Debate sobre censura a biografias marca o último sábado da XVI
Bienal do Livro Rio
Também passaram pelo evento John Freeman, editor da revista literária Granta, Mary
Gabriel, biógrafa de Karl Marx, e Sylvia Day, um dos principais nomes da nova literatura
erótica
Uma das mesas mais esperadas deste sábado na Bienal do Livro Rio, intitulada “A vida proibida
do craque”, aconteceu às 20h, no Placar Literário, reunindo o escritor Ruy Castro e o deputado
Alessandro Molon, sob mediação de Paulo César Araújo. A abertura do debate foi marcada pela
leitura, por Ruy, do “Manifesto dos intelectuais brasileiros contra a censura às biografias”, documento
redigido por diversas personalidades do meio literário como Zuenir Ventura, Rosiska Darcy de Oliveira,
Cristovão Tezza, Ferreira Gullar e o próprio Ruy Castro. O texto ressalta a importância do gênero para a
imortalização de personagens e a consolidação de um patrimônio de símbolos e tradições nacionais e
pede que seja aprovado o projeto de lei que permite a publicação de biografias sem a necessidade de
autorização prévia do objeto de estudo dos autores.
Para Ruy Castro, de “Estrela Solitária – Um brasileiro chamado garrincha”, livro proibido de ser
publicado pela família do jogador de futebol, existe certo cinismo por parte dos parentes dos
biografados. “Durante três anos entrevistei pelo menos dez filhos de Garrincha e, cinco dias antes da
publicação do livro, após uma entrevista minha para a televisão, a editora foi procurada por advogados
dos herdeiros que diziam desconhecer a publicação”, conta o escritor. A família pedia um milhão de
dólares para liberar a venda da obra. “Anos depois, uma das filhas foi questionada sobre qual trecho
do livro havia desagradado e respondeu que não sabia, pois nunca havia lido.”
Já Paulo Cesar Araújo viu sua obra ser questionada pelo próprio biografado, após 15 anos de
pesquisa. Autor de “Roberto Carlos em detalhes”, o escritor conta que passou anos de sua vida
tentando agendar uma entrevista com o cantor, mas nunca foi recebido. “Quando Roberto escreveu
‘Eu sou terrível’ ele não estava brincado”, brinca.. O músico, além de reivindicar uma multa diária de
500 mil reais para que o livro não fosse vendido, ainda pediu na justiça a prisão do escritor. “Ele
acredita que só deve haver um livro sobre determinado personagem e defende que sua história é um
patrimônio que pertence somente a ele”, comenta. Assim como a família de Garrincha, Roberto Carlos
nunca chegou a ler a biografia, mas não deixou de embargar a publicação.
Diferente do livro sobre a vida do Rei, a obra sobre o Anjo das Pernas Tortas foi liberada após
uma negociação que envolveu o pagamento de 30 mil reais a cada filho vivo do jogador, além de 300
mil para cada advogado envolvido no processo. As obras proibidas poderiam ter outro destino se a
Câmara dos Deputados não tivesse entrado com recurso contra o projeto de lei que prevê que a
ausência de autorização não impede a divulgação de imagens, escritos e informações com finalidade
biográfica de pessoa cuja trajetória pessoal, artística ou profissional tenha dimensão pública ou esteja
inserida em acontecimentos de interesse da coletividade.
Segundo Alessando Molon, relator do projeto, proibir a publicação de uma obra é ferir o direito
à liberdade de expressão. Para o deputado, os autores têm o direito de escrever e os leitores, de saber
o que se passa na vida de pessoas públicas, que são exemplos para a população. “Perdemos o direto
de conhecer o nosso país por meio da história de personagens importantes”, acredita. Ruy Castro
concorda. “Como seria possível contar a história do Brasil no século 19 sem citar Dom João VI e Dom
Pedro I? Imaginem se a família Bragança resolvesse nos proibir”, conclui.
