Nome:
Português
Nº:
3º ano
Gabarito - Ficha 5 - LP
Turma:
Amanda Maio/10
Exercícios
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
RIOS SEM DISCURSO
A Gabino Alejandro Carriedo
Quando um rio corta, corta-se de vez
o discurso-rio de água que ele fazia;
cortado, a água se quebra em pedaços,
em poços de água, em água paralítica.
Em situação de poço, a água equivale
a uma palavra em situação dicionária:
isolada, estanque no poço dela mesma,
e porque assim estanque, estancada;
e mais: porque assim estancada, muda,
e muda porque com nenhuma comunica,
porque cortou-se a sintaxe desse rio,
o fio de água por que ele discorria.
O curso de um rio, seu discurso-rio,
chega raramente a se reatar de vez;
um rio precisa de muito fio de água
para refazer o fio antigo que o fez.
Salvo a grandiloquência de uma cheia
lhe impondo interina outra linguagem,
um rio precisa de muita água em fios
para que todos os poços se enfrasem:
se reatando, de um para outro poço,
em frases curtas, então frase e frase,
até a sentença-rio do discurso único
em que se tem voz a seca ele combate.
(Melo Neto, João Cabral de - Rios Sem Discurso. In: POESIAS COMPLETAS: 1940-1955. 2ª ed., Rio de
Janeiro, J. Olympio, 1975, p. 26)
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1. (Unesp) A partir do título, o poema instaura uma relação entre vocábulos ligados à
hidrografia e à linguagem. Estabeleça a relação entre pelo menos quatro palavras de cada
conjunto.
Rio relaciona-se com discurso, água com sintaxe, poço com palavra em situação
dicionária (descontextualizada) e cheia com grandiloquência.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
A PALAVRA
"Tanto que tenho falado, tanto que tenho escrito - como não imaginar que, sem querer, feri alguém?
Às vezes sinto, numa pessoa que acabo de conhecer, uma hostilidade surda, ou uma reticência de
mágoas. Imprudente ofício é este, de viver em voz alta.
Às vezes, também a gente tem o consolo de saber que alguma coisa que se disse por acaso ajudou
alguém a se reconciliar consigo mesmo ou com a sua vida de cada dia; a sonhar um pouco, a sentir uma
vontade de fazer alguma coisa boa.
Agora sei que outro dia eu disse uma palavra que fez bem a alguém. Nunca saberei que palavra foi;
deve ter sido alguma frase espontânea e distraída que eu disse com naturalidade porque senti no momento
- e depois esqueci.
Tenho uma amiga que certa vez ganhou um canário, e o canário não cantava. Deram-lhe receitas para
fazer o canário cantar; que falasse com ele, cantarolasse, batesse alguma coisa ao piano; que pusesse a
gaiola perto quando trabalhasse em sua máquina de costura; que arranjasse para lhe fazer companhia,
algum tempo, outro canário cantador; até mesmo que ligasse o rádio um pouco alto durante uma
transmissão de jogo de futebol... mas o canário não cantava.
Um dia a minha amiga estava sozinha em casa, distraída, e assobiou uma pequena frase melódica de
Beethoven - e o canário começou a cantar alegremente. Haveria alguma secreta ligação entre a alma do
velho artista morto e o pequeno pássaro cor de ouro?
Alguma coisa que eu disse distraído - talvez palavras de algum poeta antigo - foi despertar melodias
esquecidas dentro da alma de alguém. Foi como se a gente soubesse que de repente, num reino muito
distante, uma princesa muito triste tivesse sorrido. E isso fizesse bem ao coração do povo; iluminasse um
pouco as suas pobres choupanas e as suas remotas esperanças."
(BRAGA, Rubem. "A Palavra". In: AI DE TI, COPACABANA! 5ª ed., Rio de Janeiro, Sabiá, 1963, pp.
195/196)
2. (Unesp) Explique o sentido das expressões em maiúsculo no seguinte enunciado do texto:
"As vezes sinto, numa pessoa que acabo de conhecer, uma HOSTILIDADE SURDA, ou uma
RETICÊNCIA DE MÁGOAS.
Hostilidade surda: agressividade silenciosa.
