RELATÓRIO I ENCONTRO DE INTERVENÇÃO PRECOCE DO ALENTEJO III ENCONTRO DE INTERVENÇÃO PRECOCE DE MONTEMOR-O-NOVO 9 e 10 de Dezembro de 2003 Sessão de abertura A sessão de abertura foi muito calorosa e espelhou o empenho dos parceiros no trabalho desenvolvido até aqui pelo programa de Intervenção Precoce do Alentejo e contou com a presença do Sr. Governador Civil do Distrito de Évora, a Presidente da ARS do Alentejo, a representante da Senhora Directora Regional de Educação do Alentejo, o Director do CDSSS de Évora, a Presidente da Direcção da CERCIMOR, uma representante do Grupo Interdepartamental de Intervenção Precoce, a responsável pela Equipa de Montemor-o-Novo e a coordenadora da Equipa Regional. 1ª Sessão Intervenção Precoce em Portugal Grupo Interdepartamental Dr. Boavida e Drª. Maria do Rosário Teixeira de Abreu O Dr. Boavida, representante da Direcção-Geral de Saúde no Grupo Interdepartamental começou por apresentar duas definições de Intervenção Precoce, da qual passamos a transcrever a do Libro Blanco de Atención Temprana1, que, desde o início, constituiu referência para o nosso trabalho a nível regional do Alentejo: “Entende-se por Intervenção Precoce um conjunto de intervenções, dirigidas à população infantil dos 0 aos 6 anos, à família e ao ambiente, tendo como objectivo dar resposta o mais precocemente possível às necessidades transitórias ou permanentes que apresentam as crianças com problemas de desenvolvimento ou em situação de risco. Estas intervenções devem considerar a globalidade da criança, sendo planeadas por uma equipa de profissionais de orientação interdisciplinar ou transdisciplinar.” Falou em seguida da importância do Despacho Conjunto e do quadro que veio trazer. Referiu também o constrangimento do programa não ter sido dotado de verbas, nem de orçamentos próprios para fazer face aos compromissos previstos nos vários ministérios. Em seguida ainda do mesmo Grupo Interdepartamental falou a Dr.ª M.ª Rosário Teixeira de Abreu da DGSSS. Lamentou a inactividade do Grupo desde 2001 e expressou claramente a urgência da sua revitalização para que se possa proceder à avaliação do Despacho Conjunto. Informou sobre o número de acordos já realizados com as regras do Despacho Conjunto. Principais Preocupações do Secretariado Nacional de Reabilitação e Integração Social das Pessoas com Deficiência – SNRIPD Drª. Isabel Felgueiras A Dr.ª Isabel Felgueiras, representante do SNRIPD apresentou em seguida a sua comunicação exprimindo as principais preocupações daquele organismo, mas também algumas linhas enquadradoras de que se destacam o deixar de encarar a IP como uma necessidade, para passar a encará-la como um direito da criança e 1 Grupo de Atención Temprana, Libro Blanco de la Atención Temprana – Documentos 55/2000. Editor: Real Patronato de Prevención y Atención a Personas con Minusvalia. Maio de 2000. Pedidos para Centro Español de Documentación sobre Discapacidad. Correio electrónico: [email protected] 1 da família. Chamou a atenção para a urgência de se fazer uma avaliação, não só dos aspectos organizativos, mas “abrangente”: ecológica e sistémica, sobre a qualidade dos programas: que serviços são prestados as famílias, que práticas e processos. Como aspectos positivos ressaltou o aumento das práticas centradas na família. Como preocupações, indicou a sinalização tardia, a baixa cobertura em IP, mas também ao nível de creches e estabelecimentos de educação pré-escolar. Concluiu sublinhando a necessidade de investir na formação dos profissionais. Intervenção Precoce no Alentejo Drª. Alice Caldeira Cabral A coordenadora da Equipa Regional de IP do Alentejo (ERIPA) Alice Caldeira Cabral evocou a pequena história da vida da ERIPA, lembrando que, a seguir à nomeação d 3 elementos dos vários ministérios, a actividade da equipa se desenvolveu em torno da premência duma acção concreta: a concretização do primeiro acordo de cooperação segundo as regras do Despacho Conjunto, vencendo as barreiras culturais existentes nos diferentes serviços e até entre os membros da equipa. Falou-se da nossa opção de fundo: