um desafio ao poder público 1 Escolas irregulares: 2 um desafio ao poder público 3 Escolas irregulares: Estado de Mato Grosso Governador do Estado de Mato Grosso Secretário de Estado de Administração Diretor Geral da Escola de Governo Blairo Borges Maggi Geraldo Aparecido de Vitto Júnior Almir Balieiro Escola de Governo do Estado de Mato Grosso Diretoria de Laboratório de Administração Pública Angela Maria Teixeira de Almeida Diretoria de Educação Superior e Profissional Regina Lúcia Borges Araújo Diretoria de Educação Continuada Toshico Elza Yamamura Rios Universidade do Estado de Mato Grosso Reitor Vice-Reitor Pró-Reitoria de Administração e Finanças Pró-Reitoria de Ensino e Graduação Pró-Reitoria de Extensão e Cultura Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação Pró-Reitoria de Planej. e Desenv. Institucional 4 Taisir Mahmudo Karim Almir Arantes Wilbum de Andrade Cardoso Neodir Paulo Travessini Solange Kimie Ikeda Castrillon Laudemir Luiz Zart Marcos Francisco Borges um desafio ao poder público ESCOLAS IRREGULARES: UM DESAFIO AO PODER PÚBLICO MARIA AMÉLIA RAMOS 5 Escolas irregulares: Coordenação Editorial Imagem de Capa Projeto Gráfico/Arte Final Diagramação Revisão Marilda Fátima Dias Marcio A. Campos Oliveira Valter Gustavo Danzer Edgar Bortoleto Ferreira/ Franciano Antunes Equipe Editora UNEMAT Copyright © 2005 / Editora UNEMAT Impresso no Brasil - 2005 Ficha Catalográfica elaborada pela Coordenadoria de Bibliotecas / UNEMAT - Cáceres Ramos, Maria Amélia. Escolas irregulares: um desafio ao poder público/Maria Amélia Ramos. Cáceres-MT: Editora Unemat, 2005. 238p. 1. Educação 2. Legislação escolar 3. Escolas irregulares Mato Grosso I. Título ISBN 85-89898-29-6 CDU 37.014.15 (817.2) Índice para catálogo sistemático 1. Educação - 37 2. Legislação escolar - 37.014.15 (817.2) EDITORA UNEMAT Av. Tancredo Neves, 1095 - Cavalhada - Cáceres - MT - Brasil - 78200000 Fone/Fax 65 3221 0080 - www.unemat.br - [email protected] Todos os Direitos R eservados. É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma Reservados. ou por qualquer meio. A violação dos direitos de autor (Lei n° 5610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal. 6 um desafio ao poder público Dedico... A meus pais Joaquim R Ramos amos “in memorian” e Amélia Gazzi Ramos pelos incansáveis ensinamentos e condições para que eu chegasse até aqui. Ao meu esposo Paulo Ibanhes pela dedicação, carinho permanente, estímulo constante e sempre à minha disposição nas inúmeras leituras e valiosas contribuições. 7 Escolas irregulares: 8 um desafio ao poder público Agradecimentos Especiais Ao Professor Dr Dr.. Sérgio Brasil Nazário Scala Scala, orientador de todo o trabalho, pela dedicação, paciência e estímulo constante. Minha gratidão por ter ele acreditado no meu potencial e me encorajado sempre. À Profª Alaídes Alves Mendieta, Presidente do Conselho Estadual de Educação pelo apoio constante na divulgação da pesquisa. À Profª Drª Marlene Silva Oliveira Santos ex- Presidente do Conselho Estadual de Educação, ex- Secretária de Estado de Educação pelo apoio, incentivo e disponibilização dos dados no momento da pesquisa. À Profª Eloysa Maria TTeixeira Alves, Secretária Executiva eixeira Alves do Conselho Estadual de Educação, pela revisão de grande parte de meus escritos e significativas contribuições, seu espírito amável, dedicado e alegre ao contribuir com seus conhecimentos e sugestões durante a pesquisa jamais será esquecido, por sua confiança e estímulo nos momentos difíceis, muito obrigada! 9 Escolas irregulares: Agradeço: Ao Criador que me concedeu luz, perseverança e discernimento nos momentos de dúvida. Aos Conselheiros, Coordenadores, Técnicos e servidores do Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso pelo apoio, compreensão e sugestões durante a pesquisa. Aos servidores da Secretaria de Estado de Educação em especial da Superintendência de Tecnologia da informação pelo apoio e disponibilização de dados. Aos Presidentes dos Conselhos Estaduais de Educação dos Estados que contribuíram com a pesquisa enviando legislações e outros documentos. Aos Presidentes dos Conselhos Municipais de Educação de Barra do Garças e Tangará da Serra, senhores José Nogueira de Moraes e Elídeo Vagner Yenis Suares pelas valiosas contribuições. Aos Técnicos da Secretaria Municipal de Educação e Assessores Pedagógicos do Município de Cuiabá-MT pelo apoio e fornecimento de dados. Aos Assessores Pedagógicos dos 65 Municípios colaboradores. Aos Secretários Municipais de Educação dos 41 Municípios que contribuíram. Aos Diretores, Professores, Pais e Alunos de Escolas Públicas e Privadas que contribuíram com a pesquisa. Aos Secretários Acadêmicos das Instituições de Ensino Superior: UNIC, UNIRONDON, UNIVAG, IVE e UNEMAT pelo fornecimento de dados. Aos atendentes do Arquivo Público Estadual pela eficiência no atendimento. Aos atendentes do Instituto Memória da Assembléia Legislativa do Estado pela presteza no atendimento. À Escola de Governo pelo incentivo e publicação dos trabalhos realizados por servidores públicos. 10 um desafio ao poder público PREFÁCIO A melhoria da gestão pública do Estado de Mato Grosso é um dos grandes objetivos estratégicos do Governo Blairo Maggi Maggi. Para tanto, torna-se imprescindível o fortalecimento das instituições de governo, principalmente, pela valorização, formação e capacitação dos profissionais comprometidos com a efetivação das atividades de governo no atingimento desses objetivos. Nesta perspectiva ocorre todo um esforço para a criação da Escola de Governo do Estado de Mato Grosso. A Escola de Governo foi criada através da “Lei Complementar nº 156, de 19 de janeiro de 2004”, tem a finalidade de formular as políticas de formação e capacitação dos servidores públicos civis e militares do Estado de Mato Grosso, bem como produzir e divulgar conhecimentos em Políticas Públicas. Comprometida com a melhoria da gestão pública do Estado, a Escola de Governo está inserida em dois grandes programas de governo; “formação e capacitação dos servidores públicos” e “estudos e geração de conhecimentos”. Esta obra, ora prefaciada, é resultado do Projeto Publicação de TTrabalhos rabalhos Científicos Científicos, contextualizado no programa Estudos e Geração de Conhecimentos em Políticas Públicas, tendo como objetivo a geração, divulgação e socialização de conhecimentos em políticas públicas. A Escola de Governo acredita que esse projeto, inovador em nosso Estado, contribuirá sobremaneira para a melhoria da gestão pública, tornando-se uma prática do servidor público, grande protagonista de todo esse processo. Desta forma, o servidor público revela-se altamente comprometido com a permanente melhoria dos serviços públicos prestados à sociedade mato-grossense, não como coadjuvante, mas, definitivamente, como sujeito de todo processo. Almir Balieiro Diretor Geral da Escola de Governo 11 Escolas irregulares: 12 um desafio ao poder público SUMÁRIO APRESENT AÇÃO ................................................... 017 APRESENTAÇÃO INTRODUÇÃO ...................................................... 021 CAPÍTUL O 1 CAPÍTULO Os instrumentos legais de controle da educação escolar no Brasil .................................................... 029 1 Conceitos básicos .................................................. 030 1.1 Sistema e sistema de ensino ................................. 030 1.2 Administração e burocracia ................................. 035 1.3 Democracia, participação e cidadania .................. 039 2 Breve histórico dos instrumentos legais de controle da educação escolar no Brasil .......................................... 046 3 Desafio: a sociedade da informação e o modelo de controle da educação escolar adotado pelo poder público 059 CAPÍTUL O 2 CAPÍTULO Os instrumentos legais de controle da educação escolar no Estado de Mato Grosso ..................... 068 1 Breve histórico do controle da educação escolar no Estado de Mato Grosso ......................................... 069 1.1 Os mecanismos de fiscalização adotados pela Secretaria de Estado de Educacação da sua criação em 1946 ao ano 2001 ............................................................. 080 1.2 Os instrumentos legais de controle adotados pelo Conselho Estadual de Educação da sua criação em 1963 ao ano 2001 ............................................................. 104 CAPÍTUL O 3 CAPÍTULO Escolas irregulares: um problema de dimensão estadual ................................................................. 127 1 Como são cadastradas as escolas do Sistema Estadual de Ensino no Conselho Estadual de Educação .................... 127 13 Escolas irregulares: 2 Escolas públicas estaduais e particulares em funcionamento irregular ..................................................................... 133 3 Procedimentos do Conselho Estadual de Educação para resguardar a vida escolar dos alunos nos anos 1999 e 2000 ......................................................................... 134 4 O tempo de permanência dos processos de autorização e reconhecimento no CEE/MT nos anos 1999 e 2000 .. 141 CAPÍTUL O 4 CAPÍTULO Contribuições de órgãos afins ............................. 146 1 Contribuições dos Conselhos Estaduais de Educação ........ 146 2 Contribuições dos Conselhos Municipais de Educação ........ 151 2.1 O Sistema Municipal de Ensino de Barra do Garças . 151 2.2 O Sistema Municipal de Ensino de Tangará da Serra .... 153 3 Contribuições de Assessorias Pedagógicas e Secretarias Municipais de Educação ............................................. 159 3.1 Dificuldades vivenciadas pelos Assessores Pedagógicos . 165 3.2 Dificuldades vivenciadas pelos Secretários Municipais de Educação .................................................................. 166 4 Contribuição da Junta Comercial do Estado de Mato Grosso .............................................................. 172 CAPÍTUL O 5 CAPÍTULO Escolas irregulares: um problema no m unicípio de Cuiabá-MT ...................................................... 178 1 Caracterização do Município ................................. 178 2 As redes: pública estadual, municipal e particular de Ensino do Município de Cuiabá nos anos 1999 e 2000 179 3 Procedimentos adotados pela Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá/MT para conter oferta de cursos irregulares no Município............................................. 184 4 Contribuições da comunidade cuiabana .................. 191 4.1 Contribuições de dirigentes escolares de instituições públicas e privadas ..................................................... 192 4.2 Contribuições de professores ............................... 198 14 um desafio ao poder público 4.3 Contribuições de alunos ...................................... 200 4.4 Contribuições de pais .......................................... 203 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................... 208 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................... 223 15 Escolas irregulares: 16 um desafio ao poder público APRESENT AÇÃO APRESENTAÇÃO Este trabalho de Maria Amélia Ramos é um estudo de referência para a pesquisa em educação no Brasil. A temática e a forma como foi discutida revelam sua qualidade acadêmico-científica e relevância social. Mas que elementos a sustentam? O que demonstra sua importância frente aos problemas educacionais e à pesquisa sobre a educação brasileira de ontem e de hoje? Três razões, dentre outras, dão ao estudo seu diferencial e pertinência. Em primeiro lugar, deve-se ressaltar a relevância da temática e do objeto em análise. A pesquisa discute o grave problema das escolas com funcionamento irregular e, embora o faça no âmbito de uma única localidade da federação, a problemática investigada é uma realidade a ser estudada e solucionada em todo o Brasil. Contudo, apesar de sua recorrência e importância, trata-se de uma questão lacunar na pesquisa educacional no país. Além deste aspecto – de trazer ao centro da análise um problema que atinge grande contingente de estudantes e famílias em todo o país e exige solução imediata - é fundamental a perspectiva por meio da qual a autora tece a análise. A pesquisadora não se restringe a um aporte técnico da questão, embora também o faça. Ela vai ao aspecto mais crucial, examinando a problemática do funcionamento irregular das escolas, como o campo dos direitos sociais: do exercício da cidadania. Nesse sentido, a autora entende que uma escola de qualidade, aquela que atenda às exigências necessárias para seu bom funcionamento é algo a ser discutido além da questão técnico-burocrática, pois diz respeito ao direito social à educação e a uma escola de qualidade. Essa perspectiva de análise do problema, inserindo-o no plano da construção de uma educação e sociedade democráticas é a segunda razão que sustenta a relevância social e científica do estudo. No entanto, a escolha da temática e dessa perspectiva analítica seriam insuficientes para garantir a grandeza de 17 Escolas irregulares: sua pesquisa, não fosse a seriedade, a responsabilidade e esforço intelectual da pesquisadora. A esse respeito é notável a conduta de Maria Amélia, em sua obstinada dedicação e busca de uma investigação rigorosa. A pesquisadora não se deixou vencer pelos obstáculos, procurando os elementos necessários à qualidade científica do estudo, numa atitude exemplar: em um esforço incansável, inclusive acolhendo críticas e sugestões de seus professores e interlocutores na realização do trabalho. Esse senso de incompletude junto à ousadia em formular questões, hipóteses e bases para possíveis descobertas marcaram a sua conduta, tal como se espera de todo/a pesquisador/a. Esse é o terceiro dos principais aspectos que asseguraram a qualidade final do trabalho aqui apresentado. Nesse ofício de pesquisadora, desenvolvido a partir de uma rigorosa atitude de pesquisa, de quem interroga e vai ao do objeto, não se contentando com as primeiras e superficiais impressões e descobertas, Maria Amélia elabora seu trabalho com dignidade e altivez, enfrentando as tensões e preocupações próprias às lidas desse ofício. Por esses caminhos, com seriedade e determinação, a pesquisadora realiza o que se espera das Ciências Humanas e Sociais e da Ciência como um todo: a elaboração de conhecimentos que problematizem e questionem a realidade vigente, rompendo com a razão instrumental, que a restringe à mera aplicação técnica. Ao fazer um trabalho que denuncia a realidade existente, mas que também anuncia possibilidades para sua superação, na perspectiva dos direitos sociais, a autora se aproxima de uma Ciência edificante das relações sociais que participa da construção de uma nova ordem social: uma sociedade de direitos efetivamente exercidos. Saudações, Maria Amélia, por sua contribuição à pesquisa educacional brasileira e à educação de nossa gente! E proveitosas reflexões para seus/suas leitores/as! Sendo eu uma dentre eles/as, sugerimos que siga à frente. Senão por outras razões, porque seu trabalho reiterou que são grandes nossos desafios adiante, mostrando-nos que não podemos parar aqui. 18 um desafio ao poder público Indicou-nos, em sua análise do problema, denunciando e anunciando algumas veredas a percorrer e a edificar rumo ao que você anuncia: a possibilidade de uma educação e de uma escola que sejam, verdadeiramente, um direito social ao alcance de nossos/as crianças, adolescentes, jovens e adultos. Uma educação inclusiva e democrática que auxilie as novas e antigas gerações de brasileiros/as na construção de uma outra sociedade, possível tanto quanto necessária: um Brasil em que a liberdade, a justiça, a igualdade e a diversidade sejam uma realidade viva e vigorosa, uma invenção permanente. Um projeto, uma arquitetura social e histórica em que não poderão faltar a educação, a escola e seus sujeitos. Novembro de 2004 Profª. Drª. Inês Assunção de Castro Teixeira Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais 19 Escolas irregulares: 20 um desafio ao poder público Esta obra, originária de uma pesquisa realizada nos anos 2000/2001 sobre a situação de legalidade das escolas de educação básica, públicas e privadas do Município de Cuiabá-MT, concretiza uma idéia que surgiu há mais de dez anos durante o desempenho de atividades profissionais na Equipe de Inspeção Escolar, na Superintendência Regional de Ensino em Cuiabá-MT. A idéia foi fortalecida quando passei a compor a Equipe Técnica do Conselho Estadual de Educação - CEE/MT, local em que alunos que freqüentam o Ensino Fundamental ou Médio, não autorizados e/ou não reconhecidos pelo órgão competente buscam constantemente soluções, principalmente após serem aprovados em vestibular, ou quando necessitam do certificado de conclusão ou diploma para se manterem empregados e não têm como comprovar os seus estudos. Nesse órgão é comum a presença de pais em busca de solução para a vida escolar de seus filhos e, ainda, de dirigentes de escolas públicas e privadas que visam a regularização dos cursos oferecidos pelas escolas que administram. A convivência diária com problemas dessa ordem foi o impulso para estudar o assunto, cujo teor está intimamente 21 Escolas irregulares: relacionado aos procedimentos do Conselho Estadual de Educação CEE –MT, órgão normativo do sistema estadual de ensino e à Secretaria de Estado de Educação SEDUC-MT, como órgão executivo. No Estado de Mato Grosso, nesse momento toda escola de educação básica do sistema estadual de ensino, necessita dos atos de autorização e reconhecimento dos cursos que oferecem a fim de que possa emitir os certificados de conclusão com validade nacional. O ato de autorização concedido pelo CEE/MT, órgão competente para tal, significa permissão para o início das atividades e o reconhecimento, a confirmação da autorização para a continuidade da oferta. Esses atos somente são concedidos mediante análise de processos instruídos conforme a legislação vigente à vista do Relatório de Verificação Prévia elaborado após visita “in loco” por pessoas designadas para a função pela Secretaria de Estado de Educação. Esse procedimento visa a garantia dos direitos do aluno previstos nas legislações de ensino em termos de condições físicas, administrativas e pedagógicas da instituição, além de outras que possam comprometer o processo ensino - aprendizagem ou oferecer riscos aos alunos. As escolas de educação básica em funcionamento sem o ato de autorização e /ou de reconhecimento podem não estar observando os preceitos legais estabelecidos para a garantia dos direitos da clientela escolar e da qualidade do processo ensino aprendizagem. Não foram, durante a pesquisa, detectados ou analisados outros tipos de irregularidades como as questões administrativas e trabalhistas especialmente das escolas mantidas pela iniciativa privada e também as relativas à qualidade do ensino que, embora também se refiram ao funcionamento irregular, não constituíram objeto da investigação. A legalização da escola não está intrinsecamente relacionada à qualidade do ensino ofertado. O simples fato de uma escola oferecer cursos autorizados e/ou reconhecidos, não garante, por si só, a qualidade do ensino. Para que o 22 um desafio ao poder público ensino seja de qualidade muitos outros fatores devem ser avaliados acompanhados e, principalmente, fiscalizados, mas as chances de uma escola cujos cursos estejam autorizados e/ ou reconhecidos oferecer ensino de melhor qualidade e garantir os direitos da clientela escolar são muito maiores. A regularização periódica dos cursos oferecidos pela escola, aliada à fiscalização sistemática e eficaz pelo poder público com o envolvimento da sociedade, pode ser um bom caminho para a erradicação da oferta irregular e, inclusive da má qualidade, do ensino por escolas públicas e privadas. A finalidade da pesquisa foi dimensionar o problema, levantar as causas que levam as escolas a funcionarem sem o ato de autorização e/ou reconhecimento dos cursos que oferecem e contribuir para que reflexões sejam desencadeadas nos órgãos educacionais, a fim de que, formas alternativas possam ser encontradas pelo poder público facilitando a manutenção de escolas legalizadas e que garantam os direitos à educação de melhor qualidade à população. O funcionamento de escolas irregulares não é um problema novo no Estado. Após a instauração da prática de concessão de autorização do governo para a abertura de escolas particulares no Estado de Mato Grosso em 1875, escolas passaram a ser fechadas por funcionarem sem a permissão do poder público. Muitas normas foram estabelecidas para disciplinar o assunto, mas, ao longo dos anos, alguns mantenedores e/ou dirigentes de escolas públicas e privadas foram adquirindo o hábito do descumprimento dos preceitos legais e em conseqüência, escolas funcionando sem a permissão do poder público sempre existiram desde o período imperial. A sociedade mato-grossense, portanto vem convivendo com problemas dessa ordem há quase dois séculos e, apesar da existência dos instrumentos de controle utilizados pelo poder público, envolvendo o estabelecimento de normas e mecanismos de fiscalização das unidades escolares para a manutenção de cursos legalizados, o problema tem se intensificado nas últimas décadas. 23 Escolas irregulares: A legislação atual que disciplina a oferta da educação escolar básica nas escolas públicas e privadas do sistema estadual de ensino do estado de Mato Grosso deixa claro que os atos praticados pelas escolas, antes do ato de autorização ou após a vigência do prazo de autorização de funcionamento e/ ou do reconhecimento dos cursos, não serão válidos e, ainda, que serão de exclusiva responsabilidade dos dirigentes da entidade mantenedora (pública ou privada) os danos causados aos seus alunos pela infração. Entretanto, no ano 2000, cerca de 40 % das escolas da rede pública e 50% das escolas da rede particular de ensino do Município de Cuiabá-MT ofereceram alguma etapa da educação básica ou outra modalidade de ensino de forma irregular. No Estado, nesse mesmo ano, a percentagem aproximou-se de 40% em ambas as redes. Também em 2000, 47,3% dos alunos que concluíram o Ensino Médio em escolas públicas, e 10,3% dos que concluíram em escolas particulares, no Município de Cuiabá-MT, o fizeram em cursos irregulares. Esses números são significativos e indicam necessidade de providências. A intenção inicial foi verificar os procedimentos adotados pela Secretaria Municipal de Cuiabá - SME/CBÁ, Secretaria de Estado de Educação - SEDUC/MT e Conselho Estadual de Educação- CEE/MT em relação ao controle da oferta da educação escolar básica nos últimos dez anos. Entretanto, as origens do problema extrapolavam o período pretendido e não fazia sentido o estudo do problema num período tão recente. As causas não estavam nele, mas muito distantes e qualquer trabalho por mais aprofundado que fosse, nesse curto período, seria insuficiente e poderia trazer indicativos de soluções apenas paliativas como tantas outras. Acompanhar a trajetória do órgão normativo quanto à elaboração das normas que regulam a oferta da educação escolar e, também, do órgão executivo que fiscaliza e zela pelo bom funcionamento das escolas do sistema estadual de ensino desde o período imperial, foi o caminho escolhido na pes24 um desafio ao poder público quisa para entender os procedimentos atuais desses órgãos e, conseqüentemente, resgatar as causas que levam escolas públicas e privadas a funcionarem de forma irregular. Para que os órgãos responsáveis diretamente pela administração do sistema estadual de ensino, Conselho Estadual de Educação e Secretaria de Estado de Educação, possam perceber se estão avançando ou retrocedendo nessa área, o conhecimento pregresso dos seus procedimentos pode trazer elementos importantes. É evidente que o conhecimento do passado não assegura a solução dos problemas do presente nem impede, por si só, o surgimento de problemas no futuro, mas pode possibilitar a identificação de pontos de estrangulamento das políticas adotadas, de ações que podem ser viabilizadas e entendidas como realmente novas ou úteis e ainda, perceber até que ponto as raízes podem ser cortadas sem que o cerne seja comprometido. Para facilitar a compreensão da realidade tal como se apresenta, todo o trabalho está organizado em cinco capítulos. No primeiro estão incluídos alguns conceitos básicos como: sistema e sistema de ensino, administração e burocracia, democracia, participação e cidadania, a fim de facilitar o entendimento do objeto do estudo. Consta também nesse capítulo, um breve resgate histórico dos instrumentos legais de controle da oferta da educação escolar no país e uma abordagem sobre o desafio da sociedade da informação ao poder público que se encontra forçado a se adaptar aos avanços tecnológicos para que possa atender aos anseios da sociedade. O poder público diante desse desafio pode seguir tendências ligadas ao pensamento neoliberal de estado mínimo, utilizando-se de tecnologias diversas para obter maior controle e fortalecer ainda mais o poder hegemônico em detrimento da disponibilidade e socialização das informações à população, e isso é preocupante. Esse é um assunto que merece redobrada atenção dos órgãos responsáveis pela educação no Estado, que devem canalizar todos os esforços a fim de que meios tecnológicos sejam utilizados para socializar informações, fa25 Escolas irregulares: vorecer o desenvolvimento amplo da cidadania e, sobretudo, atender aos anseios coletivos. O segundo capítulo resgata historicamente, alguns procedimentos dos órgãos normativo e executivo do sistema estadual de ensino do Estado de Mato Grosso, relativos ao tema do período imperial ao ano 2001. Apenas foram resgatados alguns fatos, ações e decisões políticas determinantes da política de controle da educação escolar básica no sistema estadual de ensino para a visualização dos pontos de estrangulamentos das políticas adotadas e conseqüentemente de soluções probabilísticas relacionadas ao tema. No terceiro capítulo, mereceu destaque o complexo levantamento sobre o número de escolas existentes no âmbito estadual, municipal e particular visto que tanto as Secretarias Municipais como a de Estado de Educação e o Conselho Estadual de Educação não possuíam em seus arquivos dados completos e agrupados que permitissem uma análise no contexto proposto pela pesquisa. Os dados existiam, mas registrados em fichas individuais feitas manualmente para cada escola. Para concluir o levantamento e apurar os números, foi necessário o cruzamento dos dados existentes no CEE/MT com os da Secretaria de Estado de Educação e os do Censo escolar 2001, sem os recursos da informatização. Nessa parte, também está evidenciada a percentagem de escolas públicas estaduais e particulares que ofereceram alguma etapa da educação básica ou modalidade de ensino de forma irregular em todos os municípios do Estado no ano 2000 para uma visualização da dimensão do problema no Estado. Não foi possível realizar o mesmo levantamento com relação às escolas municipais instaladas em todo o Estado devido ao elevado número de estabelecimentos existentes, aproximando-se de três mil unidades escolares e também devido aos limites de tempo da pesquisa para o manuseio de dados não informatizados. Contudo, os números encontrados com relação às escolas estaduais e particulares são significativos e indicam necessidade de providências quanto ao 26 um desafio ao poder público assunto. Levantamentos abrangendo escolas das três redes: estaduais, municipais e particulares somente estão incluídos no quinto capítulo destinado especificamente ao Município alvo. No quarto capítulo estão postas as contribuições de Conselhos Estaduais de Educação de 18 Estados brasileiros; 02 Conselhos Municipais de Educação de Municípios que instituíram seus sistemas de ensino até meados do ano 2001; 41 Secretarias Municipais de Educação e 65 Assessorias Pedagógicas dos Municípios do Estado de Mato Grosso. Esses órgãos guardam cada qual a sua identidade e características próprias, mas as experiências relacionadas ao tema da pesquisa vivenciadas por eles são enriquecedoras. Por ser um problema social, a visão histórico-progressista, a pluralidade de idéias e pontos de vistas são extremamente importantes para qualquer tipo de mudança. Facilitam a auto-avaliação e permitem significativos avanços. O quinto capítulo refere-se aos levantamentos diversos e necessários para demonstrar a situação de legalidade dos cursos oferecidos pelas escolas instaladas no Município de Cuiabá que até o término da coleta de dados para a pesquisa esteve integrado ao sistema estadual de ensino. Nesse Município foi possível realizar os levantamentos abrangendo escolas das três redes (estadual particular e municipal) sem os recursos da informatização, por se tratar de um número inferior a 400 unidades escolares. Estão incluídos também, no capítulo, os procedimentos adotados pela Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá para coibir a oferta irregular, proteger a população e minimizar as conseqüências dessa forma de oferta. Estão postas, ainda, as contribuições da comunidade cuiabana: dirigentes escolares, professores, pais e alunos de escolas públicas e privadas com relação ao tema, obtidas através de entrevistas diretas. Finalmente, foram tecidas as considerações finais onde estão explicitados os três principais pilares que sustentam a oferta irregular da educação escolar básica no Estado e no Município de Cuiabá/MT, quais sejam: a forma de elabo27 Escolas irregulares: ração de normas que regulam a abertura de escolas, a autorização e o reconhecimento dos cursos, desconsiderando as diversidades locais e regionais; os mecanismos de fiscalização de caráter corretivo e não preventivo e a escassa utilização de tecnologias modernas de comunicação e informação nos setores educacionais, o que se constitui num desafio da sociedade da informação ao poder público ligado à área educacional. Estão postos também nas considerações finais, indicativos prováveis de solução e algumas ações que poderão auxiliar os órgãos normativo e executivo do sistema estadual de ensino a refletirem sobre a necessidade de se estabelecer normas que possibilitem a regularização da oferta da educação escolar básica pelas escolas públicas e privadas, de forma que todas sejam impulsionadas a buscarem progressivamente a melhoria de suas estruturas físicas, pedagógicas e administrativas, como uma conquista e não como uma imposição do governo por meio de normas sempre mais rígidas e feitas para escolas ideais. 28 um desafio ao poder público A educação escolar não autorizada pelo órgão competente, mas oferecida em escolas públicas e privadas no Estado de Mato Grosso e, especialmente, no Município de Cuiabá-MT, é um fato que vem afligindo a população há vários anos. Para compreender esse fato e partir em busca de soluções, a pesquisa realizada traz à tona, ainda que brevemente, um panorama histórico dos instrumentos legais de controle existentes no país que norteiam os órgãos públicos responsáveis pela educação1 nos estados e municípios. O objetivo deste capítulo é resgatar elementos que demonstrem por que o Conselho Estadual de Educação e a Secretaria de Estado de Educação, que são órgãos que administram a educação escolar básica no Estado, adotam determinados procedimentos com relação ao tema. 1 Entende-se por órgãos responsáveis pela educação nos estados e nos municípios, os órgãos que a administram. No caso do Sistema Estadual de Ensino, o Conselho Estadual de Educação, a Secretaria de Estado de Educação e o Fórum Estadual de Educação. No caso de Sistema Municipal de Ensino, o Conselho Municipal de Educação a Secretaria Municipal de Educação e Fórum Municipal de Educação, quando houver. 29 Escolas irregulares: Para tratar do funcionamento de escolas públicas e particulares, sem o ato autorizativo do órgão competente, primeiramente, foram abordadas algumas questões conceituais indispensáveis, relacionadas à educação escolar institucionalizada: sistema e sistema de ensino, administração e burocracia, democracia, participação e cidadania. Em seguida, são resgatados alguns instrumentos legais de controle historicamente adotados no Brasil e, finalmente, faz-se uma abordagem sobre o desafio da sociedade da informação que vem forçando o poder público a adotar novas formas de controle, incluindo modernas tecnologias de comunicação e informação, a fim de que possa melhor atender aos anseios da sociedade marcadamente tecnológica. A socialização das informações e novas formas de controle são necessárias para estimular os cidadãos a reivindicarem seus direitos e contribuírem para as mudanças no campo educacional. 1 Conceitos básicos 1.1 Sistema e sistema de ensino O termo sistema, embora tenha sido utilizado na Constituição Federal de 1934, pela primeira vez (Art. 150), para definir as competências da União e dos Estados no campo educacional estabelecendo os dois sistemas, federal e o estadual, foi concebido no século XVIII, por Condillac (1979, p. 3) que o definiu como “Disposição das diferentes partes de uma arte ou de uma ciência numa ordem onde elas se sustentam todas mutuamente e onde as últimas se explicam pelas primeiras.” Lalande (1953, p. 1223) define sistema, como sendo: Un conjunto de elementos, materiales , o no, que dependen reciprocamente los unos de los otros de manera de formar un todo 30 um desafio ao poder público organizado.”El sistema solar.”- “El sistema nervioso.” “Un sistema de tres ecuaciones.” “...A la unidad de série, que origina cada movimiento de uno precedente, habrá venido a añadirse la unidad se sistema, que hace converger vários movimientos hacia um fim comun”. A noção de sistema nas conceituações acima pressupõe reunião e ordenação em vista de um determinado fim, uma intenção, um objetivo. A partir da conceituação de Lalande, o termo passou a ser usado para identificar conjuntos de partes coordenadas entre si, formas de governo, ou constituição política de um estado, conjuntos dos mais variados possíveis, inclusive o de órgãos vegetais e animais. Por algumas décadas, o termo sistema foi utilizado também para identificar as redes de ensino estadual, particular e municipal. Após a Constituição de 1988 (art. 211), o poder sobre o sistema educacional, antes concentrado na União e Estados, é descentralizado. Nesse artigo fica estabelecido que a “União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino”. A liberdade de criação de sistemas municipais de ensino como ação descentralizadora da administração do ensino, concretiza-se com a Constituição Federal de 1988, mas só é regulamentada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que repete literalmente em seu art. 8º os dizeres do art. 211 da Constituição Federal. O parágrafo único do art. 11, da mencionada lei diz: “Os Municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor com ele um sistema único de educação básica”. Essa liberdade representa, sem dúvida, um grande passo rumo à descentralização do poder sobre o sistema edu31 Escolas irregulares: cacional, mas tem suscitado muita insegurança aos municípios, principalmente porque a emancipação do sistema estadual de ensino, do qual foram dependentes durante quase dois séculos, pode significar uma responsabilidade para a qual não estão preparados. A criação e manutenção de um sistema educacional envolvem, não apenas, recursos financeiros, mas também análises minuciosas quanto às questões políticas, técnicas, administrativas, pedagógicas e legais. Nem todos os municípios, contudo, possuem condições favoráveis para tal. Acreditar que os municípios, por pior que administrem a educação com os seus problemas, o farão melhor que o Estado, pode parecer prematuro a muitas pessoas. Essa ação pressupõe mudança de mentalidade dos grupos governantes e um verdadeiro exercício de cidadania para a população. Muitos erros e acertos ocorrerão, a sociedade pode ganhar muito, mas pode também sofrer conseqüências de atos políticos impensados. Politicamente, a criação dos sistemas municipais de ensino pode não interessar aos estados, mas para a sociedade pode ser uma boa oportunidade para o exercício da cidadania. Embora o Conselho Nacional de Educação, no ano 2000, tenha emitido Parecer Orientador para esclarecer sobre a instituição de sistemas municipais de ensino, percebe-se que o amadurecimento da responsabilidade recebida por lei é gradativo e só a incorporação dos princípios fundamentais dessa competência fará com que haja mobilização para a desvinculação do sistema estadual de ensino. É natural que essa nova competência esteja causando apreensão em muitos dirigentes municipais quanto à decisão de caminharem nessa direção. Podem estar faltando referências positivas para que possam assumir esse compromisso. No país não são muitos os municípios que já o instituíram e, no estado de Mato Grosso, até meados de 2001, dos 139 municípios existentes, apenas dois o haviam organizado. A LDB define as competências e a área de abrangência dos sistemas de ensino através dos art. 16 a 18, onde expressa: 32 um desafio ao poder público Art. 16. O Sistema Federal de Ensino compreende: I- as instituições de ensino mantidas pela União; II- as instituições de educação superior criadas e mantidas pela iniciativa privada; III- e órgãos federais de educação; Art. 17. Os Sistemas de Ensino dos Estados e do Distrito Federal compreendem: I- as instituições de ensino mantidas, respectivamente, pelo poder público estadual e pelo Distrito Federal; II- as instituições de educação superior, mantidas pelo poder público municipal; III- as instituições de ensino fundamental e médio criadas e mantidas pela iniciativa privada e os órgãos de educação estaduais e do Distrito Federal, respectivamente; Art. 18. Os Sistemas Municipais de Ensino compreendem: I- instituições de ensino, fundamental, médio e de educação infantil mantidas pelo poder público municipal; II- instituições de educação infantil criadas e mantidas pela iniciativa privada; III- os órgãos municipais de educação. Para Bordignon (2000, p. 9), o termo sistema tem sido utilizado com uma elasticidade tal, que permite abrigar quase tudo. Segundo ele “reduzindo-se essa elasticidade podese limitar o conceito à sua aplicação na organização da educação brasileira”. No entendimento proposto pela LDB, o sistema de ensino não caracteriza redes de ensino e, tampouco, níveis de ensino superior ou básico. As redes de ensino público (estadual, municipal) e particular que mantenham ensino superior ou 33 Escolas irregulares: básico são partes de um sistema. O termo está posto no sentido de organização do ensino nas esferas de governo: federal, estadual e municipal. Nesta obra, cujo foco central é a situação de ilegalidade dos cursos oferecidos pelas escolas de educação básica do sistema estadual de ensino de Cuiabá-MT, a expressão sistema de ensino não estará, em nenhum momento, desacompanhada da esfera de governo. Será sempre utilizada para se referir à organização do ensino nas respectivas áreas de abrangência estado ou município com suas respectivas redes de ensino: estadual, municipal e particular e os demais órgãos educacionais. A referência às escolas do sistema estadual de ensino instaladas no Município de Cuiabá-MT, portanto reporta-se às escolas das três redes de ensino: estadual, municipal e particular, uma vez que o município de Cuiabá, embora com intenções de criar o seu próprio sistema, manteve-se integrado ao sistema estadual de ensino até o final de 2001. Uma vez organizados os sistemas de ensino, no âmbito de suas esferas de governo, estes devem ser administrados e essa administração é efetivada segundo as ideologias, interesses políticos e econômicos de cada esfera governamental. Todo sistema de ensino, no âmbito de sua esfera de governo, deve ser organizado segundo os princípios da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Ocorre que diante de novas leis, alguns órgãos que administram os sistemas estaduais ou municipais de ensino, incorporam os novos princípios e dispositivos sem descartar aqueles que somente faziam sentido na vigência da lei anterior, preservando, assim, práticas desnecessárias e transformando os órgãos responsáveis pela educação em órgãos abarrotados de papéis e funções, como será detalhado no terceiro capítulo. A forma como são organizados os sistemas de ensino e, principalmente, como são administrados, pode determinar os rumos da educação na respectiva esfera de governo atendendo ou não as expectativas da sociedade. A questão da ilegalidade dos atos praticados pelas escolas está intimamente 34 um desafio ao poder público ligada às formas de gestão desses sistemas. Para que se possa compreender a atuação dos órgãos responsáveis pela educação e como estes exercem o controle da oferta da educação escolar básica, é fundamental entender alguns conceitos como administração e burocracia. 1.2 Administração e burocracia Na concepção de Sandroni (1985-1989, p. 9-10), a administração é definida como o conjunto de princípios, normas e funções cuja finalidade é ordenar os fatores de produção de modo a aumentar sua eficiência. Segundo esse autor, como resposta aos desafios enfrentados pelas empresas desencadeados pelos avanços da revolução industrial a partir do século XIX, houve um desenvolvimento da administração científica. As empresas cresceram extraordinariamente, forçadas, pela mecanização, automação, produção e o consumo em massa, o que provocou uma mudança nos padrões tradicionais de controle. Diz ele: “A posição de capitão da indústria, do empresário tradicional que tudo controlava pessoalmente, foi seriamente abalada e começaram a surgir os especialistas em administração.” Na administração burocrática, segundo o entendimento de Sander (1995), a mediação que ocorre entre o administrador e os administrados é normativa e enfatiza a dimensão institucional do comportamento organizacional. É de tendência legalista e autoritária, favorece a democracia política, mas inibe a prática efetiva da democracia social. Sobre o administrador burocrático, o autor assim se expressa: [...] o administrador burocrático se preocupa com o cumprimento das leis e das normas que regem o funcionamento da instituição educacional e com a defesa de seus 35 Escolas irregulares: interesses como sistema, desconsiderando a importância de seus participantes como pessoas. A preocupação do administrador burocrático é criar um clima organizacional que favoreça a eficácia do sistema para atingir os seus objetivos, relegando a segundo plano a eficiência individual dos participantes (Ibid., p. 85). A preocupação dominante na administração burocrática é com a eficácia do sistema e com o cumprimento de normas. Na mesma obra, (p. 111), autor após um estudo sobre os vários modelos de administração, acredita que o grande desafio para a gestão da educação é a passagem da avaliação crítica da realidade organizacional e administrativa da educação para implementação de propostas concretas de ação humana. Para ele a participação cidadã concebida como direito e dever de todos os integrantes de uma comunidade democrática na gestão da educação é a estratégia mais efetiva para enfrentar esse desafio. É oportuno lembrar, também, o que diz Duarte, in:Oliveira (1998, p. 260), “Se um novo modelo de atuação estatal deve ter em conta a eficácia no atendimento à população, administrar esta transição requer uma reflexão sobre as políticas historicamente implementadas para a gestão burocrática”. Concordando com a autora acima, numa organização em que o modelo burocrático vem sendo exercido historicamente é fundamental um período de transição baseado em muitas reflexões visto que toda passagem de um modelo a outro é marcado por conflitos, inseguranças, incertezas, perdas e ganhos. Bruno, in: Oliveira (1998, p. 29) lembra que, até a década de 40, a administração era concebida como um sistema fechado, visto a partir da realidade interna da organização e, reforça dizendo: A ênfase era dada à hierarquia, à imposição 36 um desafio ao poder público de regras e disciplinas rígidas. Procurava-se a padronização do desempenho humano e a rotinização das tarefas, para evitar a variabilidade das decisões e dos comportamentos individuais. A autora ressalta que, a partir da segunda guerra mundial, com o surgimento de novos pólos de poder político e do avanço decisivo dos gestores tecnocratas no controle do capital e do processo econômico global, a prática da gestão torna-se mais complexa exigindo estudos mais específicos sobre os diferentes tipos de estrutura organizacional. Thompson (1957) citado por Bruno, in: Oliveira (1998, p. 36), ao analisar as deficiências da hierarquia presentes na estrutura de poder, monocrática e rotineira concluí que: [...] a hierarquia burocrática constitui um entrave para o desenvolvimento das organizações, pois dificulta os processos de inovação ; “cria feudos” de poder locais, muitas vezes utilizados pelo dirigente para alcançar objetivos pessoais em detrimento dos interesses da organização; dificulta os processos de comunicação na medida em que permite ao dirigente monopolizar informações, podendo-a bloquear tanto para cima como para baixo. Para o autor acima, a organização burocrática convencional é estruturada com um só centro de autoridade que reprime o conflito por considerá-lo ameaçador do “status quo”. Assinala ainda que esse modelo burocrático surgiu numa época em que as informações eram escassas e raramente se desenvolviam processos inovadores e, portanto, não se ajustam a uma era em que a abundância de informações e a rapidez das mudanças requerem o uso adequado da inteligência, da criatividade e adaptabilidade rápida e constantes dos dirigentes. Para Bordignon, in: Ferreira (2001, p. 162), o eixo central das teorias organizacionais clássicas e científicas é baseado no poder central de superintendência, delegação e 37 Escolas irregulares: distribuição de tarefas, em que a unidade de comando e os controles são mantidos. O sujeito é o poder e o objetivo é a subordinação. Reforça dizendo ainda que: “nesse modelo, as rotinas são fundamentais, o risco deve ser reduzido ao mínimo. O conflito, resultante da afirmação dos sujeitos, é indesejável e deve ser ´acomodado` pela autoridade do chefe”. A abordagem dos autores acima evidencia que o modelo burocrático já não é aceito no momento democrático em que vivemos. As organizações educacionais que historicamente se burocratizaram para garantir suas próprias sobrevivências e o controle das instituições de ensino vivem hoje a transição e são marcadas por crises de identidade. Querem modernizar-se, mas a passagem de um modelo a outro é realmente um desafio. A mudança pode implicar na diminuição de poder, perda de funções e descarte de algumas práticas cristalizadas que podem não ser interessantes para alguns. No sistema educacional brasileiro, as leis e as demais normas têm-se constituído numa forma burocrática de garantir a manutenção da estrutura política social e econômica. Esses mecanismos são necessários à sobrevivência das organizações, mas se não acompanharem a evolução científica e tecnológica e os interesses coletivos podem se constituir numa forma de dominação legal difícil de ser aceita, emperrando o curso normal de evolução da sociedade. No contexto da pesquisa realizada, a expressão administração burocrática refere-se ao modelo hierarquizado, centrado em normas, papéis e principalmente em funções e práticas estabelecidas pelo poder público que não mais condizem com a realidade que hoje é caracterizada pela abundância de informações e de processos de mudanças. Esse modelo dificulta o desempenho ágil das atribuições inerentes aos órgãos educacionais e, sobretudo, o atendimento eficiente às solicitações e expectativas da sociedade. O que não mais é possível conceber na sociedade da informação hoje, é a manutenção de mecanismos de controle para a oferta da educação escolar utilizados em épocas em 38 um desafio ao poder público que os sistemas de ensino possuíam uma área de abrangência significativamente mais restrita, o regime de governo era autoritário e as exigências da sociedade eram outras. A modernização e a adoção de novos modelos de administração é fundamental, porém é preciso atentar aos modernos métodos de gerenciamento de produção nas grandes empresas. Eles têm estimulado mudanças nos sistemas burocráticos de gestão governamental influenciando o comportamento de muitos órgãos educacionais, a manterem ideais capitalistas. Nesse sentido, toda atenção dos responsáveis pela administração da educação no Estado deve ser concentrada porque nem tudo o que se aplica no meio empresarial pode ser aplicado à educação. Como diz Sander (1995, p.151): “No mundo dos negócios o papel do cliente ou consumidor ocupa lugar central, em vista de que ele pode escolher entre diferentes serviços ou produtos. No setor público não há clientes ou consumidores; há cidadãos com deveres e direitos”. É visível que os órgãos educacionais que administram os sistemas de ensino no país estão em crise e buscam novos modelos de gerenciamento. Para a adoção de políticas educacionais de controle da oferta da educação escolar mais adequadas ao momento democrático em que vive a sociedade é extremamente necessária uma reflexão sobre as bases históricas das políticas atuais. Para isso, é fundamental entender o verdadeiro sentido dos termos democracia, participação e cidadania. 