Parecer n.º J-04/03
Processo n.º 223.424/2002 – SECD
Assunto: Conflito de competência suscitado entre Secretários de Estado sobre a expedição de atos administrativos
pertinentes a processo de licitação.
EMENTA: ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO.
CONCORRÊNCIA PÚBLICA. HOMOLOGAÇÃO.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA
1.Análise do conflito de competência suscitado pelos titulares da Secretaria de Estado da Administração e
dos Recursos Humanos (SEARH) e da Secretaria de Estado da Educação, da Cultura e dos Desportos (SECD),
haja vista o disposto no art. 54, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual n.º 163/1999.
2.A competência do Secretário da SEARH se limita à autorização para a instauração do certame que tenha por
objeto atividade da SECD que demande concorrência ou tomada de preços. Todavia, em se tratando da
modalidade convite, compete a cada órgão da Administração Direta autorizar a deflagração e conduzir a
disputa.
3.Compete à Secretária de SECD conduzir as concorrências que tenham por objeto a aquisição de bens e
serviços necessários para o regular desenvolvimento de suas atribuições legais.
4.A fase procedimental de homologação consubstancia-se na etapa em que a titular da SECD deve realizar a
análise da juridicidade e do mérito da licitação.
5.Compete à Secretária da SECD a expedição dos atos de homologação e de adjudicação pertinentes à
Concorrência Pública Nacional n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH, que se encontra em andamento naquele
órgão, caso sejam comprovadas a ausência de vícios de validade e a constância do interesse em firmar o
contrato que envolve o objeto do certame.
PARECER J-04/03
1.Versam os presentes autos sobre o conflito de competência envolvendo os titulares da Secretaria de Estado
da Educação, da Cultura e dos Desportos (SECD) e da Secretaria de Estado da Administração e dos Recursos
Humanos (SEARH), a propósito dos atos de homologação e de adjudicação da Concorrência Pública Nacional
n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH. Com efeito, para uma melhor compreensão dessa controvérsia, faz-se
necessária uma breve síntese dos atos e fatos jurídicos que lhes são pertinentes.
2.A referida licitação foi requerida na intimidade da Secretaria de Estado da Educação, da Cultura e dos
Desportos — SECD, pela sua Subcoordenadoria de Ensino Médio (Memorando n.º 301/2002-SUEM/SECD).
O certame tem por objeto a aquisição de equipamentos e mobiliários para as atividades técnicas, pedagógicas
e administrativas desenvolvidas pelas Unidades Escolares beneficiadas pelo Convênio 153/2001-Alvorada
II, firmado entre a União e o Estado do Rio Grande do Norte, em virtude do “Projeto Alvorada/2001” (vol. I, fls.
1-172).
3.Declarados presentes os requisitos exigidos pelo art. 16, II, da Lei Complementar Federal n.º 101, de 4.5.2000,
foi encaminhado o pedido para a Comissão Permanente de Licitação da SECD — CPL/SECD (vol. I, fls. 173196). Na época, este colegiado tinha a sua formação delineada pela Portaria n.º 170/2002-SECD/GS, emitida
pelo titular da SECD.
4.Entretanto, a Presidente da CPL/SECD encaminhou os autos para a Secretaria de Estado da Administração
e dos Recursos Humanos — SEARH, argüindo que o valor do objeto licitado exorbitava o limite determinado
para a modalidade de convite1, com base no art. 54, parágrafo único, da Lei Complementar Estadual n.º 163, de
5.2.19992 (vol. I, fls. 199). Em seguida, o Secretário da SECD solicitou ao Secretário da SEARH a promoção dos
“meios necessários com vistas à abertura de procedimento licitatório” (vol. I, fls. 200-1).
5.A Secretária Adjunta da SEARH, por sua vez, determinou a remessa do processo para a Comissão Especial
de Licitação-Educação/SEARH — CEL/EDUC/SEARH, constituída mediante a Portaria n.º 193/2001-SEARH
(vol. I, fls. 202).
6.Após provocação do Presidente da CEL/EDUC/SEARH, a Assessoria Jurídica Estadual — AJE, e a
Procuradoria Geral do Estado — PGE, emitiram pareceres favoráveis ao prosseguimento da “etapa externa” da
licitação (vol. I, fls. 204-248). Esta fase se iniciou quando houve a publicação do Aviso de Licitação no Diário
Oficial do Estado (DOE) de 23.8.2002.
