UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Luiza Prado Ricardo dos Santos RELATÓRIO DO ESTÁGIO CURRICULAR OBRIGATÓRIO NO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA CURITIBA 2010 RELATÓRIO DO ESTÁGIO CURRICULAR OBRIGATÓRIO NO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA CURITIBA 2010 Luiza Prado Ricardo dos Santos RELATÓRIO DO ESTÁGIO CURRICULAR OBRIGATÓRIO NO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Medicina Veterinária da Faculdade de Ciências e Saúde da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de Médica Veterinária. Professor Orientador: Prof Manoel Lucas Javorouski o M.Sc. Orientador Profissional: M.Sc. James M. Rasmussen CURITIBA 2010 Reitor Prof. Luiz Guilherme Rangel Santos Pró-Reitor Administrativo Sr. Carlos Eduardo Rangel Santos Pró-Reitora Acadêmica Prof ª. Carmen Luiza da Silva Pró-Reitor de Planejamento Sr. Afonso Celso Rangel Santos Diretor da Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde Profº. João Henrique Faryniuk Coordenador do Curso de Medicina Veterinária Prof ª. Ana Laura Angeli Campus Prof. Sydnei Lima Santos (Barigüi) e Reitoria R. Sydnei Antônio Rangel Santos CEP 82.010-330 – Santo Inácio Fone (41) 3331-7700 TERMO DE APROVAÇÃO Luiza Prado Ricardo dos Santos RELATÓRIO DO ESTÁGIO CURRICULAR OBRIGATÓRIO NO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para a obtenção do título de Médica Veterinária no Curso de Medicina Veterinária da Universidade Tuiuti do Paraná. Curitiba, 03 de dezembro de 2010 Medicina Veterinária Universidade Tuiuti do Paraná Orientador: Profº. M.Sc. Manoel Lucas Javorouski Profº. de Clínica de Animais Selvagens e de Zoológico da UTP Profº. Antônio Carlos do Nascimento Profº. de Zootecnia Geral da UTP Profª. M.Sc.Taís Marchand Rocha Moreira Profª. de Clínica Médica de Pequenos Animais I e II e Semiologia Veterinária da UTP Diretora da Clínica Escola de Medicina de Veterinária da UTP Dedico este trabalho a Deus e a todos aqueles que atuam no bem, principalmente aqueles que ainda têm fé na justiça e na honestidade. AGRADECIMENTOS Muitas pessoas mantiveram um papel essencial neste meu caminho de descoberta, participando ativamente nas discussões quanto aos meus anseios e devaneios, tanto acadêmicos, como pessoais, me incentivando e acreditando sempre no meu potencial. Mãe, obrigada por sempre acreditar em mim, por me incentivar a prosseguir não importando quais fossem os obstáculos, pelos abraços, carinhos, as motivações e confiar nas idéias maluquinhas que tenho de vez em quando. Pai, obrigada por sempre estar do meu lado, pelo amor e a atenção. Por me ensinar a lutar pelo que acreditamos e levar a vida com alegria e esperança. Thaysa, minha melhor amiga e terceira mãe, obrigada por sempre me apoiar. Você é meu orgulho, não tem como eu expressar o quanto te admiro, desde pequena. Vó Edy, que sempre foi minha segunda mãe em todos os ensinamentos e ajudas, a senhora é uma vencedora que sempre me inspirei em sua força. Felipe, meu noivo lindo, meu melhor amigo, meu confidente. Nossa vida juntos só está começando, mas obrigada por sempre me auxiliar em tantos momentos difíceis com palavras de amor e carinho me ajudando a não desistir e a acreditar. Eu te amo muito. Natasha, minha irmãzinha, sempre estarei aqui para você. Povo de Blu, vocês estão sempre no meu coração e no meu pensamento. E finalmente, porém não menos importante, agradeço a instituição e a todos os meus mestres, principalmente aqueles que alimentaram os meus sonhos e minha fé contribuindo para meu desenvolvimento acadêmico. Obrigada professor Manoel pela ajuda e orientação na elaboração deste trabalho de conclusão do curso. A todos os que de forma direta ou indireta, contribuíram para o alcance da conclusão desta etapa da minha formação acadêmica. "Primeiro foi necessário civilizar o homem em relação ao próprio homem. Agora é necessário civilizar o homem em relação à natureza e aos animais. " Victor Hugo. APRESENTAÇÃO Este Trabalho de Conclusão de Curso (T.C.C.) apresentado ao curso de Medicina Veterinária da Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Médica Veterinária, na qual são descritas as atividades realizadas por Luiza Prado Ricardo dos Santos durante o período de 26 de julho de 2010 a 1º de outubro de 2010, no Hospital Veterinário do Zoológico de Minnesota nos Estados Unidos da América cumprindo estágio curricular obrigatório. RESUMO O objetivo deste trabalho é descrever as atividades desenvolvidas durante o período do estágio curricular no Hospital Veterinário do Zoológico de Minnesota nos Estados Unidos da América, no período de 26 de julho de 2010 a 1º de outubro de 2010. São descritos alguns casos clínicos acompanhados, além de procedimentos realizados e instalações do hospital veterinário. Este trabalho foi elaborado pela acadêmica Luiza Prado Ricardo dos Santos do curso de Medicina Veterinária da Universidade Tuiuti do Paraná. Palavras chave: Estágio curricular; Animais Selvagens; Medicina Veterinária; Zoológico. ABSTRACT The aim of this paper is to describe the activities undertaken during the period of the obligatory externship at the Veterinary Hospital of the Minnesota Zoo in the United States, from July 26, 2010 to 1st October 2010. Additionally, some clinical cases accompanied, besides the facilities and procedures. This work was done by the academic Luiza Prado Ricardo dos Santos, student of the Veterinary Medicine course of Tuiuti’s University. Keyword: obligatory externship; Wildlife; Veterinary Medicine; Zoo. SUMÁRIO LISTA DE TABELAS..................................................................................................14 LISTA DE FIGURAS...................................................................................................15 LISTA DE GRÁFICOS................................................................................................18 LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS ................................................19 1. INTRODUÇÃO.......................................................................................................20 2. OBJETIVO GERAL DO ESTÁGIO........................................................................21 3.OBJETIVOS ESPECÍFICOS DO ESTÁGIO...........................................................22 4. LOCAL DO ESTÁGIO............................................................................................23 4.1. SALA DE PROCEDIMENTO...............................................................................26 4.2. SALA DE NECROPSIA.......................................................................................28 4.3. LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS........................................................29 4.4. INTERNAMENTOS.............................................................................................30 4.5. CENTRO CIRÚRGICO........................................................................................30 4.6. QUARENTENA....................................................................................................33 4.7. SALA DE MEDICAMENTOS...............................................................................33 5. ATIVIDADES DESENVOLVIDAS..........................................................................34 5.1. CASUÍSTICA.......................................................................................................36 6. CASOS CLÍNICOS.................................................................................................38 6.1. INSUFICIÊNCIA CARDÍACA EM OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris, G. FISHER, 1814) ...................................................................................38 6.1.1. Revisão de literatura.........................................................................................38 6.1.1.1. Biologia..........................................................................................................38 6.1.1.2. Insuficiência Cardíaca...................................................................................39 6.1.1.2.1. Fisiopatologia.............................................................................................39 6.1.1.2.2. Etiologia......................................................................................................40 6.1.1.2.3. Sinais Clínicos............................................................................................41 6.1.1.2.4. Diagnóstico.................................................................................................41 6.1.1.2.5. Tratamento.................................................................................................43 6.1.1.2.6. Prognóstico.................................................................................................45 6.1.2. Relato de caso..................................................................................................45 6.1.3. Discussão.........................................................................................................51 6.2. PARAPOXVIRUS EM BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus, ZIMMERMANN, 1780) .........................................................................................................................53 6.2.1. Revisão de literatura.........................................................................................53 