em vez de instalar equipas em todos os concelhos como o Despacho previa, fizemos o levantamento das dinâmicas existentes e optámos por avançar, a pouco e pouco, para a construção duma lógica de rede, planeada, tendo em conta os constrangimentos dos vários parceiros envolvidos, mas contando com o compromisso de cada um em avançar em conjunto: isto é, quando um avança, porque os ritmos são diferentes, o outro sabe que está vinculado a avançar também. Apresentou o estado actual, os objectivos gerais para o próximo ano, a saber: consolidar a rede; melhorar os mecanismos de detecção, sinalização e intervenção nas situações de crianças dos 0 aos 6 anos com deficiência ou em risco de atraso grave; dotar as equipas de intervenção directa dos recursos necessários, através do planeamento integrado e aperfeiçoamento dos instrumentos de monitorização do programa, assim como os critérios de avaliação comuns, de modo a aumentar a coesão técnica e científica do programa. Depois de analisarmos os resultados, referimos em conclusão que a rede de relações pessoais e de apoio mútuo tem sido um factor determinante para o avanço e consolidação das dinâmicas em curso. As acções concretas que nos foram pedidas e que se identificaram em conjunto foram outro factor importante que determinou o desenvolvimento das relações de parceria e levou a uma implicação real dos parceiros. A relação de parceria cresceu assim dum nível de neutralidade e ausência de colaboração para um reconhecimento. Esta relação tem que ser cuidada e alimentada pois de outra forma, com os vários níveis de participação em cada sector, podem ser postas em causa. Isto implica assim que cada parceiro saiba como está a contribuir para o programa comum e assim se reveja como actor nesse programa e não como parceiro “arrastado”. Dado que os serviços e as pessoas responsáveis evoluem e podem mudar, é um processo em contínua construção. Mas como recomendação final, citando uma diálogo entre uma criança e um varredor de ruas do autor Michael Ende, no seu romance Momo: “não podemos olhar a estrada toda que está por varrer, senão entramos em stress: vamos olhar para cada varridela e, com alegria, vamos percorrendo a estrada.” 2 2ª Sessão Como criar novos serviços? Uma mesa moderada pela Drª. Inês da Rosa Filipe, compôs-se duma apresentação das Equipas Distrital e de Intervenção Directa do Distrito de Portalegre, seguindo-se a Equipa de Intervenção Directa de Estremoz e do Alandroal. Cada uma as equipas apresentou a sua história, as suas características e dificuldades. Ressalta-se aqui a equipa distrital de Portalegre que nos mostrou como passou dum Distrito em que havia uma equipa que partiu dum projecto SER CRIANÇA (Elvas) que funcionava na lógica do Despacho Conjunto e duma Equipa em Portalegre com pouca funcionalidade relativamente ao proposto no DC, a um distrito com uma rede organizada, com um plano de formação dos agentes, uma coordenação forte e eficaz de toda acção no terreno e um projecto comum. Referiram os progressos na capacidade de detecção, sinalização e acompanhamento já no ano passado, que este ano melhorou de forma substancial com a criação duma equipa nova, correspondente a uma zona a descoberto do distrito. Este planeamento a nível distrital partiu também das dinâmicas já existentes, mas foi capaz de suscitar novas energias numa zona com necessidades identificadas. Apresentaram ainda uma inovação na estrutura organizativa e algumas dificuldades que surgiram ao nível da revisão dos acordos de cooperação celebrados de acordo com as regras do despacho conjunto. Elvas não conseguiu ainda ver o seu acordo revisto para conter a informação actualizada, apesar de não haver dúvidas ao nível da parceria local. 