Especificar a Área do trabalho EA XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Transformações Químicas e seus Efeitos Energéticos: compreensões de Estudantes da Licenciatura de Química e do Ensino Médio Fábio André Sangiogo (PG)1*, Raquel Woyciechoswsky (IC)1 , Simone Albrecht da Rosa (IC)1 , Otavio Aloísio Maldaner (PQ) 1. [email protected]. 1 Rua São Francisco n° 501, sala: 214 – Gipec-Unijuí, Bairro São Geraldo – Ijuí – RS, CEP- 98700-000. Palavras Chave: Transformação química, energia, formação em Química. R ESUMO: Trata-se de investigação desenvolvida no componente curricular Pesquisa em Ensino de Química II, um dos componentes de iniciação à Pesquisa Educacional no Curso de Licenciatura em Química da Unijuí como atividade curricular na Licenciatura. Investigou-se atravé s de questionário, entregue e respondido por estudantes da Licenciatura em Química e da terceira série do ensino médio, diferentes níveis de significação envolvendo conceitos científicos fundamentais na compreensão das transformações químicas e os seus efeitos energéticos. As respostas foram agrupadas segundo a sua semelhança, resultando na construção de quatro categorias de análise para ambos os grupos. Para dar suporte à análise e construção de resultados relevantes da pesquisa foram consultados artigos científicos e livros didáticos do ensino médio e da universidade que abordam o tema investigado. INTRODUÇÃO O presente trabalho traz resultados de pesquisa desenvolvida em 2006, no Curso de Química - Licenciatura da UNIJUÍ (Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul) , nos componentes curriculares Pesquisa em Ensino de Química I e II (PEQ I e PEQ II). Estes componentes têm como objetivo ensinar a pesquisa educacional como atividade curricular no Curso de Química. Segundo a ementa desses componentes, os acadêmicos elaboram e executam um projeto de pesquisa sobre a realidade escolar no que se refere ao processo de ensino e aprendizagem em Química. Para isso fazem contato com escolas, interagem com estudantes e professores do Ensino Médio (EM), entram em contato com as produções científicas mais recentes sobre educação química dentro da comunidade de educadores químicos. Na execução de seus projetos, os acadêmicos aprendem todos os passos iniciais e o ritual de uma pesquisa. Isso engloba a concepção e elaboração do projeto, sua aprovação pelo professor dos componentes, negociação do espaço para a produção de dados de pesquisa junto às escolas, acordo com os sujeitos da pesquisa, análise dos dados e sua apresentação e publicação em algum meio interno ou externo ao Curso. A pesquisa teve como foco a compreensão química que acadêmicos e estudantes de EM têm sobre fenômenos de seu cotidiano. Trata-se, portanto, de fenômenos vivenciais, para quais os estudantes estão constituindo o que Lopes (1997) chama de conhecimento químico escolar, que é decorrente de inter-relações dinâmicas, entre conhecimentos cotidianos e científicos/químicos em sala de aula. Segundo Orientações Curriculares Nacionais devemos “possibilitar que, ao acessar a informação, o aluno tenha condições de decodificá-la, interpretá- la e, a partir daí, emitir um julgamento” (BRASIL, 2006, p.33). É nessa perspectiva que a XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho EA aprendizagem deve ser estimulada para que o estudante saiba interpretar à luz da Ciência/Química os fenômenos de seu dia-a-dia. Ao realizar a pesquisa, o estudante da Licenciatura, além de ter a oportunidade da aprendizagem dessa importante ferramenta cultural, passa a ter uma relação com a dinâmica da construção do conhecimento muito diferente do que a mera concepção de transmissão e assimilação. Ao constituir-se como pesquisador na formação inicial estará preparado para (...) refletir a respeito de sua prática de forma crítica, de ver a sua realidade de sala de aula para além do conhecimento na ação e de responder, refle xivamente, aos problemas do dia-a-dia nas aulas. É o professor que explica as suas teorias tácitas, reflete sobre elas e permite que os alunos expressem o seu próprio pensamento e estabeleçam um diálogo reflexivo recíproco que, desta forma, o conhecimento e a cultura possam ser criados e recriados juntos a cada indivíduo (MALDANER, 2003, p.30). A formação proposta no Curso da Licenciatura de Química explicita