A MISSÃO É SIMPÁTICA Perder-se pelo amor texto Norberto Louro ilustração Zé Oliveira O Natal aí está de novo. Aquela festa que nunca deixa de surpreender. Quanto mais não seja, pela inesgotável fantasia geradora de modos de o fazer render, à custa do Menino Jesus. Empresas de todas as áreas, da produção ao consumo, encharcam de publicidade a comunicação social. À força de bombardear, desperta e avoluma, nesta época, o apetite consumista de gentes de todas as idades, classes sociais e credos. Também de credos diferentes. Sim, porque, até quem do Menino Jesus só tem uma vaga ideia, ou não tem ideia nenhuma, ou até tem uma ideia contra, é arrastado por esta vaga estonteante das teias do mercado. Pena é que, tanto a ganhar como a endividar-se, sejam sempre os mesmos. Convenhamos que nem tudo é negativo. Até porque, o facto de pôr as famílias a encontrarem-se, a gente a trocar presentes, a música a baixar de volume e a trocar melodias, a iluminarem-se as ruas com arte e com gosto, o mundo a conviver, as crianças a ganharem protagonismo, já é consequência benéfica – sem muitos o saberem – daquele primeiro Natal, o maior acontecimento na história da humanidade. Através dele, o Deus que todos procuram mostrou o seu verdadeiro rosto de Deus-connosco, misericordioso, optimista e amigo. Só é pena que, nem todos possam entrar nesta “rodaviva” do Natal. Ou por não saberem, ou por não quererem, ou por nada terem e não poderem. É pena que este tipo de Natal continue a ser possível só para os que têm e o monopolizam, FÁTIMA MISSIONÁRIA 33 Edição LIII | Dezembro de 2007 sem olharem à sua volta. Sem entenderem que o Menino do primeiro Natal, Jesus, não nasceu pobre por não ter, mas, sendo rico (Deus) fez-se pobre, dando tudo aos homens. Quando já não tinha nada mais para dar, deu-se a si próprio para ensinar os homens a partilhar amor e bens, para eliminar desigualdades e destruir egoísmos. Já há muito quem o faça, pagando amor com amor e não só amor com pena daquele Menino Deus a tiritar de frio no presépio. Ele veio para que ninguém sofra o frio da indiferença num mundo que ainda está longe da globalização do amor e da solidariedade. Contou-me, há dias, um colega, com um certo desencanto, que, o ano passado, falara destas coisas com um taxista que o foi levar a um bairro degradado de uma grande cidade onde ia passar o Natal. Depois de o condutor o ter alertado, com ares de tragédia, para os riscos que ia correr, para a inutilidade do que ia fazer, para o desmerecimento daquela gente de ser ajudada, atirou-lhe à queima-roupa: – O senhor padre deve ter feito alguma das boas para o seu superior lhe dar tamanho castigo! – O mesmo que Jesus fez – retorquiu o padre – para Deus Pai o mandar à terra. Deixou-se perder pelo amor. E o homem, como tantos outros, encolheu os ombros. Mas ele, o padre, jurou-me que nunca tinha passado um Natal tão Natal como aquele. E eu acredito. Porque também já me aconteceu. E acontece assim a todos os que assim fazem.