1.3 Democracia, participação e cidadania Etimologicamente o termo democracia origina-se do grego e significa predomínio do povo no governo. Em ciência política é uma forma de governo em que a soberania popular deve prevalecer. É um sistema que inclui direitos e obrigações aos cidadãos no sentido de preservar o bem comum e pressu39 Escolas irregulares: põe a participação da população nas decisões que envolvem o estabelecimento de modelos políticos, econômicos e de sociedade. Segundo Cury (2000, p.11). “A soberania popular implica cada um como fonte do poder e, como cidadãos, suportes e destinatários das leis”. Para o autor a soberania popular pressupõe conhecimento. Somente possui poder aquele que possui conhecimento e é fundamental que cada pessoa, identificada com um campo específico ou uma área profissional, conheça o contorno legal de sua profissão. Assim, o professor que não conhece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, por exemplo, não pode ser fonte de poder para contribuir implementando-a ou propondo modificações. O mesmo pode ocorrer com os profissionais que assumem a administração dos sistemas de ensino sem estarem identificados com esse campo. Democracia e participação estão intimamente relacionadas. Não há democracia sem a participação do cidadão. Nesse sentido, Frigoto (1987, p. 38) diz: “Cidadão é aquele que participa do governo e só participa do governo quem tiver poder, liberdade e autonomia”. O poder, liberdade e autonomia , muitas vezes, são atributos daqueles que estão inseridos nos meios políticos. Na educação, a Constituição Federal de 1988 estabelece através do Art. 206, inciso VII a gestão democrática do ensino público como um dos princípios a serem observados. Cury, in: Oliveira (1998, p. 201), observa que “na formulação legal o princípio democrático da gestão está adstrito ao ´ensino público`”. E lembra a pergunta feita pela deputada Ângela Amin, relatora da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: “qual deveria ser a gestão do ensino nas escolas particulares ”? Cury faz ainda uma observação sobre a noção de gestão democrática: A gestão democrática do ensino público supõe a transparência de processos e de atos. Ao caráter público e aberto se opõem 40 um desafio ao poder público o privado e o secreto. O segredo é a dimensão daquele que se tem como a sede e a fonte do poder e, portanto, nada deve à cidadania. Por esta via pode-se mesmo chegar a ´déspotas esclarecidos‘, mas que não deixarão de ser déspotas. O privado é a dimensão daquele que presta serviços sob sistema contratual de mercado. E mesmo aí contida na cidadania, o privado não é absoluto (Ibid., p. 205). Se democracia significa predomínio do povo no governo e se é um sistema que inclui direitos e obrigações aos cidadãos no sentido de preservar o bem comum pressupondo a participação da população nas decisões que envolvem o estabelecimento de modelos políticos, econômicos e de sociedade, pode-se, então, entender por gestão democrática na educação aquela de caráter não autoritário em que o poder de decisão não esteja centrado na pessoa do dirigente ou apenas, num grupo de pessoas. Oliveira (1998, p. 91) observa que a partir da década de 90, podem ser percebidos novos modelos de gestão da educação pública fundamentados na flexibilidade administrativa. A desregulamentação de serviços e descentralização dos recursos focando a escola como núcleo do sistema tem sido exercitada pelo poder central. Entretanto, esse exercício também precisa ser feito pelos órgãos que administram a educação nos Estados e Municípios. Lembrando o que diz Frigoto acima, há necessidade de um esforço muito grande dos organismos educacionais no sentido de fazer acontecer a verdadeira democracia na gestão da educação para que o cidadão comum possa participar ou ser envolvido a ponto de se tornar parceiro na administração e no controle das ações de uma escola, por exemplo, em busca de seus interesses. A disseminação ampla do conhecimento, conforme entendimento de Cury, possibilita maior participação dos segmentos sociais nas decisões pertinentes ao campo educacional 41 Escolas irregulares: evitando a participação estrita da minoria que detém algum poder, mas isso é ainda, um grande desafio. Demo (1988, p. 44) faz uma abordagem extremamente significativa para entendimento mais claro dos processos democráticos: Democracia dá muito trabalho. Onde todo mundo quer opinar [...], decidir junto; o que mais acontece é uma dificuldade enorme de gerir a balbúrdia. As discussões tornam-se intermináveis. [...]. Facilmente emerge o cansaço e a decepção, até mesmo o reconhecimento afoito de que democracia não leva a nada,[...] a insinuação de que em termos autoritários as coisas andavam melhor, porque se decidia rápido ou tudo já estava decidido. Todavia, é natural que assim comece. [...] Democracia é uma planta tão essencial quanto frágil. É extremamente mais fácil matá-la do que trazê-la ao amadurecimento. Por isso mesmo, é essencial evitar que os processos participativos degenerem em sessões repetitivas (...),pouco produtivas [...] por inabilidade na condução do processo ou por incompetência técnica ou política. Com essas palavras, Demo relata exatamente o que acontece nos processos democráticos. Embora, a democracia não seja um bom remédio para todos os males, é saudável a participação da comunidade na vida da escola e na dos órgãos educacionais não como mera prestadora de serviços, mas para auxiliar na definição das ações e tomadas de decisões. Ainda que seja de forma tímida, trabalhosa ou enfadonha para os dirigentes, a participação deve ser estimulada. A sua prática torna as pessoas mais conscientes, comprometidas e culturalmente mais evoluídas. Segundo Perrenoud (2000, p.106 ) “fazer com que a democracia ocorra é prever uma transição, saber de ante42 um desafio ao poder público mão que o caminho é incerto, que haverá injustiças, abusos de poder, momentos de desorganização.” Permitir que um processo democrático se instale, é permitir muitas vezes, o desequilíbrio da ordem estabelecida. É permitir mudanças e isso pode fazer com que fortes objeções surjam. O autor diz ainda: “Não há pior adversário da mudança que esta constatação que os céticos gostam de sussurrar com prazer: veja bem, isso não pode funcionar, eles não são capazes de assumir suas responsabilidades.”(ibid. p. 96), É comum pessoas ou grupos que participam de algum processo social sentirem-se no direito de controlarem as decisões impondo suas ideologias. Nesse sentido Bruno In: Oliveira (1998, p.38) ressalta: “não se pode esquecer que participar de um dado processo social não significa controlar suas instâncias decisórias.” Peruzzo (1998) aborda a questão da participação da seguinte forma: A participação popular implica uma decisão política e o emprego de metodologias operacionais que a favoreçam. Em matéria de comunicação, não basta incentivar o envolvimento. É necessário criar canais para tanto e mantê-los desobstruídos. Isso tem a ver com objetivos estratégicos, ou seja, aonde se quer chegar (p. 276). A participação popular pode facilitar o devir de uma nova práxis da comunicação. A participação e a comunicação representam uma necessidade no processo de constituição de uma cultura democrática, de ampliação dos direitos de cidadania e da conquista da hegemonia, na construção de uma sociedade que veja o ser humano como força motivadora, propulsora e receptora dos benefícios do desenvolvimento histórico (Ibid., p. 296). 43 Escolas irregulares: Evidentemente, incentivar o envolvimento, criar canais de comunicação e não os manter abertos é um esforço dispendioso e inútil se não se tem clareza de onde se quer chegar. Todos os caminhos, por mais atraentes que sejam, não levarão a lugar algum. Ela ressalta muito bem a importância dos processos participativos na definição dos rumos a serem tomados e conseqüentemente, no desenvolvimento da cidadania. O problema da participação da comunidade na gestão da escola e dos órgãos educacionais envolve uma complexidade que precisa ser considerada. Se, por um lado, o poder público estabelece normas de controle ou concede alguma autonomia e não mantém uma política de divulgação e conscientização do bem concedido, a população não o reconhece como um benefício e, portanto, dele não usufrui. Por outro lado, se não estabelece normas de controle, não estimula ou não disciplina a participação, a população reclama por elas. O fato é que não se está acostumado a exercer a cidadania. O termo cidadania, embora tenha sido empregado pela primeira vez na Constituição brasileira de 1937, passou a ser mais bem entendido a partir de 1988. Isso é perfeitamente compreensível, o que não se pode entender é que a sua significação não seja amplamente disseminada no ambiente educacional e que alunos, pais e professores não a exercitem. Até a promulgação da Constituição vigente, o brasileiro não questionava seus direitos individuais, ficava na expectativa das concessões que o Estado quisesse dar a ele. Como diz Ribeiro (2001, p. 2, A), “As pessoas atendiam pela denominação genérica de ‘povo’. Era uma instituição sem personalidade individual. Era mais ou menos como um grande rebanho humano com carteira de identidade expedida pelo Brasil.” Como os direitos foram sempre concedidos pelo Estado numa ordem crescente e num regime autoritário, as pessoas se habituaram a esperar que o Estado lhes desse “direito” e com isso não incorporaram a prática de buscá-los ou conquistá-los. Hoje, poucos são os movimentos que se empenham na conquista do direito e, portanto, no desenvolvimento da cidadania 44 um desafio ao poder público individual e coletiva como prevê a Constituição Federal de 1988. Embora os direitos e deveres individuais e coletivos estejam expressos na Carta Magna, é notório que ao longo dos treze anos da sua promulgação, no campo educacional não há uma política de esclarecimento e divulgação à sociedade. A lei em si não é educativa. É preciso um trabalho permanente de discussão visto que a cultura dos usos e costumes não é facilmente rompida. Quantos brasileiros conhecem as leis que regem a educação brasileira? Dos que tiveram acesso a ela, quantos são capazes de reivindicar os seus direitos exercendo a cidadania? Existe, sim, uma política de democratização do conhecimento das leis, isto é, todos podem ter acesso a elas, a ninguém é negado o direito de conhecê-la. Mas, democratizar não é o mesmo que socializar. Socializar implica, como já foi dito, em meios para que as informações cheguem aos locais de difícil acesso e nas mãos dos indivíduos que não têm condições de adquiri-las e, esse é um dever do Estado. Os direitos na verdade existem, mas somente são defendidos por aquela minoria que os conhece. Expressiva maioria não tem consciência dos direitos concedidos, não sabe até que ponto pode chegar e, portanto, permanece omissa. Essa omissão favorece ao poder público ou à iniciativa privada que, se não assumidos por líderes ou mantenedores imbuídos de um ideal voltado para a defesa do social, podem aproveitar-se da desordem e da ingenuidade dos cidadãos para cometerem abusos de toda ordem, o que abre espaço para a dominação. Cury (2000, p.12) sobre o conhecimento das leis faz uma comparação interessante: “Conhecer as leis é como acender uma luz numa sala escura cheia de carteiras, mesas e outros objetos. As leis acendem uma luz importante, mas elas não são todas as luzes. O importante é que um ponto luminoso ajuda a seguir o caminho”. Muitas luzes ainda precisam ser acesas. O desenvolvimento da cidadania só ocorre através do exercício da busca dos direitos e do cumprimento das obrigações e a tarefa de proporcionar meios aos cidadãos para tornar isso possível e 45 Escolas irregulares: acender as luzes não pode ser responsabilidade precípua de outros órgãos que não os da educação. Para saber onde está o ponto luminoso que pode auxiliar a trajetória das organizações educacionais e lhes mostrar o caminho, é fundamental resgatar elementos que indiquem quando e onde as luzes foram apagadas e como outras podem ser acesas. Nesse sentido, resgatar os instrumentos legais que norteiam os órgãos responsáveis pela educação nos estados e municípios é fundamental visto que, muitas vezes, uma lei ou uma norma pode apagar as luzes que foram acesas pela sociedade ou uma comunidade. 2 Breve histórico dos instrumentos legais de controle da educação escolar no Brasil Durante quase três séculos, a educação escolar no Brasil foi administrada pelos padres jesuítas que marcaram o início da história da educação brasileira. Discorrer sobre a história da educação no Brasil não fez parte dos objetivos da pesquisa. A obra Cultura Brasileira de Azevedo (1996) e a História da Educação de Romanelli (1999) detalham o assunto e, por serem consideradas obras basilares sobre a educação no Brasil, podem ser consultadas para maiores esclarecimentos. Apenas serão citados alguns pontos de vista desses autores para facilitar a compreensão do objeto de estudo. Após a expulsão dos padres jesuítas em 1759, Azevedo (1996, p. 545) lembra que foi aberto um parêntese de quase meio século, até que a corte portuguesa fosse transplantada para o Brasil, em 1808, com as novas idéias liberais e tecnocráticas. Na fase final do período colonial, nenhuma organização institucional substituiu a poderosa homogeneidade do sistema jesuítico, surgiram apenas aulas isoladas fragmentadas e dispersas que mal chegaram a tomar aspecto de ensino sistemático em alguns colégios religiosos estabelecidos em conventos. Segundo esse autor com a proclamação da Independência e a fundação do Império do Brasil, em 1.822, con46 um desafio ao poder público cretiza-se o sonho dos liberais. Vários debates alimentados pelos ideais da Revolução francesa fizeram surgir a Constituinte de 1.823 que anunciava nova ordem na política educacional. Com o advento da 1ª Constituição brasileira, em 1.824, (incisos 32 e 33 do art. 179), ficam garantidas a universalização e a gratuidade da instrução primária e dos elementos das ciências, belas artes e artes nos colégios e universidades e a escola se torna alvo cada vez mais procurado e os controles sobre a oferta da educação escolar começam a ser exercidos. O Ato Adicional, de 12 de agosto de 1.834, artigo 10, faz a distinção entre as competências da União e do Estado, até então denominado Província. A partir daí, fica clara a competência da União para criar e controlar a instrução superior em toda a nação criar e controlar o ensino acadêmico e a instrução em todos os níveis, no Distrito Federal e, também, a competência da Província para legislar sobre a instrução pública e prover a instrução primária e média. Com o Ato acima mencionado, consolida-se a descentralização do poder sobre a educação institucionalizada quebrando o sentido de unidade nacional, porém mantendo a preocupação com a gratuidade e universalização do ensino. Segundo Perrenoud (2000, p.109-111), desde o final do século XIX “a escola tornou-se obrigatória porque as crianças não tinham espontaneamente vontade de freqüentála, nem os pais a necessidade de confiar seus filhos a ela”. Com a escolarização obrigatória, os pais foram privados de seu poder educativo, a criança foi arrancada de sua família pela Lei, para garantir a sua instrução, protegê-la da exploração, dos maus tratos e da dependência. O fato é que a partir de então as redes de ensino expandiram-se por força de lei. Com a primeira Constituição do Brasil Republicano, em 1.891 (art. 72, nº 6), Igreja e Estado foram distintamente separados e a laicização do ensino administrado nos estabelecimentos públicos ficou estabelecida. Nesse período, todo esforço do poder central com relação à educação está voltado para o ensino superior. A escola é vista como um canal de circulação social e vertical. Consequentemente, a expressiva procura força a expansão, a 47 Escolas irregulares: iniciativa privada amplia sua atuação na educação em todo o país e o poder público amplia os mecanismos de controle. Exatamente um século depois do Ato Adicional que consagrou a descentralização do poder sobre o campo educacional, vem à tona novamente as tendências centralizadoras do governo, perceptíveis, sobretudo, pelos enunciados dos art. 148 a 158 da Constituição de 1934, onde ficam claras as competências da União em: Propor, coordenar o ensino em todos os graus e ramos de todo o país e fiscalizar a política nacional de educação; determinar as condições de reconhecimento oficial dos estabelecimentos de ensino secundário e complementar deste, e dos institutos de ensino superior, exercendo sobre eles a necessária fiscalização; exercer ação supletiva em qualquer área do ensino onde necessária, por deficiência de iniciativa ou de recursos e, ainda, que os sistemas de ensino dos Estados e do Distrito Federal devem respeitar as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação.2 2 48 Embora o Conselho Nacional de Educação tenha sido criado nesse período, a tentativa de criação de um Conselho de Educação teve início em 1870, quando o Ministro do Império, Paulino Cícero, apresentou a proposta de criação do Conselho Superior de Instrução Pública. A proposta foi reapresentada em 1877 pelo ministro José Bento da Cunha Figueiredo e, em 1882, Rui Barbosa leva à Comissão de Instrução Pública, como relator, a proposta do Ministro Leôncio de Carvalho, de criação do Conselho Superior de Instrução Nacional. A idéia de um Conselho Superior de Educação somente se concretizou em 1911, com o Decreto nº 8.659 de 05/04/11, que cria o Conselho Superior de Ensino. Seguiram-se o (Decreto nº 16782-A, de 13-01-25) que cria o Conselho Nacional de Ensino; Decreto nº 19.850 de 11-04-31, que cria o Conselho Nacional de Educação; a Lei nº 4.024 de 20-12-61, que cria o Conselho Federal de Educação e os Conselhos Estaduais de Educação; a Lei 5692/71, que cria os Conselhos Municipais de Educação e, finalmente, a Lei nº 9193/95, que cria o Conselho Nacional de Educação.(BORDIGNON, 2000, p. 06). um desafio ao poder público É importante que o leitor registre esses fatos para melhor compreensão das indicações postas no terceiro capítulo. Nessa Constituição fica estabelecido que o país terá um Sistema Federal e Sistemas Estaduais de Ensino. O Ministério de Educação e Cultura-MEC é criado pelo Governo Provisório quatro anos antes da promulgação da Constituição Federal de 1934. A partir dessa Constituição, o princípio da descentralização, nascido no período imperial, corre sérios riscos e culmina na centralização do poder. Aparece a figura dos Conselhos de Educação dos Estados com funções similares às do Conselho Nacional de Educação, mas essas figuras permanecem ocultas até 1961 como será visto posteriormente. Segundo Tomazzi (1997), nesse período, o sistema educacional expande-se forçosamente por pressões da demanda social e em conseqüência há uma imperiosa necessidade de reorganização dos sistemas de ensino às novas exigências da política e da economia, mas nada é feito substancialmente para se garantir a qualidade da escola pública. Os olhares são direcionados ao controle da oferta. Após um longo período de discussões, surge a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional3 a Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, para reestruturar o sistema educacional. Com ela, ficam claras as competências do Conselho Federal de Educação,4 que desde a Constituição de 1934, havia sido proposto e, também, dos Conselhos Estaduais de Educação. O MEC passa a exercer as funções do Poder Público Federal e a velar pelas observâncias das Leis do ensino e decisões do Conselho Federal de Educação. 3 A Constituição Federal de 1946, alínea “d”, inciso, XV, Art. 5º , já estabelecia à União a competência de fixar as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 4 A Lei define composições do Conselho Federal de Educação em duas Câmaras, atribuindo-lhes as competências de decidir sobre o funcionamento dos estabelecimentos de Ensino Superior Federais e particulares; reconhecer as Universidades; manter intercâmbios com os Conselhos Estaduais de Educação; delegar aos Conselhos Estaduais a competência de autorizar e fiscalizar os estabelecimentos de ensino estaduais isolados de ensino superior. 49 Escolas irregulares: Apartir de então, os Conselhos Estaduais de Educação são criados como órgãos colegiados e passam a exercer funções normativas e deliberativas para os sistemas de ensino. Cury (2000, p. 60) esclarece que: os Conselhos normatizam as leis educacionais por meio de Resoluções, precedidas de Pareceres. As Resoluções são o modo pelo qual as deliberações dos Conselhos ganham força de lei já que são instrumento apto da interpretação normativa própria destes órgãos. É também oportuno lembrar que, com o advento da LDB nº 4.024/61, a estrutura tradicional e a influência política sobre ensino são mantidas e a descentralização expressa no texto constitucional como uma aspiração para as inovações no campo educacional, permanece na legislação, mas não se concretiza na prática. A partir dessa Lei, fica claro que à União compete reconhecer e inspecionar os estabelecimentos particulares de ensino superior e aos Estados e o Distrito Federal, através de seus órgãos normativos, autorizar o funcionamento dos estabelecimentos de ensino primário e médio não pertencentes à União, bem como reconhecê-los e inspecioná-los. (art.14-16). É importante registrar que a Lei 4.024/61 estabeleceu na época algumas condições para o reconhecimento dos cursos como: idoneidade moral e profissional do diretor e do corpo docente, instalações satisfatórias; escrituração escolar e arquivo que assegurassem a verificação da identidade de cada aluno e da regularidade e autenticidade de sua vida escolar; garantia de remuneração condigna aos professores; observância dos demais preceitos da Lei. Para a observância dessas exigências, os Conselhos Estaduais de Educação deviam baixar normas específicas. Essas exigências certamente visaram a garantia da oferta da educação escolar aos cidadãos pela iniciativa privada por mantenedores idôneos moralmente 50 um desafio ao poder público e financeiramente estruturados, o que foi salutar; mas esses artigos permitem o entendimento de que a exigência da autorização e do reconhecimento era necessária às instituições particulares. No entanto, praticamente todos os Conselhos Estaduais de Educação passaram a autorizar e reconhecer também os cursos das instituições públicas. No Estado de Mato Grosso, as escolas públicas até essa data, após serem criadas, não eram autorizadas ou reconhecidas, eram consideradas oficiais e regidas por regulamentos, como está posto no segundo capítulo. Pode ter sido aí instaurada a prática de reconhecer cursos da educação básica, por interpretação equivocada do dispositivo legal. Prática essa, que no Parecer nº 143/02, do Conselho de Educação do Distrito Federal, mencionado nas páginas seguintes é considerada desnecessária. A partir da Constituição Federal de 1967, o leque de atendimento à demanda pelo poder público é ampliado e o ensino dos sete aos quatorze anos passa a ser obrigatório e gratuito para todos os cidadãos nos estabelecimentos oficiais de ensino. A educação nesse período extremamente capitalista é encarada como um investimento, um capital desejado por grande parte da população como um instrumento de mobilidade social. Essa mentalidade força a expansão das redes de ensino e, conseqüentemente, o poder público reforça os mecanismos de controle através de normas cada vez mais rígidas. A população sem consciência dos verdadeiros pilares da mudança deposita grandes esperanças na educação escolar. Ao lado desse ideário criado pela sociedade e da iminente necessidade de descentralização do poder, muitas discussões ocorrem e, então, surge a Lei 5.692, de 11 de agosto de 1971. Essa Lei tem como princípio administrativo a descentralização. A partir dela, os estabelecimentos particulares de ensino médio, antes vinculado ao sistema federal de ensino, ficam integrados aos respectivos sistemas estaduais. Essa conquista foi sem dúvida fruto de incansáveis lutas e discussões travadas desde o Ato Adicional de 1834. 51 Escolas irregulares: Com relação às competências da União, Estados e Distrito Federal em relação à responsabilidade pela oferta e fiscalização do ensino, autorização e reconhecimento de cursos são mantidos os artigos da Lei anterior. Os mesmos critérios para o reconhecimento de cursos sobrevivem no novo texto legal. Após vinte anos do regime implantado pelo movimento militar de 1964, o país parece caminhar rumo à normalidade democrática e, em 1985, tem início a República Nova que marca o fim do regime autoritário no Brasil. A sociedade com novas aspirações e motivada pelas influências da era tecnológica clama por novas leis e surge, então, a Constituição Federal de 1988. O § 2º, inciso VII, Art. 208, da Constituição Federal de 1988, atribui responsabilidade à autoridade competente pela negligência da oferta do ensino obrigatório pelo poder público ou a sua oferta irregular e, os incisos II e III do Art. 209, asseguram a liberdade de ensino à iniciativa privada mas, desde que se cumpram as normas gerais da educação nacional e que recebam autorização e avaliação de qualidade pelo poder público. Após essa Constituição as redes de ensino pública e privada continuam em expansão, mas o poder público não consegue fazer com que todas as escolas mantidas pela iniciativa privada sejam autorizadas e avaliadas e as públicas supervisionadas conforme o previsto na lei. Oito anos depois da promulgação da Constituição brasileira de 1988 e 25 anos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 5.692/71, surge a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996-LDB. Essa Lei, inspirada nos princípios da Constituição Federal, não traz avanços significativos quanto aos paradigmas educacionais do momento, muito há que se questionar, mas a Lei é flexível a serviço do aluno. O seu ponto forte é permitir que órgãos educacionais e escolas avancem. Apenas as inovações trazidas por ela, aquelas estritamente ligadas ao controle da oferta da educação escolar, 52 um desafio ao poder público como a liberdade de criação dos sistemas municipais de ensino, competências da União, Estados e Municípios e a gestão democrática, serão destacadas por estarem diretamente ligadas ao objeto de estudo. Para isso, os artigos abaixo da Lei n. 9394/96, precisam ser lembrados. O Art. 9º, refere-se às competências da União e entre outras está expresso no Inciso IX, ““autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos dos seus sistemas de ensino ensino” (grifo nosso). O Art. 10 diz respeito às competências do Estado deixando claro também, no Inciso IV,, que aos Estados compete: “autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino” (grifo também nosso). O Art. 11 refere-se às competências do Município e explicita através no Inciso IV que cabe a ele: autorizar autorizar,, credenciar e supervisionar ( grifo nosso) os estabelecimentos do seu sistema de ensino; É bom ressaltar que o inciso IV, dos artigos 9º e 10, possui exatamente a mesma redação. A diferença é apenas que o 9º se refere às competências da União e o 10 às competências dos Estados. No artigo 11, não aparece a figura do reconhecimento dos cursos oferecidos pelos estabelecimentos de ensino dos Sistemas Municipais de Ensino. Isso provoca o entendimento de que as escolas de educação básica dos sistemas municipais de ensino não necessitam ter seus cursos reconhecidos, ou que o reconhecimento de cursos só é necessário para o ensino superior por ser este da responsabilidade dos Estados e da União. Como se vê, a LDB deixa um vácuo quando não atribui a competência do reconhecimento dos cursos aos municípios e quando nada inclui sobre as condições para tal procedimento. Apenas estabelece que aos estados e municípios cabe baixar normas complementares para os seus sistemas de ensi53 Escolas irregulares: no. Isso me permite inferir que o reconhecimento não é uma exigência aos cursos da educação básica podendo, portanto, ser um procedimento descartado. Analisando especificamente o art 10 da LDB, com o pensamento voltado ao art 209 da Constituição Federal, podese entender que quando a LDB diz que compete ao Estado autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar, respectivamente, os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos do seu sistema de ensino, o termo respectivamente permite o entendimento de que o Estado pode autorizar os cursos das escolas particulares, reconhecer os cursos superiores, credenciar, avaliar as instituições particulares para a oferta do ensino e supervisionar sistematicamente as instituições públicas. Nesse contexto, as escolas públicas devem ser reguladas por normas de funcionamento para estar em conformidade com as legislações educacionais e garantirem os direitos constitucionais da clientela escolar em termos de qualidade nos aspectos, físicos, administrativos e pedagógicos. Para isso, basta que o Estado, através do órgão normatizador, estabeleça normas que orientem o funcionamento das escolas e que a supervisão e a avaliação constante seja exercida por meio do órgão executivo e da própria sociedade. Quanto à oferta do ensino particular, a escola deve ser credenciada, seus cursos autorizados e avaliados pelo poder público. Em relação à necessidade de credenciar os estabelecimentos de ensino públicos e privados, é interessante refletir sobre o que diz o Parecer 143/02-CEDF, de 30 de julho de 2002, através de seu relator Bordignon: As instituições públicas, uma vez criadas pelo poder público, já estão investidas de poder oficial para funcionarem segundo a finalidade de sua criação. O credenciamento pelo Conselho constitui-se redundante, uma vez que a autoridade maior com poder de 54 um desafio ao poder público homologação, ou não da deliberação do Conselho, já praticou tal ato administrativo (CONSELHO DE EDUCAÇÃO do Distrito Federal, p. 10). No mesmo Parecer, o relator deixa clara a sua visão sobre o assunto, ressaltando que o poder público tem o compromisso de universalizar a educação fundamental pública e gratuita a todos os cidadãos, inclusive aos que não tiveram oportunidade de cursá-la em idade própria. E reforça dizendo: “esse compromisso não isenta o poder público de zelar pela qualidade da educação e proteção dos direitos educacionais do cidadão, nos mesmos padrões que exige da escola particular” (ibid., p. 10). Com relação à escola particular, entende o Relator do Parecer, que ela tem compromissos próprios em função dos objetivos de seus mantenedores e atendem a determinados segmentos da sociedade. Reforça dizendo: “o seu credenciamento deve estar limitado a normas específicas de qualidade do ensino e proteção do consumidor” (ibid., p. 10). Nesse contexto, observando o que diz a Constituição Federal, a LDB e a realidade educacional deste Estado, concordar com o relator desse Parecer no que se refere ao fato de que as escolas públicas não necessitam do credenciamento e autorização para o seu funcionamento, é ainda temerário. Há no Estado um grande número de escolas em funcionamento, mas em condições ainda insatisfatórias como é demonstrado no terceiro capítulo. Dispensando-se esses procedimentos, fazse necessária a criação de mecanismos de supervisão e acompanhamento sistemático com vistas a garantia da qualidade do ensino, dos serviços prestados e dos direitos da clientela escolar. Nessa linha de raciocínio, fica claro que o credenciamento dos estabelecimentos de ensino e a autorização dos cursos de tempos em tempos, para as escolas públicas é um procedimento redundante, mas também uma forma 55 Escolas irregulares: de garantir os direitos dos cidadãos, ao menos neste momento, no Estado de Mato Grosso. O terceiro e quinto capítulos detalham a situação atual de legalidade das escolas do sistema estadual de ensino e as considerações finais demonstram que há de haver um período de transição entre uma forma de controle adotada historicamente e outra considerada mais eficaz. As escolas particulares, conforme a Constituição Federal e LDB, ao iniciarem o funcionamento devem se submeter às exigências do órgão público competente sendo credenciadas, autorizadas e avaliadas para que possam emitir certificados ou diplomas oficiais e com validade nacional. Cabe, então, ao poder público buscar alternativas para cumprir o compromisso que a Lei estabelece. Cury (2000, p. 64) observa que, na organização da educação nacional, as Constituições sempre reconheceram dois grandes gêneros de escolas: a livre e a regular. As escolas livres estão apoiadas no Art. 5º, XIII, da Constituição Federal e estão fora do âmbito da LDB. São elas as escolas de línguas, de natação, de técnicas de computação entre outras. Essas escolas podem emitir certificados com valor de mercado, porém não de valor oficial. Esclarece também que as escolas regulares são aquelas que se submetem ao conjunto das diretrizes e bases da educação nacional para que seus atos sejam reconhecidos formalmente, e para que possam expedir diplomas e certificados. O termo “irregular” em toda a pesquisa indica o oposto das escolas regulares definidas por Cury ou seja, aquelas que funcionam de forma contrária às normas ou sem autorização e/ou reconhecimento dos cursos que oferecem. Para o autor, as escolas regulares se dividem, ainda, em duas grandes espécies: públicas e privadas. As escolas públicas são um dever do Estado, oficiais por sua natureza jurídica e, pelo seu caráter de serviço público. Estas subdividem-se de acordo com a respectiva natureza administrativa em: municipal, estadual ou distrital (Distrito Federal) e federal. 56 um desafio ao poder público As escolas particulares prestam serviços de interesse público (ensino), ainda que por meios de mercado (iniciativa privada). Devem ser auto-sustentáveis, adequadas à legislação educacional e submetidas aos processos de autorização e de avaliação pelo poder público, conforme prevê o art. 209 da Constituição Federal e LDB para que seus atos se tornem oficiais. As escolas particulares podem ter caráter lucrativo ou não lucrativo. Entre as de caráter não lucrativo estão as comunitárias, confessionais e filantrópicas. No entanto, todas elas por prestarem serviços de interesse público devem se submeter às determinações específicas da legislação educacional para que tenham seus atos reconhecidos e para que possam emitir diplomas e certificados de conclusão de cursos, com valor oficial. Campos, in: BRASIL, Ministério de Educação e Cultura (1998, p.45), em seu texto “A Regulamentação da Educação Infantil” diz: O principal objetivo da exigência de autorização para o funcionamento é evitar o risco de prejuízos para as crianças. O sistema de concessão de autorização para o funcionamento definem padrões mínimos de qualidade para a implantação e operação de estabelecimentos de educação infantil. Uma autorização constitui uma permissão para operar e significa que um determinado estabelecimento não oferece riscos graves a seus usuários. Ressalta ainda que as concessões de autorização são geralmente aplicadas a estabelecimentos de ensino privados com ou sem fins lucrativos e que os estabelecimentos públicos deveriam apresentar condições de funcionamento correspondentes às exigidas para o setor privado, mas as formas administrativas para se garantir isso são muito diversas. Evidente57 Escolas irregulares: mente o texto de Campos é direcionado à educação Infantil, mas a sua idéia pode ser aplicável a toda educação básica. A questão dos padrões mínimos de qualidade não foi aprofundada. Apenas, é fundamental ressaltar que o Estado não pode abdicar da responsabilidade de proteger os direitos dos cidadãos e de garantir a qualidade dos serviços públicos. Diferentemente de Bordignon, relator do Parecer nº 143/02, a autora acima considera que a utilização de mecanismos de controle da oferta do ensino pelo poder público como a autorização dos cursos e o credenciamento das escolas, é extremamente necessária para garantir os direitos da clientela escolar. Pelas reflexões trazidas por Bordignon, Cury e Campos, é possível entender que os mecanismos de credenciamento das instituições públicas e a autorização de cursos visam a prevenção de riscos à população e a proteção aos interesses coletivos. Portanto, se o órgão executivo do sistema estadual de ensino não possuir meios eficazes e suficientes para fiscalizar, orientar e acompanhar sistematicamente as ações da escola, essas formas de controle precisam ser mantidas sob pena de se deixar a escola pública à sua própria sorte, o que seria uma irresponsabilidade do poder público. O que pode ser dispensado, sem prejuízo para a população, é o procedimento de reconhecer os cursos da educação básica já autorizados. A adoção de mecanismos que favoreçam a melhoria gradativa das condições físicas, pedagógicas e administrativas das escolas, através de normas ou de outras formas de fiscalização das unidades escolares, parece ser um dos caminhos a ser trilhado para que, num futuro não muito distante, se possa dispensar os procedimentos sugeridos por Bordignon, conforme consta no Parecer 143/02, no tocante às escolas públicas. O período de transição é fundamental e esse assunto está detalhado nos capítulos posteriores e também nas considerações finais. Os sistemas de ensino, para se adaptarem aos avanços da ciência e da técnica, e ainda, aos interesses políticos e econômicos de cada momento histórico, passam constante58 um desafio ao poder público mente por profundas mudanças que visam a garantia da educação escolar à população em escolas devidamente legalizadas. Como já foi dito, a expansão da oferta do ensino pelo poder público e pela iniciativa privada requer novas formas de controle. Há princípios fundamentais e práticas que são inerentes e necessárias para a sobrevivência da organização. No entanto, é comum algumas práticas serem arrastadas por vários anos e até por séculos sem que as questões ligadas aos avanços da ciência e da técnica sejam observadas. O uso de tecnologias modernas de informação e comunicação pelas organizações educacionais pode ser uma forma de conscientizar e envolver a sociedade na fiscalização das unidades escolares e facilitar ao poder público o controle da oferta da educação escolar. Mas isso é um desafio que está posto e o Estado precisa enfrentá-lo. 3 Desafio: a sociedade da informação e o modelo de controle da educação escolar no Brasil É praticamente impossível formar cidadãos sem uma política de socialização das informações. Formar cidadãos tem sido uma tarefa essencialmente atribuída à escola, mas o cidadão se forma nas ruas das cidades e vilarejos, nos campos e acampamentos, de norte a sul, e de leste a oeste do país. É preciso atingi-los e esse é um desafio para os órgãos que administram a educação no âmbito nacional, estadual e municipal. O avanço tecnológico, segundo Villa (1995), citado por Sampaio ( 2000 p.35), tem contribuído para eliminar barreiras físicas e temporais, o que facilita a troca e a migração de idéias, informações e negócios fazendo emergir o fenômeno da globalização econômica e cultural, mas por outro lado, proporciona vantagens para o desenvolvimento e manutenção do sistema capitalista. Bruno, in: Oliveira (1998), recorda que a partir da Segunda Guerra Mundial surgem as empresas multinacionais 59 Escolas irregulares: e, com elas, novas formas de organização e de exercício de poder no interior das organizações, motivadas pela crescente globalização econômica e cultural. O Estado, até então, era o local onde se tomavam as grandes decisões. Agora, com a redução de seu poder, perde espaço para as grandes empresas. Estas tomam consciência do poder político que detêm para interferirem nas áreas sociais e começam a participar dos processos decisórios, chegando a determinar, em muitos casos, os caminhos a serem seguidos. Como esse fenômeno ainda se faz presente no momento, a atuação política dos órgãos responsáveis pela administração da educação nos estados e municípios, as decisões coletivas e conhecimento tecnológico são necessários para que não se fortaleçam ainda mais os ideais capitalistas. Segundo Bruno, in: Oliveira (1998, p. 37), a estrutura das organizações de poder hoje tem como base o sistema de redes e diz: “as redes são constituídas por unidades interconectadas, configurando sistemas que podem parecer muito difusos, mas que, na realidade, possuem os canais que possibilitam elevada concentração de poder em alguns poucos pólos”. A autora observa também que o estudo das conexões que se estabelecem entre as organizações sob o controle de uma organização focal possibilita identificar com que freqüência elas se comunicam, que influência a organização focal exerce sobre as demais e as várias correlações entre as variáveis de interesse e ainda faz um alerta no sentido de que o poder é exercido exatamente através da coordenação da rede e pode ser de forma horizontal, vertical, diagonal ou multidirecional. Para a autora, esse novo sistema de controle por meio de redes, assume a aparência da participação e da autonomia, visto que os mecanismos são invisíveis e as hierarquias perdem a forma piramidal e monocrática características das formas convencionais de organização e exercício do poder. Entretanto, entende que essa participação é controlada e a autonomia meramente operacional, visando garantir o aten60 um desafio ao poder público dimento às condições locais mas, sobretudo, a estabilidade de toda a rede e a coesão política do grupo dominante. Com relação à organização focal diz: O controle exercido pela organização focal ( Ministério da Educação, por exemplo, ou Secretarias, ou ainda por empresas, no caso de parcerias ), passa a realizar-se basicamente através de distribuição de recurso, da definição e do controle dos meios de acompanhamento e avaliação dos resultados, do estabelecimento dos canais de distribuição das informações, da definição dos padrões gerais de funcionamento das unidades escolares, que estabelecem os limites em que elas devem operar e promover as adaptações necessárias para o bom funcionamento do sistema educacional como um todo (ibid., p.40). No contexto ideológico dos autores mencionados e da sociedade da informação em que vivemos, a modernização dos órgãos educacionais é inevitável. Para tanto, há necessidade de incluir no processo tecnologias de informação e comunicação que permitam a interligação da sociedade em rede afim de que os cidadãos tenham maior facilidade de auxiliar o poder público na fiscalização da oferta e da qualidade da educação escolar. O progresso das ciências, da tecnologia e, sobretudo, a expansão crescente do ensino tem forçado os órgãos responsáveis pela educação a abandonarem os mecanismos de controle e de divulgação de informações que antes eram suficientes e possíveis e a buscarem outros paradigmas. No entanto, é oportuno lembrar o que Silveira ( 2001, p.25) diz a respeito: O agravamento da desigualdade tecnológica na era da informação tem suas 61 Escolas irregulares: bases em fatores históricos, econômicos e políticos e é sustentado pela exclusão da população ao acesso às tecnologias e de seu desenvolvimento. Quanto maior o número de alfabetizados tecnologicamente, maior será a sinergia indispensável à criatividade e à produção de tecnologia, fundamental para a inserção autônoma do país no mundo globalizado e ainda, que “para se combater as mazelas sociais é preciso assentar a sociedade nas novas tecnologias. Não há dúvidas quanto à necessidade de modernização dos órgãos educacionais no sentido de utilizarem meios tecnológicos que facilitem a comunicação e disseminação de informações aos cidadãos, mas não fará sentido modernizálos para uma sociedade que não tem acesso a esses meios. No Brasil, o Embaixador Ronaldo Sardenberg, Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, In: Takahashi org. (2000), faz a apresentação do livro Verde5 falando do Programa Avança Brasil: o Programa da Sociedade da Informação, resultante de um trabalho iniciado em 1996, pelo Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia e diz: [...] No Brasil, Governo e sociedade devem andar juntos para assegurar a perspectiva de que seus benefícios efetivamente alcancem a todos os brasileiros. O advento da Sociedade da Informação é o fundamento de novas formas de organização e de pro5 62 O Livro Verde originou-se de um documento elaborado pelo Grupo de Implantação do Programa, composto por representantes do Ministério da Ciência e Tecnologia, da iniciativa privada e do setor acadêmico, sob a coordenação de Takahashi. Contém as metas de implementação do Programa Sociedade da Informação e constituiu-se numa síntese consolidada de possíveis aplicações de Tecnologias da Informação. um desafio ao poder público dução em escala mundial, redefinindo a inserção dos países na sociedade internacional e no sistema econômico mundial.Tem também, como conseqüência, o surgimento de novas demandas dirigidas ao Poder Público no que respeita ao seu próprio funcionamento (ibid., p. 2 ). Para o autor, a sociedade da informação é um fenômeno global de acentuada dimensão político-econômica e social. Global porque a estrutura e a dinâmica das atividades sociais e econômicas serão inevitavelmente afetadas e transformadas pela infra-estrutura de informações disponível. A acentuada dimensão político-econômica decorre da contribuição da infra-estrutura de informações tornando as regiões mais atraentes em relação aos empreendimentos. Ele enfatiza a importância das tecnologias de informação dizendo: “Sua importância assemelha-se à de uma boa estrada de rodagem para o sucesso econômico das localidades” (ibid., p. 5). Na dimensão social, a influência dessas tecnologias é marcante, visto que possuem um elevado potencial para reduzir distâncias, disseminar informações e promover a integração entre pessoas e povos. Takahashi afirma ainda que, numa administração pública transparente, eficaz e voltada para a prestação de informações e serviços à população, as tecnologias de informação e comunicação podem se prestar para estreitar o relacionamento entre o governo e os cidadãos. A tecnologia está presente em nosso meio e o controle do fluxo de informações são novas questões políticas e sociais que não podem ser ignoradas. Evidentemente, não se pode pensar que o cidadão equipado com um computador estará protegido do autoritarismo e de qualquer abuso que seja, nem tampouco que o computador seja um instrumento nivelador da sociedade, como lembra Silveira (2001), nas páginas anteriores. A informatização das escolas, a criação de redes 63 Escolas irregulares: telemáticas e a modernização dos órgãos educacionais é um passo fundamental diante dos avanços que assolam o mundo, mas não se pode restringi-la ao uso dos equipamentos pelas pessoas, com vistas a diminuição do número de analfabetos tecnológicos no país ou a meros instrumentos de controle. É preciso atentar para uma questão fundamental: o uso de tecnologias de informação e comunicação pelos órgãos do Estado pode seguir duas tendências divergentes para as quais toda atenção dos responsáveis pela educação deve convergir: a) o desenvolvimento de tecnologias de informação e comunicação que visem a inserção do indivíduo no mundo informacional, proporcionando-lhe meios para que possa optar entre ser um cidadão bem informado, conhecedor e consciente ou, um indivíduo alienado; b) o desenvolvimento de tecnologias que favoreçam o controle pelo controle ou pela manutenção de interesses políticos e econômicos. Para que a primeira tendência floresça um esforço contínuo dos responsáveis pela administração dos sistemas de ensino, com os olhares voltados para os interesses coletivos, é fundamental. O reaparelhamento dos órgãos educacionais é necessário e a modernização deve implicar na inserção das estruturas educacionais no mundo da tecnologia, especialmente daqueles meios tecnológicos que facilitam a disseminação da informação e a melhoria da comunicação. A modernização deve implicar, ainda, no descarte de práticas que não mais se justificam no momento e na revisão e modernização das que são inerentes e necessárias à sobrevivência da organização. A eliminação de procedimentos e de papéis é essencialmente mais importante que a simples substituição de equipamentos. A Constituição Federal de 1988 pressupõe uma política de democratização do ensino e conseqüentemente da informação que deve ser implementada constantemente pelos que assumem o poder nos campos político, social, educacional e econômico. Está claro na Constituição que todos são iguais perante a lei e, portanto, todos podem ter acesso ao ensino e às informações. 