7.Destarte, realizadas e ultimadas as fases de habilitação e julgamento, a CEL/EDUC/SEARH enviou, em
16.12.2002, a Concorrência Pública Nacional n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH para a deliberação final do
Secretário da SEARH.
8.Após a posse do atual Governo, a CEL/EDUC/SEARH enviou o relatório final da Concorrência Pública
Nacional n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH para a aprovação do novo Secretário da SEARH. Entretanto, este
agente afirma-se incompetente para expedição dos atos de homologação e adjudicação do certame, haja vista
o disposto no art. 54 da Lei Complementar Estadual n.º 163/1999.
9.O Secretário da SEARH entende que a competência para a homologação do certame seria da Secretária da
SECD, uma vez que a licitação teria sido realizada por Comissão Especial de Licitação da SECD, sem qualquer
intervenção da SEARH (vol. III, fls. 1537).
10.Diante dessa manifestação, e ciente da complexidade jurídica que envolve a matéria, a Secretária da SECD
solicita à CGE esclarecimento quanto à definição da competência para a homologação da Concorrência
Pública Nacional nº 12/2002-CEL/EDUC/SEARH (constante nos autos do processo n.º 00223424/2002-SECD
– vol. III, fls. 1540).
11.Na verdade, os fatos historiados revelam o conflito de competência existente entre os titulares da SEARH
e da SECD, diante da aplicação ao certame do art. 54, § 1º, da Lei Complementar Estadual n.º 163/1999. Assim,
face a controvérsia, algumas questões jurídicas relevantes podem ser pensadas:
(i) Qual é a autoridade competente para expedir os atos de homologação e de adjudicação da
Concorrência Pública Nacional n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH?
(ii) Quais são as atribuições do Secretário da SEARH na Concorrência Pública n.º 12/2002-CEL/
EDUC/SEARH, diante do art. 54, parágrafo único, da Lei Complementar n.º 163/1999?
(iii)Uma vez firmada a competência para a homologação e adjudicação do certame, que providências
deverá tomar para a tutela da legalidade e do interesse público?
12.Como se vê, a elaboração deste Parecer fez-se necessária para o deslinde dessas pontuais indagações.
13.É, em síntese, o relatório.
I — A LEGITIMIDADE DA CONSULTORIA GERAL DO ESTADO PARA EMITIR PARECER SOBRE A
MATÉRIA
14.A Constituição Estadual (art. 68) instituiu a CGE como órgão diretamente subordinado ao Chefe do Poder
Executivo, com finalidade de: (i) assessorar o Governador em assuntos de natureza jurídica, de interesse da
Administração Estadual; (ii) pronunciar-se, em caráter final, sobre as matérias de ordem legal que lhes forem
submetidas pelo Governador; (iii) orientar os trabalhos afetos aos demais órgãos jurídicos do Poder Executivo,
com o fim de uniformizar a jurisprudência administrativa; e, (iv) elaborar e rever projetos de lei, decretos e
outros provimentos regulamentares, bem como minutar mensagens e vetos governamentais.
15.No caso sob exame, trata-se de um conflito negativo de competência que envolve dois Secretários de
Estado, ambos subordinados à Governadora. Portanto, sua resolução é atributo do Chefe do Poder Executivo,
pelas seguintes razões.
16.Em virtude do regime presidencialista adotado pelo direito positivo pátrio, cabe ao Governador do Estado
exercer o Poder Executivo, com o auxílio de Secretários de Estado (Constituição Estadual, art. 57, caput; e art.
64, inciso III)3. Se o Chefe do Poder Executivo tem a obrigação constitucional de zelar pelo fiel cumprimento
das leis, a este agente devem ser assegurados os indispensáveis meios para observá-la (Constituição Federal,
art. 85, VII, Constituição Estadual, arts. 64, inciso V, e 65). Isso explica a razão pela qual se investe o
Governador do Estado na posição de autoridade máxima da Administração Pública Estadual.
