Versão online: http://www.lneg.pt/iedt/unidades/16/paginas/26/30/185 Comunicações Geológicas (2014) 101, Especial II, 771-775 IX CNG/2º CoGePLiP, Porto 2014 ISSN: 0873-948X; e-ISSN: 1647-581X Caracterização geológico-estrutural de uma pedreira de dolerito com aplicação de prospecção geofísica e análise estrutural Geological and structural characterization of a dolerite quarry with geophysical prospecting and structural analysis J. A. M. Duarte1,2*, F. P. O. Figueiredo2, M. J. M. F. Mira3 Artigo Curto Short Article © 2014 LNEG – Laboratório Nacional de Geologia e Energia IP Resumo: Com este estudo construiu-se um modelo geológicoestrutural para o dolerito da pedreira, tendo como objectivo principal a avaliação de reservas possíveis e planificação do futuro desmonte da pedreira. Foi feita a prospecção geológica do dolerito aflorante de modo a poder avaliar a disposição e relação espacial das litologias e fracturação, as principais orientações e frequência da fracturação, e a relação destes parâmetros com o plano de lavra das explorações existentes. Depois da conclusão desta fase fez-se o planeamento dos trabalhos de prospecção geofísica, de modo a obter informação em profundidade do corpo do dolerito. Os levantamentos geofísicos efetuados, com recurso ao método electromagnético no domínio tempo, permitiram definir localmente, zonas com maior potencial para exploração, tendo em conta as características geológicas e estruturais do maciço rochoso. Foram efectuadas 8 sondagens mecânicas e 15 sondagens de prospecção electromagnética, na área abrangida pela pedreira, de modo a localizar o enraizamento do corpo doleritico. Com a interpretação das 15 sondagens geofísicas foram construídos perfis que permitiram verificar que o corpo doleritico tem uma geometria tipo soleira com uma espessura máxima de aproximadamente 16 m, sendo as reservas de matéria-prima associadas à soleira relativamente pequenas, havendo no entanto algumas reservas consideráveis associadas ao corpo principal, que foi identificado em profundidade. Palavras-chave: Pedreira, Dolerito, Prospecção geofísica, Método electromagnético, Modelação geológica-estrutural. Abstract: With this study a geological - structural model for the studied quarry was built, having the assessment of possible reserves and planning for the future dismantling of the quarry as its main objective. Geological exploration of the outcropping dolerite was made in order to assess the layout and spatial relationship of lithology and fracturing, the fracture main orientation and frequency and the relationship of these parameters with the mining plan of the existing explorations. After completing this phase, the planning work of geophysical prospecting was carried out, in order to obtain in-depth information from the dolerite. The geophysical survey performed, using the time-domain electromagnetic method, allowed the definition of areas with the highest potential for exploitation, taking into account the geological and structural characteristics of the rock mass. Fifteen electromagnetic soundings, regularly spaced in the area covered by the quarry, were made in order to find the dolerite roots. The geophysical profiles interpretation pointed out that the dolerite body has sill geometry with a maximum thickness of approximately 16 m, with relatively small reserves of raw materials associated with the sill. Even so there are some important reserves associated to the main body, which was identified in depth. To confirm the data obtained with the geophysical surveys, eight drills were performed. Keywords: Quarry, Dolerite, Geophysical prospecting, Electromagnetic method, Geological and structural modeling. 1 IQGeo – Serviços, Lda. Centro de Geociências, UC e Departamento de Ciências da Terra, F.C.T.U.C. 3 Maria Mira Consultores, Lda. * Autor correspondente / Corresponding author: [email protected] 2 1. Caracterização física da área de estudo 1.1. Localização geográfica A área de estudo, corresponde à pedreira da Jobasaltos, Extracção e Britagem, S.A., situa-se em Casais Gaiola, freguesia de Landal, concelho das Caldas da Rainha, distrito de Leiria (Fig. 1). A área que serve de objeto de estudo, encontra-se referenciada na Carta Geológica de Portugal, folha 30-B, na escala 1:50 000 (Fig. 1). 