 112)
Sempre que nos sentimos, de algum modo ameaçados por algo – ou pela
perda de algo, segundo a Psicanálise, ativamos nossos mecanismos de defesa do
ego e, um desses mecanismos bastante utilizado quando se trata de deficiências é o
da negação.
Como trabalhar no contexto escolar com essas inter-relações, buscando o
que Amaral chamou de uma “convivência não atípica”, ou seja, com um nível relativo
de abertura ao novo, de “aceitação ativa” (outro termo que usa em seus estudos),
sem contudo negar a realidade? Como superar as “fases iniciais de impacto e
descompensação psíquica” frente a diferença/deficiência?
Pesquisas apontam para a questão da resistência por parte de professores e
o medo frente às situações de inclusão de alunos com deficiência na escola. O novo
traz a ansiedade, que por sua vez, traz duas possibilidades: a de enfrentamento da
36
realidade tal qual ela é; ou o acionamento dos mecanismos de defesa, que de certa
forma perpetuam a situação existente, colocando-a com uma “roupagem” nova.
Parece óbvio que esse mecanismo perpetue o preconceito, os estereótipos, a
exclusão.
O fato é que indissociáveis, ambos – mecanismos psicológicos de
defesa e ideologias defensivas – podem, e muitas vezes precisam, ser
entendidos como reações a situações de ameaça e perigo inerentes,
simbolicamente, à presença do desconhecido, do estranho, do novo,
do diferente, do deficiente (AMARAL, 1995, p. 149)
Que caminho trilhar, então, para buscarmos esse enfrentamento da realidade
tal qual se apresenta, que não seja por meio do ataque ou da fuga (como os
inúmeros exemplos da História da Humanidade)?
Amaral aponta um caminho:
re-significar a diferença/deficiência constitui-se, em realidade, num
incomensurável desafio. Representa um movimento no sentido de desadjetivar (“des” como prefixo que indica ação contrária) o substantivo
diferença, que tem sido profundamente impregnado de conotações
pejorativas quando aliado à questão da deficiência. (...) Insisto: desadjetivar a deficiência é um caminho (...) ser diferente não é ser melhor
ou pior; a diferença não é boa ou ruim, maléfica ou benéfica (...)
simplesmente é. (idem, p. 148)
Outro ponto importante a ser enfocado é a construção social da
diferença/deficiência, que se dá por meio da perpetuação de preconceitos,
estereótipos e estigmas. Os produtos culturais veiculados pelos meios de
comunicação de massa são fortes divulgadores dessas “imagens” preconceituosas,
a própria ciência, os profissionais, enfim, sem uma consciência crítica da situação
recorreremos
ao
moto
contínuo
da
exclusão.
O
âmbito
relacional
da
diferença/deficiência é apontado como o início de um processo maior, social.
(...) relações limpas não caminham para patologias relacionais
crônicas, não são falsificadas e portanto não são, em si, geradoras de
sofrimento (...) A ausência intrínseca de adjetivação valorativa da
diferença pode levar, em conseqüência, a relações despidas de
37
hierarquia entre aqueles que são diferentes/deficientes e os que não
são (...) (idem ibidem, p. 150)
Retornando à pedagogia das diferenças, vale ressaltarmos seus princípios
norteadores (idéias mestras da escola nova):
•
O aluno deve ser o centro do processo educativo e o professor seu
orientador (fonte de recursos e apoio).
•
A aprendizagem ocorre através de processo ativo de envolvimento do
aprendiz na construção do conhecimento, interagindo com o meio e com
o outro.
•
Ensino voltado para as competências e trabalho com projetos, pesquisas
e situações-problema.
Vale ressaltar que, mesmo com essas condições, não haverá garantias de
sucesso no alcance dos objetivos de ensino com todos os alunos. Daí a importância
da diferenciação do ensino, que significa “organizar as interações e atividades de
modo que cada aluno se defronte constantemente com situações didáticas que lhe
sejam as mais fecundas” (apud ANDRÉ, 2002, p. 19)
Quando falamos das diferenças em sala de aula, abordamos várias
dimensões. Aqui pretendo enfatizar a dimensão relacional, a das relações
interpessoais. Para uma aproximação a essa dimensão, busco a teoria de Carl
Rogers.
2.2
A Contribuição da Psicologia Humanista de Carl Rogers
Carl Ransom Rogers (1902-1987) propositor da Abordagem Centrada na
Pessoa, é considerado um dos psicólogos expoentes da chamada Terceira Força
em Psicologia: a Psicologia Humanista.
De sua prática clínica nasceram os primeiros construtos do que viria a ser sua
teoria. Teoria essa dinâmica, que sofreu inúmeras releituras pelo próprio Rogers,
38
que desencorajava a formação de uma ‘escola de pensamento’ que se inspirasse
em suas conclusões, estimulando as pessoas a testarem suas afirmações.
(FADMINAN & FRAGER, 1986)
Não é objetivo desse trabalho esmiuçar os diversos aspectos de sua teoria,
mas o enfoque será dado sobre alguns pressupostos da teoria das relações
interpessoais. Para isso, recorro à hipótese principal da Abordagem Centrada na
Pessoa, que postula o seguinte:
os indivíduos possuem dentro de si vastos recursos para
a
autocompreensão e para modificação de seus autoconceitos, de suas
atitudes e de seu comportamento autônomo. Esses recursos podem
ser ativados se houver um clima, passível de definição, de atitudes
psicológicas facilitadoras (ROGERS, 1983, p. 38)
Frente a essa hipótese, Rogers apresenta três condições que devem estar
presentes para um clima facilitador de crescimento e de aprendizagem:
Autenticidade ou Congruência, Consideração Positiva Incondicional e Compreensão
Empática.
Rogers deixa claro que “essas condições se aplicam indiferentemente à
relação terapeuta-paciente, pais-filhos, líder e grupo, administrador e equipe (...) se
aplicam (...) a qualquer situação na qual o objetivo seja o desenvolvimento da
pessoa.” (idem). Diversos estudos apontam a importância dessas atitudes no
contexto do ensino e da aprendizagem, principalmente na relação entre educadoreducando. Essa relação, se bem sucedida, pode levar à aprendizagem significativa,
que no referencial de Rogers é “aquela que é mais do que acumulação de fatos. É a
aprendizagem que faz a diferença no comportamento do indivíduo, no curso de ação
de suas escolhas futuras, nas suas atitudes e na sua personalidade.” (ROGERS
apud CARVALHO, p. 02)
Apresento as três condições como contribuição da teoria das relações
interpessoais para o processo de ensino-aprendizagem e como criação de um clima
facilitador de crescimento e interação no ambiente escolar.
39
2.2.1 Autenticidade ou Congruência
A condição da autenticidade ou congruência é apontada por Rogers como
elemento fundamental na construção da relação:
Descobri que quanto mais conseguir ser genuíno na relação, mais útil
ela será. Isso significa que devo estar consciente de meus próprios
sentimentos, o mais que puder, ao invés de apresentar uma fachada
externa de uma atitude, ao mesmo tempo em que mantenho uma
outra atitude em um nível mais profundo ou inconsciente. Ser genuíno
também envolve a disposição para ser e expressar, em minhas
palavras e em meu comportamento, os vários sentimentos e atitudes
que existem em mim. [...] Descobri que isto é verdade mesmo quando
as atitudes que sinto não são atitudes com as quais estou satisfeito, ou
atitudes que parecem conducentes a uma boa relação. (ROGERS,
1997, p. 37)
Rogers afirma ainda que:
Congruência foi o termo a que recorremos para indicar uma
correspondência mais adequada entre a experiência e a consciência.
Pode ainda ser ampliado de modo a abranger a adequação entre a
experiência, a consciência e a comunicação (...) (idem, p. 392)
Em outras palavras, podemos dizer que congruência ou autenticidade tem
correlação com a coerência entre o que sentimos, pensamos e comunicamos por
meio das palavras e da expressão corporal. Um alto grau de autenticidade
pressupõe um baixo grau de defesa psíquica frente aos fatos e às situações.
Em seu “Estudo Teórico sobre o Conceito de Congruência em Carl R.
Rogers”, Vera Placco explica que:
Se houver congruência apenas entre experiência e consciência , mas
não entre estas e comunicação, caracteriza-se uma situação de
falsidade ou engano, do ponto de vista social. Se houver discrepância
entre experiência e consciência, a comunicação também será
discrepante e caracteriza uma situação defensiva ou de negação à
consciência – portanto um problema de ordem pessoal. Nos dois
casos – situação defensiva ou de negação à consciência e situação
40
de falsidade ou engano – a relação que se estabelece não caracteriza
uma verdadeira relação de ajuda (1978, p. 44)
Para esclarecer a forma como essa atitude se manifesta, Rogers apresenta
um exemplo:
(...) Com alguns indivíduos, compreendemos que, na maior parte da
sua atividade, não apenas traduzem conscientemente o seu
pensamento, como também exprimem seus sentimentos mais
profundos, quer que se trate de reações de cólera ou de rivalidade, de
afeto ou de colaboração. Sentimos então que “sabemos exatamente
onde essa pessoa está”. Com outro indivíduo, reconhecemos que o
que ele está dizendo é quase que com certeza uma fachada, uma
máscara. Interrogamo-nos sobre o que ele realmente sente.
Perguntamos a nós mesmos se ele próprio sabe o que está sentindo.
Tendemos a desconfiar e ser cautelosos com um indivíduo desse
gênero. (1997, p. 395-396)
Segundo Rogers, a congruência, como as outras atitudes facilitadoras de um
clima de crescimento, tem grau variável na mesma pessoa, dependendo do
momento e do grau de aceitação daquilo que a pessoa está experenciando. Rogers
formula a hipótese de que, quanto maior o grau de congruência numa relação, mais
a relação implicará numa:
(...) tendência para uma comunicação recíproca caracterizada por
uma crescente congruência; uma tendência para uma compreensão
mútua mais adequada da comunicação; uma melhoria da adaptação
psicológica e do funcionamento de ambas as partes; satisfação
recíproca na relação. (idem, p. 399)
Inversamente, quanto maior o grau de incongruência, cada vez mais a relação
terá as comunicações incongruentes, com desintegração da compreensão,
funcionamento e adaptação psicológica menos adaptados em ambas as partes e a
conseqüente insatisfação recíproca na relação.
Se pensarmos na questão da diferença/deficiência e na constituição de
defesas, como afirmou Amaral (1995), como a negação da diferença, por exemplo,
torna-se difícil afirmarmos que na relação entre a pessoa sem deficiência e a pessoa
com deficiência, exista um elevado grau de congruência na comunicação. Esse pode
ser considerado um dos agentes de sustentação das barreiras atitudinais nas
41
relações interpessoais, pois dificilmente há a comunicação consciente de
sentimentos ou percepções tais quais elas são, devido a atitudes de preconceitos.
2.2.2 Consideração Positiva Incondicional
A consideração positiva incondicional é apontada por Rogers:
(...) como uma segunda condição, acho que quanto mais aceitação e
apreço sinto com relação a esse indivíduo, mais estarei criando uma
relação que ele poderá utilizar. Por aceitação, quero dizer uma
consideração afetuosa por ele enquanto uma pessoa de autovalia
incondicional – de valor, independente de sua condição, de seu
comportamento ou de seus sentimentos. (...) significa uma aceitação
de suas atitudes no momento ou consideração pelas mesmas,
independente de quão negativas ou positivas elas sejam, ou de quanto
elas possam contradizer outras atitudes que ele sustinha no passado.