64 um desafio ao poder público É oportuno lembrar o que diz Brandão (1995, p. 85): “As leis de ensino são criadas para democratizá-lo mas na verdade ocultam o fato real de que o exercício desta educação consagra desigualdades que deveria destruir”. Não há como um indivíduo interferir numa realidade quando a desconhece ou quando não sabe até onde pode chegar. O processo de modernização com vistas à democratização das informações não pode ser entendido apenas como informatização das escolas e distribuição de softwares ou como aquisição de equipamentos a serem utilizados como instrumentos de controle para os órgãos educacionais, mas, sobretudo, na utilização de “tecnologias de informação e comunicação” que possam proporcionar conhecimento, conscientização aos cidadãos e, ao mesmo tempo, facilitar o controle interno dos órgãos responsáveis pela educação e o controle da oferta da educação escolar também pela própria sociedade. Com canais de comunicação eficientes e desobstruídos, a sociedade pode ter alguns elementos a mais que lhe permita verificar a situação legal das escolas públicas e privadas e a fazer sua opção. Por outro lado, o poder público pode ganhar aliados para o exercício da fiscalização. Em síntese, é fundamental destacar deste capítulo alguns pontos que poderão facilitar a compreensão dos demais: 1- o controle da educação institucionalizada no país, durante quase três séculos, esteve sob o comando jesuítico. A União o assume por aproximadamente 70 anos e, em seguida, divide a responsabilidade com os estados. Estes, no âmbito de suas competências, administram a educação por um período de 150 anos e há menos de 15 anos a Constituição Federal de 1988, sugere aos estados que dividam a responsabilidade com os municípios. Essa competência só é regulamentada pela LDB nº 9.394/96 e, portanto, alguns municípios passaram a exercitá-la há menos de 5 anos. Há falta de referências positivas nesse sentido. 65 Escolas irregulares: 2- as idéias centralizadoras sempre estiveram presentes ao longo da história, mas a descentralização do poder, implementada pelo Ato Adicional de 1834, nunca foi totalmente aniquilada. Permanece, mesmo sob as ameaças e tentativas de extermínio. O desejo de descentralização das ações do governo sobre as questões educacionais, não pode ser ignorado, mas fortalecido ao máximo para que possa produzir os frutos esperados. Cabe aos responsáveis pelos sistemas de ensino das suas respectivas esferas de governo, zelar para que esse desejo se torne forte e indestrutível. 3- o controle da educação escolar pelo poder público no país tem sido exigência legal desde o Período Imperial. O Estado não pode se eximir da tarefa de garantir aos cidadãos os direitos constitucionais relativos à instrução escolar seja em instituições públicas ou privadas. No entanto, os mecanismos de controle da oferta legalizada, até então adotados, não têm sido suficientes no contexto da sociedade atual; 4- a Constituição Federal de 1988 mantém a exigência de autorização e avaliação pelo poder público dos cursos da educação básica oferecidos pela iniciativa privada. A nova LDB mantém as exigências da autorização e reconhecimento de cursos na forma da Lei anterior e acrescenta a figura do credenciamento dos estabelecimentos de ensino. Porém, permite o entendimento de que o reconhecimento de cursos só é necessário ao ensino superior. 5- o Art. 209, da Constituição Federal e os artigos 9º a 11, da LDB permitem o entendimento de que as escolas particulares devem ser credenciadas e seus cursos autorizados e avaliados e, as escolas públicas devem ser criadas para atender a demanda, supervisionadas para que funcionem conforme as legislações educacionais e também para garantirem a qualidade do ensino e os direitos constitucionais da clientela escolar. 66 um desafio ao poder público 6- os mecanismos de controle exercidos pelo poder público ao longo dos séculos, fortalecidos por um discurso de proteção aos direitos do cidadão têm contribuído para a manutenção do poder hegemônico que se perpetua, independentemente dos interesses coletivos e não garantem o ensino legalizado à população; 7- é necessário encontrar formas de controles externos para a oferta da educação escolar de forma que a própria sociedade auxilie o poder público na fiscalização. Favorecer a inserção do indivíduo-cidadão como agente no processo de fiscalização das ações da escola em busca dos ideais da comunidade em que estiver inserido, deve ser tarefa precípua do poder público, nesse momento, democrático; 8- um novo modelo de administração para os órgãos educacionais envolvendo a desburocratização e modernização, no sentido de descartar papéis e funções que não mais fazem sentido, é um grande desafio ao poder público e cada vez mais urgente na atual circunstância. O momento pede que os órgãos educacionais sejam adaptados aos avanços da ciência e da técnica. 9- o uso de tecnologias modernas de informação e comunicação, embora não seja uma solução definitiva para os problemas educacionais relacionados ao tema, pode ser um grande auxílio para o controle da oferta legalizada do ensino e um meio de envolver a sociedade na fiscalização das unidades escolares, visto que a socialização das informações em si não educa, mas contribui para o desenvolvimento da cidadania e desperta o indivíduo para a busca de seus direitos. No segundo capítulo, será feito um breve resgate histórico dos instrumentos legais de controle sobre a educação escolar e dos mecanismos de fiscalização das unidades escolares no Estado de Mato Grosso. 67 Escolas irregulares: O capítulo visa proporcionar uma visão histórica dos mecanismos de controle sobre a oferta da educação escolar básica no Estado de Mato Grosso utilizado pelo poder público, em especial os relacionados à inspeção das unidades escolares e ao estabelecimento de normas que disciplinam o funcionamento das escolas. Acompanhar a trajetória dos órgãos normativo e executivo do sistema estadual de ensino, mais especificamente do Conselho Estadual de Educação e Secretaria de Estado de Educação responsáveis diretos pela administração da educação no Estado, é fundamental para identificar as políticas de controle adotadas, mostrar como foi instaurada e como se perpetuou a prática da concessão da autorização de funcionamento pelo poder público às escolas públicas e privadas e, também, como os mecanismos de controle foram exercidos, modificados ou conservados desde os tempos da Capitania de Mato Grosso até o ano 2001. Rastrear os procedimentos adotados pelos órgãos responsáveis pela educação escolar básica no Estado foi o caminho escolhido para a realização da pesquisa. 68 um desafio ao poder público Os registros históricos desses mecanismos fizeram vir à tona a memória seqüencial dos fatos ligados a essa área e poderão possibilitar reflexões sobre formas alternativas para conter a oferta irregular da educação escolar básica pelos estabelecimentos de ensino públicos e privados do sistema estadual de ensino, evitando a retomada de procedimentos que já foram descartados ou a adoção de mecanismos inviáveis. Os fios condutores desse capítulo são os artigos da Constituição do Estado de Mato Grosso atinentes ao tema, as normas educacionais emanadas do Conselho Estadual de Educação que disciplinam a oferta do ensino institucionalizado neste Estado e as normas da Secretaria de Estado de Educação que regulam o funcionamento e estabelecem formas de inspeção para as escolas do sistema estadual de ensino. Foram construídas duas histórias, uma sobre os órgãos responsáveis pela elaboração das normas educacionais e seus procedimentos com relação às escolas irregulares e outra sobre os mecanismos de fiscalização das unidades escolares adotados do período imperial ao ano 2001. 1 Breve histórico: os instrumentos legais de controle da educação escolar básica no Estado de Mato Grosso A educação escolar básica neste Estado, como em todo o país, esteve sob o comando dos jesuítas desde o descobrimento do Brasil até 1759. A partir de então, o controle ficou sob a responsabilidade da União por um período de quase um século. O disposto no Ato Adicional de 1834, Lei nº 16, de 12 de agosto de 1834, define as competências entre a União e Estado. O governo provincial de Mato Grosso assume o que lhe é devido e começa a legislar sobre a educação. Através da Lei Provincial nº 8, de 5 de maio de 1837, artigos 2º ao 5º, o Estado obriga-se a manter escolas públicas de primeiro grau em todas as povoações ou lugares onde 69 Escolas irregulares: houver vinte alunos e de segundo grau onde houver trinta e, ainda, a criar uma Escola Normal para instrução primária do primeiro e segundo graus. A vigilância sobre as escolas, a partir da Lei Provincial acima, é exercida pelo governo provincial por intermédio de um Inspetor Geral dos Estudos Públicos da Capital e um Inspetor Especial para cada Paróquia cujas atribuições, entre outras, destaca-se: “inspecionar as escolas particulares e comunicar o Inspetor Geral dos Estudos da Capital e ao governo o que fosse conveniente a esse respeito”. (Art. 28, § 5º). Marcilio (1963, p. 49) observa que, nessa época, os inspetores paroquiais eram incumbidos de visitar as escolas de suas paróquias ao menos uma vez por mês para verificar o cumprimento das normas. Essa forma de inspecionar as escolas perdurou por algumas décadas. A partir da Lei Provincial nº 15, de 04 de julho de 1873, os inspetores especiais são incumbidos de inspecionar as escolas públicas de três em três meses e as escolas particulares anualmente, ou sempre que necessário. Nota-se que a prática de o poder público inspecionar com maior zelo as escolas públicas, deixando as particulares para o segundo plano, tem o seu início no período imperial. Essa Lei cria também o primeiro Conselho de Educação do Estado denominado Conselho Literário, como um órgão do governo para ser consultado em alguns casos como: escolha dos métodos e sistemas práticos de ensino; compêndios escolares; sistema a ser adotado nos exames para o concurso de cadeiras vagas; proposta de criação de escolas; fundamentação para reformas na educação; apreciação sobre o merecimento dos professores e elaboração do regimento interno das escolas públicas. Esse Conselho é composto por quatro membros efetivos reconhecidamente habilitados, além de seu presidente, o Inspetor-Geral da Instrução Pública, nomeados pela presidência (art. 117). Embora de caráter consultivo, a Lei o autoriza deliberar quando reunidos pelo menos três de seus membros, salvo nos 70 um desafio ao poder público casos de julgamento que necessitam do conselho pleno. Entre outras competências, cabe ao Conselho: julgar com apelação “ex-officio” para o Presidente da Província, as infrações disciplinares a que estejam impostas penas maiores que as admoestações, repreensões, multas ou suspensões por mais de quinze dias. O Conselho Literário, criado há mais de um século neste Estado numa época em que a Constituição Federal ainda não previa organismo de controle semelhante mantém a unidade do ensino no Estado, mas não deixa de ser uma expressão da preocupação existente com a manutenção da ordem e do poder vigentes. Embora tenha sido criado com funções apenas consultivas e deliberativas sobre os assuntos atinentes à educação, esse Conselho foi, sem dúvida, a raiz pela qual brotaram os posteriores Conselhos de Educação no Estado, evidentemente com outras funções. Até 1874, é permitida a abertura de escolas particulares independentemente de licença do governo6 . Com a Lei Regulamentar do Ensino Público e Particular da Província de Mato Grosso, de 26 de maio de 1875, através do § 1º, art. 106, fica estabelecido que, para a abertura de qualquer escola ou colégio de instrução, o professor da instituição ou o diretor do colégio deve primeiro requerer licença do governo para posteriormente iniciar as atividades. Com essa lei fica instaurada a prática de concessão de autorização pelo poder público para o funcionamento de escolas particulares na Província de Mato Grosso. 6 Não era exigida a licença, mas os professores, antes de abrirem suas escolas, podiam solicitar ao governo o exame de suficiência. Os que não apresentassem competência para ensinar satisfatoriamente ao menos as matérias do primeiro grau, eram obrigados a deixar de ensinar. A escola, que através de um professor ofendesse à moral e os bons costumes ou mostrasse no exame de suficiência falta de capacidade para ensinar, era fechada pelo Presidente da Província, ouvido o Inspetor Geral e seus mantenedores não poderiam abrir novamente outras escolas. (SÁ, 2000, p.12). 71 Escolas irregulares: Essa lei delega ao Inspetor Geral a competência de mandar fechar as escolas ou estabelecimentos particulares de instrução, no caso de contravenções especificadas. Isso deixa evidente que desde essa época as normas existem, mas não são integralmente cumpridas. A lei acima inclui também a figura dos Delegados Literários nomeados pela presidência, sob a proposta do Inspetor Geral, um para cada paróquia com atribuições constantes do art. 6º, que estabelece entre outras a de “vedar que se abram escolas, colégios ou estabelecimentos de instrução em seus respectivos distritos, sem a licença da Inspetoria Geral”. A exigência da licença e da prova de capacidade profissional para exercer o ensino particular na Província deixa de existir com o art. 203, do Regulamento da Instrução Primária da Província de Mato Grosso, de 4 de março de 1880. Porém, os professores e diretores de colégios passam a ter algumas obrigações como o encaminhamento de informações sobre a denominação e o local do estabelecimento, programas de estudos, pessoal empregado e outras alterações. Essa liberdade concedida à iniciativa privada para abertura de escolas dura algumas décadas. Segundo consta em Marcilio ( 1963, p. 69-70), o Estado em 1863, contava com apenas 30 escolas sendo: 20 públicas e 10 particulares para atender uma clientela de 818 alunos na rede pública e 133, na particular. Note-se que nesse período havia um inspetor para cada Paróquia. O autor relata também que, nesse período, o ensino particular é livre na Província e inspecionado apenas no que diz respeito à moralidade, à ordem pública e à higiene. Percebe-se que desde essa época, a inspeção exercida pelo poder público nas unidades escolares mantidas pela iniciativa privada não é direcionada às questões pedagógicas e à situação legal da oferta. Segundo Marcilio (1963, p.103), um pouco antes da proclamação da República, 31 de março de 1889, surge novo regulamento para reorganização do ensino e, entre as principais reformas, é criado o Conselho Superior da Instru72 um desafio ao poder público ção Pública, considerado pelo seu idealizador Souza Bandeira7 , como “a chave da abóbada da nova organização.” Esse Conselho é composto por três membros, funcionários das três principais sessões da Instrução, mais quatro membros amovíveis, sendo três nomeados pela Presidência e um professor público primário da Capital eleito por seus colegas. Estrutura-se em três comissões de dois membros cada uma, sendo uma pedagógica, uma disciplinar e outra para as questões administrativas. O seu Regimento Interno, aprovado em 6 de junho de 1889, inclui entre outras competências: [...] consultar sobre questões de instrução pública, elaborar trabalhos necessários ao melhoramento da legislação escolar, dar parecer sobre provas de concurso para o magistério, primário e secundário, julgar os processos disciplinares intentado contra professores, propor ao presidente as medidas que se fizessem necessárias a promover o desenvolvimento da Instrução Pública (MARCILIO, 1963, p. 103). Esse Conselho, criado como órgão de consulta do governo para os assuntos educacionais, ocupa o lugar do Conselho Literário em atuação desde 1873 conserva praticamente todas as atribuições daquele. Pela forma de composição desse Conselho como no anterior, pode-se perceber que não havia embates de forças políticas em seu interior. O Conselho era um órgão estritamente do governo. Pela Lei Provincial de 7 de junho de 1889, que regulamenta o ensino primário da Província de Mato Grosso, os 7 Dr.Antonio Herculano de Souza Bandeira, antigo Diretor da Instrução Pública do Rio de Janeiro, especializado em assuntos da educação na Europa, ao assumir o governo da Província de Mato Grosso traça um vasto plano de reformas do ensino, pondo-o imediatamente em prática. (MARCILIO, 1963, p. 99). 73 Escolas irregulares: inspetores escolares são incumbidos de visitar as escolas públicas ao menos uma vez por semana e as particulares quando julgassem necessário. A vigilância nas escolas particulares continua em segundo plano e a abertura de escolas particulares independe de licença do governo. Segundo Póvoas (1985, p. 87), “no início do Período Republicano chegam a Cuiabá-MT, os primeiros padres Salesianos que fundam em 1894 o Liceu Salesiano São Gonçalo e contribuem para impulsionar o ensino particular no Estado”. Essa escola particular, certamente, trouxe contribuições valiosas à sociedade no sentido de cobrir as deficiências de vagas ofertadas pelo poder público, além de estimular o poder público à busca de novas formas de controle. Nesse período inicial da República, a Assembléia Constituinte, através do Decreto nº 140, de 02 de janeiro de 1903, organiza o Regimento Interno do Conselho Superior da Instrução Pública do Estado de Mato Grosso. O art. 1º esclarece que o referido Conselho é um órgão de consulta do Presidente da Província e reza sobre assuntos referentes ao ensino público primário e secundário e é também o tribunal para julgar as faltas cometidas pelos professores públicos de qualquer categoria no desempenho dos seus deveres impostos pelos respectivos regulamentos. Está bem claro que o Conselho é um órgão de consulta do governo, criado para assessorá-lo segundo seus interesses. Conforme o art. 2º do Decreto acima, o Conselho é composto por 08 membros sendo: Diretor Geral da Instrução Pública; Presidente da Câmara Municipal da Capital; Secretário do Governo; um professor eleito pela congregação do Liceu dentre seus membros; um professor primário da Capital, eleito pelos seus pares da mesma Capital e três cidadãos nomeados pelo Presidente do Estado. 74 um desafio ao poder público Nota-se que houve uma evolução no sentido da representatividade da sociedade com a inclusão de professores na composição do Conselho mas, ainda assim o órgão continua tendo como maioria elementos ligados ao governo. O Art. 8º estabelece como competências, além das atribuições que lhe são conferidas como autoridade consultiva: 1-decidir em grau de recurso em última instância, as reclamações sobre as penas impostas pelas autoridades do ensino, na forma dos regulamentos da Instrução Pública; 2-aprovar, mediante parecer de uma comissão por si nomeada, os métodos e sistemas práticos de ensino, assim como a adoção e revisão ou substituição de compêndios escolares; 3-processar e impor as penas regulamentares aos membros do magistério público. Essas atribuições continuam semelhantes às estabelecidas em 1989. Como se pode perceber, até o início do século XX, a Constituição Federal ainda não previa a criação de Conselhos de Educação, mas o Estado de Mato Grosso avança, criando inicialmente o Conselho Literário e depois o Conselho Superior da Instrução Pública. Nessa época, já circulava no Congresso Federal a necessidade de criação de um Conselho Superior de Instrução Pública, como foi explicitado no capítulo anterior. Segundo Marcilio (1963, p. 132), a partir de 1910, a inspeção dos estabelecimentos particulares de ensino passa a ser responsabilidade do Presidente do Estado através do Conselho Superior de Instrução Pública e da Diretoria Geral da Instrução com seus auxiliares imediatos. Em todo o Estado haveria inspetores para cada paróquia com seus respectivos substitutos, até a efetivação de convênios entre os governos estadual e municipal conforme os preceitos legais. 75 Escolas irregulares: O autor acima observa, também, que no início do século XX havia muita interferência política na educação e cita parte de um pronunciamento do Governador Caetano de Albuquerquer; O que faz mal ao ensino público não é essa dependência em que ele está ainda do governo; o que, todavia, lhe faz grandíssimo dano é o contágio da politicagem, fazendo do professor público o servidor do partido, o galopim eleitoral, que escreve a ata e é o agente da cabala eleitoral (Ibid., p. 144). Por esses enunciados, pode-se perceber as origens da mentalidade imbuída de interesses políticos que permearam, até pouco tempo, muitos setores da educação pública em nosso Estado. O ensino no Estado é reorganizado pelo Decreto nº 759, de 22 de abril de 1927, que dá novo Regulamento à Instrução Primária do Estado. Com esse Regulamento, a Diretoria Geral da Instrução Pública continua responsável pela inspeção do ensino público e particular de qualquer grau no Estado e é retomada a questão da licença para o funcionamento de escolas particulares que desde 1880 havia sido dispensada. O art. 250 desse Decreto estabelece que nenhuma escola pode funcionar no Estado sem prévia ciência e expresso consentimento da Diretoria Geral da Instrução Pública. Por esse Decreto é concedido às escolas particulares existentes no Estado um prazo de 90 dias para oficializarem a solicitação do consentimento à Diretoria Geral da Instrução Pública, mediante uma série de informações e documentos. As escolas particulares continuam sujeitas à inspeção do Estado, com algumas exigências, como: apresentação de dados estatísticos, higiene e moralidade, respeito às leis, regulamentos e às ordens e instruções legais do Diretor Geral da Instrução Pública. 76 um desafio ao poder público No início do século XX, as exigências para abertura de escolas particulares eram mínimas e a escola pública não dependia de autorização, apenas era inspecionada. A Constituição Estadual de Mato Grosso, promulgada em 25 de dezembro de 1935, atribui à Assembléia Legislativa a competência de legislar sobre a educação e à Câmara Municipal a competência de criar e subvencionar escolas de instrução primária ou profissional. O art. 92 dessa Constituição estabelece: o “Estado terá seu sistema educativo próprio, mantidas as diretrizes da União, e o exercerá por meio do Conselho de Educação8 , que a Lei regulará”. É oportuno observar que no Estado, até 1880, as leis e regulamentos educacionais eram elaborados na secretaria do palácio do governo. A partir de então, as alterações para os Regulamentos da Instrução Pública passaram a ser propostos pela Diretoria Geral da Instrução Pública e submetidos à aprovação da Assembléia Legislativa Provincial, o que não deixa de ser um avanço. A Assembléia Legislativa começa a legislar sobre a educação, mas as coisas, no campo educacional, não acontecem imediatamente. A Constituição Estadual de 1935 estabelece que o Estado terá seu sistema de ensino exercido por um Conselho de Educação, mas o sistema estadual de ensino somente foi instituído por lei em 1968, como será visto nas páginas seguintes. Outro fato indicativo de que os assuntos relacionados à educação não eram vistos com a devida importância no período de 1880 a 1946, é que Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, anexo à Constituição Estadual de 1946 cria, através do art. 31, as Secretarias de Segurança Pública e a de Educação Cultura e Saúde, regulamentadas pelo Decreto-Lei nº 09, de 06 de outubro do mesmo ano, mas também a Secretaria de Educação Cultura e Saúde, não é instalada de imediato. 8 Nesse período está em vigor no Estado o Conselho Superior de Instrução Pública já referenciado e não foram encontrados registros sobre a criação de outro Conselho a não ser em 1946, conforme será visto posteriormente. 77 Escolas irregulares: O Poder Executivo Estadual é autorizado a extinguir a Diretoria Geral da Instrução Pública, através do Decreto-Lei nº 767, de 21 de junho de 1946, e criar o Departamento de Educação e Cultura do Estado diretamente subordinado ao Governo. Esse Departamento foi então criado pelo Decreto nº 785, de 04 de setembro do mesmo ano e regulamentado pelo Decreto nº 273, de 29 de novembro de 1946. Ao Departamento de Educação e Cultura é atribuída a responsabilidade sobre a administração, organização técnica, orientação e fiscalização do ensino pré-primário, primário, secundário e normal, técnico-comercial e profissional, quer estadual, municipal ou particular no Estado. O Departamento de Educação e Cultura foi constituído de quatro seções: Secretaria, Conselho Estadual de Educação, Inspeção do Ensino Primário e Almoxarifado. A partir de 1946, o Conselho Estadual de Educação, integrado ao Departamento de Educação e Cultura, substitui o Conselho Superior da Instrução Pública, porém mantém o caráter consultivo e deliberativo referentes aos casos de processos disciplinares. As atribuições continuam praticamente as mesmas do antigo Conselho Superior da Instrução Pública, devendo, agora, sugerir ao governo medidas necessárias à eficiência no ensino em todos os aspectos e continua sendo composto por membros nomeados pelo Governo9. Esse Conselho reunia-se apenas duas vezes ao ano, mas a ele cabia atender as convocações extraordinárias feitas pelo Diretor Geral do Departamento a que era subordinado. Com relação à inspeção, o Decreto nº 273/46, já mencionado, divide o Estado em seis zonas, com sede em pon9 78 Oito membros foram nomeados: o Diretor do Departamento de Educação e Cultura; os Diretores dos três únicos Colégios secundários do Estado; o Diretor do Tesouro do Estado; o Consultor Jurídico do Estado; um professor catedrático do Ensino Secundário e uma pessoa da comunidade reconhecida como idônea moral e profissionalmente. (MARCILIO, 1963, p, 165). um desafio ao poder público tos estratégicos10 e ordena que para cada uma seja nomeado um Inspetor do Ensino Primário que, entre outras atribuições, devia visitar e inspecionar o maior número de vezes possível as escolas locais e, no mínimo, mensalmente aquelas situadas na zona de sua jurisdição. Nesse período, como se nota, foi reduzido consideravelmente o número de inspetores responsáveis pelas escolas. Basta lembrar que em 1837 havia, além do Inspetor Geral, um Inspetor para cada Paróquia. Em 1875, havia em cada paróquia um Inspetor e um Delegado Literário e, em 1946, com a criação do Departamento de Educação Cultura e a adoção de nova estrutura administrativa, o Estado passa a ter apenas seis inspetores destinados à inspeção de todas as escolas existentes. O Diretor Geral do Departamento de Educação recebe, entre outras atribuições constantes do art. 5º do Decreto n. 273/46, a cima citado, a de “autorizar o funcionamento, interditar ou levantar interdição e determinar o fechamento definitivo dos estabelecimentos de ensino que funcionarem em desacordo com a lei.” A educação se expande por força da pressão da demanda, a iniciativa privada ganha espaço e o controle da oferta do ensino e sua qualidade continua não sendo prioridade dos governantes. É bom lembrar que nesse período pós-guerra mundial os ideais capitalistas propugnado pelos liberais emerge fortemente no país e o campo educacional sofre as influências dessas tendências. E ainda que é nesse período de turbulências políticas que a Secretaria de Educação Cultura e Saúde - SEC / MT, prevista na Constituição de 1946, é criada. É fundamental que se tenha clareza sobre os avanços alcançados pelos órgãos educacionais e, para facilitar a 10 Foram instaladas as sedes nos Municípios de Cuiabá, Corumbá, Campo Grande, Ponta Porá, Cáceres e Lageado (atual Guiratinga) (MARCILIO, 1963, p. 165). 79 Escolas irregulares: compreensão, será feita uma abordagem sobre os mecanismos de fiscalização adotados pela, então, denominada Secretaria de Educação Cultura e Saúde e, a seguir, sobre os instrumentos legais de controle adotados pelo Conselho Estadual de Educação, da criação de ambos os órgãos até o ano 2001. 1.1 Os mecanismos de fiscalização adotados pela Secretaria de Estado de Educação, da sua criação em 1946 ao ano 2001 Conforme já foi dito, a Secretaria de Educação, Cultura e Saúde-SEC/MT criada pelo Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, em anexo à Constituição Estadual de 1946, não se instalou imediatamente. A sua instalação solene se deu somente em 03 de agosto de 1953. No período de 1946 a 1953, a educação no Estado ficou sob a responsabilidade do Departamento de Educação e Cultura diretamente subordinado ao governo. Três anos após a sua criação, a Secretaria de Educação contava, segundo MARCILIO (1963, p. 183), com 49 grupos escolares, 36 escolas reunidas, 1.018 escolas rurais, 10 escolas regimentais e 09 escolas secundárias. Para inspecionar essas escolas, são criadas quinze inspetorias regionais de ensino primário em pontos estratégicos do Estado. Os Inspetores Escolares, presentes em cada paróquia do Estado desde o Período Imperial, deixam de atuar como agentes locais e a inspeção regionalizada começa a ser exercida. Embora tenham sido ampliados os pontos de atuação dos inspetores, passando de seis para quinze pontos estratégicos, o fim da inspeção local em 1946 e o início da inspeção regionalizada indicam que as idéias centralizadoras se fazem muito presentes nesse período. O sistema de controle continua entendido como necessário à manutenção da ordem e do poder. Após dez anos de sua criação, a Secretaria de Edu80 um desafio ao poder público cação Cultura e Saúde é desmembrada pela Lei Estadual nº 2.090, de 19 de dezembro de 1963, em duas Secretarias: a de Saúde e a de Educação denominada Secretaria de Educação e Cultura- SEC/MT. Esta, continua atuando como órgão responsável pela orientação e inspeção das questões educacionais nas escolas e a partir de então passa por constantes alterações que serão explicitadas a seguir. A Lei nº 2.821, de 14 de março de 1968, que organizou o sistema estadual de ensino no Estado de Mato Grosso, naquele momento, também estabeleceu (art. 81) que o Estado, através da Secretaria de Educação e Cultura- SEC / MT, deveria criar o serviço de Inspeção de ensino nos diferentes graus e ramos de acordo com instruções do Conselho Estadual de Educação. Naquele momento, a Lei determinou que o inspetor de ensino devia ser escolhido por concurso de provas e títulos e possuir conhecimentos técnicos e pedagógicos demonstrados de preferência no exercício de funções do magistério, de auxiliar na administração escolar ou na direção de estabelecimento de ensino. Para a regulamentação do serviço de inspeção e numa tentativa de descentralizar as ações da Secretaria de Educação e Cultura - SEC / MT são criadas pelo Decreto nº 537, de 7 de maio de 1968, as Delegacias Regionais de Ensino a quem, nos termos do art. 14, compete cumprir e fazer cumprir as normas administrativas emanadas da SEC / MT. Como se nota, nesse período, a Inspeção está muito ligada à verificação do cumprimento das normas administrativas, com vistas à manutenção da ordem e as questões pedagógicas continuam em segundo plano. Cinco anos mais tarde, em cumprimento às determinações da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, o Estado reorganiza o sistema estadual de ensino pela Lei nº 3.407, de 22 de outubro de 1973, a qual estabelece como competências da Secretaria de Educação e Cultura- SEC, o controle e a avaliação do sistema estadual de ensino. 81 Escolas irregulares: O Serviço de Inspeção escolar é então assumido pela Divisão de Inspeção e Serviços Técnicos de Ensino-DISTE, do Departamento de Educação da SEC / MT, que nos termos do art. 2º e 8º do Decreto Estadual nº 1.588, de 10 de agosto de 1973, recebe a competência de fiscalizar o ensino e velar pela observância das leis vigentes e das normas didático-pedagógicas em todo o Estado. Por força do art. 15, do Decreto Estadual nº 1.749, de 26 de novembro de 1973, as Delegacias Regionais de Ensino passam a denominar Delegacias Regionais de Educação e Cultura (DRECs) e recebem a competência de coordenar, supervisionar, orientar, controlar e executar as atividades da Secretaria de Educação e Cultura - SEC / MT, nas respectivas áreas de jurisdição. O art. 5º, desse mesmo Decreto, define a ação inspetora regional como atividade executiva e técnicoadministrativa com a finalidade de fiscalizar o ensino do sistema estadual de ensino, orientar a regulamentação das escolas e a organização da escrituração escolar mas segundo Souza (1991, p. 41), as atividades do Serviço de Inspeção Escolar somente passaram a ser desenvolvidas pelas Delegacias Regionais de Educação e Cultura – DREC em 1974. Souza (op. cit., p. 39) lembra ainda que a partir de 1976, o Serviço de Inspeção da SEC / MT é exercido pela Divisão de Inspeção e Administração Escolar - DIAE, do Departamento de Educação, com a finalidade de coordenar e controlar a inspeção do sistema de ensino do Estado, determinando normas, critérios e padrões de desempenho para a execução dos serviços. Portanto, o Serviço de Inspeção, realizado pelas Delegacias Regionais de Educação e Cultura no âmbito de suas jurisdições, desenvolvia-se conforme suas determinações. Esse organismo tinha uma autonomia muito limitada. É oportuno registrar esses fatos porque são elementos determinantes das políticas de controle adotadas posteriormente. Com a Reforma Administrativa, implantada pela Lei Estadual nº 4.087, de 11 de julho de 1979 que dispõe sobre a organização da administração Estadual com vistas à moderni82 um desafio ao poder público zação administrativa, o Serviço de Inspeção da SEC/MT passa a ser responsabilidade da Divisão de Administração Escolar-DAE. Essa Divisão recebe competências estabelecidas pelos art. 4º e 26 do Decreto Estadual nº 539/80, que abrangem desde a supervisão, acompanhamento e controle das atividades técnico-administrativas dos estabelecimentos de ensino, em especial, do funcionamento das secretarias escolares, até a responsabilidade em relação às diretrizes norteadoras da organização e funcionamento das unidades escolares do Pré, 1º e 2º Graus. Segundo Souza (1991, p. 41), a partir da referida reforma administrativa, as competências dos Inspetores passam a tomar a forma de orientação e assessoramento direto e indireto às escolas com a finalidade de correção dos desvios e reforço de aspectos positivos com relação a atividades técnicas de orientação pedagógica, de administração escolar e educacional. A Secretaria de Educação e Cultura, nesse período, mantém no Estado uma Divisão encarregada do Serviço de Inspeção em todas as escolas do Sistema Estadual de Ensino, no que se refere ao cumprimento das normas e à avaliação do sistema de ensino e regionalmente as Delegacias Regionais de Educação e Cultura, como já foi dito. Estas foram criadas com a função de coordenar, supervisionar, orientar, controlar e executar as atividades da SEC / MT nas respectivas áreas de jurisdição, mas com autonomia limitada. Todas a tentativas da administração central para descentralizar suas ações relativas à administração regionalizada e ao serviço de inspeção, até então, referem-se à execução das diretrizes por ela estabelecidas. Começam a surgir traços de descentralização, mas somente no que tange aos serviços a serem executados. Há inspetores regionais, mas as decisões continuam na SEC/MT, caracterizando fortemente a administração burocrática na forma explicitada no capítulo anterior. Souza (1991, p. 42) observa também que, a partir de 1980, a ação inspetora regional passa a integrar o Grupo de orientação e Assessoramento, cuja finalidade é prestar tanto a orientação pedagógica como a administrativa. O inspetor 83 Escolas irregulares: cede lugar ao Orientador de Assuntos Técnicos, consagrando-se uma nova mentalidade com relação ao Serviço de Inspeção nesse período, não mais fragmentando o atendimento às escolas, mas de forma que as questões pedagógicas e administrativas da escola fossem inspecionadas por uma mesma equipe. E acrescenta ainda: As atribuições como: “fiscalizar, cumprir e fazer cumprir, zelar pela observância das leis de ensino e outras correlatas deixaram de ser enfatizadas. Teria havido um abrandamento do autoritarismo? Ou apenas uma estratégia do discurso? (ibid., p. 42). Entendo, com base na experiência profissional, vivenciada nesse período como professora de escola pública que, seguramente, a estratégia do discurso existiu. Presenciei, por muitas vezes, o comportamento apreensivo da direção e coordenação da escola e de muitos professores nos dias que antecediam a chegada de uma inspeção da SEC/MT. Entretanto, os efeitos das normas foram positivos e contribuíram, embora muito lentamente, para que a teoria fosse incorporada à prática. Somente mais tarde, o Inspetor, que era visto como uma autoridade central ou um policial encarregado de denunciar os erros cometidos pelas escolas com vistas à punição, passa a ser visto como um orientador com a função de apontar caminhos para a correção dos desvios. Segundo Souza (op. cit., p. 44), com a divisão do Estado de Mato Grosso em 1977 e a conseqüente redução do número de escolas pertencentes à sua jurisdição, o número de Delegacias Regionais de Ensino foi reduzido, mas voltou a crescer gradativamente, chegando, em 1990, com 25 estruturas em pontos estratégicos do Estado. Por esses fatos históricos, é possível observar que a luta pela descentralização do poder perdeu forças a partir de 1946 e começa a ganhar espaço aproximadamente 40 anos depois, quando a inspeção escolar realizada por agentes regionais volta a ser uma preocupação. A Lei nº 4.752, de 26 de outubro de 1984, altera a estrutura organizacional da SEC/MT, a qual passa a atuar com 84 um desafio ao poder público o apoio de seis Coordenadorias. 11 Essa estrutura, embora revestida de intenções descentralizadoras, caracteriza o modelo de administração burocrática utilizado em todo o país. É importante ressaltar também que o atendimento às unidades escolares continuava fragmentado pelas diversas equipes embora fosse intenção da Secretaria de Educação e Cultura desde 1980, dar maior apoio às escolas. Cada uma dessas equipes, com atribuições específicas, inspecionava a escola apenas no âmbito de sua competência e, muitas vezes, a escola recebia em um mesmo dia vários inspetores: um encarregado de verificar o funcionamento do pré-escolar, outro do primeiro grau; um terceiro do ensino supletivo; um quarto da documentação escolar e assim por diante. A Secretaria de Educação e Cultura não consegue grandes avanços com esse modelo, mas é importante registrar que nesse período não foram encontrados números elevados de escolas irregulares. Será que as orientações foram mais eficientes? As normas foram fielmente cumpridas ou o tema não era considerado relevante? Creio, que a última alternativa seja a mais correta porque nessa época, atuava como professora do Ensino Médio e não tinha conhecimento da situação legal do curso como também não o tinham os alunos e os demais professores. Não se ouvia comentários dentro ou fora da escola sobre o assunto por alunos, pais ou quem quer que fosse. Em 1987, a SEC/MT parte em busca de nova concepção de administração e, como reação à forma inoperante da administração aliada às práticas anti-democráticas e centralizadoras, começa a implantar o processo democrático na rede pública de ensino. Segundo Souza (1991, p. 50-) essas práticas “favoreciam a morosidade da comunicação entre as várias instâncias do sistema estadual de ensino”. 11 Coordenadoria de Pré-Primeiro e Segundo Graus; Coordenadoria de Apoio ao Educando; Coordenadoria de Educação Supletiva; Coordenadoria de Educação Física; Coordenadoria de Documentação Escolar e Coordenadoria de Informática. 85 Escolas irregulares: Observa-se que as raízes autoritárias e centralizadoras fortalecidas pela prática durante muitos anos eram tão profundas que qualquer tentativa para arrancá-las demandaria um esforço homérico. Nesse momento histórico como diretora de escola pública, posso dizer que vivenciei esse processo e, mesmo diante das dificuldades, essa política produziu, entre outros, alguns frutos importantes: a eleição direta para diretores escolares e Delegados Regionais de Educação; a redefinição dos papéis das Delegacias Regionais de Educação e Cultura; do Conselho Estadual de Educação; do Conselho Regional de Desporto e da Fundação Cultural. Evidentemente, democratizar o ensino não significa apenas isso, mas foram passos significativos na história. Diretores escolares, a partir de 1987, não mais são indicados politicamente, são eleitos pela própria comunidade e isso quebra uma rotina antidemocrática nas escolas de mais de um século. No primeiro capítulo ficou claro que as dificuldades não são poucas para que um processo democrático se instale. No Estado de Mato Grosso, o processo de gestão democrática, exercitado desde 1987, é regulamentado pela Lei 5.604, de 22 de maio de 1990, nos termos do inciso IV, do Art. 237, da Constituição Estadual e, posteriormente, pela Lei Complementar nº 49/98 e lei 7.040/98. A Lei 5.604/90, já mencionada, assegura às unidades escolares a autonomia nas questões pedagógicas, administrativas e financeiras de seu projeto educativo. Inclui a figura dos Conselhos Deliberativos Escolares compostos por alunos, pais, professores, funcionários e a direção da escola, eleição direta para diretores escolares e, ainda, a participação dos segmentos escolares nas instâncias decisórias. As escolas, a partir de então, começam a exercitar essa autonomia com a elaboração do Plano Global Escolar12 - PGE, com a participação da 12 86 Plano Global Escolar- Denominação dada na época ao documento que traduzia as ações da escola nos aspectos pedagógicos, administrativos, disciplinares e até financeiros. um desafio ao poder público comunidade. Nesse período, vivenciei a elaboração do primeiro PGE da Escola Estadual de I e II Graus Aureolina Eustácia Ribeiro e posso dizer que as dificuldades não foram poucas para envolver a comunidade na elaboração do documento. Implantar uma nova prática que incluía a participação da comunidade e estimular essa comunidade para dar sugestões à escola, após séculos de um regime fechado e autoritário, foi realmente um desafio não superado totalmente naquele momento. As Delegacias Regionais de Educação e Cultura em funcionamento desde 1973 são transformadas em Superintendências Regionais de Educação e Cultura SEC/ SR pela Lei nº 5.702, de 19 de dezembro de 1990 e outras são criadas por este e outros atos posteriores. Assim o Estado passa a contar com 31 estruturas para a administração regionalizada. Os Delegados de Ensino passam a se denominar Superintendentes Regionais de Educação e Cultura. Com a reestruturação organizacional da SEC / MT, a administração continua regionalizada, mas com uma autonomia maior no sentido de compor o quadro de pessoal e solucionar os problemas gerados nas unidades escolares. Dois anos mais tarde, a Lei Complementar nº 14, de 16 de janeiro de 1992, que dispõe sobre a estrutura e funcionamento da Administração Estadual, dedica o Capítulo VI às Secretarias de Estado e a seção IV desse capítulo trata da Secretaria de Estado de Educação - SEE / MT que aparece desvinculada da Secretaria de Cultura. Conforme o Art. 25 dessa Lei, compete à Secretaria de Estado de Educação: O planejamento, a execução, supervisão e controle da ação governamental relativa à educação, fiscalização do funcionamento dos estabelecimentos de ensino público e particular e outras atribuições previstas em regulamento, em perfeita articulação com os governos Federal e municipais, nos termos da legislação específica. 87 Escolas irregulares: Em seguida, o Decreto nº 1.199, de 28 de janeiro de 1992, que dispõe sobre a nova estrutura organizacional da Secretaria de Estado de Educação, também estabelece como sua finalidade o planejamento, a execução, a supervisão e controle da ação governamental relativa a educação, a fiscalização do posicionamento dos estabelecimentos de ensino público e particular em perfeita articulação com os governos Federal e Municipal. O Decreto inclui, ainda, na estrutura da Secretaria de Estado de Educação sete unidades de apoio assim denominadas: I- Órgãos de Direção Superior; II- Órgão de Gerência Superior; III- Órgãos de Assessoramento Superior; IV- Órgãos de Administração Sistêmica; V- Órgãos de Execução programática; VI- Órgãos de Administração Regionalizada; VII- Órgãos de Administração Descentralizada. Todos esses órgãos desdobram-se em Coordenadorias, Assessorias, Divisões e outros, mas serão destacados apenas o órgão de Execução Programática, que se desdobra em Coordenadorias13: Técnica, de Educação e os órgãos da Administração Regionalizada, que são as Superintendências e Unidades Escolares por serem pertinentes ao tema. Essa nova estrutura mostra que houve uma evolução na política educacional adotada no sentido de descentralizar as ações da Secretaria de Educação. O Decreto estabelece como 13 88 As Coordenadorias desdobravam-se em: 1-Coordenadoria Técnica: composta pela: Divisão de Administração Escolar; Divisão de Apoio ao Educando; Divisão de Articulação com os Órgãos Municipais de Educação; 2Coordenadoria de Educação: Divisão de Educação Pré-escolar e Ensino fundamental; Divisão de Ensino Médio; Divisão de Educação de jovens e Adultos; Divisão de Atendimento a Alunos Portadores de Necessidades Especiais; Divisão de Desporto Escolar. um desafio ao poder público órgãos de administração regionalizada as Superintendências Regionais de Ensino e as próprias unidades escolares e isso foi um avanço, um indicativo de que os efeitos do regime político, vivenciados até 1988 não só no Estado, mas em todo o país começa a ser amenizado. Entretanto, com as coordenadorias e divisões, cada qual com equipes e funções específicas, foi mantida a fragmentação no atendimento às unidades escolares. Percebe-se que a estrutura típica da administração autocrática adotada desde 1946 sofre um impacto e cede lugar à administração mais aberta e democrática. Os princípios descentralizadores do Ato Adicional de 1834, enfraquecidos nas décadas de 40 e 50, retomados timidamente em 1968, voltam à tona e são reforçados com o Decreto acima referido. A nova estrutura organizacional básica e setorial da Secretaria de Educação rompe toda uma cultura de administração centralizada o que foi um grande passo mas o modelo fragmentado da organização por coordenadorias e divisões conserva as hierarquias em moda no país, como foi dito no primeiro capítulo. Durante o período de 1990 a 1995, período em que atuei como técnica de Inspeção na Superintendência Regional de Ensino - SR-02, em Cuiabá-Mt, posso afirmar que, nos dois primeiros anos, a inspeção era direcionada às escolas públicas estaduais. As escolas particulares e as municipais não eram objeto de inspeção permanente. Somente eram visitadas mediante denúncias da comunidade ou quando casos graves vinham à tona. A prática de inspecionar e orientar escolas públicas com maior zelo tem suas raízes no período imperial como já foi dito e perdura por aproximadamente dois séculos. A partir de 1993, as Superintendências Regionais de Ensino começam a se preocupar também com as escolas municipais e particulares e estas passam, então, a ser visitadas periodicamente com o objetivo de se fazer um trabalho preventivo e de orientação, o que era uma aspiração da Secretaria de Educação desde 1980. Com a mudança de governo no ano de 1995, propostas descentralizadoras de gestão democrática da educação 89 Escolas irregulares: passam a ser operacionalizadas e, através do Decreto nº 99, de 17 de abril de 1995, a estrutura organizacional da Secretaria de Estado de Educação-SEE/MT, desmembrada da Cultura desde 1992, ganha nova sigla- SEDUC/ MT e também nova estrutura. Não mais são mantidas as Superintendências Regionais de Educação que estavam estruturadas e em funcionamento desde 1990 como órgão de Administração Regionalizada. Com o Decreto acima, é praticamente mantida a estrutura organizacional da SEDUC/MT. Seis, dos sete órgãos criados pelo Decreto anterior, são mantidos com alterações apenas em seus desdobramentos e o Órgão da Administração Regionalizada é substituído pela Administração Local. Como Órgãos de Execução Programática, a Secretaria passa a contar não mais com duas Coordenadorias como na estrutura anterior, mas com três Coordenadorias e um Núcleo: 1- Coordenadoria de Política Pedagógica; 2- Coordenadoria de Política de Ensino Superior; 3- Coordenadoria de Política de Cooperação Estado-Município; 4- Núcleo de Programas/ Projetos Estado /Município. 