3ª Sessão Trabalho com Famílias, Marilyn Espe-Sherwindt Sendo a intervenção precoce intrusiva por natureza como fazer para não esmagar a família com as nossas boas intenções? Depois de fazer um momento de role playing em que pediu uma voluntária para fazer duma mãe de 19 anos com uma filha de 9 meses com deficiência (sindroma de Down), convidou “n” técnicos (médico de família, médico especialista, cardiologista, etc. 10 ao todo) a vir ao palco apresentar-se à mãe e fazer-lhe uma recomendação. A confusão da mãe ficou bem patente. Em seguida frisou que “o meu poder para influenciar o desenvolvimento da criança é aquele que eu tiver para ter influência nos pais.” Para isso preciso de admitir que eu “sei pouco e que tenho que aprender com as famílias”. A maneira como aquela família vive a sua situação é única. Ela conhece a criança como ninguém: tenho que me situar ao nível duma relação horizontal, para poder estabelecer uma relação pessoal com a família, que vai permitir o seu desenvolvimento. Os técnicos passam, a família fica. É necessário que os técnicos admitam que sabem pouco e que têm que aprender. Esta atitude é fundamental para se poder partir para a construção dum plano de Intervenção com a Família: o PIAF tem que ser um processo que consiste em criar e concretizar planos com a família, possibilitando que ela tenha o controle da situação. Segundo a Professora Marylin um PIAF: 1. Regista objectivos que cada família define para si e para as suas crianças; regista resultados que a família identifica em relação a si e aos seus filhos. 3 2. Descreve recursos/ serviços e a sua articulação para apoiar esses objectivos. Identifica e organiza os recursos formais e informais facilitadores para que as famílias atinjam os objectivos para os seus filhos e para si próprios. Referiu a importância da organização de “apoios família a família”: há planos de trabalho úteis e outros que não o são, por não conseguirem obter as mudanças que se pretendem, ou por induzirem stress acrescido. Caracterização dos planos úteis: • as famílias vêem-nos como seus; • todas as decisões sobre o processo e conteúdo do plano, foram tomadas com as famílias; • as estratégias e actividades não adicionam stress; • Existe uma probabilidade de sucesso dentro dum curto espaço de tempo; • Os recursos que estão disponíveis e acessíveis foram incluídos no plano; • O plano pode ser alterado e actualizado com frequência; • Planificar é um processo contínuo; • As pessoas chave das famílias estão identificadas (nem sempre são as pessoas que reúnem os nossos parâmetros, mas aquelas com que as famílias ou alguns dos seus membros contam para um alívio da carga ou para recuperar energia – a Marylin contou que uma mãe lhe referia que a pessoa que mais a ajudava, era uma pessoa de quem ela nem sequer sabia o nome, mas com quem, a uma hora determinada, se encontrava todos os dias para correr – com ela chorava, falava e depois ia para casa aliviada e com forças para enfrentar o seu dia a dia.) 2º dia – 4ª sessão Trabalho com famílias em situações particulares de risco Moderadora da Mesa: Drª. Filomena da Costa Pereira do Departamento de Educação Básica do Ministério da Educação e membro do Grupo Interdepartamental “Crianças em Risco – uma reflexão teórico-prática ou prático-teórica” Dr.ªs Isabel Adelaide de Matos Lopes e Joana Isabel de Castro Gonçalves. Falou-se2 do papel da Intervenção Precoce no suporte do projecto de vida das famílias de “crianças em risco”, funcionando como um factor protector que não assentando tanto em remover o stress e a adversidade, mas em ajudá-las a confrontarem-se com desafios graduais que promovam a sua resiliência num contexto disfuncional. Assim não se pode avaliar o sucesso da intervenção tendo apenas como referência a evolução da criança, mas também a satisfação dos pais. Ao dar-lhes oportunidade de descobrirem e criarem novas forças; ao torná-los capazes de reflectir em conjunto sobre os seus problemas e agir com autonomia contribuindo para a sua solução, estamos a torná-los os principais decisores do processo de intervenção. Foi exposto um estudo de caso em que o técnico é confrontado com uma situação de risco ambiental complexa. O técnico cria novos instrumentos e adaptou os já existentes (currículo CRESCER) de modo a dar uma resposta eficaz aos problemas que foram surgindo. Foi feita uma análise do papel do técnico, visto como intermediário dos vários sistemas em que a criança se encontra inserida, 2 Extractos do resumo da comunicação. 