Essa aceitação de cada aspecto flutuante desta outra pessoa constitui
para ela uma relação de afeição e segurança, e a segurança de ser
querido e prezado como uma pessoa parece ser um elemento
sumamente importante em uma relação de ajuda. (ROGERS, 1997,
p.38)
Após análise de várias formas assumidas por este construto na obra de
Rogers, Almeida (1980) propôs uma síntese do mesmo, com o objetivo de facilitar a
sua compreensão:
Consideração positiva incondicional é a atitude calorosa de aceitar o
outro, como ele é, no momento, permitindo-lhe a expressão de
qualquer sentimento, apreciando-o, em sua totalidade, sem
estabelecer comparações e estimando-o, em sua forma não
possessiva. É o resultado da confiança no organismo humano e, para
que seja eficaz, na relação de ajuda, é necessário que seja percebida
pelo outro a comunicação dessa atitude. (p. 102)
Novamente, Rogers aponta a importância da comunicação para a efetiva
manifestação dessa condição, assim como na autenticidade. Torna-se relevante
destacar que:
Consideração não é proteção ou comiseração ou mesmo
consentimento fácil. O terapeuta [ou professor] não é paternalista,nem
sentimental, nem superficialmente social e agradável. A consideração
se estabelece, segundo um movimento de igualdade, sem pretender o
poder sobre o outro, nem sua possessão, sem introduzir qualquer
42
desnível entre a importância do outro e a própria importância, sem
estabelecer preferência entre o intelectual e o afetivo, nele ou no
outro, entre as expressões ou tendências positivas ou negativas.
(ALMEIDA, 1980, p. 15)
No âmbito educacional, se o professor aceitar o aluno tal como ele é e se for
capaz de compreender os sentimentos que o aluno manifesta, tornará possível a
concretização de uma aprendizagem significativa e uma evidente melhora na
construção da relação com seus alunos.
No caso da diferença/deficiência, a consideração positiva incondicional traz
consigo a valorização da pessoa tal qual ela se apresenta, com suas potencialidades
e limitações que lhe são peculiares. Aceitar o outro permite ao outro aceitar a si
mesmo, é uma relação dialética. E, para que a aceitação seja possível, a que se ter
a compreensão do seu mundo interior, por meio da condição de empatia.
2.2.3 Compreensão Empática
Em seu “Estudo Teórico do Conceito Compreensão Empática nas Obras de
Carl Rogers”, Carvalho (1979) afirma que a compreensão empática é conseqüência
da autenticidade: quanto mais a pessoa estiver aberta à sua própria experiência e
menos defensiva, estará mais predisposta a demonstrar compreensão empática em
seus relacionamentos.
Segundo o próprio Rogers,
... a relação é significativa na medida em que sinto um desejo contínuo
de compreender – uma empatia sensível com cada um dos
sentimentos e comunicações do cliente como estes lhe parecem no
momento. Aceitação não significa muito até que esta envolva a
compreensão. (1997, p. 38)
Paradoxalmente, só consigo compreender o outro se eu tiver um relativo
afastamento da minha própria realidade. Como posso compreender o diferente?
Essa atitude em colocar-se no lugar do outro para observar o mundo do jeito mais
43
próximo possível de como ele o observa, é o que faz da compreensão empática uma
atitude fundamental no processo de uma relação de ajuda, seja ela terapêutica ou
educacional.
Todas as três atitudes psicológicas facilitadoras apresentadas até o momento:
autenticidade, consideração positiva incondicional e compreensão empática, são
intimamente ligadas e necessárias a uma relação útil, de acordo com Rogers:
Dessa forma, a relação que considerei útil é caracterizada por um tipo
de transparência de minha parte, onde meus sentimentos reais se
mostram evidentes; por uma aceitação desta outra pessoa como uma
pessoa separada com valor por seu próprio mérito; e por uma
compreensão empática profunda que me possibilita ver seu mundo
particular através de seus olhos. (1997, p. 39)
É importante ressaltar que, dependendo do tipo de relação interpessoal,
Rogers ainda admite a existência de distinções quanto a relevância dessas atitudes:
o
o
o
Nas relações cotidianas: vida familiar, relações sexuais,
relação professor-aluno, empregador-empregado, amigos –
provavelmente a congruência seria o fator prioritário, básico
para essa vida em comum, garantindo o clima de veracidade;
Nos relacionamentos não-verbais, onde se tem como objetivo
criatividade e outros processos produtivos, é essencial que se
demonstre cuidado e apreço, sendo aí prioritária a
consideração positiva incondicional;
Nos relacionamentos terapêuticos, em que o cliente se
encontra confuso, ansioso ou amedrontado, é prioritária a
empatia. (PLACCO, 1978, p. 46)
Na esfera da educação formal, Rogers afirma que a aprendizagem pode ser
facilitada e tornar-se significativa se o professor for uma pessoa congruente, e isso
implica que ele tenha consciência plena das atitudes que assume. Segundo Rogers
(1973, p. 106), o professor “é, assim, para seus alunos, uma pessoa, não a
corporificação, sem feições reconhecíveis, de uma exigência curricular ou o canal
estéril através do qual o conhecimento passa de uma geração à outra”. O enfoque é
no ensino centralizado nas atitudes, no ensino fundamentado nas relações entre
pessoas em desenvolvimento.
44
Aprofundando essa visão, uma hipótese a ser considerada é a qualidade da
relação interpessoal entre todos os atores educacionais, como elemento essencial
no favorecimento da aprendizagem significativa. Segundo Placco:
Só quando existe uma real comunicação e integração entre os atores
do processo educativo há possibilidade e emergência de uma nova
prática docente, na qual movimentos de consciência e compromisso
se instalam e se ampliam, ao lado de uma nova forma de gestão e
uma nova prática docente. (2003, p. 52)
Se pensarmos a questão da inclusão escolar, torna-se relevante o estudo de
como essas relações acontecem e como a comunicação entre as pessoas
envolvidas influencia na criação de um clima propício à mudança dentro do contexto
escolar.
45
3. METODOLOGIA
3.1
Estudo de Caso
A abordagem utilizada nessa pesquisa é o estudo de caso do tipo etnográfico,
que de acordo com André (1995) é indicado:
(1) quando se está interessado numa instância em particular, isto é,
numa determinada instituição, numa pessoa ou num específico
programa ou currículo; (2) quando se deseja compreender
profundamente essa instância em particular em sua complexidade e
em sua totalidade; (3) quando se estiver mais interessado naquilo que
está ocorrendo e no como está ocorrendo do que nos seus resultados;
(4) quando se busca descobrir novas hipóteses teóricas, novas
relações, novos conceitos sobre um determinado fenômeno; e (5)
quando se quer retratar o dinamismo de uma situação numa forma
muito próxima do seu acontecer natural. (p. 51-52)
A escolha dessa abordagem deu-se pela aproximação às características
apontadas por André, ou seja: o estudo de uma escola de educação especial,
procurando compreender as ações e relações que se desenrolam no seu dia-a-dia.
É um estudo que busca compreender o processo no qual ocorrem essas relações e
o conseqüente dinamismo das situações observadas.
3.2
Caracterização da Escola
A escola de educação especial pesquisada foi fundada em 1976, num
município do estado de São Paulo. É uma instituição confessional, beneficente, sem
fins lucrativos, mantida por instituição religiosa, na forma de uma Associação.
O surgimento dessa escola se deu pela necessidade de uma mãe participante
da instituição religiosa. Primeiramente ela procurava atendimento odontológico para
seus dois filhos com deficiência mental. No final da década de 70 não havia
atendimento odontológico especializado, ou seja, quando uma pessoa com
deficiência precisasse desse atendimento, ele teria que ser feito numa unidade
hospitalar, com equipe formada por dentista, enfermeira instrumentadora e
anestesista, que aplicava anestesia geral. Era um tratamento caro e poucos
profissionais estavam preparados para realizá-lo.
Com a situação posta, a Associação sensibilizou-se com a condição dessa
família e passou a canalizar os recursos obtidos nas igrejas para o tratamento de
pessoas com deficiência mental: primeiro foi o tratamento odontológico e,
posteriormente, a criação da própria escola. O terreno onde se localiza a escola hoje
está em regime de comodato com a Prefeitura municipal por período de vinte anos,
já renovado.
O atendimento odontológico, por sua vez, foi realizado em parceria com uma
Universidade que manteve três consultórios no prédio da escola para atendimento
aos alunos e comunidade, até dezembro de 2002. A partir daí, o atendimento
passou a ser realizado nas dependências da Universidade, mantendo-se o convênio
com a escola.
Hoje a escola atende alunos com deficiência mental, de ambos os sexos, a
partir dos 15 anos, sem limite superior de idade. São sessenta e sete alunos
matriculados no início do ano de 2004. Devido a grande demanda, a escola foi
diversificando o seu campo de atendimento, incluindo jovens e adultos com
deficiência mental associada à deficiência visual, auditiva, física (deficiência múltipla)
e, em 2002, iniciou o atendimento a portadores de autismo4.
Número de alunos por faixa etária
15 – 20 anos
21 – 30 anos
31 – 40 anos
41 – 50 anos
51 – 60 anos
Total
08
22
18
15
04
67
4
Autismo: transtorno neuropsiquiátrico que afeta o indivíduo em três áreas: interação social,
comunicação e imaginação. Fonte disponível em: http://www.autismo.com.br/site.htm
47
Dos 67 alunos matriculados no primeiro semestre de 2004, 39 (58%) são do
sexo masculino e 28 (42%) do sexo feminino. A faixa de idade com maior índice de
alunos matriculados é a que abrange 21 a 40 anos (60%). Atualmente, os alunos
matriculados são provenientes de cinco municípios distintos.
A escola tem período integral de funcionamento, das 8h às 17h, em dois
turnos: matutino (das 8h às 12h) e vespertino (das 13h às 17h). O horário de almoço
ocorre das 12h às 13h, sendo oferecido também o café da manhã, às 8h e o lanche
da tarde, às 15h.
Oferece o Ensino Fundamental de 1a. a 4a. série, na modalidade Educação
Especial, dividida em Ciclo I (1ª. e 2ª. Séries com alfabetização) e Ciclo II (3ª. e 4ª.
séries), Educação para o Trabalho e Programa de Atendimento a Jovens Portadores
de Autismo. A escola trabalha com as seguintes disciplinas:
Base Comum: Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia,
Educação Artística, Educação Física.
Parte diversificada: Oficinas Pedagógicas e Educação Ambiental, Atividades de Vida
Diária e Prática, Prestação de Serviços para Empresas, Ensino Religioso.
A escola é formada por equipe multidisciplinar: diretora, assistente social,
psicóloga, coordenadora pedagógica, fisioterapeuta e neurologista; equipe docente
com doze professores; e equipe administrativa: recepcionista, secretária, inspetora
de alunos, pessoal da cozinha e limpeza, vigia, totalizando 25 funcionários no início
de 2004. Destes, 21 são mantidos pela própria Associação, através de convênios
com:
-
Ministério da Educação (oferece verbas para material pedagógico,
pequenas reformas, cursos de formação continuada para professores e
equipe multidisciplinar);
48
-
Secretaria Estadual de Educação (oferece verba para custear sete
professores);
-
Prefeitura municipal (oferece bolsa de estudo para munícipes e
mantêm três professoras e uma merendeira);
-
Prefeitura municipal vizinha (repassa verbas para pais de alunos
matriculados residentes na divisa de município);
-
Comunidade
internacional
da
instituição
religiosa
mantenedora
(solicitam projetos e orçamentos para aprovação e posterior envio de
verbas, provenientes principalmente da Alemanha, Estados Unidos e
Inglaterra – com isso a escola construiu sala de fisioterapia, oficina de
reciclagem de papel e realizou a reforma da cozinha). Alemanha e
Estados Unidos também são consumidores de materiais produzidos
artesanalmente, como: cartões de Natal, blocos de anotações,
marcadores de livros etc.
