1 Vídeo - Paulo Freire: O educador da Liberdade Data Video: Out-nov/88 Transcrição elaborada por: Isabel Cristina Nache Borges Abril 20001 Cátedra Paulo Freire Pesquisa: A gestão Paulo Freire na S.M.E. de São Paulo Professora: Ana Maria Saul PF: (...) Elza exerceu uma influência grande em mim. Acho que ela me influenciou mais do que eu a ela. Claro que também a influenciei. Digo isso porque acho difícil alguém influenciar alguém, sem ser influenciado também. (...) Durante muito tempo se falou em mim ou se pensou em mim como se eu fosse um especialista em técnicas ou métodos de alfabetização de adultos. Eu gostaria de dizer que se fosse isso verdadeiro eu não seria mal. Não acho isso uma coisa inferior, acho isso de uma importância enorme. A minha preocupação é mais gulosa do que essa. O que busco desde 50 é uma crítica a educação brasileira. Obviamente que eu incluía nessa crítica a crítica ao mecanismo mecanicista. (...) Um lavrador uma ocasião me dizia: eu agora vou fazer uma comparação de como um doutor vive e de como nós vivemos.Eu não conheço a casa onde o Dr. Mora, mas eu não tenho dúvida de que é uma “casa volta dos dois lados” deve ter um jardinzinho com uma grama. A sua casa deve ter um quarto para o senhor e sua esposa e mais dois quartos para os seus filhos. Uma cozinha com toda “linha Arno”, o sr deve ter chuveiro elétrico, uma sala boa pra comer, os meninos tem comida, tem médico. Quando o sr chega a noite em casa, os meninos já estão com o “bainho” tomado, dizem bença pai, tomam a sopinha deles e vão dormir depois que brinca. O sr fica sozinho com sua mulher, vai ao cineminha se quiser, mais tarde o sr dorme bem, deve ter ventilador no mínimo. Agora, se o sr não tiver diálogo com seus filhos, o sr é que não merece respeito nenhum! Nós moramos numa casa que tem um cômodo que é tudo: banheiro, sala, quarto com os cachorros misturados! Quando nós chegamos em casa os meninos estão endiadrados porque não comeram bem, não tem água pra tomar banho. Os meninos estão com fome, irritados, impertinentes e eu preciso dormir porque no dia seguinte as 4h da manhã a fábrica apita e acorda o bairro inteiro! Despertam a cidade! Não apenas o seu operariado! Agora, como é que o senhor vai querer que haja o diálogo que o senhor quer? O homem fez naquela noite, uma análise de classe que eu não tinha sido capaz de fazer! Naquele momento eu comecei a aprender o que significava ser uma consciência dependente, uma consciência política dependente! (...) 2 Projeto ANGICOS-RN- 1963: (300 trabalhadores alfabetizados em 40 h de trabalho. Este projeto torna PF conhecido em todo Brasil ) Plano de alfabetização do governo Goulart pretendia erradicar o analfabetismo. (...) PF: Lembro-me quando fui preso pela primeira vez e tive que atravessar uma rua. Estava parado em frente ao quartel e eu entre uma sargento e um soldado que apontavam uma metralhadora pra cima de mim. Eu estava assustadíssimo e pensava: esses caras devem saber coisas de mim que eu não sei! Ou eu sou um líder extraordinário que poderia ter feito a revolução ontem neste país, ou então eles são loucos!Como um cara como eu, um professor simples, precisava de um aparato daqueles?Eu, ali parado, cercado de balas por todos os lados! Eu era uma “lha das balas”!. As pessoas que passavam nos ônibus e me reconheciam, me olhavam com uma cara de pânico!. O que me tomava era que a minha compreensão de ser preso, tinha que ver com estelionato, roubo, essas coisas! Então eu não tinha que me ver preso!Lá, na cadeia eu refletia! Meu espanto da prisão era um espanto de classe social ! Eu encontrei camponeses presos que não tinham espanto nenhum. Porque prisão pra ele é obvio, faz parte da vida de excluído! Aprendi muito! E foi esse aspecto da cadeia que me preparou para a vida fora do Brasil. O exílio se forjou na cadeia! (...) África: Cartas a Guiné Bissau: relata experiência de alfabetização na África. No exílio começo a aprender a conviver longe do pais!Sempre pensei que diante de um problema, uma coisa que você tem que fazer é aprender com as positividades nas negatividades da situação. Sempre recusei choramingar. Sempre recusei ter pena de mim, não vergonha da minha dor, nem ter raiva. Procurei prender do sofrimento, do gozo, de aprender de tudo com as diferenças culturais por exemplo, o gosto da comida, tudo é cultura. Andando pelo Chile, com um amigo, coloquei minha mão em seu ombro e ele sem jeito me disse: Paulo, no Chile um homem não põe a mão no outro!. Agradeci, pois não sabia, mas, na volta, no ônibus pensava: “Puxa, falta alguma coisa em uma cultura que rejeite um gesto de carinho! Há realmente alguma coisa errada com a minha cultura, que não permite o toque com o corpo, um gesto afetivo. Vocês não imaginam o quanto aprendi com essa experiência do toque com o corpo . Depois me curei! (...) A Vida com Elza e com Anita. (...) PF: Eu sou um intelectual que não tem medo de ser amoroso. Eu amo as pessoas e amo o mundo, e é porque amo as pessoas e amo o mundo, que luto para que a justiça social se implante antes da caridade........