17.A hierarquia, princípio regente da Administração Pública, constitui um complexo de relações de coordenação
e subordinação que orientam a ação dos órgãos e agentes públicos. Dentre os poderes do hierárca, há a
prerrogativa de resolver os conflitos negativos e positivos de competência entre os seus subordinados4.
18.Portanto, a CGE tem o dever de emitir opinião técnica sobre o assunto, haja vista integrar o rol de atribuições
do Chefe do Poder Executivo.
19.Alerte-se, desde já, que não serão feitas considerações quanto à legalidade do certame, uma vez que a CGE
encontra-se desautorizada a se pronunciar sobre esse aspecto.
II — NOÇÕES GERAIS SOBRE A ETAPA INTERNA E A ETAPA EXTERNA DAS LICITAÇÕES PÚBLICAS.
20.A licitação pública é o processo administrativo que o Estado deve realizar, quando precisa contrair relações
jurídicas de conteúdo patrimonial com o particular5. Tem por finalidade garantir a concretização do princípio
constitucional da isonomia e a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, observados os
demais princípios do regime jurídico-administrativo (Lei Federal n.º 8.666/1993, art. 3º, caput).
21.A doutrina costuma dividir o processo licitatório em duas etapas: a etapa interna e a etapa externa.
22.A válida instauração do processo licitatório pressupõe a obediência a alguns requisitos específicos. Todo
o conjunto dos atos preparatórios para a licitação é comumente definido por etapa interna6. Embora não
integre propriamente a licitação, a regular efetivação desta etapa é imprescindível para a validade de todo o
certame7. Visite-se o enunciado do art. 38, caput, da Lei Federal n.º 8.666/19938:
“Art. 38. O procedimento da licitação será iniciado com a abertura de processo administrativo, devidamente
autuado, protocolado e numerado, contendo autorização respectiva, a indicação sucinta de seu objeto e do
recurso próprio para a despesa (...)” (grifou-se).
23.Por sua vez, a chamada etapa externa é pertinente ao processo de licitação propriamente dito. E, como
compreende um processo administrativo, a licitação se desdobra em fases procedimentais. Onde a realização
e o regular exaurimento de cada fase é indispensável para a validade da que lhe seja subseqüente, na preclara
lição de Celso Antônio Bandeira de Mello9.
24.A licitação se inicia com a divulgação do instrumento convocatório10. A instauração do processo ocorre,
portanto, quando a Administração manifesta a sua intenção de realizar uma relação obrigacional com quem
apresente a proposta mais vantajosa. É no instrumento convocatório (edital ou carta-convite) que serão
firmados os critérios a serem empregados pela Administração para a realização da disputa dentro de parâmetros
jurídicos. Afinal, o Edital é a lei interna da licitação, como bem leciona Hely Lopes Meirelles11.
25.Na etapa externa, a seqüência procedimental variará conforme a modalidade da licitação. Na concorrência,
modalidade de licitação que foi empregada no caso sob exame, há cinco fases12: (i) edital, na qual há a sua
deflagração mediante a convocação dos interessados e o estabelecimento dos preceitos regentes do certame;
(ii) habilitação, onde são analisados os proponentes; (iii) julgamento, que implica na classificação das
propostas; (iv) homologação, pela qual se examina a regularidade jurídica das fases anteriores e a conveniência
do prosseguimento do certame; e, (v) adjudicação, que enseja declaração do licitante vencedor como único
apto para a celebrar o contrato com a Administração.
26.Na situação concreta, faz-se preciso descrever como o direito estadual disciplina os atos de instauração,
homologação e adjudicação nas concorrências promovidas pela Administração Pública Estadual. Não se fará
qualquer consideração quanto aos demais atos preparatórios e procedimentais da licitação, uma vez que
essas manifestações não integram o objeto deste Parecer.
III — INSTAURAÇÃO, HOMOLOGAÇÃO E ADJUDICAÇÃO DAS CONCORRÊNCIAS NA LEI
COMPLEMENTAR ESTADUAL N.º 163/1999
27.Com uma redação sofrível e lacunosa, a Lei Complementar Estadual n.º 163/1999 disciplina a instauração,
homologação e adjudicação das concorrências em seu art. 54 (com a redação que lhe conferiu a Lei
Complementar Estadual n.º 237/2002). A sua transcrição é imprescindível para as reflexões subseqüentes:
“Art. 54. São atribuições básicas dos Secretários de Estado, as previstas na Constituição do
Estado
do Rio Grande do Norte e as a seguir enumeradas:
I – planejar as ações dos órgãos sob sua responsabilidade e promover a administração da
Secretaria com observância das disposições legais e regulamentares da Administração Estadual,
e, quando aplicáveis, da Administração Federal;
(...)