Reticência de mágoas: desgosto não expresso.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
OS SERTÔES
A Serra do Mar tem um notável perfil em nossa história. A prumo sobre o Atlântico desdobra-se como
a cortina de baluarte desmedido. De encontro às suas escarpas embatia, fragílima, a ânsia guerreira dos
Cavendish e dos Fenton. No alto, volvendo o olhar em cheio para os chapadões, o forasteiro sentia-se em
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segurança. Estava sobre ameias intransponíveis que o punham do mesmo passo a cavaleiro do invasor e
da metrópole. Transposta a montanha - arqueada como a precinta de pedra de um continente - era um
isolador étnico e um isolador histórico. Anulava o apego irreprimível ao litoral, que se exercia ao norte;
reduzia-o a estreita faixa de mangues e restingas, ante a qual se amorteciam todas as cobiças, e alteava,
sobranceira às frotas, intangível no recesso das matas, a atração misteriosa das minas...
Ainda mais - o seu relevo especial torna-a um condensador de primeira ordem, no precipitar a
evaporação oceânica.
Os rios que se derivam pelas suas vertentes nascem de algum modo no mar. Rolam as águas num
sentido oposto à costa. Entranham-se no interior, correndo em cheio para os sertões. Dão ao forasteiro a
sugestão irresistível das entradas.
A terra atrai o homem; chama-o para o seio fecundo; encanta-o pelo aspecto formosíssimo; arrebatao, afinal, irresistivelmente, na correnteza dos rios.
Daí o traçado eloquentíssimo do Tietê, diretriz preponderante nesse domínio do solo. Enquanto no S.
Francisco, no Parnaíba, no Amazonas, e em todos os cursos d'água da borda oriental, o acesso para o
interior seguia ao arrepio das correntes, ou embatia nas cachoeiras que tombam dos socalcos dos
planaltos, ele levava os sertanistas, sem uma remada, para o rio Grande e daí ao Paraná e ao Paranaíba.
Era a penetração em Minas, em Goiás, em Santa Catarina, no Rio Grande do Sul, no Mato Grosso, no
Brasil inteiro. Segundo estas linhas de menor resistência, que definem os lineamentos mais claros da
expansão colonial, não se opunham, como ao norte, renteando o passo às bandeiras, a esterilidade da
terra, a barreira intangível dos descampados brutos.
Assim é fácil mostrar como esta distinção de ordem física esclarece as anomalias e contrastes entre
os sucessos nos dous pontos do país, sobretudo no período agudo da crise colonial, no século XVII.
Enquanto o domínio holandês, centralizando-se em Pernambuco, reagia por toda a costa oriental, da
Bahia ao Maranhão, e se travavam recontros memoráveis em que, solidárias, enterreiravam o inimigo
comum as nossas três raças formadoras, o sulista, absolutamente alheio àquela agitação, revelava, na
rebeldia aos decretos da metrópole, completo divórcio com aqueles lutadores. Era quase um inimigo tão
perigoso quanto o batavo. Um povo estranho de mestiços levantadiços, expandindo outras tendências,
norteado por outros destinos, pisando, resoluto, em demanda de outros rumos, bulas e alvarás
entibiadores. Volvia-se em luta aberta com a corte portuguesa, numa reação tenaz contra os jesuítas.
Estes, olvidando o holandês e dirigindo-se, com Ruiz de Montoya a Madri e Díaz Taño a Roma,
apontavam-no como inimigo mais sério.
De feito, enquanto em Pernambuco as tropas de van Schkoppe preparavam o governo de Nassau, em
São Paulo se arquitetava o drama sombrio de Guaíra. E quando a restauração em Portugal veio alentar em
toda a linha a repulsa ao invasor, congregando de novo os combatentes exaustos, os sulistas frisaram
ainda mais esta separação de destinos, aproveitando-se do mesmo fato para estadearem a autonomia
franca, no reinado de um minuto de Amador Bueno.
Não temos contraste maior na nossa história. Está nele a sua feição verdadeiramente nacional. Fora
disto mal a vislumbramos nas cortes espetaculosas dos governadores, na Bahia, onde imperava a
Companhia de Jesus com o privilégio da conquista das almas, eufemismo casuístico disfarçando o
monopólio do braço indígena.
(EUCLIDES DA CUNHA. Os sertões. Edição crítica de Walnice Nogueira Galvão. 2 ed. São Paulo: Editora
Ática, 2001, p. 81-82.)
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3. (Unesp 2008) Dentro das linhas de força do pré-modernismo, que levavam os escritores a
uma nova e mais objetiva interpretação do país e de seus problemas, Euclides da Cunha, no
último parágrafo do texto, levanta crítica à Companhia de Jesus, atribuindo-lhe, por exemplo,
com ironia brotada do conhecimento histórico, a "conquista das almas", isto é, a catequese dos
indígenas brasileiros. Releia esse parágrafo e, a seguir, explique o que quer significar o autor
na sequência com a expressão "monopólio do braço indígena".
