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Comunicação oficial/comercial
Donizete Soares
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Comunicação oficial/comercial
Donizete Soares1
Nos últimos 200 anos, as sociedades que optaram pelo que chamamos de
desenvolvimento vêm operando sérias mudanças nos modos de ver e tratar a
si mesmas. Ideias e ações envolvendo o homem, a convivência social e a
comunicação, entre outras, têm sofrido profundas alterações. Nomeá-las e
contextualizá-las para buscar entendê-las é uma necessidade. O que fazer com
elas, depois de compreendidas, é um desafio que se impõe a cada um de nós.
Desde a Revolução Francesa (vale dizer: burguesa), nos idos de 1789, grande
parte dessas sociedades tem procurado tornar realidade uma adaptação do
conceito de democracia grega – em particular a inventada pelos atenienses do
período próximo ao fim da longa história dos povos que formavam a Grécia –
devidamente acrescida de outro importante acontecimento inglês (vale dizer:
burguês) nos meados do mesmo século 18: a Revolução Industrial.
Essas sociedades tornaram-se modelo para grande parte das sociedades de
outros países, que tentam reproduzi-lo. E aperfeiçoá-lo, como é o caso do
Estados Unidos, que não só acrescentou outros sentidos ao termo, como se
tornou a sede do atual império, que faz questão de dizer que é democrático...
Tais acontecimentos, todavia, simplesmente não seriam possíveis sem a efetiva
participação de habitantes de outros dois continentes: América e África. De
modo algum, os feitos franceses, ingleses e estadunidenses – impecáveis do
ponto de vista do des-envolvimento – seriam tão decisivos para as sociedades
atuais, incluindo a nossa, se, concordando ou não, parcelas importantes das
sociedades africanas e americanas não co-laborassem tanto com eles.
Desdobramentos
O mais importante deles, do ponto vista humano obviamente, foi a obrigatória
corrida das pessoas dos campos para as cidades, já que o centro da vida
econômica deixou de ser a zona rural e passou a ser as zonas urbanas, que
passaram a concentrar as indústrias necessitadas de mão de obra para fazer
funcionar as máquinas. A partir de então, serão elas (as indústrias e suas
máquinas cada vez mais atualizadas) a fonte para a concentração de riquezas
nas mãos de um pequeno grupo social.
Tal corrida fez com que as cidades inchassem rapidamente. Gentes diferentes,
com costumes, gostos, visões de mundo e de si mesmas e dos outros
igualmente diferentes, vindas de lugares em geral amplos, acostumadas a
comer o que plantavam e andar léguas para encontrar familiares e vizinhos...
em pouco tempo tiveram que se acotovelar por ruas e vielas, morando
embaixo ou acima ou ao lado de outros iguais e estranhos a eles.
1 Professor de filosofia e diretor do INSTITUTO GENS
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Não se pode dizer – é claro! – que, antes, aquelas gentes viviam num suposto
paraíso e, a partir de então, habitavam o inferno (termos, não por acaso,
inventados pelas igrejas) porque tiveram de deixar o campo para viver na
cidade. Nada disso. Estamos tratando das dificuldades a serem superadas
pelas mudanças, aliás, próprias de qualquer mudança.
Dentre elas, a convivência. Sabemos o quanto são complicadas as relações
humanas entre pessoas próximas, e sabemos como são ainda mais complexas
as relações entre vizinhos. Dá pra imaginar como deve ter sido (e ainda hoje
é) difícil não ter outra opção a não ser viver dias e noites em condições
miseráveis, sofrendo carências de todo tipo e tendo que trabalhar (quando
havia ou há emprego) em condições igualmente miseráveis e carentes. Para
onde olhavam e por onde andavam, aquelas pessoas viam e encontravam nada
menos nada mais que a si próprios refletidos nos corpos, nas roupas, nas
dores, nas tristezas e nos desesperos dos outros, seus pares.
O fato é que o inchaço das cidades era (continua sendo) tão somente o
sintoma de que algo não estava (não está) acontecendo como deveria (deve)
ou como aquele pequeno grupo gostaria (gosta) e quer que aconteça.
O corpo social, formado por homens e mulheres transformados em operadores
de máquinas, apresentava (apresenta) um quadro que exigia (exige) cuidados
especiais. E assim como no corpo humano é preciso tratar não o edema, mas a
infecção que o provoca, buscando sua causa e seu fim, o mesmo tratamento
devia (deve) ser dispensado ao corpo social, uma vez que tanto as mudanças
físicas, emocionais e culturais como, inevitavelmente, os seus desdobramentos
provocam alterações profundas na vida das pessoas.