4.1- Gerente de Serviços. Com essa reestruturação organizacional, as Superintendências desapareceram e as unidades escolares, antes entendidas como Órgãos de Administração Regionalizada, passam a ser concebidas como Órgãos de Administração Local e isso mostra um ganho muito grande no que se refere ao fortalecimento da gestão democrática e autonomia da escola, que vinha sendo discutida e implementada desde 1987. A Coordenadoria de Política Pedagógica, responsável por toda a educação básica, organiza-se em setores de Educação Infantil, Ensino Fundamental, Médio e outros e dá seqüência ao atendimento fragmentado às unidades escolares como nas estruturas anteriores. Após a reestruturação da SEDUC/MT e para dar suporte às unidades escolares, surge a Portaria 956/95-SEDUC, 90 um desafio ao poder público de 1º de junho de 1995, que delega à Equipe de Assessoramento Pedagógico, instalada nas Secretarias Municipais de Educação ou nas Escolas Pólos, algumas competências no sentido de prestar assessoramento às escolas públicas estaduais e municipais e orientar as escolas particulares no âmbito das questões administrativas e pedagógicas. Esses Assessores seriam, sem dúvida, as peças fundamentais para que se rompessem o atendimento fragmentado, uma vez que poderiam ser os orientadores e supervisores diretos das unidades escolares sem a criação de setores diversos no interior das Assessorias, o que fragmentava os serviços e o atendimento, mas não foi o que ocorreu. A falta de estrutura, escassez de equipamentos, recursos materiais, financeiros e de pessoal preparado dificultou o processo. Três anos após, surge a Portaria 038/99/SEDUC/ GS/MT, de 29 de junho de 1999, que estabelece critérios para a designação, composição e define as competências das Assessorias Pedagógicas instaladas nos municípios que não possuem seus próprios sistemas de ensino. Essa Portaria é revogada no ano seguinte pela Portaria 175/00- SEDUC/GS/MT, que altera as formas de composição das Assessorias com alguns avanços em relação à anterior e permanece vigente até o final da coleta de dados para esta pesquisa. A portaria em vigor até o ano 2001, estabelece o número14 de Assessores Pedagógicos conforme o número de escolas da Rede Pública Estadual de Ensino. Essa Portaria toma por base, para a designação dos profissionais, apenas o número de escolas da rede pública estadual, mas os assesso14 De acordo com o Artigo 2º, da Portaria 175/00-SEDUC/GS/MT, de duas a cinco escolas da Rede Pública Estadual – um assessor pedagógico; de seis a dez - dois assessores; de onze a quinze- três assessores; dezesseis a vintequatro assessores; de vinte e um a vinte e cinco – cinco assessores; de vinte e seis a trinta- seis assessores; de trinta e um a quarenta – sete assessores; de quarenta e um a cinqüenta- oito assessores. Onde existir apenas uma escola da Rede Estadual não haverá assessor e nos municípios onde existir acima de dez escolas da Rede Particular, será designado mais um Assessor. 91 Escolas irregulares: res são responsáveis também pela supervisão das escolas da rede municipal e particular. Não é preciso dizer que a supervisão nas escolas particulares acaba por pertencer ao segundo plano novamente. Considerando a situação atípica do Município de Cuiabá, que apresenta um número muito elevado de escolas municipais e particulares, a SEDUC/MT, após vários questionamentos, assegura a divisão de responsabilidades quanto as competências dos Assessores entre a Secretaria de Estado de Educação e a Secretaria Municipal de Educação, ficando para a primeira as escolas estaduais e para a segunda, as municipais e particulares. O § 4º, do Art. 2º, da Portaria acima citada, esclarece que: Nos Municípios que celebram convênios de Gestão Compartilhada e / ou Gestão Única, a coordenação da Assessoria Pedagógica ficará sob responsabilidade do Titular da Secretaria Municipal de Educação, qualquer que seja o número de escolas da Rede Pública Estadual”. Entre as competências atribuídas às Assessorias Pedagógicas, a Portaria inclui, no art. 3º, inciso II: “Zelar pela regularidade do funcionamento das escolas do Sistema Estadual de ensino, mantendo sob controle os prazos dos atos que autorizam e / ou as reconhecem”. No Inciso IV: analisar emitir parecer nos processos de criação, autorização para funcionamento, reconhecimento de curso, elevação de nível, nova denominação, transferência de mantenedora, encerramento de atividades suspensão temporária de atividades, extinção de cursos das escolas do sistema estadual de ensino. No Inciso VII: inspecionar “in loco” as escolas do Sistema Estadual de Ensino para fins de autorização e reconhecimento de cursos... 92 um desafio ao poder público Atribuições específicas sobre a regularização de escolas e cursos elaboradas desse modo, há muito tempo não eram estabelecidas em normas. O Art. 4º dessa mesma Portaria incumbe à Secretaria de Estado de Educação as competências de que trata o art. 3º nos municípios onde não há convênio de Gestão Compartilhada e/ou Gestão Única e Assessoria Pedagógica. Dessa forma, teoricamente todos os municípios estão cobertos com o serviço de assessoramento direto da SEDUC / MT. Para uma visão clara sobre a existência de Assessorias Pedagógicas nos Municípios e o número de escolas foi feito o levantamento a seguir. Tabela 1 - Número de Escolas por Assessor Pedagógico nos Municípios no ano - 2001 * Números obtidos através do arquivo do CEE / MT ** Número fornecido pela SEDUC - MT/ dezembro - 2001 Ao todo, no ano de 2001, o Estado conta com 139 municípios, mas nem todos possuem assessores pedagógicos. A tabela mostra que nesse ano há 55 municípios que possuem de 02 até 63 escolas das três redes: estadual, particular e 93 Escolas irregulares: municipal que não possuem assessores; 75 municípios com número de escolas que variam de 03 a 94 escolas e apenas 01 assessor; 06 municípios com número de escolas entre 32 a 144, contemplados com 02 assessores; 01 Município (Rondonópolis) com 145 escolas e 04 assessores; 01 Município (Cáceres) com 162 escolas e 05 assessores e 01 Município (Cuiabá) com 401 escolas e 08 assessores. Pode-se notar que a distribuição, por não levar em consideração o número de escolas particulares e municipais, apresenta alguns privilégios e, portanto, é uma distribuição questionável. Se as Assessorias Pedagógicas são incumbidas de orientar e zelar pelo funcionamento de todas as escolas do sistema estadual de ensino, o número de assessores deve ser compatível. O Município de Cuiabá, por exemplo, possuía no ano 2001, 401 escolas em atividade com 08 assessores, numa média de 50 escolas por assessor, enquanto outros municípios com três escolas ou menos possuíam 01 assessor. Esse quadro pode evidenciar a necessidade de se rever a distribuição para um atendimento mais eficiente e maior aproximação entre SEDUC/MT e CEE/MT visto que quem detém o controle sobre a existência de escolas particulares e públicas municipais de todo o Estado é o Conselho Estadual de Educação e o exato número de escolas públicas estaduais é responsabilidade da SEDUC/MT que as cria. A visão do todo é fundamental para que todas as escolas tenham realmente um assessoramento da SEDUC/MT através de representantes locais. Os detalhes sobre o funcionamento, avanços e entraves encontrados pelas Assessorias Pedagógicas dos Municípios e Secretarias Municipais de Educação serão descritos no quarto capítulo. Percebe-se que a Portaria 038/99 trouxe alguns avanços em relação às anteriores. Atribui ao assessor pedagógico, no âmbito de sua jurisdição, a competência de atuar como articulador da política educacional prestando orientações técnico-pedagógicas e administrativas a todas as escolas do sistema 94 um desafio ao poder público estadual de ensino. Nota-se que o espírito dessa norma é evitar o atendimento fragmentado às escolas por diversos inspetores, o que vinha sendo uma meta da Secretaria desde 1980. Outro fato que marca a atuação da SEDUC/MT nos últimos anos, é a aprovação da Lei Estadual nº 7.040, de 1º de outubro de 1998, que regulamenta a Gestão Democrática do Ensino Público Estadual de Mato Grosso nos termos da Constituição Estadual, Federal e atual LDB. A democratização do ensino e a gestão democrática estão muito ligadas às ideologias políticas e econômicas do momento e também às questões da expansão do ensino. Portanto, são assuntos diretamente ligados ao tema da pesquisa e não podiam ser ignorados. Os preceitos da Lei acima podem ser considerados por um lado questionáveis, mas por outro, avançados quando estabelece em seu Art. 1º : I- co-responsabilidade entre o Poder Público e a sociedade na gestão da escola; II- autonomia pedagógica, administrativa e financeira da escola, mediante organização e funcionamento dos conselhos Deliberativos da Comunidade Escolar, do rigor na aplicação dos critérios democráticos para escolha do diretor de escola e da transparência automática e sistemática de recursos às unidades escolares; III- transparência dos mecanismos administrativos, financeiros e pedagógicos; IV- eficiência no uso dos recursos financeiros. Ao tratar da autonomia na gestão administrativa, a lei abre espaço à participação da comunidade na escolha dos diretores escolares e nas decisões da escola, através dos Conselhos Deliberativos da Comunidade Escolar. A gestão democrática do ensino público que desde 1987 vinha sendo um assunto bastante discutido é implementada nas escolas públi95 Escolas irregulares: cas e a sociedade mato-grossense começa a reconhecer o direito de participar da vida da escola não só como prestadora de serviço, mas nas suas decisões. A Lei acima citada preconiza um modelo de gestão que convida a comunidade escolar a uma mudança de mentalidade considerável visto que a escola em tempos atrás não possuía autonomia sequer para escolher seus métodos de ensino, como foi dito no início deste capítulo. Nesse sentido, a Secretaria de Estado de Educação assim se expressa: Educação democrática e de qualidade, é uma expressão que resume bem os objetivos a serem alcançados pelo ensino público. No Plano de Metas 1995-2006, o Governo propôs uma série de transformações, a partir de problemas identificados na educação, partindo de conceitos como democracia e autonomia, em contraposição ao autoritarismo e à centralização do poder. (MATO GROSSO. SEDUC, 1998a, p. 5). Fica evidente a evolução da política adotada e o espírito descentralizador e modernizador da SEDUC/MT quando decide não mais manter estruturas regionais, mas criar Assessorias Pedagógicas nos municípios ou delegar competências às Secretarias Municipais de Educação onde couber para exercerem a supervisão, a orientação e o acompanhamento às escolas, através de agentes locais e, ainda, criar Conselhos Deliberativos da Comunidade Escolar como órgão de apoio administrativo nas escolas públicas estaduais. O resgate histórico dos mecanismos de fiscalização utilizados no Estado mostra que essas estruturas precisam ser fortalecidas com o envolvimento da sociedade a fim de que criem raízes fortes e impeçam que atores políticos motivados por suas ideologias as exterminem, como ocorreu em 1946 quando os inspetores locais foram substituídos pelos regionais. É louvável que o Estado tenha avançado rumo a um modelo de administração mais democrático e resguardado às 96 um desafio ao poder público escolas ampla autonomia expressa através de leis. Porém, para que haja garantia de continuidade, a população deve ser envolvida. É preciso que ela tome conhecimento dessa autonomia e lute por preservá-la. Como se pode ver, as normas existem. A democratização do ensino, a autonomia da escola e o esquema de um trabalho de supervisão constante estão postos teoricamente. Entretanto, o que falta pode ser uma política de democratização e socialização das informações para que as pessoas conheçam amplamente os seus direitos e deveres e os faça valer. Verifica-se que a legislação não tem sido observada por alguns dirigentes ou mantenedores de escolas públicas e privadas e o acompanhamento pelo poder público tem sido exercido com deficiência. Há um número expressivo de escolas que oferecem cursos não autorizados e/ou não reconhecidos ou ainda com os prazos de vigência dos atos vencidos, causando prejuízos aos alunos como está dito nos próximos capítulos. É válido ressaltar que no Estado de Mato Grosso, a Secretaria de Estado de Educação tem demonstrado sua preocupação com a regularidade dos cursos oferecidos e, também, com os rumos da educação quando deixa clara a sua visão sociológica e progressista ao postular: Para cumprir a sua função social, a escola precisa considerar as práticas de nossa sociedade, sejam elas, de natureza econômica, social, cultural, ética ou moral. Tem que considerar também as relações diretas ou indiretas dessas práticas com os problemas específicos da comunidade local a que presta serviços. [...] é fundamental conhecer as expectativas dessa comunidade, suas necessidades, formas de sobrevivência, valores, costumes, manifestações culturais e artísticas. É através desse conhecimento que a escola pode atender a comunidade e auxiliála a ampliar seu instrumental de compreensão e transformação do mundo. (MATO GROSSO. SEDUC, 1997, p. 18-19). 97 Escolas irregulares: Não se pode negar que a prática nas escolas tem sido gradualmente alterada. Dirigentes escolares têm incentivado a comunidade a construir juntos o Projeto Político Pedagógico da Escola e, na medida do possível, procurado conhecer as expectativas da comunidade escolar. No entanto, são oportunas as seguintes indagações: essa comunidade escolar tem sido incentivada a conhecer os problemas relacionados à situação de regularidade dos cursos por ela oferecidos? Quantos alunos conhecem a situação dos cursos que freqüentam e as conseqüências que podem sofrer ao freqüentarem um curso irregular? Está, essa comunidade, em condições de lutar pela regularização dos cursos que seus filhos freqüentam? Evidentemente, a maioria das pessoas, além de desconhecerem a situação legal dos cursos, não tem o hábito de fazer análises prévias para prever os problemas. Somente procuram a solução quando estão envolvidos em situações conflituosas. Promover meios de socializar as informações de tal forma que o controle da oferta da educação escolar pública e privada seja feito pelo poder público, mas em parceria com a própria comunidade, parece ser um grande desafio para os órgãos educacionais do Estado nos dias de hoje. Como já foi demonstrado anteriormente a postura de compromisso da Secretaria de Estado de Educação com a gestão do ensino de forma democrática, preocupando-se com a participação e o comprometimento da sociedade nas ações da escola é recente e a incorporação de novos mecanismos, sobretudo, quando modificam a prática é lenta. Freire (1979, p. 91) fala desse comprometimento da seguinte forma: “O papel dos que estão comprometidos numa ação cultural para conscientização não é propriamente falar sobre como construir a idéia libertadora, mas convidar os homens a captar com seu espírito a verdade de sua própria realidade”. Pode-se perceber que o poder público tem procurado democratizar a gestão da educação escolar para que as escolas se adaptem à realidade, mas a questão da legalidade 98 um desafio ao poder público dos cursos oferecidos parece estar fugindo aos seus controles. O poder público não tem conseguido acompanhar a expansão da oferta nos últimos anos e não tem conseguido manter escolas devidamente regularizadas. Com relação à expansão do ensino, a Secretaria de Estado de Educação tem enfrentado um problema crescente a cada ano. Segundo Marcilio (1963, p. 183), na década de 50, o Estado contava com 49 grupos escolares, 36 escolas reunidas, 1.018 escolas rurais, 10 escolas regimentais e 09 escolas destinadas ao Ensino Secundário. Segundo dados do Censo Escolar 2000, o Estado possui 603 escolas Estaduais, 2.312 escolas municipais e 325 escolas particulares, somando 3.240 unidades escolares nas diversas etapas da educação básica e modalidades de ensino. Essa expansão contribuiu para o desequilíbrio do sistema com relação à supervisão e estimulou o poder público à adoção de novas formas de controle. Em 1996, a SEDUC/MT, elaborou uma cartilha intitulada Sistema Único Descentralizado de Educação Básica na qual explicita que: A cobertura do sistema educativo de Mato Grosso em relação à média nacional, torna-se ainda mais desafiadora diante do crescimento vertiginoso da população matogrossense que apresenta taxas anuais significativamente superiores à média nacional: 5.9% contra 2% ao ano. Esses dados são reveladores de que o sistema educativo de Mato Grosso além de focalizar a melhoria qualitativa das vagas deve ter claramente delineada uma política de expansão quantitativa da oferta, sob pena de aumentar a exclusão de amplos segmentos da população devido a falta de acesso à escola (MATO GROSSO. SEDUC, 1996, p. 94). É entendimento da Secretaria que o monitoramento 99 Escolas irregulares: contínuo da relação prospectiva entre demanda e oferta, associada à metodologia do micro-planejamento, deverá nortear as ações no sentido de assegurar a equidade espacial no processo de expansão da rede física, visando a universalização do atendimento. O desvendamento da realidade sócio-econômica e cultural para que a especificidade de cada região do Estado e de cada escola seja respeitada é ponto de partida para a expansão e para um planejamento eficaz, os dados do censo escolar realizado anualmente são de fundamental importância. A Secretaria de Estado de Educação assim se expressa: O planejamento da rede pública de ensino, num enfoque progressista, conforme assumido pela atual gestão no Governo do Estado de Mato Grosso, precisa partir de uma análise conjuntural, pela qual, quem atua na gestão da rede pública, possa localizar as possibilidades e limites da descentralização, neste momento em que a globalização da economia determina com maior força as políticas públicas dos países periféricos. A implantação deste trabalho, em Mato Grosso, pode contribuir para superar a desarticulação histórica entre as redes estadual e municipais, ampliando o atendimento às demandas de ensino pela Educação Básica. Pela experiência já acumulada, pode-se vislumbrar que esta opção vem se revelando capaz de mobilizar a sociedade contra a exclusão social provocada pelas propostas neoliberais (MATO GROSSO. SEDUC, 1998b, p. 9). Pode-se perceber que a Secretaria de Estado de Educação tem procurado administrar a educação escolar e acompanhar o funcionamento das escolas, mantendo estruturas locais. Essa Secretaria tem envidado esforços para alcançar 100 um desafio ao poder público um novo modelo de gestão da escola pública com maior articulação entre as duas redes: estadual e municipal, implantando, através de lei e outras normas, a gestão democrática preconizada pela Constituição Federal e Estadual. O Programa de Gestão Única e a Proposta de um Sistema Único Descentralizado de Educação Básica, além de outras ações, deixam clara a postura progressista da Secretaria de Estado de Educação para incorporar e disseminar idéias contrárias ao pensamento neoliberal. Entretanto, pode estar faltando estabelecer uma política de democratização e socialização das informações para que as pessoas conheçam amplamente os seus direitos. Nesse sentido, a utilização de meios tecnológicos, especialmente os que favoreçam a comunicação e a disseminação de informações, como sugere Takahashi (org.) 2000 e outros já mencionados no primeiro capítulo, pode ser um bom caminho. Com referências ao uso de tecnologias educacionais, há uma proposta da SEDUC/MT para informatizar as escolas, órgãos centrais e Assessorias Pedagógicas dos Municípios, visando o intercâmbio de informações e a disponibilização de informações e dados de interesses dos usuários. A SEDUC já trabalha na montagem de um poderoso modelo de comunicação de dados e, pela ousadia da proposta, Mato Grosso foi um dos três Estados, ao lado de São Paulo e Ceará, a receber do MEC um conjunto de equipamentos de informática de última geração, que iniciará o processo de ligação em rede de todos os dados educacionais no Estado e posteriormente no País (MATO GROSSO. SEDUC, 1996, p. 94). Evidentemente, a ligação dos órgãos educacionais em rede como estão fazendo alguns Estados como São Paulo, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Distrito Federal e outros, facilitam o acesso às normas, cadastro e situação legal de es101 Escolas irregulares: colas, acompanhamento de processos, enfim as inúmeras consultas esclarecedoras poderão contribuir para que as pessoas se tornem mais conscientes de seus direitos e obrigações, mobilizem-se, participem mais ativamente da vida das escolas e velem pelos seus direitos num verdadeiro exercício de cidadania, embora se sabe que a maioria não tem acesso a esses meios tecnológicos. A interligação da sociedade em rede não garante que os problemas educacionais do Estado sejam solucionados e tampouco que a prática do oferecimento de cursos irregulares seja definitivamente coibida, mas pode significar um passo muito grande rumo à modernização dos órgãos educacionais, socialização das informações, fiscalização das escolas pela própria comunidade e ao desenvolvimento da cidadania. A SEDUC/MT divulga, ainda, com relação à modernização: As unidades de ensino trabalham com Kits tecnológicos e poderão contar com os Núcleos de Tecnologia Educacional e Laboratórios de Informática. [...] “às vésperas do ano 2000, não há como a escola virar as costas para a tecnologia que pode servir como poderoso instrumento de trabalho em sala de aula.” [...] “não há como falar em tecnologia sem mencionar a informática. A SEDUC está desenvolvendo o Programa de Informatização Escolar, através do Programa Nacional de Informática Educativa PROINFO. Mato Grosso poderá contar com seis Núcleos de Tecnologia Educacional – NTE, em municípios- pólo, a serem usados como ferramentas didático-pedagógicas (MATO GROSSO. SEDUC, 1998a, p. 18-19). Embora a modernização não signifique apenas a utilização de equipamentos tecnológicos, não há como iniciar 102 um desafio ao poder público um processo de modernização em qualquer organização sem inovações tecnológicas. Contudo, é bom lembrar o que foi dito no primeiro capítulo: os equipamentos tecnológicos são, por um lado, poderosos instrumentos de controle e conseqüentemente propícios para a manutenção do poder. Os controles por meio de papéis podem ser transferidos para os arquivos de computador, disquetes, cds ou outros meios e a simplificação de formulários e papéis não garante que as práticas e funções que não mais condizem com a realidade sejam descartadas. Por outro lado, proporcionar meios para que os cidadãos mato-grossenses localizados nos quatro cantos do Estado possam receber informações necessárias à libertação de todo o tipo de ignorância, desenvolvendo-se e auxiliando de forma consciente a transformar o seu meio social para melhor e, assim deixar de ser vítimas de abusos, seja do poder público ou da iniciativa privada, pode não ser interessante para alguns poucos detentores do poder. Os órgãos públicos responsáveis pela educação no Estado têm se esforçado no sentido de implantar tecnologias de informação e comunicação e de administrar a educação de forma a se adequar aos novos modelos propostos pelos estudiosos do assunto como Sander, Oliveira, Bordignon e Cury citados no primeiro capítulo, mas está evidente que esses órgãos não se libertaram totalmente dos antigos mecanismos de controle por meio de papéis e funções hoje praticamente inviáveis. Para constatar as características burocráticas descritas no primeiro capítulo, basta observar a estrutura dos órgãos em departamentos coordenadorias ou divisões e manusear algumas normas por eles emanadas. Os mecanismos de controle cartorial adotados pela Secretaria de Estado de Educação e Conselho Estadual de Educação deste Estado têm contribuído para o aumento excessivo de serviços diversos em seus interiores o que corrói o precioso tempo que precisariam para “pensar” em políticas educacionais de administração e controle possivelmente mais simples e eficazes. É evidente que abandonar práticas ligadas aos con103 Escolas irregulares: troles não é fácil. Mudanças dessa natureza são marcadas por incertezas e conflitos e podem implicar na perda de algumas funções. Por outro lado, mantê-las pode resultar num aumento crescente de serviços nesses órgãos e torná-los congestionados e inoperantes. Contudo, pode-se observar que a Secretaria de Educação com as suas diversas denominações e estruturas, desde a sua criação em 1953, tem avançado muito em busca de melhores formas de atendimento à população: resgatou o serviço de fiscalização nas escolas por agentes locais e garantiu a elas uma autonomia nunca vista em toda a história. A partir de 1992 e, mais especificamente, da última estrutura organizacional (1995), fica evidente a evolução para um modelo de administração mais aberto em que o poder de decisão não está centrado nas mãos de alguns poucos, mas descentralizado para os órgãos internos e externos, inclusive às escolas que são consideradas como órgãos de administração local. Isso foi um avanço que merece ser registrado em sua história. Com a nova estrutura, embora tenha alcançado uma evolução considerável no sentido de criar várias instâncias decisórias, não consegue descartar práticas do modelo de administração que vêm se arrastando por séculos. As características da administração burocrática, vistas no primeiro capítulo, ainda estão presentes no interior do órgão. O que se nota é um esforço muito grande de seus integrantes, um verdadeiro exercício no sentido de se alcançar o novo modelo, mas a gestão democrática é ainda recente neste Estado e toda passagem de um regime a outro exige mudança de mentalidade, o que não acontece repentinamente. 1.2 Os instrumentos legais de controle adotados pelo Conselho Estadual de Educação, da sua criação em 1963 ao ano 2001 Como já foi dito no início deste capítulo, o Estado de Mato Grosso teve, no período imperial, o Conselho Literá104 um desafio ao poder público rio como órgão consultivo do governo para os assuntos educacionais. Na fase inicial do Período Republicano, valeu-se do Conselho Superior da Instrução Pública e, em 1946, do Conselho Estadual de Educação integrado ao Departamento de Educação e Cultura. Esses três Conselhos foram de caráter consultivo podendo deliberar apenas em alguns casos. Todos criados para assessorar o governo nos assuntos atinentes à educação. Em atendimento às exigências da Lei 4.024, de 20 de dezembro de 1961, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, comentada no primeiro capítulo, o Estado de Mato Grosso promulga a Lei Estadual nº 1.815, de 7 de Fevereiro de 1963, que cria o atual Conselho Estadual de Educação nos termos da Lei Federal e dispõe sobre a sua composição e competência. Com relação à composição15 desse Conselho, houve uma grande evolução. Foi permitida a ampliação da participação representativa de alguns segmentos da sociedade pela primeira vez na história desde o Conselho Literário em 1873 e do Conselho Superior da Instrução Pública em 1889. Embora indicados pelo Governador, a participação de representantes de alguns segmentos da sociedade no órgão normativo do sistema estadual de ensino merece ser registrada. Conforme o art.3º, da Lei Estadual n. 1.815, acima mencionada, o Conselho nesse momento, é composto por: Dois representantes dos diretores e dos professores de estabelecimentos públicos e particulares de ensino primário; dois representantes dos diretores e dois de professores de estabelecimentos públicos e particulares de ensino normal; um representante dos professores de ensino municipal; dois diretores e dois representantes de professores 15 Os conselheiros são designados pelo Governador dentre pessoas de notório saber e experiência em matéria de educação (MATO GROSSO. CEE, 1996, p. 15). 105 Escolas irregulares: de estabelecimentos públicos de ensino secundário; um representante dos professores de Educação Física dos ensinos médios e primários; um representante de diretores e um de professores de estabelecimentos de ensino técnico comercial; um representante dos diretores e um de professores de estabelecimentos de ensino técnico industrial; um representante de diretores e um de professores de ensino agrícola; um representante de diretores e um de professores de fundações que se dediquem ao ensino e um assistente social ( MATO GROSSO. CEE, 1996, p. 15). No mesmo ano, a composição do Conselho é alterada pela lei 1.922/63, passando de 27 para 11 membros, divididos em duas câmaras: 1-Câmara de Ensino Primário - um representante de diretores de estabelecimentos estaduais; dois representantes de ensino particular e municipal.2- Câmara de Ensino Médio e Superior- dois representantes de professores de ensino médio particular; dois professores de ensino público estadual; dois professores representantes de ensino profissionalizante; dois professores representantes de ensino superior (MATO GROSSO. CEE, 1996, p. 17). A partir da nova composição com representantes apenas de segmentos ligados à educação, certamente os embates de forças políticas no interior do Conselho praticamente inexistiam. O órgão continua sendo de governo e voltado aos interesses políticos. Não se pode esquecer que nesse período interesses capitalistas permeavam por toda parte e a indicação de nomes pode ter sido estratégica. 106 um desafio ao poder público Com essa Lei são mantidas as competências16 do Conselho e também o seu caráter consultivo e deliberativo constantes da Lei anterior. A Secretaria de Estado de Educação é incumbida de zelar e fazer cumprir as decisões do Conselho. A partir de 1968, a Lei Estadual nº 2.821, de 14 de março de 1968, estabelece que o Conselho Estadual de Educação, órgão Colegiado, normativo, planificador e orientador das atividades educacionais no Estado de Mato Grosso, exercerá as atribuições constantes da Lei n. 4.024/68 além das estabelecidas em legislação especial. Essa Lei deixa claro em seu art. 8º, inciso I, que nenhum estabelecimento de ensino do sistema estadual de ensino poderá funcionar sem autorização do Conselho Estadual de Educação sob pena de nulidade de todos os atos escolares. O Conselho então fortalecido com essa competência começa a estabelecer normas e a deliberar sobre assuntos educacionais, mas suas decisões são vinculadas à homologação do Secretário de Educação Cultura17 do Estado. Nota-se que houve, a partir desse momento, alteração nas funções políticas do órgão. Em 22 de novembro desse mesmo ano, o Conselho Estadual de Educação-CEE/MT, fixa normas para autorização de 16 Entre as competências atribuídas ao CEE/MT, pelo art. 6º, da referida Lei, podem ser destacados como mecanismos de controle da oferta do ensino: a) Decidir sobre o funcionamento das escolas de ensino primário, médio, estaduais, municipais e particulares, seus métodos e períodos escolares próprios, respeitada a legislação federal em vigor; b) opinar sobre a incorporação de escolas, de nível superior, respeitada a legislação federal em vigor; c) opinar sobre a incorporação de escolas de graus primários e médio ao sistema público estadual de ensino, após verificação da existência de recursos orçamentários; d) decidir sobre o reconhecimento de estabelecimentos de ensino médio, mediante apresentação de seu regimento interno depois de um prazo de funcionamento regular de no mínimo três anos, respeitada a legislação federal em vigor. ( MATO GROSSO. CEE, 1996, p,16). 17 Nesse momento, a Secretaria de Educação e Cultura já havia sido desmembrada da Saúde. O desmembramento ocorreu em 19 de dezembro de 1963, pela lei 2.090/63. 107 Escolas irregulares: funcionamento das escolas primárias estaduais, através da Resolução nº 49/68-CEE/MT. Essa Resolução possui apenas dois artigos sendo o primeiro para o estabelecimento de critérios para o pedido de autorização os quais não vão além do número de alunos, qualificação de professores, equipamentos e cumprimento de calendário escolar. O segundo artigo revoga as disposições em contrário. É uma norma pouco exigente, não estabelece prazos dos atos e é específica para escolas públicas estaduais. Nota-se que havia uma prática secular no Estado de autorizar somente as escolas particulares e inspecionar as públicas como já foi dito no início deste capítulo. A partir da Lei 4.024/61, os Conselhos de Educação receberam a competência de autorizar e reconhecer as escolas dos seus sistemas de ensino e, no Estado de Mato Grosso, o Conselho Estadual de Educação, a partir de 1968, passou a autorizar também as escolas públicas. Seria essa uma exigência necessária apenas, às escolas privadas? O poder público após criar uma escola necessitaria autorizar o seu funcionamento? Dez anos após a sua criação, o CEE/MT passa a desempenhar funções nos níveis de decisão superior,18 de administração central e de prestação de serviços educacionais. Estabelece a Resolução 039/76, de 17 de dezembro de 1976, que fixa normas para a reorganização, autorização de funcionamento, reconhecimento e registro de estabelecimentos de 1º e 2º graus do sistema estadual de ensino, nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 5.692/71. A Resolução acima, alterada pela Resolução nº 58, de 06 de julho de 1977, constitui-se em norma única para todas as escolas públicas e privadas de 1º e 2º graus do sistema estadual de ensino, porém é bem mais exigente que a anterior. Estabelece um prazo de cento e vinte dias, antes do início 18 108 Por decisão superior pode ser entendida a responsabilidade do Estado que deverá atuar através dos colegiados de educação, de cultura e de desporto e do titular da pasta de Educação e Cultura. Por administração central a Secretaria de Educação e Cultura. E por prestação de serviços educacionais, as entidades executoras-escolas. (LEI nº 3.407, de 22 de outubro de 1973, Art. 4º a 7º). um desafio ao poder público das atividades escolares para a entrega dos pedidos de autorização nas Delegacias Regionais de Educação e Cultura; fixa o prazo de dois anos para a validade dos atos de autorização; declara que não serão válidos os atos escolares praticados em estabelecimentos de ensino antes da autorização para o seu funcionamento; estabelece que o reconhecimento dos cursos é considerado uma autorização definitiva formalizada por ato do Secretário de Estado de Educação e Cultura, mediante Parecer Favorável do Conselho Estadual de Educação. Como critérios para a concessão do ato de autorização, a Resolução 039/76-CEE/MT inclui, entre outros, a comprovação da idoneidade moral, sanidade física e mental dos dirigentes; obrigações eleitorais e militares em dia, atestado de residência e folha corrida dos dirigentes fazendo, dessa forma, uma seleção mais rígida dos interessados em oferecer o ensino, o que foi salutar para a educação. Essa norma nada exige da entidade mantenedora, pessoa jurídica, porém segue a determinações da Lei nº 5.692/71 vigente. A partir dessa Resolução, os cursos são autorizados por dois anos e após o prazo de validade do ato de autorização são reconhecidos definitivamente mediante solicitação dos mantenedores: Secretaria de Educação e Cultura no caso de escolas estaduais, Prefeituras Municipais no caso de escolas municipais e responsáveis pelas pessoas jurídicas quando escolas particulares. Embora a norma acima citada estabeleça que não serão válidos os atos escolares praticados em estabelecimentos de ensino, antes da autorização para seu funcionamento, há nos arquivos do Conselho, atos posteriores emanados por ele, como as Resoluções 079/82; 082/83; 086/83, que concedem validação de estudos. A Resolução 079/82 declara regularidade dos estudos levados a efeito por uma escola da rede particular de ensino que funcionou sem o ato de autorização durante dez anos, de 1972 a 1982. Isso comprova que a oferta de cursos irregulares não é um assunto novo no Estado, mas uma prática exercida pelas escolas desde o período imperial, como já foi dito e mais freqüentemente nos últimos 30 anos. 109 Escolas irregulares: A estrutura do CEE/MT é alterada pelos Decretos 2.045/ 74, 655/80, 154/83/ 3110/91 e 2.423/92, porém sem grandes modificações com relação ao controle da oferta do ensino. Segundo consta em Mato Grosso. CEE (1996, p. 31) no período de 1980-1990, devido ao processo migratório vertiginoso no Estado, a demanda estudantil em todas as etapas de ensino, em especial no ensino fundamental, cresceu consideravelmente, o que forçou a Secretaria de Educação e Cultura a adotar medidas emergenciais para a organização da realidade conjuntural. Contudo, essas medidas não foram suficientes para conter o desencadeamento de entraves legais e pedagógicos que forçaram a ação emergente por parte do sistema estadual de ensino. Esses entraves referiam-se: ao volumoso número de processos de autorização no interior do órgão; reduzido número de pessoal para o trabalho de inspeção; morosidade no repasse de recursos financeiros; alto índice de criação de escolas públicas; novos cursos e escolas particulares, inclusive clandestinas; escolas irregulares que não podiam expedir certificados e diplomas e, conseqüentemente, acarretando dificuldades de acesso dos alunos ao ensino superior e aos concursos públicos. Diante da situação conflituosa, o Conselho Estadual de Educação fixa norma para a autorização de funcionamento e reconhecimento de estabelecimentos de ensino já que a Resolução nº 39/76- CEE/MT não mais atende a realidade. A Secretaria de Estado de Educação, naquele momento, através da Coordenadoria Técnica de Educação e Superintendências Regionais envida esforços para supervisionar todas as escolas do sistema estadual de ensino no intuito de minimizar o problema. Ainda, na mesma obra, está evidenciado que do firme propósito de regularização das escolas e das prioridades apontadas pelos reclamos da sociedade resultam além de diversas indicações e pareceres, as Resoluções: 163/90, específica para o funcionamento de escolas particulares; 330/92 que dispõe sobre a criação, Nova Denominação e Elevação de Nível das Escolas da rede pública e municipal e estadual e a Resolução 331/92 que revê e consolida dispositivos referentes às normas 110 um desafio ao poder público para autorização de funcionamento e reconhecimento de estabelecimentos de ensino da rede pública estadual e municipal. Como se percebe, a Resolução nº 039/76 permanece vigente por quatorze anos como norma única para todas as escolas do sistema estadual de ensino. Somente em 1990, surge a Resolução 163/90/CEE /MT, de 11 de dezembro de 1990, que fixa normas específicas para as escolas da rede particular de 1º e 2º graus regular, supletivo e de educação pré- escolar no sistema de ensino do Estado de Mato Grosso e dá tratamento diferenciado às escolas públicas e privadas. As escolas da rede pública continuam orientando-se pela Resolução 039/76-CEE/MT até o advento da Resolução 330/92 e 331/92-CEE /MT. Com a Resolução 163/90-CEE/MT, os pedidos de autorização continuam sendo feitos pelas mantenedoras e os critérios19 são mais exigentes que os estabelecidos na norma anterior. O prazo de vigência do ato de autorização continua de dois anos, podendo ser prorrogado por mais dois e o reconhecimento passa a ter validade por 04 anos. Esta Resolução declara, como a norma anterior, que os atos praticados pela escola depois de expirado o prazo de autorização serão considerados nulos, cabendo responsabilidade aos dirigentes e mantenedores. Novamente o Conselho Estadual de Educação descumpre sua própria norma e concede validação de estudos em atos posteriores como as Resoluções 05/91; 06/91; 028/ 93 e outras que se encontram em seus arquivos. Até o início de 1993, o Conselho utilizava-se da prática de emitir Resoluções específicas20 para declarar regularidade de estudos. A partir daí, 19 Os critérios estabelecidos para abertura de escolas foram estendidos aos mantenedores que deveriam, entre outros: comprovar a condição jurídica da mantenedora devidamente registrada em cartório; a capacidade econômica-financeira da mantenedora mediante declaração da existência de patrimônio próprio, descrição do imóvel e ainda a comprovação de sua regularidade fiscal e para fiscal. 20 Resoluções específicas são atos emitidos pelo CEE/MT não para autorizar o funcionamento dos cursos, mas apenas para validar os estudos realizados em um determinado período. 111 Escolas irregulares: cresce o número de solicitações de autorização e reconhecimento com pedidos de validação de estudos concomitantemente e o órgão passa a declarar validade dos atos na própria Resolução de autorização ou Portaria de reconhecimento. A partir da Resolução 163/90, todas as escolas da rede particular são obrigadas a se adaptarem às novas normas, encaminhando processos de autorização ou reconhecimento dos cursos em funcionamento. As que possuíam processo em tramitação no Conselho foram contempladas por atos emergenciais21 como os Pareceres 193/91/CEE e 194/ 91/CEE, arquivados no CEE/MT, que regularizam a situação dos cursos oferecidos. Quanto às escolas das redes pública estadual e municipal que funcionavam na época com base apenas no ato de criação, sem o ato, ou somente autorizada sem o reconhecimento, houve consenso em 1992, entre a Secretaria de Estado de Educação e Conselho Estadual de Educação para a realização de um gigantesco mutirão e novas medidas emergenciais são baixadas pelo Secretário de Estado de Educação. As Portarias 873/92, 3.273/92 e 3.277/92, in: Mato Grosso. CEE, 1996, p. 34, concederam autorização ou reconhecimento dos cursos oferecidos pelas 4.478 escolas que estavam em situação irregular. A partir do empenho conjunto CEE /MT e SEE /MT, que resultou na legalização massiva das escolas, as Superintendências Regionais de Educação através de suas Divisões Técnico-Pedagógica e Administrativa procuram supervisionar os cursos oferecidos para mantê-los legalizados visto que os atos de autorização são emitidos por tempo determinado. Mais uma vez os entraves burocráticos, financeiros e administrativos dificultam um trabalho eficaz, os atos começam a vencer, 21 112 Esses Atos emergenciais foram Pareceres, Resoluções e Portarias de autorização e reconhecimento de cursos, emitidos para solucionar problemas relacionados à legalização de escolas para regularização de vida escolar dos alunos que não podiam esperar o trâmite normal dos processos. um desafio ao poder público a inspeção não é suficiente, providências não são tomadas e as escolas voltam a oferecer cursos irregulares. É oportuno lembrar também, que a Secretaria de Estado de Educação e Prefeituras Municipais de Educação foram responsáveis pelos pedidos de autorização e reconhecimento de cursos, oferecidos pelas escolas mantidas por elas durante o período de 1976 a 1991 e que, a partir de 1992, os pedidos de autorização e reconhecimento de cursos das escolas da rede pública estadual e municipal, passam a ser feitos pelos dirigentes das próprias escolas. Em 1992, a estrutura organizacional do Conselho Estadual de Educação é alterada pelo Decreto nº 2.423, de 23 de dezembro de 1992 e sua composição, conforme o Art.1º, §1º, passa a ser : 18(dezoito) membros titulares e 6 (seis) suplentes, nomeados pelo Governador do Estado, escolhidos entre pessoas de notório saber e experiência em matéria de educação, que representem as regiões geo-educacionais do Estado, os diversos níveis de ensino e o magistério público e particular, com mandatos de seis anos, mediante lista tríplice elaborada pelo Conselho Estadual de Educação (MATO GROSSO. CEE, 1996, p. 18). É interessante observar que essa Lei não estabelece quem são os representantes do CEE/MT, como as anteriores. Deixa a cargo do próprio Conselho a escolha de seus membros através de lista tríplice. Isso demonstra um desvio dos rumos tomados até então pela Secretaria de Educação que, nesse momento, luta pela implantação da gestão democrática da educação no Estado como já foi dito. A indicação de nomes pelo próprio Conselho poderia estar imbuída de interesses políticos ou mesmo particulares. Naquele momento, houve um corte na forma democrática de composição que vinha garantindo a participação de alguns poucos segmentos sociais, embora ligados ao governo. 113 Escolas irregulares: Contudo, o Conselho continua a estabelecer normas e a Resolução 163/90/CEE/MT, referente à autorização e reconhecimento dos cursos das escolas da rede particular de ensino, vigente por apenas três anos, é substituída pela Resolução nº 120/93-CEE /MT. Dessa vez, ampliam-se as exigências para a concessão do ato de autorização e reconhecimento dos cursos. Os aspectos administrativos, pedagógicos e condições da mantenedora passam a ser observados com maior rigor. Para as mantenedoras são exigidas, entre outros documentos, as certidões negativas de débitos em órgãos públicos, certificados ou declarações de regularidade fiscal e parafiscal das esferas federal, estadual e municipal, protestos de títulos (pessoa jurídica), certidões negativas da Justiça Federal e Estadual e protesto de títulos dos dirigentes (pessoa física). A inclusão dos documentos acima mencionados provoca um atraso considerável no encaminhamento de processos de autorização e reconhecimento de cursos pelas mantenedoras de instituições particulares que não conseguem obtê-los quando possuem débitos junto aos órgãos públicos. Não os obtendo, funcionam com os atos vencidos passando a ser irregulares perante o Conselho Estadual de Educação e causando problemas a um elevado número de alunos. O Conselho Estadual de Educação ao adotar tais medidas procurou seguir as determinações e o espírito protetor das leis educacionais nº 4.024/61 e 5692/71 já mencionadas anteriormente. Esse procedimento pode ter sido adotado para garantir a oferta do ensino pelo poder público e iniciativa privada por mantenedores e dirigentes idôneos moral e profissionalmente e, ainda, financeiramente estruturados. Mas, é importante registrar que a exigência dos documentos mencionados, a partir de 1990 não impediu que muitas instituições educacionais fossem constituídas sem estrutura consistente para funcionarem. Nos anos subseqüentes, foi visível neste Estado a inviabilidade financeira com que muitas empresas funcionavam e muitas, simplesmente, cerraram suas portas sem regularização junto ao CEE/MT deixando centenas de alu114 um desafio ao poder público nos em prejuízo. Isso mostra que o estabelecimento de normas mais exigentes não contribuiu para minimizar o problema da oferta irregular da educação escolar básica no Estado. Outro aspecto que merece destaque na Resolução 120/93/CEE /MT que permaneceu vigente por 08 anos, é que os prazos de vigência dos atos de autorização continuam temporários, mas os de reconhecimento voltam a ser concedidos por tempo indeterminado. Como se vê, essa norma traz pseudo-avanços com relação às anteriores no sentido de tentar coibir a oferta da educação escolar básica por mantenedores inidôneos ou desestruturados financeiramente. Ela dificulta o processo de abertura de escolas pela iniciativa privada com a intenção de garantir o ensino regularizado e de melhor qualidade à população, mas não impede o funcionamento de escolas irregulares. O que houve, a partir de então, foi um aumento significativo de escolas ofertando cursos irregulares. Para solucionar o problema dos alunos envolvidos que cobram providências, o Conselho continua concedendo validações de estudos, crescentemente chegando a declarar validade de estudos em 100% dos atos referentes ao reconhecimento de cursos, emitidos no ano 2000, conforme consta no capítulo terceiro. Esse procedimento contraria suas próprias normas, mas diante das necessidades e pressões da sociedade não resta outro posicionamento senão emitir pareceres em favor do aluno quando os estudos podem ser comprovados e quando os mínimos estabelecidos por lei são atingidos. Isso pode indicar a necessidade de uma nova política de controle ou de novo formato de normas. A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que traça novos rumos à educação nacional atribui aos órgãos e instituições dos sistemas de ensino dos Estados e do Distrito Federal, entre outras, a competência de autorizar, reconhecer, credenciar, supervisionar e avaliar respectivamente os cursos das instituições de educação superior e os estabelecimentos de ensino. 115 Escolas irregulares: O Estado de Mato Grosso promulga, então, a Lei Complementar nº 49/98, que dispõe sobre a instituição do Sistema Estadual de Ensino que foi alterada um ano depois pela Lei Complementar nº 57, de 22 de janeiro de 1999 e no ano seguinte pela Lei nº 77, de 13 de dezembro de 2000. Essa Lei não reorganiza o sistema instituído em 1968, mas sim dispõe sobre a sua “instituição” nos termos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. A partir de então, o Sistema Estadual de Ensino passa a ser constituído conforme o art. 23, I-VIII da mencionada Lei: I- instituições de educação de todos os níveis, criadas e mantidas pelo Poder Público Estadual; II- instituições de Educação Superior mantidas pelo Poder Público Municipal; III- instituições de Ensino Fundamental e Médio, criadas e mantidas pela iniciativa privada; IV- Secretaria de Estado de Educação; V- Conselho Estadual de Educação; VI- Fórum Estadual de Educação; VII- instituições de Educação Básica criadas e mantidas pelo Poder Público Municipal, nos Municípios que não criaram seu próprio sistema; VIII- as instituições de Educação Infantil criadas e mantidas pela iniciativa particular, nos Municípios que não criaram seu próprio sistema (MATO GROSSO. SEDUC, 2002, p. 25-26). É oportuno registrar que o sistema estadual de ensino de Mato Grosso fica menor a partir de 1998, visto que criaram seus sistemas de ensino os Municípios de Barra do Garças-MT (1998), Tangará de Serra - MT ( 1998). Outros Municípios como Várzea Grande, São José do Rio Claro e Cuiabá manifestaram o desejo de se emanciparem, mas até o término da coleta de dados para a pesquisa não o haviam realizado. 