Encontros com autores
O consultor e escritor James Hunter era uma das atrações internacionais mais aguardadas deste
sábado (7) na XVI Bienal Internacional do Livro. O americano, que já vendeu três milhões de “O monge
e o executivo” somente no Brasil, foi apresentado pela jornalista Claudia Chaves e abordou temas
como liderança e sucesso.
Depois de agradecer em português a presença do público, Hunter se desculpou: “Peço perdão
por estar aqui e não saber a língua de vocês, mas infelizmente nos Estados Unidos não incentivavam o
aprendizado de outras línguas”. Hunter respondeu com entusiasmo às perguntas de quem estava no
Auditório Mario de Andrade, mostrando intimidade com o público brasileiro depois de já ter passado
por mais de 30 cidades do país.
“O Brasil é um ótimo lugar, com pessoas maravilhosas, mas me preocupo com a questão da
liderança aqui”, contou Hunter, que comentou ainda o sucesso que o livro faz no país. “Escrevi ‘O
monge e o executivo’ em 1997, e em 2005 recebi uma ligação do editor da Sextante me convidando
para dar uma palestra no Brasil, pois o livro era um sucesso de vendas”, lembrou.
Hunter comentou a identificação do brasileiro com sua obra e falou também sobre a história e
seus personagens. “O brasileiro tem boa vontade e gosta de ser útil, por isso se identifica”, opinou. “A
história do livro é uma parábola para ensinar as verdades, e os personagens foram inspirados em
pessoas que conheci”.
O outro encontro do dia foi com a americana Sylvia Day, no topo das listas internacionais de
mais vendidos com os best-sellers “Toda sua”, “Para sempre sua” e “Profundamente sua” (Paralela). O
público feminino, de todas as idades, compareceu em peso para conhecer a autora, fazer perguntas e
participar de uma sessão de autógrafos.
Com mais de dois milhões de cópias vendidas e os direitos da série “Crossfire” negociadas
recentemente para a TV, Sylvia Day contou que demora de quatro a oito semanas para fazer um
rascunho geral do livro. “Depois que escrevo o texto, ele ainda passa por várias outras etapas até ser
finalizado. Por isso os livros demoram a ser publicados”, contou. “Ainda não tenho uma previsão do
lançamento do quarto livro. Só posso dizer que já está bem avançado”, revelou, arrancando gritos das
fãs.
Questionada sobre o amor que descreve em seus livros, Sylvia diz que acredita absolutamente
que esse tipo de relação exista na vida real. “O amor deve ser uma paixão selvagem, e se você está em
um relacionamento assim deve permanecer nela”, disse. “Homens como o *personagem] Gideon Cross
existem, sim e, felizmente, eu já encontrei alguns com ele.”
Há dez anos redigindo romances, Sylvia contou que tenta estar sempre pronta para escrever.
“Alguns escritores conseguem sentar e escrever todos os dias. Para mim é mais orgânico, eu preciso
sentir a história. Mas procuro estar sempre com o computador perto de mim para quando a inspiração
vier”, disse.
Traduzindo brasileiros
“Bons tradutores são como assistentes de mágicos, personagens-chave para o sucesso de uma
obra”, afirmou John Freeman, ex-editor da revista literária britânica “Granta”, durante o primeiro Café
Literário do dia, dedicado a debater os desafios da tradução de textos nacionais e a repercussão de
autores brasileiros no exterior, com mediação do jornalista Rinaldo Gama. Freeman dividiu o palco
com Alison Entrekin, tradutora australiana residente no Brasil, e José Luiz Passos, romancista
pernambucano e professor de literatura brasileira na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos.
“A língua portuguesa é muito elástica. Não vejo tantas experimentações linguísticas nos textos
de autores ingleses, talvez pela estrutura do idioma, com frases mais curtas”, apontou Entrekin.
“Qualquer obra pode ser bem traduzida, só que muitas vezes não há a correspondência cultural
necessária à tradução de determinados livros, tais como ‘Cidade de Deus’, cheios de gírias que
dialogam com o contexto onde a história acontece – o que dificulta o trabalho”, explica a tradutora.