Como tratar a infecção
Mas como conter ou, mais que isto, eliminar a doença que pode levar à ruína
os projetos de uma sociedade agora fundada na exploração do trabalho de
homens e mulheres transformados em operadores de máquinas cada vez mais
sofisticadas?
Conforme os milenares saberes da medicina, a inflamação, que pode ser aguda
ou crônica, é sempre um 'quadro grave': não importando se os 'processos
inflamatórios' apresentam-se como de baixo ou alto grau de gravidade, eles
podem levar o indivíduo à morte.
E a morte, como bem sabemos, é desaparecimento...
Mas como tratar o corpo social, esse ser sem o qual nenhuma máquina pode
funcionar e, portanto, impedir a acumulação da riqueza? Como mantê-lo vivo
sem alterar as causas dos 'processos inflamatórios' e dos males que decorrem
das operações dos equipamentos, esses sim, tão importantes? Como fazer o
corpo social entender e aceitar as novas e atuais condições de vida em
sociedade, convencendo-o de que esta, em muito, supera a que ele vivia
anteriormente? Como evitar que ele desapareça? Como ao menos acalmá-lo,
minimizando os efeitos das tensões internas e promovendo algum conforto ao
corpo trabalhador?
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Duas foram e continuam sendo as respostas encontradas.
São respostas simples, objetivas e diretas – o que não quer dizer que não
demandam esforços, investimentos, tecnologias e um tipo especial de
inteligência talhada em avançados centros de pesquisa. Ao contrário, mas
exatamente por isso são respostas efetivas. Sempre deram e dão certo, e
atingem, na maioria absoluta das vezes, os objetivos previstos. São, enfim,
respostas que têm se apresentado como estratégias absolutamente confiáveis.
Assim tem sido e, nos dias atuais, possivelmente mais do que em qualquer
outro tempo, respondem a praticamente todas as perguntas eventualmente
formuladas.
A primeira tem a ver com a força bruta acompanhada dos seus respectivos
dispositivos: polícias, exércitos, guardas e 'seguranças' de todas as máquinas e
dos seus donos. O que fazem, ou melhor, o que devem fazer? Nada mais que
cumprir e fazer cumprir princípios e objetivos dos que os elaboraram e fizeram
com que se tornassem... leis. Infelizmente, não podem – a rigor, não devem –
questioná-las; não estão ali pra isso, sobretudo porque, conscientemente ou
não, optaram por esse tipo de serviço à sociedade.
As ações resultantes dessa primeira resposta, todavia, quase sempre, deixam
um rastro de desgaste político que, efetivamente, não é o desejável.
Ocorre que, embora as ações pautadas no uso da força bruta funcionem muito
bem, acalmando os ânimos e colocando uns e outros nos seus devidos
lugares... por outro lado, fazem aumentar o número dos descontentes, dos que
se opõem, dos que não aceitam que as coisas continuem como estão. “Quem
bate, esquece. Mas quem apanha, jamais esquece!” – não é isto que lembra o
dito popular?
Ou seja, só a força e seus respectivos dispositivos não bastam. É preciso,
juntamente com a aplicação dos anti-inflamatórios indicados para diminuir os
inchaços, administrar drogas mais efetivas ou que, pelo menos, não deixem
sequelas decorrentes dos possíveis cortes por onde sai o pus...
A postos, então, a segunda resposta: alta tecnologia e máquinas (sempre
máquinas!) de transmitir imagens e sons, equipamentos que entram nas
casas, nos meios de transporte e nos corpos das pessoas, levando nada menos
do que informação e entretenimento.
A postos e, em ação, os meios de comunicação social
Tanta gente habitando os mesmos espaços, tanta miséria exposta, tanta fome,
dor e exploração, tanta indignação, revolta, cassetete ('quebra-cabeça', em
francês), prisão, morte... não só impedem o funcionamento das máquinas,
diminuindo a riqueza a ser acumulada, como certamente comprometem o
futuro dos donos das máquinas.
Visivelmente doente, o corpo social passa a ser visto e tratado como algo que
não apenas demanda mas, principalmente, exige cuidados clínicos. Estudá-lo,
observá-lo e, sobretudo, acompanhá-lo – eis o que precisa e deve ser feito.
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Como? Criando mecanismos inteligentes, eficientes e eficazes, suficientemente
competentes para inibir os movimentos de reação ao pensado e instituído.
Quais? Os meios de comunicação social. Para quê? Para entreter e/ou distrair.