-
Empresa de médio porte que fornece matéria-prima para ser embalada
dentro da escola (mantas para exaustores). A empresa paga um valor
mensal à escola, que divide igualmente entre todos os alunos,
diferenciando apenas os alunos que estudam no período integral e os
que estudam meio período. Convênio firmado em 1998.
Dos doze professores contratados, três são municipais e nove são mantidos
pela associação com seus convênios, dentro do regime da CLT. Uma professora
contratada pela instituição tem regime integral de trabalho (40h/semanais) e duas
têm 30h. semanais. Duas professoras têm regime integral, pela prefeitura municipal.
Quatro professores têm regime parcial de trabalho. Todos os professores fizeram ou
estão fazendo curso de capacitação da APAE, com carga horária de 180 horas.
A escola possui duas entradas: uma para a recepção, no piso superior e outra
para o estacionamento, no piso inferior, onde se encontra o pátio e por onde os
49
alunos entram normalmente. Os dois pavimentos são interligados por escada e
rampa. O espaço físico é adaptado às necessidades de acessibilidade dos alunos da
escola e é composto por: recepção, salas da: diretoria, assistente social, psicóloga,
secretaria, salas de atendimento psicológico, sala de fisioterapia, auditório, sala de
vídeo, sala dos professores, copa, sala da coordenação pedagógica, cozinha,
refeitório, 08 salas de aula (sendo 02 salas de educação artística), 02 salas de
oficina de educação para o trabalho, sala de expressão corporal e psicomotricidade,
biblioteca, sala de repouso, enfermaria e farmácia, banheiros para alunos, banheiros
para funcionários e visitantes, pátio, quadra poliesportiva, oficina de reciclagem de
papel, depósitos de materiais, almoxarifados, estacionamento, totalizando 1.332m²
de área construída.
3.3
Sujeitos da Pesquisa
Os sujeitos dessa pesquisa são professoras e a diretora da escola. Foram
entrevistadas quatro professoras, de acordo com o tempo de trabalho na escola
pesquisada, o tempo de experiência na Educação Especial e tipo de vínculo com a
instituição:
Profa. Maria Clara5, tem 40 anos, é pedagoga, fez magistério. Está há um ano
na escola e há 14 anos na Educação Especial. Trabalhou no ensino regular em
escola particular com classes especiais, sempre com crianças. É professora
municipal e ministra as disciplinas de Matemática (escolaridade) e educação para o
trabalho.
Profa. Edinéia, tem 57 anos, é pedagoga, fez magistério. Está há seis anos na
escola e “desde solteira” na Educação Especial, em escolas de educação especial.
Foi contratada pela instituição, convidada pela atual diretora. Ministra a disciplina de
Matemática (escolaridade), e trabalha com alunos com autismo.
5
Os nomes apresentados são fictícios.
50
Profa. Lúcia, tem 36 anos, é pedagoga, fez magistério e está há 11 anos na
escola e na Educação Especial. Sua formação acadêmica é posterior à sua entrada
na escola, pois foi contratada inicialmente como instrutora de oficina abrigada.
Ministra disciplinas de Língua Portuguesa (escolaridade) e educação para o
trabalho.
Profa. Sofia, tem 53 anos, é pedagoga, e está há 27 anos na escola e na
Educação Especial. Fez Pedagogia entre 1994 e 1997. É professora municipal e
trabalha com escolaridade e com alunos com autismo.
Após as entrevistas com as professoras, optamos também por entrevistar a
diretora da escola que foi apontada pelas professoras como uma peça-chave no
processo de mudança e na implantação de novas atividades pedagógicas, além de
ser considerada um membro catalisador do próprio desenvolvimento profissional da
equipe escolar. A diretora Celina tem 55 anos, é pedagoga com habilitação em
deficiência mental e visual, socióloga, mestranda em educação. Trabalha há 38 anos
com Educação Especial e está há 6 anos nessa escola. Foi contratada pela
mantenedora da instituição.
3.4
Procedimentos de Coleta de Dados
Após efetuar a revisão bibliográfica, procurei entrar em contato com a diretora
da escola pesquisada para negociarmos as visitas futuras. Nesse primeiro momento,
a diretora fez uma única ressalva, manifestando a preferência por entrevistas
gravadas com as professoras, para a otimização do tempo.
A diretora mostrou-me as dependências da escola,
apresentando-me
a
todos os alunos e funcionários, explicando que eu iria conhecer a escola e que faria
algumas visitas semanais. Posteriormente, no intervalo das aulas, expliquei às
professoras o objetivo do trabalho, sanando algumas dúvidas e esclarecendo que
nessa relação as especialistas eram elas, que eu estaria ali para aprender com o
cotidiano de todos na escola.
51
Vale ressaltar que houve um fator catalisador desse primeiro contato com
alunos e funcionários da escola: meu grau de parentesco com uma pessoa que já
havia feito um trabalho acadêmico com eles. Isso facilitou o início da pesquisa, pois,
principalmente os alunos já apresentavam uma aceitação da minha presença, em
qualquer ambiente da escola.
Na fase exploratória da pesquisa fiz incursões a diversos ambientes: salas de
aula, quadra poliesportiva, oficina de educação para o trabalho, salas de educação
artística. Durante os intervalos, estive com as professoras e equipe na sala dos
professores, compartilhando das conversas informais e dos cafés. Alguns intervalos
também foram utilizados para a observação da interação entre os alunos e entre
equipe multidisciplinar. Durante essa fase, pudemos começar a delinear a
metodologia e roteiros de observação e entrevistas.
No total foram realizadas quatorze observações e cinco entrevistas,
totalizando 41 (quarenta e uma) horas de coleta de dados, entre os meses de abril a
dezembro de 2004. Na primeira fase da pesquisa, as observações ocorreram em
ambiente de sala de aula, com uma turma de alunos e uma professora de
escolaridade e, posteriormente, na segunda fase, decidimos aprofundar o trabalho
ampliando as opções de observação (reunião de professores, intervalo, outros
alunos e outras professoras etc), incluindo também as entrevistas de professoras e
da diretora para verificarmos, principalmente, as concepções que possuíam sobre os
alunos, sobre o trabalho pedagógico e sobre a escola.
Além disso, pude fotografar as dependências da escola, ter acesso à planta
do edifício e também ao Projeto Político Pedagógico para o ano de 2004. A planta
da escola e as fotos dos seus ambientes estão em anexo.
52
4. APRESENTAÇÃO DOS DADOS
De acordo com os objetivos dessa pesquisa, de identificar como se dão as
relações interpessoais entre professores, alunos, equipe administrativa e equipe
multidisciplinar no cotidiano da escola; detectar se existem e quais são os elementos
facilitadores das inter-relações no processo de inclusão e ensino-aprendizagem de
alunos jovens e adultos com deficiência, e identificar quais são as concepções que a
equipe docente e multidisciplinar possui sobre o aluno, sobre a deficiência e sobre o
trabalho pedagógico nessa instituição, apresentaremos os dados das observações e
das entrevistas com professoras e diretora, divididos em três grandes grupos, a
saber:
Relações Interpessoais.
Elementos Facilitadores das Relações Interpessoais.
Concepção das Educadoras sobre Alunos, sobre Deficiência e sobre
Trabalho Pedagógico.
A análise proposta tem como referenciais teóricos o aporte de Carl Rogers
nos aspectos das Relações Interpessoais e de Luc Brunet, professor pesquisador
em Ciências da Educação da Universidade de Montreal, no Canadá, nos aspectos
referentes ao clima organizacional escolar.
4.1
Relações Interpessoais
4.1.1 Primeiras impressões
Durante a primeira visita feita à escola, a recepção por parte dos alunos foi
afetuosa, com abraços, apertos de mãos, beijos, e com perguntas sobre a minha
procedência. No final das visitas, muitas vezes perguntavam se eu voltaria para vêlos, e os abraços se repetiam. Essa receptividade aponta um dos fatores
visivelmente incentivados pelos educadores dessa escola: a valorização do contato
com o outro, o acolhimento às pessoas que ali chegam. Essa facilitação da
aproximação foi fundamental para a concretização desse trabalho e o conhecimento
do funcionamento da escola como um todo. Houve também boa receptividade por
parte dos funcionários e professores.
Esse clima amistoso me chamou a atenção e, com o passar do tempo da
pesquisa, pude observar que ele se mantinha, ou seja, ficou evidente a existência de
um clima institucional acolhedor, que pareceu ser um elemento facilitador do
trabalho pedagógico da escola. Partindo dessas observações, tornou-se necessário
recorrer a estudos sobre o clima organizacional escolar, e foi em Luc Brunet (1992)
que encontrei algumas conexões com o eixo inicial do trabalho: as relações
interpessoais.
A primeira atividade do dia na escola começa logo após o café da manhã,
servido aos alunos às 8h, no refeitório. É ali que é realizada a primeira reunião de
“Atividades da Vida Prática” com alunos, professores, diretora, coordenadora
pedagógica e inspetora para discutir assuntos de interesse dos alunos, como as
últimas notícias do Brasil e do mundo, informações sobre atividades que tenham
feito em casa, comemorações de aniversários de alunos e de funcionários,
explicação de datas comemorativas, informações sobre atividades que serão
realizadas na escola, projetos a serem desenvolvidos etc. Foi num momento como
esse que fui apresentada aos alunos e aos professores. Como é uma escola
mantida por instituição religiosa, também são feitas orações nesse momento.
Quem coordena essa reunião, com duração aproximada de trinta minutos é a
diretora da escola, incentivando a participação de todos por meio de perguntas
sobre o tema do dia. É um momento bem dinâmico no qual os alunos aparentam ter
bastante interesse, pois respondem as perguntas, pedem a vez para falar, trazem
novos assuntos. E como existem alunos que estudam somente no período
vespertino, essa atividade acontece também logo após o almoço, às 13h. É uma
atividade rotineira na escola, que foi relatada pela professora Maria Clara, da
seguinte forma:
54
(...) nas Atividades da Vida Prática, a gente trabalha no grupo, no
refeitório, todos os professores juntos, né, porque serve para todos, a
parte de higiene, às vezes algum tema atual, trabalhamos as
Olimpíadas...
Nesse momento, a diretora e as professoras presentes buscam valorizar a
participação de todos, apresentando atitudes que indicam uma consideração positiva
pelos alunos: o que o outro fala é importante e há o respeito ao outro por meio de
uma escuta atenta.
Rogers fala do papel do facilitador da aprendizagem, que, nesse caso, podem
ser todas as pessoas envolvidas nessa atividade. E a característica fundamental é:
“um apreço ao aprendiz, a seus sentimentos, suas opiniões, sua pessoa. (...) uma
confiança básica – a convicção de que essa outra pessoa é fundamentalmente
merecedora de crédito (...)” (1973, p. 109)
Logo se percebe que muitos alunos têm necessidade de contato físico com a
equipe da escola, que retribui a atenção em gestos e falas. Da mesma maneira com
a qual fui recebida, a equipe também atua constantemente com o toque, o abraço, o
sorriso.
