QUARTA-FEIRA, 29 DE JULHO DE 2009 O ESTADO DE S. PAULO CADERNO CADERNO 22 D3 D3 Cinema Making Of: Chico Xavier, como se fosse El Cid Daniel Filho fala do novo filme que estreia em abril e tem Ângelo Antônio como um dos três atores no delicado papel do espírita JOSÉ LUIS DA CONCEIÇÃO/AE IQUE ESTEVES/DIVULGAÇÃO EM PAULÍNIA – Ângelo Antônio, Luis Melo, Daniel Filho e Ana Rosa (E) e o menino Matheus Costa com Nelson Xavier: diretor defende tomada única, pois busca sempre a emoção da cena recém-descoberta pelo ator Luiz Carlos Merten ENVIADO ESPECIAL PAULÍNIA É um momento forte da vida de Chico Xavier, reconstituído no filme que Daniel Filho roda atualmente sobre o lendário médium brasileiro. O jovem Chico, ainda em Pedro Leopoldo, tem a revelação da mediunidade. Sua irmã está amarrada na mesa da sala, possuída por um espírito. Um casal de espíritas tenta exorcizar a entidade que comanda a possessão. O pai, desesperado, prende os pés da filha, que se debate desesperadamente. Chico entra correndo na sala, montada no estúdio do Polo de Cinema de Paulínia. Liberta a irmã de suas amarras e a tranquiliza com o simples poder de persuasão da voz. A cena é forte e o elenco que a reconstitui é de feras. Ana Rosa, Anselmo Vasconcelos, Luis Melo, Larissa Vereza (filha de Carlos), Cléo Daniel (filha de Daniel Filho) e Ângelo Antônio, um dos três atores que se revezam no papel de Chico. Se a dramaturgia é intensa, o desafio técnico não é menor. Daniel Filho filma com duas câmeras. Uma grua, e a câmera baixa em direção ao rosto da exorcizada, descrevendo um movimento circular – uma pan, de panorâmica – que a faz rodar em torno dos personagens; e outra câmera que se move sobre trilhos, no solo, captando a cena do ângulo lateral. Daniel Filho ensaia várias vezes. Troca as lentes, corrige o tempo do movimento. Os atores ora recitam suas falas, oraficamem silêncio. Apósquase uma hora de preparação, a assistente Chris D’Amato diz que está tudo pronto. Ele grita ‘Roda!’ E ‘Corta!’ Vira-se para ATEU, ELE DIZ TER VIVIDO EXPERIÊNCIA “IRRACIONAL E TRANSCENDENTAL” o repórter, o sorriso triunfante. Oneshot! Tomadaúnica.Daniel Filho não gosta de repetir os planos. Só mesmo por necessidade, quando houve alguma falha técnica. Ele busca sempre a emoção da cena recémdescoberta peloator. Seu método costuma dar certo. Deu mais uma vez. Depois de Tempos de Paz, que estreia dia 14 – um filme pequeno, com poucos atores, adaptado da peça Novas Diretrizes em Tempos de Paz, de Bosco Brasil –, Daniel continua trabalhando com tec- nologia digital, mas o filme agora é grande, caro, com mais de 100 personagens. “É um épico, é o meu El Cid, ele brinca, referindo-se ao clássico de Anthony Mann com Charlton Heston. Daniel conheceu o biografado. Seria somente o produtor de Chico Xavier. Convidou vários diretores. Um deles, Cláudio Torres, viajou na maionese e construiu o que mais parecia uma ficção científica. Veio de Rodrigo Saturnino Braga, da empresa produtora e distribuidora Sony, a pressão para que Daniel Filho assumisse a direção. “O Saturnino chegou a invocar o Vanucci.” Augusto César Vanucci foi uma figura histórica da TV brasileira –‘Meuirmão’,como odefineDaniel. Vanucci era espírita. “Quando ele vinha falar com a gente, Boni (José Bonifácio de Oliveira Sobrinho) e eu já sabíamos que íamos terminar fazendo algum programa de inspiração espírita na Globo”, lembra Daniel. Saturnino o convenceu a fazer Chico Xavier, ‘pelo Vanucci’.Ao chegar em casa, decisão tomada, o diretor conta que viveu uma experiência irracional ou transcendental, deem o nome que quiserem. “Fui contar a Olivia – sua mulher, Olivia Byington – e as lágrimas não paravam de escorrer. Estava fa- lando, estava feliz e as lágrimas desciam numa enxurrada.” O roteiro creditado a Marcos Bernstein, de Central do Brasil, bebe em várias fontes, incluindo a biografia de Marcel Souto Maior. Teve nove versões. Daniel explica que a estrutura episódica conta três fases da vida de Chico Xavier por meio de experiências decisivas que viveu na infância e já adulto, em Pedro Leopoldo, e depois em Uberaba, onde se radicou. O garoto Matheus Costa e, depois, Ângelo Antônio e Nelson Xavier vivem as diferentes fases do médium. O roteiro possibilita a realização de um filme de quase três horas, mas pela estrutura flexível, Daniel espera deixar a versão para cinema com cerca de duas horas. Haverá outra, mais extensa, para TV, para ser exibida como microssérie. Por contrato, a estreia será em 2 de abril de 2010, dia do centenário de nascimento de Chico Xavier. Coincidentemente, será Sexta-Feira Santa. Pode-se estar desenhando mais um grande êxito do cinemabrasileiro.Afinal, oespiritismo é forte no País e outro filme pequeno, sobre Allan Kardec – com Carlos Vereza –, já foi um sucesso inesperado. O diretor pediu – e obteve – a aprovação de familiares de Chico Xavier, mas não precisava, porque tem os direitos do livro. Desde que começou a trabalhar no projeto, Daniel Filho conta que ouviu 1.001 histórias sobre o