6.2.1.1. Biologia..........................................................................................................53 6.2.1.2. Ectima Contagioso........................................................................................55 6.2.2. Relato de caso..................................................................................................58 6.2.3. Discussão.........................................................................................................61 6.3. LESÃO CRÔNICA EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei, BLYTH, 1853) ............................................................................................................63 6.3.1. Revisão de Literatura.......................................................................................63 6.3.1.1. Biologia..........................................................................................................63 6.3.1.2. Dermatologia em Répteis..............................................................................65 6.3.2. Relato de caso..................................................................................................67 6.3.3. Discussão.........................................................................................................71 7. CONCLUSÃO........................................................................................................73 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................74 LISTA DE TABELAS TABELA 1 ATIVIDADES CLÍNICAS REALIZADAS NO PERÍODO DE 26 DE AGOSTO A 01 OUTUBRO DE 2010, NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, USA...................................................................36 TABELA 2 - PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS REALIZADOS NO PERÍODO DE 26 DE AGOSTO A 01 OUTUBRO DE 2010, NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, USA...................................................................37 LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 - MAPA DA LOCALIZAÇÃO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, NO ESTADO DE MINNESOTA, CIDADE DE APPLE VALLEY, EUA............................................................................................................................23 FIGURA 2: VISTA PARCIAL DA FACHADA DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA............................................................................................................................25 FIGURA 3: SALA DE PROCEDIMENTOS HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA........................................................................26 FIGURA 4: PROCEDIMENTO DE CORREÇÃO DE BICO EM FALCÃO-PEREGRINO (Falco peregrinus) REALIZADO NA SALA DE TRATAMENTO DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.........................................................................................................................................27 FIGURA 5: PROCEDIMENTO ULTRA-SONOGRÁFICO PARA DIAGNÓSTICO DE HEPATOPATIA EM LINCE-CANADENSE (Lynx canadensis), REALIZADO NA SALA DE TRATAMENTO DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.......................................................27 FIGURA 6: SALA DE NECROPSIA DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.......................................................28 FIGURA 7: PROCEDIMENTO DE NECROPSIA REALIZADO EM BISÃO-AMERIACANO (Bison bison) NO LABORATÓRIO DE DIAGNÓSTICO DA UNIVERSIDADE DE MINNESOTA, USA.................................................................................................................29 FIGURA 8: LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.........................................................................................................................................30 FIGURA 9: CENTRO CIRÚRGICO NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.........................................................................................................................................31 FIGURA 10: PROCEDIMENTO ODONTOLÓGICO DE ROTINA EM LONTRA-ANÃORIENTAL (Aonyx cinerea) REALIZADO NO CENTRO CIRÚRGICO DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA........................................32 FIGURA 11: INDUÇÃO ANESTÉSICA DE LINCE-CANADENSE (Lynx canadensis) EM CÂMARA DE CONTENÇÃO, PARA EXAME DE ROTINA, REALIZADA NO CENTRO CIRÚRGICO DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA.....................................................................................................32 FIGURA 12: RAPTOR CENTER LOCALIZADO NA UNIVERSIDADE DE MINNESOTA, NA CIDADE DE MINNEAPOLIS, EUA................................................35 FIGURA 13: OURIÇO PIGMEU AFRICANO (Atelerix albiventris).............................38 FIGURA 14: CONTENÇÃO QUÍMICA COM ISOFLURANO EM OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris) PARA EXAME RADIOGRÁFICO NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.............................................................................46 FIGURA 15: EXAME RADIOGRÁFICO DE OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris) EM POSICIONAMENTO LATERO-LATERAL NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA (A) SILUETA CARDÍACA AUMENTADA GENERALIZADA. (B) HEPATOMEGALIA (C) OPACIDADE DA REGIÃO PULMONAR; EDEMA PULMONAR............................................................47 FIGURA 16: EXAME RADIOGRÁFICO DE OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris) EM POSICIONAMENTO LATERO-LATERAL APRESENTANDO UM ANIMAL SAUDÁVEL, COM PARÂMETROS CONSIDERADOS NORMAIS PARA A ESPÉCIE....................................................................................................................48 FIGURA 17: EXAME RADIOGRÁFICO DE OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris) EM POSICIONAMENTO VENTRO-DORSAL NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA. (A) ABDÔMEN DISTENDIDO; GRANDE QUANTIDADE DE CONTEÚDO FECAL E GÁS. (B) OPACIDADE DA REGIÃO PULMONAR; EDEMA PULMONAR................................49 FIGURA 18: BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus) NO RECINTO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.............................................................................................................................54 FIGURA 19: LESÃO CARACTERÍSTICA DE ECTIMA CONTAGIOSO EM REGIÃO OCULAR DIREITA DE BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus) DO ACERVO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.............................................................................................................................59 FIGURA 20: LESÃO CARACTERÍSTICA DE ECTIMA CONTAGIOSO EM MEMBRO POSTERIOR ESQUERDO DE BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus) DO ACERVO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.......................................................................................................59 FIGURA 21: BIÓPSIA DE PELE EM BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus) DO ACERVO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.......................................................................................................60 FIGURA 22: JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei).......................63 FIGURA 23: DIFERENCIAÇÃO EM ENTRE AS SUBESPÉCIES DE Manouria emys. (esq.) Manouria emys phayrei. (dir.) Manouria emys emys.......................................64 FIGURA 24: LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei). APARÊNCIA DA LESÃO EM PRIMEIRA AVALIAÇÃO NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.........................................................................................68 FIGURA 25: CURATIVO SUTURADO PARA MELHOR FIXAÇÃO EM LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei). HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.........................................................................................69 FIGURA 26: LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei) APÓS QUATRO DIAS DE TRATAMENTO SEM APRESENTAR MELHORA. HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.............................................................................69 FIGURA 27: LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei) APARÊNCIA DA LESÃO UMA SEMANA APÓS INÍCIO DE TRATAMENTO (Esq.). LESÃO APÓS O DEBRIDAMENTO E LIMPEZA, COM APARÊNCIA DE TECIDO SAUDÁVEL (Dir.). HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA..................................................70 FIGURA 28: LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei) LESÃO NO ÚLTIMO DIA DE TRATAMENTO COM TECIDO SAUDÁVEL E SEM PRESENÇA DE MATERIAL PURULENTO. HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA.............................................................................................................................71 LISTA DE GRÁFICOS GRÁFICO 1 - ÚLTIMO CENSO DE ANIMAIS REALIZADO EM JUNHO DE 2010 NO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA........................................................................24 GRÁFICO 2 - CASUÍSTICA DE PROCEDIMENTOS REALIZADOS NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA, NO PERÍODO DE 26 DE JULHO A 01 DE OUTUBRO DE 2010.......................................................................36 LISTA DE ABREVIATURAS HVMNZ HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA IC INSUFICIÊNCIA CARDÍACA ICC INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CONGESTIVA IECA INIBIDOR DA ENZIMA CONVERSORA DE ANGIOTENSINA NYHA NEW YORK HEART ASSOCIATION 20 1. INTRODUÇÃO O presente relatório tem como objetivo apresentar e descrever as atividades desenvolvidas durante o estágio curricular obrigatório realizado no Hospital Veterinário do Zoológico de Minnesota (Minnesota Zoological Garden) (HVMNZ) no período de 26 de julho a 1º de outubro de 2010. O zoológico está localizado na cidade de Apple Valley, Estado de Minnesota, Estados Unidos da América. A realização de estágio em medicina de animais de zoológico fora do país teve por objetivo aprimorar os conhecimentos obtidos durante a graduação e aplicálos de uma forma mais prática em um local que apresente uma grande rotina de procedimentos. Esse estágio não trouxe apenas uma oportunidade de aprendizado profissional, mas também de experiência pessoal, com a vivência em diferentes costumes sociais e abordagem em procedimentos veterinários. 