116 um desafio ao poder público Os procedimentos adotados pelos Conselhos Municipais de Educação dos municípios que instituíram seus sistemas de ensino com relação ao problema em pauta não faz parte dos objetivos deste trabalho, mas os presidentes contribuíram com a pesquisa, enviando as normas emanadas e sugestões explicitadas no capítulo terceiro. A lei acima, com suas respectivas alterações, estabelece que a administração geral do sistema estadual de ensino será exercida pela Secretaria de Estado de Educação, Conselho Estadual de Educação e pelo Fórum Estadual de Educação. Define a Secretaria de Estado de Educação como o órgão executivo com atribuições de planejamento, coordenação, execução, administração, supervisão, fiscalização, avaliação e outras definidas em lei própria (art. 30). O Conselho Estadual de Educação, nesta Lei, é definido como “órgão colegiado de caráter normativo, deliberativo e órgão de Assessoramento Superior da Secretaria de Estado de Educação, com representação paritária entre Governo do Estado e entidade da sociedade civil organizada.” (MATO GROSSO. SEDUC, 2002, p. 28) O Fórum Estadual de Educação, segundo o Art. 48, da Lei 49/98, deverá ser promovido e convocado em primeira reunião pela Secretaria de Estado de Educação, pelo Conselho Estadual de Educação, pela Comissão de Educação da Assembléia Legislativa, pelo Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública, pela Associação Mato-Grossense de Estudantes e pela União dos Dirigentes Municipais de Educação-UNDIME-MT. O Fórum Estadual de Educação, integrado por representantes indicados pelos diversos segmentos educacionais da sociedade mato-grossense através de suas respectivas entidades estaduais, é o organismo encarregado de promover trienalmente a Conferência Estadual de Educação e deve propor as diretrizes e prioridades para a formulação da Política Pública Estadual de Educação na perspectiva da valorização do ensino público. Com essa Lei, pode-se perceber uma evolução com relação ao caráter democrático e aberto da administração da 117 Escolas irregulares: educação. A instituição do Fórum, como um ente também responsável pela administração da educação no Estado, abre as portas à sociedade e oportuniza a participação de outros atores na condução dos assuntos educacionais e inclusive do controle. Nos termos da Lei Complementar 49/98, com as respectivas alterações, o Conselho Estadual de Mato Grosso-CEE/ MT, reestrutura-se em Câmara de Educação Básica, Câmara de Ensino Superior e Comissões Específicas a serem definidas em seu Regimento, espelhando-se na organização do Conselho Nacional de Educação ganha algumas competências voltadas à elaboração, acompanhamento e avaliação da Política Educacional do Estado e outras de ordem operacional, voltadas ao funcionamento de escolas do Sistema Estadual de Ensino. O Conselho Estadual de Educação passa, a partir de então, a ser constituído com a representação paritária entre o governo do Estado e entidades da sociedade civil organizada sendo 22 membros e respectivos suplentes divididos em duas Câmaras: de Educação Básica e Câmara de Ensino Superior e ainda Comissões a serem definidas em seu Regimento. Nesse Conselho, o Presidente é eleito democraticamente por seus pares, o que significa avanço e maior liberdade nas tomadas de decisões. Merece registro também a abertura que se deu a alguns segmentos da sociedade para comporem as Câmaras do Conselho Estadual de Educação, com a indicação de 01 representante para o cargo de Conselheiro titular e 01suplente. A Câmara de Educação Básica e de Ensino Superior, conforme o Art. 36 da Lei acima, são constituídas, cada uma, por 11 (onze) Conselheiros e respectivos suplentes e são presididas por um de seus pares eleito para um mandato de dois anos, permitida a sua recondução imediata. O § 1º do artigo acima estabelece que deverá haver, necessariamente, um representante dos seguintes segmentos: Câmara de Educação Básica: Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública Básica; Dirigentes de estabeleci118 um desafio ao poder público mentos de ensino privado; Secretários Municipais de Educação; Educação Indígena; Conselho da Criança e do Adolescente; Pais de alunos da Educação Básica; Alunos da Educação Básica; Federações empresariais; Centrais Sindicais dos Trabalhadores; Educação Especial; Secretaria de Estado de Educação (MATO GROSSO. SEDUC, 2002, p. 30). Na Câmara de Ensino Superior: Universidades Públicas; Universidades Privadas; Instituições Públicas Isoladas de Ensino; Instituições Superiores Privadas de Ensino; Sindicato dos Trabalhadores de Educação Superior; Alunos Universitários; Comunidade Científica e Cultural; Federações Empresariais; Centrais Sindicais dos Trabalhadores; Conselhos de Classe; Secretaria de Estado de Educação (Ibidem, p. 31). A nova estrutura do Conselho Estadual de Educação e principalmente a sua nova forma de composição, é marcada por uma grande diferença: representantes não indicados somente pelo governo. Pela primeira vez, o Conselho foi estruturado de forma a permitir ser o órgão mediador entre o governo e a sociedade, avanço este que merece ser registrado em sua história. A participação da sociedade poderá contribuir para que o órgão consiga abandonar muitas práticas profundamente enraizadas e que foram arrastadas ao longo dos anos. O Conselho está pronto para contribuir na gestão democrática do ensino e para enxergar os problemas educacionais não somente com os olhos do governo, mas com os múltiplos olhares dos diversos segmentos sociais, juntamente com a SEDUC/MT e Fórum Estadual. Isso pode trazer muitos avanços, além de soluções mais eficazes para os problemas educacionais do Estado. 119 Escolas irregulares: Bordignon (2000) fez um estudo sobre a natureza dos conselhos de educação, procurando reconstituir a trajetória histórica e a atuação desses órgãos nos respectivos sistemas de ensino e ainda analisar a natureza e o papel que lhes cabe hoje cumprir. Seu estudo culmina numa proposta de nova dinâmica de funcionamento do Conselho de Educação do Distrito Federal que pode ser objeto de reflexão para outros conselhos. Para ele, os conselhos de educação são os mediadores entre governo e sociedade e responsáveis pela garantia da continuidade das políticas públicas e sobre o assunto assim se expressa através do Parecer n. 143/02: Em seu papel mediador entre a sociedade e o governo, os conselhos, fiéis à sua função de Estado, não podem querer constituir-se na síntese da vontade da sociedade, dada a impossibilidade da síntese no contraditório social e uma vez que a “ totalidade poderia vir a ser totalitarismo”. Precisam aceitar as diferença, trabalhar no contraditório, sem cair na armadilha de pretender reduzir a vontade da sociedade à do governo, ou vice-versa ou, pior ainda, querer reduzir a vontade de ambos à sua própria, situando-se numa “terceira margem do rio”, desconectados tanto da sociedade, quanto do governo ( BRASÍLIA. PARECER 143-CEDF, 2002, p. 2). Nesse contexto, não é difícil perceber a crise pela qual estão passando os conselhos de educação. Não podem estar desconectados da sociedade e/ou do governo. Em meio a essa crise, esses órgãos podem pender para um dos lados e, portanto, toda atenção de seus membros é necessária para que não haja polarização. O Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso vive um momento extremamente rico nesse sentido, está tentando não ser a terceira margem do rio. A sua conexão com 120 um desafio ao poder público ambos os lados está sendo aos poucos estabelecida. Contudo, pode ser que esteja faltando um melhor ajuste no “plug” que o liga à sociedade para que possa receber as suas mensagens e, assim, mediar os interesses do governo e da sociedade, embora muito plural, em favor da oferta da educação básica regularizada à população. Com a nova composição e atribuições, o Conselho Estadual de Educação passa a rever as normas vigentes para adequá-las às exigências da LDB -Lei nº 9.394/96 e Lei Complementar nº 49/98, resultando em vários atos dos quais serão destacadas somente as normas atinentes ao controle da oferta do ensino pelo poder público e iniciativa privada. A Resolução nº 120/93-CEE/ MT que estabelecia normas para a autorização e reconhecimento dos cursos da educação básica, especificamente para as escolas da rede particular, em vigência desde 1993, e a Resolução 331/92 que estabelecia normas para a autorização e reconhecimento dos cursos da rede pública estadual e municipal, em vigência desde 1992, foram substituídas pela Resolução 118, de 24 de abril de 2001. Segundo a Resolução acima, vigente para todas as escolas públicas e privadas do sistema estadual de ensino até o término da pesquisa, uma escola pública tem a permissão para iniciar suas atividades a partir do ato de criação, porém o seu dirigente tem um prazo máximo de três meses para protocolar o processo solicitando a autorização de funcionamento ao CEE/ MT. É oportuno registrar que esse prazo é consideravelmente curto. As escolas não conseguem se organizar nesse período e obrigadas a atender a demanda, funcionam irregularmente. Uma escola particular, para iniciar suas atividades, depende do ato de autorização concedido pelo órgão competente. Portanto, a sua mantenedora ou representante legal deve providenciar o processo alguns meses antes do início do ano letivo e obter o ato de autorização do CEE/MT. Após o prazo estipulado no Ato de Autorização dos cursos, a escola deve buscar o reconhecimento dos respectivos cursos, o que confirma a autorização e a habilita para a continuidade da oferta, mas nem todos os mantenedores procedem conforme as normas. 121 Escolas irregulares: Os atos de autorização para as escolas do sistema estadual de ensino são emitidos com prazo estabelecido na legislação de ensino conforme a especificidade do curso, podendo ser de dois ou quatro anos e os atos de reconhecimento são renováveis a cada cinco anos. Tanto as escolas públicas como privadas devem buscar o reconhecimento dos cursos autorizados, no mínimo, cento e oitenta dias antes de expirar o prazo de vigência da autorização. Está claro na norma acima mencionada, que os atos praticados pelas escolas antes do ato de autorização ou após a vigência do prazo de autorização de funcionamento e/ou reconhecimento não serão válidos e os danos causados pela infração aos seus alunos serão de exclusiva responsabilidade dos dirigentes da entidade mantenedora pública ou privada. Mas, a prática da validação dos estudos para ressalvar a vida escolar dos alunos ainda continua presente. Percebe-se que o CEE/MT, com essa Resolução e na tentativa de avançar e garantir melhor qualidade à educação escolar pública e privada, volta a fixar norma única para as redes, municipal, estadual e particular como o fez em 1976, através a Resolução 039/76, vigente durante 14 anos. Retoma a prática do reconhecimento por tempo determinado, que havia sobrevivido durante o curto período de 1990 a 1993. Adota critérios mais rigorosos para a concessão dos atos legais e mantém a proposição de não considerar válidos os atos praticados pelas escolas irregulares, como o faz há mais de 30 anos. Todos esses procedimentos indicam a preocupação em garantir a educação escolar básica legalizada e de qualidade nas redes pública e privada, minimizando as diferenças entre uma rede e outra. Entretanto, a retomada da concessão do ato de reconhecimento com renovação a cada cinco anos provoca um aumento significativo de serviços no órgão e também para os órgãos afins. Isso tem dificultado o desempenho satisfatório de suas outras funções como, por exemplo, o atendimento ágil à população e contribui para que o número de escolas que oferecem cursos irregulares seja elevado, como está detalhado no terceiro capítulo. 122 um desafio ao poder público O órgão normativo do sistema estadual de ensino passa por momento histórico muito importante. Está em franca evolução, graças àqueles que nele se debruçam sem medir esforços, na tentativa de atender as exigências e expectativas da sociedade. Contudo, algumas reflexões podem ser oportunas: o rigor das normas tem contribuído para diminuir o número de escolas que oferecem cursos irregulares? O que garante a qualidade do ensino nas escolas públicas e particulares: o reconhecimento dos cursos oferecidos, periodicamente, ou um sistema de supervisão e acompanhamento constante por agentes locais em parceria com a sociedade? O reconhecimento dos cursos da educação básica é uma exigência da lei atual ou um atavismo das leis anteriores? É coerente o órgão exigir o cumprimento das normas e ele próprio descumprilas concedendo validação de estudos, mesmo em defesa do aluno? Essas questões precisam ser melhor refletidas e serão retomadas no terceiro capítulo. A Resolução 118/01 embora vise a garantia da oferta do ensino da melhor qualidade, dificulta, pelas razões já expostas, o processo de obtenção dos atos de autorização para funcionamento e reconhecimento de cursos oferecidos pelas escolas públicas e particulares. É uma norma feita para ser cumprida por escolas ideais. Com essa medida, espera-se garantir a oferta do ensino por mantenedores, em especial da iniciativa privada, mais estruturados financeiramente e idôneos moralmente, com vistas a evitar prejuízos à clientela e isso é salutar. No entanto, está claro que inclusão de maiores exigências para a abertura de escolas nas normas emanadas no período de 1990 a 2001 foi uma atitude protetora aos cidadãos, mas não garantiu a regularidade no funcionamento das escolas públicas e privadas. Ao contrário, o número de cursos irregulares aumentou gradativamente. Isso comprova que não é o estabelecimento de normas mais rígidas e exigentes que elimina a prática da oferta de cursos irregulares pelo poder público e iniciativa privada no Estado. A prática do descumprimento das normas relativas à autorização para o funcionamento de escolas públicas e pri123 Escolas irregulares: vadas existe neste Estado há aproximadamente cento e cinqüenta anos, porém tem se alastrado nas últimas décadas e todas as tentativas de solução, até o momento, foram paliativas como já foi dito anteriormente e está detalhado no terceiro capítulo. Algum outro caminho precisa ser encontrado. Sintetizando este capítulo, é fundamental que alguns pontos fiquem muito claros para facilitar o entendimento dos demais: 1- em 1834, as Assembléias Constituintes receberam a competência de legislar sobre a educação. No Estado de Mato Grosso, as Leis educacionais de 1.889 a 1.946 passaram a ser propostas pela Diretoria Geral da Instrução Pública e submetidas à aprovação da Assembléia. De 1.946 a 1.963, extinta a Diretoria Geral da Instrução Pública, o Conselho Estadual de Educação, por intermédio do Departamento de Educação, passou a sugerir ao governo as medidas necessárias para a eficiência do ensino. 2- o Estado de Mato Grosso, teve até a presente data, quatro conselhos de educação para auxiliar o governo na administração da educação escolar básica: o Conselho Literário (1873), o Conselho Superior da Instrução Pública (1989), o Conselho Estadual de Educação subordinado ao Departamento de Educação (1946) e o atual Conselho Estadual de Educação criado em (1963). Os três primeiros foram de caráter consultivo e deliberativo e o último, após várias alterações, de caráter consultivo, deliberativo, normativo e de assessoramento superior da Secretaria de Estado de Educação. Somente a partir de 1968, o Estado de Mato Grosso teve o seu sistema de ensino instituído por lei. 3- neste Estado o serviço de inspeção escolar foi desenvolvido da seguinte forma: pela Diretoria da Instrução Primária, através de inspetores para cada paróquia, no período de 1837 a 1890, pela Diretoria Geral da Instrução Pública, 124 um desafio ao poder público por meio de inspetores escolares no período de 1891 a 1946; pelo Departamento de Educação de 1947 a 1953, com auxílio de inspetores regionais do ensino primário; pela Secretaria de Educação de 1953 até 1995, por intermédio de inspetores regionais que receberam diversas denominações e, a partir de 1995, a Secretaria de Estado de Educação altera a prática de inspeção regionalizada utilizada durante meio século por um serviço de orientação, acompanhamento e assessoramento às unidades escolares por meio de Assessorias Pedagógicas instaladas nos municípios. 4- a prática da concessão da autorização do governo para a oferta da educação escolar para a iniciativa privada foi instaurada neste Estado em 1875. A escola pública não necessitava de autorização para funcionar, era apenas criada e inspecionada. Essa prática foi suspensa por alguns anos, retomada em 1927 e fortalecida a partir de 1968 por força de lei, quando o funcionamento de escolas públicas e privadas passou a depender de autorização do CEE/MT. A partir de 1976, os cursos da educação básica das escolas públicas e privadas, além de autorizados, passaram a ser também reconhecidos pelo Conselho Estadual de Educação-CEE/MT. 5- as primeiras normas que regulamentaram a educação escolar básica foram elaboradas no período imperial quando a Província de Mato Grosso possuía um reduzido número de escolas. Desde então, a elaboração de uma norma sempre teve como base a anterior, fazendo com que as matrizes fossem trazidas uma após outra para o período republicano, fazendo perpetuar o caráter impositivo, corretivo e autocrático e, ainda, os critérios tidos como ideais a serem atingidos por todas as escolas do sistema estadual de ensino, desconsiderando as diversidades locais e regionais. 6- o poder público, desde o período imperial, exerceu o controle da oferta da educação escolar por meio de normas e mecanismos de fiscalização, mas ao longo de quase 125 Escolas irregulares: dois séculos observa-se que a cultura do descumprimento às normas educacionais sempre esteve presente. Nesse período, escolas já eram fechadas por funcionarem sem a autorização do governo ou por infringirem as normas estabelecidas. Em toda a história do órgão normativo e executivo do sistema estadual de ensino verifica-se a presença de escolas irregulares. 7- na última década, foi visível o esforço do colegiado do Conselho Estadual de Educação para alterar a norma pertinente, com vistas a atender satisfatoriamente aos anseios da sociedade. Algumas audiências públicas começaram a se realizar, embora timidamente. As minutas de Resoluções normativas, feitas por uma comissão, passaram a ser levadas para discussão ao Colegiado e aos segmentos de interesse. A sociedade começa, então, a participar da elaboração das normas e isso é um avanço que merece registro na história do CEE/MT. Entretanto, as normas continuam sendo feitas para as escolas ideais e, as poucas que conseguem cumprem-nas, mas a maioria, principalmente as públicas, fica à margem de todo o processo e funcionam segundo suas possibilidades, muitas vezes, fazendo acontecer o ensino razoavelmente bom, mas permanecendo como instituições irregulares perante o órgão normatizador por não conseguirem atender todos os requisitos estabelecidos nas normas. Enfim, o controle por meio de normas e supervisão, historicamente exercido pelo poder público, ora de forma centralizada, descentralizada, regionalizada ou local; ora de forma rigorosa ou flexível, com maior ou menor número de agentes fiscalizadores, às vezes avançando, outras, retrocedendo não tem conseguido impedir a proliferação da oferta de cursos irregulares. Escolas infratoras sobrevivem nestes dois séculos e o problema se intensificou nos últimos dez anos. Está evidente que algum outro caminho precisa ser encontrado. Visando trazer subsídios aos órgãos responsáveis pela educação no Estado de Mato Grosso, o próximo capítulo detalha a dimensão do problema no Estado. 126 um desafio ao poder público Este capítulo aborda a situação de legalidade das instituições escolares públicas e privadas do sistema estadual de ensino de Mato Grosso. Essa abordagem tem como ponto de partida a forma de cadastro das escolas no Conselho Estadual de Educação com vistas a dimensionar o problema no Estado. A oferta irregular da educação escolar básica por um número considerável de instituições públicas e privadas tem sido um dos fatores determinantes dos rumos e procedimentos dos órgãos normativo e executivo do sistema estadual de ensino neste Estado. Não há como analisar o problema sem observar onde estão fincadas suas raízes. Elas podem trazer nutrientes de outros locais e de outros tempos e com elas influências e hábitos internalizados que dificultam as mudanças. 1 Como são cadastradas as escolas do Sistema Estadual de Ensino no Conselho Estadual de Educação No Conselho Estadual de Educação, as escolas são cadastradas no momento em que a solicitação de autorização para a oferta dos cursos, feita através de processos, é deferida 127 Escolas irregulares: mediante Resolução publicada em Diário Oficial do Estado. Os processos nem sempre são encaminhados imediatamente à criação da escola ou implantação de um curso ao CEE/MT. Muitos permanecem, por vários meses, tramitando em outro órgão e alguns, somente são enviados muito tempo depois do início de funcionamento da escola. Algumas escolas públicas e privadas são desativadas simplesmente sem nenhuma comunicação ao CEE/MT e isso também contribui para que os números existentes não sejam reais. A desativação parcial ou total das atividades dos estabelecimentos de ensino públicos ou privados precisa ser efetivada por meio de processos, instruídos conforme as determinações legais, mas não tem sido essa a prática de muitos mantenedores e dirigentes escolares. Pode-se dizer, portanto, que os dados do CEE/MT são confiáveis em relação à situação de legalidade dos cursos oferecidos pelas escolas, mas não em termos de números de escolas e cursos existentes no Estado. Na Secretaria de Estado de Educação, as escolas são cadastradas quando são criadas e quando respondem ao Censo Escolar exigido pelo MEC anualmente. Toda escola pública, ao responder ao Censo Escolar, recebe um código que constitui a sua matrícula no MEC para fins de recebimento de recursos financeiros do Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental -FUNDEF. De acordo com o § 1º e 4º do Art. 2º da Lei nº 9.424, de 24 de dezembro de 1996, que dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério -FUNDEF, a distribuição dos recursos financeiros, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, é feita entre o Governo Estadual e os Governos Municipais na proporção do número de alunos matriculados anualmente nas escolas cadastradas das respectivas redes de ensino. Pode-se dizer então, que os dados da Secretaria de Estado de Educação obtidos anualmente através do Censo Escolar são confiáveis em termos de número de escolas públi128 um desafio ao poder público cas existentes, uma vez que não responder ao Censo significa perda de recursos financeiros e isso não é interessante nem para o Estado e nem para os Municípios. Mas não se pode dizer que o número de escolas particulares apresentados pelo Censo escolar realizado até então no Estado de Mato Grosso seja o real, visto que nem todas as escolas particulares têm respondido os formulários encaminhados pela Secretaria de Estado de Educação. Embora a Portaria nº 177, de 05 de março de 1998/ MEC, em seu art. 5º, I, alínea “a” estabeleça aos diretores ou dirigentes de escolas da rede pública e privada entre outras a competência de receber e preencher os formulários, autenticálos com os dados pessoais exigidos enquanto responsável pelo Censo na sua área de atuação obedecendo às normas e ao prazo estabelecido, é visível que esse preceito legal não tem sido cumprido. Ramos explica essa situação: [...] Em todo o Estado de Mato Grosso estão cadastradas, no Conselho Estadual de Educação, 653 escolas particulares e, apenas 325 ou 49,7% responderam ao Censo Escolar 2000. Das 209 escolas particulares instaladas no Município de Cuiabá, cadastradas no Conselho Estadual de Educação, apenas 58 ou 28,0% encaminharam os formulários devidamente preenchidos. Só em Cuiabá, 151 escolas e não sabemos quantos alunos, ficaram excluídos dos números oficiais e, isso tem prejudicado alunos. Para que possam fazer a sua inscrição no Exame Nacional de Ensino Médio (ENEM) devem apresentar o código nacional de sua escola (2002, p. 3 A). Com referência à obrigatoriedade de resposta ao Censo Escolar anual pelas escolas privadas, foi consultado durante a pesquisa via E-Mail, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais-INEP e o retorno foi o seguinte: 129 Escolas irregulares: [...] Não há nenhum instrumento legal específico para o Censo Escolar para a punição de escolas privadas que não respondam ao Censo. Existe o Decreto nº 73.177, de 20 de novembro de 1973, que trata genericamente sobre obrigatoriedade da prestação de informações, inclusive com previsões de sanções para a não prestação das informações. Como os sistemas de ensino estão sob a responsabilidade dos estados e municípios), cabe aos Conselhos Estaduais e em alguns casos, aos Conselhos Municipais de Educação, fazerem as gestões necessárias. Já tivemos conhecimento de alguns estados que tomaram providências nesse sentido. Em Goiás, por exemplo, a Secretaria de Educação, após reuniões com o sindicato de escolas particulares, expediu correspondência a todas as escolas privadas informando que após aquela data passaria a exigir o Censo Escolar preenchido e entregue para a renovação da autorização de funcionamento da escola privada(ednar@ inep.gov.br, de 6 de junho de 2001, p. 1). Como se vê, cabe aos Conselhos de Educação disciplinarem essa prática no âmbito de suas competências. O formulário do Censo Escolar 2000 enviado às escolas não expressa a preocupação com a legalidade dos cursos oferecidos. Em relação ao assunto, há apenas um item solicitando informações sobre atos legais da escola ou processos em tramitação. Esse dado é desconexo e insuficiente, visto que os atos legais são concedidos por etapa ou modalidade de ensino e não para a escola. Uma escola pode obter autorização para uma determinada etapa ou modalidade de ensino e oferecer outras sem autorização, o que é muito comum. O formulário do Censo Escolar poderia incluir 130 um desafio ao poder público os atos para cada curso. Isso facilitaria inclusive o controle da situação pelos Conselhos de Educação. Ramos (2002, p, 3.A), assim se expressa em relação à resposta ao Censo Escolar. Para o Conselho Estadual de Educação- MT, a resposta ao Censo Escolar não significa apenas o cumprimento de normas ou simplesmente o atendimento às solicitações do Ministério da Educação, mas sobretudo, uma contribuição das escolas para a manutenção de arquivos atualizados, com dados estatísticos que possibilitem o atendimento ágil e eficiente às solicitações da sociedade cada vez mais exigente. A coleta de informações e dados educacionais, como a de qualquer outra natureza, é necessária e útil quando utilizada em benefício da comunidade. A resposta ao Censo Escolar, portanto, antes de ser uma burocracia desnecessária ou o fortalecimento dos mecanismos de controle do MEC, deve ser entendida como um ato de cidadania e colaboração não só com os órgãos públicos, mas principalmente com a sociedade que, cada vez mais, necessita estar bem informada. A prática de responder ao Censo Escolar pelas escolas particulares poderá ser incorporada neste Estado a partir de um posicionamento do órgão normatizador do sistema estadual de ensino. Embora o número de escolas existentes fosse importante para a contextualização do problema, a situação de legalidade dos cursos oferecidos pelas escolas foi o ponto de interesse. Para tanto, foram utilizados os dados do Conselho Estadual de Educação. Esses dados não foram compatibilizados com os do Censo Escolar, visto que o Conselho, naquele momento, não possuía os recursos da informatização, o que demandaria um 131 Escolas irregulares: tempo considerável e extrapolaria os prazos estabelecidos para a pesquisa. Essa compatibilização, para ajustes, pode ser feita em outro momento para o benefício do próprio órgão. A tabela abaixo mostra o número de escolas existentes no Estado, segundo os dados coletados pelo Censo Escolar 2000 e os números constantes dos arquivos do Conselho Estadual de Educação, apenas para visualização das divergências nos números. Tabela 2 - Número de Escolas do Sistema Estadual de Ensino de Mato Grosso-Ano 2000- CEE/MT e Censo Escolar Dados obtidos nos arquivos do CEE/MT – setembro de 2001 e Censo Escolar 2000 Essas diferenças, causadas pelos motivos já expostos, evidenciam a necessidade do estabelecimento de um mecanismo de cooperação mútua entre o CEE/ MT e a SEDUC /MT, setor responsável pelos dados estatísticos, a fim de que os números sejam oficiais e, principalmente, verdadeiros nos dois órgãos. De posse dos números acima, seria necessário apurar o número de escolas irregulares em todo o Estado para se ter uma visão ampla do problema. Não sendo possível trabalhar manualmente com a totalidade dos dados, foi feito um levantamento apenas com os dados relativos às escolas estaduais e particulares que ofereceram alguma etapa da educação básica ou modalidade de ensino de forma irregular no ano 2000 e, para tal, foram utilizados os arquivos do Conselho Estadual de Educação. 132 um desafio ao poder público 2 Escolas Públicas Estaduais e PParticulares articulares em funcio funcio-namento irregular Para obter uma visão mais abrangente sobre o número de escolas públicas estaduais e particulares que ofereceram cursos irregulares no ano 2000, foi feito o seguinte levantamento segundo dados do Conselho Estadual de Educação. Tabela 3 - Número de Escolas Estaduais e Particulares que ofereceram alguma etapa da Educação Básica de forma irregular no ano 2000 no Estado de Mato Grosso Dados obtidos no Conselho Estadual de Educação/MT- Cadastro de Escolas no mês 10/01 A tabela deixa claro que a percentagem de escolas públicas estaduais irregulares é praticamente igual à das escolas particulares e isso indica que providências do poder público precisam ser tomadas com relação a ambas as redes. Os alunos que freqüentam cursos irregulares podem ter seus estudos invalidados pelo órgão competente. A falta do certificado de conclusão pode interferir na continuidade dos seus estudos e até na sua permanência no trabalho. No quinto capítulo está posto o levantamento do número de alunos que concluíram a terceira série do ensino médio em cursos irregulares no ano de 2000 no Município de Cuiabá- MT, apenas, para identificar o nº de envolvidos. Levantar esses dados relativos aos demais municípios do Estado seria necessário, mas, muito moroso e, portanto, pode ser objeto de outro trabalho no interior do órgão. 133 Escolas irregulares: Diante desses números, a pesquisa não poderia deixar de incluir um levantamento sobre os procedimentos do Conselho Estadual de Educação com relação ao assunto e, por iso foram levantados os números de atos normativos de autorização e reconhecimento de cursos que concederam validação de estudos nos anos 99 e 2000 para ressalvar a vida escolar dos alunos em questão. 3 PProcedimentos rocedimentos do Conselho Estadual de Educação para resguardar a vida escolar dos alunos nos anos 1999 e 2000 Para ressalvar os direitos dos alunos que estudaram nessas escolas, o Conselho Estadual de Educação, contrariando suas próprias normas, como já foi dito no segundo capítulo, tem utilizado, quando possível o mecanismo da validação dos estudos, após uma análise criteriosa das condições do curso oferecido. Os levantamentos realizados mostram que no ano 1999, foram expedidos pelo CEE/MT, 172 atos de autorizadas com maior rigor, algumas distorções foram corrigidas, mas não diminuíram o número de escolas irregulares. Por outro lado, a descentralização da fiscalização para as Assessorias Pedagógicas ou Secretarias Municipais de Educação foi valiosa em muitos aspectos, mas também não contribuiu para a diminuição da oferta de cursos irregulares. A intensificação crescente do problema pode indicar a necessidade de novas formas de elaboração de normas e também de novos mecanismos de fiscalização para as escolas. O Conselho Estadual de Educação, conforme já foi dito, substituiu no ano 2001 a norma que disciplinava a oferta da educação escolar básica. Mas essa norma contribuiu para um aumento considerável de serviços burocráticos nos órgãos responsáveis pelo sistema estadual de ensino e órgãos afins, visto que a partir dela as escolas passaram a montar periodi134 um desafio ao poder público camente processos solicitando a renovação do reconhecimento dos cursos que oferecem; as Assessorias Pedagógicas passaram a realizar incontáveis visitas, análises e relatórios de verificação prévia, porém sem estrutura para tal atribuição, muitas simplesmente não o fizeram; o Conselho Estadual de Educação passou a analisar, deferir ou indeferir inúmeros processos e os órgãos afins passaram a expedir certidões, laudos e outros documentos antes não exigidos. No entanto, o aumento de trabalhos burocráticos não foi apenas para o CEE/MT. Outros órgãos como as Prefeituras Municipais, não possuindo estrutura para tal atendimento, simplesmente deixaram de emitir os documentos solicitados pelas escolas o que acarretou atraso no encaminhamento dos processos ao CEE/MT e elevou a estatística de escolas e cursos irregulares. Para facilitar a compreensão do problema gerado em termos de serviços burocráticos, foi feito no Conselho Estadual de Educação, um outro levantamento com o objetivo de demonstrar o montante de cursos irregulares ofertados nas escolas matogrossenses. Esse levantamento mostra que 5.967 cursos foram reconhecidos por atos do CEE/MT, anteriores ao ano 2001, com prazos de vigência concedidos por tempo indeterminado e que, após a nova norma, esses atos precisariam de renovação no prazo de 01 ano para ajustes às novas exigências. Diante desses números, uma reflexão sobre algumas práticas atuais do Conselho é oportuna e questão da necessidade de reconhecimento dos cursos da educação básica, explicitada no primeiro capítulo, merece ser retomada. A incorporação do fim dessa prática, como já fizeram outros estados brasileiros, evitaria que os 5.967 processos fossem protocolados no Conselho Estadual de Educação. Por outro lado, as escolas, ao invés de providenciálos, poderiam canalizar toda a atenção ao pedagógico; as Assessorias Pedagógicas dos Municípios e Secretarias Municipais de Educação não precisariam analisar tantos processos, elaborar tantos Relatórios de Verificação Prévia; os órgãos afins não precisariam expedir inúmeras certidões, laudos, de135 Escolas irregulares: clarações; o Conselho não precisaria analisar cada processo e emitir os respectivos atos. O fim dessa prática pode significar uma economia de recursos materiais, financeiros e humanos, uma racionalização do trabalho. Enfim, os serviços burocráticos diminuiriam drasticamente no interior de vários órgãos afins e poderia permitir que os órgãos executivo e normativo do Sistema Estadual de Ensino planejassem melhor outras ações no sentido de administrar a educação numa perspectiva ampla, voltada para os interesses da comunidade e ao desenvolvimento da cidadania. Evidentemente, não se pode pensar em racionalização do trabalho ou na diminuição dos serviços internos dos órgãos educacionais e relegar as escolas à própria sorte. Não foi essa a intenção da pesquisa e tampouco o caminho para as soluções. O poder público tem obrigação de zelar pelo bom funcionamento das escolas e a educação escolar autorizada e de boa qualidade é um direito constitucional do cidadão. Apenas é preciso ressaltar que o reconhecimento dos cursos temporariamente e de forma cartorial não tem garantido o ensino de boa qualidade neste Estado. É uma prática que pode ser descartada sem prejuízo à população. Pode ser substituída pela prática do credenciamento das instituições. As exigências estabelecidas para o reconhecimento de cursos podem ser incluídas nos critérios para o credenciamento da instituição e outras para a autorização dos cursos. Cada escola, nessa perspectiva, encaminharia ao Conselho Estadual de Educação apenas 01 (um) processo de credenciamento e 01 (um) para a autorização dos cursos que oferece contendo o plano de curso de cada um. Se hoje o Estado possui aproximadamente 4.000 escolas em atividade não seriam necessários cerca de 16.000 processos de autorização de cursos ( Ed. Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e EJA 1º segmento, EJA 2º segmento e EJA Médio) e outros 16.000 de reconhecimento desses cursos, mas apenas 4.000 processos de credenciamento e 4.000 de autorização de cursos, o que reduz consideravelmente o número de processos de 32.000 para 8.000 sem prejuízo das exigências. 136 um desafio ao poder público A descentralização de algumas funções, hoje exercidas pelo órgão normativo, para o órgão executivo e a racionalização dos trabalhos no interior dos órgãos educacionais, tornase cada vez mais necessária diante do crescimento da população escolar e, sobretudo, para que o órgão normativo possa voltar suas atenções às políticas adotadas pelos governantes e aos interesses da sociedade. O Parecer nº 143/2002-CEDF de Bordignon ( 2002, p. 3 ) esclarece: Os conselhos de educação, fazendo parte da estrutura dos sistemas de ensino, têm função normativa e estratégica na gestão dos sistemas de ensino, conferindo às políticas públicas educacionais a continuidade do rumo do futuro e a representatividade da vontade plural da sociedade, para além da rotatividade dos dirigentes transitórios e suas vontades singulares. Como se vê ao Conselho, como órgão normativo do sistema estadual de ensino, cabe zelar pela normatização das questões educacionais e contribuir na elaboração das políticas públicas educacionais, garantindo os interesses da sociedade independentemente da rotatividade dos governantes. Bordignon diz ainda nesse mesmo documento: “Não faz sentido o Conselho definir a norma e ele mesmo cuidar de sua aplicação” (p. 7). Reflexões nesse sentido se fazem necessárias neste Estado. O modelo burocrático talvez interesse aos neoliberais que visam a manutenção do “status quo” ou o fortalecimento do poder econômico, mas esse modelo não mais condiz com a realidade. O Estado de Mato Grosso possui aproximadamente quatro mil escolas e a situação hoje, até pode ser controlada, mas é preciso lembrar que este Estado está em franco desenvolvimento e os números crescem a cada ano. Assim sendo, em pouco tempo a situação poderá se tornar insustentável. 137 Escolas irregulares: No Estado de Mato Grosso hoje, toda escola de educação básica do sistema estadual de ensino para autorizar ou reconhecer um curso deve elaborar um processo com base em Resolução específica e encaminhá-lo à Assessoria Pedagógica do seu Município ou para a Secretaria Municipal de Educação, caso não haja Assessoria Pedagógica no Município. Estas, visitam a escola e elaboram um Relatório de Verificação Prévia detalhando as condições físicas do estabelecimento e as condições de ordem administrativas e pedagógicas. O Relatório é anexado ao processo e este encaminhado ao Conselho Estadual de Educação via malote da SEDUC/MT ou por outros meios. No Conselho Estadual de Educação, o processo é protocolado e encaminhado à Coordenadoria Educacional que faz a distribuição à Equipe Técnica para análise. Após analisado, a ele é anexada uma Informação Técnica que poderá sugerir o encaminhamento do processo à Câmara de Educação Básica para as providências cabíveis ou a devolução do processo à interessada para reformulação ou saneamento de algumas irregularidades. Se o processo seguir para a Câmara, será novamente analisado por um Conselheiro que poderá emitir um Parecer deferindo ou não a solicitação ou um Despacho de Câmara diligenciando o processo para saneamento. No caso de Parecer, a Coordenadoria segue os procedimentos de correção, digitação, assinatura e elabora o ato que pode ser uma Resolução quando de autorização, ou Portaria quando de reconhecimento. Esses atos, depois de formalizados, são assinados pelos relatores e encaminhados ao Secretário de Estado de Educação para homologação. Após a homologação, são encaminhados à Imprensa Oficial do Estado para publicação. Publicado o ato, uma cópia é anexada ao processo e este encaminhado à interessada e a outra cópia arquivada no órgão. No caso de Despacho de Câmara, o processo passa pela Coordenadoria Educacional para formalização do ato, assinatura do relator e é devolvido à interessada. Há processos que são diligenciados até quatro vezes para saneamento e isso pode levar meses, um, dois ou mais anos. Nota-se que o trabalho do 138 um desafio ao poder público Conselho é fundamentalmente cartorial, depende das informações escritas no Relatório de Verificação Prévia pelo Assessor Pedagógico e das peças reunidas no processo pelo mantenedor ou dirigente escolar, o que caracteriza como foi dito no primeiro capítulo, uma forma de atuação dispendiosa, burocrática e morosa. Está evidente a necessidade de mudanças nesse sentido. O Estado de Mato Grosso tem em sua história, como foi visto no capítulo anterior, um período em que as solicitações de autorização e reconhecimento dos cursos eram feitas pelos mantenedores, tanto na esfera pública como privada (de 1976 a 1991). Seria viável a retomada dessa prática? Feriria ela a autonomia da escola? Não defendo a volta ao passado. O que está em pauta é uma forma de racionalizar o trabalho ou de descentralizálo para solucionar o acúmulo de serviços burocráticos nos órgãos responsáveis pela legalização de escolas, sem prejuízo à população e sem ferir a autonomia da escola e, sobretudo, para que o órgão normativo consiga desempenhar o seu papel primordial que é o de mediador entre o Estado e a sociedade. Não há óbice que as solicitações sejam feitas pelas próprias escolas. Todavia, os mecanismos podem ser menos burocráticos. Adotando-se medidas compatíveis com a atualidade, pode-se evitar a oferta irregular dos cursos da educação básica nas escolas do sistema estadual de ensino, sem ferir a autonomia da escola, sem que as questões pedagógicas sejam abandonadas e, sobretudo, pode-se garantir os direitos dos cidadãos. O Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso vem arrastando uma rotina de trabalho semelhante à de quando foi criado há 40 anos. O número de escolas naquela ocasião era bem menor e o volume de trabalhos necessários para o controle era compatível. Com o crescimento populacional, evidentemente os mecanismos de controle precisam ser modernizados sob pena de se inviabilizar o atendimento aos usuários e de não se garantir direitos constitucionais aos cidadãos. Para verificar as possibilidades de atendimento à demanda iminente e a capacidade de trabalho do órgão, foi le139 Escolas irregulares: vantado o número de processos protocolados no Conselho Estadual de Educação no período de 1997 a 2001. Tabela 4 - Número de processos período de 1997 a 2001 protocolados no CEE/MT no Dados obtidos nos arquivos do CEE/MT em janeiro de 2002. A tabela acima esclarece que durante o período de 1997 a 2001, foram protocolados no CEE/MT, 4.484 processos de diversas naturezas, alcançando uma média anual de 896. Numa análise racional, os 5.967 cursos com atos de autorização e reconhecimento considerados vencidos pela nova norma, mencionados nas páginas anteriores, correspondem ao mesmo número de processos a serem protocolados no CEE/MT e esse número extrapola, em pelo menos, seis vezes o ritmo de trabalho do órgão. É oportuno lembrar também que devem ser acrescidos a esses números, os processos de outras naturezas que são protocolados diariamente. Com o acúmulo de processos no órgão, o deferimento das solicitações certamente será moroso e isso poderá contribuir para o aumento da oferta irregular e descontentamento da população. Para minimizar os problemas relacionados à vida escolar dos alunos, o CEE/MT terá de inevitavelmente recorrer ao mecanismo da validação de estudos legitimando o descumprimento das normas, como já foi dito, ou modificar a sua rotina de trabalho para agilizar o atendimento às necessidades dos usuários. 140 um desafio ao poder público Com a finalidade de verificar a agilidade do órgão quanto à análise dos processos de autorização e reconhecimento de cursos, foi levantado o tempo de permanência desses processos no Conselho Estadual de Educação desde a data do protocolo à data de saída dos mesmos. 4 TTempo empo de permanência dos processos de autorização e reconhecimento no Conselho Estadual de Educação nos anos 1999 e 2000 São comuns as reclamações de usuários sobre a morosidade na tramitação de processos no CEE/MT, que sofrem ou não diligências. Foi, por isso feito um levantamento do número de processos de autorização e reconhecimento de cursos da educação básica protocolados no CEE/MT, nos dois anos; o número dos que foram diligenciados para saneamento e o número dos que não sofreram diligências. A tabela seguinte mostra os números obtidos. Tabela 5 - Demonstrativo do número de processos de autorização e reconhecimento protocolados no CEE/MT nos anos 1999 e 2000 com ou sem diligências. Dados obtidos nos arquivos do CEE/MT em novembro de 2001. A percentagem de processos diligenciados é relativamente alta nos dois anos e isso pode indicar a necessidade de saneamento nas instâncias de origem e maior atenção das instâncias centrais aos organismos que representam a SEDUC/ MT nos municípios. 141 Escolas irregulares: Como o tempo gasto na tramitação dos processos da escola até a deliberação do Conselho Estadual de Educação pode ser um dos elementos que contribuem para o funcionamento irregular de escolas, foi necessário levantar o tempo que os processos permaneceram no órgão, nos anos de 1999 e 2000. Com o levantamento, foi possível constatar que o tempo de permanência dos processos no CEE/MT variou de 02 a 695 dias no ano 1999 e de 11 a 486 dias no ano 2000 ou que, nesses dois anos, 56, % dos processos de autorização e reconhecimento de cursos protocolados no CEE/MT permaneceram no órgão por um período de 01 a 4 meses; 14,5 % de 4 a 6 meses e 29,4% acima de 6 meses, já descontado o tempo fora do órgão. O prazo de 4 meses para um órgão que analisa processos de todas as escolas públicas e privadas do Estado parece ser relativamente normal, o que merece reflexão são os 43,9% restantes que permanecem no interior do órgão por um período acima de 4 meses, ou os 29,4% que permanecem no órgão acima de seis meses. A reclamação das Assessorias Pedagógicas e Secretarias Municipais precisa ser considerada. Entretanto, há que se considerar também que no Estado o sistema de comunicação é ainda precário e os caminhos que um processo diligenciado percorre, entre a sua saída da escola e a sua chegada ao CEE/MT, são longos e tortuosos o que contribui para a morosidade em toda a tramitação. Um processo pode passar um longo tempo “viajando” enquanto alunos estão sendo prejudicados por falha dos mecanismos adotados pelos órgãos responsáveis pela educação escolar básica. Uma reflexão é oportuna com relação a essa morosidade na tramitação. A legislação vigente diz que a escola deve protocolar os processos de autorização nas Assessorias Pedagógicas ou Secretarias Municipais de Educação, 120 dias antes do início das atividades e os de reconhecimento, 180 dias. Espera-se, portanto, que nesse prazo os processos percorram 142 um desafio ao poder público todas as instâncias e sejam finalizados. Se isso não está ocorrendo com 43,9% dos processos, talvez valha a pena verificar a forma de atuação de cada instância como: as condições de trabalho, os recursos materiais, humanos e financeiros das Assessorias Pedagógicas e SMEs, o sistema de comunicação e transporte dos processos que envolvem essas instâncias, a qualidade das normas estabelecidas que pode não ser compatível com a realidade e ainda a fiscalização exercida pelo poder público que pode estar conservando o caráter corretivo de outrora, esquecendo-se de fazer a prevenção. Numa administração modernizada e satisfatória, a ocorrência de futuros problemas é prevista com antecedência e trabalhos preventivos são desenvolvidos. A morosidade na tramitação dos processos de autorização e reconhecimento de cursos que se inicia na escola passando pelas Assessorias Pedagógicas ou Secretarias Municipais de Educação e destas ao Conselho Estadual de Educação, aliada à morosidade que ocorre no interior do órgão para análise e em outras instâncias pertinentes, é sem dúvida um dos fatores que contribui para elevar a estatística relativa ao número de escolas irregulares. Em síntese a abordagem deste capítulo possibilitou a seguinte visualização: 1- há necessidade de estabelecer mecanismos de cooperação mútua entre o CEE /MT e a SEDUC /MT- setor de informática, para que os dados sejam oficiais e principalmente verdadeiros nos dois órgãos; 2- dos 129 Municípios mato-grossenses cadastrados no CEE /MT, 100 mantiveram escolas com funcionamento irregular nos anos 1999 e 2000; 3- no ano 2000, 39,76% das escolas estaduais e 39,50 % das particulares do sistema estadual de ensino ofereceram alguma etapa ou modalidade de ensino irregular; 143 Escolas irregulares: 4- no ano 2001, foram ofertados 5.967 cursos irregulares em escolas públicas e privadas do sistema estadual de ensino de Mato Grosso; 5- para ressalvar o direito dos alunos, o CEE/MT no ano 1999 concedeu validação de estudos em 73,8% das solicitações de autorização e reconhecimento de cursos de escolas públicas e em 66,6% das solicitações de escolas privadas. No ano 2000, o órgão concedeu validação de estudos em 87,6% das solicitações de escolas públicas e 74, % de escolas privadas; 6- a prática de oferecer cursos irregulares tem forçado o CEE/MT a estabelecer normas gradativamente mais rígidas e o problema continua, apesar da rigidez das normas e dos mecanismos de fiscalização; 7- o procedimento de validar estudos realizados pelos alunos em escolas irregulares tem sido adotado há mais de trinta anos pelo CEE/MT; 8- o aumento expressivo de trabalhos burocráticos no CEE/MT e órgãos afins tem se constituído em amarras para o sistema estadual de ensino; 9- 56, % dos processos de autorização ou reconhecimento de cursos permaneceram no CEE/MT para análise e deferimento nos anos 1999 e 2000, por um período de 01 a 04 meses. 