de forma clara, em seu Projeto Pedagógico, a constituição do professor pesquisador. Isso pode permitir a formação de professores com nova visão do processo de ensino e aprendizagem em Química, ainda fortemente baseado numa concepção própria da racionalidade técnica (SCHÖN, 1983). Superada a compreensão da racionalidade técnica, propõe-se a significação do conhecimento químico em perspectiva colocada por Lopes (1997) que entende a construção do conhecimento químico escolar como uma inter-relação dialógica de conhecimentos cotidianos e científicos. Estes, por serem de natureza diversificada, complementam-se e requerem-se mutuamente em movimentos de reciprocidade e de inter-relação nas situações típicas da sala de aula. A Química é uma Ciência que envolve o uso de conhecimentos específicos, com simbologias criadas para permitir a compreensão da matéria e sua transformação em nível atômico-molecular. É necessário, por isso, que professores superem a compreensão do ensino em sua forma apenas disciplinar, mas o compreendam em suas relações complexas e multidimensionais. Segundo Morin (2006), isso envolve, uma teia de sentidos e significações em que as partes ensinadas no âmbito de uma disciplina permitem entender o todo em âmbito transdisciplinar. Para Galiazzi (2003, p. 159) é preciso perceber “a aprendizagem como processo de construção gradativa do conhecimento, processo esse sempre incompleto. Visto como processo cíclico, incompleto, dinâmico, em que aprendem juntos, professores e alunos”. Os estudantes não vão se apropriar de conhecimentos de forma mecânica e sair usando-os no dia-a-dia, mas vão criando laços, relações, que permitem relacioná- los à sua vivência, através da mediação inicial do professor, que também aprende. “Parece que o aluno acredita que tudo vai ser aprendido de uma só vez, desde que o professor mostre o conteúdo” (Idem, p. 197), entendimento que é decorrente do ensino tradicional, a partir da qual se tem o falso entendimento de que o estudante UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho EA sabe Química quando consegue apenas repetir o conceito que é repassado pelo professor em aula. Segundo Maldaner e Zanon, (2001), é necessário articular os “saberes e conteúdos de ciências entre si, e também, com saberes cotidianos trazidos das vivências dos alunos fora da escola, permitindo uma abordagem com característica interdisciplinar, inter-complementar e trans-disciplinar”. Rosa, Quintino e Rosa (2001, p. 39) defendem que se deve tomar cuidado para as aulas não permanecerem no nível do senso comum e do cotidiano, fazendo circular apenas a satisfação imediata de curiosidades. Temos consciência de que utilizamos os conhecimentos em diversas circunstâncias da vida e não pensamos sempre cientificamente o mundo, mesmo que sejamos cientistas; em diversos momentos apenas utilizamos nosso conhecimento do senso comum. Assumimos, no entanto, que a sala de aula é o espaço em que o conhecimento mais poderoso, esse conhecimento próprio das Ciências, precisa ser re-contextualizado, rompendo visões do senso comum que emerge m da vivência cotidiana. Da inter-relação fecunda desses conhecimentos, de natureza diversa, constitui-se o conhecimento escolar. A linguagem específica da química faz com que tenhamos que lidar com fenômenos atômicos, com materiais e fatos que são tão reais quanto os da vida cotidiana, mas, “os próprios átomos e partículas elementares não exibem o mesmo tipo de realidade: elas dão lugar a um universo de potencialidades em vez de um mundo de coisas e fatos” (HEISENBERG, 1987, p. 140, apud OLIVEIRA, 1995, p.10). Para o entendimento da química é preciso o conhecimento de muitos signos, que segundo Vigotski (apud REGO, 2003) precisam ser internalizados durante a vivência escolar, havendo possibilidades de entender a rede complexa de conhecimentos em que a química está inserida. Assim, para saber Química é necessário que a sua linguagem com que se constitui como conhecimento especializado seja entendida. É ela o sistema simbólico fundamental que, significado em nível adequado, permite um pensamento novo sobre o mundo. O estudo foi realizado a partir da constatação de que a aprendizagem de conceitos fundamentais da Química, envolvidos nas transformações químicas e seus efeitos energéticos, está aquém de permitir que os