B1 B2 B3 Secundário Nível Área de competência chave CIDADANIA E PROFISSIONALIDADE CP_1 Liberdade e responsabilidade democráticas UFCD Liberdade e Responsabilidade Pessoal (1) Tema X QUE SE ENTENDE POR LIBERDADE? O conceito de liberdade é um conceito complexo e entendido de maneiras diferentes. De facto, há pensadores que defendem um conceito absoluto ou metafísico de liberdade; outros afirmam a necessidade da liberdade, mas considerando que a liberdade humana é sempre uma liberdade finita e condicionada; outros, ainda, negam a existência da liberdade humana, concebendo-a como uma ilusão acerca das nossas possibilidades reais. Estes pensadores são chamados deterministas, pois são de opinião que tudo o que acontece tem uma razão de ser e só julgamos que temos liberdade de escolha por não sabermos o que em nós actua. Assim sendo, cada ser humano seria simplesmente uma espécie de marioneta, não tendo qualquer margem de escolha. A sua conduta seria uma consequência de forças externas ou interiores, físicas ou psicológicas, que a determinam necessariamente sem lhe deixar qualquer possibilidade de opção. É neste contexto que se situam aqueles que acreditam que existe um destino ou um desígnio divino que tece a trama da nossa vida, fazendo com que as nossas escolhas sejam apenas aparentes. Todavia toda a análise do conceito da acção humana contraria este determinismo e afirma a possibilidade e a realidade da liberdade, desde logo atestada pela nossa consciência, a qual apreende e experiencia a sua evidência de modo imediato. Efectivamente, todos já sentimos a experiência da liberdade e tomamos consciência que os obstáculos que se lhe opõem não a anulam. A nossa própria natureza biológica exige a liberdade, pois, não nos pré-programou para reagir de uma maneira única aos estímulos. Nascendo isento desta programação, como que inacabado, e com a capacidade de criar/criar-se, o ser humano assume um estatuto particular em relação às coisas e aos outros seres vivos, devido precisamente a esta indeterminação A liberdade humana, porém, não é uma liberdade absoluta, um poder agir independentemente de coacções exteriores e de determinações e influências exteriores ou interiores, ou seja, um fazer o que lhe apetece ou uma omnipotência. É, antes, uma liberdade situada e condicionada, dependendo das facilidades ou das dificuldades que as circunstâncias lhe impõem. Efectivamente, o ser humano não pode realizar tudo aquilo que deseja. A sua liberdade, enquanto capacidade de auto-determinação, é condicionada por factores físico-biológicos, sócio-culturais e pessoais. As escolhas que vamos realizando ao longo da vida condicionam a nossa personalidade e determinam a opção por um determinado projecto pessoal de vida, a realizar justamente através da nossa acção. Vivemos inseridos numa sociedade cujas normas e padrões comportamentais também impõem limites à nossa possibilidade de opção. Além destes limites legais, há ainda que ter em conta os limites que impomos a nós mesmos (os limites morais) e os que decorrem da nossa finitude temporal e da nossa imperfeição (limites absolutos). Porém, estes limites não anulam a liberdade. São antes um conjunto de obstáculos que, desafiando a criatividade humana, levam à sua constante superação. Organização: Ana Paula Rodrigues 1/3 Organograma Liberdade Condicionantes Físico-biológicas Sócio-culturais Limites Pessoais Impostos pela sociedade (legais) Auto-impostos (morais) Absolutos (impostos pela imperfeição e finitude humana) A liberdade humana é uma liberdade limitada e condicionada. As condicionantes e os limites impostos à liberdade humana não anulam a liberdade. TEXTO 1 O que é ser Livre? Quando te falo de liberdade é a isto que me refiro. (...) É verdade que não podemos fazer tudo o que quisermos, mas também é certo que não estamos obrigados a querer uma só coisa. E aqui convém introduzir dois esclarecimentos a propósito da liberdade: Primeiro: não somos livres de escolher o que nos acontece (ter nascido certo dia, de certos pais, em tal país, sofrer de cancro ou ser atropelado por um carro, ser bonitos ou feios, que os Aqueus queiram conquistar a nossa cidade, etc.), mas somos livres de responder desta maneira ou daquela ao que nos acontece (obedecer ou revoltar-nos, ser prudentes ou temerários, vingativos ou resignados, vestir-se de acordo com a moda ou disfarçar-se de urso das cavernas, defender Tróia ou fugir, etc.). Segundo: sermos livres de tentar alguma coisa nada tem a ver com a sua obtenção indefectível. A liberdade (que consiste em escolher dentro do possível) não é a mesma coisa que omnipotência (que seria alguém conseguir sempre aquilo que quer, ainda que tal pareça impossível). Por isso, quanto maior capacidade de acção tenhamos, melhores resultados poderemos obter da nossa liberdade. Sou livre de querer subir ao monte Everest, mas, dado o meu lamentável estado físico e a minha preparação nula em alpinismo, é praticamente impossível que alcance o meu objectivo. (...) Há coisas que dependem da minha vontade (e isso é ser livre), mas nem tudo depende da minha vontade (caso contrário, seria omnipotente), porque no mundo há muitas outras vontades e muitas outras necessidades que eu não controlo a meu talante, Se não me conhecer a mim próprio nem ao mundo em que vivo, a minha liberdade esbarrará uma e outra vez na necessidade. Mas, aspecto importante, nem por isso deixarei de ser livre...ainda que caia. Na realidade existem muitas forças que limitam a nossa liberdade, dos terramotos ou doenças aos tiranos. Mas também a nossa liberdade é uma Organização: Ana Paula Rodrigues 2/3 força no mundo, a nossa força. Uma pessoa pode considerar que optar livremente por certas coisas em certas circunstâncias é muito difícil (entrar numa casa em chamas para salvar uma criança, por exemplo, ou combater firmemente um tirano) e que é melhor dizer que não há liberdade para não se reconhecer que livremente se prefere o mais fácil, quer dizer, esperar pelos bombeiros ou lamber a bota que nos pisa a garganta. Mas nas tripas sentimos qualquer coisa que insiste em dizer-nos: “se tivesses querido...”. (...) Em resumo: ao contrário de outros seres, vivos ou inanimados, nós os seres humanos podemos inventar e escolher parte da nossa forma de vida. Podemos optar pelo que nos parece bom, quer dizer, conveniente para nós, frente ao que nos parece mau e inconveniente. E, como podemos inventar e escolher, podemos enganar-nos (...). Assim, parece prudente estarmos atentos ao que fazemos e procurar adquirir um certo viver que nos permita acertar. Esse saber viver, ou arte de viver, é aquilo a que se chama Ética.» Fernando Savater, Ética para Um Jovem, Lisboa, Publicações D. Quixote Proposta de Actividades Tendo por base o Texto 1, responda: 1. O autor admite que liberdade seja a mesma coisa que omnipotência? Justifique apresentando os argumentos do autor. 2. Se existem muitos obstáculos que limitam a nossa liberdade, como podemos continuar a defender que somos livres? Bibliografia • ALVES, Fátima, AREDES, José, CARVALHO, José, 705 AZUL – Introdução à Filosofia, 10º ano, Texto Editora, Lisboa, 2002 • SAVATER, Fernando, Ética para um jovem, 4ª edição, Dom Quixote, 2009 Organização: Ana Paula Rodrigues 3/3