4 nomeadamente o contexto intrafamiliar , onde ocorrem os processos interactivos mãe-filho, mediados por factores sócio-culturais. A intervenção foi feita por etapas em que se tentou responder com maior qualidade, eficácia e rapidez à necessidade da família em causa, transpondo assim integralmente para a prática os valores: centrado na família, centrado nas forças, centrado na relação e ainda o facto da prática ser reflexiva e ecológica. Foram envolvidas as figuras chave no apoio a esta mãe e identificadas 5 áreas chave para o trabalho com a família: • Auto-estima • Interacção social • Locus de controle interno • Compreensão dos papéis sociais • Resolução de problemas Cada uma destas áreas foi trabalhada de forma planeada com a mãe e a criança e o seu meio; cada uma foi sendo avaliada e reformulada no âmbito do PIAF respectivo. Trabalho com Pais com Necessidades Especiais, Drª. Ana Isabel Casadinho e Drª. Ana Cristina Saloio A segunda intervenção da manhã constituiu a apresentação do trabalho feito pela CERCIMOR com pais com deficiência mental no âmbito dum projecto financiado pelo Programa SER CRIANÇA. A apresentação foi feita pela Psicóloga Ana Isabel Casadinho e pela Assistente Social Ana Cristina Saloio. Contou com uma introdução intitulada “Viajar para além do mito”, com a apresentação dum filme sobre a experiência dum casal, o Sr. Manuel e a D. Elisa que, em seguida foram entrevistados e falaram sobre si próprios e da sua experiência de ser pai/mãe. Afirmou-se que o 3”direito básico de cada família é o de educar os seus próprios filhos”, tal como os filhos têm direito de experienciar o amor dos seus pais naturais. Alguns dos pais com quem hoje o trabalho é desenvolvido são acompanhados pela instituição, desde jovens, conhecendo os técnicos bem as suas competências e o seu desejo de paternidade/maternidade, mas também os seus limites. Assim confrontadas muitas vezes com os preconceitos e as generalizações que se fazem em relação aos pais com deficiência, a CERCIMOR, considerou um imperativo seu, mostrar como, às vezes, os “mitos” funcionam como uma lente que distorce a realidade, levando-nos a classificar as pessoas com deficiência mental como pais incompetentes, sem ter em conta as enormes diferenças individuais que se escondem sob uma tal designação. “Se colocarmos os mitos de lado, começaremos a compreender e a corresponder às competências pessoais e únicas, as preocupações e prioridades de cada pai que encontrarmos.” Estamos perante uma realidade: há pais com deficiência mental que têm filhos, independentemente da discussão se as pessoas com deficiência mental se podem ou não casar e ter filhos. Até que ponto pode a sua deficiência influenciar as suas atitudes como pais, foi a viagem que a CERCIMOR nos propôs fazer na companhia do casal acompanhado pelo programa e aqui apresentado em termos de estudo de caso. 3 Extractos do resumo da comunicação. 5 O filme mostrava as interacções e o programa de reforço das competências necessário. Foi notória a evolução desta criança que reconhece os seus pais e espera deles os comportamentos protectores e os cuidados que os outros pais prestam, bem como o orgulho deles com o seu filho que lhes responde, e os surpreende com o seu sorriso primeiro e depois com as suas habilidades cada vez mais diferenciadas. E a CERCI no seu resumo conclui: “Ficámos a acreditar que estes pais são como os outros adultos em situação de aprendizagem: aprendem melhor quando são respeitados, quando a sua experiência de vida é valorizada, quando os seus estilos próprios são identificados e quando a aprendizagem do que lhes é proposto corresponde às suas necessidades práticas”. E acrescentaríamos, daquilo que nos foi permitido observar do filme: e quando isto se passa num meio contentor e que pode fazer baixar o nível de stress do casal para níveis geríveis por ele – neste caso, é este o papel da avó paterna em casa de quem eles vivem. O testemunho dos pais foi um momento importante pois puderam falar sobre o que sentiram ao ver-se no filme e ao