14,5% permaneceram por um período de 04 a 06 meses e 29,4 % por mais de seis meses; 10- dos 162 processos protocolados no CEE/MT no ano 1999, foram diligenciados 105. No ano 2000 foram protocolados 188 processos e destes, diligenciados 164. Isso indica a necessidade de saneamento dos processos nas instâncias de origem e de reflexões pelos órgãos normativo e executivo do sistema estadual de ensino sobre as condições de 144 um desafio ao poder público trabalho oferecidas, bem como quanto à qualidade dos serviços prestados nessas instâncias; 11- a modernização dos órgãos educacionais, o que inclui a informatização e, sobretudo, o abandono de práticas não mais compatíveis, faz -se necessária. É bom que se tenha em mente todas essas considerações sugeridas pelos levantamentos feitos no âmbito do Estado para que se possa ter uma noção clara do problema no município de Cuiabá, que será apresentado no 5ºcapítulo. Estão postas no capítulo seguinte algumas contribuições de outros órgãos, consideradas de fundamental importância. O que pensam e fazem os responsáveis pela educação escolar básica de outros órgãos como: Conselhos Estaduais de Educação de alguns estados brasileiros, Conselhos Municipais de Educação deste Estado, Secretarias Municipais de Educação e Assessorias Pedagógicas de alguns municípios mato-grossenses, pode significar ganhos para o Conselho Estadual de Educação-CEE/ MT como órgão normativo e para a Secretaria de Estado de Educação - SEDUC/MT como órgão executivo do sistema estadual de educação. 145 Escolas irregulares: Visando trazer os diversos olhares sobre a oferta da educação escolar básica irregular do ponto de vista legal, este capítulo reúne procedimentos de 18 (dezoito) Conselhos Estaduais de Educação, sugestões de 02 (dois) Conselhos Municipais de Educação, 41 (quarenta e uma) Secretarias Municipais de Educação e 65 (sessenta e cinco) Assessorias Pedagógicas dos Municípios mato-grossenses. O objeto de estudo é um problema social e não pode ser visto apenas com os olhos do Conselho Estadual de Educação ou da Secretaria de Estado de Educação. A contribuição de outros órgãos pode trazer ganhos consideráveis. 1 Contribuições de Conselhos Estaduais de Educação Para a pesquisa, foi solicitado oficialmente aos Conselhos Estaduais de Educação de todos os estados e do Distrito Federal, o encaminhamento das normas que estabelecem critérios para autorização e reconhecimento de cursos, as leis de instituição dos seus sistemas de ensino e outros materiais produzidos em relação ao controle da oferta da educação escolar básica. 146 um desafio ao poder público Dos 27 Conselhos Estaduais de Educação consultados, 18 contribuíram enviando normas relativas ao funcionamento de escolas, vigentes até meados de 2001: Amazonas, Acre, Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Santa Catarina , São Paulo, Sergipe, Tocantins e Distrito Federal. Nenhum estado encaminhou trabalhos desenvolvidos na área. Não foi feita uma análise das normas enviadas pelos conselhos, apenas foram extraídos alguns elementos para facilitar o estudo em pauta. As normas possibilitaram o levantamento de alguns dados como: quantos conselhos estaduais ainda mantém a competência de autorizar e reconhecer cursos e fiscalizar as unidades escolares, quantos credenciam os estabelecimentos de educação básica conforme exigências da LDB e quantos incluem, como critérios para autorização ou reconhecimento de cursos oferecidos pela iniciativa privada, documentos que comprovem a regularidade fiscal e para fiscal das mantenedoras. Com relação ao credenciamento dos estabelecimentos de ensino de educação básica, constatou-se que 07 dos 18 Conselhos Estaduais consultados para a pesquisa já estão exigindo o credenciamento de instituições de ensino de educação básica estabelecido pela LDB. Com relação à autorização dos cursos, em 12 Estados a responsabilidade ainda é do Conselho Estadual de Educação. Em 04 Estados, das Secretarias de Estado de Educação e 01 Estado não informou. Com referência ao reconhecimento, verifica-se que em 12 Estados os atos são expedidos pelo Conselho Estadual de Educação, em 04 não há reconhecimento de cursos da educação básica e 02 Estados não informaram. A fiscalização é responsabilidade das Secretarias de Estado de Educação nos 18 Estados contribuintes Com relação à exigência de certidões negativas de débitos da mantenedora junto aos órgãos públicos, como critérios para a obtenção do ato de autorização ou reconheci147 Escolas irregulares: mento de cursos, observa-se que em 9 Estados esses documentos são exigidos, em 06 não há essa exigência e 02 não informaram. Como se pode observar, as exigências não são as mesmas em todos os Estados, apenas a fiscalização das unidades escolares é responsabilidade unânime das Secretarias de Estado de Educação dos 18 Estados. Em quatro Estados, a competência de autorizar cursos da educação básica é da SEDUC. Isso indica que alguns Conselhos Estaduais de Educação já avançaram rumo à descentralização de algumas ações. O Parecer 143/02-CE/DF citado no primeiro capítulo deixa claro o novo perfil para os conselhos de educação, podendo ser caracterizado como: · Fórum instituinte, do sistema, dando organicidade flexível e seu arcabouço normativo, evitando engessamentos; · Promotor de princípios educacionais( dimensão ética) orientadores da ação dos dirigentes do sistema, das escolas, dos educadores, dos pais e alunos; · Instância de mobilização e de articulação do compromisso público com a educação ( papel mediador sociedade/governo); · Ouvidor da sociedade em assuntos educacionais; · Estimulador da autonomia da escola; · Guardião dos direitos educacionais da sociedade; · Facilitador de experiências inovadoras, especialmente para abertura e novos educacionais que superem o cartesiano conceito escolar; · Indutor (normatizador) da avaliação de qualidade educacional; · Fórum de análises e estudos de políticas educacionais; · Fórum consultivo do sistema. 148 um desafio ao poder público Esse novo perfil implica em mudanças na rotina de trabalho tanto no órgão normativo como no executivo do sistema. Evidentemente, esse Parecer é específico para o sistema de ensino do Distrito Federal e o que é ideal para essa unidade da federação pode não ser para as demais. As realidades são diversas e precisam ser cuidadosamente analisadas. Mas é um documento que merece ser consultado. Cury in: Ferreira (2001, p. 45), deixa clara a sua visão sobre a função dos conselhos de educação quando diz: A existência desses Conselhos, de acordo com o espírito das leis existentes, não é o de serem órgãos burocráticos, cartoriais e engessadores da dinamicidade dos profissionais e administradores da educação ou da autonomia dos sistemas. Sua linha de frente é dentro da relação Estado Sociedade, estar a serviço das finalidades maiores da educação e cooperar com zelo pela aprendizagem nas escolas brasileiras. Como se vê, os conselhos de educação estão numa fase de transição muito delicada e precisam criar suas próprias identidades. Para isso a reorganização interna desses órgãos deve ser conjunta com a reorganização das instâncias executivas a fim de definirem suas funções. Nesse contexto, o Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso, a partir da Lei Complementar nº 49/98 que organiza o Sistema Estadual de Ensino, segue, ao menos teoricamente, a visão de CURY. O Conselho é o órgão normativo do sistema, fórum consultivo e de estudos das políticas educacionais do Estado. Igualmente a SEDUC/MT, como órgão executivo, é responsável pela aplicação das normas, fiscalização, acompanhamento e avaliação da educação escolar. Entretanto, percebe-se que há ainda alguns desvios de funções entre os dois órgãos, como a função de autorizar e reconhecer cursos, analisar processos de diversas naturezas entre outras, que podem 149 Escolas irregulares: contribuir para o atendimento insatisfatório à população e, conseqüentemente, favorecer o descumprimento às normas estabelecidas e a oferta irregular da educação escolar básica. A leitura das normas relativas ao credenciamento dos estabelecimentos de ensino, autorização e reconhecimento de cursos desses conselhos de educação, possibilitaram a percepção clara de que o credenciamento dos estabelecimentos de ensino da educação básica é um procedimento necessário, visto que somente é concedido mediante comprovação das condições físicas do estabelecimento e estrutura financeira de seus mantenedores. Esse procedimento pode contribuir para melhorar o empenho dos mantenedores na manutenção dos prédios escolares e garantir a continuidade da oferta em condições aceitáveis. A autorização dos cursos oferecidos, como já foi dito no primeiro capítulo, é uma permissão para a oferta e visa a garantia dos direitos do aluno, sobretudo em termos pedagógicos. O reconhecimento de cursos está sendo visto por alguns Conselhos como uma forma de confirmação da autorização e um procedimento redundante, cartorial e burocrático que não garante, por si só, a qualidade do ensino ofertado. Portanto, passível de ser descartado como já o fizeram alguns Conselhos Estaduais de Educação. Foi possível perceber também que alguns Conselhos Estaduais de Educação, que já estão credenciando os estabelecimentos de ensino, seguem uma mesma linha de pensamento no que se refere aos critérios adotados como requisito para o credenciamento dos estabelecimentos de ensino da mesma forma adotada para a autorização dos cursos. As normas por eles encaminhadas, vigentes até meados do ano 2001, mostram que os critérios para o credenciamento das instituições de ensino são os mesmos para todas as escolas desconsiderando as diversidades locais e regionais. Percebe-se que a perspectiva é a de se alcançar a escola ideal em termos de espaço físico para a aprendizagem, condições administrativas e, mantenedores estruturados finan150 um desafio ao poder público ceiramente para ofertar educação escolar básica. Ficou claro, no segundo capítulo, que no Estado de Mato Grosso as normas relativas à autorização e reconhecimento de cursos também são feitas para a escola ideal. Isso pode ser um dos pontos de estrangulamento da política de controle da oferta da educação escolar básica e mudança nesse aspecto pode ser um bom caminho. 2 Contribuições de Conselhos Municipais de Educação No Estado de Mato Grosso, até meados de 2001, apenas dois Municípios haviam instituído seus sistemas municipais de ensino: Barra do Garças e Tangará da Serra. Foram entrevistados pessoalmente os presidentes dos dois Conselhos Municipais de Educação, com o intuito de perceber procedimentos que possam auxiliar na solução dos problemas relacionados à oferta irregular da educação escolar básica. Além da entrevista, os presidentes forneceram as legislações produzidas pelos respectivos Conselhos após a instituição dos sistemas de ensino, a fim de que os procedimentos por eles adotados fossem vistos com maior clareza. Como os objetivos da pesquisa não incluíam uma análise detalhada sobre o funcionamento desses órgãos, apenas foram extraídos da legislação encaminhada, a caracterização desses sistemas municipais de ensino e alguns procedimentos legais adotados com relação ao problema em pauta que pudessem servir para reflexões ou que indicassem soluções. 2.1 Sistema Municipal de Ensino de Barra do Garças O Sistema Municipal de Ensino do Município de Barra do Garças foi instituído pela Lei Municipal, nº 2.095 de 26 de Agosto de 1998 alterada pela Lei Complementar nº 055, de 18 de dezembro de 2.000. Segundo essa lei, integram o Sistema Municipal de Ensino: 151 Escolas irregulares: I- as instituições de ensino fundamental e médio e de educação infantil mantidas pelo poder público municipal; II- as instituições de educação infantil criadas e mantidas pela iniciativa privada; III- o Conselho Municipal de Educação; IV- a Secretaria Municipal de Educação. Estavam sob a responsabilidade do Sistema Municipal de Ensino desse Município (ano 2001), 24 escolas municipais de educação básica e 11 escolas particulares que ofereciam a educação infantil. Numa breve leitura das normas emanadas do Conselho Municipal de Educação acima referido, observa-se que as Resoluções que tratam da autorização e reconhecimento de cursos são consideravelmente simples22 em alguns aspectos. Não explicitam, por exemplo, os dizeres mantidos nas normas do CEE/MT: “não serão válidos os atos escolares praticados antes da autorização de funcionamento de cada etapa....” Também não há nessas normas a exigência de documentos que comprovem a regularidade fiscal e parafiscal da mantenedora como critérios para autorização e reconhecimento de cursos. Evidentemente, a não exigência desses documentos pelo Conselho Municipal de Educação não exime as empresas prestadoras de serviços educacionais das responsabilidades que lhe são inerentes. Apenas faz com que os débitos da mantenedora para com os órgãos afins, sejam um problema a ser resolvido pelas instâncias prejudicadas, o que parece ser coerente e um bom caminho para os Conselhos de Educação. Mas, por outro lado, a dispensa desses documentos, como exigências para autorização ou reconhecimento de cursos, pode fazer com que mantenedores desestruturados financeiramente 22 152 Para a autorização de cursos não são exigidos, por exemplo, documentos que comprovem a regularidade fiscal e parafiscal da mantenedora. Apenas no ato do credenciamento a sua inscrição no CGC e INSS. As certidões negativas de débitos do INSS, FGTS e Receita Federal somente são exigidas após dois anos de funcionamento, ou seja, na ocasião do reconhecimento. um desafio ao poder público abram escolas e venham trazer prejuízos aos alunos. Em síntese, o que assegura o funcionamento regularizado das unidades escolares pertencentes a esse sistema municipal de ensino não parece ser a exigência rígida de documentos, mas os mecanismos de fiscalização adotados. Em cumprimento ao que dispõe a Lei Complementar estadual nº 77/00 - Poder Executivo, de 13 de dezembro de 2000, o Conselho Municipal de Educação do Município de Barra do Garças, estabeleceu a Resolução nº 019/99-CME, específica para a inspeção e desativação de estabelecimentos de ensino fundamental e de educação infantil que compõem o sistema municipal de ensino e nessa Resolução há critérios bem definidos para serem observados no ato da inspeção, inclusive para os casos de validação de estudos quando se enquadram nos requisitos mínimos estabelecidos na própria Resolução.23 A forma simples da legislação educacional, emanada desse Conselho Municipal de Educação e o fato de estabelecer critérios para a fiscalização das unidades escolares em normas distintas facilita, por um lado, a oferta do ensino regularizado pelo poder público e iniciativa privada. Por outro, dá abertura para que sejam solucionados os casos de irregularidades que por ventura ocorram sem isentar os infratores das sanções previstas, sem que o Conselho descumpra suas próprias normas e sem que alunos fiquem prejudicados. 2.2 Sistema Municipal de Ensino de TTangará angará da Serra O Sistema Municipal de Tangará da Serra-MT foi instituído pela Lei Municipal nº 1.410/98, de 14 de abril de 1998 e organizado pela Lei nº 1.493/98, de 16 de dezembro do mesmo ano e compreende: 23 Na Resolução específica para a supervisão, são estabelecidos alguns requisitos mínimos para a validação dos atos praticados pela escola, referentes ao espaço físico, corpo docente, currículo, arquivo escolar, regimento, diários de classe, biblioteca, relação de alunos e outros. 153 Escolas irregulares: I- as instituições de educação infantil criadas e mantidas pelo poder público municipal; II- as instituições de educação infantil criadas e mantidas pela iniciativa privada; III- a Secretaria Municipal de Educação e Cultura; IV- o Conselho Municipal de Educação; V- o Fórum Municipal de Educação. Sob a responsabilidade desse Sistema Municipal de Ensino, no ano 2001, estavam 37 escolas municipais de educação básica e 13 escolas particulares que ofereciam a educação infantil. Quanto à legislação produzida pelo Conselho Municipal de Tangará da Serra, observa-se que a norma específica para autorização de funcionamento também não mantém a tradição do Conselho Estadual de Educação de não considerar válidos os atos praticados pelas escolas antes do ato de autorização. As Resoluções número 001/99/CME e 002/99/ CME, que fixam normas para a educação infantil e ensino fundamental, respectivamente, no sistema municipal de ensino do município, estabelecem que: “cabe à supervisão propor às autoridades competentes o cessar efeitos dos atos de autorização da instituição quando comprovadas irregularidades que comprometam o seu funcionamento ou quando verificado o não cumprimento da proposta pedagógica”, (art. 23 e 28). Isso facilita a oferta e evita que o Conselho forçosamente tenha que lançar mão da validade de estudos. Os critérios estabelecidos para a obtenção do ato de autorização de funcionamento de escolas de educação infantil mantidas pela iniciativa privada nesse município são pouco exigentes com relação às obrigações da mantenedora com os órgãos afins. Referem-se à localização, proposta pedagógica da escola, espaço físico, recursos humanos, capacidade de atendimento, condições de funcionamento e alvará de licença. Entre eles não estão incluídos documentos que compro154 um desafio ao poder público vem a regularidade fiscal e parafiscal da mantenedora. São exigidos apenas o seu registro junto aos órgãos competentes: Cartório de Títulos e Documentos, Junta Comercial e Cadastro Geral dos Contribuintes do Ministério da Fazenda e de documentação que possibilite verificar a capacidade de autofinanciamento, prova de idoneidade econômico-financeira da entidade mantenedora e de seus sócios, consistindo de certidão negativa do cartório de distribuição pertinente. Pelo que se pode perceber nos dois Conselhos Municipais de Educação as questões relativas à regularidade fiscal e parafiscal da mantenedora são resolvidas pelos órgãos fiscalizadores próprios e não há vinculação desses documentos com o processo de autorização de funcionamento. Pode ser esse um dos motivos da não existência de escolas irregulares nesses dois Municípios. Foi observado ainda nas normas que os dois Conselhos Municipais de Educação foram criados com funções consultivas, normativas, deliberativas e de fiscalização e conservam o espírito do controle por órgãos centrais. Com relação à competência de fiscalizar, é bom lembrar o que diz Parecer nº 143/02, de Bordignon, nas páginas anteriores: “não faz sentido o Conselho definir as normas e ele mesmo cuidar de sua aplicação”. O órgão executivo do sistema pode desempenhar essa função. Segundo os presidentes entrevistados, no Município de Barra do Garças, havia apenas, uma escola particular oferecendo cursos irregulares (ano 2001) e em Tangará nenhuma. Nos dois municípios as escolas são notificadas oficialmente sempre que apresentam irregularidades. Na opinião do presidente do Conselho Municipal de Educação de Barra do Garças, embora não tenha enfrentado problemas com o funcionamento irregular de escolas, os principais motivos que podem levar as escolas a oferecerem cursos irregulares são a dificuldade na montagem dos processos, as sanções que nem sempre são aplicadas conforme a lei e porque não há envolvimento da comunidade. 155 Escolas irregulares: Para o presidente do Conselho Municipal de Educação de Tangará da Serra, os três principais motivos são a displicência dos dirigentes, o desconhecimento das normas e porque não há envolvimento da comunidade. Para os dois presidentes a falta de envolvimento da comunidade na fiscalização é um dos fatores que contribui para a existência de escolas irregulares. Ao serem indagados sobre os mecanismos de controle das escolas, os dois presidentes alegaram ter no órgão, arquivo com os documentos que comprovam a situação de regularidade de todos os cursos oferecidos pelas escolas no âmbito da competência do sistema municipal de ensino. A fiscalização das escolas em Barra do Garças é feita pelo Serviço de Inspeção da Secretaria Municipal de Educação. Em casos mais graves, o Conselho Municipal também participa. Em Tangará da Serra, segundo o presidente, os conselheiros fazem um acompanhamento com visitas e assessoramento legal, esclarecendo dúvidas e sugerindo mudanças quando necessário. Escolas não são fechadas, mas são impedidas de iniciarem o funcionamento quando não apresentam condições mínimas. Os presidentes foram argüidos sobre as orientações recebidas de outros órgãos e, em resposta, o presidente do CME de Barra do Garças informou que busca orientações junto ao Conselho Nacional, já que o relacionamento com o Conselho Estadual até o momento não havia sido satisfatório. O CME de Tangará da Serra busca orientações no CEE/MT e Conselho Nacional de Educação. Para os dois presidentes, as orientações recebidas têm sido suficientes. Os dois presidentes informaram, como resposta de uma outra questão, que durante os anos 1999 e 2000 não houve registro de reclamações por parte da comunidade em relação às escolas irregulares. Foi solicitado aos presidentes que enumerassem as dificuldades encontradas por técnicos e conselheiros quando da análise de processos referentes a regularização das escolas. 156 um desafio ao poder público Em Tangará da Serra, o presidente informou que não houve, até aquele momento, dificuldades especiais e as dúvidas são sanadas durante as reuniões ordinárias. Em Barra do Garças só houve um caso de funcionamento irregular e as providências foram tomadas. Nenhuma dificuldade foi enumerada nesse sentido. A última questão da entrevista, sobre a opinião dos presidentes se foi ou não positiva a instituição do sistema municipal de ensino e o que recomendariam aos municípios que ainda não o criaram, foi respondida pelos dois presidentes de forma semelhante, com palavras diferentes. Em Barra do Garças o presidente informa que a organização do SME foi altamente positiva. A maior e única dificuldade encontrada foi a falta de parceria com o CEE/MT e recomenda aos municípios que ainda, não criaram seus sistemas de ensino, que o façam após minucioso estudo das reais condições do município, guiando-se pelo Parecer Orientativo do CNE e normas do CEE/ MT, emitido no ano 2000 e, em sendo viável, que o organizem imediatamente. Em Tangará da Serra a instituição do sistema municipal de ensino foi favorável. Apenas, o presidente lamenta que a partir de então, o contato com o CEE/MT tornou-se distante e que seria interessante maior aproximação entre os dois órgãos, visto que o crescimento é mútuo. Para ele, o município tornou-se mais autônomo e a comunidade escolar passou a participar mais das questões educacionais. Recomenda aos Municípios que ainda não criaram seus sistemas que o criem porque a participação da Comunidade é fundamental para o crescimento do Município. Em síntese, as contribuições dos dois Conselhos Municipais de Educação foram significativas para a pesquisa, principalmente porque possibilitaram algumas reflexões que podem ser úteis ao Conselho Estadual de Educação: 1- A necessidade de credenciar os estabelecimentos de ensino como prevê a LDB; 157 Escolas irregulares: 2- Elaboração de uma norma específica para a supervisão das escolas como está dito na Lei que organiza o sistema estadual de ensino, poderia facilitar o trabalho dos responsáveis pela fiscalização; 3- A vinculação dos documentos relativos a regularidade fiscal e parafiscal da mantenedora como critério para a concessão do ato de autorização e reconhecimento dos cursos pode contribuir para o atraso no encaminhamento de processos ao Conselho Estadual de Educação e elevando a estatística das escolas irregulares. 4- O fato de o Conselho Estadual de Educação expressar, nas normas específicas para autorização e reconhecimento de cursos, que não serão válidos os estudos realizados antes do ato legal e, mesmo assim conceder validade de estudos para não prejudicar alunos, demonstra incoerência em suas ações. Essas reflexões trazidas das contribuições dos Conselhos Municipais de Educação são positivas e indicam que alguns procedimentos adotados pelo Conselho Estadual de Educação relacionados ao problema em questão, devem ser melhor discutidos ou repensados. O estudo das normas de outros Conselhos Estaduais e Municipais de Educação permitiu-me perceber que todos os órgãos consultados adotam como critérios para autorização de funcionamento, exigências que devem ser cumpridas por todas as escolas dos seus sistemas na tentativa de estimulálas a chegar à condição ideal. Entretanto, se as normas fossem elaboradas de forma a impulsionar as escolas à busca de melhorias em suas estruturas físicas, pedagógicas e administrativas gradativamente, considerando as diversidades locais e regionais, todas as escolas poderiam ser legalizadas de acordo com suas possibilidades e impulsionadas a buscarem a condição ideal. Esse assunto será retomado e detalhado nas considerações finais. 158 um desafio ao poder público Na busca de subsídios para complementar o estudo do problema em pauta, foram também coletadas contribuições dos organismos fiscalizadores do sistema estadual de ensino com o objetivo de conhecer como desempenham a função, suas dificuldades e o que sugerem ao órgão normativo do sistema. 3 Contribuições de Assessorias PPedagógicas edagógicas e Secre Secre-tarias Municipais de Educação Para a realização da pesquisa, foram consultados no ano 2001, por meio de formulários escritos, 139 municípios mato-grossenses. Houve contribuição de 106 municípios (76,2%), sendo 65 através das Assessorias Pedagógicas (46,7%) e 41 através das Secretarias Municipais de Educação (29,4%). Apenas 33 municípios, ou seja, (23,7%) não se manifestaram. Essa participação considerável indica que o desejo de solucionar o problema existe e que os meios de comunicação com os organismos fiscalizadores no interior do Estado não são tão falhos como se pensa. Pelo levantamento, foi possível verificar que 83% dos assessores pedagógicos ou secretários de educação que responderam os formulários possuem curso superior, o que é um bom indicativo. Com relação ao tempo de serviço na função, 27,6% estavam há menos de 01 ano nas assessorias pedagógicas e nas secretarias municipais de educação o número sobe para 73,1%. A experiência dos assessores e técnicos das secretarias de educação na função fiscalizadora é importante porque são eles os responsáveis pelas orientações sistemáticas às escolas e pelas providências preliminares. Se o responsável pela função não possui experiência ou conhecimento das normas e de procedimentos viáveis, pouco pode contribuir e aqui é bom lembrar os dados do segundo capítulo nos quais fica evidente que em 55 municípios não há assessorias e a fiscalização em muitos deles fica a cargo das secretarias municipais de educa159 Escolas irregulares: ção e, portanto, sob a responsabilidade de pessoas com pouca experiência no assunto. Esses dados podem possibilitar reflexões no sentido de se melhorar as condições de trabalho das pessoas que fiscalizam e de se pensar em estratégias para fixar técnicos na função. As escolas necessitam de elementos preparados e experientes ao seu lado para que possam confiar nas orientações. Aos órgãos responsáveis pelo sistema estadual de ensino pode ser viável refletir sobre o estabelecimento de normas simples, executáveis e que possibilitem às escolas o autocontrole ou a auto-avaliação, a melhoria da qualidade dos serviços e, ainda, a fiscalização em parceria com a comunidade escolar. O trabalho das assessorias pedagógicas e secretarias municipais de educação é altamente relevante para o CEE/ MT e SEDUC/MT com relação à oferta da educação escolar legalizada, razão pela qual, a pesquisa não poderia deixar de verificar como funcionam essas estruturas, como acompanham o funcionamento das escolas e o que sugerem com relação ao tema. Foi encaminhado a esses órgãos um questionário contendo 12 (doze) questões com perguntas, algumas padronizadas e outras abertas. As respostas das questões padronizadas foram computadas para a extração dos dados e as abertas sintetizadas ou agrupadas por semelhança de idéias para que fosse possível tecer algumas considerações. Com as respostas das questões padronizadas foi detectado que: a) apenas 54,5% das assessorias e 40,0% das secretarias consultadas notificam oficialmente os responsáveis pelas escolas infratoras enquanto as demais notificam verbalmente ou não notificam. Nota-se com isso que, aproximadamente, 50% dessas estruturas fiscalizadoras não cobram oficialmente das instituições o cumprimento das normas; b) 66,1% das assessorias e 68,2% das secretarias alegam que possuem arquivos organizados com a documentação das escolas. 42,4% desses órgãos ainda não o orga160 um desafio ao poder público nizaram e trabalham às escuras, pois desconhecem as reais condições de legalidade dos cursos oferecidos pelas escolas de suas jurisdições. Isso pode indicar a necessidade de maiores esclarecimentos e melhores condições de trabalho aos assessores e secretários municipais de educação; c) quanto à periodicidade das visitas às escolas pelos assessores e técnicos das secretarias, observa-se que um percentual de 32,3% do total dos órgãos realizam visitas quinzenais, 27,4% mensais; 6,8% semestrais, 32,3% só visitam escolas quando há problemas e 4,9% não informaram. Percebe-se que as assessorias e secretarias que visitam escolas ocasionalmente ou que não informaram, somando 32,3% não fazem trabalhos preventivos. As visitas às escolas são importantes para manterem-nas informadas e atualizadas quanto às normas, principalmente para as escolas do interior do Estado. Evidentemente, as assessorias e as secretarias municipais incluídas nesse percentual devem ter seus motivos para visitas tão esparsas e as dificuldades e entraves postos nos próximos parágrafos devem ser analisados e considerados; d) 78,4,0% das assessorias e 43,9% das secretarias municipais estão satisfeitas com as orientações recebidas; 21,5% das assessorias e 46,3% das secretarias, não. Em suma 31,1% dessas estruturas consideram que as orientações não são suficientes. Nota-se que as secretarias municipais de educação estão mais carentes de informações e orientações do que as assessorias pedagógicas e, isso pode indicar a necessidade de maior aproximação com a SEDUC e o CEE/MT; e) os motivos que levam as escolas a funcionarem irregularmente, na opinião dos assessores pedagógicos, pela ordem, são: a dificuldade na montagem dos processos (61,5%); a displicência dos dirigentes (58,4%) e a morosidade na tramitação dos processos (50,7%); f) para os secretários municipais de educação os motivos diferem em apenas um item. Pela ordem os motivos enumerados foram: dificuldade na montagem dos processos (56,0 %), a morosidade na tramitação dos processos (53,6 %) e a 161 Escolas irregulares: dificuldade de acesso aos órgãos educacionais responsáveis pela educação (51,2%); g) outros motivos indicados pelos assessores, também merecem ser avaliados: insegurança dos mantenedores de escolas particulares quanto ao negócio que estão empreendendo; a inadimplência junto aos órgãos como INSS, FGTS, o que dificulta a obtenção das certidões negativas para incluir nos processos de autorização e reconhecimento; a falta de divulgação ampla da relação de escolas regularizadas para que a população possa optar por elas; a centralização dos serviços pelos dirigentes escolares; o hábito e o comodismo dos dirigentes internalizados pela morosidade no trâmite de processos nos órgãos; falta de orientações sobre o assunto aos assessores pedagógicos pelo Conselho Estadual de Educação e a falta de estrutura da Assessoria para fiscalizar; h) algumas secretarias municipais também indicaram outros motivos para o problema em pauta: as mudanças constantes na legislação Estadual, a falta de orientações sobre o assunto aos secretários municipais de educação e a necessidade de atendimento imediato à clientela com a criação de novas escolas e cursos, cuja regularização é morosa. Todos os motivos assinalados ou propostos pelas assessorias pedagógicas dos municípios e secretarias municipais de educação são significativos para os propósitos da pesquisa e podem se constituir em pauta para reflexões no interior dos órgãos educacionais, mas considero que três deles devam receber atenção especial: inadimplência dos mantenedores de escolas particulares junto aos órgãos públicos, fato que acarreta dificuldades para a obtenção das certidões negativas de débitos; a falta de divulgação pela SEDUC/MT da relação de escolas públicas e privadas regularizadas e a displicência dos dirigentes escolares internalizada pela morosidade crônica na tramitação dos processos de autorização e reconhecimento das etapas da educação básica ou modalidades de ensino nos órgãos pertinentes. 162 um desafio ao poder público i) as assessorias pedagógicas e secretarias municipais de educação foram indagadas sobre o número de reclamações da comunidade em relação à oferta de cursos não autorizados ou não reconhecidos registradas no órgão. Como resultado, nos 106 municípios que enviaram contribuições para a pesquisa, há registros de 404 reclamações, sendo 315 referentes a escolas públicas e 89 a particulares; Num contingente de aproximadamente 4.000 escolas, uma clientela de 800.000 alunos um número próximo de 50% de escolas que oferecem cursos não autorizados ou não reconhecidos, como já foi levantado, pode-se entender que, aproximadamente, 50% dos alunos estejam em cursos irregulares. Com esse entendimento, o número de reclamações registrado é relativamente pequeno. Isso pode indicar que grande parte da comunidade não conhece o problema e as conseqüências para a vida escolar dos alunos; não está conscientizada sobre seus direitos ou está acomodada com a situação que acaba sempre sendo resolvida, mesmo com prejuízos; j) ao serem inquiridas sobre os procedimentos adotados nos últimos dois anos para evitarem a oferta irregular de cursos em seus municípios, 19, das 41 Secretarias Municipais de Educação que contribuíram, não responderam, 13 buscam informações junto à SEDUC/MT e Conselho Estadual de Educação e realizam visitas para orientações aos dirigentes, 07 providenciam os processos de autorização e reconhecimento de cursos das escolas irregulares e 02 abrem extensões ou salas anexas às escolas regularizadas, ou seja, solucionam o problema como entendem mesmo sem observância à legislação que não permite tais procedimentos; k) a Secretaria Municipal de Educação de CuiabáMT, informou que, para evitar a oferta irregular de escolas particulares, publica na imprensa escrita, anualmente, a relação das escolas regularizadas, procede a lacração das escolas irregulares junto ao Ministério Público e emite o certificado de regularidade às escolas cujos cursos estão devidamente autorizados e ou reconhecidos no final de cada ano letivo. 163 Escolas irregulares: Como se pode ver, a maioria das assessorias pedagógicas e das secretarias municipais de educação adota, com relação ao tema, procedimentos convencionais de visitarem as escolas e orientarem os dirigentes escolares para que procedam a regularização. Algumas dessas estruturas utilizam procedimentos diversos, mas merece destaque a Assessoria do Município de Cuiabá que realiza um trabalho conjunto com a Secretaria Municipal de Educação, cuja atuação está detalhada especificamente, no quinto capítulo por ser o Município alvo da pesquisa. No que se refere aos procedimentos que a SEDUC/ MT e o Conselho poderiam adotar, na opinião das assessorias pedagógicas e secretarias municipais de educação, para desempenhar melhor suas competências, as sugestões foram diversas e, não sendo possível mencionar todas, foram agrupadas em quatro itens: 01- Promoção de cursos de capacitação e maior aproximação do Conselho às Assessorias; 02- Maior autonomia aos Assessores para a solução de problemas e maior respeito no sentido de não aceitar processos diretamente da escola sem o Parecer da Assessoria para fortalecê-la; 03- Maior agilidade na tramitação de processos de qualquer natureza; 04- Maior rigor na aplicação de sanções previstas em Lei, aos infratores. As secretarias municipais de educação também apontaram diversos procedimentos que foram agrupados nos itens seguintes: 01- Convocação, em tempo hábil, para reuniões, encontros e seminários; 02- Capacitação e repasse das normas vigentes da SEDUC, CEE, CNE; 03- Contato mais próximo e constante com as SMES facilitando a comunicação; 164 um desafio ao poder público 04- Maior agilidade na análise de processos; 05- Maior rigor na aplicação das sanções previstas em Lei. A necessidade de capacitação específica, maior agilidade na análise dos processos pelo Conselho Estadual de Educação são pontos comuns entre assessorias e secretarias municipais de educação, mas os assessores pedem maior autonomia e valorização de seus trabalhos e as secretarias maior rigor no cumprimento das normas, repasse imediato de informações e que sejam também convocadas para reuniões promovidas pela SEDUC/MT em tempo hábil. Vale ressaltar que, se a autonomia concedida às assessorias por meio de normas não é suficiente, cabe a elas buscar espaços maiores junto aos órgãos centrais, visto que estes concedem a autonomia que julgam necessárias ou convenientes e a situação só será alterada quando argumentos justos e convincentes forem postos por aqueles que as recebem e não estão satisfeitos. A verdadeira autonomia é aquela que se obtém da luta por aquilo que se quer. As principais dificuldades encontradas pelos assessores pedagógicos e secretários municipais de educação no desempenho de suas funções estão postas a seguir: 3.1 Dificuldades vivenciadas pelos assessores pedagógicos 01- Obter as legislações educacionais vigentes; 02- Interpretar as normas sem embasamento legal para tomar decisões e, às vezes, sem ter com quem trocar idéias; 03- Rotatividade dos Assessores motivada pela falta de experiência no serviço; 04- Dificuldade de acesso aos órgãos, através dos meios de comunicação, principalmente via telefone; 05- Falta de condições materiais, financeiras e humanas para o desempenho das funções; 165 Escolas irregulares: 06- A linguagem incompatível entre SEDUC/MT, CEE/ MT e assessorias; 07- A morosidade no trâmite dos processos na SEDUC/MT. 3.2 Dificuldades vivenciadas pelos secretários municipais de educação 01- Convocação para seminários, encontros e repasse de informações com atraso; 02- Difícil acesso às normas vigentes; 03- Canais de comunicação precários; 04- Recursos humanos escassos; 05- Embasamento legal escasso para o desempenho das funções. A seguir serão transcritos alguns textos alusivos às dificuldades dos secretários municipais extraídos dos formulários respondidos: “As maiores dificuldades são a análise dos processos e a elaboração do Relatório de Verificação Prévia.” “Não só temos dificuldades como estamos carentes de informações e materiais para consultas.” “Não há um fluxo de informações que atenda nossas dificuldades. O Município é muito carente de meios de comunicação.” “Para esclarecer dúvidas técnico-administrativas ou de interpretação de leis e normas dificilmente encontro na SEDUC a pessoa certa por telefone. Freqüentemente 166 um desafio ao poder público tenho que fazer muitas ligações até conseguir a informação correta. Às vezes dão informações erradas ou palpites inúteis: acho que....” “Falta de orientação por parte da SEDUC e Conselho Estadual de Educação.” Todas essas dificuldades podem parecer simples para aqueles que estão nos órgãos educacionais centrais da educação, mas podem ser extremamente complexas para os técnicos encarregados da fiscalização das unidades escolares nos municípios onde há carência de recursos materiais, financeiros, humanos e inclusive de informações. Um assessor ou secretário de educação sozinho, ao detectar o funcionamento irregular de uma escola num município distante dos órgãos que detém as informações necessárias, carente de recursos de toda ordem e muitas vezes, sem experiência no serviço que desenvolve, acaba por tomar decisões baseadas na sua própria condição de interpretar as normas (quando estas estão acessíveis ) ou no bom senso e um deslize pode provocar tropeços legais na vida escolar futura dos alunos. Uma atenção especial dos órgãos executivo e normativo do sistema estadual de ensino, aos assessores pedagógicos e secretários municipais de educação com relação a essas dificuldades pode ser oportuna. Na última questão do formulário, foram solicitadas sugestões dos assessores pedagógicos e secretários municipais de educação, à SEDUC/MT e ao Conselho Estadual de Educação, para que seja evitada a oferta de qualquer etapa da educação básica ou modalidade de ensino não autorizada ou não reconhecida. Também nesses casos, as respostas foram diversificadas e, portanto, assim sintetizadas: Os assessores pedagógicos sugerem: 01- capacitação para orientações aos dirigentes escolares e assessores; 167 Escolas irregulares: 02- não permissão do início de atividades sem autorização; 03- notificação da SEDUC e Conselho diretamente à escola infratora; 04- maior agilidade na análise de processos de qualquer natureza; 05- aplicação das sanções previstas em Lei aos infratores; 06- maior rigor na fiscalização e no controle dos cursos oferecidos; 07- ampla divulgação das escolas regularizadas através dos meios de comunicação de massa; 08- conscientização dos usuários sobre as conseqüências da matrícula em cursos não autorizados ou reconhecidos; 09- maior interação entre o CEE, Promotoria da Justiça e Cidadania e SMES para lacração de escolas; 10- esclarecimentos sobre como as Assessorias podem manter todas as escolas regularizadas; 11- desburocratizar os processos de autorização e reconhecimento. Algumas sugestões dos Assessores Pedagógicos transcritas: “Fiscalização constante junto às Unidades Escolares. Orientar as Assessorias. Fortalecer os Assessores junto dos Municípios, do papel do Assessor.” “Não receber nada em mãos , a não ser pelo Assessor. Fazer a publicação das irregularidades a nível de Estado, mediante informações prévias da assessoria.” “Publicar a lista de Municípios com suas escolas em situação irregular. Punir as autoridades irresponsáveis.” 168 um desafio ao poder público “Não dar validação de estudos anteriores à autorização.” “As Prefeituras não poderiam soltar alvará sem o Parecer da Assessoria Pedagógica, uma vez que tem escolas e ou creches que funcionam sem as mínimas condições.” “Analisar os processos com maior rapidez pelo CEE, pois os Assessores anexando os seus Pareceres no processo não há necessidade de demora por parte do Conselho.” “Divulgação maior na Imprensa falada e escrita, alertando os interessados no início do ano letivo e que haja interação dos órgãos CEE, Promotoria da Justiça e Cidadania, SMES para lacração de escolas irregulares.” “As escolas deveriam ser autorizadas a fazer (sic) o seu CGC somente após o trâmite legal dos documentos perante o CEE e SEDUC.” “Aplicar as sanções previstas em Lei já seria o suficiente para solucionar os problemas.” “Punindo os dirigentes, inclusive Assessores que são coniventes. Fazer um trabalho de formação específica para dirigentes . Dar mais autonomia às assessorias para deliberarem em seus municípios.” “Como falta consciência desta responsabilidade, se a SEDUC/MT e o Conselho fechassem escolas que ofertam ensino irregular e comunicassem a imprensa, fizessem divulgações, poderíamos ter mais compromisso por parte das escolas. [...] Se fosse divulgado na imprensa, para a sociedade 169 Escolas irregulares: ter conhecimento das escolas que funcionam irregularmente, daí os pais fazerem opções em que escola matricula seus filhos.” As secretarias municipais de educação apontam as seguintes sugestões: 01- repasse imediato das normas vigentes da SEDUC/ MT, CEE, CNE; 02- maior agilidade na análise de processos; 03- capacitação para orientações aos Secretários Municipais de Educação; 04- maior rigor na fiscalização; 05- aplicação das sanções previstas em Lei aos infratores; 06- maior facilidade de comunicação, sobretudo por telefone; 07- maior respeito não recebendo processos sem o Parecer da Secretaria Municipal de Educação. A seguir serão transcritos dos formulários respondidos pelos secretários municipais de educação, algumas sugestões tal como foram escritas para ilustração. “Manter mais contato com as SMES” “Nos assessorar(sic) mais freqüentemente, pois a nossa situação é quase de calamidade pública em todos os sentidos e naturalmente na educação não seria diferente.” “Maiores informações e mais rigor na fiscalização.” “Viabilizando com mais rapidez os processos enviados pela SME. Quanto às autorizações e reconhecimentos tem que ser renovado (sic) 170 um desafio ao poder público automaticamente pela SEDUC e enviar para a Secretaria Municipal de Educação.” As sugestões acima são extremamente importantes. Primeiro, porque foram elencadas por pessoas que conhecem e convivem com o problema gerado por escolas irregulares em seus municípios vivenciando-os no dia a dia. Segundo, porque conhecem as aspirações da comunidade e, portanto, têm maiores condições para envolvê-la no processo de fiscalização. As sugestões apresentadas apontam vários caminhos que podem ser desbravados e, entre eles, merecem destaque os procedimentos indicados pelas assessorias pedagógicas e secretarias municipais de educação, a seguir: 1- divulgação da relação de escolas regularizadas para que os pais possam fazer opções no momento da matrícula; 2- maior interação do Conselho, SEDUC/MT com a Promotoria da Justiça e Cidadania e Secretarias Municipais de Educação para lacração de escolas irregulares; 3- parceria dos órgãos educacionais com as prefeituras municipais visando critérios mais rigorosos quanto a expedição de alvará de licença para funcionamento de unidades escolares; 4- desburocratização dos órgãos educacionais centrais visando ágil atendimento; 5- aplicação de sanções previstas em Lei aos infratores; 6- capacitação e assessoramento específicos sobre o assunto às secretarias municipais e assessorias pedagógicas; 8- parceria do Conselho Estadual de Educação com os órgãos ligados aos responsáveis pela constituição das empresas; 9- Modernização dos órgãos centrais com vistas à democratização e à socialização das informações. 171 Escolas irregulares: As assessorias pedagógicas dos municípios e secretarias municipais de educação inseridas na comunidade, como representantes da Secretaria Estadual de Educação, estão em contato direto com as unidades escolares e, conseqüentemente, com seus problemas. Conhecem a realidade e mostram caminhos que, embora dentro da visão tradicional de controle, merecem cuidadosa análise. As informações prestadas pelas assessorias pedagógicas e secretarias municipais de educação e suas sugestões despertaram-me para a busca de um dado que me pareceu indispensável na pesquisa: o número de empresas educacionais abertas mensal e anualmente em Mato Grosso e o número das que se regularizam perante os órgãos educacionais. Informações precisas sobre o número de empresas constituídas no Estado e onde elas se encontram, podem ser prestadas somente pela Junta Comercial do Estado. 