21 2. OBJETIVO GERAL DO ESTÁGIO Aprimorar e praticar conhecimentos teóricos e práticos obtidos durante a graduação envolvendo manejo e medicina de animais selvagens, além de outras áreas de aprendizado envolvidas na clínica. 22 3. OBJETIVOS ESPECÍFICOS DO ESTÁGIO Acompanhar a rotina em um Hospital Veterinário dentro de um Zoológico de grande porte; aprimorar os conhecimentos sobre a biologia e medicina de espécies selvagens; auxiliar no diagnóstico e tratamento das enfermidades; realizar e interpretar hemogramas e exames bioquímicos de animais selvagens; realizar necropsias; confeccionar dardos e treinar o uso da pistola de CO2. 23 4. LOCAL DO ESTÁGIO O presente estágio foi realizado no Hospital Veterinário do Zoológico de Minnesota (Minnesota Zoological Garden) (HVMNZ) no período de 26 de julho a 1º de outubro de 2010. O zoológico está localizado na cidade de Apple Valley, Estado de Minnesota, Estados Unidos da América (Figura 1). FIGURA 1: MAPA DA LOCALIZAÇÃO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, NO ESTADO DE MINNESOTA, CIDADE DE APPLE VALLEY, EUA. Fonte: http://www.iepc2009.org/about/ann_arbor Fundado em 22 de maio de 1978, com a função de conectar as pessoas aos animais e a natureza. Os programas de educação ambiental e conservação, por ele desenvolvidos, são conhecidos mundialmente. O Zoológico de Minnesota é uma instituição credenciada da Associação de Zoológicos e Aquários (Association of Zoos and Aquariums - AZA) e membro institucional da Aliança dos Parques e Aquários de Mamíferos Marinhos (Alliance of Marine Mammal Parks and Aquariums) 24 e da Associação Mundial de Zoos e Aquários (World Association of Zoos and Aquariums - WAZA). A última contagem dos animais do acervo foi realizada dia 30 de junho de 2010, totalizando 3.681 animais, sendo 514 espécies diferentes (Gráfico 1). Essa análise inclui peixes/invertebrados, aves, mamíferos e répteis/anfíbios. GRÁFICO 1: ÚLTIMO CENSO DE ANIMAIS REALIZADO EM JUNHO DE 2010 NO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Página eletrônica do Zoológico de Minnesota (www.mnzoo.org) O Hospital Veterinário (Figura 2) está localizado no departamento de Saúde Animal (Animal Health), onde também se localiza o setor de conservação do zoológico. Nesse departamento estão instalados: a sala de procedimentos, a sala de necropsia, os escritórios, o laboratório de análises clínicas, o centro cirúrgico, a sala dos répteis, os internamentos internos e externos, a sala de medicamentos, quarentena e a cozinha. a 25 FIGURA 2: VISTA PARCIAL DA FACHADA DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) O hospital veterinário utilizava um banco de dados muito conhecido nos Estados Unidos chamado de Medarks. Este é um programa para organizar dados de animais e manutenção de registros que facilita a documentação e acompanhamento de informações específicas para os animais atendidos por instituições AZA-credenciados. Esse banco de dados possui alguns programas que se especializam em diferentes aspectos de manutenção de registros do animal, incluindo os dados médicos e genealógico. Os registradores de zoológicos e aquários também podem inserir informações e link com os sistemas de dados maiores, incluindo o Sistema Internacional de Informação de Espécies (ISIS). O departamento veterinário do HVMNZ é composto de três veterinários que trabalham em conjunto na maioria dos casos clínicos e procedimentos; duas técnicas em veterinária que são responsáveis em auxiliar os veterinários em procedimentos, além de realizar e supervisionar todos os exames clínicos e parasitológicos realizados no hospital; e três tratadoras responsáveis pelo manejo dos animais na quarentena e internamento. 26 4.1. SALA DE PROCEDIMENTO A sala de procedimento comporta o tratamento de animais de pequeno e médio porte (Figura 3 e 4). Os demais animais são atendidos diretamente no recinto de manutenção daquele animal. FIGURA 3: SALA DE PROCEDIMENTOS HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) Essa sala possui duas máquinas de anestesia inalatória, nas quais sempre é usado o gás isoflurano; uma mesa de procedimento acoplada com uma balança; uma mesa e aparelho de radiografia; geladeira com vacinas e medicamentos que necessitam de refrigeração; aparelho de ultra som (Figura 5) e endoscopia; armários com medicamentos de emergência; um computador para facilitar o acesso da ficha clínica dos animais; armário com seringas, agulhas e equipamentos necessários para exames físicos, coleta de amostras e monitoração dos animais. Junto a essa sala também está o almoxarifado e a sala para revelação de radiografias, além de equipamentos de contenção como câmaras de gás, gaiolas e luvas de couro. 27 FIGURA 4: PROCEDIMENTO DE CORREÇÃO DE BICO EM FALCÃO-PEREGRINO (Falco peregrinus) REALIZADO NA SALA DE TRATAMENTO DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) FIGURA 5: PROCEDIMENTO ULTRA SONOGRÁFICO PARA DIAGNÓSTICO DE HEPATOPATIA EM LINCE-CANADENSE (Lynx canadensis), REALIZADO NA SALA DE TRATAMENTO DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. . Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 28 FF 4.2. SALA DE NECROPSIA No HVMNZ os procedimentos de necropsia eram realizados nos animais em que não estivesse apresentando algum caso de enfermidade crônica e a causa do óbito fosse perceptível (Figura 6). Os animais eram pesados e dados de todos esses procedimentos eram armazenados no sistema de dados. O hospital veterinário do zoológico mantém uma parceria com a Universidade de Minnesota localizada em Minneapolis, já que os três veterinários eram professores da Universidade, a maioria dos procedimentos de necropsia era encaminhada para o Laboratório de Diagnóstico da Universidade (Figura 7). Esse laboratório realizava histopatológico e bacteriológico para todos os animais que recebiam. FIGURA 6: SALA DE NECROPSIA DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 29 FIGURA 7: PROCEDIMENTO DE NECROPSIA REALIZADO EM BISÃO-AMERIACANO (Bison bison) NO LABORATÓRIO DE DIAGNÓSTICO DA UNIVERSIDADE DE MINNESOTA, USA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 4.3. LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS A maioria das análises clínicas e todos os exames parasitológicos eram realizados no próprio hospital veterinário do zoológico pelas técnicas em veterinária. O laboratório era anexo a cozinha e ao depósito do hospital, e nele estão guardadas todas as fichas clínicas dos animais em quarentena. O laboratório era equipado com duas centrífugas, um homogenizador para tubos, três microscópios, um analisador bioquímico, um refratômetro, um contador eletrônico de hemograma (apesar de que a maioria dos exames era contada manualmente devido às particularidades celulares) além entre outros diversos equipamentos (Figura 8). 30 FIGURA 8: LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) Todos os dias eram realizados pelo menos dez exames parasitológicos e três ou mais hemogramas e bioquímicos. 4.4. INTERNAMENTOS O hospital possui quatro salas internas para internamento, cada uma com dois a seis recintos, além de seis recintos externos. Os recintos comportam animais de pequeno a médio-grande porte. Quando um animal maior necessita de internamento fica alojado em recintos reservas localizados em um prédio próximo ao hospital veterinário. 4.5. CENTRO CIRÚRGICO A sala de cirurgia do hospital veterinário do zoológico é equipada com um aparelho de mamografia para realizar radiografias em animais de menor porte, uma 31 incubadora, um aparelho de endoscopia, um kit de tratamento dentário, além de material esterilizado que seja necessário para algum procedimento (Figura 9). FIGURA 9: CENTRO CIRÚRGICO NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) Apesar de o HVMNZ possuir um centro cirúrgico, a maioria das cirurgias é realizada no centro cirúrgico da Universidade de Minnesota, principalmente quando se trata de um procedimento mais especificado. No hospital veterinário do zoológico são realizados apenas pequenos procedimentos que não envolvam muita complicação (Figuras 10 e 11). 