ver o seu filho. Foi clara a sua satisfação por se sentirem valorizados nos seus papéis e por lhes ser pedida a opinião. A mãe estava claramente centrada no “seu” menino, atenta às suas necessidades e orgulhosa como qualquer outra mãe. O pai, exprimiu o seu contentamento por estar ali, “em vez de estar no trabalho” , mostrando-se também atento aos dois. Processos vinculativos e desenvolvimento da família da criança portadora de deficiência, Prof. Doutor Vítor Franco e Drª. Ana Margarida Albano Para terminar esta mesa, o Prof. Vítor Franco da Universidade de Évora enquadrou um estudo apresentado pela Psicóloga Ana Margarida Albano sobre o tema. O modo como cada família lida com a deficiência de um dos seus membros está intimamente ligada com o seu próprio processo de desenvolvimento. A deficiência afecta todo o sistema familiar, quer se localize num dos pais quer se localize num dos filhos4. Nessa medido, toda a família é portadora de deficiência. Um diagnóstico de deficiência afecta inevitavelmente o lugar que ocupa na imaginação dos pais, nos seus projectos, na sua esperança e na sua emocionalidade. Em estudos anteriores dos mesmos autores, tiveram oportunidade de ver que a resiliência familiar, assenta essencialmente na coesão e na capacidade de elaboração dos sentimentos por parte dos pais, bem como na forma como o bebé os conquista. Neste trabalho apresentaram um estudo que aborda o modo como a reacção as mães ao diagnóstico, marca a sua capacidade para estabelecerem um vínculo afectivo com os filhos com deficiência. Tudo aponta para a importância do diagnóstico em si e dum acompanhamento as mães após a revelação. Mães excessivamente perturbadas pela sua situação emocional, demasiado invadidas pelos seus sentimentos de raiva, deprimidas, confusas ou com expectativas demasiado distorcidas relativamente à situação da criança, poderão ter mais dificuldades em lhe fornecer uma base vinculativa segura. Assim a situação emocional, cognitiva e social dos pais é, sem dúvida, determinante no seu envolvimento activo nos processos de desenvolvimento dos filhos. 4 Extraido do resumo de comunicação. 6 5ª sessão: Acreditar que é possível Prof. Marylin Espe-Scherwindt Esta sessão foi presidida pela Prof.ª Ana Serrano e preenchida com uma segunda comunicação da Profª. Marylin com título acima, tendo sido explanado o impacto das situações de pobreza nas crianças e nas famílias. Foi lembrada a importância do primeiro ano de vida para a vinculação e ainda que o risco é aditivo: quanto mais factores de risco estiverem presentes maior é o risco. É preciso que haja um equilíbrio entre factores de risco e factores de oportunidade. É preciso ter uma consciência viva de que há factores que podem ser mudados e outros que não. Assim os programas a construir nestas situações têm que responder às seguintes 5 questões: • Que equilíbrio entre risco e oportunidade para esta família? • Onde estão os seus (e os meus) suportes? • Quais são as verdadeiras questões na perspectiva da família? • Onde podemos vivenciar sucesso? • Por onde devemos começar? Se tivermos em conta o que foi dito na outra comunicação da Prof. Marylin sobre a intrusão e participação das famílias na construção do PIAF concluiu-se que uma intervenção efectiva não depende só daquilo que fazemos, mas também da forma como orientamos esta intervenção – das atitudes dos profissionais. Nesta sessão foram feitos dois jogos que nos ajudaram a tomar consciência das diferenças que existem entre as pessoas e também das diferenças que existem na rede de apoio de que as pessoas dispõem. No primeiro foi-nos pedido que escrevessemos num papel individualmente o nome dum pássaro, duma côr, um número e o nome dum mês. Em seguida foi pedido à Presidente da Mesa que dissesse o que tinha escrito e pedido à assistência que dissessem quantas pessoas tinham escrito o mesmo. Concluiu-se que raramente se encontravam coincidências em relação a cada um dos elementos e não havia coincidência em nenhuma situação do conjunto de respostas. No segundo jogo foram colocadas as seguintes questões: • Com quem