Para Passos, “escolhas bem feitas reconstroem bem qualquer obra”. Apesar disso, o professor
da UCLA afirmou que não existem traduções iguais, e essa, para ele, é uma qualidade. “Em minhas
aulas, utilizo traduções de diferentes profissionais e épocas dos livros de Machado de Assis, por
exemplo, e acho que cada uma delas tem seu valor”.
Freeman, que lança na Bienal “Como ler um escritor” antes mesmo de a publicação chegar às
lojas dos EUA, em outubro, ressaltou durante o papo a importância da projeção de novos autores
brasileiros no exterior. “Acho que a edição especial de Granta dedicada a essa nova geração contribuiu
para traçar um panorama da literatura nacional contemporânea”, disse. “Conhecendo apenas um
escritor de terminado país, certamente temos uma visão distorcida daquele lugar. Ainda que seja Jorge
Amado, brilhante. Tinha a ideia de que todos os escritores brasileiros ficavam nus o tempo todo”,
brincou o crítico, referindo-se à ideia preconceituosa de certos americanos com relação ao Brasil.
Ainda no Café Literário, os ilustradores Roger Mello, Andrés Sandoval e Axel Scheffler – criador
do personagem infantil de “O grúfalo”, já traduzido para mais de 40 línguas – conversaram sobre a
arquitetura do livro e a criação e a produção da ilustração infantil. “O livro é um objeto e um espaço
que tem características próprias e que levam a um tipo de percepção. Quanto mais exploro os espaços
e os recursos do livro, melhor”, acentuou Andrés.
Boemia, vida familiar e revolução
Também no Café Literário, o público acompanhou o bate-papo embalado por aspectos
históricos que marcam as obras dos convidados. “Uma narrativa impressionantemente ágil”, segundo
o mediador e professor da Universidade Federal Fluminense Felipe Pena, “Amor e capital: A saga
familiar de Karl Marx e o nascimento de uma revolução” (Zahar), da biógrafa Mary Gabriel, foi o
assunto mais destacado no encontro.
Segundo a autora, as pesquisas para o livro foram embasadas pelas cartas escritas por Marx, sua
esposa e as três filhas do casal, além da fiel governanta. “Minha busca começou em 2002. Tive contato
com colecionadores na Itália e na França, mas encontrei a maioria dos arquivos em Moscou”.
Para Daniel Aarão, “Amor e capital” traz à tona uma perspectiva pouco divulgada sobre a vida
do grande teórico do socialismo. “Marx era um racionalista romântico. Mary escapa de uma cilada:
falar apenas do racionalismo e da genialidade de Marx, sem abordar a dimensão afetiva. O
entrelaçamento entre o privado e o público é inerente à vida humana”, ressaltou o acadêmico. Ao
longo da conversa, Daniel adiantou que vai lançar em 2014 um novo livro intitulado “Da ditadura à
democracia” para marcar os 50 anos do Golpe de 1964.
A afirmação de Daniel é compartilhada por Andrew Miller. “No romance histórico, os aspectos
pessoais estão na raiz da obra”, completou o premiado autor de “Puro”, considerado pelo The
Guardian um dos dez melhores romances históricos de todos os tempos ao analisar a sociedade
francesa antes da Revolução de 1789.
Quando questionada, Mary afirmou ter mudado sua percepção sobre Marx após a produção
biográfica, levando em conta o lado humano e familiar do personagem. “Como homem, achava que
ele era frio. Mas passei a amá-lo como sua família o amava. Ele era como um artista totalmente
dedicado ao seu trabalho que contava com o apoio das mulheres da família, sempre ao seu lado. As
pessoas não conseguiam compreendê-lo. Ele sentia que tinha uma missão e o mundo era um
desapontamento. Para o público, ele era um personagem diferente. No livro eu junto essas duas
pessoas”.
Bienal para jovens
Os nerds lotaram o auditório Rachel de Queiroz para o encontro com o escritor Eduardo Spohr,
que falou na tarde deste sábado – dentro da programação do #acampamento na Bienal – sobre a
literatura de fantasia. Os fãs dos livros da série “Filhos do Éden”, entre outros, ainda presenciaram a
homenagem que a editora Record organizou para comemorar a marca de 600 mil livros vendidos.