1.2. Caracterização geológica A actividade ígnea de natureza transicional que ocorre na Bacia Lusitanica, bacia sedimentar que se desenvolveu na Margem Ocidental Ibérica (MOI) durante parte do Mesozóico, é representada por afloramentos intrusivos na forma de domas e filões que se distribuem ao longo dos alinhamentos oriental e ocidental que a limitam e ainda pelos associados às estruturas diapíricas (Kullberg et al., 2006). O local onde foi efetuado o estudo, situa-se no complexo vulcânico da Serra de Todo-o-Mundo que é constituída por um sill ou por um derrame lávico (?) em relação possível com uma chaminé. O dolerito aflorante, mostra nitidamente estrutura ofítica, por vezes grosseira estando implantado nos arenitos jurássicos. Na área, desenvolve-se um complexo de conglomerados, de grés e de argilas de cores diversas (Zbyszewski et al., 1966) (Fig. 1). 772 J. A. M. Duarte et al. / Comunicações Geológicas (2014) 101, Especial II, 771-775 Verifica-se, em alguns locais da pedreira, que existem rochas doleríticas intercaladas em arenitos argilosos e argilas, que evidenciam algum metamorfismo de contacto. Embora a rocha aflorante e explorada na pedreira seja um dolerito, esta é vulgarmente designada por basalto (nome comercial). 1.3. Caracterização das estruturas A evolução tectónica da Bacia Lusitanica foi condicionada por falhas que se formaram durante o episódio de gracturação tardi-varisca aproximadamente entre os 300 e os 280 M.a. Este episódio tardi-orogénico resulta de imposição de regime de cisalhamento direito à micro-placa ibérica nos seus paleolimites E-W setentrional e meridional, dos quais resultariam as falhas de desligamento esquerdo de direcção aproximada NNE-SSW a NE-SW. Outras falhas orogénicas variscas de orientação N-S (falha de Porto-Tomar) e NW-SE foram também importantes na estruturação da Bacia Lusitânica (Kullberg et al., 2006). Do conhecimento actual da cartografia geológica, verifica-se que o complexo vulcânico é atravessado por vários acidentes tectónicos com orientação NW-SE e NESW. No terreno, para além das disjunções prismáticas, características destas estruturas, são identificáveis falhas com orientação E-W e atitude subvertical, bem como as falhas cartografadas e referidas. Não foram identificados critérios de movimento (espelho de falha, estrias de atrito, mudança brusca de litotipos) que permitissem caracterizar como estes acidentes controlam a massa mineral em análise. Fig. 1. Localização geográfica geral da área de estudo. Carta Administrativa Oficial de Portugal no mapas.igeo.pt. (consultado em 08/03/2014) e enquadramento da área de estudo no excerto da Carta Geológica de Portugal, folha 30-B Bombarral. Carta geológica simplificada na escala 1:25 000. Fig. 1. General geographic location of the study area. Official Administrative Map of Portugal on mapas.igeo.pt. (accessed on the 08/03/2014) and framework of the study area in excerpt of the Carta Geológica de Portugal, folha 30-B Bombarral. Simplified geological map, at the scale 1:25 000. 2. Levantamento geofísico e sondagens mecânicas Para a realização deste levantamento foi utilizado o método eletromagnético, no domínio tempo, com a realização de 15 sondagens estrategicamente posicionadas (Fig. 2), de modo a abranger toda a área estudada, com aproximadamente 5,5ha, e contribuir para esclarecer as dúvidas existentes quanto à geometria e desenvolvimento da estrutura doleritica em profundidade (IQGeo, 2012). A utilização de métodos eletromagnéticos no domínio do tempo está, de uma forma geral, direcionada para o estudo da prospecção mineira de depósitos minerais profundos, fornecendo bons resultados na determinação da sua geometria e desenvolvimento vertical e horizontal. Neste método, o campo primário é gerado em pulsos da ordem dos milissegundos, é posteriormente desligado e o campo secundário induzido no subsolo é então medido. No entanto, é possível a utilização de apenas uma antena Caracterização geológico-estrutural de dolerito (“loop”) quer para a indução quer para a deteção do campo induzido, tornando os trabalhos de campo relativamente expeditos (Correia et al., 2010). A intensidade do campo magnético transmitido é função do número de espiras, da intensidade de corrente que circula na bobine, bem como da área da antena ou “loop” transmissor. Verifica-se que a propagação do campo transiente é função destas variáveis, em particular da condutividade elétrica uma vez que a variabilidade da permeabilidade magnética é baixa para a generalidade dos materiais geológicos podendo, no entanto, ser fator determinante na obtenção de modelos fidedignos particularmente em meios cuja mineralogia esteja associada a elementos metálicos. Esta técnica, permite a detecção e localização de formações que exibam valores de resistividade