[Vale a pena ler os sentidos desses termos, conforme o dicionário de Houaiss:
entreter é o mesmo que
➢ “prender, desviar a atenção de; distrair
➢ enganar (com astúcia, manha, promessas etc.); iludir, lograr
ocupar(-se) de maneira prazerosa (com); distrair(-se), recrear(-se)
➢ ter por ocupação ou distração; entender-se
➢ fazer uso de; consumir (espaço de tempo, disponibilidade); encher, ocupar,
preencher
➢ tornar mais suave, menos incômodo; aliviar, mitigar, suavizar
➢ fazer esperar, fazer demorar ou demorar-se (em algum lugar); deter(-se),
retardar(-se)
➢ fazer durar, manter no mesmo estado; conservar, manter
distrair é o mesmo que
➢ fazer ir para diferentes lados; separar, dividir
➢ mudar o curso de (riacho, córrego etc.); desviar
➢ desviar ardilosamente a atenção (do adversário), para fazê-lo cometer erro
➢ desviar (da destinação inicial); desencaminhar, extraviar
➢ tirar ou desviar (a atenção de alguém)
➢ afastar o pensamento de (trabalho, preocupações, tristezas, obsessões etc.);
fazer esquecer ou esquecer
➢ ocupar(-se) de maneira prazerosa
➢ praticar lazer; divertir-se
Observe, ainda de acordo com Houaiss, a etimologia do termo distrair: “lat.
distràho,is,xi,ctum,hère 'puxar para diversas partes, destruir um todo em partes,
rasgar, romper, separar, dividir, vender a retalho', p.ext. 'partir, desunir, dissolver,
frustrar, malograr'; ver traz-; f.hist. 1563 distrayr”
Tem como não relacionar cada um dos sentidos dos termos entreter e distrair e os
meios de comunicação oficiais e/ou comerciais?]
Pois bem. Era (continua sendo) fundamental e necessário manter as pessoas
no interior das casas, escolas, empresas, clubes, igrejas, estádios... alegando
que as ruas, sempre cheias de bandidos e marginais, são um perigo constante.
As praças – se existirem – devem ser tão somente locais de lazer em feriados
e finais de semana, lugares de passeios com animais e/ou para as crianças
brincarem sempre junto com seus pais e familiares. Aliás, 'tirar a criança da
rua' – não é este o grande objetivo dos que se dizem preocupados com o
futuro das novas gerações?
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Os demais espaços públicos (avenidas, jardins, parques...), também chamados
de logradouros, devem servir para o trânsito de veículos, ligando os pontos
oficialmente permitidos, incluíndo os especialmente escolhidos e devidamente
preparados para eventual concentração de pessoas. Porém, mais que isso –
aliás, é o que realmente importa –, os logradouros formam um sistema que
permite a identificação individual dos habitantes. 'Nome e Endereço Completo'
– não são exigências para preencher qualquer cadastro? Ou seja: não basta
que os logradouros sejam definidos e oficializados; é fundamental que todos (e
cada um) dos transeuntes sejam identificados, localizados e reconhecidos.
Qualquer outro equipamento apresentado como público não é e nem pode ser
visto e tratado como exatamente público, já que há regras normatizando e
regulando sua utilização.
O que resta, então?
Espaços privados que, para serem frequentados, exigem pagamentos ou,
antes, lugares proibidos aos que não podem arcar com as despesas e lucros de
quem investiu neles. Reservados e protegidos, são espaços particulares e,
portanto, com acesso único e exclusivo aos devidamente inscritos, fichados,
autorizados... e pagantes.
Os que podem bancar sua estadia, por sua vez, têm à disposição não somente
um tipo privilegiado de informação e entretenimento, mas a tudo o que a
humanidade vem construindo culturalmente ao longo dos tempos.
Já os que não têm acesso aos espaços privados, dispõem dos chamados meios
de comunicação social: jornal, rádio, revista, tevê, cinema, vídeo, internet...
Em especial, a Comunicação Oficial/Comercial
Elaborados por especialistas devidamente formados por centros de ensino, ou
como tal reconhecidos, e produzidos em máquinas cada vez mais avançadas e
maravilhosas, as mídias – outra denominação dos meios de comunicação social
– servem exatamente pra isso: ocupar o tempo do que se convencionou
chamar grande público.
A elas foi dada a missão (que palavra horrível!) de informar e entreter os
inflamados pelas infecções causadas por agentes estranhos e não bem vindos
à suposta e/ou desejável harmonia social. A elas são reservados o direito e o
dever de não apenas mostrar e dizer isto ou aquilo, mas, sobretudo, de
convencer os incapacitados de transitar pelos espaços privados de que os seus
respectivos lugares já foram definidos e, portanto, eles devem ter o cuidado de
não ultrapassá-los.
