14 Clínica EMERGÊNCIAS MÉDICAS www.dentistry.com.br Clínica Será que você está preparado para lidar com as situações de emergências medicas? Artigo apresenta situações de emergências médicas que podem ocorrer em clínicas e consultórios odontológicos e aponta ações que auxiliam no atendimento e socorro adequado destes pacientes Introdução A população está vivendo mais1, com a evolução da medicina e introdução de novas tecnologias pacientes que, no passado morriam ou se encontravam acamados ou ainda hospitalizados, atualmente se encontram estabilizados ou controlados e apresentando uma “relativa” qualidade de vida. Atualmente, no entanto, ocorre o fenômeno da Polifármacia (uso simultâneo de múltiplas drogas), onde os pacientes fazem uso de muitos remédios, alguns prescritos, mas muitos utilizados pelos pacientes como auto-medicação, OTC (out the counter), herbais e suplementos alimentares, como consequência, aumentam as internações em hospitais2-4 em função das reações adversas às drogas, muitas vezes, resultando na morte dos pacientes2. Os avanços médicos e cirúrgicos estão aumentando o número de pacientes com considerações médicas importantes, isto é, complexidades médicas que trazem preocupações importantes na terapia Odontológica. Transplantes de órgãos sólidos; reparações cirúrgicas complexas de válvulas cardíacas e cirurgias cardíacas de revascularização do miocárdio; introdução de articulações artificiais; marca-passos implantados e cardiodesfibriladores; e ainda bombas de insulina bem como, novas drogas para diferentes terapias de doenças crônicas são somente alguns exemplos dos avanços médicos que aumentam o número de pacientes com uma complexidade médica que, possivelmente, irão se apresentar para o tratamento Odontológico. A Odontologia também avançou muito e introduziu novas tecnologias como os implantes intra-ósseos, tratamentos periodontais avançados combinados a Odontologia restauradora extensa com novas tecnologias e materiais, proporcionando uma Odontologia com longa vida, atraindo para os consultórios pacientes apresentando uma complexidade médica bem como os pacientes saudáveis. No entanto, a Odontologia atual pode e deve proporcionar o atendimento seguro para os diversos pacientes. Assim, é razoável que os profissionais estejam atentos em assuntos como a avaliação física, histórico médico e considerações em relação a possíveis interações de drogas e ainda considerar a introdução de algumas modificações na terapia odontológica no sentido de diminuir o stress dessa população. Esses são alguns fatores que muito provável irão prevenir situações de emergências medicas no ambiente odontológico. Serão discutidas nesse artigo algumas sugestões no sentido de preparar o consultório e ou ambulatório odontológico para lidar com as emergências médicas. Preparação para as Emergências Médicas: Em 2002, a American Dental Association5, através do seu conselho científico, propôs alguns medidas para a preparação dos consultórios odontológicos a fim de lidar com situações de emergências médicas de forma segura e efetiva (quadro1.0) 1. Treinamento de todos envolvidos no atendimento em SBV & RCP Diversas pesquisas demonstram uma preparação inadequada dos estudantes da área de saúde em Suporte Básico de Vida (SBV) e Ressuscitação Cardiopulmonar (RCP) 6-13, incluindo-se os estudantes de Odontologia, Enfermagem e Medicina o que justifica, segundo organizações internacionais, preconizar o treinamento dos profissionais periodicamente em SBV & RCP13,14. Os conceitos que condizem com as principais organizações internacionais que preconizam algoritmos, sequência e melhorias na administração de técnicas através de estudos e, que são periodicamente atualizados -Cursos de Educação continuada em Emergências Médicas (Didáticos e Clínicos) -Capacitação e Treinamento de todos envolvidos no atendimento dos pacientes em SBV (Suporte básico de vida) & RCP (Reanimação cardiopulmonar) -Introdução de um Kit Básico de Emergências Médicas, incluindo-se Drogas, Equipamentos e Oxigênio -Serviço de Emergências Médicas disponível para acionar e com número de fácil visualização EMERGÊNCIAS MÉDICAS Clínica 15 www.dentistry.com.br em relação ao SBV13,14, estão relacionados a prevenção ou correção da falta de oxigenação aos órgãos nobres que são o cérebro e coração15. Para o controle de todas as situações de emergências médicas em ambiente odontológico, deve ser assegurado o suporte básico de vida, assegurando que o sangue oxigenado seja fornecido aos órgãos vitais, cérebro e coração. Se todos os envolvidos no atendimento dos pacientes lembrarem desse princípio, toda a sequência do atendimento fará sentido. De fato, esse é o principio do treinamento do Suporte Básico de Vida (SBV), também conhecido como Ressuscitação Cardiopulmonar (RCP)16. É razoável que os profissionais se disponibilizem a um treinamento de 1 dia para se atualizarem em SBV & RCP, bem como os profissionais envolvidos no atendimento do paciente em geral. Enfim, todos que trabalham em ambiente odontológico ou médico devem estar preparados e treinados para administrar o SBV& RCP de forma efetiva. Uma atualização recente e importante no SBV é que o DEA-Desfibrilador Automático Externo (Figura 1), antes relacionado ao ACLS (Advanced Cardiovascular Life Support), atualmente está relacionado ao SBV & RCP, evidenciando a necessidade dos profissionais de saúde no manejo desse moderno e simples dispositivo. 