estudantes relacionem, entendam e interpretem situações reais do dia-a-dia sobre o tema investigado. Questões como: qual o nível real de significação de conceitos fundamentais para pensar as transformações químicas e seus efeitos energéticos? Como esses conceitos são apresentados em livros didáticos de Química? Como os estudantes do Curso de Licenciatura e do EM interpretam situações reais que envolvem o uso desses conceitos? UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho EA ASPECTOS M ETODOLÓGICOS No componente PEQ II foi proposto como tema de pesquisa verificar, a partir de um questionário com quatro questões abertas e ligadas a situações de vivência dos estudantes, o nível de significação de conceitos químicos básicos no entendimento das situações apresentadas. As situações foram apresentadas, em forma de questões a serem respondidas por escrito, por estudantes do Curso de Licenciatura de Química e do 3o ano do EM. O entendimento das situações envolvia conteúdos relativos à (i) transformações químicas e efeitos energéticos, (ii) neutralização ácido/base em meio aquoso, (iii) modelos de representação em nível atômicomolecular de fenômenos químicos e (iv) ligações químicas. Cada situação foi analisada por um grupo de licenciandos, tendo como referência os conteúdos preferenciais e os conceitos centrais que permitiam formar um juízo sobre o entendimento produzido. Aqui são apresentados resultados sobre a situação que precisava ser entendida sob o ponto de vista da transformação química e da energia térmica envolvida. O questionário foi organizado com a idéia de que os estudantes pudessem utilizar conhecimentos químicos já desenvolvidos em diferentes momentos do ensino da Química e pudessem interpretar situações vivenciais apontadas nas questões, como na combustão, metabolismo e dissolução de substância conhecida (hidróxido de sódio) em na água. A pesquisa é de natureza qualitativa. As respostas dos estudantes referentes às questões realizadas foram consideradas como documentos a serem analisados (LÜDKE; ANDRÉ, 1986), cientes de que (...) ao considerar os diferentes pontos de vista dos participantes, os estudos qualitativos permitem iluminar o dinamismo interno das situações, geralmente inacessíveis ao observador externo (...). Deve, por isso, encontrar meios de checá-las, discutindo-as abertamente com os participantes ou confrontando-as com outros pesquisadores para que elas possam ser ou não confirmadas (p.12-13). A investigação compreendeu três fases. Em todas houve debate em grupo para que as primeiras percepções fossem explicitadas e se tomasse consciência delas através do aprofundamento teórico. Na fase I os acadêmicos responderam ao questionário proposto pelo professor do componente curricular PEQ II, envolvendo os conteúdos indicados anteriormente. 45 acadêmicos (do 3° ao 8° semestre) do Curso de Licenciatura em Química da UNIJUÍ foram respondidos, em diferentes momentos. Sobre cada questão foi feito um exercício de pesquisa, com produção e análise de dados a partir das respostas produzidas pelos acadêmicos. Muitas transformações químicas são acompanhadas por efeitos energéticos, como as combustões, por exemplo. De onde vem a energia liberada nesse tipo de reações químicas? Questão respondida pelos licenciandos UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho EA As respostas dos acadêmicos foram identificadas, com um número, que corresponde ao acadêmico (1, 2, 3...) e outro número, agora romano, que permite saber a qual turma pertencia o estudante (I, II e III), tendo em vista que as mesmas questões foram respondidas por três turmas diferentes. Na fase II foi desenvolvida a leitura e análise de livros didáticos de Química (do EM e da Universidade) e de referenciais teóricos de cunho pedagógico e epistemológico sobre o tema investigado. Ambas as leituras visavam a ajudar a cons truir o referencial teórico, a entender e a aprofundar conhecimentos que permitiriam uma melhor organização e análise das respostas produzidas pelos acadêmicos, relacionando ensino e aprendizagem, conteúdos/conceitos da química sobre o tema investigado. Os livros didáticos consultados constam no quadro abaixo: Livros de EM: CARVALHO, Geraldo C.; SOUZA, Celso Lopes. Química de olho no mundo do trabalho. Ensino Médio. Ed: Scipione. FELTRE, Ricardo. Fundamentos da Química. Vol. Único; 3ª ed. Ed: Moderna. 