Segundo Rogers, as atitudes facilitadoras podem ser manifestadas de
maneira verbal ou não-verbal. Pude observar algumas características marcantes de
atitudes não-verbais dos professores e dos funcionários na relação com os alunos
nos diversos ambientes da escola: observei que, durante uma interação há o olhar
atento em direção ao olhar do outro, um dos sinais de uma escuta ativa. Isso
demonstra que há a busca de uma comunicação efetiva por meio da aceitação
positiva e da empatia, embora exista a dificuldade de comunicação com alguns
alunos, como afirma a professora Lúcia:
às vezes eu tenho medo de não entender o que o aluno tá falando, de
não compreender o que ele tá falando, então, eu me preocupo um
pouco. Eu acho... pra mim é uma dificuldade, às vezes de não
compreender o que o aluno está querendo dizer no momento.
55
Como estratégia de superação dessa e de outras dificuldades, as professoras
apontam o papel do grupo (equipe docente e multidisciplinar, coordenadora e
diretora) como suporte de trocas de experiências e de sentimentos gerados pelos
desafios envolvidos nessas relações. Este fato pode ser claramente observado no
relato de uma das professoras:
(...) e até os colegas, porque a gente trabalhando em equipe, eu acho
assim que é muito legal para que um ajude o outro, sabe, um tem
alguma dificuldade, questiona para o outro, pergunta. (Professora
Maria Clara)
Durante os intervalos entre as aulas, em encontros formais e informais, ficou
claro o interesse dos professores em trocar experiências e sanar dúvidas a respeito
de alguns alunos, transcendendo a prática convencional do trabalho apenas no
horário de aula. A professora Edinéia ilustra esse fato no seu relato:
Eu sempre pedi ajuda, o que eu preciso... ó, tem gente que acha que
tem tudo. Não!!! A gente sempre precisa de todo mundo! (Professora
Edinéia)
Em diversos momentos, presenciei conversas entre as professoras na sala
dos professores, nos corredores e mesmo dentro de sala de aula, trocando
informações, idéias de atividades, materiais pedagógicos confeccionados por elas
mesmas. Tudo indica que há um bom nível de relacionamento entre professoras, o
que influencia na manutenção do clima institucional acolhedor, já explicitado. A fala
da professora Sofia ilustra ainda mais essa constatação:
Quando a gente tem alguma dificuldade, você já coloca para a equipe,
para os amigos, então a dificuldade é logo superada.
Essas atitudes demonstram um bom nível de confiança na equipe
educacional. Se considerarmos que o espaço escolar é também um espaço
privilegiado para o aprendizado do professor na sua formação continuada, há nesse
caso, a abertura para que se admita o “não-saber”, necessário à busca pelo
conhecimento e troca efetiva com o outro. A equipe torna-se um apoio, um suporte
na formação do professor, incluindo aí, sua “formação emocional”, proporcionando
56
as superações de desafios cotidianos. Significativa é a inclusão da palavra “amigos”
na frase da professora Sofia.
Retornando para as atividades diárias da escola, após a Atividade da Vida
Prática, os alunos dirigem-se às salas de aula, oficinas, quadra esportiva, enfim,
para os locais onde serão realizadas as aulas do dia, o para os atendimentos
psicológico e fisioterápico. As turmas são pequenas, com média de 10 alunos por
sala, com exceção das salas freqüentadas por alunos portadores de autismo, que
têm um número menor, uma média de cinco alunos. Durante essas atividades
percebo que existe uma certa flexibilidade frente à participação dos alunos, embora
haja o encorajamento para que todos participem e atenção às resistências
apresentadas, exigindo um certo grau de empatia, por parte dos educadores. Um
exemplo do que Rogers apresenta como compreensão empática é explicitado nas
falas de duas professoras:
Você tem que ter, acima de tudo o interesse e ver as necessidades,
do que o aluno precisa, você entendeu? (Professora Edinéia)
Por exemplo, em outras escolas, aí o aluno entra, tem toda uma
estrutura mecanizada, né, para ele cumprir, uma etapa mecanizada. E
aqui não, eles têm as atividades, têm as tarefas, mas no momento que
a gente vê que precisam descansar, que eles precisam ser ouvidos, a
gente dá essa abertura. (Professora Lúcia)
Quanto aos funcionários, como a equipe de cozinha, limpeza e inspetoras,
percebe-se sua participação na manutenção de um clima escolar acolhedor. Isso
não significa que não haja problemas nessa escola, mas que, de alguma forma, há a
abertura para superações de dificuldades e conflitos, através do diálogo apontado
como um diferencial dessa escola, pela professora Maria Clara:
A cada dia de sentar na sala do professor, tomar um cafezinho junto e,
nesse cafezinho a gente estar refletindo, conversando sobre os
alunos, né, conversando até mesmo um probleminha particular que às
vezes... pode até te afetar dentro de sala de aula. Mas no momento
que você chega na escola, você já põe aquilo para fora, fica ali na sala
dos professores e a gente já vai bem para a sala de aula, porque a
gente tem a compreensão desde a coordenadora, da diretora, né, das
colegas, então, o que não tá bem a gente deixa lá pra cima ou deixa
em casa, né, então eu acho que é isso que diferencia de outras
57
escolas assim, o grupo unido, coisas que, em outras escolas, mesmo
da prefeitura, era muita gente, então a gente não tem um contato
assim, que a gente tem... (Professora Maria Clara)
Um fator que chamou a atenção também, foi a presença constante da diretora
e da coordenadora pedagógica nos intervalos com os professores e mesmo dentro
de sala de aula. Por diversas vezes pude observar a interação delas com a equipe
docente, o que me levou a investigar o histórico da gestão escolar, que apresento
em seguida.
4.1.2 Uma nova direção
Um aspecto importante na análise desse caso, foi a forma como ocorreu a
chegada da diretora nessa escola: durante entrevista, a diretora informou que o
convite para trabalhar ocorreu num momento crítico na sua vida pessoal, pois
acabara de perder o único filho num acidente. A maneira que, do seu ponto-de-vista,
encontraria forças para enfrentar a situação seria continuar trabalhando na sua área,
abandonando a idéia de iniciar o mestrado que antes planejara. Comenta que em
1998, ano de sua chegada na escola, teve
uma provocação do bispo [da instituição religiosa mantenedora]:
resgatar a cidadania. A imagem da escola estava depreciada entre
pais, comunidade. Eram tratados como crianças. Escola com azulejo
caindo... eu disse para o bispo: ‘Sozinha não conseguirei, mas com
uma turminha, sim!’ (Diretora Celina)
A escola, por sua vez, também passava por um momento de dificuldades:
problemas administrativos, didáticos, financeiros, portanto a mantenedora da
instituição escolar já cogitava a hipótese de transferir os alunos para outras escolas
e fechar essa. Esse foi um fato marcante, relatado também pelas professoras
entrevistadas. Segundo a professora Lúcia, que iniciou seu trabalho na escola em
1993:
(...) a escola estava passando por dificuldades financeiras, tanto que
até umas pessoas, quando eu fui contratada, me criticaram: ‘Ah, você
está entrando num barco furado, porque tem sérios problemas de
58
salário!’. Eu falei: ‘Ah, já estou parada há algum tempo, então eu vou
tentar, né’, e valeu a pena, deu tudo certo. A estrutura da escola
também... tava muitas coisas por fazer, porque a escola foi construída
mas faltou verba mesmo. Então a parte externa não tinha sido
terminada, a parte superior, era tudo aberto, sem rebocar, então
estava com sérios problemas de infiltração, mas a gente foi levando,
até que foram vindo as verbas, né, daí foram conseguindo mudar, a
direção foi se empenhando mais, foi mudando.
Em 1998 a nova diretora foi contratada, apresentando um novo projeto
pedagógico. Na entrevista ela relata como foi esse momento de transição, afirmando
que “até que metodologicamente, didaticamente, a instituição estava caminhando,
mas eles [alunos] eram tratados como crianças, e agiam como tal, e as famílias
também.” Ela dá um exemplo a respeito: os alunos chegavam na escola com uma
espécie de lancheira de tecido, que penduravam em ganchos, no refeitório, em
locais demarcados com os nomes de cada aluno. Para sua concepção de trabalho
educacional com jovens e adultos, essa atitude era incompatível com a realidade
dessa faixa etária.
(...) eu sentia aqui era assim (...) como uma instituição não escolar,
sabe, uma instituição assistencial? É, era assim os sentimentos que
eu tive quando eu vim fazer uma aproximação da realidade aqui da
escola, né... então uma visão, ao meu ver, bastante infantilizada. E
tudo, tudo era mesmo assistencial, a gente não via aqui como uma
escola, uma instituição de ensino, sabe? Então tudo isso a gente foi
modificando, de estar deixando isso aqui com jeito de escola, né.
(Diretora Celina)
Aqui podemos observar o velho paradigma assistencialista encontrado na
realidade das relações e concepções sobre a pessoa com deficiência: o “incapaz”,
tratado como “criança”, reforçando condições de heteronomia em detrimento da
autonomia. Um ciclo reforçado por escola e família, na dimensão social da
deficiência.
Para entrar em contato com a realidade da escola, a atual diretora ficou um
período observando o contexto e elaborando novas formas de atuação. Apresentou
o projeto para funcionários, professores, afirmando que sua base consistia em
“modificar a própria identidade” [da escola], tratando os alunos de maneira coerente
com a faixa etária e com suas necessidades. Relata de maneira saudosa as
59
primeiras reações de sua proposta para a mantenedora da escola: “(...) eu fui
sabatinada a respeito daquele projeto, que na época eles acharam que era uma
loucura...(risos) o que eu estava propondo.”
Era uma proposta de firmar a escolaridade (de 1a. a 4a. série), constituir
equipe multidisciplinar, renovar maneiras de atuação com a educação para o
trabalho, investir na formação dos professores (a maioria não tinha formação na
área), mas, acima de tudo, trabalhar com as crenças constituídas de pais,
professores e dirigentes sobre as potencialidades e as limitações dos alunos. E foi
com as famílias que a diretora encontrou as primeiras barreiras atitudinais, conforme
relato:
(...) chegar para um pai, para um pai não, para muitos pais, tinha
alunos com quarenta anos, trinta anos, e dizer: “Olha, o seu filho não
é a criança que você pensa que ele é”, é um pouco complicado (...)
pela formação que eles tiveram, pela informação que eles tiveram
quando o nascimento desses filhos (...) Dos “nãos” que receberam,
não é... “Ele não vai andar, ele não vai falar, ele não vai escrever, ele
não, ele não, ele não...” E aí eu venho com a proposta do “sim”, do
sim, do sim, do sim, do sim... Então vem o médico, né, aquela coisa:
“O que que o professor... aonde está a cabeça de uma professora que
está dizendo sim aonde o médico diz não?!”, “Com que autoridade
uma criatura fala isso pra mim?”. Mas eu dizia: “Tenta isso, vamos
tentar, dá certo, dá resultado, experimenta, confia que vai dar certo!”
Eu acho que essa questão, de trocar o “não” pelo “sim” foi uma
dificuldade grande, né, mas também não foi assim uma pedra tão dura
de quebrar, não, os pais acabaram se envolvendo, como estão
envolvidos até hoje, né, e percebendo que iria melhorar a qualidade
de vida, inclusive deles, né. Não era a qualidade de vida dos próprios
filhos, mas da família como um todo, era essa, era esse o objetivo, de
estar vendo o ser humano. (Diretora Celina)
Essa visão da família é constantemente perpassada por opiniões e
diagnósticos dos profissionais que iniciam os atendimentos à pessoa com
deficiência: médicos, psiquiatras, psicólogos e outros. Enfim, a visão positivista
constituída historicamente acerca da deficiência tem uma séria contribuição por
parte desses profissionais que, em nome do tecnicismo, abandonam o lado humano
sem sequer levar em consideração a situação familiar, econômica e cultural da
criança, ou “o que vai ser daqui pra frente?”. Em muitos casos, o diagnóstico tornase
a
verdade
absoluta
da
existência
da
pessoa
com
deficiência.