32 FIGURA 10: PROCEDIMENTO ODONTOLÓGICO DE ROTINA EM LONTRA-ANÃORIENTAL (Aonyx cinerea) REALIZADO NO CENTRO CIRÚRGICO DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) FIGURA 11: INDUÇÃO ANESTÉSICA DE LINCE-CANADENSE (Lynx canadensis) EM CÂMARA DE CONTENÇÃO, PARA EXAME DE ROTINA, REALIZADA NO CENTRO CIRÚRGICO DO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 33 4.6. QUARENTENA Todos os animais recebidos pelo zoológico devem passar por um período de quarentena que varia de acordo com a espécie. Apenas os peixes possuem um protocolo no qual podem passar o período de quinze dias de quarentena em tanques próximos ao recinto onde serão alojados. Em geral os mamíferos e aves devem ter um período de trinta dias na quarentena. Na primeira semana, após o animal receber uma alimentação controlada e apresentar um comportamento mais passivo, é realizado um exame completo, com coleta de sangue e pêlos/penas para análises. Caso o animal não apresente nenhum quadro de maior preocupação, apenas os tratamentos preventivos são realizados. São coletadas três amostras de fezes para parasitológico e os mamíferos recebem duas doses de vermífugo nesse período de trinta dias. Ao final é realizado outro exame de quarentena e, caso o animal se apresente saudável e sem sinal de parasitas, é liberado para o recinto. 4.7. SALA DE MEDICAMENTOS Localizada próxima a sala de tratamento, apenas os veterinários possuíam a chave do local devido aos anestésicos e medicamentos controlados que eram armazenados. Os equipamentos utilizados para contenção química dos animais também eram armazenados nesse local. 34 5. ATIVIDADES DESENVOLVIDAS As atividades do estágio no Hospital Veterinário do Zoológico de Minnesota iniciavam-se diariamente às oito horas da manhã e encerravam-se às cinco horas da tarde, com uma hora de intervalo para o almoço, totalizando uma carga horária de oito horas diárias, de segunda a sábado. As funções do estagiário durante os procedimentos variam de acordo com o que o médico veterinário responsável pelo caso determinasse antes do procedimento, mas, em geral, envolviam a preparação dos equipamentos e medicamentos para todos os procedimentos realizados naquele dia: o exame físico, sob supervisão de um médico veterinário, em todos os animais anestesiados; a coleta de sangue dos animais que fossem necessários; além de monitorar anestesia e parâmetros físicos. As responsabilidades gerais do estágio são separadas por semana, para que o aluno possa se aprimorar nas diferentes áreas encontradas em um zoológico. Todos os sábados, o estagiário passa o dia nas diferentes áreas com diferentes tratadores. O zoológico é composto de dez áreas diferentes: Animais Tropicais, Aquários, Mamíferos Marinhos, Ruminantes, Educação Ambiental, Fazenda, Animais Regionais, Aves, Show das Aves e Quarentena. Na primeira semana são apresentadas as áreas do hospital, assim como o manuseio do programa de dados, para que fosse possível o estagiário ser responsável em colocar as fichas clínicas de todos os procedimentos em dia. Na segunda semana de estágio inicia-se um treinamento em análises sanguíneas das diferentes espécies encontradas em um zoológico que continua durante todo o estágio. O estagiário deve aprender sobre as particularidades de 35 cada espécie e realizar o hemograma dos animais que tiveram seu sangue coletado. Em seguida, interpretá-lo e inserir no banco de dados Medarks. As semanas seguintes o estagiário passa por um treinamento em preparo e uso dos dardos, e de preparar protocolos anestésicos que seriam revisados pelo veterinário responsável antes do procedimento. Após a terceira semana, iniciam-se também as análises parasitológicos que devem ser realizadas em todos os animais anestesiados e no grupo do acervo determinado por um roteiro naquela semana. Na quarta semana do presente estágio foi possível acompanhar durante dois dias a rotina de um centro de reabilitação de rapinantes, localizado na cidade de Minneapolis, na Universidade de Minnesota. O centro é conhecido como Minnesota Raptor Center (Figura 12) e acolhe, em média 100 aves de rapina internadas. Essas aves chegam ao centro por diversos motivos, como a caça ilegal, alguma enfermidade que impossibilita o comportamento selvagem esperado, atropelamentos e traumas. No centro, o estagiário tem a possibilidade de realizar exames físicos, troca de curativos, coleta de amostra e necropsia. FIGURA 12: RAPTOR CENTER LOCALIZADO NA UNIVERSIDADE DE MINNESOTA, NA CIDADE DE MINNEAPOLIS, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 36 5.1. CASUÍSTICA No período do estágio foram acompanhados 796 procedimentos clínicos, sendo onze peixes, quatorze anfíbios, 45 répteis, 416 aves e 310 mamíferos. Estes procedimentos também incluem exames de rotina realizados, exames parasitológicos e vacinações. GRÁFICO 2: CASUÍSTICA DE PROCEDIMENTOS NO PERÍODO DE 26 DE JULHO A 01 DE OUTUBRO DE 2010, NO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. 1% Casuística 2% 6% Peixes 52% Anfíbios 39% Répteis Mamíferos Aves Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) TABELA 1: ATIVIDADES CLÍNICAS REALIZADAS NO PERÍODO DE 26 DE AGOSTO A 01 OUTUBRO DE 2010, NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Aves Mamíferos Répteis Peixes Anfíbios 3 Casos clínicos 6 Cirurgia 10 Exame de quarentena 2 Exame de rotina Exame de rotina/Tratamento 0 46 Exame pré embarque 1 Exame visual 9 Necropsia 336 Parasitológico 6 Tratamento 416 Total 49 3 3 0 4 6 26 13 29 78 2 50 99 307 0 1 5 0 24 0 0 5 12 47 0 0 0 0 0 1 4 1 5 11 0 3 0 0 0 0 5 7 0 15 Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 37 TABELA 2: PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS REALIZADOS NO PERÍODO DE 26 DE AGOSTO A 01 OUTUBRO DE 2010, NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Nome Comum Espécie Antilocapra Antilocapra americana Antilocapra Antilocapra americana Lemure Vermelho Varecia rubra Rena Americana Rangifer t. caribou Zarro Castanho Aythya nyroca Zarro Castanho Aythya nyroca Zarro Castanho Aythya nyroca Zarro Castanho Aythya nyroca Zarro Castanho Aythya nyroca Zarro Castanho Aythya nyroca Procedimento Orquiectomia, Remoção dos cornos Orquiectomia Hérnia abdominal Orquiectomia Remoção de primeiros dígitos de asa direita Remoção de primeiros dígitos de asa direita Remoção de primeiros dígitos de asa direita Remoção de primeiros dígitos de asa direita Remoção de primeiros dígitos de asa direita Remoção de primeiros dígitos de asa direita Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 38 6. CASOS CLÍNICOS 6.1. INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CONGESTIVA EM OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris, G. FISHER, 1814) 6.1.1. Revisão de Literatura 6.1.1.1. Biologia O Ouriço-pigmeu-africano (Atelerix albiventris) é um mamífero da ordem Eulipotyphla da família Erinaceidae (Figura 13) (HUTTERER, 2008). Essa espécie é encontrada apenas na África Central, é uma espécie pouco conhecida que habita savanas e áreas com vegetação a base de gramínea (COSGROVE, 1986). De acordo com Baumgartner e Isenbugel (1993) esses animais formam ninhos em fendas de rochas, em árvores ocas e habitats semelhantes. Esses animais possuem uma expectativa de vida de sete a dez anos, e os adultos podem alcançar até vinte centímetros de comprimento (HUTTERER, 2008). São animais insetívoros, noturnos e solitários, que apresentam um dimorfismo sexual evidente com as fêmeas menores e apresentando uma coloração mais clara que os machos (BAUMGARTNER e ISENBUGEL, 1993). FIGURA 13: OURIÇO PIGMEU AFRICANO (Atelerix albiventris). Fonte: http://www.projecto-exotico.com/animalia/mammalia/atelerixalbiventris 39 6.1.1.2. Insuficiência Cardíaca 6.1.1.2.1. Fisiopatologia Segundo Keene e Bonagura (2008), a Insuficiência Cardíaca (IC) não é uma doença específica, mas um distúrbio fisiopatológico no qual o débito cardíaco não consegue manter as necessidades de perfusão dos tecidos metabolizantes, limitando, desta maneira, a capacidade de exercícios. Essa síndrome não é de diagnóstico específico, podendo ser decorrente de um ou mais processos subjacentes (COUTO, 2008). A IC pode ser causada por uma incapacidade do coração em ejetar sangue, adequadamente conhecida como insuficiência sistólica; por um enchimento ventricular inadequado, que chamamos de insuficiência diastólica; ou até por uma combinação de ambas (MORAIS, 2004). Segundo Andrade (2007) o animal pode apresentar uma IC esquerda, a qual ocorre no átrio esquerdo e nas veias pulmonares, que pode levar a edema pulmonar, ou uma IC direita, que acomete o átrio direito e veias sistêmicas, podendo causar uma hepatomegalia, ascite e até distensão jugular. Quando o coração não consegue atingir as demandas do organismo, ocorre uma elevação na pressão venosa e capilar, ocasionando uma congestão venosa, com extravasamento de líquido intravascular para o interstício ou cavidades corpóreas, quando isso ocorre chamamos de Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC) (ANDRADE, 2007). A ICC trata-se de um estado avançado fisiopatológico de IC, caracterizado por retenção renal de sódio, pressão venosa elevada e acúmulo de fluídos no 40 pulmão, nos tecidos subcutâneos e nas cavidades corporais (KEENE e BONAGURA, 2008). 