Uso de geossintéticos em obras da via Nova Tamoios – SP Mauricio Ehrlich(1) Luiz Guilherme de Mello(2) Clara Naoko Takaki(3) Mario Riccio Filho(1) COPPE, Universidade Federal do Rio de Janeiro(1) Vecttor Projetos e Escola Politécnica da Universidade de São Paulo(2) EGB Escritório Geotécnico Brasileiro(3) Resumo: O trecho de ligação das rodovias Carvalho Pinto e Presidente Dutra situado em São José dos Campos – SP foi finalizado em 2006. Esta importante obra contou com técnicas de engenharia geotécnica envolvendo o uso de geossintéticos em três principais obras. Estas obras compreenderam um muro de solo reforçado apoiado sobre laje estaqueada, um muro de solo reforçado apoiado sobre capitéis e geogrelha e um aterro apoiado sobre colunas granulares encamisadas com geossintético. No caso dos muros de contenção o uso do geossintético foi relevante devido ao fato de não haver área disponível para os taludes de aterro esperados devido às cotas dos greides projetados. Já no caso do uso de colunas granulares a relevância do uso do geossintético está relacionada à estabilização do solo de fundação do aterro da rodovia, solo este composto por sedimentos aluvionares recentes de argila mole e areia fofa depositados nas margens do rio adjacente à via. O muro de solo reforçado assente em laje sobre estacas e o aterro sobre colunas granulares encamisadas foram instrumentados. 1 - Introdução Neste trabalho são apresentados dois casos de obras executadas onde foram utilizados geossintéticos de forma a se viabilizar o empreendimento tecnicamente com otimização de custos e prazos. As duas obras fazem parte do trecho de ligação das rodovias Carvalho Pinto e Presidente Dutra, situado em São José dos Campos – SP. O trecho em questão faz parte da rodovia denominada Nova Tamoios. Estas obras compreendem um muro de solo reforçado apoiado sobre laje estaqueada e um aterro apoiado sobre colunas granulares encamisadas com geossintético (De Melo et al., 2008). Estas duas obras foram extensivamente instrumentadas. A construção destas duas obras ocorreu no ano de 2006, sendo que as mesmas têm apresentado desempenho satisfatório até o momento. O muro de solo reforçado foi construído sobre laje apoiada sobre estacas de forma a se evitar recalques na rodovia, uma vez que a solo de fundação possuía espessa camada argila mole. A técnica de solo reforçado foi utilizada para permitir uma face com inclinação próxima da vertical, pois não havia espaço disponível para se construir taludes de aterro. Observa-se que neste caso parte da pista de rolamento da rodovia passa em cima da estrutura de solo reforçado. Análise de resultados de instrumentação e comparação com previsões teóricas são apresentadas em Riccio (2007), Riccio e Ehrlich (2009), Riccio e Ehrlich (2010). Em Riccio e Ehrlich (2012) apresentam-se detalhes do projeto de instrumentação adotado. A construção do aterro apoiado sobre colunas granulares encamisadas com geossintéticos (as colunas encamisadas também são denominadas como colunas de solo melhorado) buscou contornar o problema de tempo de adensamento e necessidade do uso de sobrecargas para estabilização das camadas de solo compressíveis presentes no subsolo local. Esta solução proporciona aceleração dos recalques e redução significativa da magnitude dos mesmos. De Mello et al. (2008) e Sandroni et al. (2010) apresentam a geologia local, dimensionamento e resultados de instrumentação, e Tomazoni (2011) apresenta detalhes da instrumentação utilizada. As obras pertencem ao governo do estado de São Paulo e foram executadas pela construtora Andrade Gutierrez, tendo como projetista a Vecttor Projetos S/C. Os geossintéticos para a obra foram fornecidos pela empresa Huesker do Brasil. O gerenciamento foi feito pelo DERSA/SP. 2 – Relato dos casos de obras A seguir são apresentadas em maiores detalhes as duas obras mencionadas anteriormente. 