Déjà vu (*) Caio Márcio Costa Rodrigues da Cunha O número 7 do volume 12 (julho de 2007) do Eye World traz, em sua página 10, artigo assinado por John Ciccone, Diretor de Comunicações da ASCRS, intitulado: “Optometristas buscando expandir sua área de atuação – ameaça permanente à saúde1 do paciente”O número 7 do volume 12 (julho de 2007) do Eye World traz, em sua página 10, artigo assinado por John Ciccone, Diretor de Comunicações da ASCRS, intitulado: “Optometristas buscando expandir sua área de atuação – ameaça permanente à saúde1 do paciente” Eu o li e não resisti à tentação de traduzi-lo, de forma condensada, imaginando que os leitores do Jota Zero que tenham algum interesse nas discussões que hoje se travam, no Brasil, sobre a questão da regulamentação da optometria não-médica, talvez venham a reconhecer nele algumas idéias... familiares. Eu tenho quase certeza de já ter lido, ou ouvido, algumas delas antes. O original pode ser lido, em inglês, no próprio site do Eye Worl, na Web, por aqueles que preferirem “abeberarse na fonte”. Foram apresentados no Alaska, no Novo México e em Oklahoma, neste ano, projetos de leis estaduais que buscam expandir a área de atuação dos optometristas, permitindo-lhes até executar cirurgias. Os oftalmologistas estão lutando contra esses esforços, com o apoio da Academia Americana de Oftalmologia e da Sociedade Americana de Catarata e Cirurgia Refrativa, além de outras entidades médicas. A Dra. Cynthia Bradford, Secretária para Assuntos de Estado da Academia Americana de Oftalmologia e professora de oftalmologia no Colégio de Medicina da Universidade de Oklahoma, afirma não acreditar que o status de ‘cirurgião virtual’ seja desejado pela maioria dos optometristas, mas alerta que esse é o objetivo nacional das ‘lideranças 1 No original, “welfare”. optométricas’, que o estão perseguindo, agressivamente, nos respectivos estados, em todo o país. Pondera a Dra. Bradford: “Seria inocente pensar que esse problema vai simplesmente acabar”, diz ela. “É um processo lento, de água sobre pedra, capaz de criar, ao longo do tempo, um Grand Canyon... é algo com que nós temos que nos preocupar”. Ela alerta que os optometristas passam a usar brechas da legislação em seu favor, para executar procedimentos e prescrever medicações, e que, depois de algum tempo, eles passam a dizer aos legisladores que as novas leis que propõem constituiriam apenas uma “evolução lógica”, já que, afinal, eles vinham executando essas tarefas há anos... E que o resultado desse processo é a gradativa ampliação das atibuições dos optometristas: projetos de leis hoje em tramitação em diversos estados já buscam permitir aos optometristas cirurgias a laser, injeções subconjuntivais e palpebrais, e retirada de lesões da pálpebra. “Há procedimentos técnicos para os quais as pessoas podem ser treinadas, mas, e quanto ao diagnóstico? O que acontecerá se ele estiver errado? Qual será o passo seguinte? Sem a ampla experiência da educação médica formal e do treinamento clínico, não se pode chegar a um diagnóstico acurado”, diz a Dra. Bradford. Os optometristas têm tentado racionalizar os argumentos em prol da expansão de suas atribuições. Um desses argumentos seria o de que os pacientes, principalmente nas áreas rurais, muitas vezes têm dificuldades para ter acesso a um oftalmologista. “Não é bem assim”, diz a Dra. Bradford. “Em Oklahoma City eu recebi um paciente com lesões palpebrais, cuja biópsia determinou serem malignas, e que não tinham sido corretamente tratadas. O paciente foi enviado por um optometrista de uma pequena cidade onde havia um oftalmologista acessível em menos de dez minutos, que bem poderia ter proporcionado ao paciente o cuidado adequado. De qualquer forma, o essencial é que os pacientes rurais têm o mesmo direito a um tratamento com qualidade que aqueles das áreas mais populosas”. Em algumas campanhas, os oftalmologistas têm sido acusados de procurar limitar a atuação dos optometristas para proteger suas clínicas e sua renda. A Dra. Bradford contradiz esse argumento: “Se v. olhar para as agendas dos oftalmologistas, v. verá que eles estão ocupados. Então, não é uma questão de perder pacientes, ou renda. Foi a preocupação com a qualidade do serviço que levou a Associação Médica Americana, o Colégio Americano de Cirurgiões, a Associação Osteopática Americana, e outras entidades, a defenderem o conceito de ‘cirurgias por cirurgiões’. Os oftalmologistas representam somente três a cinco por cento de toda a medicina, então, nós certamente não estamos em posição que nos permita empurrar essas organizações no sentido de contribuir com nossos esforços. Elas, entretanto, enxergaram a questão como nós o fazemos, isto é, como uma questão de qualidade de serviço”. Desde 1990, a campanha ‘cirurgias por cirurgiões’ tem ajudado 17 estados a rejeitar a linguagem da ‘cirurgia optométrica’. Arizona, Montana, Texas e Washington baixaram normas para tornar claros quais procedimentos são considerados ‘cirúrgicos’, situando-se, portanto, fora do alcance da prática da optometria. Em 2004, o Comitê Executivo da ASCRS decidiu por proibir que optometristas registrassem suas inscrições para o Simpósio anual, a menos que comprovassem ser empregados de oftalmologistas, e assinassem um documento reconhecendo que sua participação não os qualificaria para executar cirurgias, nem lhes proporcionaria créditos de educação médica continuada. A razão para tal exigência foi a constatação de que os optometristas usavam os comprovantes de sua participação em congressos médicos para alegar, na justiça, que, já que haviam freqüentado os mesmos cursos de educação médica continuada que os médicos, deveriam, portanto, ter permissão para realizarem cirurgias. “Nós temos que permanecer vigilantes”, diz a Dra Bradford. “Quando esses projetos de lei aparecem, eles têm que ser motivo de atenção”. (*) Caio Márcio Costa Rodrigues da Cunha, Bacharel em Direito. e-mail [email protected] JOTA ZERO 19