2001. PEQUIS (Projeto de Ensino de Química e Sociedade). SANTOS, Wildson L. P.; MÓL, Gerson S. (organizadores). Química e Sociedade.Vol. único, Ensino Médio – SP, Nova Geração, 2005. FONSECA, Martha Reis M. Química: físico-químico. Editora FTD, São Paulo 1992. Livros da Universidade: EBING, Darrell D. Química Geral. 5ª Ed., Vol. I., 1998. MASTERTON; SLOWINSKI; STANITSKI. Princípios de Química. Ed: LTC, 6 a ed. (traduzido), 1990. ATKINS, Peter & JONES, Loretta – Princípios de Química. Ed: Bookmann, 2001. ATKINS, Peter. Físico-Química – Fundamentos. Ed: LTC, 3ª ed., 2001. Livros Didáticos consultados Na fase III, tendo em vista resultados obtidos junto aos licenciandos, houve a elaboração de um novo questionário. A questão inicial foi desdobrada em três, para ser respondido por estudantes do 3° ano do EM de uma escola pública. As questões foram (re)elaboradas com o objetivo de permitir que estes pudessem expressar seus conhecimentos e entendimentos sobre as transformações químicas e efeitos energéticos e, na intenção de obter respostas mais precisas sobre a origem dos efeitos energéticos em transformações químicas exotérmicas, nas quais são conhecidos e evidenciados fenômenos energéticos. Na termoquímica você usa os conceitos de transformação química exotérmica (?H<0) e endotérmica (? H>0), isto é, transformações com liberação e absorção de energia. A) Relacione esses conceitos com uma reação química de combustão. B) A 1ª lei da termodin âmica nos garante que a energia em um sistema isolado é constante, independente do que aconteça em seu interior. Como você explica que ao adicionar água a uma porção de NaOH (s) no interior de uma garrafa térmica perfeita (isolamento térmico perfeito) a temperatura sobe muitos graus Celsius? Isso Contradiz ou não a 1ª lei? Por quê? C) Em termos de estruturas químicas, qual a origem da energia liberada em transformações como as combustões comuns na presença de oxigênio ou a transformação da glicose em nosso organismo? As questões respondidas por Estudantes do EM As questões foram respondidas por 10 estudantes do EM, aqui identificados com número (1, 2, 3...), mais as letras A, B ou C, que se referem ao item da questão respondida. As respostas dos licenciandos e estudantes do EM foram digitadas e após leitura cuidadosa foram realizados agrupamentos segundo a semelhança de nível conceitual atingido. Isso permitiu a construção de categorias de análise, não sem o apoio de referenciais teóricos UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho EA buscados em artigos, resumos de pesquisas, livros didáticos do EM e da Universidade, já estudados em outros componentes disciplinares do Curso ou no próprio componente da PEQ II. A sistematização final, além do relatório completo da investigação realizada, foi feita na forma de resumo expandido nos moldes exigidos para os trabalhos submetidos à Comissão Científica da Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química. Foi preparada, ainda, uma síntese da pesquisa para ser apresentada aos licenciandos e aos estudantes da Escola que responderam às questões formuladas. ALGUNS RESULTADOS Os livros didáticos foram analisados apenas no que concerne aos conteúdos e conceitos ligados a transformações químicas e efeitos energéticos. Esse assunto é tratado, geralmente, nos capítulos que dizem respeito à Termoquímica. Assim, o foco do olhar dirigiu- se a esse capítulo. I. LIVROS DIDÁTICOS DE Q UÍMICA: ENSINO M ÉDIO E G ERAL S UPERIOR Carvalho e Souza abordam, mais detalhadamente, os conceitos de reação exotérmica e endotérmica. Para reação exotérmica os autores propõem pensar na reação de queima do hidrogênio ; para reação endotérmica, a decomposição do carbonato de cálcio (CaCO3 ) e a obtenção de gás hidrogênio e gás oxigênio a partir da água. Os conceitos são trabalhados sem propor reflexões que possam relacionar os fenômenos com os modelos atômico- moleculares e nem inter-relacionar os conceitos. Isso leva à memorização mecânica dos conceitos, com pouca significação. Assim, resta apenas a substituição uma expressão como “energia liberada” por “? H<0” ou “transformação exotérmica” como aprendizagem escolar. O livro não contempla conceitos relacionados com energia cinética e energia potencial e nem são discutidas a ruptura e formação de ligações nas transformações envolvidas para explicar, por exemplo, a variação da energia potencial e cinética do sistema e a conservação da energia total. Ricardo Feltre se preocupa muito com a classificação e conceitualização de reações exotérmicas e endotérmicas. Propõe a seguinte reflexão: “por que as rações liberam ou absorvem calor?”