X – autorizar a instauração de processo de licitação, declarar sua inexigibilidade ou dispensa,
nos casos previstos em Lei, observado o disposto no parágrafo único;
(...)
XV – assinar contratos e convênios em que a Secretaria seja parte;
(...)
§ 1º Os atos de que tratam o inciso X deste artigo competem:
I – ao Secretário de Estado da Administração e dos Recursos Humanos, nos casos de alienação,
compras, serviços gerais, para os quais seja exigida tomada de preços ou concorrência,
ressalvado o disposto no inciso III;
II – ao Secretário de Estado da Infra-Estrutura, nos casos de obra e serviços de engenharia,
para os quais seja exigida tomada de preços ou concorrência, ressalvado o disposto no inciso
III;
III – ao Secretário de Estado dos Recursos Hídricos, nos casos de compras e serviços gerais,
obra e serviços de engenharia, desde que, em qualquer hipótese, digam respeito à oferta
hídrica, saneamento e gestão dos recursos hídricos, para os quais seja exigida tomada de
preços ou concorrência;
IV – a qualquer Secretário de Estado, titular de órgão equivalente ou de órgão de regime
especial, em todos os casos em que couber convite.”
28.Como se vê, a autoridade competente para autorizar a instauração do processo de licitação, também pode
ter o atributo para determinar a execução da licitação no direito estadual. Isso é constatado ao se visitar o rol
de competências do titular da Secretaria de Estado da Infra-Estrutura — SIN, que possui tanto o dever-poder
de autorizar a instauração de licitação como o dever-poder de determinar a sua realização (Lei Complementar
Estadual n.º 163/1999, art. 31, inciso IV, e art. 54, § 1º, inciso II, e § 2º).
29.Em situação similar, encontra-se o titular da Secretaria de Estado dos Recursos Hídricos — SERHID (Lei
Complementar Estadual n.º 163/1999, art. 35, inciso V, e art. 54, § 1º, inciso III).
30.Portanto, note-se que, o termo “autorizar”, referido nos dispositivos supra citados, abrange justamente a
“autorização” mencionada no art. 38 da Lei Federal n.º 8.666/1993.
31.Autorizar a instauração não é conduzir as fases procedimentais do certame, oportunamente rotulados pela
doutrina de “etapa externa da licitação”. A interpretação do enunciado do art. 54 da Lei Complementar
Estadual n.º 163/1999 deve ser empreendida em contraste com o art. 38 da Lei Federal n.º 8.666/1993.
32.Por fim, apesar de não integrar o cerne da questão, deve-se logo firmar o entendimento de que os dispositivos
transcritos somente incidem sobre a Administração Direta.
33.Como as entidades da Administração Indireta se encontram submetidas à tutela administrativa exercida
pelas Secretarias de Estado (Lei Complementar Estadual n.º 163/1999, art. 6º, § 1º, e art. 54, inciso VI), não
cabem aos seus titulares autorizar, instaurar e desenvolver as licitações ocorridas na intimidade daquelas, por
duas razões: (i) tais entes têm personalidade jurídica distinta da personalidade do Estado do Rio Grande do
Norte; e, (ii) a tutela administrativa somente é composta pelos instrumentos que se encontram expressa e
previamente estabelecidos em lei13.
IV — COMPETÊNCIA DO SECRETÁRIO DE ESTADO DA ADMINISTRAÇÃO E DOS RECURSOS
HUMANOS PARA AUTORIZAR A LICITAÇÃO NO CASO CONCRETO
34.O conflito de competência suscitado na Concorrência Pública Nacional n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH,
que ensejou a emissão deste parecer, envolve a aquisição de bens que se enquadram nos padrões pecuniários
que demandam a realização da concorrência (Lei Federal n.º 8.666/1993, art. 23, inciso II, alínea c). Ademais,
foi visto que a Lei Complementar Estadual n.º 163/1999 (art. 54, § 1º, inciso I) determina ser atribuição do
Secretário da SEARH “autorizar a instauração de processo de licitação”, em se tratando de concorrência que
envolva alienações compras e serviços gerais, desde que essas operações não sejam pertinentes à Secretaria
de Estado dos Recursos Hídricos — SERHID.
