C ONTRA
A CORRENTE
Fabiane Cavalcanti*
Como tudo o que diz respeito à ciência no Brasil, o jornalismo
científico – uma das modalidades da divulgação científica – sofre com
a falta de investimento e de espaço. Enquanto nas instituições de
pesquisa não chega dinheiro para financiar os trabalhos, faltam
anunciantes para manter as publicações na mídia. Se, na hora de cortar
despesas, o setor de ciência e tecnologia é um dos mais prejudicados,
quando é necessário “enxugar” os custos com o papel do jornal ou
revista, adivinhe onde o espaço é reduzido?
Questões mais específicas à prática do jornalismo científico –
como a relação entre jornalistas e cientistas, com suas diferentes
linguagens, modos de produção e timing – são hoje praticamente
superadas ou mais facilmente contornáveis, por causa da conscientização
sobre a importância da divulgação científica. Esses problemas
infernizavam as cabeças dos repórteres e pesquisadores há dez anos,
quando, curiosamente, havia mais espaço para a ciência na mídia
impressa. Nos jornais, os espaços começaram a diminuir em meados
dos anos 90, com a chamada “crise do papel”.
No Jornal do Commercio (JC), do Recife-PE, não foi diferente. A
primeira editoria diária de ciência do Norte e Nordeste, criada em
junho de 1989, teve espaço e equipe reduzidos, mas escapou de ser
extinta (como chegou a ser proposto!) por decisão da direção do jornal.
Ciência/Meio Ambiente passou a ser uma subeditoria da Editoria de
Cidades, tendo em média meia página por dia (antes era geralmente
uma página limpa). A disposição de manter o produto, diferenciado
em relação aos outros dois jornais de Pernambuco, repercutiu quando,
em 1997, o JC ganhou o 17º Prêmio José Reis de Divulgação Científica,
concedido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq).
Apesar do enxugamento, a flexibilidade aumentou. Hoje, quando
o assunto exige, Ciência/Meio Ambiente pode ganhar mais espaço ou
até ir para a capa do caderno de Cidades. E a cobertura pode
* Jornalista e mestra em lingüística pela Universidade Federal de Pernambuco. É subeditora de
Ciência/Meio Ambiente do Jornal do Commercio (Recife-PE).
218
.C
IÊNCIA E
PÚBLICO
eventualmente ter o apoio de outros repórteres, além da responsável
pelo setor.
As matérias são publicadas sob o selo de Ciência/Meio Ambiente,
de terça-feira a domingo. Nas sextas-feiras, são veiculados ainda a coluna
Vida & Ciência, destinada a artigos, e o serviço de balneabilidade das
praias de Pernambuco. No sábado, sai a avaliação da qualidade do ar
na Região Metropolitana do Recife. E, nos domingos, há a seção “De
Olho na Ciência”, projeto que implantei em 1996. É um espaço em
que pesquisadores e professores respondem a perguntas enviadas por
leitores do JC.
Do ponto de vista editorial, a preferência é a publicação de
reportagens sobre pesquisas desenvolvidas em Pernambuco e no
Nordeste, seguidas de matérias nacionais e internacionais. A ordem
inverte-se, claro, dependendo da importância do assunto. Mas ter uma
pauta diária local é uma característica que diferencia Ciência/Meio
Ambiente de outras editorias de ciência do país.
A redução do espaço impôs um outro desafio: aumentar a
concisão das reportagens, sem permitir que os textos fiquem pouco
atraentes para o público não-especializado ou imprecisos nos dados
científicos.
A cobertura de ciência feita pelo JC ainda não tem a abrangência
e o espaço ideais. No entanto, considero a continuidade da publicação
diária de Ciência/Meio Ambiente um indicativo de que é possível “nadar
contra a corrente” imposta pelo cenário econômico e cultural da ciência
no Brasil e, mais especificamente, no Nordeste.
Download

CONTRA A CORRENTE Como tudo o que diz respeito à ciência no