. Introduz o conceito de energia interna, afirmando que qualquer substância possui certa quantidade de energia interna armazenada em seu interior, principalmente, na forma de energia de ligação entre seus átomos; explica a liberação e absorção pela diferença de energia interna dos reagentes (energia inicial) e a energia interna dos produtos (energia final). A partir disso introduz os termos reação exotérmica e endotérmica. Trata, a seguir, do princípio da conservação da energia, explicando que a energia pode ser transformada, e que “a quantidade total de energia permanece sempre constante”. Feltre não utiliza os conceitos de energia potencial e cinética, o que poderia facilitar o entendimento da variação de temperatura de transformações químicas em UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho EA sistemas isolados. Não há preocupação maior em contextualizar os conceitos introduzidos com fenômenos da vivência dos alunos e nem em relacionar as transformações químicas com o que ocorre em nível atômico- molecular, como a ruptura e formação de novas ligações químicas. No livro do PEQUIS, os conceitos são trabalhados de forma bem contextualizada sobre as transformações químicas, possibilitando entendimentos sobre a absorção de energia necessária para romper ligações dos reagentes e a liberação de energia quando são formadas novas ligações, relacionando isso com rearranjo de átomos. Os autores do livro falam vagamente sobre os entendimentos de energia cinética e potencial, dando apenas o significado dos mesmos, não permitindo que os estudantes consigam interpretar situações vivenciais que envolvam efeitos energéticos relacionados às conversões de energia cinética e potencial, que estão envolvidos durante a quebra e formação de novas ligações. Martha Reis da Fonseca apresenta os conceitos de termoquímica, de energia interna, reações exotérmicas e endotérmicas, utilizando equações genéricas de transformações como: “A + B ? C + D + Calor” e “A + B + Calor ? C + D”. É conceituada a lei da conservação da energia e são feitas algumas relações com o valor de entalpia dos reagentes e produtos e variação de entalpia com liberação e absorção de calor. A autora apresenta os conceitos de forma descontextualizada, os exemplos não envolvem explicações da realidade dos estudantes, não atingindo o nível atômico-molecular que permite o entendimento das transformações químicas que expressam liberação e absorção de energia, pois, não foram discutidas as estruturas das moléculas (quebra e formação de novas ligações) e os entendimentos referentes à energia cinética e potencial. Os livros da universidade seguem uma apresentação de conteúdos de forma bem semelhante a muitos livros do EM, porém, mais ênfase nas inter-conversões de energia nas transformações químicas e no princípio da conservação da energia. Energia Cinética é a energia que um corpo possui devido ao seu movimento. Energia Potencial é a energia que um corpo possui em função de sua posição. Energia Total, de uma partícula é a soma das suas energias cinética e potencial. (...) Uma característica muito importante da energia total é que, se não existem influências externas, ela é constante. A energia cinética e a energia potencial podem converter-se uma na outra, mas sua soma é constante (ATKINS, 2001). Em geral, os livros da universidade apresentam os significados dos conceitos em forma de definições, não tendo maior preocupação com a sua significação em contextos mais amplos. Ebbing, por exemplo, aborda os conceitos de energia cinética e energia potencial, absorção e liberação de energia. Apresenta exemplos de situações do cotidiano dos estudantes, como: conversão de energia potencial em cinética, que é relacionada com a água no topo de uma represa; mudança de energia cinética de um sistema gasoso mediante injeção de calor, que UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. Especificar a Área do trabalho EA XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) aumenta