2.1 – Muro de solo reforçado O muro de solo reforçado foi construído com face do tipo blocos modulares e geogrelhas de poliéster. O método de dimensionamento interno empregado neste projeto foi analítico o proposto por Ehrlich e Mitchell (1994). A adoção do uso da solução em muro de solo reforçado ao invés de muro de concreto armado, ou outra solução, buscou a economia de custos e também a aceleração do processo construtivo, pois o aterro da rodovia pode ser construído de forma paralela à execução do muro, o que resultou em um ganho considerável de tempo com relação ao cronograma da obra. O uso de geossintético (reforço) contornou o problema de falta de espaço, necessário a receber os taludes de aterro da rodovia no trecho em questão. Em um trecho do muro (parte menos alta) haveria espaço para um talude em aterro, porém seria necessária a retirada de vegetação da área e um maior volume de solo a ser retirado da jazida. Possibilitou também o uso de solo com grande porcentagem de finos, que era o disponível nas proximidades. O solo utilizado para a construção do aterro do muro de solo reforçado foi uma argila arenosa com alta porcentagem de finos, com 55,0% passando na peneira #200, sendo 40,0 % de fração argila. A Figura 1 ilustra a seção transversal típica com a seqüência de camadas executadas e também o posicionamento dos geossintéticos utilizados. Os reforços foram espaçados verticalmente de 0,60m e 0,40m. A Figura 2 ilustra a instrumentação empregada na camada número 3 (de baixo para cima) do muro. O monitoramento da obra foi feito por meio de células de carga para medição de esforços de tração nos reforços (40), células de tensão total para medições das tensões verticais próximas à base (5), bloco instrumentado que substituiu um bloco de face de concreto com o objetivo de medir os esforços na face (1), inclinômetros (2) para medição das deformações horizontais próximas (zona ativa) e afastadas da face (zona passiva) e placas magnéticas de recalque para medição das deformações verticais (10). Alguns instrumentos foram especialmente projetados para o monitoramento desta obra como as células de carga para os reforços e o bloco instrumentado de face. Figura 1 – Seção transversal típica com seqüência de camadas e geossintéticos (geogrelha de poliéster) utilizados (Riccio e Ehrlich, 2009). Figura 2 – Vista em planta da camada de número 3 do muro (de baixo para cima), com a instrumentação instalada (Riccio e Ehrlich, 2009). No quadro a seguir são apresentadas fotos que mostram as principais etapas construtivas executadas na obra em questão. (a) (b) (d) (c) (e) (f) Quadro 1 – Principais etapas da execução da obra: a) execução do colchão drenante; b) compactação de camada de solo; c) posicionamento de fileira de blocos modulares; d) enchimento dos blocos com brita (face drenante); e) camada pronta para receber solo para aterro; f) solo sendo lançado para execução de nova camada (Riccio e Ehrlich, 2009). (g) (h) Quadro 1 – continuação: g) compactação do solo lançado; h) muro finalizado (Riccio e Ehrlich, 2009). A Figura 3 ilustra resultados típicos obtidos pela monitoração do muro. (a) (b) Figura 3 – Resultados típicos obtidos pela instrumentação utilizada: a) tração nos reforços (R4); b) forças na base da face (Riccio e Ehrlich, 2009). 2.1 – Aterro sobre colunas de material melhorado O aterro rodoviário no trecho em questão teve sua fundação tratada com o emprego de estacas de solo melhorado (material envolto em um encamisamento com material geossintético). O perfil geotécnico apresenta espessuras de argila mole de até 9,0m e considerando um aterro de até 8,0m soluções como construção em etapas mostraram-se inviáveis. Adicionalmente uma camada de geossintético tipo geogrelha foi inserida sobre as colunas (base do aterro) de forma a diminuir deformações entre colunas. O método de cálculo empregado neste projeto foi o método analítico proposto por Raithel (1999) e Raithel e Kempfert (2000) para as colunas de solo melhorado e o método de Kempfert et al. (2004). O uso das colunas evitou a necessidade do uso de bermas de equilíbrio. As bermas além de consumir espaço lateral produzem um aumento considerável no volume de solo utilizado, o que gera custos adicionais de movimento de terra, assim como material de sobrecarga para acelerar recalques (em caso de solução convencional). Do ponto de vista ambiental o uso do geossintético proporcionou um menor volume de material utilizado. A Figura 4 ilustra a seção transversal típica da solução adotada para a obra em questão. O aterro foi apoiado sobre as colunas de solo melhorado (colunas encamisadas