35.Com efeito, é preciso que fique bem claro que a “autorização” prevista no art. 54 da Lei Complementar
Estadual 163/1999, é justamente aquela autorização mencionada no art. 38 da Lei Federal n.º 8.666/1993. Em
outras palavras, diz respeito exclusivamente ao desencadeamento de licitação, legítimo ato preparatório para
a deflagração desse processo administrativo.
36.Na verdade, a autorização para a instauração do processo licitatório, conferida por lei ou decreto regulamentar
à autoridade administrativa, é a manifestação que visa apurar se há interesse público e viabilidade financeira
na realização da disputa.
37.Serve a referida autorização como um instrumento de controle interno. Nesse ato, avalia-se a legalidade, a
conveniência e a viabilidade financeira da licitação e do contrato que foram objeto da requisição. Contudo,
a competência do Secretário da SEARH se limita autorizar a instauração do processo.
38.Já a instauração do processo de licitação — a etapa externa — ocorre com a divulgação do instrumento
convocatório. No caso da concorrência, com a publicação do aviso do edital, pois é nessa oportunidade que
a Administração se abre para os administrados na preparação dos contratos administrativos.
39.Ao desfecho do item, calha trazer a lúcida lição do administrativista Antônio Carlos Cintra do Amaral14. Na
visão do renomado jurista se porventura os atos preparatórios mencionados no art. 38 da Lei Federal n.º
8.666/1993 forem interrompidos, haverá: (i) o mero arquivamento, haja vista não existir ainda nessa ocasião o
processo de licitação; (ii) ou, a decisão pela contratação direta mediante processo de dispensa ou de
inexigibilidade de licitação. Afinal, após a deflagração da etapa externa, ou seja, com a publicação do
instrumento convocatório (exempli gratia, do edital da concorrência), o processo de licitação somente tem
extinção válida mediante invalidação ou revogação devidamente fundamentada (Lei Federal n.º 8.666/1993,
art. 49; Constituição Federal, art. 93, inciso IX)15.
V — COMPETÊNCIAS DO SECRETÁRIO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA E DOS DESPORTOS
NA CONCORRÊNCIA PÚBLICA NACIONAL N.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH.
40.É cediço que, pelo princípio da legalidade, a Administração somente atua com legitimidade se a lei lhe
conferir a competência para tanto. Logo, a lei não outorga ao Secretário da SEARH a prerrogativa de obrigar
a realização da licitação na intimidade da SECD, mas, tão somente, a de aferir se a requisição desta Secretaria
de Estado está ou não em conformidade com os parâmetros legais e as diretrizes orçamentárias da Administração
Estadual.
41.Compete, portanto, à SECD conduzir as concorrências pertinentes às suas atribuições legais, haja vista
não constar, no rol de competências da SEARH, a realização das licitações descritas no art. 54, § 1º, inciso I,
da Lei Complementar Estadual n.º 163/1999. Acresça-se: cabe ao Secretário da SECD assinar os contratos
administrativos pelos quais a SECD seja responsável, consoante o art. 54, inciso XV, da Lei Complementar
Estadual n.º 163/1999.
42.Uma vez que não existe dispositivo legal ou regulamentar em sentido diverso, cabe à Secretária da SECD
todas as operações necessárias para a formalização e desencadeamento do processo de licitação no âmbito
de sua pasta. Dentre as quais, a designação da própria Comissão de Licitação.
43.Somente a lei e o decreto regulamentar podem determinar as competências para a autorização e realização
de licitação. Os demais atos normativos que integram o regime jurídico-administrativo (instruções, resoluções
e portarias) não poderiam ser empregados para disciplinar a matéria, sem explícita remissão legal16.
44.Por derradeiro, uma vez firmada a competência da Secretária da SECD para a expedição dos atos de
homologação e de adjudicação exigidos para a consolidação das licitações, cuja matéria envolva atividade de
responsabilidade da SECD, subsiste um último ponto a ser enfrentado.