a energia interna e cinética das moléculas. Há pouca preocupação com o que acontece em nível atômico-molecular, como rompimento de ligações entre átomos em uma molécula e a formação de novas ligações. O modelo também não é relacionado à conservação da energia total e à inter-conversão energia cinética/potencial em sistemas isolados, o que é essencial, em nosso entendimento, para que se compreendam as variações de temperatura e de entalpia em sistemas isolados nos quais ocorrem transformações químicas. A análise de livros didáticos do EM e da Universidade mostra que a ênfase dada foi nos conceitos: reações exotérmicas ou com liberação de energia e reações endotérmicas ou com absorção de energia. De uma forma ou outra, os fenômenos energéticos são relacionados à quebra de ligações entre átomos e formação de novas ligações, e mais raramente à interconversões energia potencial e cinética. Espera-se, assim, que esse conjunto de conceitos aparecesse nas respostas dadas pelos estudantes. II. COMPREENSÕES DOS ACADÊMICOS De forma geral, os acadêmicos não responderam à questão de modo a abranger todos os níveis de compreensões possíveis, isto é, não utilizaram todos os conceitos que poderiam estar envolvidos nas explicações sobre as transformações químicas. O uso de conceitos e o nível de significação atingido permitem analisar a possível compreensão que os estudantes mostraram do fenômeno referido na questão. A partir de leituras cuidadosas, as respostas foram agrupadas segundo a semelhança, permitindo a construção de 4 categorias de análise, conforme Tabela 1. Tabela 1: Categorização do nível de compreensão dos acadêmicos. Categoria Licenciandos Nível 1) Uso Bom de conceitos científicos 7I, 11I, 3III, 4III, 6III, 7III. Nível 2) Idéias Confusas sobre conceitos científicos 9I, 14I, 18I, 19I, 10II, 2III, 11III. Nível 3) Uso Contraditório dos conceitos científicos 2I, 3I, 5I, 6I, 8I, 12I, 20RI, 1II, 2II, 3II, 4II, 5II, 6II, 8II, 9II, 11II, 12II, 12III. Nível 4) Uso Insuficiente de conceitos científicos 1I, 4I, 10I, 13I, 15I, 16I, 17I, 21I, 7II, 1III, 9III, 8III, 10III, 13III. Na categoria 1 as respostas estão dentro do esperado, houve um bom e correto uso de conceitos científicos relacionados as reações que envolvem a absorção (endotérmica) e liberação de energia (exotérmico), a quebra e a formação de novas ligação, apesar de não serem considerados os conceitos de energia potencial e cinética. Para formação ou quebra de ligações, sempre há energia envolvida, absorção ou liberação da mesma. Quando uma ligação é formada, há energia liberada, e quando há quebra existe absorção de energia. No caso de uma combustão uma UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho EA nova ligação é formada (depois de uma dissociação/quebra de ligação) liberando grande quantidade de energia. (3III) A energia liberada nas reações químicas vem das ligações que, de acordo com o tipo, liberam mais ou menos energia. Essa energia depende do tamanho da molécula, da ionização, da eletronegatividade. (6III). Sempre que ocorre formação de composto ocorre liberação de energia. A reação de uma determinada substância como o oxigênio presente no ar resulta na formação de CO2 , H2 O e energia. (7III). A exemplo de 3III alguns estudantes mostraram bom nível conceitual, atribuindo a origem do fenômeno energético: absorção de energia na ruptura da ligação e liberação de energia na em sua formação. Outros (6III e 7III) demonstram ter boa interpretação e utilizam bem os conceitos. Esperava-se, porém, que explicassem a origem da energia, pelo rompimento e a formação de novas ligações. A resposta de 6III poderia complementar a de 7III. Apesar de ser a categoria com maior nível conceitual, percebem-se limites nas explicações dos acadêmicos quanto ao uso do conhecimento químico referentes à energia potencial e cinética, que pode estar relacionado a pouca atenção dada às variações de temperatura nos sistemas ou a não distinção entre os conceitos calor e temperatura nos livros didáticos utilizados. Na categoria 2 foram agrupadas respostas com significados confusos para os conceitos utilizados e que pertencem ao contexto apresentado. Vêm dos átomos envolvidos na transformação esses átomos liberam energia para serem transformados. (14I) Vem do material usado, e do modo que é usado. Depois