com geossintético), sendo que na base do aterro, ou seja, topo das colunas foi inserido um reforço do tipo geogrelha para assegurar equilíbrio horizontal da estrutura e diminuir a diferença de deformação vertical na região das colunas e entre as colunas. Foi adotada uma malha com colunas de 0,70m de diâmetro e espaçamento entre eixos variável entre 1,80m e 2,20m, dependendo da altura do aterro. Figura 4 – Seção transversal típica, estaca 1133 (De Mello et al., 2008). O monitoramento da obra foi efetuado por meio de inclinômetros (2), perfilômetros (1), placas de recalque (4), células de tensão total (2) e medidores de deformação (diâmetro da coluna) em número de 2. A Figura 5 ilustra o posicionamento da instrumentação e a Figura 6 ilustra alguns resultados obtidos pela instrumentação. Figura 5 – Seção transversal instrumentada, estaca 1135 (De Mello et al., 2008). As principais etapas construtivas da obra são apresentadas no quadro 2 a seguir. (a) (b) (c) Quadro 2 – Etapas construtivas das fundações em colunas de areia encamisadas com geossintético: a) enchimento da camisa com material granular (areia) pelo funil; b) retirada da camisa metálica com auxílio de vibração; c) aspecto da parte superior da coluna após a retirada da camisa metálica (De Mello et al., 2008). (a) (b) Figura 6 – Resultados típicos obtidos pela instrumentação utilizada: a) recalques medidos pelo perfilômetro (R4); b) tensão na coluna (topo) (De Mello et al., 2008). 3 – Comentários finais As soluções implantadas vêm se mostrando adequadas aos objetivos propostos, com desempenho satisfatório comprovado pela instrumentação. Não se observaram problemas durante a fase executiva e pós-construção. O uso de geossintéticos permitiu diminuir o volume total de aterros em ambas as soluções, bem como prazo de construção. Tal como geralmente ocorre, o uso de geossintéticos permitiu uma redução de custos comparativamente às soluções convencionais. 4 – Referências bibliográficas De Mello, L. G., Mondolfo, M., Barboza, G.E., Bilfinger, W., Tsukahara, C. N., 2008, “Extension of Vidoca Avenue: Successful use of geosynthetics for retaining structure and embankment construction", 1st Pan American Geosynthetics Conference & Exhibition, 2-5 de março de 2008, Cancun, Mexico, pp. De Mello, L. G., Mondolfo, M., Montez, F., Tsukahara, C. N., Bilfinger, W., 2008, “First Use of Geosynthetic Encased Sand Columns in South America”, 1st Pan American Geosynthetics Conference & Exhibition, 2-5 de março de 2008, Cancun, Mexico, pp. 1332-1341. Ehrlich, M. & Mitchell, J. K. 1994. Working Stress Design Method for Reinforced Soil Walls, Journal of Geot. Engrg, v.120, n. 4, pp. 625-645. Kempfert, H. G., Gobel, C., Alexiew, D., Heitz, C., 2004, “German Recommendations for Reinforced Embankments on Pile-Similar Elements”, Peoceedings of EuroGeo3, European Geosynthetics Conference, Geotechnical Engineering with Geosynthetics, pp. 219-284. Riccio, M.V.F., 2007, “Comportamento de um muro de solo reforçado com solos finos tropicais”, Tese de Doutorado, COPPE, Universidade federal do Rio de janeiro. Riccio, M.V.F., Ehrlich, M., 2009, “Performance of a block-faced geogrid wall using fine-grained tropical soils. In: 17th International Conference on Soil Mechanics and Geotechnical Engineering”, Alexandria. Proceedings of the 17th International Conference on Soil Mechanics and Geotechnical Engineering. Amsterdam : IOS Press, 2009. v. 2. p. 1877-1880. Riccio, M.V.F., Ehrlich, M., 2010, “Predicition of tension in the reinforcement in a full scale block-faced geogrid reinforced soil wall using fine-grained tropical soil as backfill”, 9 ICG - 9th International Conference on Geosynthetics, Guarujá, Brasil, pp. 1619-1622. Riccio, M.V.F., Ehrlich, M., 2012, “Monitoring of a Geogrid Reinforced Soil Wall with Segmental Blocks Facing”, 2nd Pan American Geosynthetics Conference & Ehibition, 14 de maio de 2012, Lima, Perú, CD-ROM. Sandroni, S.S., De Melo, L.G., Gomes, R.C. e Vilar, O.M., 2010, "Brazilian reasearch and practice with geosynthetics", 9 ICG - 9th International Conference on Geosynthetics, Guarujá, Brasil, pp. 3-41. Tomazoni, C. S., 2011, “Analysis of Rheologic Processes in Rational Design of GEC Systems”, tese de doutorado, ITA, São José dos Campos.