falaria se o seu bebé de 4 meses acordasse da sesta cheio de manchas vermelhas? • A quem telefonaria depois duma briga com o seu marido? • A quem telefonaria se a sua sogra lhe dissesse que vinha visitá-la durante seis meses? • A quem telefonaria se lhe anunciassem que tinha ganho uma viagem à Jamaica? Tomámos consciência da rede de apoios com que contamos, diferente de família para família e, mesmo de situação para situação. Assim conclui-se que é a partir de atitudes de respeito, não superioridade e da consciência que é a partir duma relação de proximidade que se pode desenvolver um programa útil para qualquer família carecida de apoio. 7 6ª Sessão Mesa moderada pela Drª. Fátima Breia – Centro de Saúde de Montemor-o-Novo O contexto familiar e o sono da criança Drª Vanda Clemente Nesta comunicação feita pela Psicóloga da CERCIPENELA Drª. Vanda Clemente fez uma análise exaustiva dos padrões de sono-vigília ao longo das várias fases do desenvolvimento infantil com destaque para as interacções família-criança. Abordaram-se os distúrbios do sono e orientações para o trabalho com as famílias de crianças com perturbações do sono numa perspectiva ecológica. Intervenção Sistémica em Vários Contextos Dr. Manuel Peixoto, Drªs Vera Santos, Rosário Baetas e Cristina Perdigão A comunicação sobre Intervenção sistémica em vários contextos foi introduzida pelo Dr. Manuel Peixoto da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar a que se seguiu uma apresentação por Vera Santos, Rosário Baetas e Cristina Perdigão, alunas do Curso de Intervenção Sistémica do SNRIPD de casos clínicos e elaborada uma reflexão a partir deles sobre os diferentes sistemas envolvidos: dimensões pessoais, familiares, da equipa, de outras instituições... A intersecção destes sistemas cria situações complexas sobre as quais importa reflectir, em particular quando surgem impasses no processo terapêutico. Redes de suporte Prof. Doutora Ana Serrano e Drª. Antonieta Bentes A Prof. Ana Serrano abordou alguns conceitos teóricos fundamentais no âmbito do apoio social, sobre os quais assenta a teoria da ajuda do Modelo Integrado de Intervenção Precoce de Dunst, nomeadamente as conceptualizações sistémicas de Intervenção Precoce, os conceitos de apoio social, redes de apoio, componentes e funções da rede de apoio e influência do apoio social para as famílias com crianças com necessidades especiais ou em risco. Ao longo dos últimos anos, a Intervenção Precoce de Montemor-o-Novo tem vindo a estudar as famílias apoiadas, reflectindo sobre as suas práticas no sentido de as aperfeiçoar. Esse estudo elaborado numa metodologia de investigação-acção foi apresentado nesta comunicação. Foram identificadas as fontes de apoio social a que as famílias apoiadas pelo Serviço de Intervenção Precoce recorrem. Constataram-se dados surpreendentes: As famílias contam mais com o apoio dos pais do pai que com os pais da mãe, a seguir contam com o Serviço de IP, foi frequente a constatação de que se conta com a loja de bairro, a merceeria, a farmácia, o taxista, os bombeiros (das ambulâncias) ou os guardas da GNR e pouco ou nada com os serviços, com a Igreja, com grupos sociais ou clubes. Não ajudam: pais da mãe, amigos do casal, outros pais, colegas de trabalho, a igreja. Cem Palavras Drª. Cristina Miranda Por fim elaboraram-se alguns pontos à laia de síntese dos trabalhos, intitulada Cem Palavras. I. Identificaram-se pressupostos de toda a acção: a) A intervenção precoce deve ser considerada uma questão de direitos b) Toda a pessoa, com ou sem deficiência, criança ou adulto, deve ser reconhecida como um cidadão com direitos. 