6.1.1.2.2. Etiologia A IC geralmente é causada por afecções do coração, mas o animal cardiopata não irá necessariamente apresentar sinais clínicos de congestão ou baixo débito cardíaco (ANDRADE, 2007). É uma doença progressiva e fatal que para se identificar a fase em que o paciente se encontra foi proposta uma classificação pelo New York Heart Association (NYHA) (COUTO, 2008). Segundo Couto (2008), essa proposta está dividida em quatro classes funcionais baseadas na avaliação clínica, sem considerar etiologia e função miocárdica. A Classe I apresenta os pacientes assintomáticos que possuem sopro ou arritmias, porém sem sinais clínicos visíveis; a Classe II é considerada um nível moderado da doença, com o animal apresentando certa intolerância a exercícios, tosse, mas sem influenciar na sua qualidade de vida. Já a Classe III é um estágio mais avançado com tosse, cardiomegalia importante no exame radiográfico e edema pulmonar; por último a Classe IV traz uma sintomatologia grave, com o animal apresentando sinais quando esta em repouso, e sinais radiográficos de ICC, cardiomegalia, efusão pleural e abdominal. As causas da IC são diversas e podem ser separadas de acordo com grupos fisiopatológicos gerais como: insuficiência miocárdica, sobrecarga de pressão, sobrecarga de volume e complacência ventricular reduzida. De acordo com Couto (2008) a maioria dos casos de IC recai em um desses grupos, porém existem outras 41 anormalidades presentes como, por exemplo, anormalidades de funções sistólicas e diastólicas. As causas mais importantes de IC são: endocardiose de válvulas mitral e tricúspide, cardiomiopatia dilatada, efusão pericárdica, hipertensão sistêmica, hipertensão pulmonar, arritmias, endocardite bacteriana, doenças cardíacas congênitas e dirofilariose (KEENE e BONAGURA, 2008). 6.1.1.2.3. Sinais Clínicos De acordo com Schwartz e Melchert (2008) os sinais clínicos da ICC podem ser subdivididos em três grupos: sinais de baixo débito, sinais congestivos no lado esquerdo e sinais congestivos no lado direito. Dentre dos sinais de baixo débito incluem-se cansaço, fraqueza ao exercício, síncope, azotemia pré-renal, cianose e arritmias cardíacas; já em sinais congestivos no lado esquerdo observamos congestão pulmonar e edema (tosse, taquipnéia, dispnéia, ortopnéia, estertores, cianose, hemoptise, e cansaço), ICC direita secundária e arritmias cardíacas. Finalmente nos sinais congestivos no lado direito estão a congestão venosa sistêmica (distensão jugular), congestão hepática, congestão esplênica, efusão pleural, ascite, efusão pericárdica, edema subcutâneo e arritmias cardíacas. (SCHWARTZ e MELCHERT, 2008) 6.1.1.2.4. Diagnóstico Para Keene e Bonagura (2008), a identificação das formas e causas das doenças cardíacas, assim como a classificação dos mecanismos fisiopatológicos da IC, permite um direcionamento da terapia recomendada, com um diagnóstico mais acurado. O diagnóstico da doença cardíaca pode ser realizado inicialmente 42 avaliando a idade, a espécie, o sexo e a raça do animal, e de acordo com a anatomia e a morfologia das lesões, a etiologia da doença, baseado nos sinais clínicos juntamente com exames complementares como radiografia, ecocardiograma, eletrocardiograma e testes laboratoriais clínicos. As radiografias torácicas são importantes para avaliação do coração, dos pulmões e do espaço pleural, sendo importante a observação de cardiomegalia, a identificação de alterações vasculares e a observação de alterações compatíveis com o ICC (MORAIS, 2004). As radiografias são essenciais para diagnóstico diferencial de doenças respiratórias nesses animais (KEENE e BONAGURA, 2008). De acordo com Morais (2004), o exame laboratorial é utilizado para confirmar a presença e a causa da doença cardíaca, assim como a presença e a gravidade da ICC. Os testes utilizados com uma maior rotina são: o teste para dirofilariose, hemoculturas, níveis séricos de troponina cardíaca I, testes de função renal (uréia sanguínea, creatinina sérica) e enzimas da musculatura estriada (creatinina cinase, aspartato aminotranferase). O ecocardiograma é um exame essencial para a confirmação do diagnóstico da doença cardíaca. De acordo com Keene e Bonagura (2008) o exame identifica as lesões cardíacas e a cardiomegalia, mede as funções sistólicas e diastólicas ventricular, avalia a doença cardíaca valvular, identifica os padrões de fluxo anormal e quantifica os gradientes de pressão. A eletrocardiografia pode ser utilizada para avaliar o ritmo cardíaco, porém oferece apenas uma informação indireta da função cardiovascular, portanto não fornecendo critérios definitivos para diagnosticar a IC (MORAIS, 2004). 43 6.1.1.2.5. Tratamento Segundo Schwartz e Melchert (2008) o tratamento de IC tem como principal objetivo aumentar a sobrevida e melhorar a qualidade de vida do paciente. Além disso, seu tratamento visa diminuir os efeitos deletérios causado por uma série de eventos perpetuados pelo organismo em uma tentativa de manter a pressão arterial e o débito cardíaco (ANDRADE, 2007). Na maioria dos casos de ICC é recomendável uma combinação de Furosemida, Oxigênio, Nitroglicerina e Sedação, conhecido como FONS, pois é um tratamento aplicável na maioria dos casos independente da causa (KEENE e BONAGURA, 2008). A terapêutica utilizada irá depender do grau da doença determinado de acordo com a proposta da NYHA, mas em geral pode utilizar diuréticos, inibidores da enzima conversora de angiotensina (iECA), digitálicos, vasodilatadores, simpatomiméticos, compostos bipiridínicos, além de terapia com oxigênio, ansiolítico, supressores de tosse e caso necessário toracocentese/abdominocentese (KITTLESON, 2004). De acordo com Andrade (2007), na IC ocorre comumente edema e efusões, devido à formação da angiotensina II que libera aldosterona causando retenção de água e sódio, e aumento o volume do sangue circulante, aumentando a pressão venosa e capilar, causando o extravasamento de líquido. Para isso usam-se os diuréticos (na veterinária o de escolha é a Furosemida), que inibem a reabsorção de eletrólitos e aumentam a excreção de íons sódio, cloreto, potássio, hidrogênio, cálcio, magnésio e fosfato (KITTLESON, 2004). 44 De acordo com Tárraga (2006), quando existe a presença de disfunção miocárdica sistólica, ou seja, quando o coração apresenta sua capacidade de contração diminuída, os digitálicos são indicados como tratamento. Esses medicamentos apresentam efeito inotrópico positivo, ou seja, inibindo a enzima sódio-potássio-ATPase, consequentemente aumentando o cálcio intracelular (ANDRADE, 2007). Além disso, esses fármacos restabelecem os reflexos barorreceptores, aumentam a atividade parassimpática nos nós sinusal e atrioventricular e nos átrios, e diminuem os efeitos simpáticos. Todas essas ações resultam na diminuição da freqüência cardíaca (TÁRRAGA, 2006). Os vasodilatadores agem causando o relaxamento do músculo liso arteriolar ou venoso, levando a vasodilatação, porém o efeito que esses fármacos exercem sobre a vasculatura pulmonar é irregular e não significativo (KITTLESON, 2004). De acordo com Tárraga (2006) esses fármacos visam controlar os efeitos deletérios causados pela vasoconstrição, sendo classificados em três grupos, de acordo com seu mecanismo de ação: os de ação direta venoso ou arteriolar, os bloqueadores alfa-adrenérgicos e os iECA. Segundo Schwartz e Melchert (2008), os iECA agem inibindo a conversão da angiotensina I em angiotensina II, impedindo todo o processo de extravasamento de líquidos da célula. Já os medicamentos bloqueadores alfa-adrenérgicos bloqueiam os receptores a nível arterial e venoso, diminuindo o tono e a resistência vascular e aumentando o desempenho cardíaco (TÁRRAGA, 2006). E os fármacos de ação direta venosa ou arteriolar desviam o fluxo venoso ou arteriolar tentando melhorar a pré-carga e pós-carga, no caso dos nitratos (TÁRRAGA, 2006); 45 As aminas simpatomiméticas agem aumentando a contração, a velocidade de condução e a frequência cardíaca, ligando-se a receptores cardíacos betaadrenérgicos (KITTLESON, 2004). Porém, esses medicamentos não devem exceder dois a três dias de uso continuo, pois diminuem a resposta inotrópica aos simpatomiméticos, o que reduz a eficácia do medicamento. De acordo com Kittleson (2004), os compostos bipiridínicos agem inibindo a fração III da fosfodiesterase, que é uma enzima responsável pela degradação da AMPc; o aumento da AMPc possui um efeito inotrópico no miocárdio, aumentando sua contratilidade, além de produzir uma pequena dilatação arteriolar sistêmica. Além das terapias apresentadas, pode ser realizado um tratamento de suporte com oxigênio, ansiolítico, supressores de tosse e caso necessário um procedimento de toracocentese/abdominocentese (SCHWARTZ e MELCHERT, 2008). 6.1.1.2.6. Prognóstico Segundo Keene e Bonagura (2008), o prognóstico da ICC dependendo da causa, da gravidade e dos cuidados recebidos pelo paciente, os animais podem sobreviver até um ano após os primeiro sinais clínicos da ICC caso o proprietário mantenha um cuidado correto com auxilio veterinário. Portanto é considerada uma síndrome com um prognóstico geral de reservado a pobre. 6.1.2. Relato de caso Um Ouriço-pigmeu-africano (Atelerix albiventris) fêmea, pesando 395g e com quatro anos de idade foi atendido no Hospital Veterinário do Zoológico de Minnesota 46 (HVMNZ) no dia 10 de agosto de 2010 com histórico de ácaros e apresentando dispnéia. Inicialmente o animal foi submetido à anestesia inalatória via câmara de gás com isoflurano para a realização de exames clínicos e radiográficos (Figura 14). FIGURA 14: CONTENÇÃO QUÍMICA COM ISOFLURANO EM OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris) PARA EXAME RADIOGRÁFICO NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) O animal apresentava uma boa condição física (condição corporal de 3/5), um acúmulo moderado de cálculo dentário e ácaros. Na auscultação foi observado um sopro sistólico grau II/VI, e no exame radiográfico foi encontrado um padrão pulmonar anormal (Figura 15, 16 e 17). Na região próxima ao coração e multifocal ao pulmão foi encontrado um padrão intersticial pulmonar e também foi observado um tamanho cardíaco aumentado Nesse momento, o animal foi tratado para ácaros, com ivermectina, mas como nenhum outro diagnóstico havia sido confirmado, foi 47 coletado sangue para determinar o próximo passo para confirmação de uma possível doença cardíaca como endocardite bacteriana ou uma doença pulmonar. FIGURA 15: EXAME RADIOGRÁFICO DE OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris) EM POSICIONAMENTO LATERO-LATERAL NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA (A) SILUETA CARDÍACA AUMENTADA GENERALIZADA. (B) HEPATOMEGALIA (C) OPACIDADE DA REGIÃO PULMONAR; EDEMA PULMONAR. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 48 FIGURA 16: EXAME RADIOGRÁFICO DE OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris) EM POSICIONAMENTO LATERO-LATERAL APRESENTANDO UM ANIMAL SAUDÁVEL, COM PARÂMETROS CONSIDERADOS NORMAIS PARA A ESPÉCIE. Fonte: Cosgrove (1986) 49 FIGURA 17: EXAME RADIOGRÁFICO DE OURIÇO-PIGMEU-AFRICANO (Atelerix albiventris) EM POSICIONAMENTO VENTRO-DORSAL NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, EUA. (A) ABDÔMEN DISTENDIDO; GRANDE QUANTIDADE DE CONTEÚDO FECAL E GÁS. (B) OPACIDADE DA REGIÃO PULMONAR; EDEMA PULMONAR. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 50 Em 25 de agosto de 2010 o animal retornou ao hospital severamente debilitado e com comprometimento respiratório. Foi relatado que há quatro dias esse animal não estava se alimentando, além de apresentar tosse. O exame clínico revelou caquexia, 10% de desidratação, sopro sistólico grau IV/VI, respiração muito debilitada e pulso arterial fraco. O hemograma indicou leucocitose, neutrofilia, monocitose, linfopenia e basopenia, as quais podiam estar relacionadas a uma reação de estresse, mas considerando o histórico desse animal era provável estar relacionada a uma reação inflamatória, considerando que o animal estava apresentando uma pneumonia secundária à insuficiência cardíaca. O exame bioquímico revelou um aumento na uréia relacionado a azotemia pré-renal que também se pode associar a doença cardíaca diagnosticada. Em função do diagnóstico por meio dos sinais clínicos, raios-X e exames clínicos iniciou-se um tratamento com furosemida-Lasix®, trimetoprim e sulfa, solução fisiológica NaCl 0.9%, tendo o animal ficado internado na câmara de oxigênio. Foi agendado um eco-cardiograma na Universidade de Minnesota com especialistas, para avaliar a severidade da doença, porém no dia seguinte o animal veio a óbito. Na necropsia foi confirmado o diagnóstico de insuficiência cardíaca congestiva. Além de observado ascite moderada, hepatomegalia, edema pulmonar, e que o coração apresentando uma dilatação moderada biventricular. 51 6.1.3. Discussão A IC é um desafio para os médicos veterinários de todas as áreas, em especial no caso do Ouriço-pigmeu-africano (Atelerix albiventris), para o que não existe estudo aprofundado ou relatos de casos de ocorrência. Esses animais, por se tratar de uma espécie selvagem, tendem a esconder os sinais clínicos e se afastar dos tratadores quando apresentam algum desconforto. A ICC é uma síndrome que, no caso desse animal, pode ser relacionada a diversas origens. Como por exemplo, a cardiomiopatia dilatada, mesmo não se tratando de um animal de grande porte e macho, não se sabe, por falta de estudos suficientes o normal esperado para essa espécie, mais se encontra uma ICC tanto de esquerda quanto de direita, assim como um aumento de câmaras cardíacas que podem ser resultados dessa enfermidade. Não pode ser também descartada a hipótese de um alto índice de estresse acometido a esse animal, ela não se tratava de um animal idoso para a expectativa de vida dessa espécie, porém sua função no zoológico era de enriquecimento ambiental, o que aumentava a possibilidade de ter sido o causador da ICC pela hipertensão causada. Para esse animal não foi encontrado nenhum sinal de degeneração em válvulas, descartando a possibilidade de endocardiose, assim como não foi encontrado sinal de dirofilariose, endocardite bacteriana ou efusão pericárdica. O animal atendido no HVMNZ apresentou uma sintomatologia clássica de ICC verificada em pequenos animais, porém pela demora da confirmação do diagnóstico não foi possível dar continuidade com um tratamento efetivo. Quando foi iniciado o 52 tratamento o animal já apresentava uma condição debilitada e irreversível, vindo a óbito. 53 6.2. PARAPOXVIRUS EM BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus, ZIMMERMANN, 1780) 6.2.1. Revisão de Literatura 6.2.1.1. Biologia O Boi-almiscarado (Ovibos moschatus) é um animal da ordem Artiodactyla, da família Bovidae e subfamília Caprinae (DIETERICH e FOWLER, 1986). Segundo Gunn e Forchhammer (2008), trata-se de uma ordem muito variada com cerca de 220 espécies que possui uma grande importância econômica ao homem. O Boi-almiscarado (Figura 18) pode alcançar até 2,3 metros de comprimento e 1,5 metros de altura nos ombros, assim como pesar até 650 kg (GUNN E FORCHHAMMER, 2008). Segundo Dieterich e Fowler (1986), esses animais são herbívoros que no estado selvagem se alimentam de gramíneas, amieiros, salgueiros e arbustos, porém no cativeiro tiveram que se adaptar a fenos e alfafa. O seu nome provém do cheiro característico de almíscar dos machos. Esse odor é produzido em alvéolos na região interna do saco escrotal e armazenado na região abdominal (GREENISH, 1920). Esses animais são nativos das regiões árticas do Canadá, Groelândia, e do Alaska. A população foi expulsa do Alaska no século XIX e no início do século XX, mas foi novamente reintroduzida. A espécie também foi reintroduzida ao norte da Europa, incluindo Suécia, Noruega, Rússia e no Canadá oriental. Esses animais estavam perto da extinção, mas a espécie se recuperou após ser protegida da caça. 54 A população do mundo (até a data de 1999) era estimada entre em 65.000 e 85.000 espécimes e está aumentando, especialmente nas áreas onde o animal foi introduzido no século XX (GUNN E FORCHHAMMER, 2008). São herbívoros de grande porte que normalmente vivem em manadas mistas de sexo e idade de dez a vinte animais, porém já foram relatados grupos com até 400 animais (GUNN E FORCHHAMMER, 2008). No entanto, durante o inverno é comum os pequenos rebanhos de machos solteiros. Os filhotes nascem bem antes que a neve derreta, portanto a amamentação é mantida por reservas de gordura da fêmea (UCMP..., 2010). FIGURA 18: BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus) NO RECINTO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 55 6.2.1.2. Ectima Contagioso Ectima contagioso, dermatite pustular contagiosa, dermatite pustular viral contagiosa, orf, sore mouth, scabby mouth, ou dermatite pustular cutânea é uma doença causada pelo Parapoxvirus da família Poxviridae composto de pelo menos seis cadeias imunológicas (RADOSTITS et al., 2000). Segundo Haig e Mercer (1998) trata-se de um DNA vírus epiteliotrófico com distribuição mundial que induz lesões pustulares agudas na pele. A família Poxviridae inclui os gêneros Orthopoxvirus, Caprinopoxvirus, Suipoxvirus e Parapoxvirus além de outros que ainda não foram classificados (HOWARD e SMITH, 1999). Segundo Peacock (2004), o ectima contagioso é uma doença que acomete comumente ovinos, caprinos e um grande número de artiodactilideos selvagens, causando uma considerável perda econômica, por ser altamente contagioso, além de causar anorexia e dor em variados níveis. Essa doença é de preocupação da vigilância sanitária por se tratar de uma zoonose (PERALTA, 2005). Ocorre principalmente com os cordeiros e cabritos de três a seis meses de idade, porém animais mais novos e adultos também podem ser seriamente acometidos (RADOSTITS et al., 2000). A transmissão pode ocorrer por contato diretamente com os animais afetados ou com os fômites, ou seja, as superfícies ou objetos contaminados por esse animal (ROBISON e KERR, 2001). Os surtos de transmissão ocorrem principalmente em períodos mais secos, por se tratar de uma época em que esses animais estão pastando (RADOSTITS et al., 2000). De acordo com Rasmussen et al. (2004) nos 56 ambientes secos e à temperatura ambiente o parapoxvirus é capaz de sobreviver por até quinze anos. A enfermidade causa lesões em forma de bolhas que quando estouram formam crostas na região dos lábios, olhos e narinas (RADOSTITS et al., 2000). Segundo Nóbrega et al. (2008), as lesões de pele podem ser em vários graus, imperceptíveis ou graves, no início formando pápulas, vesículas e pústulas seguindo para crostas mais espessas. De acordo com Robison e Kerr (2001), dependendo da gravidade e local das lesões, os animais podem parar de se alimentar, ou até apresentar problemas de claudicação, levando essa enfermidade a uma morbidade de 100% e fatalidade variando de 5 a 15 %. Segundo Anderson, Rings e Pugh (2005), pápulas, vesículas e pústulas cutâneas se formam rapidamente, e as crostas amarronzadas a pretas, espessas são mais evidentes nas comissuras orais, podendo causar mastite devido ao comprometimento dos mecanismos de defesa do teto. Raramente há comprometimento dos sistemas respiratórios e gastrointestinais, porém já foi relatada a ocorrência de pneumonia e diarréia (PUGH, 2005). O diagnóstico pode ser confirmado na espécie acometida juntamente com os sinais clínicos, lesões histológicas características e microscopia eletrônica (NÓBREGA et al., 2008). Segundo Radostits et al. (2000), na microscopia eletrônica é possível observar hiperplasia epitelial com células inchadas e degeneradas e alguns queratinócitos apresentam eosinófilo com corpos de inclusão citoplasmáticos. 