da mistura dos materiais, então teremos a combustão dos produtos. Alguns precisam ser excitados para entrar no processo de combustão, a base de aquecimento, etc. (2III) Combustível + comburente. A energia liberada provém da ligação que ocorre entre o combustível e o comburente e forma água no estado de vapor e “derivados” de carbono. Lembrando que este é um processo exotérmico, todas as combustões se comportam dessa forma, com liberação de energia, pois as moléculas do produto possuem menor energia que as dos reagentes. (19I) Os termos científicos esperados muitas vezes não são utilizados, ou são utilizados incorretamente pelos acadêmicos, havendo confusão por parte dos mesmos, como mostram de imediato, os exemplos acima. Na categoria 3 houve o uso contraditório dos conceitos científicos nas explicações sobre a absorção de energia durante a quebra de ligações nos reagentes e a liberação de energia resultante da formação de novas estruturas moleculares nos produtos. As explicações mais comuns foram: UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. Especificar a Área do trabalho EA XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) A energia liberada é originada quando uma ligação química é rompida e liberará energia para o meio. Neste caso a reação é denominada exotérmica. Nesse caso ligações são rompidas e novas são estabelecidas. (6II) O efeito vem da quebra entre as ligações intramoleculares das moléculas, causa uma enorme liberação de energia, para então posteriormente ocorre novas interações entre os átomos. Formando conseqüentemente novas substâncias. (4II) Esta energia liberada nesse tipo de reações químicas vem da quebra das moléculas em transformação; isto se deve a capacidade de romper as forças moleculares e intermoleculares. (1II) Vem da agitação dos átomos, que ao se agitar liberam certa quantidade de energia, e quando à rompimento de ligações químicas à liberação de energia. (6I) Nessa categoria percebe-se que os licenciandos não têm conhecimentos químicos suficientes e claramente significados de modo a permitir interpretação de situações vivenciais. Isso, ficou evidenciado pelo emprego incorreto de alguns dos conceitos químicos e a forma confusa escrita pelos estudantes, o que nos preocupa e alerta, como na categoria anterior, para a importante (re)significação dos conceitos/conteúdos durante as aulas. Na categoria 4 foram agrupadas respostas que mostram que os estudantes não conseguiram responder a questão, por utilizarem de forma insuficiente os conceitos de nível microscópico (atômico- molecular) da química. A energia liberada vem dos átomos que se unem fazendo com que aconteçam as transformações químicas. (10I) Muitas transformações com efeitos energéticos ocorrem no nosso dia a dia, como a combustão. Para que ocorra a combustão é necessário que haja presença de oxigênio. Se acendermos 2 velas de 4 cm cada e deixarmos uma na presença de oxigênio, e a outra cobrirmos com um copo a chama acaba, cessando a combustão pela falta de oxigênio. (8III) Pode-se afirmar que, de forma geral, os acadêmicos tiveram dificuldades em responder com boa compreensão conceitual à questão proposta. Pouco inter-relaciona m as expressões reações exotérmicas e endotérmicas, quebra e formação de ligações, inter-conversão energia potencial/cinética, conservação da energia em sistemas isolados e variação de temperatura nesses sistemas. III. COMPREENSÕES DOS ESTUDANTES DO ENSINO M ÉDIO A partir de leituras cuidadosas das respostas dos estudantes do EM pode-se chegar a 4 níveis ou categorias de compreensão, conforme segue na Tabela 2. Tabela 2: Categorização do nível de compreensão dos estudantes do EM. Categoria Respostas dos estudantes do EM Nível 1) Responderam segundo o esperado 1A, 4A, 6A, 7A, 8A, 9A, e 10A. Nível 2) Não responderam o esperado (confusos), não sabiam 3A, 5A, 1B e 3B, 2C, 3C, 4C, 7C, 10C. UFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. Especificar a Área do trabalho EA XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Nível 3) Respostas contrárias aos conceitos científicos 2A, 2B, 4B, 7B, 8B, 9B, 10B e 1C. Nível 4) Não tentaram responder 5B, 6B, 5C, 6C, 8C, 9C. Na categoria 1 os estudantes expressaram-se sobre a diferença das reações exotérmicas, que liberam energia, e endotérmicas, que absorvem energia. A categoria