8 c) Um desses direitos é ser fecundo e a sua fecundidade ser reconhecida por si e pelos outros d) Constituir família e procriar é uma dimensão do desejo de fecundidade, que caracteriza a vida Em relação ao título - Pais com Amor (i)limitado - teceram-se as seguintes considerações ainda como pressupostos: a) Todos os pais desejam ter um amor ilimitado pelos seus filhos b) Todos os pais têm limites nesse amor e enquanto os filhos são dependentes precisam de apoios variados em intensidade e extensão, conforme o estado de saúde, de ânimo, de n factores que podem afectar as competências parentais. c) Alguns são mais limitados que outros. Referiu-se a importância de conceitos como a fecundidade e a responsabilidade quando estamos a falar de trabalho com adultos. Registou-se a afirmação repetidamente explanada neste encontro de que é preciso acreditar nas forças: • a criança tem competências; • a família tem competências; • o meio tem recursos. É preciso descobri-los e valorizá-los. É preciso ter consciência de que o profissional passa, a família fica, mas a intervenção é possível. II. Para a intervenção é importante partir dum diagnóstico, de atitudes de respeito pelas famílias e humildade dos técnicos; A intervenção deve ser planeada com a família para ajudá-la a sentir que tem controlo sobre a situação e a sua vida; tem que ser feita com método, baseada em critérios aferidos e avaliada pelos resultados. Tem que se pensar o que fazemos, mas também como o fazemos. A rede de relações que envolve a família, constituída num círculo próximo pelos familiares, amigos, colegas, vizinhos, membros de igrejas, lojas, serviços de transporte (taxistas e ambulâncias) e num segundo círculo os serviços e instituições. Acrescentámos duas funções que nos parecem importantes: • a de fornecer serviços de apoio e ajuda prática e a segunda: • a de atenção vigilante, numa atitude pro-activa de prevenção de problemas, através de intervenções atempadas e de canais de comunicação regulares. III – Necessidades dos profissionais a) Os técnicos de intervenção directa necessitam de orientações claras e precisas; delimitação de competências em relação a outros projectos na mesma faixa etária; formação inicial e contínua; suporte ao nível profissional através de supervisão. b) Diferenciação/responsabilidade técnica: a abordagem centrada na família implica diferenciação técnica e uma busca de aperfeiçoamento profissional contínuo; isso implica estabilidade nas funções e aprofundamento de relações pessoais com a população alvo. c) É urgente garantir a estabilidade das equipas técnicas. IV – Abordagem Inter-sectorial Da experiência do trabalho desenvolvido resulta clara a importância da abordagem inter-sectorial, territorializada pois permite a concretização dos pressupostos identificados. Implica a constituição de parcerias fortes construídas a partir dum olhar convergente para as necessidades comuns dos vários sectores. 9 V – Avaliação Para dar visibilidade às acções desenvolvidas, é preciso avaliá-las e repensá-las à luz da missão e dos objectivos dos três sistemas mais directamente implicados: saúde, educação e acção social. Esta deve ser abrangente: ecológica e sistémica, tal como o é a intervenção centrada na família. Para o desenvolvimento sustentado duma rede de serviços devemos partir das iniciativas pré-existentes, valorizando a sua experiência e saber. As relações de parceria devem basear-se na confiança e informalidade que pressupõe compromisso e responsabilidade pessoal, identificação de objectivos e acções concretas. VI - Funções dos diferentes níveis Os vários níveis previstos no Despacho conjunto são imprescindíveis: O Grupo Interdepartamental ao nível central, as equipas regionais, que, em estreita articulação com o nível central devem dar orientações, fazer a avaliação e acompanhamento e ainda uma função que não consta do texto do Despacho, mas que consideramos implícita: a da concertação e do planeamento ao nível regional. Esta dimensão tem-se revelado de enorme importância na nossa experiência do Alentejo. Terminou com a formulação dum desejo: Na imensidão do nosso território alentejano há muitas famílias isoladas. Tal como o sobreiro da fotografia apresentada, pôde desenvolver a sua beleza própria, graças ao solo trabalhado e à cortina protectora doutros sobreiros, queremos que estas famílias também possam ultrapassar alguns limites do seu amor (i)limitado e ver os seus filhos crescer na sua beleza única. 28 de Janeiro de 2004 ERIPA (Equipa Regional de Intervenção Precoce do Alentejo) 10