57 Segundo Pugh (2005), alguns diagnósticos diferenciais a serem considerados quando suspeita de ectima contagioso são dermatose ulcerativa, varíola ovina e dermatofilose. A grande causa de perda econômica com essa enfermidade é decorrente da falta de tratamento específico da doença (RADOSTITS et al., 2000). Segundo Pugh (2005), é importante manter um suporte nutricional e fluidoterapia, pois dependendo da localização das lesões os animais acometidos relutam em se alimentar, facilitando a ocorrência de infecções bacterianas secundárias, e, caso não ocorra uma higienização, podem apresentar crescimento de miíase. As lesões tendem a regredir em um mês caso não exista nenhuma outra complicação (WRIGHT, 1983). De acordo com Robison e Kerr (2001), as lesões começam a aparecer depois de cinco dias após o primeiro contato com o vírus, dois dias depois as crostas começam a se formar. Nos próximos dez dias aumentam a quantidade de crostas e pústulas além de aumentar a vermelhidão ao redor das lesões e seus tamanhos. Em três semanas elas começam a regredir e, caso seja uma ocorrência sem muitos problemas, as crostas caem na quarta semana (ROBISON e KERR, 2001). Porém o vírus possui um período de incubação que pode variar de quatro dias até duas semanas (ANDERSON, RINGS e PUGH, 2005). Em casos graves podem ser encontradas na necropsia lesões de formato irregular com bordas hiperêmicas na cavidade oral e no trato respiratório superior, raramente envolvendo esôfago, abomaso e intestino (RADOSTITS et al., 2000). No início do surto, os animais afetados deverão ser isolados e o restante vacinado, porém essa vacinação não deve ser realizada se existir a suspeita de que 58 os animais que não apresentaram nenhum sinal clínico estejam com a enfermidade (PEACOCK, 2004). Segundo Radostits et al. (2000) a vacinação é feita com uma vacina viral viva. De acordo com Peralta (2005), em humanos a enfermidade possui as lesões, a patogenia e o tratamento semelhantes com o ectima contagioso nos animais, porém ocorre principalmente em dígitos, mãos, rostos e braços. Deve ser administrado um medicamento para prevenir infecções secundárias e para redução da dor, por se tratar de uma enfermidade que causa inchaço e muito desconforto (ROBISON e KERR, 2001). Por esses motivos, de acordo com Peralta (2005), quando se trabalhar com animais infectados deve-se tomar medidas de boas práticas de trabalho, como cuidar com higiene pessoal, usar equipamentos protetores, sempre atentar para limpeza e desinfecção do local, evitar exposição à perfuro-cortantes, destinar corretamente o lixo e, caso necessário, procurar sempre assistência médica. A melhor prevenção é manter o rebanho livre do vírus, examinando qualquer animal que entre no acervo durante o período de quarentena (PERALTA, 2005). 6.2.2. Relato de caso Um Boi-almiscarado (Ovibos moschatus) com peso estimado de 300 kg, macho, de dois anos foi atendido no Zoológico de Minnesota com histórico de apresentar algumas áreas com descoloração ao redor dos dois olhos, a qual também apresentava uma grande quantidade de moscas ao seu redor. A primeira queixa ocorreu no dia 19 de agosto de 2010, e após um exame visual, foi determinado que esse animal fosse acompanhado para avaliar a 59 necessidade de uma contenção química para avaliação. Três dias depois, vários animais do rebanho começaram a apresentar as mesmas descolorações e, nesse momento, começou a se suspeitar de lesões típicas de parapoxvirus ao redor dos olhos e narinas (Figura 19 e 20). FIGURA 19: LESÃO CARACTERÍSTICA DE ECTIMA CONTAGIOSO EM REGIÃO OCULAR DIREITA DE BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus) DO ACERVO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) FIGURA 20: LESÃO CARACTERÍSTICA DE ECTIMA CONTAGIOSO EM MEMBRO POSTERIOR ESQUERDO DE BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus) DO ACERVO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 60 Dois dias após a última avaliação visual, o primeiro animal que havia apresentado as lesões ao redor dos olhos foi anestesiado para realização de uma biópsia de pele (Figura 21) e possível diagnóstico de ectima contagioso (já que o rebanho já possuia histórico de infecção de parapoxvirus). FIGURA 21: BIÓPSIA DE PELE EM BOI-ALMISCARADO (Ovibos moschatus) DO ACERVO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) Para o exame físico o animal foi anestesiado com uma combinação de Carfentanil e Xilazina. Foram encontradas lesões ao redor dos dois olhos, na narina e no membro posterior esquerdo. Havia miíase nas lesões oculares, porém o animal apresentava perda de peso neste momento, provavelmente relacionado a não existência de lesões na cavidade oral. Para tratamento preventivo, foi administrado permetrina tópico para agir como um inseticida e fosfato de tilmicosin – Micotil, para possíveis infecções secundárias. 61 No dia 24 de agosto de 2010 foi confirmada através da histopatologia e microscopia elétrica a presença de partícula indicando ectima contagioso. 6.2.3. Discussão Como não existe tratamento para esse tipo de enfermidade, e provavelmente todos os animais do rebanho já estavam infectados, os tratadores foram orientados a tomar certas medidas preventivas. A ocorrência desse surto durante o período do verão dificultou o tratamento devido à grande presença de moscas e miíase agindo como vetores mecânicos do vírus. Todos os materiais utilizados no manejo (alimentação, limpeza e tratamentos diários) deveriam ser de uso exclusivo do recinto desses animais. As vestimentas utilizadas pela equipe também não deveriam entrar em contato com outras áreas do zoológico, assim como o manejo desses animais deveria ser realizado após todos os outros daquele tratador. Também foi implantado pedilúvio em todos os acessos ao recinto. Como o rebanho é composto de treze animais, sete machos e seis fêmeas (algumas em gestação), a separação dos sexos no período de reprodução não é possível de acordo com a estrutura do recinto desses animais, foi recomendada a orquiectomia, já que esses animais vêm apresentando um problema anual de infecção de parapoxvirus. O boi-almiscarado não se trata de um animal em risco de extinção, além de não ser uma espécie de difícil aquisição para os zoológicos americanos, portanto não existe uma maior preocupação em inviabilizar esses animais para reprodução. 62 No ano de 2009 o mesmo rebanho apresentou uma condição mais severa de parapoxvirus, havendo diversos animais com lesões orais, causando perda de peso. Foi realizada a vacinação dos animais que não haviam entrado em contato com o vírus, porém não se mostrou viável já que a imunidade recebida mediante vacina (vírus vivo) deveria apresentar uma duração de pelo menos um a dois anos. Como os animais não apresentaram uma condição muito preocupante, o tratamento foi apenas preventivo para infecções secundárias e miíase, além de tratar o recinto como os mesmo cuidados de uma área de quarentena. 63 6.3. LESÃO CRÔNICA EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei, BLYTH, 1853) 6.3.1. Revisão de Literatura 6.3.1.1. Biologia O Jabuti-birmanês-negro (Manouria emys phayrei) (Figura 22) faz parte da ordem Testudines da família Testunidae. A espécie é dividida em duas subespécies: M. emys phayrei (Jabuti-birmanês-negro) e M. emys emys (Jabuti-birmanês-marrom) (MCKEOWN, 1990). FIGURA 22: JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei). Fonte: http://animaldiversity.ummz.umich.edu/site/resources/tanya_dewey/tortoise.jpg/view.html Segundo Jacobsen e Tabaka (2004), principal diferença entre as duas subespécies é encontrado nos escudos peitorais. Em M.e.phayrei os escudos peitorais estão perto da linha média, enquanto que em M.e.emys eles estão 64 amplamente separados (Figura 23). A M.e.phayrei é uma subespécie do norte, encontrando-se do centro e do norte da Tailândia, em Myanmar, em Assam, na Índia e em Bangladesh (BUHLMANN, RHODIN, VAN DIJK 2010). De acordo com Mckeown (1990), esses animais podem chegar a até 50 centímetros de comprimentos e pesar até 46 kg. Eles geralmente possuem coloração da carapaça marrom, verde-oliva escuro ou preto cúpula (JACOBSEN e TABAKA, 2004). FIGURA 23: DIFERENCIAÇÃO EM ENTRE AS SUBESPÉCIES DE Manouria emys. (esq.) Manouria emys phayrei. (dir.) Manouria emys emys. Fonte: - http://www.chelonia.org/articles/burmmtortoise.htm Esta é a maior tartaruga terrestre da Ásia e é considerada a quarta maior do mundo (MCKEOWN, 1990). Segundo Jacobsen e Tabaka (2004), a frente dos membros anteriores é coberta com grandes e pesadas escamas de sobreposição. Além disso, há um agrupamento de grandes escamas em cada coxa. Segundo Mckeown (1990) as escamas da coxa são tão pronunciadas que esta espécie é muitas vezes referida como a "seis pernas" ou "seis patas". Sua alimentação é muito variada, normalmente é composta de gramíneas como trevo, dente de leão, entre outras ervas de folha larga (MCKEOWN, 1990). Também se alimentam de verduras, couve-flor, abóbora, frutas e minhocas (JACOBSEN e TABAKA, 2004). 