Ou seja, o papel que lhes cabe é ainda maior: em meio ao entretenimento e à
informação, os meios de comunicação oficial/comercial – ou grande mídia,
como são usualmente chamados – devem, sobretudo, educar as pessoas. Não
como a escola convencional que há séculos atua selecionando intelectual e
manualmente inventores, assistentes, divulgadores e defensores de todos os
tipos de máquinas, mas de modo mais efetivo e realmente duradouro.
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Não como a escola enquanto instituição responsável por um tipo de educação –
igualmente oficial/comercial – que, mesmo permitindo o ingresso de grande
número de alunos, opera de modo a excluir a maioria deles – diplomados ou
não –, beneficiando os poucos e mesmos de sempre... O que as mídias têm de
fazer é ensinar sem pressa, sem atropelos e de forma bastante didática. Para
atingir seus objetivos pedagógicos, não é preciso cobrar trabalhos, exercícios,
provas e exames. Não do tipo das escolas convencionais, obviamente... Afinal,
não há por que excluir absolutamente ninguém.
Um dos sentidos do termo educação é conduzir os passos dos que ainda não
sabem, dos que ainda ignoram os saberes necessários para que possam,
então, se dar bem na vida... É dizer a eles o quê e como deve ser dito o que
pode e deve ser dito e, portanto, o quê e como deve ser pensado o que pode e
dever ser pensado. É ensinar-lhes os modos de comportar e agir frente a toda
e qualquer situação.
Neste sentido, educar é influenciar as pessoas para que elas mesmas, frente a
determinados e definidos padrões, alterem seus gostos, desejos, vontades e
preferências. É mexer com os mais profundos sentimentos e pensamentos dos
que ainda não sabem, dos que ainda ignoram os valores que sustentam e
norteiam uma sociedade civilizada e... democrática.
Não por acaso, é pelos sentimentos humanos, especialmente relacionados a
dor, dificuldade, carência e necessidade, isto é, pelo que há de mais frágil na
condição humana – quando o indivíduo se vê e se sente só e abandonado –, é
justamente aí que as chamadas Mídias o abordam e, mais que isso, o cercam.
Isto mesmo! Assim como o atento caçador cerca a presa para dela se apossar,
os Meios de Comunicação Social, atendendo ao chamado que lhes foi definido e
determinado, observam agudamente as mazelas humanas e fazem delas suas
pautas, seus roteiros, suas imagens, seus textos e seus sons.
E assim, ocupando os sentidos e as ideias das pessoas, os trabalhadores das
mídias oficiais/comerciais esmeram-se na busca dos mais detalhados modos de
convencer seus leitores, ouvintes e espectadores a aceitarem e adotarem como
se fossem deles os valores e as máximas dos donos das máquinas.
E, em particular, a televisão
De todos os meios de comunicação, a televisão tem absolutamente tudo o que
é necessário para que as pessoas, aprendendo com ela, façam dos discursos
dos apresentadores, comentaristas, 'atores' e 'atrizes'... – tarefeiros em geral
bem remunerados – as suas falas e os seus próprios discursos. Por causa dela,
nosso tempo é responsável por uma das maiores façanhas da humanidade:
graças aos comerciais, conseguem convencer e mudar comportamentos,
usando um tempo de, no máximo, 30 segundos...
Vale dizer: a televisão é a síntese dos meios de comunicação social. Nela os
textos, imagens e sons adquirem vida. Mais: ela faz a vida ser mais real que a
própria vida, transformando tudo – em especial, a vida – num grande show.
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Não há como não reconhecer, além da qualidade técnica de suas máquinas e
equipamentos, os esforços dos que fazem da tevê a educadora exemplar. Digase o mesmo tanto dos equipamentos como dos que atuam no rádio e na mídia
impressa. São realmente competentes!
Tão competentes que nem é preciso que se lhes seja dito sobre o que eles têm
de pensar e fazer. De tal modo foram apropriados pelos donos das máquinas
que eles mesmos se apropriaram de falas e pensamentos como se deles
fossem. É possível que nem eles saibam o que eles próprios podem pensar...
Ou se o sabem, a tal ponto se retorceram que o que sai de suas bocas, mãos e
cabeças não é mais o que eles querem, mas tão somente o que querem deles.
Aliás, esse não é um fenômeno exclusivo dos homens e mulheres que
trabalham nos meios de comunicação. Claro que não! Tanto nas famílias como
nas escolas e nas corporações, em geral, ou os homens trabalhadores pensam
e agem como querem os donos das máquinas ou, simplesmente, não há lugar
pra eles. E do mesmo modo como se dá nas instituições midiáticas também
nas outras os pensamentos e os procedimentos já estão previstos, testados e
afinados. Ora, pra que servem os pais, os professores, os chefes, os editores,
os diretores, os supervisores? Não são reconhecidos e/ou pagos para que os
discursos que, em geral, nem deles são, simplesmente não se alterem?