2. Chamar Ajuda: Quando e Quem Chamar? Um fator importante é saber quando procurar ajuda e não hesitar em fazê-lo. Nunca hesite em chamar ajuda, é melhor chamar socorro do que tentar lidar com a situação de emergência médica sozinho, podendo chegar a uma situação em que seja tarde demais o auxílio externo. Assim que o profissional achar que precisa de ajuda especializada deve chamar socorro, mesmo em casos de dúvida deve ativar o serviço de emergência médica. Na ocorrência dessas situações, geralmente, em fun- FIGURA 1 - Desfibrilador automático externo tempo até a chegada desse serviço. A formação básica em SBV será importante para que durante o período de espera o profissional mantenha o paciente vivo até que ele se recupere ou até a chegada do SEM. Resumidamente, essa é uma obrigação moral e legal, cujos profissionais treinados deverão assumir as manobras e eventualmente a administração de drogas. Como já mencionado a administração do SBV será muito importante durante o período de espera do SEM. FIGURA 2 - Posicionando o paciente, posição supina com os pés ligeiramente elevados A Odontologia atual pode e deve proporcionar o atendimento seguro para os diversos pacientes ção do nervosismo e despreparo não se sabe a quem pedir socorro. O mais lógico é ativar o serviço de emergência médica (SEM) da região. No Brasil o SAMU (192) é o serviço nacional disponível nos diversos estados do pais17. Sugere-se que esse número esteja disponível e com fácil visualização nos consultórios e ambulatórios no sentido de acionar rapidamente esse serviço quando necessário. O tempo de demora entre o acionamento do serviço e a chegada do pessoal especializado no consultório, muito provável pode variar bastante, por exemplo: 6-10 minutos em uma cidade sem trânsito, ou ainda por exemplo 25-30 minutos em uma grande metrópole com tráfego pesado. Em regiões isoladas o profissional pode permanecer com o paciente por períodos maiores de 3. Cursos de Educação Continuada em Emergências Médicas, Drogas e Kits Evidente que se faz necessário cursos de educação continuada envolvendo as emergências médicas destinados ao tratamento específico das principais situações que possam acontecer em ambiente odontológico. Exemplos: sincopes, alergias, ataque de asma, epilepsia, angina, infarto agudo do miocárdio, dentre outras. Evidente que o profissional deve estar familiarizado com algumas drogas para que sejam instituídas no seu kit de emergências médicas. A adrenalina injetável talvez seja a droga mais importante que deve estar contida no kit de emergências médicas, uma vez que essa droga realmente pode salvar uma vida em determinadas situações, exemplos: reações alérgicas moderadas ou severas. O oxigênio é uma droga importante e pode ser utilizado em quase todas as situações de emergências médicas também. Dai a importância para o treinamento para administrar esses remédios em situações especificas. 4. Plano Básico de Ação Quando ocorrem as situações de emergências médicas, geralmente todos ficam em pânico e não sabem determinar uma seqüência para o atendimento dessas ocorrências. Uma vez que seja estabelecido um plano de ação18-20 com treinamento de todos os profissionais envolvidos no atendimento, o dentista “ ganha tempo” mesmo que ainda não seja estabelecido o diagnóstico. O dentista pode e deve iniciar, imediatamente, o aten- FIGURA 3 - Inclinação posterior da cabeça e levantamento do queixo (head tilt-chin lift) 16 Clínica EMERGÊNCIAS MÉDICAS www.dentistry.com.br C- Circulação – Verificar a circulação, verificar o pulso 15-30 segundos, geralmente o pulso carotídeo e, se indicado, iniciar as compressões torácicas. D- Tratamento definitivo - Que pode ser o simples posicionamento do paciente (P) que foi realizado inicialmente e pode já ter apresentado resultados ou mesmo desfibrilação, administração de drogas. Resumidamente, estas são as ações realizadas pelo dentista ou profissionais de saúde (staff) para ajudar a melhorar a condição do paciente, determinando que a vitima retorne ao estado anterior a situação de emergência médica. Fica evidente a importância do treinamento e simulação de situações de emergências médicas para a administração do SBV no ambiente odontológico. FIGURA 4 - Verificação do pulso carotídeo que deve ser realizada com 2 dedos por no mínimo 15 segundos dimento do paciente assim que se reconheça a situação, “algo errado” com o paciente e que, provavelmente, possa gerar uma situação de perda da consciência, ou uma disfunção respiratória. A administração do suporte básico de vida é o passo mais importante no controle de todas as situações de emergências médicas e, na grande maioria das vezes, será mais importante do que a administração de