45.Não se questiona que a mudança no comando da Secretaria de Estado, decorrente do início de novo
mandato governamental, justifica plenamente o receio do novo titular em homologar e adjudicar o objeto de
licitação que não acompanhou. Contudo, é inexorável que esse agente não pode se negar a dar continuidade
à atividade administrativa.
46.Outrossim, não é desnecessário lembrar que a fase de homologação tem justamente por finalidade assegurar
à Administração a oportunidade para aferir a juridicidade e o mérito dos atos procedimentais que integraram
as fases anteriores do certame.
47.Logo, considerando o momento de transição político-administrativa, não poderia haver oportunidade
melhor para que a nova Secretária de Estado requeira à sua assessoria jurídica um pronunciamento sobre a
legalidade dos atos praticados na licitação17. Caso verificada alguma ilegalidade, caber-lhe-á decidir sobre
invalidação (vício insanável) ou convalidação (vício sanável) do certame18.
48.Porém, ainda que inteiramente legal, o certame poderá ser revogado pela autoridade administrativa
competente se houver a comprovação de evento superveniente e razoável que impeça a adjudicação e futura
contratação (Lei Federal n.º 8.666/1993, art. 49).
VI — RESPOSTAS
49.Com base nessas considerações, a Consultoria Geral do Estado oferece as seguintes soluções para a
controvérsia que envolve as atribuições do Senhor Secretário da Administração e dos Recursos Humanos e
a Senhora Secretária da Educação, da Cultura e dos Desportos, a propósito dos atos que dizem respeito ao
processo de licitação:
(i)a competência do Senhor Secretário da Administração e dos Recursos Humanos se limita, no
caso concreto, a autorizar a instauração do certame;
(ii)é de competência da Senhora Secretária da Educação, da Cultura e dos Desportos expedir os
atos de homologação e adjudicação pertinentes à Concorrência Pública Nacional n.º 12/2002CEL/EDUC/SEARH;
(iii)a Senhora Secretária da Educação, da Cultura e dos Desportos deverá solicitar à Assessoria
Jurídica Estadual a emissão de parecer sobre a legalidade dos atos praticados por ocasião da
Concorrência Pública Nacional n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH;
(iv)caso seja aferida alguma ilegalidade, deverá a Senhora Secretária da Educação, da Cultura
e dos Desportos decidir sobre a invalidação ou convalidação da Concorrência Pública Nacional
n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH, conforme a gravidade do vício;
(v)se houver a comprovação de evento superveniente e razoável que impeça a adjudicação e a
futura contratação, a Senhora Secretária da Educação, da Cultura de dos Desportos poderá
revogar, de forma motivada, todo o processo de licitação.
(vi)Por fim, deverá a Senhora Secretária de Estado da Educação, da Cultura e dos Desportos,
homologar o referido certame, se ausente razão de legalidade ou de mérito que impeça a
adjudicação de seu objeto.
50.É o parecer.
51.Submeta-se à apreciação da Excelentíssima Senhora Governadora do Estado do Rio Grande do Norte.
Consultoria Geral do Estado, Natal/RN, 16 de março de 2003.
Tatiana Mendes Cunha
CONSULTORA-GERAL DO ESTADO
1
Consulte-se o art. 23, II, a, da Lei Federal n.º 8.666, de 21.6.1993.
Registre-se que houve, nos atos aqui mencionados, irregularidade na indicação do motivo legal do ato, haja
vista a nova redação que a Lei Complementar Federal n.º 186, de 28.12.2000 e a Lei Complementar Estadual n.º
237, de 16.5.2002 conferiram ao enunciado do art. 54 da Lei Complementar Estadual n.º 163/1999. Todavia,
essa falha não macula a validade de tais atos.
3
Consultar Geraldo Ataliba, República e constituição, 2 ed., São Paulo, Malheiros, 1998, pp. 143 ss.
4
Sobre a hierarquia, consultar: Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de direito administrativo, 15 ed., São
Paulo, Malheiros, 2003, p. 140-1; Diógenes Gasparini, Direito administrativo, 7 ed., São Paulo, Saraiva, 2002, p.