4 Contribuição da Junta Comercial do Estado de Mato Grosso Pelos motivos já expostos no capítulo anterior no item: como são cadastradas as escolas no Conselho Estadual de Educação, seria interessante que, no ato de constituição de uma empresa com fins educacionais, fosse exigido pela Junta Comercial do Estado um cadastro provisório no órgão educacional competente. Isso faria com que o interessado, ao passar pelo órgão responsável pela educação antes de constituir a sua empresa, recebesse as orientações necessárias e tomasse ciência das normas pertinentes. Há muitos empresários que se preocupam apenas com as burocracias ligadas à constituição da empresa e deixam de lado as exigências dos órgãos educacionais e só regularizam a situação muito tempo depois do início das atividades. Não se pode esquecer que ideais capitalistas existem em toda parte na sociedade e esta precisa de proteção contra os 172 um desafio ao poder público abusos. Não se pode impedir também que esses ideais se manifestem na mente das pessoas, mas o poder público precisa estar atento para impedir que seus efeitos prejudiquem os cidadãos. A Junta Comercial do Estado, por ser o primeiro órgão procurado pelos interessados em constituir empresas sejam elas educacionais ou não, pode ser uma boa parceira para o Conselho Estadual de Educação. O Secretário Geral da Junta Comercial do Estado de Mato Grosso foi contatado pessoalmente em 08/11/01 para uma entrevista com o objetivo de obter alguns esclarecimentos sobre os critérios para constituição de empresas educacionais. Ao ser indagado sobre as exigências para abertura de empresas educacionais, o Secretário contribuiu com a pesquisa esclarecendo que os interessados na oferta de serviços educacionais constituem a empresa mediante a apresentação dos mesmos documentos exigidos para as empresas com finalidades comerciais. Segundo ele, não há critérios diferenciados para a constituição de empresas educacionais e, para qualquer mudança nesse sentido, seria necessária a alteração do Decreto Federal nº 1.800, de 30 de janeiro de 1996 que, em seu artigo 34, parágrafo único, diz: Nenhum outro documento, além dos referidos neste Regulamento, será exigido das firmas mercantis individuais e sociedades mercantis, salvo expressa determinação legal, reputando-se como verdadeiras, até prova em contrário, as declarações feitas perante os órgãos do Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins. Segundo ele, a alteração não é de todo impossível, mas demandaria tempo, vontade política e mobilização no âmbito do Conselho Nacional de Educação para uma proposição nesse sentido. O Senhor Secretário ao ser informado sobre a existência de empresas com fins educacionais devidamente constituídas 173 Escolas irregulares: na Junta Comercial, mas irregulares junto ao órgão normativo do sistema estadual de ensino, sugeriu que o CEE/MT solicitasse oficialmente à Junta Comercial- JUCEMAT a relação mensal das empresas constituídas com fins educacionais em todo o Estado para que possa tomar conhecimento da existência de todas as empresas constituídas e tomar as devidas providências. A possibilidade, ainda que remota da alteração do Decreto Federal acima citado, não deve ser descartada, pode ser assunto para reflexões mais aprofundadas no interior do órgão normativo do sistema estadual de ensino futuramente. A sugestão dada pelo Secretário da JUCEMAT, indicando ser este um bom caminho para amenizar a situação, foi imediatamente repassada à Presidência do Conselho e esta, em seguida, oficializou a solicitação ficando assim estabelecida a parceria com a Junta Comercial a partir do ano 2001. Essa parceria entre o Conselho Estadual de Educação e a Junta Comercial do Estado de Mato Grosso, resultante dessa entrevista, possibilitou a realização do levantamento abaixo. Tabela 6 - Número de Empresas constituídas com fins educacionais (Etapas da Educação Básica ou modalidades de ensino) no ano 2000/ 2001 no Estado de Mato Grosso e respectiva regularização junto ao CEE/MT. Fonte: * Relatórios mensais emitidos pela JUCEMAT – 2000/2001 ** Arquivos do Conselho Estadual de Educação- Maio / 2002 174 um desafio ao poder público Em conseqüência da parceria com a Junta Comercial, todas as assessorias pedagógicas dos municípios do Estado, passaram a ser informadas bimestralmente pelo CEE/MT sobre a existência das empresas recém constituídas com seus respectivos endereços a fim de prestarem orientação quanto aos procedimentos necessários para a autorização de funcionamento. Com esse procedimento, foi possível constatar que, das 109 empresas constituídas na Junta Comercial no 2000 e 2001 no Estado com fins educacionais, apenas 25 obtiveram atos de autorização até o final do ano 2001. Embora não se possa dizer que todas essas empresas estejam em funcionamento porque nem todas as assessorias pedagógicas prestaram informações ao Conselho Estadual de Educação até o final da pesquisa. Isso demonstra que a obtenção do ato de autorização de funcionamento do órgão competente, antes do início das atividades, é uma exigência que está posta na legislação, mas não tem sido observada. Está evidente que a cultura do descumprimento às normas ainda não foi superada pelos empresários da educação. Nessa parceria com a Junta Comercial do Estado não há envolvimento de capital ou perdas financeiras para empresários ou para o Estado. Apenas é divulgada a existência de uma escola, desde a sua origem na Junta Comercial aos órgãos locais responsáveis pela fiscalização para que a acompanhe evitando, com trabalho preventivo, o início de atividades irregulares. Manter as informações fornecidas pela Junta Comercial do Estado no Conselho Estadual de Educação sem divulgálas não faria o menor sentido. A cooperação deve ter o único objetivo de facilitar a socialização das informações às assessorias pedagógicas dos municípios, às secretarias municipais de educação e à sociedade numa atitude protetora, mas também estimulando-a para que ela própria reclame seus direitos. No contexto da pesquisa, é fundamental que o Conselho Estadual de Educação, os conselhos municipais de educação dos municípios que instituíram seus sistemas de ensino, a Secretaria de Estado de Educação e as secretarias munici175 Escolas irregulares: pais de educação tenham conhecimento da existência de todas as empresas educacionais desde a sua constituição e também o controle da situação legal de todas as instituições de ensino, não pelo simples fato de tê-lo, mas para que as informações possam ser socializadas massivamente e a comunidade auxilie espontaneamente na fiscalização. A socialização das informações referentes à existência de escolas particulares desde o seu início, bem como da situação legal dos cursos que oferecem, poderá forçar a mudança de mentalidade e automaticamente o controle da oferta da educação escolar básica passará a ser feito também pela própria comunidade evitando, dessa forma, o acúmulo de burocracias nos órgãos educacionais e prejuízos à população. Finalizando o capítulo é fundamental elucidar que: 1- alguns conselhos estaduais de educação já descentralizaram as competências relacionadas à autorização e reconhecimento de cursos. Outros descartaram os procedimentos de reconhecer cursos relativos a educação básica autorizados e alguns incluíram o credenciamento dos estabelecimentos de ensino; 2- os critérios para a obtenção da autorização e reconhecimento de cursos diferem em questões mínimas entre os estados, mas todos os conselhos estaduais de educação consultados estabelecem cada qual suas exigências para que sejam cumpridas por todas as unidades escolares do seu sistema de ensino. As normas emanadas por todos eles são feitas para escolas ideais. As escolas que não atingem essa condição não obtêm o ato de autorização e são consideradas irregulares; 3- a questão da validação dos estudos realizados em escolas irregulares concedida pelo Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso pode solucionar o problema relacionado à vida escolar dos alunos, mas pode favorecer a acomodação dos mantenedores e dirigentes escolares, além de ser um procedimento incompatível com as normas por ele emanadas; 176 um desafio ao poder público 4- o Conselho Municipal de Barra do Garças /MT adotou critérios para a validação de estudos, que por ventura ocorram em escolas irregulares, através de uma norma específica de supervisão das unidades escolares. O procedimento desse Conselho pode servir de parâmetro para outros municípios e para reflexões; 5- a necessidade de maior apoio às secretarias municipais de educação e assessorias pedagógicas dos municípios com relação à regularização das escolas públicas e privadas é evidente para que sejam garantidos os direitos dos cidadãos; 6- a parceria CEE/MT e Junta Comercial do Estado, celebrada a partir desta pesquisa, pode não resolver o problema da oferta irregular da educação básica pela iniciativa privada no Estado de Mato Grosso, mas é uma medida que, aliada às demais ações, tem facilitado a divulgação das escolas particulares existentes, auxiliando no controle interno e poderá possibilitar o envolvimento da própria comunidade na fiscalização das escolas; 7- a modernização dos órgãos educacionais responsáveis pela educação escolar básica, envolvendo a informatização dos dados e o abandono de práticas não mais compatíveis faz-se extremamente necessária no atual momento. É bom que se tenha em mente todas essas considerações sugeridas pelos levantamentos no âmbito do Estado para que se possa ter uma noção clara do problema no município de Cuiabá, assunto do próximo capítulo. 177 Escolas irregulares: Neste capítulo estão concentrados dados específicos sobre a situação de legalidade dos cursos oferecidos pelas unidades escolares do sistema estadual de ensino instaladas no Município alvo da pesquisa, Cuiabá-MT e, também, contribuições e sugestões de alguns segmentos da comunidade cuiabana em relação ao assunto, visando dimensionar o problema em pauta no âmbito do município e trazer os diversos olhares sobre o tema. 1 Caracterização do Município O Município de Cuiabá localiza-se no centro sul matogrossense. Possui uma área de 3.224,68 km2 e uma população de 482.498 habitantes. Esse município vive as conseqüências de um crescimento populacional vertiginoso ocorrido nas últimas décadas e, para se adaptar vem se fortalecendo cada vez mais como um centro comercial e de serviços. Em relação à educação, o município manteve-se integrado ao sistema estadual de ensino até o final do ano 2001 178 um desafio ao poder público e, portanto, todas as escolas das redes estadual, municipal e particular nele instaladas fizeram parte da pesquisa. 2 As redes pública e privada de ensino do Município de Cuiabá/ MT MT,, nos anos 1999 e 2000 A Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá SME / CBÁ tem administrado a rede municipal de ensino segundo as normas estabelecidas pelo Conselho Estadual de Educação, com propostas específicas iniciadas a partir de 1985, em defesa de uma política educacional pautada no exercício da democracia. As suas propostas relacionadas à qualidade do ensino, embora sejam inovadoras e significativas, não foram abordadas. Os caminhos trilhados foram os do controle da oferta da educação escolar básica do ponto de vista legal e, portanto, demonstrar a situação de legalidade dos cursos oferecidos pelas escolas existentes no município e os procedimentos adotados pela Secretaria Municipal de Educação com relação ao assunto foi o ponto de interesse. Para melhor compreensão das políticas de controle adotadas por esse Município, é oportuna uma abordagem, ainda que breve, do modelo de gestão adotado pela SME / CBÁ, na última década. Segundo Maldonado et all (1993) a SME/CBÁ vem trabalhando na construção de um modelo de gestão democrática mesmo antes da promulgação da Constituição Estadual vigente. Esse processo foi interrompido por questões político-ideológicas durante o período de 1985 a 1988, sendo retomado efetivamente em 1993, quando a Prefeitura de Cuiabá firmou um convênio com a Fundação de Ensino Superior do Estado de Mato Grosso- FESMAT, hoje Universidade do Estado de Mato Grosso, com o objetivo de realizar um estudo sobre as experiências de modelos de gestão democrática que subsidiasse a rede pública municipal de ensino para atender as necessidades da população escolar. O estudo culminou na 179 Escolas irregulares: edição do livro Gestão Democrática – Uma proposta para Cuiabá, por Maldonado et all (1993) com significativas discussões que deram origem à Lei nº 3.201, de 10 de novembro de 1993, que dispõe sobre a Gestão Democrática do ensino na rede pública municipal de Cuiabá-MT. Maldonado, na obra citada, faz um resgate profundo e muito rico dos princípios da centralização, descentralização e gestão democrática do ensino público e deixa claro que a gestão democrática não é a solução para todos os problemas educacionais, mas um caminho a ser trilhado em direção à sedimentação da cidadania e da participação social. A proposta de gestão democrática do município está fundamentada em três elementos considerados básicos para o grupo de estudos: a constituição de conselhos escolares comunitários; a eleição de diretores escolares e a transferência de recursos financeiros à unidade escolar. Com esses elementos a escola ganha maior autonomia administrativa, financeira e pedagógica, podendo investir em seu aspecto físico, em formação de professores e em projetos pedagógicos e, assim construir a sua própria identidade. O Município de Cuiabá-MT pode ser considerado um dos pioneiros no Estado, na tentativa de romper o modelo fechado e hierarquizado de gestão da educação pública que prevaleceu por séculos, iniciando essa prática em 1985. Após a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394, de 26 de dezembro de 1996, a lei vigente sobre a Gestão Democrática do Município passou a não corresponder aos anseios da sociedade e, então, foi aprovada a Lei nº 4.120, de 16 de novembro de 2001, que dispõe sobre a instituição da Gestão Democrática na rede municipal de ensino de Cuiabá-MT. A Lei acima mantém os princípios firmados em 1993, e acrescenta alguns preceitos importantes: a co-participação entre o poder público e sociedade na gestão dos Conselhos democraticamente instituídos; transparência dos mecanismos financeiros e pedagógicos das escolas e a eficiência no uso dos recursos financeiros. 180 um desafio ao poder público O art. 2º da mencionada Lei estabelece que a gestão democrática de ensino deve ser entendida como uma ação coletiva, princípio e prática político-filosófica e deve abranger todas as entidades e organismos integrantes da rede municipal de ensino: Conferência Municipal de Educação; Fórum Municipal de Educação; Conselho Municipal de Educação; Conselho de Merenda Escolar; Conselho do FUNDEF / FUEFUM; Conselho do FUNED / SME; Conselho Escolar Comunitário. O Conselho Municipal de Educação do Município de Cuiabá-MT foi criado pela Lei nº 4.131, de 03 de dezembro de 2001, como órgão colegiado de caráter consultivo, deliberativo, normativo e de assessoramento superior da Secretaria Municipal de Educação, com representação paritária entre o Governo Municipal e a sociedade civil organizada, sem que o município tivesse instituído seu sistema de ensino por lei específica. Nesse sentido, é oportuno um comentário visto que há o entendimento de que um sistema de ensino municipal ou estadual deve ser instituído por lei própria. O art. 211 da Constituição Federal reconhece a existência de sistemas municipais de ensino deixando o entendimento de que esses entes federativos já possuem sistema de ensino. A LDB deixa evidente que o município passa a gerir a educação no âmbito de sua competência após a instituição do seu sistema de ensino e CURY no Parecer Orientador- CEB/ CNE nº 30, de 12 de setembro de 2000, que dispõe sobre os sistemas municipais de ensino, deixa claro que, após a Constituição de 1988, os Sistemas de Ensino da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, passaram a ter existência constitucional, usufruindo de existência legal. Assim sendo, há o entendimento de que os municípios podem organizar seus sistemas de ensino, independentemente de criação por lei específica. O estudo sobre a situação de legalidade dos cursos oferecidos pelas escolas do Município de Cuiabá, ainda integrado ao sistema estadual de ensino, foi iniciado com o levantamento do número de escolas irregulares nele existentes e, a 181 Escolas irregulares: tabela a seguir, mostra a dimensão do problema nos anos 1999 e 2000, segundo dados do Conselho Estadual de Educação. Tabela 7 - Número de Escolas que ofereceram cursos irregulares nos anos 1999 e 2000-Cuiabá/MT Dados obtidos nos arquivos do CEE/MT em abril de 2001. O levantamento acima evidencia que no ano 1999, do total de escolas instaladas no Município de Cuiabá/MT nas três redes, 37,4% ofereceram alguma etapa irregular e no ano 2000, 49,6 %. Esses dados, aliados aos do capítulo anterior, surpreenderam-me visto que, no Conselho Estadual de Educação sabia-se da existência de escolas irregulares, mas não se conhecia números que indicassem a dimensão do problema. Isso me despertou para um levantamento que demonstrasse as etapas ou modalidades de ensino que elevam a estatística referente ao número de escolas irregulares no Município e, como resultado, pode-se dizer que da totalidade das escolas instaladas no Município de Cuiabá nas redes pública e privada, destacam -se como oferta irregular pela ordem: a 182 um desafio ao poder público Educação de Jovens e Adultos- EJA 2º segmento, EJA- Ens. Médio, EJA 1º segmento e o Ensino Médio. O levantamento demonstrou ainda que a educação infantil e o ensino fundamental não apresentam grandes problemas no município. A maior preocupação é com relação à Educação de Jovens e Adultos e Ensino Médio. A percentagem de escolas irregulares no município é significativa e, portanto, a pesquisa não poderia deixar de incluir o número de alunos envolvidos nessa problemática. Porém, apurar manualmente esses números em todas as etapas da educação básica ou modalidades de ensino, seria muito moroso e, então, foi feito, apenas, um levantamento do número de alunos que concluíram o Ensino Médio regular ou Supletivo nas escolas públicas e privadas do Município de Cuiabá, no ano 2000. Para esse levantamento, foram utilizados os números de alunos matriculados obtidos pelo Censo Escolar-2001 e a situação de legalidade dos cursos conforme o cadastro de escolas do CEE/ MT. A tabela a seguir facilita a compreensão. Tabela 8 - Nº de Alunos que freqüentaram a 3º série do ensino médio em cursos irregulares no Município de Cuiabá/MT - ano 2000. * Números obtidos através do Censo Escolar/Mt./2001. ** Situação das escolas conforme os arquivos do Conselho em outubro de 2001. 183 Escolas irregulares: A tabela mostra que 38,7% dos alunos que freqüentaram a 3ª série do ensino médio em escolas públicas e particulares do Município de Cuiabá, no ano 2000, fizeram-no em cursos irregulares. Isso não quer dizer que todos esses alunos perderam seus estudos. Recordando o que foi dito no segundo capítulo, quando os cursos são ministrados em condições aceitáveis, são posteriormente validados pelo Conselho Estadual de Educação e grande parte dos alunos nesses casos obtém regularização da vida escolar. Entretanto, esses dados evidenciam que muitas escolas públicas e privadas não estão funcionando segundo as normas vigentes e que os mecanismos de fiscalização não têm sido eficazes no sentido de evitar a ocorrência de cursos irregulares. Nesse contexto, a tarefa precípua do Conselho Estadual de Educação e da Secretaria de Estado de Educação deve ser a de zelar para que as políticas públicas educacionais garantam aos cidadãos o acesso e a permanência à educação escolar básica legalizada e de qualidade em todas as escolas do sistema estadual de ensino. A Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá/MT, contribuindo com o Conselho Estadual de Educação e com a Secretaria de Estado de Educação nessa difícil batalha tem se empenhado na fiscalização das escolas e alguns procedimentos por ela adotados merecem ser destacados. 3 PProcedimentos rocedimentos adotados pela Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá-MT Cuiabá-MT,, para conter a oferta de cursos irregulares no município No segundo capítulo, foi dito que a Secretaria de Estado de Educação é o órgão executivo e fiscalizador das unidades escolares e que, para exercer essa competência, ela delega poderes às assessorias pedagógicas instaladas nos municípios. Foi dito ainda que, no Município de Cuiabá, a fiscalização das escolas públicas estaduais é responsabilidade da 184 um desafio ao poder público Secretaria de Estado de Educação e a fiscalização das escolas públicas municipais e particulares fica a cargo da Secretaria Municipal de Educação-SME/CBA. A SME/CBA tem se dedicado, nos últimos quatro anos, a um trabalho constante para obter o controle da oferta do ensino legalizado no Município. No início do ano letivo de 1998, a Secretaria Municipal de Educação fez um chamamento às escolas que deveriam regularizar seus cursos. Essa ação motivou a instauração do procedimento administrativo que resultou na Notificação Recomendatória nº 016/98, da 12ª Promotoria de Justiça, através da qual o Sr. Secretário Municipal de Educação, atendendo a solicitação do Ministério Público, encaminhou a relação das 43 escolas que funcionavam em Cuiabá sem a devida autorização. A Promotoria de Justiça da Capital Cidadania e Defesa Comunitária, encaminhou à SME/CBA, através do ofício nº 238/98, a Notificação Recomendatória em que notifica o Município de Cuiabá, através do seu Prefeito nos seguintes termos: 1- determinar à sua Secretaria de Educação e Cultura que em constatando através de inquérito administrativo, irregularidade de funcionamento de Escolas Particulares no Município de Cuiabá, aplique as medidas preconizadas pela Resolução 120/93, impondo, consoante delegação da Secretaria Estadual de Educação e Cultura ( Port. 956/95, Art. 1º, inciso IV) as penalidades de advertência; intervenção e cassação de autorização aos estabelecimentos irregulares ou lacração às escolas que funcionem sem autorização; 2- informar pessoalmente a pais e comunidade estudantil prejudicada e divulgar à população em geral, através dos meios de comunicação ( rádio, jornal e televisão), as medidas adotadas e as razões pelas 185 Escolas irregulares: quais as mesmas foram tomadas; 3- viabilizar junto ao Conselho Estadual de Educação, meios para reconhecer a validade do ensino ministrado aos alunos dos estabelecimentos fechados, de modo a reduzir ao máximo o impacto social negativo das medidas; 4- remeter ao Ministério público, cópias dos inquéritos administrativos que ensejam a aplicação das penalidades de suspensão e lacração de empresas, para se estudar a possibilidade de responsabilidade civil e penal dos dirigentes e mantenedores dos estabelecimentos (MINISTÉRIO PÚBLICO, 1998, p. 2). O documento menciona o art. 11, da Lei nº 8.429/92, que diz: constitui improbidade administrativa a omissão que viole deveres de legalidade às instituições e, notadamente, oretardamento ou o deixar de praticar, indevidamente, atos de ofício. (Ibid., p. 04). O Promotor de Justiça encerra o documento concluindo que o Município cumpriu uma de suas prerrogativas ao detectar o funcionamento irregular de diversas empresas particulares de ensino e que somente lhe resta fazer valer o seu “poder de polícia” e evitar que a população continue a ser prejudicada pela ação danosa de certos empresários coibindo, mediante atos de ofício, a continuidade dos serviços dados por irregulares e ainda que a Promotoria de Justiça seja informada ao termo de 30 dias sobre as providências adotadas. A Secretaria Municipal de Cuiabá, com base na Notificação Recomendatória nº 016/98- Ministério Público/Promotoria de Justiça da Cidadania e Defesa Comunitária, publica convocações e editais e determina a lacração das instituições infratoras. Nessa ocasião, foi publicada uma nota em jornal de grande circulação com o seguinte teor: 186 um desafio ao poder público [...] dos 248 estabelecimentos de ensino particulares existentes em Cuiabá, 139 tinham alguma irregularidade e destas apenas 118 procuraram a Secretaria para regularização. Das 21 que ficaram irregulares muitas não possuem sequer a autorização de funcionamento (RIECHELMANN, 19 maio, p. C1,1998). Segundo consta na mesma reportagem, essas escolas não se manifestaram e foram, em seguida, lacradas. A SME/CBA, com o propósito de conter a oferta irregular da educação básica, institui, através da Portaria nº 172/ 98/SSME/GS, de 06 de novembro de 1998, o Certificado de Regularidade para as Escolas Privadas de Educação Básica do Município de Cuiabá. De acordo com essa Portaria, somente podem receber o referido Certificado as escolas que apresentam, anualmente, os atos de autorização e/ou reconhecimento dos cursos que oferecem. Aquelas que oferecerem cursos que não constem do Certificado de Regularidade serão publicamente advertidas e estarão sujeitas as demais penalidades previstas na legislação vigente. A instituição dos certificados de regularidade para as escolas é um procedimento muito válido visto que pressupõe maior ação vigilante por parte da sociedade e do próprio órgão responsável pela educação no Município, além de estimular o compromisso dos mantenedores para com a sua clientela. Conforme nota publicada pela reportagem do Jornal DIÁRIO DE CUIABÁ (1998, 11, nov., p. D4), a partir de então, a SME/CBA passa a vistoriar as unidades escolares em vários aspectos, mas três quesitos são fundamentais para a obtenção do certificado de regularidade: “o espaço físico, a qualificação dos professores e a regularidade fiscal e parafiscal da empresa, junto aos órgãos afins.” Como resultado da verificação nos termos acima, a SME/CBA, após notificações oficiais, lacra 32 escolas no ano 187 Escolas irregulares: de 1998 e 21 em 1999 que estavam funcionando totalmente de forma irregular, sem as mínimas condições para a oferta do ensino e sem autorização do Conselho Estadual de Educação, conforme nota publicada por CARVALHO (1999, p. 2c). No ano 2000, segundo informações obtidas na Diretoria de Documentação e Informação da SME-CBA, apenas 02 escolas foram fechadas. Isso indica que houve uma regressão progressiva dos números a partir de 1998. Sem dúvida, o trabalho da SME/CBA nos últimos anos, embora não tenha solucionado definitivamente o problema, tem sido de grande importância para o controle da oferta do ensino legalizado no Município. Os procedimentos da SME/CBA forçaram, inclusive, as instituições de ensino superior a se preocuparem mais com a questão dos documentos relacionados à vida escolar dos acadêmicos que ao ingressarem no Ensino Superior não apresentavam documentos comprobatórios do Ensino Médio. Com relação a esse assunto, foi publicada no ano de 1998 uma nota em jornal de grande circulação, nos seguintes termos: [...] Com a informatização do setor de registros escolares e documentação, a universidade tem agora uma idéia exata dos alunos que têm pendências com documentos. Com cerca de 8,5 mil universitários, somente no campus de Cuiabá, a UFMT tinha até o ano passado 5 mil alunos com documentos pendentes. Agora o número baixou para 500 (CAMILA BINI, 19 maio, p. C1, 1998). Evidentemente, não se pode afirmar que esses 5.000 alunos tenham cursado o Ensino médio em escolas irregulares. Sabe-se que outros motivos levam alunos a não cumprirem suas obrigações com relação à apresentação dos documentos. Entre eles, o próprio sistema de organização das Ins188 um desafio ao poder público tituições de Ensino Superior que não cobram a documentação. Quando os documentos comprobatórios do Ensino Médio são exigidos no ato da matrícula, sob pena de cancelamento como fixa a legislação pertinente, os alunos, com raras exceções, deixam de apresentá-lo. E quando não o possuem, pressionam as escolas de origem e os órgãos afins até a sua obtenção. A publicação dessa nota despertou-me para a realização de um levantamento em algumas instituições superiores de educação instaladas no município, para verificar o número de alunos que são aprovados em vestibular e não conseguem efetuar matrícula por falta de documentos. Foram então consultadas as seguintes Instituições: Universidade do Estado de Mato Grosso-UNEMAT, Universidade Cuiabá-UNIC, Universidade Federal de Mato Grosso- UFMT, Faculdades Integradas Cândido Rondon-UNIRONDON, Universidade de Várzea Grande-UNIVAG e Instituto Várzea-Grandense de Educação- IVE. A UNIRONDON informou através do of. 008/00: A média de candidatos que deixam de efetuar matrículas após classificação no Concurso Vestibular, por falta de documentos comprobatórios de conclusão do Ensino Médio, gira em torno de 5% num universo de 1600 alunos, Entretanto, não há como comprovar esse índice pois, se o candidato não se matricula, não há registro e vida escolar do mesmo, na secretaria. Informou, ainda que, em média, 30% dos alunos aprovados em vestibular efetuam matrículas mediante um atestado de conclusão do Ensino Médio e que, pelo menos, metade destes apresentam o documento no decorrer do 1º ano; cerca de 10% o entregam nos anos subseqüentes e mais ou menos 5% somente apresentam os documentos quando requerem o registro do diploma de conclusão do 3º Grau. Nessa Instituição, no ano de 2000 e 2001 nenhuma matrícula foi cancelada por falta de documentos. 189 Escolas irregulares: A UNIC/CBA informou que 23 (vinte e três) matrículas foram canceladas no decorrer do curso do 1º ao último ano por falta de comprovação do Ensino Médio. A UNEMAT informou que apenas um aluno foi impedido de efetuar sua matrícula por apresentar Atestado de Conclusão emitido por escola não autorizada. A UFMT não informou. O IVE e a UNIVAG informaram via telefone que não possuem esses dados visto que somente são arquivados os dados de alunos devidamente matriculados. Como se pode observar, não são todas as Instituições de Ensino Superior que registram esses fatos. No entanto, é de domínio público que o fato ocorre e não se pode esquecer o que foi levantado nas páginas anteriores: 38,7% dos alunos que concluíram o Ensino Médio no ano 2000 no Município de Cuiabá o fizeram em escolas irregulares. Por outro lado, é preciso levar em conta que nem todos os alunos que concluem o Ensino Médio em escolas regularizadas ou não, chegam às Universidades. O afunilamento da formação acadêmica é muito grande por diversas razões. Contudo, é preciso garantir à população escola legalizada. O certificado de conclusão ou o diploma referente à última etapa da educação básica para o estudante, se não for necessário para o seu ingresso na faculdade, pode significar a sua permanência no trabalho. Embora, o esforço despendido pela SME/CBA deva ser amplamente reconhecido e divulgado no Estado por ter adotado medidas que minimizaram a situação de irregularidade das escolas, por ter impulsionado outros órgãos a rever suas ações e por ter reduzido o número de escolas totalmente irregulares no município, os levantamentos mostram que o problema não foi solucionado completamente ao longo do período de 1998 a 2001. Basta recordar que no ano 2000, 55% das escolas particulares do Município de Cuiabá/MT ofereceram alguma etapa da educação básica ou modalidade de ensino irregular e que, nesse mesmo ano, foram fechadas 02 escolas mantidas pela iniciativa privada por estarem totalmente irregulares. Isso pode significar que houve maior ob190 um desafio ao poder público servância às normas pelos interessados no momento de constituírem suas empresas, mas o mesmo não está acontecendo com aquelas que estão em funcionamento há vários anos e que oferecem alguma etapa da educação básica irregular. Portanto, outras causas devem existir e outras providências precisam ser tomadas. É oportuno lembrar também, que nos anos 2000 e 2001, das 109 empresas que foram constituídas em todo o Estado, somente 25 se regularizaram perante o CEE/ MT nesse mesmo ano. O desejo de buscar as causas levou-me à realização de entrevistas sobre o assunto e, assim, o contato com elementos da comunidade cuiabana abrangendo mantenedores, dirigentes escolares, professores, alunos e pais, se fez necessário. 4 Contribuições da Comunidade Cuiabana Para complementar a pesquisa com sugestões e contribuições daqueles que convivem diretamente com o problema ou são por ele atingidos, as entrevistas foram um recurso valioso. Lüdke e André (1986, p. 37) com relação aos procedimentos para entrevistas dizem: “o registro feito através de notas durante a entrevista certamente deixará de cobrir muitas coisas ditas e vai solicitar atenção e esforço do entrevistador, além do tempo necessário para escrever.” Ciente do que dizem as autoras sobre as vantagens e desvantagens da utilização dessa técnica e, ainda, que os resultados das entrevistas não representam “verdades,” esse procedimento pareceu-me um instrumento que não poderia deixar de ser utilizado como forma de trazer aos órgãos educacionais ao menos um pouco do que pensam algumas pessoas dos segmentos da comunidade cuiabana que mais convivem com o problema. As entrevistas foram realizadas de janeiro a novembro de 2001, com um número de participantes limitado: 20 diretores de escolas particulares, 20 diretores de escolas públicas, 20 professores, 20 pais e 20 alunos. A limitação de 20 191 Escolas irregulares: participantes por segmento não representa amostragem. Significa apenas um número que foi considerado ideal e exeqüível, pelo tempo que as entrevistas requerem e o prazo para a realização da pesquisa. Quando foram iniciadas as entrevistas nas escolas, percebi que grande parte das pessoas abordadas, ao constatar que o trabalho relacionava-se com irregularidades no funcionamento de escolas e que estava sendo feito por elemento do Conselho Estadual de Educação, temia a identificação e se recusava a prestar esclarecimentos ou o fazia com restrições. Foi necessário, assim, mudar a estratégia e colher os dados em locais variados e de forma aleatória, aproveitando espaços em intervalos de reuniões, seminários de educação, pontos de ônibus, shoppings, condomínios, lojas e correios, sem que as pessoas abordadas precisassem mencionar a que escola estavam ligados. Dessa forma, os entrevistados prestaram informações mais significativas, através de questões padronizadas que visavam o levantamento de alguns números e das questões abertas, cujo objetivo era identificar os diversos olhares sobre o tema. Vale ressaltar que os professores, pais e alunos entrevistados não pertenciam às mesmas escolas e não foram escolhidos por nenhum critério. Simplesmente foram abordados como possíveis colaboradores de uma pesquisa. 4.1 Contribuições de dirigentes escolares de instituições públicas e privadas O objetivo da entrevista com os dirigentes escolares foi basicamente estabelecer uma interação tal que permitisse conhecer o nível de formação, como entendem a questão da regularidade dos cursos oferecidos, como vêem os órgãos responsáveis pelo controle da educação escolar básica e como trabalham a questão com a clientela escolar. As respostas das questões padronizadas foram computadas em forma de tabelas e, as abertas agrupadas por 192 um desafio ao poder público semelhança de idéias conforme a relevância das informações e algumas foram transcritas, tal como foram colhidas. Tabela 9 - Caracterização dos diretores entrevistados. Por esses dados pode-se perceber que 32,5 % dos diretores nas duas esferas estão na função há mais de três anos e que 50% desempenham a função há mais de 05 anos sendo, portanto, profissionais experientes. Esse é um tempo suficiente para um administrador tomar conhecimento da situação legal de todos os cursos oferecidos pela escola e não justifica funcionamento irregular. Com relação à habilitação, 92,5% nas duas esferas possuem curso superior, sendo 45% habilitados em Pedagogia e 47,5 % em outros cursos superiores. Apenas 7,5% dos diretores de escolas particulares possuem o Ensino Médio. As respostas das questões padronizadas permitiram observar que: a) 100% dos diretores consultados de escolas públicas e 55 % dos diretores de escolas particulares participam de encontros, reuniões, seminários etc, promovidos pela SEDUC/ MT e ao serem inquiridos por que não participam, alguns disseram que geralmente não são convocados, outros que a convocação, quando chega, é de última hora e um deles ressaltou que a SEDUC sempre foi muito distante das escolas particulares, 193 Escolas irregulares: Por outro lado, percebe-se que em encontros promovidos por outros órgãos, 75% dos diretores de escolas particulares e 45% de diretores de escolas públicas consultados participam. Esses diretores, em sua maioria, alegaram que participam porque gostam de se manter atualizados e que geralmente o nível desses encontros é muito bom; b) 90% das escolas públicas e 70% das particulares, cujos diretores foram entrevistados, existem há mais de sete anos, o que não justifica o desconhecimento da situação; c) 65% dos diretores de escolas particulares e 25% de escolas públicas informaram que, ao iniciar as atividades, os cursos já estavam autorizados. Os demais disseram que não estavam ou que não tinham conhecimento. Isso mostra que uma percentagem considerável de dirigentes escolares ainda não se preocupa com a questão da legalidade da escola; d) 80 % dos dirigentes de escolas particulares e 60% de escolas públicas, ao serem inquiridos sobre a situação legal dos cursos e se essa situação é esclarecida aos professores, pais e alunos, disseram que sim. Pelas respostas, poder-se-ia deduzir que mais da metade dessa clientela é bem informada, mas não é o que ocorre conforme será detalhado nas páginas seguintes; e) 35% dos diretores de escolas particulares e 40% dos diretores de escolas públicas informaram que os pais procuram informações sobre a legalidade dos cursos. Isso indica que a maioria dos pais não se preocupa com isso ou não tem conhecimento da importância do fato; f) 70% dos diretores de escolas particulares e 75% de escolas públicas consultados estão satisfeitos com as orientações recebidas da SEDUC em relação à regularização dos cursos considerando-as suficientes e muito boas. Nesse particular, cabe uma reflexão: se as orientações são suficientes e muito boas por que ainda há cursos irregulares? Onde estão os entraves? g) 25% de diretores de escolas particulares e 20% de escolas públicas ao serem indagados se sabiam da existência de cursos irregulares na escola, confirmaram que sim; 194 um desafio ao poder público h) Os diretores de escolas públicas indicam como principais motivos da oferta irregular: a morosidade na tramitação de processos, a falta de acompanhamento sistemático para orientações e saneamento de dúvidas e entraves burocráticos. Para os diretores de escolas particulares, os principais motivos são: a dificuldade para obter documentos como certidões e comprovantes de regularidade em órgãos públicos, entraves burocráticos e dificuldade financeira; i) Na opinião de 65% dos diretores de escolas particulares e 45% de escolas públicas, as normas relativas à autorização e ao reconhecimento de cursos são claras e aplicáveis. Os diretores que consideram que as normas não viabilizam a oferta regularizada foram questionados e alguns, de escolas particulares, disseram que a norma é muito burocrática, exige documentos desnecessários e pouco se preocupa com o pedagógico. Os diretores de escolas públicas evidenciaram que normas muito exigentes atrapalham e propiciam o descumprimento. Um deles respondeu dizendo: “Ninguém cumpre e depois o Conselho valida os estudos e fica por isso mesmo, então, a gente se acomoda...” A flexibilização do Conselho em validar os estudos oferecidos por escolas irregulares pode favorecer o descumprimento das normas e levar os diretores à acomodação quanto ao vencimento dos atos legais. Esse pode ser um dos fatores que contribui para a existência de cursos irregulares no Estado; j) As dificuldades encontradas pelos diretores para a manutenção de cursos regularizados foram apontadas livremente e as mais significativas foram enumeradas: 1- Morosidade na tramitação de processos; 2- Burocracias desnecessárias para montagem dos processos; 3- Inadimplência elevada provocando dificuldade para a quitação de compromissos e dificultando a obtenção dos documentos; 195 Escolas irregulares: 4- Falta de amparo legal para o recebimento de mensalidades, dificultando a quitação dos compromissos para a obtenção de certidões negativas; 5- Vinculação da regularidade fiscal e parafiscal da mantenedora com os processos de autorização e reconhecimento de cursos; 6- Falta de orientação aos diretores. A questão da burocracia e da vinculação da regularidade fiscal e parafiscal da mantenedora levantada pelos diretores vem ao encontro do que foi dito no primeiro capítulo. Esses são critérios adotados pelo poder público para garantir a oferta da educação escolar básica pela iniciativa privada à população, por mantenedores idôneos e financeiramente estruturados, mas segundo alguns diretores escolares, constitui-se num entrave para as escolas particulares na manutenção de cursos regularizados visto que uma empresa em débito com os órgãos públicos não consegue obter as certidões negativas e, portanto, não pode regularizar os cursos no CEE/ MT. Descartar essas exigências pode favorecer a ação de oportunistas e a população pode ser prejudicada. Essa é uma questão que precisa ser cuidadosamente analisada e aprofundada, em defesa da população. k) Os diretores indicam que a oferta da educação escolar básica irregular tanto nas escolas privadas como nas públicas está relacionada à: 1- Falta de fiscalização e impunidade aos infratores (mantenedores das escolas públicas e privadas e não aos dirigentes); 2- Morosidade na tramitação dos processos e entraves burocráticos; 3- Falta de responsabilidade dos dirigentes escolares; 4- Falta de acompanhamento sistemático para orientação; 5- Prazo dos atos de autorização muito curtos; 196 um desafio ao poder público 6- Descumprimento das normas; 7- Pouco investimento em recursos humanos. Percebe-se que a mentalidade do controle com rigor por meio de fiscalização pelo poder público está impregnada por toda parte. Um diretor de escola pública alerta que os mantenedores das escolas públicas deveriam ser responsabilizados pela oferta irregular visto que, quem decide sobre o início de funcionamento de um curso não é o diretor da escola, mas a Secretaria de Estado de Educação ou a Secretaria Municipal de Educação. Essa visão evidencia uma lógica que merece ser avaliada. No caso de escolas particulares, os mantenedores são os principais responsáveis pelas infrações cometidas. No caso de escolas públicas, o poder público, como foi dito no primeiro capítulo, é obrigado a atender a demanda escolar criando escolas e oferecendo vagas. É comum, mas não é legal, a escola pública permanecer em funcionamento irregular após três meses de sua criação. Nenhum diretor de escola pública pode alegar desconhecimento das normas que disciplinam a oferta da educação escolar básica. Portanto, mesmo não sendo ele o mantenedor da escola, é o responsável imediato pela regularização dos cursos logo após a criação da escola e, portanto, passível de sanções. l) Para o saneamento do problema em pauta as sugestões dos diretores ao CEE/MT e SEDUC/MT foram: 1- Desburocratização dos órgãos educacionais; 2- Maior agilidade na tramitação de processos; 3- Fiscalização para o cumprimento de normas e punição aos infratores; 4- Preocupação da SEDUC/MT e CEE/MT com as questões pedagógicas e estruturais da escola. Nota-se que os dirigentes escolares estão preocupados com a burocracia existente nos órgãos, com a morosidade na tramitação dos processos, com a fiscalização das uni197 Escolas irregulares: dades escolares quanto ao cumprimento das normas, mas também estão indicando ao CEE/MT e a SEDUC/MT, a necessidade de rever suas ações canalizando esforços para as questões pedagógicas. 4.2 Contribuições de PProfessores rofessores A intenção da entrevista com os professores foi identificar se eles conhecem a situação legal dos cursos que ministram, se são cobrados pelos alunos com relação a esse assunto, se conhecem os motivos que levam escolas públicas e privadas a oferecerem cursos irregulares e, ainda, coletar as suas sugestões sobre o assunto. Tabela 10 - Caracterização dos Professores Entrevistados As questões padronizadas possibilitaram verificar que: a) 50% dos professores entrevistados receberam da direção ou coordenação, informações sobre a situação legal dos cursos que ministram. Isso indica que outros 50% de professores não receberam informações sobre os cursos em que atuam e não procuraram saber; 198 um desafio ao poder público O meio mais adequado para informar a comunidade escolar sobre a situação legal dos cursos é a afixação de cópia do ato de autorização ou de reconhecimento de cada curso em local visível e de circulação, mas esse é um hábito que ainda precisa ser criado por uma boa parte de dirigentes escolares. b) 85% dos professores informou desconhecer a existência de cursos irregulares na escola em que trabalham e ao serem indagados sobre o que pensam a respeito, alguns disseram que isso acontece por fatores burocráticos, falta de interesse da Secretaria de Estado de Educação e incompetência dos administradores que passam pela direção da escola. Um deles fez questão de enfatizar que cabe ao poder público impedir que isso aconteça; c) todos os entrevistados demonstraram conhecer as conseqüências de um curso irregular, alegando que, além de não ter validade, acarreta prejuízos financeiros e perda de tempo aos alunos. Ao serem questionados se os alunos procuram informações sobre o assunto, 09 professores afirmaram que alguns poucos solicitam esclarecimentos e destes, 03 professores informaram que ao serem procurados procuram esclarecer, 04 encaminham à coordenação e apenas 02 incentivam à busca de maiores informações. Nota-se por esses números que os professores não se envolvem nas questões administrativas da escola; d) para os professores, os motivos que levam escolas públicas e privadas a oferecerem cursos irregulares são os entraves burocráticos, o desconhecimento das normas e a displicência dos dirigentes. É bom lembrar que os entraves burocráticos foram lembrados pelos dirigentes escolares e também pelos professores; e) as sugestões dos professores para que a SEDUC/ MT e o Conselho possam coibir a oferta irregular de cursos por escolas públicas e particulares podem ser agrupadas nos itens seguintes: 199 Escolas irregulares: 1- Maior agilidade na apreciação de processos; 2- Informação à comunidade escolar em geral, campanha de esclarecimentos; 3- Divulgação na mídia da relação de escolas regularizadas; 4- Fortalecimento do sistema de fiscalização e sanções; 5- Estabelecimento de normas mais rígidas; 6- Desburocratização dos órgãos. Percebe-se que também os professores estão preocupados com a morosidade na tramitação dos processos, fiscalização e a burocracia inerente aos órgãos educacionais. Mas eles sugerem maiores esclarecimentos à população e o estabelecimento de normas mais rígidas. Os esclarecimentos à população são essenciais numa sociedade democrática, mas o estabelecimento de normas mais rígidas, conforme está demonstrado no segundo capítulo, não tem produzido bons efeitos nesse sentido. Entretanto, a contribuição dos professores reforça a questão da necessidade de desburocratizar os órgãos educacionais para maior agilidade no atendimento à população. 4.3 Contribuições de alunos O principal objetivo da entrevista com os alunos foi conhecer até que ponto eles recebem informações da direção sobre a situação dos cursos que freqüentam na escola, procuram informações a respeito do assunto, se sabem o que significa freqüentar um curso irregular, onde devem recorrer em caso de prejuízos e se participam das decisões da escola. Os 20 alunos foram abordados em locais distantes da unidade escolar: pontos de ônibus, shoppings, lojas e condomínio. 200 um desafio ao poder público Tabela 11 11- Caracterização dos alunos entrevistados As respostas das questões padronizadas possibilitaram perceber que: a) apenas 20% dos alunos receberam informações sobre a situação legal dos cursos no ato da matrícula e dos 80% restantes, apenas 6,25% procuraram informações na secretaria ou diretoria da escola; Ao serem indagados porque não procuram informações, a maioria respondeu que não sabia que isso era importante para sua vida escolar. Alguns disseram que nunca pensaram no assunto e outros porque se matricularam em escola antiga e, portanto, supunham ser regularizada; b) 75% dos alunos sabem o que significa freqüentar um curso não autorizado ou não reconhecido e citaram inclusive algumas conseqüências: “não poder receber o certificado de conclusão ou não poder fazer o vestibular; perda de tempo e de recursos financeiros”; Pode-se perceber que grande parte dos alunos entrevistados conhece as conseqüências para a sua vida escolar, mas, se não forem informados pela direção, não procuram pelas informações. Simplesmente se matriculam. Essa atitude está muito relacionada com a falta de consciência cidadã da qual foi falada no primeiro capítulo. A maioria das pessoas espera que o poder público lhes conceda e garanta seus direitos e não possuem o hábito de conquistá-los ou cobrar providências. Somente se preocupam quando se envolvem em situações problemáticas. 