drogas. A partir disso, a seqüência A-B-C será relevante para o atendimento das situações. Como na maioria das situações o paciente se encontra na cadeira odontológica, Malamed18, propôs a introdução do P, que será posicionar o paciente no sentido de iniciar o controle da situação. Então é sugerido que se acrescente o P na sequência A-B-C . P-A-B-C-D P- Posicionar o paciente pode ser o inicio do controle das situações de emergências médicas. Num paciente inconsciente, a causa provável é a ausência de uma perfusão cerebral adequada ou seja, um fornecimento inadequado de oxigênio. Posicionando o paciente em uma posição supina com os pés mais elevados podemos aumentar o fluxo sanguíneos para a “cabeça “ melhorando, consequentemente, a perfusão cerebral, corrigindo o fornecimento inadequado de oxigênio. (Figura 2) A- Airway - Acessar as vias aéreas e determinar a “desobstrução” se indicada, com a administração de manobras de inclinação posterior da cabeça e levantamento do queixo (head tilt-chin lift). (Figura 3) B- Breathing - Acessar a respiração e iniciar a ventilação boca - máscara, ou até administração de oxigênio com máscara facial em casos de apneia. A administração do suporte básico de vida é o passo mais importante no controle de todas as situações de emergências médicas e, na grande maioria das vezes, será mais importante do que a administração de drogas Conclusões As emergências médicas podem e devem acontecer em consultórios e ambulatórios odontológico. Apesar de diferentes etiologias, cada consultório deve estar preparado em algum nível básico para se deparar com essas situações com resultados eficazes. Essas situações podem estar diretamente relacionadas a terapia odontológica (ex: administração do anestésico local,terapia periodontal, endodontia, outras); podem estar relacionadas a administração de drogas, interações, overdoses ou ainda reações adversas; podem estar relacionadas a uma condição física pré-existentes (ex: hipertensão, insuficiência cardíaca, angina, hipotensão ortostática, outras); relacionadas a reações psicogênicas em função do ambiente odontológico e ainda por acaso (exemplos: “morte súbita,” parada cardíaca, AVC , outros). Apesar de todos os esforços para a prevenção dessas situações, infelizmente essas situações podem acontecer. No entanto, a capacitação e treinamento em SBV e a introdução de um plano básico de ação no consultório por parte dos profissionais podem salvar vidas. Referências Bibliográficas 1. The Financial Impact of longevity risk.Chapter4.International Monetary Fund.April2012. 2. Bjerrrum et al L et al.:Polypharmacy in general practice: differences between practitioners. Br J Gen Pract. 1999 March; 49(440): 195–198 3. Walker UJ et.al.:Prevalence and predictors of polypharmacy among older primary care patients in Germany. Family Practice Advance Access published on 11 December 2006 4. Bjerrum L et al.: Polipharmacy in general practice: differences between practitioners.British Journal of General Practice,March 199,49,195-198 5. Office Emergencies and emergency kits.J Am Dent Assoc-Ada Counsil on Scientific Affairs-2002;133;364-365 6. ChandrasekaranS et al.:Awareness of basic life support among medical, dental, nursing students and doctors.Indian J Anaesth,2010 March;54(2):121-6 7. Sharma R,Attar NR. Adult Basic Life Support. NUJHSVol2,nº3,September 2012. 8. Carvalho RM et al.:Brazilian dental students’ perceptions about medical emergencies: a qualitative exploratory study. J Dent Educ. 2008 Nov;72(11):1343-9. 10. Chaudhrary A et al.:Current Scenario:Knowledge of Basic Life Support in Medical College. Vol 1 Issue 2 Oct – Dec 2011 11. Craham CA,Scollon D.Cardiopulmonary resuscitation training for UK undergraduate dental students. Resuscitation. 1996 Sep;32(2):105-8. 12. Sopka et al.:Practical skills training influences knowledge and attitude of dental students towards emergency medical care. Eur J Dent Educ. 2012 Aug;16(3):179-86 13. Chamberlain et al.Education in Resuscitation: An ILCOR Symposium.Circulation November 18, 2003 14. 2010 American Heart Association Guidelines for Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science. Circulation. 2010;122:S640-S656. 15. Hazinski MF, et al. Part 1: Executive Summary: 2010 International Consensus on Cardiopulmonary Resuscitation and Emergency Cardiovascular Care Science With Treatment Recommendations. Circulation. 2010;122 (Suppl 2):S250-See275. 16. American Heart Association. Part 2: the systematic approach—the BLS primary survey and ACLS secondary survey. In: Advanced Cardio- vascular Life Support Provider Manual: Professional. 2006:7-10. 17. Portal Saude .website: http://portal.saude.gov.br/ portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=36594.Visitado em 07.10.2012 18.Malamed SF. Preparation. In: Medical Emergencies in the Dental Office. 6th ed. St. Louis: Mosby; 2007:59-65. 19. Malamed SF. Beyond the basics.Emergency Medicine in Dentistry.J Am Dent Assoc 128(7):843-854,1997 20. Haas D.The Dental Team Approach to Medical Emergencies Part1.Inside Dentistry.March2011.