contrastantes com os do restante meio geológico (AEMR, 2007), condições essas que se encontram no local em estudo e que já foram aplicadas no estudo de outros doleritos (Cruz et al., 2010). Os levantamentos geofísicos foram realizados com um equipamento TEM FAST - 48 HPC (AEMR, 2007) e para 773 a georreferenciação dos dados dos levantamentos e topografia do terreno utilizou-se um GPS Ashtech MobileMapper 100. Foram utilizadas antenas com geometria quadrada, com dimensões a variar entre os 10 e 25m. Essa diferença de dimensões foi devida às condicionantes físicas existentes no terreno. No entanto, sempre que possível foram utilizadas antenas com a maior dimensão, de modo a aumentar a profundidade de investigação A campanha de prospecção geofísica permitiu selecionar os melhores locais para a realização de uma campanha de oito sondagens mecânicas (MMC, 2012). Essas sondagens mecânicas permitiram confirmar alguns pormenores estruturais levantados pela campanha de prospecção geofísica e esclarecer algumas dúvidas, bem como utilizar essa informação para o ajuste do modelo geofísico. As oito sondagens mecânicas destrutivas foram efetuadas com uma perfuradora existente na pedreira, para identificação das litologias, estado de alteração e nível freático. Fig. 2. Localização das sondagens electromagnéticas, sondagens mecânicas, e falhas interpretadas (linha tracejada branco), adaptada de MMC. Fig. 2. Location of electromagnetic surveys, mechanical surveys, and interpreted faults (white dashed line), adapted from MMC. 774 J. A. M. Duarte et al. / Comunicações Geológicas (2014) 101, Especial II, 771-775 3. Resultados obtidos Para o processamento de dados, representação das superfícies topográficas, construção das secções de resistividade e modelação 3D utilizaram-se os suportes informáticos ArcGIS 10 da ESRI, RockWorks 15 e TEM-RES-WIN (IQGeo, 2012). Para o efeito, o algoritmo utilizado na modelação 3D, no RockWorks 15, foi a ponderação direcional (“Directional Weighting”), algoritmo esse que proporciona uma aproximação mais fidedigna do modelo à realidade. Dos 15 locais onde foram realizados levantamentos geofísicos, TEM 1 a TEM 15, foram elaborados perfis 2D e um modelo 3D interpretativo da disposição geológico-estrutural do maciço, elaborados a partir dos valores obtidos através da inversão no TEM-RES-WIN (AEMR, 2009), utilizando o RockWorks 15. O ajuste da modelação, foi possível através da combinação de dados da informação recolhida pelas sondagens mecânicas e dos dados das sondagens eletromagnéticas. Da análise das sondagens mecânicas efetuadas, com uma profundidade média de 25 metros, foi possível definir as litologias, nível freático e correlação espacial entre elas (MMC, 2012). Com a informação das sondagens mecânicas e das sondagens eletromagnéticas construíram-se as secções de resistividade, que mostram a disposição dos diversos tipos litológicos presentes, assim como a sua relação espacial. Os modelos 2D, permitiram numa primeira análise, definir a disposição espacial do dolerito, e a fracturação associada. A litologia correspondente ao dolerito, com valores de resistividade acima dos 800 ohm.m, foi assinalada com uma elipse, apresenta uma configuração descontínua, resultante das estruturas tectónicas existente, estando assinaladas com uma linha tracejada, nas figuras refentes às secções de resistividade. Os valores de resistividade que variam entre 10ohm.m e 800 ohm.m, corresponderam as litologias circundantes à intrusão doleritica e à escombreira da pedreira. Verifica-se que associado às descontinuidades do dolerito, em profundidade existe uma zona bem definida de resistividades inferior a 10ohm.m, correspondente a uma estrutura geológica bastante alterada, com direção aproximada N70ºE, e que foi confirmada pelas observações de campo. Esta estrutura está assinalada, nos perfis, com uma elipse a tracejado. Os dados obtidos na inversão, foram posteriormente tratados no RockWorks 15, obtendo-se uma modelação geológico-estrutural 3D (Figs. 3 a), b), c,)). Na verdade, a interpretação dos perfis de TEM, são interpretações 1D interpoladas em 2D e 3D. Para melhor efeito de visualização das estruturas descritas, foram construídos vários modelos com intervalos de resistividade e perspetivas diferentes. O modelo 3a) foi construído para valores superiores a 800 ohm.m e com perspetiva N-S. O modelo 3b) foi construído para valores superiores a 400 ohm.m e com perspetiva N-S. Por último, o modelo 3c) foi construído para valores superiores a 100 ohm.m e com perspetiva