apareceu apenas para a Questão A e não foram muito além de citar exemplos. Exotérmica: combustão de álcool, formação de nuvem de chuva, a partir do vapor d’água do ar. Endotérmica: sublimação da naftalina, degelo do freezer. (10A) Na categoria 2 os estudantes não responderam dentro do esperado. Praticamente não utilizam conceitos escolares estudados ou mostram significados confusos. Exotérmica – liberação de energia com a queima do papel. Endotérmica – absorção de energia da queima de combustível. (5A) Não, pois aumenta a temperatura. (1B) Não, porque quando a variação de energia em um sistema isolado é constante, sua temperatura também será constante, pois existe movimentação entre as moléculas. (3B) Através da absorção de oxigênio e da liberação de gás carbônico. (7C) A origem das combustões ocorre na absorção de oxigênio e depois a liberação do gás carbônico, ou seja, libera energia. (3C) Na categoria 3 os significados dados às palavras que representam conceitos científicos no contexto escolar parecem caminhar na contramão dos significados que deveriam ter. Zn + H2 SO4 à ZnSO4 + H2 Exotérmica. (2A) Porque a concentração de NaOH é muito alta quando ocorre a reação. (7B) Sim, pois a água fica concentrada na térmica, e o que faz com que ela se aqueça cada vez mais e o isolante dela, ela não está em constante contato com o meio externo, por isso demora mais para mudar a temperatura. (8B) A energia vem da quebra das moléculas, aí transformando o alimento em energia em nosso organismo. (1C) 1C mostrou algum conhecimento frente à energia liberada e levou em consideração a estrutura das moléculas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados da investigação mostram que a maioria dos estudantes do Curso de Licenciatura de Química e do EM, que responderam a questões apresentadas sobre a origem dos efeitos energéticos em reações químicas conhecidas, tem dificuldade para produzir uma resposta que possa ser considerada satisfatória em termos do que ocorre em nível atômico-molecular. Constata-se que as expressões reação exotérmica e reação endotérmica são empregados corretamente pelos licenciandos, mas ficam confusos quando precisam explicar a origem da energia nessas reações, fazendo pouca menção pertinente ao nível atômico- molecular e às interUFPR, 21 a 24 de julho de 2008. Curitiba/PR. XIV Encontro Nacional de Ensino de Química (XIV ENEQ) Especificar a Área do trabalho EA conversões de energia que devem ocorrer para que seus efeitos energéticos possam ser percebidos. Estudantes do EM conseguem indicar alguns exemplos de reações químicas em que são classificadas (exotérmicas e endotérmicas) e poucos associam isso às mudanças nos arranjos atômicos em moléculas envolvidas nas transformações. Ambos os grupos de sujeitos praticamente não mencionam a conservação da energia em sistemas isolados em que ocorrem as transformações e muito menos tentam explicar a origem da variação na temperatura que se observa nessas reações à inter-conversão energia potencial e cinética. Algo semelhante foi encontrado nos livros didáticos: muita ênfase em cálculos de energia (valores de ? H) em dada equação química, num exercício de somar e subtrair calores de formação, do que na significação conceitual. REFERÊNCIA IS : Brasil, Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica. Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Brasília, vol. 2, 2006. Galiazzi, Maria do Carmo. Educar pela Pesquisa: ambiente de formação de professores de ciências. Ed. Unijuí, Ijuí, 2003. Lopes, Alice. Conhecimento Escolar: Inter-Relações com Conhecimentos Científicos e Cotidianos. Contexto e Educação. Ed. Unijuí. n° 45, p. 40-59, Jan/Mar 1997. Lüdke, M; André, M. Abordagens Qualitativas de Pesquisa: pesquisas qualitativas. São Paulo: EPU. 1986, Cap.2, p.11-24: Abordagem Qualitativas de Pesquisa: a pesquisa etnográfica e o estudo de caso. Maldaner, Otavio. A Formação Inicial e Continuada de Professor de Química: Professores/ Pesquisadores. Col. Educação em Química. 2ª ed. rev. Ed: Unijuí, 2003. Maldaner, Otavio; Zanon, Lenir. Situação de Estudo: Uma Organização do Ensino que Extrapola a Formação Disciplinar em Ciências. Espaços da Escola. n°41. p. 45-60, Jul/Set. 2001. Morin, Edgar. Os Sete Saberes necessários à Educação do Futuro. 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