Ao classificar a "conquista das almas", empreendida pela Companhia de Jesus, como
um eufemismo, o enunciador denuncia o uso feito da catequese pelos jesuítas, para
explorar o trabalho dos índios.
TEXTO PARA A PRÓXIMA QUESTÃO:
LEITO DE FOLHAS VERDES
Por que tardas, Jatir, que tanto a custo
À voz do meu amor moves teus passos?
Da noite a viração, movendo as folhas,
Já nos cimos do bosque rumoreja.
E sob a copa da mangueira altiva
Nosso leito gentil cobri zelosa
Com mimoso tapiz de folhas brandas,
Onde o frouxo luar brinca entre flores.
Do tamarindo a flor abriu-se, há pouco,
Já solta o bogari mais doce aroma!
Como prece de amor, como estas preces,
No silêncio da noite o bosque exala.
Brilha a lua no céu, brilham estrelas,
Correm perfumes no correr da brisa,
A cujo influxo mágico respira-se
Um quebranto de amor, melhor que a vida!
A flor que desabrocha ao romper d'alva
Um só giro do sol, não mais, vegeta:
Eu sou aquela flor que espero ainda
Doce raio do sol que me dê vida.
Sejam vales ou montes, lago ou terra,
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Onde quer que tu vás, ou dia ou noite,
Vai seguindo após ti meu pensamento;
Outro amor nunca tive: és meu, sou tua!
Meus olhos outros olhos nunca viram,
Não sentiram meus lábios outros lábios,
Nem outras mãos, Jatir, que não as tuas
A arazóia na cinta me apertaram.
Do tamarindo a flor jaz entreaberta,
Já solta o bogari mais doce aroma;
Também meu coração, como estas flores,
Melhor perfume ao pé da noite exala!
Não me escutas, Jatir! Nem tardo acodes
À voz do meu amor, que em vão te chama!
Tupã! Lá rompe o sol! Do leito inútil
A brisa da manhã sacuda as folhas!
(DIAS, Gonçalves. OBRAS POÉTICAS, II, p.17)
VOCABULÁRIO
arazóia - variante de araçóia, saiote de penas usado pelas mulheres indígenas.
bogari - arbusto, trepador, cultivado em jardins, que apresenta flores alvas, de perfume penetrante.
tapiz - tapete.
viração - vento brando e fresco, aragem, brisa.
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APELO
Amanhã faz um mês que a Senhora está longe de casa. Primeiros dias, para dizer a verdade, não
senti falta, bom chegar tarde, esquecido na conversa de esquina. Não foi ausência por uma semana: o
batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho.
Com os dias, Senhora, o leite primeira vez coalhou. A notícia de sua perda veio aos poucos: a pilha de
jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo da escada. Toda a casa era um corredor deserto, e até o
canário ficou mudo. Para não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora da noite
eles se iam e eu ficava só, sem o perdão de sua presença e todas as aflições do dia, como a última luz na
varanda.
E comecei a sentir falta das pequenas brigas por causa do tempero na salada - o meu jeito de querer
bem. Acaso é saudade, Senhora? As suas violetas, na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não
tenho botão na camisa, calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolhas? Nenhum de nós sabe, sem a
Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor.
(TREVISAN, Dalton. "II - Os Mistérios de Curitiba", In OS DESASTRES DO AMOR - Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira, 1968)
4. (Unesp) O ENTERRADO VIVO
É sempre no passado aquele orgasmo,
é sempre no presente aquele duplo,
é sempre no futuro aquele pânico.
É sempre no meu peito aquela garra.
É sempre no meu tédio aquele aceno.
É sempre no meu sono aquela guerra.
É sempre no meu trato o amplo distrato.
Sempre na minha firma a antiga fúria.
Sempre no mesmo engano outro retrato.
É sempre nos meus pulos o limite.
É sempre nos meus lábios a estampilha.
É sempre no meu não aquele trauma.
Sempre no meu amor a noite rompe.
Sempre dentro de mim meu inimigo.
E sempre no meu sempre a mesma ausência.
(ANDRADE, Carlos Drummond de. OBRAS COMPLETAS. Rio de Janeiro, Aguilar, 1967, p. 81)
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Apesar das diferentes perspectivas de abordagem, "Apelo" e "Leito de Folhas Verdes"
apresentam semelhanças bem marcadas no que diz respeito ao tratamento do tema da
ausência. A partir dessa observação, compare esses dois textos com o poema "O Enterrado
Vivo" e diga em que medida esse terceiro texto distingue-se dos outros dois no tratamento do
mesmo tema.
No "O Enterrado Vivo" vemos não uma ausência, mas uma solidão angustiante de um
eu - lírico voltado inteiramente para a sua solidão.
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