65 6.3.1.2. Dermatologia em Répteis De acordo com Cooper (2006), a pele dos répteis é queratinizada e age como um recurso característico desses animais, realizando a mesma função que o tegumento para as demais espécies. Porém para os répteis ela protege o animal de abrasões, de dessecações, dos raios ultravioleta e age como uma barreira para organismos exógenos (COOPER, 2006). Segundo Bennett (1994), a epiderme é revestida por escamas ou cascos que variam de tamanho e formato de acordo com a espécie de réptil em questão. Histologicamente, a epiderme desses animais é composta de três camadas. O estrato córneo externo é altamente queratinizado, acelular, e tem uma superfície serrilhada. A zona intermediária é composta por células filhas do estrato germinativo, que é a camada mais inferior, em vários estágios de diferenciação. Estas três camadas estão presentes durante a fase de dencanso da pele (BENNETT, 1994). A ecdise ou troca de pele é um processo regulado pelos hormônios tireoidianos. Começa com as células do estrato germinativo sofrendo mitose simultâneas para formar uma nova zona intermediária e estrato córneo sob a velha geração (GOULART, 2006). A ação das enzimas quebra as células da base da antiga zona intermediária, e o fluxo linfático provoca a separação entre a antiga zona intermediária e o estrato córneo novo (BENNETT, 1994). Segundo Bennett (1994), os vasos sangüíneos se tornam ingurgitados e incham rompendo a pele velha e completando a ecdise. Em quelônios e crocodilianos, proliferação e queratinização são contínuas e derramamento dessa pele ocorre somente em regiões flexíveis do corpo. Isso produz anéis de crescimento entre estas escamas quando eles crescem 66 e as anteriores, as camadas de menor não são perdidos (COOPER, 2006). A freqüência de ecdise é proporcional à taxa de crescimento e metabolismo do animal, mas geralmente leva de dez a quatorze dias (COOPER, 2006). Cooper (2006) cita ainda que a zona intermediária é composta de tecido mesenquimal, principalmente conectivo, que engloba canais linfáticos, veias sanguíneas, nervos e cromatóforos (células especializadas capazes de refletir a luz e dar coloração a alguns animais). O processo de cicatrização ocorre em fases similares das observadas em mamíferos. Inicialmente os fluídos proteináceos juntamente com fibrina preenchem a lesão a fim de formar uma crosta, em seguida uma camada única de células epiteliais migra abaixo dessa crosta. Essa camada então se prolifera para restaurar a espessura de um epitélio íntegro. Além disso, os macrófagos e heterófilos migram para essa região, e eliminam as bactérias (MADER e BENNETT, 2006). Ainda, Mader e Bennett (2006) comentam que ocorre a formação de uma cicatriz fibrosa transversalmente pelos fibroblastos que migram para a região. Segundo Cubas e Baptistotte (2006), os quelônios possuem um casco rígido que os protege da variação de temperatura, predadores e pressões ambientais. Essa estrutura é formada de osso, pela fusão da coluna vertebral, costelas e cintura pélvica. A parte superior é conhecida por carapaça, e a ventral, por plastrão (COOPER, 2006). As lesões de pele em répteis podem ocorrer devido a um substrato incorreto, dano físico, mordida provocada por companheiros de recinto ou até por roedores (COOPER, 2006). Segundo Frye (1997, A), o tratamento de lesões nesses animais 67 deve incluir limpeza, debridamento de tecido necrosado, e caso necessário a sutura deverá ser realizada para auxiliar o processo primário de cicatrização. Também é necessária a realização de terapia antimicrobiana, de suporte e antibiótica para prevenção de qualquer tipo de infecção secundária (FRYE, 1997, A). Em geral o tratamento é o mesmo realizado em outras espécies, porém, para os répteis, exercem grande influência durante esse período de tratamento a temperatura e o estado nutricional (COOPER, 2006). Quanto maior a temperatura e a ingestão de proteínas e vitaminas, mas rapidamente ocorre esse processo de cicatrização, que para esses animais pode demorar de quatro a seis semanas. No caso da realização de suturas, deve ser avaliada a extensão da lesão e necessidade de ser suturada, pois de acordo com Frye (1997, B) alguns estudos já realizados com esses animais que comprovam que pequenas a médias lesões não devem ser suturadas, pois isso atrasa o processo da cicatrização. 6.3.2. Relato de caso Um jabuti-birmanês-negro (Manouria emys phayrei) fêmea, de 27 anos, com 44 kg, foi atendido no HVMNZ, apresentando um inchaço na faceta direita do pescoço. Para o exame físico realizado no dia 26 de julho de 2010, o animal foi anestesiado com uma associação de Medetomidina, Cetamina e Butorfanol. Foi encontrada uma lesão de aproximadamente dez centímetros de comprimento por seis centímetros de largura no lado direito do pescoço, com as bordas necrosadas e 68 uma grande quantidade de material purulento (Figura 24). A origem da lesão não foi determinada, mas suspeita-se que tenha sido infringida pelo companheiro de recinto. FIGURA 24: LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei). APARÊNCIA DA LESÃO EM PRIMEIRA AVALIAÇÃO NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) Foi realizado o debridamento da lesão e a limpeza com Nolvasan® (solução a base de clorexidina). Foi aplicada pomada de sulfadiazina de prata, que age como um antibacteriano e antifúngico tópico. Um curativo seco-úmido com betadine® um anti-séptico com iodo que foi suturado em cima da lesão (Figura 25) para proteção e para manter a umidade necessária. O animal foi mantido no internamento para evitar um acesso à água. 69 FIGURA 25: CURATIVO SUTURADO PARA MELHOR FIXAÇÃO EM LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei). HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) No dia 30 de julho de 2010 o animal foi anestesiado novamente para troca de curativo e reavaliação. A lesão não apresentou uma melhora significativa, tendo sido encontrada miíase no local da lesão (Figura 26), além de estar com uma aparência de maior necrose. FIGURA 26: LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei) APÓS QUATRO DIAS DE TRATAMENTO SEM APRESENTAR MELHORA. HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 70 O procedimento de debridamento foi novamente realizado, porém com aplicação de pomada de sulfadiazina de prata e suturada da abertura da pele em excesso na lesão. Em quinze dias o animal foi reavaliado e percebeu-se uma pequena melhora após a retirada do pus e do tecido necrótico que estava localizado acima da lesão (Figura 27). Desta vez foi realizado um tratamento experimental, com metade da ferida coberta com a pomada de sulfadiazina de prata e a outra metade com um produto da A-Cell, que funciona como um medicamento tópico a base de matriz extracelular da bexiga urinária de suínos e que promove um crescimento mais acelerado de células na lesão. FIGURA 27: LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei) APARÊNCIA DA LESÃO UMA SEMANA APÓS INÍCIO DE TRATAMENTO (Esq.). LESÃO APÓS O DEBRIDAMENTO E LIMPEZA, COM APARÊNCIA DE TECIDO SAUDÁVEL (Dir.). HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 71 No dia 24 de agosto de 2010 o animal já apresentava uma melhor cicatrização, foi observada a presença de tecido saudável e sem presença de pus ou necrose (Figura 28). O animal foi liberado para retornar ao recinto. FIGURA 28: LESÃO CRÔNICA DE ETIOLOGIA DESCONHECIDA EM REGIÃO DIREITA DE PESCOÇO EM JABUTI-BIRMANÊS-NEGRO (Manouria emys phayrei) LESÃO NO ÚLTIMO DIA DE TRATAMENTO COM TECIDOSAUDÁVEL E SEM PRESENÇA DE MATERIAL PURULENTO NO HOSPITAL VETERINÁRIO DO ZOOLÓGICO DE MINNESOTA, LOCALIZADO EM APPLE VALLEY, MINNESOTA, EUA. Fonte: Luiza Prado (Outubro, 2010) 6.3.3. Discussão O período de cicatrização em répteis é mais prolongado que nos mamíferos, então podemos considerar que esse animal não apresentou um grande problema no seu processo de cicatrização. Principalmente quando iniciou-se um manejo mais atento para a temperatura do recinto e quando o animal foi liberado para entrar em água. 72 A causa da lesão não foi definida, mas suspeita-se que tenha sido provocada por um companheiro de recinto, pois uma semana após o retorno desse animal à exibição, os tratadores perceberam um macho mordendo a mesma região da antiga lesão. Porém esse fato não pode ser confirmado, pois a atração do agressor para a região pode ter sido causada pela presença de uma lesão em cicatrização. Não pode ser confirmado qual dos diferentes medicamentos tópicos utilizados apresentou um melhor resultado, pois todos são recomendados para lesões em répteis. Os resultados variavam assim como a fase de cicatrização da lesão, e como foi observada uma melhora considerável em quatro semanas de tratamento pode-se afirmar que o tratamento foi efetivo mesmo sem o conhecimento da origem do problema. 73 7. CONCLUSÃO O estágio curricular no Zoológico de Minnesota foi uma grande oportunidade de aprendizagem e experiência para meu futuro profissional. Os procedimentos acompanhados, as realizações de exames físicos, as anamneses e as análises laboratoriais serviram de grande crescimento pessoal além de conhecimento na área de medicina de animais selvagens. Os veterinários me proporcionaram a chance de conhecer e vivenciar a rotina e os problemas de um hospital veterinário dentro de um zoológico, desde lidar com problemas sanitários relacionados com os visitantes e os animais, a problemas relacionados à dificuldade de escolha de um tratamento por algum empecilho governamental que possa influenciar na decisão. 74 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDERSON, David E; RINGS, Michael D.; PUGH, Glen D. Enfermidades do Sistema Tegumentar. In: PUGH, Glen D. Clínica de Ovinos e Caprinos. São Paulo, SP: Editora Roca, 2005, p.221-249. ANDRADE, James Newton Bizetto de. 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