N-S. Da integração dos dados de 2D, 3D, sondagens mecânicas e dados de campo, obteve-se um modelo 3D onde se pode observar a disposição do dolerito em relação às litologias circundantes, assim como as falhas que estão na origem desta configuração (Fig. 4). Fig. 3. a) Modelo 3D, com valores de resistividade acima de 800 ohm.m, Direção N-S, b) Modelo 3D com valores de resistividade acima de 400 ohm.m, Direção N-S, c) Modelo 3D com valores de resistividade acima de 100 ohm.m, Direção N-S. Fig. 3. a) 3D model with resistivities above 800 ohm.m, N-S direction, b) 3D model with resistivities above 400 ohm.m, N-S direction, c) 3D model with resistivity values above 100 ohm.m Directing N-S. Caracterização geológico-estrutural de dolerito 775 Fig. 4. Modelo 3D, com projecção da fracturação e relação espacial com o afloramento. Direção N-S. Fig. 4. 3D Model with projection of fracturing and spatial relationship to the outcrop. N-S direction. 4. Considerações finais A integração dos dados da prospecção electromagnética, sondagens mecânicas e observações de campo, permitiram construir um modelo geológico-estrutural que reflete o modelo das estruturas geológicas e que foi confirmado por informações sobre o desenvolvimento da exploração da pedreira. A disposição do dolerito, na área estudada, apresenta uma configuração tipo soleira (Fig. 4), com uma espessura máxima de aproximadamente 16m, que se prolonga entre as sondagens TEM1 à TEM 14. Na parte mais a Este da pedreira (TEM 10 a TEM 1) o dolerito é aflorante ao contrário do que se verifica a Oeste (TEM 11 a TEM 15), e que se encontra a uma profundidade superior a 10m, como se pode observar na sondagem TEM 12, e à profundidade de 30m, na TEM 13 e TEM14. Esta soleira está bastante fraturada (Fig. 4 (linha tracejada a negro)), apresentando mesmo um elevado grau de alteração, podendo essa estrutura ser encontrada a diferentes profundidades, em várias sondagens, sendo esse facto explicado pela tectónica regional. O afloramento do corpo principal encontra-se a Oeste, TEM 13 e TEM14, a partir do qual se desenvolve a soleira da estrutura doleritica. Para trabalhos futuros no desenvolvimento da exploração da pedreira, as reservas de matéria-prima associadas à soleira, são relativamente pequenas, dada a sua disposição e espessura, havendo no entanto algumas reservas consideráveis associadas ao corpo principal. A profundidade a que se encontra este corpo pode é uma das condicionantes à viabilidade técnica e económica da sua exploração. Agradecimentos Agradecemos à Sra. Fernanda Batista e ao Sr. João Carlos Batista, sócios da Jobasaltos, Extracção e Britagem, S.A, pela empenho e disponibilidade demostrada, durante a execução dos trabalhos de campo, assim como a autorização para a publicação dos dados. Os trabalhos de campo e de gabinete, que permitiram a elaboração deste estudo, foram realizados no âmbito da Bolsa de Investigação com a referência SFRH / BDE / 51635 / 2011, financiada pelo POPH - QREN - Tipologia 4.1 - Formação Avançada, comparticipado pelo Fundo Social Europeu e por fundos nacionais do MEC e pela IQGeo-Serviços,Lda. Referências Cruz, R.J.L., Machadinho, A., Correia, C.G., Figueiredo, F.P.O., 2010. Estudo preliminar da geometria do dolerito de Outeiro (Soure), pelo método electromagnético no domínio do tempo. Geosciences On-line Journal, 10(7), 3p. Correia, C.G., Cruz, R.J.L., Figueiredo, F.P.O., Azevedo, J.M.M., Rodrigues, N.V., 2010. Resultados de prospecção electromagnética nos domínios frequência e tempo. Caso de estudo: Montouro (Cantanhede). Anais do 10º Congresso da Água, APRH, Alvor, Portugal. Comunicação 116, CD-ROM, 16 p. Kullberg, J.C., Rochas, R.B., Soares, A.F., Rey, J., Terrinha, P., Callapez, P., Martins, L., 2006. A Bacia Lusitaniana: Estratigrafia, Paleogeografia e Tectónica. In: R. Dias, A. Araújo, P. Terrinha, J. C. Kullberg, (Eds). Geologia de Portugal no contexto da Ibéria. Univ. Évora, 317-368p. Zbyszewski, G., Veiga Ferreira, O., Manuppella, G., Assunção, C.F.T., 1966. Carta Geológica de Portugal, folha 30-B, Bombarra na escala 1:50 000. Notícia explicativa da Folha 30B, Bombarral. Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa, 22 p. AEMR, 2007. Manual TEM-FAST48HPC. Version 7.3. Applied Electromagnetic Research (AEMR), The Netherlands. AEMR, 2009. Manual TEM-RESEARCHER. Version 7. Applied Electromagnetic Research (AEMR), The Netherlands. IQGeo, 2012. Relatório de prospecção geofísica. Maria Mira Consultores, Lda. MMC, 2012. Relatório de sondagens mecânicas destrutivas. Jobasaltos, SA.