60
A escola, em contrapartida, pode e deve posicionar-se com horizontes mais
abrangentes: a conscientização, a formação e a informação familiar tornam-se um
dos pilares de apoio à pessoa com deficiência, por exemplo.
Durante as observações feitas na escola, muitas vezes as professoras ou a
diretora apontavam alguns casos de jovens que, se tivessem tido acesso à escola
regular desde pequenos, não precisariam freqüentar a escola de educação especial
atualmente. Mas as portas estavam fechadas para esse aluno e para essa família,
que logo começou a acreditar no “não” e nas portas trancadas da sociedade.
Retornamos aqui às barreiras atitudinais apontadas por Amaral (2002) como
ações e comportamentos discriminatórios dirigidos a um alvo específico por meio de
inter-relações mediadas por estereótipos, que a autora compara a “biombos entre os
atores da situação”. A partir de mensagens advindas de experiências anteriores ou
dos meios de comunicação, predefinimos como o outro se manifesta (“ele não vai
falar”, “ele não consegue aprender”), evitando qualquer tipo de mudança nessa
relação, ou na visão que se tem do outro. Segundo Amaral, os estereótipos são
concretizações de nossos conceitos e preconceitos, “estes últimos entendidos como
configurações psíquicas consteladas de forma independente de experiências
diretas” (2002, p. 237-238).
Mas, de onde vêm o preconceito e o estereótipo? O que leva uma família ou
uma escola a acreditar no “não”, na impossibilidade de desenvolvimento da pessoa
com deficiência?
Amaral pontua dois fatores que, imbricados, configurarão nossas atitudes:
fatores individuais (como o medo, por exemplo) e fatores sociais. Essas atitudes,
portanto, são entendidas como:
predisposições psíquicas diante de dada pessoa, grupo ou
fenômeno(...) são sempre favoráveis ou desfavoráveis e não devem
ser confundidas com opiniões e comportamentos, pois podem, ou não,
estar em coerência com eles, dependendo das inúmeras
contingências. (idem, p. 238)
61
Para um pai ou uma mãe fica a mensagem: “seu filho não pode...” Frente a
esse rótulo/estigma que recai sobre a família como um todo, há, na maioria das
vezes a proteção àquele que nasceu “imperfeito”. Essa proteção pode se traduzir em
restrição dos contatos sociais da pessoa com deficiência, e/ou assegurar-lhe
ambiente “acolhedor às diferenças”, como a escola de educação especial, por
exemplo.
Foi nesse momento, logo no início da implantação da nova proposta que,
segundo a diretora, a equipe de professores se dividiu muito, parte por pressão dos
pais, parte por não acreditar nessa nova abordagem educacional. Alguns
professores e funcionários se desligaram da escola, outros foram contratados.
As atitudes demonstradas pela diretora, ao tentar esclarecer pais e
funcionários sobre as reais potencialidades dos alunos e a possível mudança de
identidade da escola, nos remete ao que Rogers descreve como a base da
Abordagem Centrada na Pessoa: a crença na possibilidade de crescimento de si
mesmo e do outro, na prática de atitudes que favoreçam esse crescimento.
4.1.3 As relações interpessoais nas cenas do cotidiano
No processo de observação do cotidiano da escola, presenciei algumas cenas
significativas quanto ao processo das relações interpessoais e quanto as atitudes
postuladas por Rogers.
Cena 1: Lidando com Estereótipos e Preconceitos
Durante aula de educação artística, A. M., termina a bandeira nacional, feita de
mosaico de E.V.A. Cola a última peça e, emocionado, diz com dificuldade:
“-Consegui!”
Essa atividade seria corriqueira se A. M. não tivesse diagnóstico de atetose6
uma doença degenerativa que, aos 52 anos, rouba-lhe cada vez mais os
6
Atetose: distonia, alteração do tônus muscular.
62
movimentos, além da deficiência auditiva (usa aparelho auditivo) e da deficiência
mental. A professora comemora, dizendo:
“- Você tem determinação!”
Ao que ele responde: “- Eu tenho cabeça!”
A professora se aproxima, e, num abraço, afirma: “- Você tem cabeça e tem
coração!”
Ao presenciar essa cena, pude perceber a forma como a professora lidou com
uma resposta típica de um aluno acostumado a estereótipos, rótulos e preconceitos,
ao afirmar para si e para os colegas que “tinha cabeça”, reforçando simbolicamente
o seu desempenho cognitivo. O olhar afetuoso da professora para com o aluno,
indicando atitudes de consideração positiva e empatia, salienta que o mesmo “tem
coração”, mostrando que o aluno é valorizado, além da sua capacidade cognitiva, e
subliminarmente mostra que o mesmo é aceito de forma integral, inclusive com
ênfase na atitude de determinação.
Cena 2: Lidando com as perdas
Ao perder num jogo de dados proposto pela professora, Z., 51 anos, com
síndrome de Down, debruça-se na carteira e reclama, chateado: “Não gosto de
perder...” A professora aproxima-se e, agachada, com as mãos sobre seus braços,
diz: “Z., tem dias que a gente ganha, outros dias a gente perde. O importante é não
perder o carinho”. Olhando nos seus olhos, continua: “Seu colega ganhou hoje, mas
pode perder amanhã, mas o carinho da professora, você perdeu? O que é melhor:
perder no jogo ou perder o carinho, o amor da professora”?
Z. responde: “No jogo”
“Meu time perdeu...”, conclui a professora.
Z. ri e comemora, pois ele não gosta do time para o qual a professora torce.
Podemos afirmar que, nessa situação, foi necessária para a professora a
atitude de compreensão empática em relação ao aluno. Rogers diz que:
quando o professor tem a habilidade de compreender as reações
íntimas do aluno, quando tem a percepção sensível do modo como o
63
aluno vê o processo de educação e de aprendizagem, então, cresce a
probabilidade de aprendizagem significativa. (1973, p. 111)
Essa compreensão exige um certo distanciamento do eu para que possa
haver uma real compreensão da necessidade do outro. A professora demonstrou,
até mesmo em sua postura física, uma real vontade de compreender o que se
passava com o aluno.
4.2
Elementos Facilitadores das Relações Interpessoais
4.2.1 O clima organizacional
Para complementar a análise de dados para além da dimensão pessoal,
surgiu a necessidade de abordar o contexto dessa escola, no tocante ao clima
organizacional, por ser este um diferencial, apontado como um facilitador das
relações interpessoais.
Segundo Brunet (1992), o clima organizacional pode ser definido, com base
na
medida
perceptiva
dos
atributos
organizacionais,
que
se
reportam
essencialmente ao conceito de satisfação das necessidades dos indivíduos que
compõem a instituição escolar. Debruçam-se sobre as micro-percepções dos
trabalhadores sobre o ambiente de trabalho. Podemos afirmar que o clima de uma
organização tem características relativamente permanentes, que:
a) Diferenciam uma dada organização, podendo considerar-se que
cada escola é susceptível de possuir uma personalidade própria, um
clima específico; b) Resultam dos comportamentos e das políticas dos
membros da organização, especialmente da direcção, uma vez que o
clima é causado pelas variáveis físicas (estrutura) e humanas
(processo); c) São percepcionadas pelos membros da organização; d)
Servem de referência para interpretar uma situação, pois os indivíduos
respondem às solicitações do meio ambiente de acordo com a sua
percepção do clima; e) Funcionam como um campo de força
destinado a dirigir as actividades, na medida em que o clima
determina os comportamentos organizacionais. (p. 126)
64
Ainda segundo Brunet, quando se tenta determinar as causas do
comportamento de um indivíduo em situação de trabalho,
depressa se constata que a análise baseada exclusivamente em
aspectos pessoais se torna caduca e incompleta, sendo necessário
alargar a pesquisa ao ambiente de trabalho. São os actores no interior
de um sistema que fazem da organização aquilo que ela é. Por isso, é
importante compreender a percepção que estes têm da sua atmosfera
de trabalho, a fim de se conhecerem os aspectos que influenciam o
seu rendimento. (BRUNET In NÓVOA, 1992, p. 125)
Reforçando os aspectos citados por Brunet, algumas professoras, quando
questionadas sobre o que as levou a trabalhar e a permanecer nessa escola,
relatam suas percepções que indicam aspectos do clima organizacional:
(...) a gente vê que aqui é um ambiente onde todo mundo se respeita.
Então a gente aqui, a gente vê que, a gente respeita muito, desde a
merendeira, da... tia do portão, sabe, a gente chama... como
educadoras, porque elas tão em contato com todos os alunos.
(Professora Maria Clara)
Aqui é assim, desde bolo a curso, tudo se passa. E as alegrias
também são divididas e as tristezas também, a gente é bem unido, é
uma família, porque são quase trinta funcionários, é assistente social,
coordenadora, direção, fisio, é... a equipe inteira, toda trabalha junto e
o resultado é esse, positivo. (Professora Edinéia)
Quando a professora Edinéia afirma que “de bolo a curso, tudo se passa”,
podemos perceber que no clima organizacional da escola em questão predomina a
cooperação entre seus membros, em contraposição à competição, caracterizando
um clima organizacional do tipo aberto, descrito como “um meio de trabalho
participativo, no qual o indivíduo tem um reconhecimento próprio, no quadro de uma
estratégia de desenvolvimento do seu potencial.” (p. 130)
Outro aspecto relevante quanto à colaboração do pessoal administrativo, é
apontado no relato da diretora:
Desde o guarda da noite, que apesar de, que eu não vejo, só
converso com ele por telefone, mas ele vale ouro, ele é precioso aqui
dentro porque qualquer emergência, ele pinta a escola inteira, ele é
guarda, mas ele pinta, ele não pára, ele pinta a escola, a torneira que
65
tá pingando ele troca, à noite ele faz, ele tem um amor tão grande pelo
que ele faz, que... ele cuida, ele ama isso aqui, sabe?
Brunet afirma que quando se quer identificar o clima de uma escola há que
considerar um conjunto de características:
a) Os atributos de uma organização constituem as unidades de
análise; os actos e os comportamentos da direcção são as
determinantes principais do clima de uma organização.
b) As percepções têm conseqüências importantes sobre o
comportamento dos empregados
c) O clima é um conceito polivalente e sintético, que não é possível
diagnosticar com base numa única dimensão, sendo necessário
recorrer ao conjunto das suas componentes.
d) Podem existir movimentos no interior de uma organização,
produzindo a coexistência de diferentes climas; no entanto, verifica-se
geralmente uma certa partilha das percepções do clima organizacional
entre o conjunto de seus membros
e) O clima é o elemento estável no tempo e evolui muito lentamente,
baseando-se em variáveis relativamente permanentes; para o
modificar tem de se proceder a alterações importantes nos próprios
alicerces da instituição. (1992, p. 129-130)
Aqui surgem dois aspectos importantes da análise: o papel da diretora e a
alteração importante ocorrida com a sua chegada, modificando assim, o clima
organizacional escolar.