49-51; e Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito administrativo, 15 ed., São Paulo, pp. 92-4.
5
Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit. , p. 479.
6
Consultar: Marçal Justen Filho, Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, 8 ed., São Paulo,
Dialética, 2002, p. 383;Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit., pp. 523-6; e Antônio Carlos Cintra do
Amaral, op. cit., p. 34.
7
Marçal Justen Filho, op. cit. , p. 385.
8
Recorde-se também as exigências do art. 16 da Lei Complementar Federal n.º 101, de 4.5.2000. Maria Sylvia
Zanella Di Pietro (op. cit. , p. 331) alerta que “processo”, no dispositivo legal transcrito, deve ser entendido
como sinônimo de “autos”.
9
Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit., p. 526.
10
Consultar: Antônio Carlos Cintra do Amaral, Comentando as licitações públicas, Rio de Janeiro, Temas &
Idéias Editora, 2002, pp. 34-5; Adilson Abreu Dallari,
Aspectos jurídicos da licitação
, 4 ed., São Paulo, Saraiva, 1997, p. 89; e Lúcia Valle Figueiredo,
Direitos dos licitantes,
4 ed., São Paulo, Malheiros Editores, p. 44.
11
Direito administrativo brasileiro, atual. Eurico de Andrade Azevedo et al., 26 ed., São Paulo, Malheiros,
2001, p. 259.
12
Consultar: Maria Sylvia Zanella Di Pietro, op. cit., p. 331 ss.; Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit.
, p. 529. O direito positivo em vigor prevê outras modalidades de licitação. O art. 22 da Lei Federal n.º 8.666/
1993, estabelece ainda a tomada de preços, o convite, o concurso e o leilão. A Lei Federal n.º 10.520, de
17.7.2002, instituiu o pregão para a aquisição de bens e serviços comuns pela Administração.
13
Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit. , pp. 149-52.
14
Op. cit. , pp. 35-6.
15
Isso não exclui a possibilidade de invalidação
16
O direito positivo pátrio veda a delegação da competência regulamentar, pois é privativa do Chefe do Poder
2
Executivo, nos termos do art. 64, inciso V, da Constituição Estadual. Consultar: Maria Sylvia Zanella Di
Pietro, Parcerias na administração pública — concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas
, 4 ed., São Paulo, Atlas, p. 153; e Celso Antônio Bandeira de Mello, op. cit. , pp. 337-8.
17
Nos autos, é certo que há pareceres favoráveis, tanto da AJE como da PGE, à instauração do certame.
Entretanto, esses órgãos de advocacia pública ainda não foram provocados para avaliar a legalidade das
fases de habilitação e julgamento desse processo administrativo.
18
Sobre a matéria, consultar: Vladimir da Rocha França, Invalidação judicial da discricionariedade administrativa
no regime jurídico-administrativo brasileiro, Rio de Janeiro, Forense, 2000, pp. 115 ss.
PROCESSO Nº 0022342-4/2002-SECD
INTERESSADO: SECD
ASSUNTO: Concorrência Nacional nº 012/2002
DESPACHO
Em, 9.7.2003
Aprovo o PARECER J-04/2003-CGE, subscrito pela douta Consultora-Geral do Estado, cujo objeto
versou sobre o conflito de competência suscitado em torno dos atos de homologação e de adjudicação
pertinentes à Concorrência Pública Nacional n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH.
Determino à Senhora Secretária de Estado da Educação, da Cultura e dos Desportos, a adoção das
seguintes providências:
1. solicitar à Assessoria Jurídica Estadual a emissão de parecer sobre a legalidade dos atos
praticados na Concorrência Pública Nacional n.º 12/2002-CEL/EDUC/SEARH;
2. decidir sobre a invalidação ou convalidação do processo de licitação analisado, caso seja
constatada alguma ilegalidade, sempre observando as normas pertinentes ao devido processo
legal;
3. decidir sobre a revogação do certame, de forma fundamentada, na hipótese de comprovado
e razoável fato superveniente que impeça a adjudicação e a futura contratação que foi objeto
da disputa;
4. homologar o referido certame, se ausente razão de legalidade ou de mérito que impeça a
adjudicação de seu objeto.
Wilma Maria de Faria
GOVERNADORA
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Parecer J-04