201 Escolas irregulares: c) 40% dos alunos, ao serem questionados sobre o que fariam se fossem informados que o curso em que se matricularam é irregular, responderam que procurariam a SEDUC/ MT, 20% processariam o colégio ou os responsáveis, 20% iriam para a justiça, 15% informaram não saber o que fazer e 01 enfatizou que “reclamaria até o fim do mundo” para resolver o seu problema; d) alunos de escolas públicas sugerem aos interessados que procurem escolas “particulares de nome” porque segundo eles, são menos “bagunçadas” e dificilmente são irregulares. Alunos de escolas particulares sugerem que procurem escolas públicas porque “elas já são regularizadas”; Como se vê, alunos de escolas públicas definem escolas particulares como escolas sérias e regularizadas e alunos de escolas particulares não imaginam que possa existir escola pública irregular. e) apenas 25% dos alunos afirmaram que participam das decisões da escola através de reuniões no pátio ou coleta de sugestões em sala. Um deles disse com orgulho: “Nós é que escolhemos os professores, coordenadores e até os diretores”; f) as sugestões dos alunos ao CEE/MT e SEDUC/MT para que as escolas somente ofereçam cursos regularizados giraram em torno de: fiscalização, aplicações de sanções e divulgação das escolas irregulares nas ruas através de altofalantes, rádio, televisão e jornais, inclusive, “ o jornal do ônibus.” Alguns disseram que os professores e os coordenadores deveriam manter os alunos sempre informados sobre esse assunto. Um deles argumentou: “Não adianta só fiscalizar tem que agir.” Outro disse: “As escolas erradas têm que ir para a TV e jornais e os culpados têm que ser punidos” Um terceiro disse com um tom de voz imponente: “A escola tem que andar direito porque o aluno não está lá para brincar.” Percebe-se que os alunos são mais duros no julgamento. Enquanto os professores e diretores sugerem a divulgação das escolas regularizadas, sanções e mais orientação aos infratores, os alunos sugerem a divulgação das escolas “erradas” mais fiscalização e punição aos diretores. Essas 202 um desafio ao poder público respostas, embora evidenciem que eles possuem noção de sociedade regida por leis que precisam ser cumpridas, pode estar caracterizando também a forma rude e austera como crianças e jovens são tratados pela família e pela sociedade. Outro aspecto a considerar nas entrevistas com os alunos é que não demonstraram receio pela identificação. Um deles o fez com prazer dizendo “eu falo, escrevo e assino embaixo”. Apenas dois alunos abordados se recusaram a prestar informações, não se sabe se por timidez, medo ou outros motivos e foram respeitados. 4.4 Contribuições de PPais ais A entrevista com os pais objetivou, além da coleta de sugestões, diagnosticar até que ponto são informados sobre o assunto, se conhecem a situação legal dos cursos freqüentados por seus filhos, se sabem o que significa um curso irregular e quais motivos levam as escolas a oferecerem esses cursos. Foram abordados, em pontos de ônibus, shoppings, e cursos de educação e desenvolvimento pessoal. Também demonstraram medo de fornecer o nome da escola em que seus filhos estudam e foram respeitados. Tabela 12 - Caracterização dos pais entrevistados 203 Escolas irregulares: A entrevista com os pais possibilitou a obtenção das seguintes informações: a) 45% receberam informações sobre a situação legal do curso no ato da matrícula. Os 55% restantes disseram que não foram informados e também não procuraram saber; b) 100% não tinham conhecimento da existência de cursos irregulares na escola; c) 45% alegaram que nunca se preocuparam com esse assunto e 65% sabiam o que significa um curso irregular e salientaram como conseqüências a perda de tempo, de recursos financeiros, impossibilidade de receber diploma e continuar os estudos. A percentagem dos que não têm consciência da importância do assunto é grande e fica evidente a necessidade de campanhas de esclarecimentos aos pais que não conhecem as conseqüências de um curso irregular para seus filhos; d)as sugestões dos pais ao Conselho e SEDUC/MT para que possam coibir a oferta irregular foram assim agrupadas: 1- fiscalização, sanções, normas mais rígidas; 2- campanhas de conscientização à população através da imprensa falada e escrita sobre o assunto; 3- desburocratização dos órgãos públicos relacionados à educação e modernização visando maior rapidez no atendimento às solicitações das escolas e ao público em geral; 4- obrigação de ressarcimento dos prejuízos causados por essas escolas aos alunos. As sugestões dos pais ao CEE/MT e SEDUC/MT não são muito diferentes dos demais segmentos. As questões ligadas à fiscalização, sanções, desburocratização e esclarecimentos sobre a situação das escolas à população, também foram mencionadas. Contudo, os pais lembraram dos prejuízos causados pelas escolas irregulares e sugerem a obrigatoriedade do ressarcimento, em caso de funcionamento irregular. Evidentemente, os pais são os que mais sofrem as conseqüências 204 um desafio ao poder público em termos financeiros e, portanto, a sugestões são muito válidas para reflexões. As entrevistas, de um modo geral, trouxeram contribuições significativas. Ouvir aqueles que vivenciam os problemas diariamente é, sem dúvida, muito enriquecedor. Os entrevistados evidenciaram a necessidade de desburocratização dos órgãos educacionais para que haja maior agilidade na execução dos serviços essenciais e no atendimento ao público; o fortalecimento da função fiscalizadora do Estado com aplicações de sansões mais rigorosas e sugeriram campanhas de esclarecimentos à população sobre a importância de se freqüentar cursos regularizados em escolas públicas e privadas. Apontaram as dificuldades que encontram no dia a dia da escola e mostraram caminhos que merecem ser avaliados por aqueles que administram a educação no Estado. Muitos outros levantamentos poderiam ser feitos, mas creio que estes são suficientes para a visão geral da situação de legalidade das unidades escolares e para evidenciar a necessidade de se pensar em medidas que não estejam apenas ligadas à rigidez das normas, punição ou intensificação dos mecanismos de fiscalização, mas que estejam relacionadas à mudança de mentalidade a respeito do assunto; ao fim de práticas desnecessárias que causam desperdício de recursos materiais, financeiros e humanos e sobretudo, voltadas às questões pedagógicas das unidades escolares. Sintetizando, procurei evidenciar neste capítulo que: 1- o Município de Cuiabá trabalha uma proposta de gestão democrática há mais de dez anos e até o ano 2001 esteve integrado ao sistema estadual de ensino com vistas a instituir seu próprio sistema de ensino; 2- No ano 1999, 37,4% das escolas instaladas no Município, nas três redes de ensino, ofereceram alguma etapa da educação básica ou modalidade de ensino irregular e no ano 2000 essa percentagem é elevada para 49, 6 %; 205 Escolas irregulares: 3- A Educação de Jovens e Adultos - EJA II segmento, EJA Ensino Médio, EJA I segmento e o Ensino Médio, pela ordem, são as modalidades de ensino e as etapas da educação básica que elevam a estatística das escolas irregulares no município de Cuiabá; 4- no ano 2000, dos 6.429 alunos que concluíram o Ensino Médio em escolas públicas e particulares no município de Cuiabá, 2.490 ou 38,7 % o fizeram em cursos irregulares; 5- a Secretaria Municipal de Educação de Cuiabá tem envidado esforços no sentido de coibir a oferta irregular com procedimentos diferenciados em relação aos demais municípios. Muitas escolas foram fechadas com o apoio do Ministério Público. Certificados de regularidade dos cursos foram expedidos e relações de escolas legalizadas foram divulgadas. Essas ações são muito válidas e contribuem com o Conselho Estadual de Educação e SEDUC/MT, mas ainda não soluciona definitivamente o problema; 6- a parceria com o Ministério Público é necessária para coibir casos abusivos, mas também não é suficiente para banir o problema. Algumas escolas totalmente irregulares são lacradas, porém outras continuam oferecendo alguma etapa ou modalidade de ensino irregular; 7- o município de Cuiabá não está fora do contexto, está entre os 100 municípios que apresentam o problema no Estado. Cortar apenas algumas raízes desse problema crônico o fará brotar ainda mais vigorosamente tempos depois. Um problema como este, que não está localizado, mas disseminado em todo o Estado, requer um tratamento amplo e profundo para que possa ser exterminado definitivamente; 8- 75% dos alunos consultados na capital, conhecem as conseqüências para a vida escolar no caso de freqüentarem cursos irregulares, mas 95% destes, se não forem informados 206 um desafio ao poder público pela direção da escola, no ato da matrícula, não procuram informações. 15% não sabem a quem recorrer. E em caso de prejuízos esperam que a direção, coordenadores e professores os mantenham informados e solucionem o problema; 9- apenas 45% dos pais entrevistados alegaram que foram informados sobre a situação dos cursos no ato da matrícula. Por outro lado, 100% afirmaram que não tinham conhecimento de cursos irregulares na escola onde seus filhos estudam; 11- As principais causas da oferta irregular apontadas pelos diretores, professores, pais e alunos podem ser resumidas: - Dificuldade financeira para quitar compromissos com os órgãos públicos e obter certidões negativas, no caso de escolas particulares; - Falta de normas mais rígidas e aplicação de sansões; - Entraves burocráticos e morosidade na trami-tação de processos; - Desconhecimento das normas; - Displicência dos dirigentes; - Dificuldade na montagem dos processos; - Falta de conscientização e esclarecimentos à população. Pode-se perceber que a cultura da impunidade aos infratores faz com que os responsáveis pela gestão das escolas se acomodem e não se preocupem com os prazos de vigência dos atos legais e, portanto, sérias conseqüências são causadas aos alunos. A flexibilidade do Conselho Estadual de Educação em validar os estudos realizados pelos alunos em escolas irregulares há muitos anos tem solucionado problemas relacionados à vida escolar de uma parcela dos envolvidos, favorecendo a acomodação dos mantenedores ou dirigentes escolares e isso é preocupante. A seguir estão postas algumas considerações finais que foram visualizadas no decorrer da pesquisa. 207 Escolas irregulares: Embora tenham ficado em evidência as principais constatações e alguns elementos para reflexão em cada capítulo, uma pergunta ainda paira no ar e precisa ser retomada: que mistério é capaz de envolver e fazer perpetuar um problema por tanto tempo, assemelhando-se a uma enfermidade que prejudica, debilita, mas não é fatal? Em que fortaleza ele se esconde para sobreviver às intempéries das ações exercidas sobre ele? É oportuno sintetizar que a existência de escolas irregulares neste Estado é um problema crônico que se ancora em três pilares cujas bases estão fixadas profundamente: a) Forma de elaboração de normas através de matriz semelhante à que foi construída no período imperial, com critérios únicos para todas as instituições escolares, desconsiderando as diversidades locais e regionais; b) adoção de mecanismos de fiscalização de caráter corretivo e não preventivo, e manutenção de práticas incompatíveis com a realidade; c) disponibilidade e uso de tecnologias de informação e comunicação escassos e deficientes nos setores educacionais. Com relação à forma de elaboração das normas, foi possível perceber que no período imperial foi construída uma matriz em que as normas relativas à autorização de funcionamento de 208 um desafio ao poder público escolas eram feitas de forma autocrática e para a escola ideal. Ao se estabelecer os mesmos critérios para todas as escolas, independente das especificidades e do local onde estavam inseridas, não eram consideradas as diversidades locais e regionais e tampouco princípios de autonomia. Essa matriz, adequada àquele momento, sofreu ao longo dos anos diversas modificações, mas a sua estrutura foi conservada e trazida ao Período Republicano. O mesmo ocorreu com as normas relativas ao reconhecimento dos cursos. A partir de 1976, neste Estado, também foi construída uma “matriz” específica para esse procedimento. Esses dois “moldes” cristalizaram-se, ao longo dos anos, de tal forma que a construção de uma nova norma sempre teve como base a norma anterior e, com isso, muitos enunciados e algumas nomenclaturas mudaram, mas a estrutura foi conservada ano após ano, século após século, perpetuando-se. Assim, essas práticas foram internalizadas imperceptivelmente, constituindo-se em entraves para a manutenção de escolas regularizadas nos dias de hoje. As normas continuam sendo elaboradas para a escola ideal, como mandamentos do poder público que dita os critérios a serem atingidos por todas as escolas do sistema, determinando o cumprimento, estabelecendo punição aos infratores e, nos casos graves, o fechamento de escolas. As normas que disciplinam a oferta do ensino, elaboradas com as características acima vem sendo descumpridas por escolas públicas e privadas desde o Período Imperial e, ao poder público, nesse caso representado pelo Conselho Estadual de Educação, cabe adotar procedimentos para proteger os alunos. Para tal, esse órgão tem utilizado mecanismos de proteção aos alunos incompatíveis com suas próprias normas como a validação dos estudos, conforme está detalhado no terceiro capítulo. A pesquisa evidencia que as normas atuais relativas a autorização e reconhecimento de cursos exprimem uma preocupação muito grande com a qualidade do atendimento à clientela escolar, estabelecendo critérios que, se fossem cumpridos, poderiam garantir melhor qualidade dos serviços à popu209 Escolas irregulares: lação em escolas públicas e privadas ideais. Essa preocupação é louvável. No entanto, normas produzidas para escolas ideais não são cumpridas por aquelas que estão aquém das exigências e isso favorece o funcionamento irregular principalmente, quando a fiscalização não é suficiente e constante. A forma como essas normas têm sido elaboradas com critérios difíceis de serem alcançados e idênticos para todas as instituições sejam públicas ou privadas, de periferia ou dos grandes centros sem considerar as especificidades e diversidades existentes, não está estimulando a busca ou a conquista espontânea de melhores condições de atendimento, melhorias na qualidade do processo ensino-aprendizagem, dos serviços administrativos e da estrutura física pelas próprias escolas. Os critérios para a obtenção dos atos de autorização e reconhecimento de cursos estabelecidos pelo Conselho Estadual de Educação, sem a participação efetiva da sociedade, têm provocado resistências por parte de algumas instituições que precisam cumpri-los e aqueles que não conseguem cumprir simplesmente os ignora, e escolas continuam em atividade, mesmo sem o ato autorizativo. A partir do ano 2000, o CEE/MT, órgão normativo do Sistema Estadual de Ensino, parece ter encontrado um novo caminho para o estabelecimento de normas e algumas tímidas audiências públicas para discutir normas começaram a acontecer. No entanto, a realização de audiências públicas é também um exercício de cidadania para o poder público que não possui o hábito de fazê-lo. Realizar audiências públicas apenas para que a população legitime as ações do órgão proponente não traduz procedimento democrático. O que caracteriza processo democrático, como diz DEMO (1988), no primeiro capítulo, é a participação efetiva dos segmentos sociais. Neste contexto, a construção conjunta das normas educacionais deve ser a meta precípua do órgão normatizador. Contudo, esse procedimento, por si só, também não garante o respeito às diversidades locais e regionais se forem estabele210 um desafio ao poder público cidos critérios únicos para serem atingidos por todas as instituições educacionais de acordo com a indicação de grupos interessados. O apoio dos segmentos sociais que irão cumprir as determinações legais como os dirigentes escolares de escolas públicas e privadas ou daqueles que irão acompanhar e supervisionar o cumprimento de normas como as Secretarias Municipais de Educação e Assessorias Pedagógicas e, ainda, de parceiros como Conselhos, Sindicatos, Universidades entre tantos outros, é extremamente necessário para que sejam construídas conjuntamente normas que estabeleçam critérios bem definidos, agrupados por ordem de prioridade e que estejam ao alcance de todos, a fim de que a obtenção dos atos legais seja possível para todas as unidades escolares que apresentem condições mínimas aceitáveis, porém sendo estimuladas a buscarem o progresso gradativo até alcançarem as condições ideais. Os segmentos cumpridores sabem o que conseguem cumprir, o poder público deve zelar pela garantia dos direitos dos cidadãos e os segmentos parceiros podem ser fortes colaboradores na busca do ponto de equilíbrio. Na elaboração de uma norma não pode haver polarização, os interesses de ambos os lados devem ser preservados já que Estado e sociedade não são forças antagônicas, como diz BORDIGNON (2002), mas forças complementares. O CEE/MT e a SEDUC/MT, neste contexto, poderiam ser, além de coordenadores, os sistematizadores do processo de construção de normas coletivamente. O que quer a sociedade e o que o poder público pode conceder deve ser compatibilizado por esses dois órgãos numa atitude mediadora para que os interesses, de ambos os lados, embora muito diversificados, sejam resguardados dentro do possível, da justiça e da legalidade. O poder público não pode se eximir da responsabilidade de proteger os cidadãos e de garantir os seus direitos. Os órgãos normativo e executivo do sistema estadual de ensino precisam trilhar caminhos diferentes porque as suas naturezas assim o exigem, mas devem convergir para um mesmo fim, escola pública e privada legalizada e de qualidade à população. 211 Escolas irregulares: É visível neste Estado que, a partir de 1990, e mais especificamente em 2001, os critérios estabelecidos nas normas relativas a autorização e reconhecimento de cursos da educação básica devem ser cumpridos por todas as escolas públicas e privadas, independente dos locais onde estão inseridas. Esses critérios são difíceis de serem alcançados e, então, aquelas escolas que conseguem, cumprem e as que não têm condições deixam de cumpri-las, mas não deixam de funcionar e se tornam infratoras, o que prejudica os alunos. É inegável que no Estado de Mato Grosso há instituições de ensino públicas e privadas funcionando em condições físicas, pedagógicas e administrativas excelentes, boas, ruins e péssimas, cujos cursos foram autorizados e /ou reconhecidos por igual período como foi demonstrado no quarto capítulo. É inútil esperar que uma norma elaborada para a escola ideal, de um momento para o outro, seja cumprida por todas as demais. No Estado, em relação às escolas irregulares, há duas situações distintas: a de escolas públicas e privadas em funcionamento irregular com atos vencidos por não conseguirem cumprir as exigências legais das normas atuais para a renovação desses atos e a de escolas que estão em processo de busca da primeira autorização, mas em condições aquém das exigências legais. Fechar a escola particular por não atingir os critérios estabelecidos na legislação, enquanto há escolas públicas na mesma rua ou mesmo bairro em condições piores, ou impedir o funcionamento de uma escola pública enquanto há escolas particulares em condições ainda mais precárias seria um contra senso nas atuais circunstâncias. Fechar todas as escolas públicas e privadas que não atendem as exigências legais seria provocar um caos social. É imperdoável a oferta da educação escolar pelo poder público em escolas onde tudo é precário, mas isso ocorre. É inadmissível que a iniciativa privada mantenha escolas em condições desfavoráveis, porém isso também ocorre. Não é intenção de a pesquisa sugerir que o órgão normativo do sistema credencie estabelecimentos de ensino 212 um desafio ao poder público ou autorize cursos de escolas públicas ou privadas em condições desfavoráveis, nem tampouco que as exigências sejam reduzidas. O zelo pelos direitos do cidadão é dever do poder público e, sendo assim, é preciso encontrar mecanismos que forcem os mantenedores públicos ou privados a investirem nas escolas que mantém para que sejam garantidos os direitos da clientela escolar no que se refere à estrutura física, pedagógica e administrativa e, ainda, a manterem escolas legalizadas para a população que não pode ser vítima de abusos de qualquer ordem. Como já foi dito, a Lei Complementar Estadual, que organiza o sistema estadual de ensino, permite que o Conselho Estadual de Educação seja composto por representantes dos diversos segmentos da sociedade e seja um órgão mediador entre o Estado e a sociedade em defesa dos interesses coletivos. Com essa lei, a tradição da indicação política, que visava a proteção de interesses particulares ou mesmo políticos, foi rompida. Mas, apesar da representatividade conseguida, o que está impedindo a atuação do órgão normatizador como mediador entre o Estado e a sociedade representando a balança capaz de demonstrar o ponto de equilíbrio entre essas duas forças, que na verdade, não são antagônicas, mas complementares, pode ser justamente a sua rotina de trabalho alicerçada em práticas não mais compatíveis. Para atender as exigências da LDB e Lei Complementar Estadual nº 49/98, já comentadas e atender satisfatoriamente as exigências da sociedade, o descarte de algumas práticas pelo CEE/MT, como explica Bordignon e Cury citados no primeiro capítulo, é fundamental. Os integrantes do Conselho Estadual de Educação entraram, imperceptivelmente, numa roda viva em que todos trabalham intensamente e apesar disso, não conseguem vencer o volume crescente de serviços e, conseqüentemente, não conseguem atender satisfatoriamente as necessidades dos usuários. Para que o CEE/MT consiga romper a tradição cristalizada de sua rotina de trabalho, construir outras “matrizes” 213 Escolas irregulares: de elaboração de normas e possibilitar que a SEDUC/MT também mude as suas em relação à fiscalização e juntos comecem a pensar no estabelecimento de políticas educacionais mais eficazes, é urgente que dê um basta em sua rotina de trabalho, descartando algumas práticas que a atual LDBEN não mais exige ou que não mais se justificam, como explica BORDIGNON, no Parecer 143/02 mencionado no primeiro capítulo. A SEDUC/MT desenvolve ações de acompanhamento e orientação às unidades escolares com base nas normas estabelecidas pelo CEE/MT. Portanto, mudanças na forma de elaboração das normas pelo órgão normativo podem ser benéficas também para o órgão executivo. Reverter esse quadro cristalizado através de normas cada vez mais rígidas, como foi feito no período de 1990 a 2001, seria dar continuidade a procedimentos que não produziram efeitos positivos. A correção dessas distorções não pode ser feita somente através de uma norma, mas lenta e gradativamente se forem levadas em consideração as diversidades locais e regionais. Nesse sentido, a pesquisa traz algumas possibilidades, não como fórmulas, mas apenas como indicativos a serem discutidos, analisados e complementados. Para ajustar o “modelo” existente às necessidades atuais da sociedade, o órgão normativo do sistema pode descartar os procedimentos relativos ao reconhecimento de cursos da educação básica e elaborar normas relativas ao credenciamento dos estabelecimentos de ensino e à autorização dos cursos com participação efetiva de segmentos sociais pertinentes com vistas à consideração das diversidades existentes e à definição dos requisitos essenciais para a emissão dos atos, agrupados por ordem de prioridade. O respeito às diversidades locais e regionais não significa o estabelecimento de critérios diferenciados para essa ou aquela escola. Pode se dar inclusive com o estabelecimento de uma norma única para todas as escolas do sistema estadual de ensino, mas com blocos de requisitos distintos e por ordem de 214 um desafio ao poder público prioridade. As escolas em atividade precisam se ajustar conforme suas condições físicas, pedagógicas e administrativas e buscar o progresso gradativamente até alcançarem as condições ideais. Mas as normas precisam estimular essa busca. Ficou claro na pesquisa que critérios difíceis de serem alcançados não contribuem para a oferta do ensino regularizado e propiciam irregularidades. Critérios fáceis de serem identificados e atingidos são como impostos e taxas públicas comedidas: dificilmente deixam de ser quitados. Para a obtenção do ato legal de credenciamento das instituições de educação básica ou da autorização de cursos numa nova perspectiva, por exemplo, a norma pode incluir requisitos agrupados em três blocos por ordem de prioridade. As escolas que preencherem apenas os requisitos do primeiro bloco, prioritários para a garantia dos direitos dos alunos, podem ter o ato legal de credenciamento e de autorização concedido por um prazo hipotético de 04 anos. Aquelas que preencherem os requisitos dos dois primeiros blocos poderão ter o credenciamento por um prazo de 06 anos e as que preencherem todos os requisitos, poderão ser credenciadas por 08 anos com uma avaliação do poder público a cada 04 anos. Nesse contexto, é oportuno esclarecer que os critérios para o credenciamento de uma instituição de ensino devem se referir à sua mantenedora e às suas condições físicas do estabelecimento e para a autorização dos cursos os critérios devem estar voltados às condições pedagógicas e administrativas. Uma instituição, nesse caso, não poderá ser credenciada por 04 anos e ter cursos autorizados por 06 ou 08, mas poderá obter credenciamento por 08 anos se as condições físicas forem privilegiadas, e ter cursos autorizados por 04 ou 06, dependendo das condições pedagógicas e administrativas apresentadas. Evidentemente, a definição dos critérios para o credenciamento e autorização não pode ser tarefa exclusiva do órgão normativo e executivo do sistema como tem sido feito há quase dois séculos. O envolvimento dos segmentos afins, 215 Escolas irregulares: já mencionados, é fundamental. Esses segmentos podem auxiliar na definição dos requisitos, sua ordem de importância e prioridade para serem preenchidos pelas escolas no momento do credenciamento e da autorização dos cursos. A delimitação dos requisitos, por ordem de prioridade pode ser um mecanismo capaz de estimular as escolas a buscarem por si mesmas e de forma gradativa o progresso nos padrões de atendimento à população, a conservação de sua estrutura física, administrativa e pedagógica. Pode ser, inclusive, um mecanismo capaz de tirar algumas escolas da inércia em que se encontram. Esse mecanismo poderá fazer uma grande diferença na manutenção de escolas legalizadas no Estado visto que todas as instituições, das mais simples às mais sofisticadas, poderão ser credenciadas e ter seus cursos autorizados. A diferença será apenas, que umas preencherão requisitos que outras ainda não conseguem, mas que poderão atingi-los num futuro não muito distante. A adoção de critérios para o credenciamento de instituições de ensino e autorização de cursos, numa ordem de complexidade gradativa e, ainda, sugeridos por aqueles que irão cumpri-los ou avaliá-los, poderá possibilitar a auto-avaliação e o acompanhamento das ações da escola pela própria comunidade escolar e também pelo poder público. Isso pode contribuir para que o sistema seja administrado com maior sucesso e para que o número de processos nos órgãos educacionais seja consideravelmente reduzido. Uma vez credenciado o estabelecimento de ensino, o recredenciamento poderá ser automático com base em Relatórios de Verificação Prévia elaborados pelo órgão executivo e, de uma Declaração do Conselho Deliberativo da Comunidade Escolar atestando as condições da mantenedora e condições físicas do estabelecimento. Com relação ao ato de autorização, este poderá ser renovado mediante a proposta pedagógica e condições administrativas da escola, simplificando sobremaneira a elaboração 216 um desafio ao poder público e análise dos processos e o trabalho dos órgãos afins. O sistema de credenciamento, por bloco de requisitos cumpridos e o da concessão da autorização dos cursos com prazos conjugados aos prazos do credenciamento, poderá provocar na escola o desejo espontâneo ou impulsionado pela própria comunidade de alcançar patamares mais elevados de qualidade estrutural, pedagógica e administrativa. Isso poderá ser altamente favorável à população, que poderá acompanhar o progresso da escola; à escola que poderá se auto-avaliar e partir em busca dos demais requisitos e, ainda, ao poder público que terá facilitado o controle da oferta legalizada e da qualidade da educação escolar básica com o apoio da comunidade. Dessa forma, todas as escolas já instaladas, que apresentem as condições mínimas para a oferta da educação escolar básica, podem ser credenciadas pelo prazo mínimo de 04 anos e serem estimuladas a buscarem os demais requisitos e, conseqüentemente, maiores prazos. Nesse contexto, para evitar a acomodação por parte dos mantenedores e dirigentes escolares das escolas públicas ou privadas que obtiverem o credenciamento mínimo, por 04 anos, podem-se estabelecer regras claras que as impulsione à busca dos demais requisitos e à melhoria gradativa de suas condições de atendimento. Por outro lado, as escolas credenciadas por 08 anos devem receber a cada quatro anos, supervisão do poder público com vistas à garantia do cumprimento dos requisitos referentes às condições físicas do estabelecimento de ensino e estrutura geral da mantenedora. Uma vez credenciada a instituição, para a oferta de etapas da educação básica cabe ao órgão executivo do sistema de ensino supervisionar o cumprimento das normas. Com esse procedimento, não se estaria institucionalizando no Estado de Mato Grosso escolas sem as mínimas condições de funcionamento, uma vez que não seriam credenciadas escolas que não cumprissem o primeiro bloco de requisitos considerados prioritários para o início do funcio217 Escolas irregulares: namento, mas se estaria oportunizando às escolas já instaladas a busca gradativa do progresso com o preenchimento dos demais requisitos visando o atendimento satisfatório em termos de estrutura física, pedagógica e administrativa à população. Com esse mecanismo é provável que, num prazo máximo de 08 anos, o Estado tenha exterminado o problema crônico que vem sendo arrastado por aproximadamente dois séculos e poderá contar com grande número de escolas já cumprindo os dois primeiros blocos de requisitos, ou seja, credenciadas por 04 ou 06 anos e com os cursos devidamente autorizados. O Estado poderá romper uma tradição de quase dois séculos e passar a manter escolas regularizadas e de melhor qualidade e, ainda, órgãos educacionais desafogados de serviços burocráticos. Esse mecanismo pode ser o primeiro passo para que as escolas, especialmente as públicas, alcancem melhorias em suas estruturas físicas, administrativas e pedagógicas. É provável que num futuro, não muito distante todas as escolas tenham alcançado gradativamente os requisitos exigidos na norma e o poder público possa substituir a prática do credenciamento dos estabelecimentos de ensino públicos e a autorização dos seus cursos, por um acompanhamento constante e eficiente capaz de manter escolas em funcionamento compatível com as normas como propõe Bordignon (2002). A delimitação dos requisitos por ordem de prioridades indicada pela pesquisa não deve ser entendida como uma estratégia para simplesmente regularizar escolas, mas, sobretudo, como uma política para impulsionar as instituições de ensino públicas e privadas a buscarem por si mesmas os requisitos que indiquem melhores condições de atendimento à população, adequando-se às normas gradativamente, sob pena de serem preteridas pela própria sociedade. Com referência ao segundo pilar que sustenta a existência de escolas irregulares, ou seja, a adoção de mecanismos de fiscalização pelo poder público e a manutenção de práticas não mais condizentes, a pesquisa mostra que a SEDUC/MT 218 um desafio ao poder público também conservou traços das “matrizes” de fiscalização das unidades escolares construídas no período imperial. No segundo capítulo, ficou claro que neste Estado a fiscalização ou a supervisão pelo poder público sempre foi exercida com maior zelo nas escolas públicas estaduais, ficando as municipais e particulares para o segundo plano. Essa prática foi muito pouco alterada, até o ano 2001. Em função das normas emanadas do CEE/MT, a SEDUC/MT também desenvolveu sua rotina de trabalho de forma: a exercer a supervisão das escolas orientando e verificando as falhas em caráter corretivo; a adotar critérios gerais para todas as escolas desconsiderando as diversidades locais e regionais; a cobrar o cumprimento das normas obrigandose a “fechar os olhos” diante de irregularidades por não conseguir impedir os descumprimentos. É possível que as pessoas responsáveis pela supervisão basearam-se em práticas anteriores, arrastando-as imperceptivelmente de uma gestão para outra, décadas após décadas. A manutenção de práticas e funções é evidente. No primeiro capítulo, ficou entendido que a expressão organização burocrática, no contexto da pesquisa, refere-se à organização hierarquizada, centrada em normas e papéis, funções e práticas. E como se pode ver, os dois primeiros pilares mencionados encontram nesse modelo os seus nutrientes. Nesse particular, haverá quem possa indagar: se a rotina de trabalho ou o fio que prende o CEE/MT e a SEDUC/ MT ao passado for rompido completamente, escolas irregulares deixarão de existir? Provavelmente sim, mas somente se for criada uma nova dinâmica de estabelecimento de normas e de supervisão das unidades escolares e se construir uma identidade própria para esses dois órgãos fazendo convergir as suas forças para um só foco: a realidade. O resgate histórico sobre os mecanismos de supervisão, abordado no segundo capítulo, mostra que do período imperial a 1945 as escolas eram “inspecionadas” por agentes locais. De 1946 a 1995, período em que predominaram idéi219 Escolas irregulares: as centralizadoras, a supervisão foi feita por agentes regionais e, somente a partir de 1995 agentes locais voltaram a supervisionar as escolas. Esse mecanismo foi a melhor forma encontrada e, portanto, deve ser mantido. Porém, para o seu fortalecimento e para se evitar que forças centralizadoras novamente o extermine, o envolvimento efetivo da comunidade é fundamental. O momento democrático em que vive o país e o Estado pede a participação da comunidade na vida da escola e na construção das normas que a regem. O terceiro pilar que sustenta o problema em pauta, é a questão do uso escasso de tecnologias de informação e comunicação como mecanismo de controle interno e externo nos órgãos educacionais. É oportuno recorrer aos argumentos de Silveira apresentados no primeiro capítulo. Ficou claro que as tecnologias estão presentes em todos os locais, mas a maioria da população não possui acesso a elas e uma população desconectada do mundo das informações fica impossibilitada inclusive, de fazer opções. Por outro lado, foi dito que a modernização implica na inserção dos órgãos educacionais no universo tecnológico e numa mobilização rumo ao rompimento de práticas que não mais se justificam. A questão da impossibilidade de acesso da população aos recursos tecnológicos e da modernização ou inserção dos órgãos educacionais no mundo informacional são paradoxais: órgãos educacionais tecnologicamente modernizados para uma população que não tem acesso. Entretanto, não se pode esquecer que o desenvolvimento da cidadania ocorre lenta e processualmente, partindo da necessidade de cada indivíduo. Nesse contexto, é imprescindível que os órgãos educacionais se modernizem e se tornem capazes de disponibilizarem as informações pelos meios de comunicação de massa mais diversificados possíveis: imprensa falada e escrita ou virtual. É preciso atingir todas as camadas da população, como lembra um aluno de periferia durante a entrevista quando sugeriu que a situação das escolas deveria ser divulgada 220 um desafio ao poder público através de rádios, jornais do ônibus e, inclusive, por carros com alto-falantes nas ruas dos bairros. Se esses são, ainda, os meios de comunicação que atingem grande parte da população no Estado, não podem ser ignorados. É possível que um indivíduo não esteja despertado para a busca de seus direitos por não ter conhecimento, condições financeiras ou por estar alienado ou “desconectado”. Nesse sentido, não cabe aos órgãos educacionais desalienálo porque isso só ocorrerá quando ele próprio decidir, mas sim socializar as informações ao maior número de pessoas possível, criar canais de comunicação e mantê-los abertos, para o momento em que ele se dispuser a buscá-las. O processo de conscientização deve caminhar paralelamente a disponibilização das informações, pois um indivíduo pode ter acesso aos meios tecnológicos, mas se não souber articular o seu raciocínio não saberá o que buscar ou o que fazer com as informações encontradas. A mídia e os conselhos escolares pode prestar-se a essa conscientização. Diante da globalização crescente, desencadeada pelo avanço tecnológico, o poder público ligado à educação neste Estado pode seguir uma das duas vertentes descritas no primeiro capítulo: ou ele luta por investimentos em tecnologias de informação e comunicação que permitam a interligação de todos os organismos educacionais, inclusive escolas públicas e privadas, socializando as informações e entrelaçando a sociedade numa só rede, de modo a possibilitar aos indivíduos a sua inserção gradativa no mundo das tecnologias e, ao mesmo tempo conscientiza-los para que possam buscar informações e se tornarem cidadãos mais conscientes, conectados e capazes de fazerem opções; ou, parte para investimentos em tecnologias de informação para a obtenção de maior “controle” numa visão neoliberal de Estado mínimo, adequando-se passivamente às exigências do poder econômico nacional e internacional, distanciando-se cada vez mais dos interesses coletivos. Toda atenção do órgão normativo e mediador entre o Estado e a sociedade, nesse particular, é fundamental. 221 Escolas irregulares: Para encerrar este trabalho que pode ser início de tantos outros, resta dizer, ainda, que hoje, para uma sociedade que se move deslizando velozmente sobre as águas, quatro rodas ou duas asas, lê e interpreta, digita e “clica”, as normas elaboradas pelo poder público que ainda, não deixou totalmente a soberania e também os mecanismos de fiscalização nos moldes conservadores, são questionados e entendidos como forças coercitivas que emperram e punem, provocam resistências e estimulam infrações. O grande desafio para os atuais órgãos responsáveis pela educação não pode ser apenas o de controlar o número de estabelecimentos de ensino os cursos que oferecem, o que fazem com esses cursos, e ainda, o de incluir toda criança na escola. Há um outro desafio emergente a ser considerado, o de incluir no mundo das tecnologias todos os analfabetos tecnológicos que se encontram, em sua grande maioria, dentro das próprias escolas. Alfabetizá-los tecnologicamente e despertá-los para a busca de melhores condições em todos os sentidos é fundamental, visto que não é mais suficiente saber ler, escrever e calcular, mas é necessário que se saiba, além desses atributos interpretar, “clicar,” conectar e, sobretudo, o que fazer com as informações que se pode encontrar. 222 um desafio ao poder público 1 Livros AZEVEDO, Fernando de. A cultura brasileira. 6.ed. Rio de Janeiro, UFRJ, Brasília: Ed. UNB,1996. BORDIGNON, Genuíno. A natureza dos conselhos de educação. Paraíba: CEE, 2000. BRANDÃO,, Carlos Rodrigues.. O que é educação. 33.ed. (Coleção Primeiros Passos), São Paulo: Brasiliense, 1995. BRASIL. Ministério de Educação e Cultura-MEC. Subsídios para credenciamento e funcionamento de instituições de educação infantil. 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Mato Grosso: Entrelinhas, p.15, 29 out. 1996. 230 um desafio ao poder público _______. Lei nº 4.752, de 26 de outubro de 1984. Dispõe sobre a alteração da estrutura organizacional da Secretaria de Estado de Educação. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 2, out. 1984. _______. Lei Complementar n. 14, de janeiro de 1992. Dispõe sobre a estrutura e funcionamento da administração Estadual. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 3-6, jan. 1992. _______. Lei nº 3.201, de 10 de novembro de 1993. Dispõe sobre a Gestão Democrática do ensino na rede pública de Cuiabá. In: Coletânea de Leis da Secretaria Municipal de Educação. Mato Grosso. 1993. _______. Lei Complementar nº 49 de 1º de outubro de 1998 alterada pela Lei Complementar nº 57 de 22 de janeiro de 1999 e Lei Complementar nº 77 de 13 de dezembro de 2000. Altera dispositivos da lei Complementar nº 49, de 1º de outubro de 1998, dispõe sobre a instituição do sistema estadual de ensino de Mato Grosso.In: MATO GROSSO. 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Aprova o Regimento interno do Conselho Superior da Instrução Pública do Estado de Mato Grosso. Gazeta Oficial do Estado. Mato Grosso, n. 2.026 p. 3-6 jan. 1903. _______. Decreto nº 759, de 22 de abril de 1927. Dá novo Regulamento a Instrução Primária do Estado de Mato Grosso. In: Coletânea de Leis e Decretos, SAD.DDA, Arquivo Público Estadual. Mato Grosso, p. 162-227, 1927. _______. Decreto-Lei nº 767, de 21 de junho de 1946. Autoriza o Poder Executivo a extinguir a Diretoria Geral da Instrução Pública Primária do Estado e a criar o Departamento de Educação e Cultura. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 1, 1º jul.1946. _______. Decreto n. 785, de 03 de setembro de 1946. Extingue a Diretoria Geral da Instrução Pública Primária do Estado e cria o Departamento de Educação e Cultura do Estado. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 1, 06 set.1946. _______. Decreto n. 273, de 29 de novembro de 1946. Baixa o Regulamento do Departamento de Educação e Cultura do Estado de Mato Grosso. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p.1,4 dez.1946. 233 Escolas irregulares: _______. Decreto nº 1.588, de 15 de agosto de 1973. Aprova o Regimento da Secretaria de Educação e Cultura (SEC). Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 1-8, 15 ago.1973. _______. Decreto nº 537, de 07 de maio de 1968. Aprova o Regimento da Secretaria de Educação e Cultura. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 3-9, 14 mai. 1968. _______. Decreto nº 1.749, de 29 de novembro de 1973. Aprova o Regimento da Delegacias Regionais de Educação e Cultura. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 3-5, 29 nov.1973. _______. Decreto nº 539, de 7 de agosto de 1980. Aprova o Regimento Interno da Secretaria de Educação e Cultura. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 2-13, 7 ago.1980. _______. Decreto nº 1.199, de 28 de janeiro de 1992. Dispõe sobre a alteração da estrutura organizacional da Secretaria de Estado de Educação, a redistribuição dos cargos de Direção e Assessoramento. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 3 jan. 1992. _______. Decreto nº 2.423, de 23 de dezembro de 1992. Dispõe sobre a alteração da organização do Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso, a redistribuição dos cargos de Direção e Assessoramento. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 1-2, 23 dez.1992. _______. Decreto nº 99, de 17 de abril de 1995, dispõe sobre a alteração da estrutura organizacional da Secretaria de Estado de Educação-SEDUC, a redistribuição de cargos de Direção e Assessoramento. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 1, 17 abr. 1995. 234 um desafio ao poder público 4.3 Resoluções MATO GROSSO, Conselho Estadual de Educação. Resolução nº 049, de 22 de novembro de 1968. Estabelece normas para a Autorização de funcionamento das escolas primárias. In: Coletânea de Resoluções, CEE. Mato Grosso, 1968. _______. Resolução nº 039, de 17 de dezembro de 1976. Fixa normas para a reorganização, autorização de funcionamento, reconhecimento e registro de estabelecimentos de 1º e 2º graus do Sistema Estadual de Ensino. Coletânea de Resoluções, CEE. Mato Grosso, 1976. _______. Resolução nº 58, de 06 de julho de 1977. Dá nova Redação aos Artigos 7º, 31,33, e 36 da Res. 39 de 17 de dezembro de 1976. Coletânea de Resoluções, CEE. Mato Grosso, 1977. _______. Resolução nº 163, de 11 de dezembro de 1990. Fixa normas para autorização de funcionamento de graus de ensino, cursos ou habilitações e de estabelecimentos de ensino da rede particular de 1º e 2º graus, regular, supletivo e de educação Pré-Escolar no Sistema Estadual de Ensino. Coletânea de Resoluções, CEE. Mato Grosso, 1990. _______. Resolução nº 330, de 15 de dezembro 1992. Dispõe sobre a criação, Nova Denominação e Elevação de Nível de Escolas da Rede Pública Estadual e Municipal. In: MATO GROSSO. CEE. Batáru: Edição Especial, 30 anos. Mato Grosso: Entrelinhas, p.133-134, 1996. _______. Resolução nº331, de 15 de dezembro de 1992. Revê e consolida dispositivos referentes às normas para Autorização de funcionamento e Reconhecimento de Estabelecimentos de Ensino da Rede Pública, Estadual e Municipal. In: MATO GROSSO. CEE. Batáru: Edição especial, 30 anos. Mato Grosso: Entrelinhas, p,134-138, 1996. 235 Escolas irregulares: _______. Resolução nº120, de 21 de setembro de 1993. Revê e consolida dispositivos referentes às Normas para Autorização e Reconhecimento de nível de Ensino, Grau, Curso ou Habilitação Profissional, por Modalidade, nos Estabelecimentos de Ensino da Rede Particular de Ensino. In: MATO GROSSO. CEE. Batáru. Edição Especial, 30 anos. Mato Grosso: Entrelinhas, p. 144-158, 1996. _______. Resolução nº118, de 24 de abril de 2001. Fixa normas para autorização e reconhecimento de etapas e modalidades de ensino em nível de Educação Básica, nos estabelecimentos públicos e privados de ensino. In: MATO GROSSO. CEE. Batáru. Edição Especial 30 anos. Mato Grosso: Entrelinhas, p.109-124, 2.002. _______. Resolução nº 01, de 3 de março de 1999. Fixa normas para a Educação Infantil no Sistema Municipal de Tangará da Serra. In: Coletânea de normas, CME, Tangará da Serra. Mato Grosso, 1999. _______. Resolução nº 02, de 3 de março de 1999. Fixa normas para a Educação do Ensino Fundamental no Sistema Municipal de Tangará da Serra. In: Coletânea de normas, CME, Tangará da Serra. Mato Grosso, 1999. _______. Resolução nº 019, de 26 de maio de 1999. Fixa normas de inspeção, desativação de estabelecimentos de ensino fundamental, de educação infantil que compõe o Sistema Municipal de Ensino de Barra do Garças. In: Coletânea de normas, CME, Barra do Garças. Mato Grosso,1999. 4.4 PPareceres areceres CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Parecer Nº 30/ CEB/CNE, de 12 de setembro de 2000. Dispõe Sistemas 236 um desafio ao poder público Municipais de Ensino- CNE-Definição-Parecer Orientador. Relator Conselheiro Carlos Roberto Jamil Cury. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 06 out. seção I, p. 25- 42, out. 2000. CONSELHO DE EDUCAÇÃO do Distrito Federal. Parecer Nº 143, de 30 de julho de 2002. Aprova nova dinâmica de funcionamento para o Conselho de Educação do Distrito Federal. In: Coletânea de normas do CEE. Mato Grosso, 2002. 4.5 PPortarias ortarias MINISTÉRIO DE EDUCAÇÃO E CULTURA/ MEC. Portaria n. 177, de 05 de março de 1998. Dispõe sobre a execução do Censo Escolar. In: PRASEM II, Marcos Legais, 2ª edição. Brasília, DF, 1999. SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO. Portaria Nº 873, de 1992. Concede reconhecimento às escolas da rede pública estadual e municipal, que possuam ato de autorização, vencidos ou a vencer até 30/06/92. In: Coletânea de Portarias, CEE. Mato Grosso, 1992. ________. Portaria Nº 3.273, de 1992. Prorroga o prazo contido na Portaria nº 873/92/SEE. In: Coletânea de Portarias, CEE. Mato Grosso, 1992. ________. Portaria Nº 3.277, de 29 de dezembro de 1992. Concede reconhecimento às escolas públicas estaduais e municipais, que comprovarem ato de criação e ou de elevação de nível. In: Coletânea de Portarias, CEE. Mato Grosso, 1992. _______. Portaria Nº 956, de 1º de junho de 1995. Delega competência para as Equipes de Assessoramento Pedagógico, instaladas nas Secretarias Municipais de Educação ou nas 237 Escolas irregulares: escolas pólos, procederem orientação e acompanhamento às escolas do Sistema Estadual de Ensino. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 4-5, 12 jun. 1995. _______. Portaria nº 038, de 29 de junho de 1999. Estabelece critérios para a designação, composição e define competências das Assessorias Pedagógicas instaladas nos Municípios ou escolas pólos. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p.12-13, 02 jul. 1999. _______. Portaria nº 175, de 21 de dezembro de 2000. Define as competências das Assessorias Pedagógicas nos Municípios. Diário Oficial do Estado. Mato Grosso, p. 15, 21 dez. 2000. SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO. Portaria Nº 172, de 6 de novembro de 1998. Institui o Certificado de Regularidade para as escolas de Educação Básica do Município de Cuiabá/MT. In: Coletânea de Portarias da Secretaria Municipal de Educação. Mato Grosso,1998. 4.6 Ofícios MINISTÉRIO PÚBLICO do Estado de Mato Grosso. 12ª Promotoria de Justiça. Ofício nº 238, de 15 de abril de 1998. Encaminha notificação recomendatória ao Município de Cuiabá. In: Coletânea de Ofícios recebidos do CEE/MT. Mato Grosso, 1998. 5 Documento eletrônico INEP. Consulta sobre obrigatoriedade de resposta ao Censo Escolar pelas escolas particulares. Ednar @inep. gov. br. email enviado em: 10 mai. 2001. Retorno recebido em: 06 de junho de 2001, p. 1. 238