O conhecimento do clima permite identificar as dimensões que
desempenham um papel fundamental na percepção do ambiente de
trabalho e, deste modo, facilita a planificação dos projectos de
intervenção e de inovação. Finalmente, é importante sublinhar que a
eficácia da escola e o sucesso dos alunos são afectados pelo clima
organizacional. (BRUNET In NÓVOA, 1992, p. 138)
Esse clima influencia também a percepção do aluno sobre a escola, que
passa a ser um referencial positivo no seu cotidiano, ao contrário do que estamos
acostumados a ouvir dos alunos de escolas regulares, como ilustra o exemplo a
seguir:
E o valor é de ver a alegria deles, né, assim, de estarem numa escola,
de eles acharem ruim com um feriado... risos... que eles não querem,
não gostam de feriado, eles querem vir para a escola... nossa, férias...
eles já começam a... alguns ficam até mal, começa a dar dor de
cabeça, a baixar a pressão, porque eles não gostam. Até um hoje
66
falou assim: “Se eu fosse presidente da República, eu tirava todos
esses feriados!”... (risos)... (Professora Maria Clara)
Portanto, sob este ponto-de-vista, na implantação da inclusão em escolas
regulares, um diagnóstico do clima organizacional escolar pode ser um instrumento
de facilitação para a adoção das ações que visem a eficácia do processo de
mudança.
4.2.2 O papel da direção
A atual diretora encontrou a escola em condições desfavoráveis de
funcionamento e buscou implantar uma série de mudanças a partir de sua vontade
íntima e desencadeadora.
Seu papel na transformação da escola como
incentivadora de mudanças foi um item recorrente, que vem ao encontro do que
Brunet afirma sobre o clima organizacional escolar: “a resposta dos responsáveis
face a uma determinada situação tem efeitos no clima.” (idem, p. 128).
Podemos afirmar que a chegada da diretora foi um marco de mudança nas
características do clima organizacional e nas concepções da equipe educacional
sobre as próprias potencialidades, reformulando a própria identidade institucional.
Nota-se aqui que o momento de troca de direção da escola proporcionou essa
ruptura, alterando significativamente o clima organizacional escolar. Esse novo
ambiente é percebido pelas professoras, como no relato da professora Maria Clara:
Acho que o apoio maior, como essa é uma escola, é da parte da
direção, né, e a diretora... ela é ótima, ela te compreende, ela tem
assim, o dom da palavra com os funcionários, com os alunos, que eu
admiro muito, sabe esse... o jeito de falar com as pessoas? Não
precisa ser autoritária para você querer as coisas. Então, ela, com
jeitinho, ela consegue muita coisa da gente, né. (...) Acho que tanto a
diretora que é acima de nós, eu acho que a gente toma isso como
exemplo. Então a gente passa isso também para os alunos, né, que
nós somos unidos, que... e ela também transmite muito isso pra gente,
essa alegria, essa espiritualidade, esse carinho, né, que ela tem. (...)
Porque eu acho que... sem uma pessoa assim... que eu já trabalhei
em outras escolas e por mais que o grupo tentasse se unir, e tudo, a
pessoa que seria a parte administrativa, né, que seria uma direção,
coordenação, desmanchava aquele grupo. (...) Então assim, é um
respeito mútuo, eu dou bastante valor para isso. (Profa. Maria Clara)
67
Aqui vale ressaltar mais uma característica que pontua a favor de uma
postura corajosa frente às ameaças. Aprender com os próprios erros e de sua
equipe, se preciso for, voltar a estudar para melhor enfrentar os desafios:
Nós estamos juntos, se a gente errar, nós vamos errar junto, mas
errar por uma boa intenção. A nossa intenção é acertar, sempre, e a
gente vai procurar respaldo, nós não estamos fazendo por ouvir dizer.
Nós vamos primeiro pesquisar, nós vamos estudar, nós vamos voltar
pra Universidade, vamos fazer as coisas com paixão. (Diretora Celina)
Neste sentido a diretora da escola tem um papel importante na implantação
de uma dinâmica de constante aprendizagem, adaptando-se às variáveis do
cotidiano sempre buscando inovar, criando a cada dia uma “nova instituição”. Como
diz Morin: “(...) para se reformar a instituição, temos de reformar as mentes, mas não
se pode reformar as mentes sem uma prévia reforma das instituições.” (apud
MANTOAN, 2003, p. 20)
Esta realidade do papel da diretora constatada na entrevista e nas
observações, pôde também ser comprovada nas entrevistas com as professoras:
A diretora falou: Edinéia, nós vamos fazer até acertar. Resolvemos o
problema... Agora, nós pedimos o tanque de areia, fizemos uma
piscina de tanque de areia, ela tá fazendo o tanque de areia lá
embaixo, já tá sendo construído. Então é uma pessoa que ela também
acredita no nosso trabalho. E ela dá essa liberdade. Você fala: “Hoje
eu vou fazer isso”... mas você não faça sem falar. Tudo é comunicado,
e tudo pode se fazer. Claro que ela avisa, o sucesso não se ganha
sozinha, é tudo coletivo. Às vezes eu não tenho uma visão, mas a
outra tem. Então, o trabalho é de grupo, sempre nós trabalhamos em
equipe, uma ajuda à outra, uma colabora com a outra... (Professora
Edinéia)
Há aqui o apoio por meio de recursos materiais e também o apoio
pedagógico, no sentido da confiança no trabalho das professoras, que percebem
isso na troca de informações e na valorização da coesão da equipe docente por
parte da direção da escola. E esse relato reforça novamente a contribuição do papel
da direção na constituição do clima organizacional escolar, como expôs Brunet
(1992).
68
No contato com experiências bem sucedidas de integração/inclusão de alunos
com deficiência na escola regular, Amaral (2002) aponta para um fator
imprescindível: a “flexibilização da hierarquia rígida de saberes e fazeres”:
(...) hierarquia essa, muitas vezes, apoiada em “especialidades” que
se opõem a diferentes formas de conhecimento da realidade ou, em
outras, em degraus institucionais de caráter funcional – ambos apoios
impedindo a livre circulação de aspetos comuns. (...) desejo apenas
enfatizar que ela pode invadir espaços em que não seria necessária
sua cristalização e, sim, seria imprescindível sua flexibilização.
Quantas vezes a observação de uma merendeira, por exemplo, pode
ser preciosa contribuição para a ação pedagógica e vice-versa! (p.
246)
Um exemplo da ocorrência dessa flexibilização é apontado pela própria
diretora:
Todos nós temos alguma coisa para contribuir, isso eu valorizo muito
e tenho conversado muito com a equipe, faço reuniões com a equipe
de apoio, inspetores de alunos, pessoal de limpeza, merenda... de
valorizá-los, de dizer: “Olha, aqui não existe ninguém mais do que o
outro, né, nós somos seres imprescindíveis nesse trabalho”. Tudo que
nós falamos em termos pedagógicos e técnicos, a gente fala com
eles: como tratamos os autistas, porque tratamos, porque às vezes
temos que contê-los, tudo, tudo, a gente fala, na medida do possível,
tem coisas que são sigilosas, mas tudo o que é pra que as vidas aqui
dentro sejam valorizadas, nós tratamos. Porque senão fica uma coisa
de hierarquia e parece que a coisa não flui, porque aquilo “não é a
minha obrigação, é obrigação do outro, então eu não vou, o meu limite
é aqui, mas o do outro começa ali...” Então eu costumo falar pra elas,
eu uso a metáfora da corrente, então eu digo: “nós somos elos de
uma só corrente, quando um elo se quebra, pra que serve a
corrente?”, né. Então toda pessoa que se propõe a trabalhar numa
unidade escolar, é um educador (...) Com carinho, com respeito, mas
deve ser, né. Então eu gosto disso e os funcionários também, eles
contribuem muito à essa valorização, não é, que eu sei que aqui nós
temos, que precisa de uma... não é perfeita, não, precisa ser
aprimorada, mas valorizar a vida de todos os envolvidos, é pra mim
isso é o mais importante. (Diretora Celina)
A inexistência de barreiras entre os colegas da escola, e o sentimento de
valorização advindo do resultado do trabalho, parecem ser uma extensão da
personalidade da diretora.
Às vezes a gente vai, nós vamos, uma só da equipe; que vai e busca
informação e vem como reprodutor, né, como um semeador do que
aprendeu, na medida que isso for possível... é... acabou... até
69
trocando, porque a medida que a gente passa o que recebeu, também
tem essa troca, né.
Finalmente, de acordo com as observações e as entrevistas entre as
professoras, podemos enumerar algumas características designadas à diretora, tais
como:
1. O “dom de lidar com as pessoas”
2. Flexibilização da hierarquia
3. Dedicação ao trabalho
4. Expressão de sentimentos incentivadores (alegria, espiritualidade,
carinho)
5. Incentivo à troca de aprendizados e colaboração entre a equipe
6. Valorização da equipe escolar
7. Facilitação da coesão na equipe
8. Incentivo ao aprendizado com os erros
9. Incentivo à formação em serviço
10. Gestão participativa
11. Respeito mútuo
12. Criação e aplicação de novas metodologias.
4.2.3 A construção de um novo projeto pedagógico
Evidentemente que a situação inicial encontrada pela diretora, ou seja, uma
situação precária da escola, aliada a sua vontade de implantar um novo fazer, levou
a reflexões acerca de um novo projeto pedagógico.
Ao se deparar com uma oficina abrigada em funcionamento na escola, a
diretora fez uma das primeiras propostas que causou impacto entre pais e
professores. Segundo seu relato:
Havia uma oficina de vassouras que tinham serras perigosíssimas,
serras elétricas... instrumentos todos ligados na eletricidade, que
poderiam amputar o dedo de um aluno, e alunos convulsivos
trabalhando ali, sem proteção alguma. Então a primeira coisa que eu
disse: ”Eu só entro aqui se essa oficina se fechar. Eu não creio que
70
fabricar vassouras seja o ideal para esse alunado”. (...) Lógico que
chocou porque o profissional que trabalhava ali ele não me favorecia
mais, como instrutor de oficina. (Diretora Celina)
A professora Lúcia foi uma das instrutoras de oficina que buscou,
posteriormente, a formação e especialização, incentivada pela própria escola.
Eu fui contratada como monitora de oficina (...) E aí, depois que a
gente estava aqui há um ano, mais ou menos, aí eu vi que era a área
mesmo que eu gostaria de seguir, daí que eu fui fazer o magistério
(...) logo em seguida eu já fui contratada como professora, então meu
cargo mudou, né, para professora, e aí também fiz o curso da APAE
como uma maior especialização e fiz Pedagogia, agora terminei
Pedagogia. Então o magistério veio para a minha vida através deles
(...) foi através da escola que eu escolhi o magistério.” (Professora
Lúcia)
Foi proporcionado com que eles fossem procurar instituição para estar
bancando isso, né, para que eles fossem procurar uma
especialização, uma reciclagem, incentivá-los para que fizessem
Pedagogia ou qualquer outra disciplina, faculdade afim, não é, para
que eles enriquecessem aqui. Tudo isso a gente foi investindo aos
poucos (...) eu queria pedagogos, meu projeto envolvia pessoas
especializadas e eu só trabalharia se fosse nessas condições. De ter
uma equipe formada, equipe com fono, ainda não consegui montar a
equipe toda como você percebeu, né mas uma equipe que desse
suporte porque sozinha a gente não consegue, né, aqui é uma
orquestra que precisa desses instrumentos.(Diretora Celina)
Na tentativa de mudança de identidade da instituição (como pontua a
diretora), aspectos relacionados ao clima organizacional começam a despontar
como indicadores de superação. Vejamos: ao mesmo tempo em que uma atividade
já consolidada na escola é eliminada do dia-a-dia, há a possibilidade de formação
desses instrutores para novas atividades, ou novos desafios no trabalho com a
pessoa com deficiência. O momento de crise pode significar um risco, mas também
se apresenta como uma oportunidade de mudança e de superação de uma situação
estabelecida.