médium e sobre a força do espiritismo. O que o atrai nele é seu imenso coração. Não é um filme de militante espírita, pois Daniel se autodefine como ateu. Crê numa energia superior, não em Deus. Crê no homem, apesar de tudo. Mas ele quis que alguns atores, pelo O QUE O ATRAIU FOI O IMENSO CORAÇÃO DO MÉDIUM E NÃO A MILITÂNCIA ESPÍRITA menos, fossem espíritas. Ana Rosa é. “Há mais de 30 anos, tento decifrar esse mistério”, diz a atriz, que teve vários encontros com o médium, em Uberaba. Ela conta uma história, que ouviu dele. Uma médium lhe disse que via uma chuva sobre ele. “Uma chuva do quê?’, Chico perguntava. “De livros”, ela respondeu, antecipando os 400 livros que o médium psicografou. Ontem, Ângelo Antônio filmou a cena em que Chico psicografa pela primeira vez. Ator O diretor e a tecnologia digital: “Isso é irreversível” Ele tambem comenta o inédito Tempos de Paz e sua visão de Inimigos Públicos, o novo Michael Mann PAULÍNIA Daniel Filho aproveitou sua folga de fim de semana para assistir a Inimigos Públicos, opoderoso filme de gângsteres de Michael Mann que estreou na semana passada. Interessava-lhe verousoqueoautor norte-americano está fazendo da tecnologia digital. Chico Xavier, como o longa anterior de Daniel, também foi feito em digital. En passant, Daniel conta o que parece uma piada. Ele foi com a filha, a atrizCléoDaniel, quefaz umpapel em Chico Xavier. O filme tem mais de 100 personagens e atores. “Com exceção dos três que fazem o Chico, todos passam rapidamente pelo set. Ficam dois, três, quatro dias”, explica o diretor. Ele conhece Hollywood como pouquíssima gente. Você pode ficar horas invocando clássicos com Daniel Filho. É notório, faz parte de sua biografia, que John Dillinger, o cha- mado inimigo público número um, foi morto na saída do cinema. O filme que Johnny Depp, intérprete do papel, assiste no filme de Michael Mann, é Manhattan Melodrama, de W.S. Van Dyke, de 1934, lançado no Brasil como Vencido pela Lei. O filme conta a história de um FILME DEVE ENTRAR EM CARTAZ POR OCASIÃO DOS 100 ANOS DE CHICO triângulo. Clark Gable faz o gângster. Myrna Loy é sua amada e, entre ambos, está o amigo, Dick Powell. Daniel não se conformou. “Minha filha disse que ele era muito feio. Clark Gable, o Rei! Myrna Loy e ele era como Angelina Jolie e Brad Pitt, mas essa garotada só quer saber de Brangelina...” O diretor e produtor consi- dera o digital ‘irreversível’. E ele analisa – “Quando o cinema começou a falar, houve um retrocesso. O cinema recuou 15 anos. O cinema mudo havia atingido a perfeição do preto e branco e dos movimentos de câmera. Aurora, do Murnau, é sublime. Com as câmeras pesadas e o sistema de captação de som, houve um retrocesso no começo dos anos 30. Houve outro retrocesso quando o cinema ficou colorido. Toda grande mudança traz um avanço e um recuo.” Daniel está fascinado pelo digital. “Muita gente reclamou das cenas noturnas de Inimigos Públicos. Nos EUA, houve um crítico que disse que elas haviam virado um borrão. Acho que o digital ressalta a urgência de Inimigos Públicos e cria uma textura muito rica e fascinante da imagem.” TemposdePaz,com DanStulbach e Tony Ramos, adaptado da peça Novas Diretrizes em Tempos de Paz, e Chico Xavier usam a mesma tecnologia, mas em formatos diferentes. “Um filme pequeno barato, e outro grande, caro”, diz o diretor. Os filmes pequenos o atraem, mas o tamanho vem da história que ele quer contar e a de Chico Xavier é grande, ‘o meu épico’. Daniel anuncia que tem a história, mas já desistiu de fazer Se Eu Fosse Você 3. O próximo projeto, ele antecipa – “Vou filmar Roque Santeiro em maio do ano que vem.” ● L.C.M. de teatro, cinema e TV, ele é atraído pela espiritualidade. É interessante ver sua concentração no set – adepto de ioga, Ângelo faz seu tai chi direto, antes de entrar em cena. O repórter pergunta se vê alguma ponte entre o pai de Zezé di Camargo e Luciano em 2 Filhos de Francisco e Chico Xavier, como representações de brasilidade. “Nunca tinha pensado nisso”, ele diz. “Mas ambos se chamam Francisco.” E mais – “Chico Xavier era considerado louco por suas visões. Francisco também era, por sua obstinação em transformar os filhos em artistas.” Ângelo Antônio sabe que é uma grande responsabilidade interpretar Chico Xavier. Todo dia, dá um trabalhoimenso colocar aquela peruca. Daniel Filho investigou até o aspecto mais polêmico – a suposta homossexualidade do médium. “Perguntei para todo mundo. Ele não era homossexual. Era assexuado.” Ângelo explica.“Um amigodele me disse que Chico tinha a delicadeza de uma menina. É assim que o interpreto, feminino. Sua bondade é uma inspiração.” ● A companhia de cruzeiros mais inovadora do mundo Consulte seu agente de viagens ou www.royalcaribbean.com.br Aberta a nova temporada de camarão no La Cocagne. De 2ª a Sábado no Jantar R. Campos Bicudo, 129 Itaim-Bibi 11 3079.5177 www.lacocagne.com.br Venha saborear os pratos que sempre fizeram sucesso entre nossos clientes. “Crevettes à Elizabeth Salgueiro” R$ 52,00