No mundo das mídias, todavia, essas características tornam-se ainda mais
evidentes. Por quê? Porque o fim principal ao qual elas foram destinadas é
educar a sociedade. E elas não deixam de educar as pessoas, porque elas não
não podem deixar de educar a todos, não importando se são velhos, crianças,
jovens, adultos, sãos, alegres, tristes, portadores de deficiência ou doentes
mentais.
Pois é isto o que a televisão faz 24 horas por dia durante 365 dias por ano ao
longo de anos a fio. E o que ela ensina? Exatamente o que ela tem de ensinar:
a competição. Não é este o tema de suas novelas, de seus programas de
auditório, das músicas que divulga, das matérias que compõem os noticiários,
dos comentaristas e colunistas sedentos de justiça? Sobre o que tratam os
principais documentários e a maioria dos filmes especialmente produzidos para
a 'telinha' ou para os 'cadernos especiais' dos jornais e revistas? O que são e
querem as peças publicitárias inseridas nas falas, nos textos, nas imagens, nos
intervalos e nos espaços das mídias impressa, radiofônica e televisiva? E o que
fala, aparece e convence subliminarmente?
As mídias – meios de comunicação oficial/comercial, em particular a tevê – são
balcões de loja que mostram, oferecem e vendem ideias, produtos e serviços.
Montando as barracas e simpaticamente atuando como vendedores, homens e
mulheres – apóstolos não somente escolhidos, mas treinados, disciplinados e,
sobretudo, devotados e envolvidos com a causa – elaboram, produzem,
apresentam e defendem pautas que sustentam e mantém as máquinas e seus
donos – para quem o que realmente importa e efetivamente interessa é que
cada membro da sociedade não seja mais do que um mero consumidor de
suas ideias, produtos e serviços.
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Por fim
Não erramos, pois, se afirmamos que o fato de ainda aceitarmos os reais
propósitos da comunicação oficial/comercial fez e faz dela o grande achado dos
dirigentes das sociedades que optaram pelo des-envolvimento. Não é o que
querem, de um lado, os representantes oficiais dos donos das máquinas e de
outro, os consumidores de suas ideias, produtos e serviços?
Se deixamos de lado as nossas raízes mais profundas, des-volorizando nossas
antigas formas de ver e tratar o homem e a convivência social, adotamos como
nossos outros modos de lidar com as pessoas. Não é por causa disto que
adoecemos como corpo social?
Se adotamos como nossos os ideais impostos pelos grupos que fizeram as
chamadas revoluções burguesas, definimos como de toda a sociedade os
objetivos e as escolhas daqueles grupos. Não é por isso que, sem dificuldade,
aceitamos ser educados para não frequentar espaços que não os permitidos e
reservados?
Se aprendemos com os meios de comunicação oficial/comercial a treinar e a
defender a competição como o principal valor dessa sociedade, e concordamos
com isso, aprofundamos ainda mais as várias formas de ignorância, miséria e
violência entre nós. Não é por isto que damos tanta audiência e levamos tão a
sério o que dizem, escrevem e mostram nas mídias, especialmente na tevê?
Reconhecemos a criatividade, a importância, os esforços e o enorme sucesso,
tanto dos empreendedores como dos realizadores desse tipo de comunicação,
que certamente é o maior e mais efetivo invento para controlar as sociedades
que optaram pelo des-envolvimento. Não fossem eles, os que vieram antes de
nós seguramente não teriam aceito tantas e brutais alterações nas formas de
convivência social. Não fossem eles, certamente não seríamos tão pacientes e
coniventes com as recorrentes, insistentes e múltiplas formas de ingerência
em nossa vida individual e coletiva.
Afirmamos no início deste texto que nomear e contextualizar essas alterações,
a fim de entendê-las, é uma necessidade e que, uma vez compreendidas, são
um desafio para cada um de nós. Divulgar e discutir os propósitos e os modos
como operam os meios de comunicação oficial/comercial são, sem dúvida, os
primeiros passos. Tomara que as ideias apresentadas aqui contribuam para o
que pode vir a ser o grande achado dos grupos sociais americanos e africanos
que, conscientemente ou não, tanto colaboraram com o grande feito dos
europeus e estadunidenses; dos que querem e buscam outras formas de
convivência social pautadas em princípios como solidaridade e apoio mútuo e
plenas de envolvimento das pessoas e das sociedades.
São Paulo, julho de 2011
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