“O tema central de ‘A Batalha do Apocalipse’ é o livre arbítrio. O leitor fica revoltado, mas essa
é a metáfora, o poder de escolher o nosso destino. Essa é a hora de o leitor entrar em ação”, explicou
Spohr quando questionado sobre o fim da história que publicou em 2007.
Spohr respondeu ainda sobre a diferença do mercado desde o lançamento das primeiras 100
cópias de “A Batalha do Apocalipse”. “A internet trouxe mudanças, os blogs ganharam muita
importância. Também temos hoje a comunicação através das redes sociais”, opinou Spohr.
Os jovens ouvintes pediram dicas para quem deseja trabalhar como escritor. “Pode parecer
clichê, mas o trabalho é a única maneira de conseguir sucesso como escritor ou em qualquer outra
profissão”, opinou Spohr.
Spohr adiantou um pouco a história do livro que está escrevendo, ainda sem data de
lançamento. “’Paraíso Perdido’ abre os caminhos para ’A Batalha do Apocalipse’, mas ainda estou
trabalhando nele. Tenho certeza de que vocês vão gostar”, contou Spohr, fazendo mistério para
instigar os leitores presentes.
No mesmo auditório, centenas de adolescentes receberam Thalita Rebouças, musa da literatura
teen. Carismática e bem-humorada, a autora conversou com as fãs e se preparou para uma rodada de
autógrafos, além de receber carinhos e elogios do público e homenagem de seu fã clube.
“Quando escrevo quero fazer rir, quero que os adolescentes leiam, mas nunca imaginei que ia
mudar a vida de alguém ou que ia melhorar o relacionamento entre pais e filhos. Fico
superemocionada com as histórias. Escrevo há 13 anos, e tem gente que me acompanha há muito
tempo, é muito bacana”, contou. Este ano ela lança no evento o livro “Ela disse, Ele disse: O namoro”,
parceria com Maurício de Sousa. Em outubro sai seu primeiro livro para o publico infantil: “Por que só
as princesas se dão bem?”.
Os patrocinadores
O evento tem como patrocinadores másters a CCR, o Grupo Bradesco Seguros e a Petrobras,
contando com o apoio cultural do BNDES. A Light patrocina a visitação escolar; a Supergasbras, o
Placar Literário; a Secretaria Municipal de Cultura, o #acampamento na bienal; a Submarino, o ecommerce; o Iba, o Café Literário; e os Correios patrocinam a operação logística. A Rede D’OR é
responsável pelo serviço médico do evento.
A Bienal também conta com a realização do Ministério da Cultura através da Lei Federal de
Incentivo à Cultura e com o patrocínio do Governo do Rio de Janeiro, através da Secretaria de Estado
de Cultura, pela Lei estadual de Incentivo à Cultura do Rio de Janeiro.
Os organizadores
Com escritórios no Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Bahia, a Fagga l GL events
exhibitions é uma das maiores empresas em promoção e organização de feiras do país, responsável
pela realização de mais de 20 eventos anuais. Subsidiária do grupo GL events Brasil, operação
brasileira de um dos maiores grupos do setor de eventos do mundo - a francesa GL events -, a Fagga
soma mais de meio século de experiência.
O SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros) é uma sociedade civil que tem como objetivo
o estudo e a coordenação das atividades editoriais no Brasil, assim como a representação legal da
categoria de editores de livros e publicações culturais. Sua missão é dar suporte à classe nas áreas de
direitos autorais, biblioteconomia, trabalhista, contábil e fiscal. A atual presidente do SNEL é Sonia
Jardim, que também é vice-presidente de operações do Grupo Editorial Record.
Mais informações para a imprensa:
Adriane Constante – [email protected]
João Veiga – [email protected]
Cláudia Montenegro – [email protected]
Tel.: (21) 3461-4616 – ramal 123 – www.approach.com.br
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