Segundo Brunet, o clima organizacional desempenha um papel fundamental:
(...) no êxito das acções de aperfeiçoamento ou de formação
(reciclagem) do pessoal da escola. O aperfeiçoamento ou a formação
só se tornam eficazes se o participante tiver a noção de que vai poder
71
utilizar os novos conhecimentos e de que o clima lhe proporcionará os
complementos e os apoios necessários. Um clima de tipo participativo
e aberto às mudanças estimula o empenhamento em programas de
formação e de aperfeiçoamento. (2002, p. 132)
A diretora afirmou que, no seu ponto de vista, há muito que melhorar no projeto
pedagógico e na didática e que o foco principal da escola é o resgate da cidadania.
A construção e reconstrução do projeto pedagógico é relatada da seguinte forma:
E a gente começou esse projeto e ele é sempre inacabado, né...
risos... é um produto inacabado, como a gente também é... gente tá
modificando, estudando, como a gente ainda estuda o próprio projeto
político pedagógico, que a gente sempre tem trabalhado nele, ele tem
muitas falhas ainda e alguns profissionais ainda não se encontram
nele, ainda não se sentem parte dele, apesar de eu estar sempre
estimulando (...) mas elas tão caminhando pra isso, tão caminhando.
Eu sei que tem pontos que a gente precisa ainda retomar, mas
parece-me que nós temos agora a nossa cara, que ela ainda precisa
de alguns retoques, de alguma maquiagem, mas já temos a nossa
identidade, né, embora ainda um pouco fragmentada, mas a gente
tem uma identidade que não é aquela de 98. (Diretora Celina)
Um projeto pedagógico acabado, pronto, é o ideal frente a uma realidade de
constantes mudanças e desafios?
Então, nossa, eu sempre lembro, até no projeto pedagógico tem, né:
“Somos elos de uma só corrente”. (Diretora Celina)
Eu falo que a nossa pedagogia é relacional, né, eu invento esse
termo, é a pedagogia do relacionamento, da confiança mútua, de um
se importar com o outro... (Diretora Celina)
Aqui percebemos a nítida influência de uma filosofia existencial, humanista,
permeando o projeto pedagógico da escola, uma abordagem muito próxima da de
Carl Rogers.
4.2.4 A escola em crise
Um dos objetivos iniciais deste trabalho, de oferecer subsídios para o estudo
da inclusão, é atendido quando analisamos a crise gerada na escola com a chegada
de uma aluna com autismo, que não encontrou capacitação docente para lidar com
72
suas necessidades. Não seria esta a situação habitual na tentativa de inclusão nas
escolas regulares? A aluna Mariana, de 16 anos, gerou esta crise e, contrariando a
tendência habitual de exclusão, provocou uma reação no sentido de buscar
aprimoramento para superar esta “deficiência” da escola. Num primeiro momento, o
sentimento de exclusão foi substituído por um pedido de perdão à família desta
aluna, no ano de 2001:
Eu trabalho tanto com educação especial, sei tanta teoria e quando eu
pego um autista, eu não sei o que faço com ele... Então eu falei:
“Não”... Nós devolvemos a Mariana para a família e pedimos perdão.
Eu pedi perdão, pedi: “Perdão, mãe, não sei trabalhar com ela, as
professoras estão se frustrando, ela se... ela se bate muito!” Ela já
tinha perdido uma visão, já tava com um problema, com uma lesão no
seio, então a gente... “Não, nós não... o que que nós vamos fazer com
essa criança aqui? Nós não sabemos... Ela tá jovem, ela tava com
dezesseis anos. “E olha, nós podemos, se a família der uma chance,
nós vamos estudar, nós vamos voltar para a Universidade, depois a
gente retoma. Mas enquanto isso, olha, pode colocar nessa
instituição, nessa, nessa instituição”. Dei outras alternativas para a
família pra ela ter... Ficamos preocupadas, né, porque é como assinar
um atestado de incompetência... (Diretora Celina)
Houve, portanto, por parte da direção, a constatação da exclusão de uma
aluna do sistema de ensino especial, o que a levou a tomar a decisão de formar os
professores para, a médio prazo, poderem atender essa demanda.
Eu não fui competente para trabalhar com esse aluno, né, eu não sou.
Mas aí a gente voltou para a Universidade, a equipe toda, fomos
visitar instituições, fazer estágio, começar do zero mesmo, né, e a
gente viu que a gente era capaz, sim. Aí ligamos para a família da
Mariana, chamamos a família toda aqui e eu disse: “Agora estamos
com essa bagagem, isso não quer dizer que nós vamos acertar, mas
a gente tem mais chance de acertar”. Porque só boa vontade a gente
viu que não vale a pena, e a gente tava imbuído da maior boa
vontade, né, mas precisa de competência, é preciso do saber fazer,
né, não só do querer fazer... risos... então retomamos... (Diretora
Celina)
Apesar da busca por formação na especialidade do autismo, a equipe não
abandonou a filosofia do projeto pedagógico, fazendo algumas adaptações de
técnicas que viessem ao encontro dos objetivos do projeto. Tudo isso feito com
discussões entre direção e corpo docente.
73
O que a gente via (...) era uma contenção física e a nossa filosofia
não... Como é que eu vou segurar o braço de uma jovem e não deixar
com que ela tenha as respostas, movimentos livres, né, então a gente
começou a mesclar, a pegar uma coisa dali, uma coisa de lá, e um
pouco do método TEACCH7, um pouco do que a gente achava que
dava certo, dava resultado, e no fim acho que a gente achou um
equilíbrio, que ainda está sendo lapidado, mas a gente tem visto
resultados positivos, tem sido gratificante.
O primeiro curso de autista, que foi uma semana... a gente selecionou,
assistiu tudo e mesclou, e a gente selecionou o que, deu uma mescla
do que era bom e do que a gente não gostava para a nossa realidade,
e deu muito certo. (Professora Edinéia)
Após um ano de capacitação, a diretora chamou novamente a aluna, e a
família aceitou sua inscrição na escola. Hoje o relato da diretora sobre a aluna
Mariana é o seguinte:
A evolução é maravilhosa, né, é uma menina que hoje participa, ela
tem ainda algumas coisas, claro, ela é uma pessoa que tem autismo,
mas é uma aluna que tá bem integrada... pra gente é muito
gratificante, muito gratificante. (Diretora Celina)
Para as professoras envolvidas diretamente com essa aluna, diversos
desafios surgiram, como mostra a professora Sofia:
A Mariana se agride muito, se auto-agride, então para mim foi muito
forte isso. Conversando com a equipe, me explicaram para ter mais
tranqüilidade, que o comportamento dela era esse mesmo, que iria
diminuir com o tempo, e com isso eles transferiram ela para outra
professora (...) existe todo um cuidado também com o profissional e
com o aluno... (Professora Sofia)
Esse cuidado com o professor, nas suas dúvidas, angústias, medos frente ao
desconhecido são apontados como uma das marcas de situações escolares bem
sucedidas no que tange à inclusão, como afirma Amaral (2002):
7
Método TEACCH: Treatment and Education of Autistic and Related Communication Handicapped
Children (Tratamento Educacional para Crianças Autistas e com Dificuldade de Comunicação).
74
Para “representar” o lado subjetivo da questão, podemos lembrar a
importância de socialização de medos e angústias, de
problematização conjunta de mitos e tabus, de criação coletiva de
formas de enfrentamento de resistência de cada um dos agentes
envolvidos em processos de inclusão. (p. 246)
Nesse sentido, as atitudes que Rogers postula podem ser facilitadoras nesse
processo de escuta da direção e coordenação pedagógica frente às novas vivências
da equipe docente. Na medida que há esse espaço dentro da escola, cada vez mais
as situações podem ser trabalhadas de maneira mais eficaz, amenizando as
barreiras atitudinais entre todos os atores educacionais envolvidos.
4.3
Concepções das Educadoras sobre Alunos e Trabalho Pedagógico
4.3.1 O aluno e a deficiência
Nos relatos das professoras e da diretora, durante entrevistas, pudemos
observar suas concepções sobre os alunos e a deficiência. Por diversas vezes pude
observar que as professoras utilizavam o termo “filhos” para se referir aos seus
alunos:
Então a gente tem que, realmente, se unir, né, essa família, e como se
eles fossem nossos filhos e abraçá-los mesmo e se dedicar pra eles,
né, assim, fazer o melhor possível para que eles se sintam mesmo
pessoas, cidadãos, é... que são respeitados, que têm tudo para
aprender alguma coisa, né, de acordo com o limite deles, mas eles
têm as aptidões, as potencialidades, eles vão aprender a adquirir (...)
(Professora Maria Clara)
Eles são como filhos dentro de casa. Você pode ter dez, nós somos
dez irmãos, cada um tem uma necessidade, cada um tem um dom.
Sabe? Então você tem que ver o interesse, a necessidade, a atenção,
você vê que a nossa situação é pequena. Eles são diferentes, para
melhor. São especiais para melhor. (Professora Edinéia)
Ao analisar a forma como as professoras se referem aos alunos, podemos
interpretá-las de duas maneiras distintas: como uma postura paternalista,
assistencialista de atenção à pessoa com deficiência, ou de outra forma, como sinal
de consideração positiva, proximidade do aluno, numa alusão à intimidade,
75
incorporando-o à própria família. Na afirmação da professora Lúcia, podemos
observar a situação familiar de alguns alunos:
...pela faixa etária, já não têm pai, mãe, moram com outros parentes e,
às vezes a gente percebe que em casa ele vai no final de semana, ele
vai ter o banho, a alimentação, mas o diálogo, alguém que o ouça, a
gente percebe que não tem essa troca... às vezes a família cuida em
casa e não leva para passear, não leva para ter contato com outras
pessoas... (Professora Lúcia)
Nesse sentido, a diretora aponta a escola como espaço privilegiado de
atenção à pessoa com deficiência, em detrimento de muitas situações familiares
impeditivas de ações mais concretas por parte do aluno:
Mas a gente sente, por exemplo, que a gente poderia... os alunos
poderiam estar tendo um aproveitamento maior se estivessem mais
tempo conosco, porque a família não tem condição de dar aquilo que
a gente dá aqui, né. (Diretora Celina)
Podemos retomar aqui o que Amaral aponta como barreiras atitudinais frente
a condição de diferença/deficiência: o ciclo estereótipos/preconceito/atitudes e
estigma. E como existe esse movimento de contradição também nas relações
escolares, há a contradição em relação às concepções sobre seu público-alvo, como
explicita a professora Maria Clara:
Agora eles já são adultos, né, apesar de eles serem uma “eterna
criança” assim, né, mas a gente tem que tratar eles como adultos
mesmo, porque eles nem gostam de ser tratados como uma
criancinha, né, ser muito bajuladinho assim, nhenhenhen, né. (...) Lá
é adultos... o novo sempre assusta um pouco, né, aí eu fiquei meia
que assustada, assim: “Ai, mas é adulto, eu nunca trabalhei com
adulto...” mas assim, mas eu gostei muito, me identifico muito...
(Professora Maria Clara)
Segundo Amaral, essas concepções surgem de uma construção histórica, e
para sua superação devemos recorrer aos:
(...) fóruns coletivos [para que possamos] dar sustentação e amparo a
dificuldades individuais, oriundas não de incompetências ou
insensibilidades, mas de uma longa história de discriminação e
segregação que impediu quase todos nós de estarmos frente a frente,
em pé de igualdade”, com o significativamente diferente e, portanto,
76
alimentando o mal-estar e o estranhamento que essa não-conversa
suscita. (AMARAL, 2002, p. 246)
4.3.2 O trabalho pedagógico
No que tange às concepções sobre o trabalho pedagógico na escola
pesquisada, pudemos enumerar algumas questões: as dificuldades/desafios
presentes, os movimentos de superação dessas dificuldades e os diferenciais dessa
escola na visão de suas educadoras.
No primeiro item, alguns relatos apontam para as dificuldades/desafios
encontrados no cotidiano da escola. Segundo as educadoras:
(...) Eu acho que esse lado da alfabetização, do aprendizado, com
criança é muito mais fácil do que com o adulto, né, então assim, a
dificuldade que eu tô tendo às vezes é de como lidar com esse lado
mesmo do aprendizado, da alfabetização, né, não com todos, mas
aqueles que já estão na idade adulta assim, chegando ao
envelhecimento (...) vai acabando aquela, aquele entusiasmo, então
às vezes, por mais que você dá de si, por mais que você traga
informação, que você trabalhe com eles... às vezes, assim, é difícil
deles captarem... (Professora Maria Clara)
Profa. diz que “hoje eles entendem, mas na próxima semana tem que
explicar tudo de novo... são 20 anos assim! Porque quando a gente tá
perto, sai, quando a gente sai, não vai...” (Professora Edinéia)
Esse aspecto apontado pelas professoras nos remete a um dos desafios da
educação da pessoa com deficiência mental: lidar com as limitações cognitivas,
quando há uma supervalorização do ensino regular justamente nesse aspecto.
Provavelmente a formação escolar que as próprias professoras tiveram lhes mostrou
isso, formando-se então um referencial do que seja “ensinar” e do que seja
aprender. Romper com essa estrutura de saber estereotipada não é das tarefas mais
fáceis. Segundo Amaral, “não há lugar para surpresas num mundo pleno de
estereotipia e, portanto, não há lugar para desafios” (2002, p. 237)
77
Questões de ordem administrativa e de recursos materiais aparecem na
escola de cunho filantrópico, como dificuldades para a concretização do projeto
pedagógico em sua completude.
O que falta é o horário de estudo, mas a gente procura fazer em casa.
(Professora Edinéia)
Outro ponto que a gente bate muito aqui é por falta de verba, por
questão financeira mesmo, né. Às vezes a gente quer fazer um curso,
e quer... mas não... aqui é uma instituição filantrópica, nós não temos
fins lucrativos, então nós dependemos de verbas públicas... de
doações das igrejas... (...) porque senão a rotatividade da equipe
compromete o trabalho, qualidade do trabalho... Então essa questão
de estarmos nos formando, nos reciclando, também eu vejo como um
impedimento, porque nem sempre nós podemos estar fazendo isso.
(Diretora Celina)
Encontramos aqui o movimento da dificuldade e, em contraposição, o
movimento de resistência dos atores educacionais frente a essas dificuldades,
buscando alternativas de atuação e de superação, como mostrado em alguns
relatos:
Eu preciso me segurar... a menina falou que eu sou a rainha da
sucata... A maioria dos nossos materiais que são pedagógicos, eu
posso dizer, funciona ok, (...) fizemos com E.V.A., tudo ganho, eu não
jogo nada... olha, isso pode ser isso... até o meu marido traz, ele diz:
Olha, dá pra aproveitar isso lá na sua escola? Leva pra escola... e a
gente vai fazendo... (Professora Edinéia)
Mas elas vão discutir, tudo é discutido, tudo é estudado, é
importantíssimo... (Professora Edinéia)
Novamente podemos observar a importância do fórum coletivo na escola para
a resolução de problemas, de enfrentamento de desafios, de incentivo à formação
docente em serviço, do apoio à equipe educacional. Segundo Amaral (2002), a
inclusão como:
a proposta de participação ativa das pessoas significativamente
diferentes na vida social – e, obviamente, aí se insere o contexto
educacional -, iniciada há décadas, deve ancorar-se, cada vez mais,
em processos coletivos de construção. (p. 247)
78
Na escola de educação especial pesquisada, encontramos alguns diferenciais
que, no parecer de seus componentes, fazem dessa escola um organismo único,
com sua personalidade própria, remetendo-nos a Brunet. A diretora afirma:
Eu penso... aliás, não, eu tenho certeza que o que me encanta mais
aqui é a delicadeza das relações entre as pessoas, entre alunos e
professores, acho que isso me encanta muito porque coincide muito
com a maneira como eu entendo a educação... (Diretora Celina)
Todos nós temos capacidades, independentemente das limitações...
para mim foi ensinamento também: de olhar as pessoas, a parte boa.
Para mim é uma lição de vida (...) a humanidade, a questão do
cuidado com o ser humano aluno, o cuidado com o profissional, faz a
gente conviver... gostar de vir para a escola. (Professora Sofia)
É a dignidade, o respeito. Isso é um pelo outro, é pelos professores e
principalmente, pelos alunos. E é o que falta [em outros locais]. O
respeito, a dignidade, aqui eles têm. Tudo isso. (Professora Edinéia)
Fica evidente a valorização do aspecto humanista na esfera das concepções
das educadoras sobre o trabalho pedagógico nessa escola. A “pedagogia relacional”
apontada pela diretora como essência do projeto pedagógico implantado a partir de
1998 parece estar construindo também um clima organizacional facilitador das
atitudes apresentadas por todos os atores educacionais.
79
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao revisitar o caminho percorrido... revendo a trajetória dessa pesquisa,
percebo a necessidade de apontar algumas marcas que a escola apresentada nos
mostrou como caminhos possíveis para o processo de inclusão de alunos com
deficiência em escolas regulares. Obviamente que, cada escola possui suas
características que lhes são peculiares, mas alguns aspectos estudados parecem
fornecer pistas de atitudes que possam facilitar a inclusão nos seus aspectos
relacionais e, num âmbito maior, na sua interface com o clima organizacional
escolar.
De acordo com os relatos recorrentes dos sujeitos entrevistados, a proposta
pedagógica da direção atual da escola ocasionou uma ruptura com um estilo de
gestão e, mais ainda, com concepções de pais, professores, equipe e alunos sobre
as possibilidades de mudança e superação de uma situação na qual a escola se
encontrava há algum tempo. O papel da direção da escola evidenciou-se como
fundamental na construção do clima organizacional atual da escola.
O aspecto da mudança gera rupturas, assim, quando falamos de inclusão de
alunos com deficiência no sistema regular de ensino, nos deparamos com o desafio
de olhar para as concepções estabelecidas culturalmente do que vem a ser a
diferença/deficiência, como nos relacionarmos com o diferente.
Saber lidar com o “não saber” também foi uma marca evidenciada na situação
que a escola vivenciou ao lidar com uma aluna diferente do público atendido na
ocasião. Situação muito próxima do que a escola regular possa estar passando. A
formação em serviço entra aqui como fio condutor das mudanças que se seguiram,
além do apoio ao professor, na socialização de seus medos, dúvidas e angústias.
Atitudes de partilha de sentimentos entre equipe docente, direção e coordenação
foram apontadas como suporte para a inovação do trabalho pedagógico.
As concepções que os sujeitos da pesquisa apresentam sobre o trabalho
nessa escola, apontam para um local de trocas significativas, facilitador de
crescimento pessoal e profissional e de aprendizado.
Ampliando os horizontes para outros possíveis locais de inclusão, podemos
observar que o clima organizacional criado pode ser um elemento facilitador ou não
do processo de implantação de novas propostas, como a da inclusão. Portanto,
relevante se torna o estudo de outra esfera: a das relações interpessoais entre os
atores educacionais, e não só com o aluno com deficiência.
Se a escola se apresenta como um local que fornecerá o apoio necessário ao
professor e à equipe nesse processo de mudança, as pessoas envolvidas sentirão o
acolhimento necessário para arriscar-se na inovação que a inclusão exige. É no
fórum coletivo de construção que as possibilidades se apresentam como possíveis
de serem concretizadas. Assim, cada membro da equipe de atores educacionais tem
a possibilidade de conscientizar-se de que, “somos elos de uma só corrente”8.
8
Frase pronunciada pela diretora da escola durante entrevista.
81
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ROGERS, C. R., Liberdade para aprender. 2a. ed. Belo Horizonte, MG: Interlivros,
1973.
________, Tornar-se pessoa. 5a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
84
________, Um jeito de ser. São Paulo: EPU, 1983.
SANTOS, R. A. A trajetória escolar de alunos deficientes mentais atendidos em
classes especiais da rede pública estadual paulista. 2002. 115 p. Dissertação
(Mestrado em Educação: História, Política e Sociedade) Programa de Estudos PósGraduados em Educação: História, Política e Sociedade, Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, São Paulo.
SCHWARTZMAN, J. S. Integração: do que e de quem estamos falando? In:
MANTOAN, M. T. E. et al. A integração de pessoas com deficiência: contribuições
para uma reflexão sobre o tema. São Paulo: Memmon; Editora SENAC, 1997. p. 6266
WERNECK, C. Sociedade inclusiva: quem cabe no seu todos? Rio de Janeiro: WVA
Editora, 1999.
85
7. ANEXOS
Roteiro de Entrevistas
1. Por que veio trabalhar nesta escola?
2. Por que continua?
3. Quais as maiores dificuldades que você tem encontrado no seu trabalho?
4. O que você acha que esta escola tem que a diferencia de outras escolas?
5. Você tem oportunidade de ter novas aprendizagens nesta escola? (formação)
6. Do que você sente falta nesta escola?
7. O que você mais valoriza nesta escola?
Roteiro de Observação
1. Interação verbal
2. Elementos não-verbais (movimentos, gestos, expressões faciais);
3. Atividades (natureza das tarefas, comportamento do professor);
4. Gerenciamento (como o professor controla o comportamento dos alunos, uso
de recursos, organização de grupos, trabalho individual);
5. Habilidades
profissionais
(questionamentos,
explicações,
despertar
interesse e curiosidade);
6. Auxílios ao ensino (uso de recursos audiovisuais – televisão, slides, tapes e
outros materiais e equipamentos, como o computador);
7. Características afetivas (sentimentos e emoções do professor e dos alunos,
relações interpessoais);
8. Traços sociológicos (papéis que as pessoas desempenham, normas,
códigos, efeitos do background social, status)
LOCAIS/ AMBIENTES:
SALA DE AULA – ESCOLARIZAÇÃO: observar relação professor-aluno (interação
verbal e não verbal, características afetivas), gerenciamento da sala de aula pelo
professor, habilidades profissionais, recursos utilizados, atividades propostas.
REFEITÓRIO: observar interação entre alunos e corpo docente/administrativo;
traços sociológicos.
SALA DE ARTES: observar relação professor-aluno (interação verbal e não verbal,
características afetivas), gerenciamento da sala de aula pelo professor, habilidades
profissionais, recursos utilizados, atividades propostas.
SALA DE EDUCAÇÃO PARA O TRABALHO: observar relação professor-aluno
(interação verbal e não verbal, características afetivas), gerenciamento da sala de
aula pelo professor, habilidades profissionais, recursos utilizados, atividades
propostas.
SALA DOS PROFESSORES: observar inter-relações entre professores e entre
equipe multidisciplinar durante intervalo, planejamento e outras situações, seus
traços sociológicos, o assunto tratado, as decisões e resoluções tomadas.
MATERIAIS: recursos disponíveis e recursos utilizados pelos alunos e pelos
profissionais.
ESPAÇOS: utilização dos espaços físicos da escola. Atividade realizada nos
mesmos, situações em que são utilizados.
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Vista Externa da Escola
Pátio Interno
Oficina
Recepção
da
Escola
Oficina de Reciclagem
Produtos da Reciclagem
Refeitório
Sala de Artes
Sala de
Aula
Sala de Fisioterapia
Sala dos Professores
Salão de Eventos
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